"Não, não e não!", Tânia repetiu mais uma vez a si mesma. "Não posso me envolver com Mark Anders". Ela sabia que Mark não era homem de uma mulher só e não
estava disposta a sofrer. Por isso, buscava consolo saindo com um príncipe árabe e um comandante de avião, mesmo reconhecendo que nenhum dos dois era capaz de enlouquecê-la
como Mark. Desde que havia chegado ao Texas, para trabalhar numa plataforma de perfuração de petróleo, ela não conseguia tirá-lo da cabeça. Pagaria qualquer preço
para descobrir que estranho poder Mark possuía, para deixar todas as mulheres perdidamente apaixonadas por ele!
Doação do livro: Valeria
Digitalização: Joyce
Revisão: Raquel
Capítulo I
O vento passava assobiando através da torre de ferro acima de sua cabeça. Tânia segurou firme o capacete e olhou para o alto. A torre se elevava uns sessenta
metros, acima da superfície da plataforma onde estava.
A fúria do vento fazia espumar a superfície do mar. Tânia podia ouvir o barulho das ondas batendo contra as colunas de sustentação da plataforma, que abafava
um pouco o barulho das máquinas. O céu, no entanto, estava completamente azul; estranho para um dia de fevereiro, em pleno mar do Norte.
Tânia Cameron, geofísica e paleontóloga, era engenheira de operações em alto-mar da Empire Petroleum. Agora, ali naquela plataforma, olhava com satisfação
o resultado de seu trabalho.
Missão cumprida, pensou. Onde estavam nesse momento os gozadores e descrentes que achavam que uma mulher não podia se encarregar da instalação de uma plataforma
de produção de petróleo? Pois ela tinha executado o projeto, com facilidade e eficiência.
Retirou seu capacete e passou a mão enluvada pelos cabelos curtos e negros. Tânia estava usando botas, jeans e um casaco de pele de carneiro, curto. Tinha
um corpo bonito e elegante. Havia convivido toda sua vida com homens do petróleo e já nem notava mais os olhares de admiração dos trabalhadores. Nem reparou também
no olhar interessado daquele homem, alto, encostado na parede da cabine do superintendente.
Tomada por um impulso repentino, Tânia foi até a beira da plataforma, segurou em um cabo de aço, e ficou observando a manobra do guindaste, que tinha a precisão
de um relógio. Ela sorriu para Ian Taylor, o manobrista, e levantou o polegar. Começou a voltar, então, para a cabine do superintendente.
Várias milhas ao longe, um movimento sobre a água chamou sua atenção. Parou para admirar o pelicano que mergulhava na água. Ou seria uma gaivota? Ficou tão
emocionada com o vôo elegante do pássaro, que esqueceu por um instante onde estava.
Não chegou a perceber um grito rouco no ar. Nem viu o homem encostado na parede da cabine se atirar com violência sobre ela. Em um salto de goleiro de futebol,
ele bateu nela com seus oitenta quilos e a jogou no chão do deck. Segurou-a e imediatamente rolou de lado. Nesse instante, o gancho do guindaste passou no ar a apenas
alguns centímetros deles.
Tânia ficou assustada e sem fôlego. Não conseguia respirar direito com aquele peso em cima dela. O pior é que o homem tinha o rosto enterrado na curva do
seu pescoço, e ofegava contra a sua pele. Os braços dele, como um anel de aço, a apertavam tão junto de seu corpo como ninguém jamais havia feito antes.
Recobrando-se um pouco, e percebendo a pequena aglomeração que se formava ao redor, Tânia se mexeu. A reação dele foi imediata. Levantou a cabeça, mostrando
uns olhos tão gelados como o mar que os cercava e falou, furioso:
? O que está pretendendo, sua pequena idiota? Quer ver seus pobres miolos esparramados por toda parte? Vá para o inferno, mulher! Quem foi o débil mental
que permitiu sua entrada nesta plataforma?
Tânia olhava, perplexa. Certamente ele sabia que ela era a chefe das operações ali!
? Como se atreve a falar comigo desta maneira? Saia, quero levantar imediatamente! ? ela protestou, indignada.
? Vou deixá-la sair daqui, quando eu resolver! Tenho vontade de lhe dar uma lição inesquecível.
Aquele rosto tão perto do seu perturbou Tânia. Cada nervo de seu corpo parecia gritar um alerta, como se o corpo daquele homem representasse um perigo, que
devia evitar a qualquer custo. Assustada com essa descoberta, ela tentou bater em retirada.
? Olhe, estamos atraindo muita atenção ? falou, baixo. ? Por favor, me deixe sair. Estou grata por ter agido tão rápido. Muito obrigada, mesmo.
Ela sentiu que ele afrouxou o peso.
? Ok, dra. Cameron, vou soltá-la se prometer conservar seus miolos dentro de sua linda cabecinha. Promete? ? ele falava arrastado, com sotaque americano.
Tânia concordou com a cabeça, tentando entender por que não simpatizava com ele.
O homem a soltou, finalmente. Neste momento, Ian Taylor chegou junto dela e puxou-a para cima.
? Meu Deus, Tânia, o que houve com você? Se não fosse pelo Anders... ? A sua impassível expressão de escocês estava completamente transtornada. Tânia tocou
de leve seu rosto preocupado.
? Eu sei, Ian. Sinto muito. Por um instante esqueci de mim mesma.
? Bem... é bom que não se distraia novamente.
Tânia sentia-se como uma escolar apanhada em falta. Era uma sensação desconfortável que não combinava com sua habitual frieza e competência. Olhou com raiva
para Anders, como se ele tivesse culpa do vexame que ela havia passado. Ele, em resposta, deu apenas um sorriso irônico.
? Nunca vi você fazer algo tão irresponsável antes, Tânia ? Ian continuou, espantadíssimo.
? Sossegue, Ian. Já prometi ao sr. Anders que nunca mais vou ser tão distraída.
Anders ainda estava sentado no chão, com os braços apoiados nos joelhos. Parecia exausto. Tânia o olhou com curiosidade. Sentindo o olhar dela, Anders levantou
a cabeça, muito sério. Foi Ian Taylor quem, mais uma vez, quebrou o clima desagradável.
? Bela demonstração, amigo! Deixe que lhe agradeça por todos nós ? Ian disse, sacudindo a mão do americano e sorrindo para Tânia. ? Esta senhorita é uma
espécie de mascote para nós. Não queremos que nada aconteça com ela.
Tânia não estava gostando de ser o centro das atenções agora, muito menos das atenções do americano. Ela tinha para com ele uma dívida de gratidão, é claro,
mas duvidava que pudesse chegar a bom termo com um homem arrogante e autoritário como ele. Era justamente o tipo que devia achar que o lugar de uma mulher é na cozinha,
preparando petiscos.
Achando graça nisso foi em direção da cabine, mas Anders chegou na frente e abriu a porta para ela. Ao passar por ele, Tânia percebeu que ainda estava pálido,
como uma pessoa preocupada com alguém querido. Afastou esse pensamento absurdo da cabeça. Esse homem era um completo estranho para ela.
? Obrigada, Anders ? ela disse, seca.
? Por nada, srta. Cameron.
O sorriso dele tinha um charme inegável.
"Deve haver algum demônio escondido naquele homem", Tânia pensou, procurando afastá-lo do pensamento.
Clide Atkins, o engenheiro civil encarregado da produção, o poço já estava produzindo, tirou os olhos dos papéis que estudava e sorriu para Tânia, quando
ela entrou.
? Bem, Tânia querida, o que decidiu sobre o emprego?
Atkins era um velho e querido amigo. Ela o conhecia desde criança. Havia trabalhado com o pai de Tânia durante anos e estava no local do acidente quando
o pai e o noivo dela, Kurt, morreram. Atkins foi até a Universidade onde ela estudava, levar a terrível notícia da tragédia, e ficou com Tânia até que pudesse aceitar
o fato de que os homens mais importantes de sua vida tinham ido para sempre.
Ele a consolou, deu força, cuidou de seus estudos e incentivou sua carreira. Atkins patrocinou tudo, desde a Universidade até seus primeiros contatos com
a Empire Petroleum. Graças à orientação dele e ao seu próprio esforço, Tânia chegou até o posto de engenheira de operação em alto-mar.
Agora recebia essa fabulosa proposta da United Petroleum da Califórnia. Parecia um sonho!
É claro que isso significava ter que deixar a Escócia, sua mãe e seu avô. Seu irmão mais novo, Rob, estava na Universidade e não ia sentir falta da irmã.
Mas e os outros?
A mãe e o avô de Tânia estavam bem habituados com a vida atribulada dos trabalhadores de petróleo. Jock Cameron, o avô, tinha perfurado campos pelo mundo
afora. Seu filho único, Antony, seguiu seus passos e casou com Joan Lutman, filha do paleontólogo responsável pelas pesquisas que levaram às primeiras descobertas
de petróleo na Arábia Saudita.
Sim, eles entenderiam quando ela trocasse a segurança da Empire Petroleum pelas promessas da United nos Estados Unidos. Iam compreender seu desejo de enfrentar
um desafio profissional e, ao mesmo tempo, visitar outro país e ver como se vivia do outro lado do mundo.
? Decidi aceitar a oferta, Atkins ? Tânia disse, voltando à realidade.
? Certo. Então é melhor se apressar. ? Atkins saiu do balcão que servia como mesa de trabalho e a abraçou com carinho. ? Aquele helicóptero deve chegar de
Aberdeen em menos de duas horas. Você precisa ir nele para Londres ainda hoje, se pretende viajar para a América. Diabo, vou sentir saudades suas, Tânia. ? Seus
olhos estavam molhados de lágrimas quando a largou. ? Vai também, Anders? ? Atkins agora olhava para o americano, que estava impassível atrás deles.
? Tenho passagens para o vôo que sai de Londres para Dallas amanhã cedo, e a srta. Cameron também. Fazemos parte de um mesmo grupo contratado pela United.
Eu serei o chefe dela. Começamos a trabalhar em uma semana.
Tânia ficou louca da vida. Queria passar uns dias com a família antes de partir para os Estados Unidos.
? Eu não posso partir amanhã cedo ? ela protestou.
? Tem coisas para resolver, srta. Cameron, ou talvez um namorado para se despedir?
? Se fosse algo assim, evidentemente não seria da sua conta! ? Tânia falou com toda segurança. Não tinha medo de machões presunçosos. Havia aprendido a conviver
com eles, em seu trabalho. Sua língua afiada e seu temperamento, quando provocada, eram bem conhecidos entre os homens do petróleo. Era sempre educada, mas era capaz
de arrasar qualquer pessoa que esquecesse as boas maneiras.
Ocupada demais nos últimos dias, Tânia não havia prestado quase atenção naquele americano alto. Sabia que ele e mais cinco homens estavam na plataforma estudando
os métodos, pelos quais um novo poço tinha sido localizado. Todos os seus contatos com ele foram ligeiros e estritamente de trabalho, a respeito de técnicas e equipamentos.
As perguntas de Anders tinham sido inteligentes e concisas. Ela o considerou um geofísico competente. Mas nada além disso. Hoje, no entanto, alguma coisa
esquisita havia acontecido.
Ela o olhou uma vez mais. Anders tinha um corpo atraente, os cílios mais longos que ela já havia visto e, ainda por cima, olhos cor de avelã, contrastando
com os cabelos castanho-claros. É... definitivamente ele era um fantástico espécime masculino, para quem gostasse do tipo dominador. Bem... Anders que jogasse seu
charme em cima de outras pessoas. Com ela, não ia conseguir!
Tânia levantou o queixo para falar com Atkins:
? Clive, na verdade, eu não avisei que ia embora tão depressa. Não posso deixar de passar em casa. Jock nunca me perdoaria, se eu não o visse antes de ir
para outro país. Preciso ver mamãe, também. Você pode ajeitar isso para mim? ? pediu, com um sorriso que teria derretido até um iceberg.
? Deixe comigo! Mas vá logo arrumar suas coisas, porque de qualquer jeito terá que pegar aquele helicóptero. Mas me diga como pretende chegar a Edimburgo.
? Dou um jeito! ? Tânia saiu sorrindo para Atkins, e nem se dignou a olhar para Anders.
Mais tarde, Tânia subiu no helicóptero e Anders subiu logo atrás. Ela sentou-se perto da janela.
? Se incomoda se eu sentar-me aqui? ? Ele se instalou ao lado dela, considerando como um sim o indiferente olhar que ela deu. ? Não pude deixar de ouvir
sua conversa com Clive, dra. Cameron. Tenho negócios a tratar amanhã em Edimburgo, para a companhia. Há um carro esperando por mim em Aberdeen. Se quiser uma carona,
terei muito prazer em levá-la comigo. Vou viajar durante a noite, para estar lá amanhã cedo.
Acostumada com a camaradagem dos trabalhadores do petróleo, ela aceitou imediatamente.
? Isso resolve meu problema. Obrigada, sr. Anders. Foi muito amável em oferecer.
? Por nada. Estou satisfeito em poder servi-la. Estaremos trabalhando na mesma equipe. Meu nome é Mark.
? Está bem, Mark. Eu sou Tânia para a maioria das pessoas com quem trabalho.
? Eu gosto desse nome. Fica bem em você.
Ele tem um sorriso charmoso, pensou Tânia, contente com o elogio.
Depois disso, ele abriu sua pasta e passou a examinar alguns papéis. Tânia pegou um jornal e tratou de ignorar aquela presença perturbadora.
Algumas horas mais tarde, estavam viajando em um possante Jaguar preto. Mark Anders dirigia a uma tremenda velocidade.
Tânia arriscou um olhar de lado para ele. Não, definitivamente Mark Anders não era seu tipo. Graças a Deus. Desde a trágica morte de Kurl, seu noivo, nas
águas geladas de Cook Inlet, no Alaska, quatro anos atrás, nenhum homem a interessava. Ninguém conseguia preencher o lugar de Kurt em seu coração!
? Está cansada, Tânia? ? Anders perguntou, de repente.
? Sim... sim, um pouco. Foi uma semana dura. ? Ela sorriu, gostando do jeito como ele dizia seu nome.
? Vou colocar seu encosto para trás e então pode tirar uma soneca. ? Ele se inclinou na frente dela, e mexeu numa alavanca ao lado do assento. O encosto
baixou suavemente até uma posição confortável. Depois, ele tirou um cobertor do banco de trás e jogou para a frente. Tânia se ajeitou no banco, puxou o cobertor
e fechou os olhos. Seu "obrigada" quase não deu para ouvir.
? Durma bem! ? ele disse, carinhoso.
Ela sorriu e, no instante seguinte, estava dormindo. Algum tempo depois, acordou de repente. Sentiu um certo calor, uma sensação estranha e desconfortável.
Abriu os olhos e levou um susto, quando viu o rosto de Mark tranquilamente adormecido há alguns centímetros do seu.
Mark estava virado para ela, com a cabeça aconchegada em seu ombro esquerdo. O braço direito dele descansava ao redor de seu corpo. O indomável Mark Anders
estava dormindo junto dela, numa perturbadora intimidade.
Deitado desse jeito, parece um garoto doce e desprotegido, pensou ela. Qualquer mulher sentiria o desejo de acariciá-lo.
De repente, as pálpebras dele se mexeram e se abriram. Tânia mergulhou subitamente nas profundezas daqueles olhos tão perto dos seus, que pareciam atraí-la
como um imã. Como se fosse a coisa mais natural do mundo, Mark inclinou ainda mais a cabeça e começou a beijá-la. Assustada, ela se deu conta de que estava correspondendo
com paixão, até com mais paixão do que correspondia aos beijos de Kurt...
Tânia murmurou um fraco protesto contra aquela loucura. Mas não podia negar que estava faminta daqueles lábios sequiosos. Fazendo um esforço imenso para
recuperar sua razão, ela empurrou o braço de Mark que a prendia ao assento, separando-se dele.
? Não pude resistir ? ele confessou com voz rouca, tirando o braço da cintura dela. Depois se espreguiçou lentamente, ajeitou a camisa e passou a mão pelo
rosto sem barbear. Quando se inclinou sobre Tânia, para recolocar o assento no lugar, tocou-a de leve e ela sentiu um arrepio. Mas Mark pareceu não notar. Apenas
disse:
? Para onde gostaria de ir, srta. Tânia Cameron? Ê melhor sairmos daqui ou seremos multados.
Tânia então percebeu que estavam parados na Princess Street, na entrada da cidade. Provavelmente, Mark não agüentou de cansaço e deu uma paradinha para tirar
um cochilo. Acabou dormindo.
Quando o carro deu a saída, uma guarda já vinha se aproximando. Escaparam da multa por pouco!
? Se me levar até o ponto de ônibus, posso pegar um que me deixe em casa. É perto daqui ? Tânia disse afinal, quando já andavam pela cidade.
? Por que não me deixa levá-la em casa? Ainda não são sete horas e meu primeiro compromisso é só daqui a algumas horas.
Tânia não podia recusar, embora preferisse se separar dele o quanto antes.
? Bem... se é assim... está bem. Tem certeza de que não é muito incômodo?
? Claro que tenho certeza ? falou, sorrindo para ela. ? Está com fome, Tânia?
? Estou. Já que vai até minha casa, por que não toma o café da manhã conosco? É a única coisa que posso fazer para retribuir sua amabilidade.
? Vou adorar, obrigado. Vai ver Jock?
? Jock? ? ela repetiu, espantada.
? Parece que a ouvi dizer que não podia deixar a Escócia sem vê-lo antes.
? É verdade. ? Tânia tinha vontade de rir. ? Jock é meu avô. Jock Cameron. Minha mãe mora com ele, e não entenderia se eu viajasse sem contar todos os meus
planos, antes. Essa despedida é importante, para que eles não tenham a impressão de que eu os estou abandonando.
? Ele vai tentar mudar sua decisão de ir?
? Não, imagine.
Tânia recostou-se no assento e ficou apreciando, feliz, aquela paisagem familiar, agora que já se afastavam da cidade. Sempre sentia-se feliz quando voltava
para Dawn Cottage, seu lar, um chalé cinzento que era uma beleza à luz da manhã. Ficava num vale, tinha um telhado de ardósia, e o cenário mais lindo que já havia
visto. Tânia aspirou o ar puro e olhou com emoção a mata em volta. Agora, já via a fumaça que saía da chaminé de sua casa.
? Isto nunca muda ? ela comentou, com olhar brilhante.
Mark sorriu, carinhoso.
? Você ama isto, não? Posso ver por quê.
Ela sorriu e, quando pararam o carro, subiu pulando a escada da frente, como uma criança. Pegou a velha argola de bronze e bateu, impaciente. Por alguma
razão muito estranha, parecia natural Mark estar ali com ela...
Capítulo II
? Tânia! ? Joan Cameron abraçou-a, amorosa. Tinha os mesmos olhos azuis aveludados da filha. ? Não esperava vê-la senão daqui a algumas semanas, querida!
? Eu sei, mamãe, mas Clive ficou de terminar tudo para mim, para que eu possa ir para o Texas.
? Texas? Para quê? ? Neste momento, Joan notou o homem sorridente que aparecia na porta atrás de sua filha. Muito feminina, ajeitou os cabelos negros.
? Este é Mark Anders, mamãe. Meu novo chefe. Ele tem um compromisso em Edimburgo hoje e se ofereceu para me trazer até aqui.
? Obrigada, sr. Anders. Eu vejo tão pouco esta minha garota. Entre, por favor.
O sorriso dele era puro charme, quando se aproximou da mãe de Tânia.
Ele está sempre pronto para cativar qualquer mulher dos oito aos oitenta anos, Tânia pensou, azeda.
? Eu sou Joan. ? A mãe de Tânia ofereceu a Mark a mão ainda suja de farinha. ? Desculpe minha aparência. Estava preparando o café da manhã.
? Eu convidei Mark para tomar o café conosco. ? Tânia reparou que não gostava de tratá-lo pelo primeiro nome.
Joan sorriu para a filha e depois para Mark e saiu, fechando a porta. Mark deu uma piscada e tirou o casaco. Tânia também tirou o seu e foi procurar o avô.
Colocou seus braços ao redor dos ombros do velho, que já vivia há anos numa cadeira de rodas, e o abraçou.
Tânia e o avô estavam no meio de uma discussão sobre trabalho quando Mark voltou. Ele cheirou o ar, apreciando o aroma que vinha da cozinha.
Tânia ignorou sua presença e continuou as explicações sobre o novo computador, instalado a bordo da plataforma, e que tinha sido usado para a perfuração
do poço. Jock, velho pesquisador de poços, demonstrava grande interesse nas técnicas usadas atualmente. Ele fez a Mark três ou quatro perguntas, achou que o americano
sabia o que dizia e o incluiu na conversa. Antes de terminarem o café, os dois já conversavam como se tivessem se conhecido toda a vida.
Quando acabou de comer, Jock puxou a cadeira de rodas para longe da mesa e notou que Mark parecia terrivelmente cansado, com os ombros meio curvados e um
olhar sonolento.
? Rapaz, há quanto tempo não tira um bom sono?
Mark levantou os olhos, surpreso com a preocupação de Jock.
? Deixei a Califórnia uma semana atrás, logo depois de saber que Tânia já tinha colocado seu poço em funcionamento. Temos acompanhado os trabalhos no mar
do Norte desde que a United Petroleum decidiu usar essa mesma técnica em seu novo projeto no golfo do México. Essa equipe, da qual faço parte, veio conhecer a plataforma,
para se inteirar de perto de como funciona. É muita coisa para entender em pouco tempo, e então tenho estado ocupado demais para dormir o suficiente. Achei que isso
poderia esperar até a volta para o Texas.
Ele teria trabalhado tanto assim desde a sua chegada à plataforma? Tânia não podia se lembrar. Tinha uma vaga idéia da presença constante de Mark a seu lado,
mas prestou pouca atenção nele, até que a salvou com tanta eficiência. Sentiu-se meio encabulada com a lembrança do incidente e foi ajudar sua mãe com as louças,
sem se afastar muito para poder ouvir a conversa.
? A que horas vocês saíram de Aberdeen, ontem? ? perguntou Jock.
? Às sete da noite ? Mark respondeu.
? E dirigiu toda a noite até chegar a Edimburgo, sem dúvida ? deduziu o velho.
Mark riu e olhou para Tânia, cúmplice.
? Estávamos tirando uma soneca esta manhã, quando o tráfego começou a aumentar e Tânia acordou.
(* )Ela ficou complctumcnte sem graça com aquele comentário que a fazia se lembrar do inesperado beijo.
- Bem, lenho que arrumar minha mala, mamãe... - desconversou, para fugir do aposento rapidamente.
Tânia subiu correndo a escada, até o quarto dos fundos, e apanhou a mala. Geralmente levava suas coisas numa sacola mole e alongada, que carregava no ombro e chamava
de "linguiça". Mas desta vez ia precisar de mais algumas coisas. Afinal, os Estados Unidos não ficavam assim tão perto...
De qualquer maneira, não levaria muita coisa, decidiu, voltando para o seu quarto que ficava no andar térreo, junto com os outros dormitórios. Quando entrou e fechou
a porta, ainda ouviu conversa e risos vindo do corredor central. Sua família parecia apreciar bastante Mark Anders. Bem, eles que ficassem com suas opiniões, ela
não acreditava nas amabilidades dele. Sabia que era um tipo perigoso.
Um pouco chocada com essa agressividade fora do comum, Tânia jogou sua maleta sobre a cama e começou a escolher sua roupa. Já estava terminando, quando Joan bateu
na porta e entrou.
- Tudo bem, querida?
- Estou terminando, mãe. - Tânia fechou a mala, puxou com esforço a correia e colocou-a no chão. - Não está muito pesada.
- Tem certeza de que pegou tudo que vai precisar? - Joan sentou-se nos pés da cama. Há muito tempo tinha desistido de controlar os passos da filha.
- Vou ficar morando em Galveston, à beira do golfo do México. Clive me disse que lá é bastante quente, mesmo nesta época do ano. Não se preocupe comigo, mamãe.
*- Bem... eu tento não interferir. . .
Tânia sentou-se na cama a seu lado e abraçou-a:
- Entendo como deve ser duro ter uma única filha como eu, mas sempre desejei que papai tivesse orgulho de mim e você e vovô também.
- Oh, Tânia! Eu não poderia pedir uma filha melhor. Seu avô ficou exultante quando a instalação do novo poço deu certo. Se seu pai estivesse vivo, estaria orgulhoso
como ninguém. Seu irmão também está. Recebemos carta dele ontem. Você e seu poço foram seu único assunto. Ele escreveu páginas e páginas. Você devia ler.
- Vou ler. Gostaria de poder ver Rob, mas não tenho tempo,
17
) mãe. Vamos de trem ainda hoje para Londres, porque temos reservas para o vôo de amanhã de manhã.
Houve uma longa pausa. Finalmente o silêncio foi quebrado.
? Eu gostei do seu Mark Anders! ? disse Joan, de repente.
? Ele não é meu Mark Anders! ? Tânia levantou-se, aborrecida, e foi até a janela. ? Eu mal conheço esse homem! ? Seu protesto era um tanto exagerado.
? Eu notei isso ? comentou Joan, mas parecia que, na realidade, ela tinha percebido muito mais.
? Mamãe, esse homem é tremendamente insuportável. Eu simplesmente o detesto!
? Ele fez avanços impróprios? Não parece ser desse tipo!
Tânia encabulou. Lembrou-se do beijo de Mark e sentiu um arrepio. De modo algum podia classificar aquele beijo como "avanço impróprio".
? Não seja ridícula, mamãe. Avanços impróprios desapareceram quando surgiu o Movimento de Liberação Feminina. E, de qualquer modo, ele nunca se atreveria!
? Então foi grosseiro? ? insistiu Joan. ? Ele parece ser tão cavalheiro...
Tânia riu para a mãe.
? Eu tenho sido chocantemente rude com ele, mas não, ele não revidou, ainda. Só que vai revidar a qualquer hora. Eu não me impressiono demais com sua docilidade.
Joan fez beicinho.
? Que vergonha, minha filha. Bem, me diga uma coisa: você pode fazer umas compras para mim? Eu o convidei para almoçar e preciso de algumas coisas. ? Tirou
uma listinha do bolso. ? Pode ir com o carro.
Tânia fez uma careta e pegou a lista.
? Vou andando. Preciso mesmo de exercício e assim aproveito para fazer umas visitas.
Ela mantinha sempre o contato com aqueles vizinhos que conhecia tão bem. Mandava cartões e bilhetes contando sua última aventura, e não deixava de fazer
suas visitas quando estava em casa.
Não tinha pensado a ir até a vila naquele momento, mas o passeio não a desagradava, principalmente porque era uma maneira de ficar longe de Mark, que tanto
a perturbava. Você é uma covarde, Tânia, acusou a si mesma.
Foi a todas as lojas do vilarejo, conversou e riu com os amigos, gente que conheceu toda a vida. Fez as compras e umas três horas mais tarde estava voltando
para o chalé.
A casa lhe pareceu muito quieta. A porta do estúdio do avô estava fechada. Ela supôs que Mark estivesse lá, conversando. O brilhante Jaguar negro ainda se
encontrava estacionado onde o tinham deixado.
Joan não apareceu na cozinha. O fogo queimava na lareira e uma chaleira assobiava. Tânia sorriu e colocou as compras na mesa. Sua mãe era uma romântica incurável.
Ela amava ouvir o som da chaleira chiando no fogo, enquanto lia ou cozinhava. Rob sempre sugeria caçar um grilo e colocá-lo numa gaiola para que ela pudesse ouvi-lo
o tempo todo. Aliás, era típico de Rob encontrar soluções mágicas e muito simples para resolver os piores problemas da vida. Já Tânia era a prática e a obstinada
da família Cameron. O que é uma boa coisa, ela disse a si mesma.
Abriu a porta da cozinha e olhou para fora. Faltava a bicicleta de sua mãe. Provavelmente ela tinha ido até a casa dos MacCall, que forneciam leite, manteiga
e ovos.
Foi até seu quarto dar uma última revisão nas gavetas e nos armários, para ver se estava levando tudo que precisava. Quando entrou, viu Mark deitado em sua
cama de lado para a porta, dormindo pacificamente em seu travesseiro. Seu corpo era terrivelmente másculo e sensual, deitado naquela posição. Tânia parou perto dele,
com o coração disparado.
Que diabos ele fazia em sua cama? E, por que estava dormindo ao invés de cumprir seu suposto compromisso em Edimburgo? Acreditou que a resposta a essa pergunta
estava num grande envelope pardo, colocado displicentemente junto às roupas dele.
De repente, ele se virou na cama, entreabriu os olhos e deu um sorriso satisfeito. Tânia ficou com medo que acordasse e correu para fora do quarto. Nunca
tivera sensações tão incontroláveis como essas, o que arrasava o seu habitual bom senso. Perto de Mark, sentia-se em perigo constante. Mas por quê? Ela não tinha
a menor vontade de pensar nisso.
Na manhã seguinte, Tânia acordou a salvo, no compartimento de primeira classe do trem, no qual havia dormido desde Edimburgo. O trem tinha chegado de manhãzinha
à estação de King's Cross, mas os passageiros tinham o direito de permanecer nele, se quisessem dormir mais um pouco.
Tânia espreguiçou-se e procurou seu relógio de pulso. Sete e meia. Espichou para fora da cama suas lindas pernas e foi fazer a toalete da manhã no banheiro
que ficava ao lado. O café chegou pontualmente às oito horas, trazido por um atencioso camareiro.
Tinha acabado de comer, quando bateram na porta. Devia ser Mark. Sentiu uma irritação sem sentido. Abriu a porta mal-humorada e deparou com uma pessoa completamente
diferente. A velha calça jeans e os cabelos revoltos haviam desaparecido. Mark tinha se transformado num elegante e urbano homem de negócios. Usava um terno escuro,
de lã fina, camisa clara, de algodão, uma gravata de extremo bom gosto, abotoaduras de ouro e um sobretudo chiquíssimo, jogado no ombro. Seus cabelos tinham sido
domados por um eficiente pente e agora lhe davam um ar de moço fino. Ele sorriu.
? Bom dia! Surpreendi você, Tânia?
? Sim... bem... ? Ela piscou os olhos azuis. ? Eu não sabia que o príncipe da Cinderela ia chegar.
Mark riu.
? Venha, nossa carruagem nos espera, Cinderela ? brincou.
Ele apanhou a mala dela, deixando que Tânia saísse na frente. Ela ficou pensando de onde ele teria trazido aquela roupa. Mark não tinha levado mala nenhuma
para Edimburgo, havia embarcado no trem com as mãos vazias.
Logo ela teria sua resposta. Um homem com uniforme de motorista veio ao encontro deles na estação. Fez um cumprimento e apanhou a mala de Tânia.
? Espero ter trazido a roupa certa, Mark.
? Tudo primeira classe, John. Até assustei a srta. Cameron com minha súbita transformação de operário para homem de negócios. ? Ele apresentou o homem como
John Gann. John era inglês, mas perfeitamente entrosado com Mark, que era americano. ? John faz parte do pessoal permanente da United Petroleum, em Londres ? explicou
Mark, enquanto John o seguia com a bagagem.
? Eu não sabia que a United tinha pessoal permanente aqui ? Tânia comentou.
? Tem sim ? ele respondeu, enquanto seguia num passo rápido a multidão apressada que desembarcava, na direção do estacionamento. ? Temos escritórios, funcionários
e suítes para executivos e visitantes importantes no Green Park Hotel.
Mark parou de repente porque se lembrou de procurar alguma coisa no bolso. Tânia, que estava bem junto dele, tropeçou e sua maleta de mão voou longe, esparramando
tudo pelo chão.
Mark segurou-a, impedindo que caísse. Num instante a lembrança dos braços dele ao redor de seu corpo, na plataforma do mar do Norte, voltou à sua mente.
Zangada, ela afugentou a lembrança, mas percebeu as batidas agitadas do coração de Mark.
Sentindo-se sufocada, procurou se livrar da mão que a prendia. Mark sorriu, com um brilho atrevido nos olhos.
? Sinto muito, Tânia.
? Sente? Ora, você se arremete contra essa multidão como se estivesse participando de uma corrida, e então, pára subitamente na minha frente, sem nenhum
aviso. Depois me aperta como se... ? Tânia se interrompeu, chocada. Ia quase dizendo "como se tivesse esse direito".
Meu Deus, o que havia de errado com ela? Afinal de contas, Mark a salvou de um sério acidente, levou-a até sua casa com toda gentileza e vinha sendo um bom
companheiro o tempo todo. Por que o tratava tão mal? Ainda zangada, começou a juntar suas coisas. Várias pessoas ajudaram a recolher o que estava espalhado.
Ela jogou tudo de qualquer jeito dentro da valise, que, depois disso, não fechava. Tânia fazia força, mas quando olhou para o rosto de Mark e viu que ele
se divertia, perdeu completamente a calma. Aquele homem era o responsável por essa cena e ainda achava graça. Era demais!
Tentou arrumar as coisas de outro jeito e deixou cair a carteira de couro na qual carregava a foto de Kurt. Ele havia dado a foto a ela pouco antes de morrer.
A dedicatória era: "Ame-me para sempre como eu te amo, Kurt".
A carteira foi parar, aberta, aos pés de Mark; ele imediatamente abaixou-se para apanhá-la, e acabou lendo a mensagem, mas não mostrou a menor reação.
Tânia o encarou, tentando descobrir o que Mark achava daquilo. Por um momento seus olhares se cruzaram, e ela sentiu que vibrava inteira. Mas logo ele quebrou
o encantamento:
? Está tudo aí, Tânia? Então vamos. ? Ele começou a andar sem esperar a resposta.
Ela o seguiu sem uma palavra, até o luxuoso Rolls-Royce. John já estava lá e colocou as malas na porta. Ela entrou e Mark sentou-se do lado dela.
? Primeiro, para o hotel da srta. Cameron, depois para o escritório, John ? ele mandou, assim que o carro se moveu.
Tânia olhou, intrigada, para ele.
? Pensei que estávamos indo para o aeroporto, tomar o avião para a América.
? Nós vamos, mas acontece que surgiu um problema que preciso resolver antes de viajar. Você ficará nos aposentos da companhia, por algumas noites.
? Certamente eu não preciso retardar meu embarque só porque você tem que ficar aqui. Sou bastante capaz de entrar e sair de aviões. ? Tânia não queria ficar
em Londres na companhia daquele homem. Nem por pouco tempo, e certamente nunca por "algumas noites" nos aposentos da companhia! Qual seria o jogo dele?
? Sinto decepcionar você. Tenho negócios a tratar aqui e a United decidiu que devemos viajar juntos. Então, você e eu estamos presos um ao outro, não adianta
se zangar.
Mas ela protestou:
? Fui contratada pela sua companhia como uma geofísica. Correto? ? Ele concordou. ? Então meus deveres certamente devem estar ligados à técnica de localização
e perfuração de novas fontes de petróleo. Ainda estou correta?
? Ainda. ? Os olhos dele brilhavam, divertidos è sensuais, como se achassem graça daquela explosão.
Tânia reprimiu o desejo provocado por aquele olhar. Imaginou se ele não se dava conta do efeito que provocava nela, quando a fitava assim. De certo que ele
sabia que agradava as mulheres! Mas ela não ia se render tão facilmente. Continuou a falar, afetando uma calma que não sentia:
? Além disso, posso garantir que Londres não possui a subestrutura geológica, que compense uma pesquisa geofísica para se extrair petróleo de baixo de suas
ruas. Não vamos encontrar nada aqui, tenho certeza. Então, que tal parar com essa tolice antes que comece? Se você precisa ficar aqui, ótimo. Fique. Eu vou para
o Texas e para o meu trabalho. Posso me virar sozinha.
Com todo esse discurso, ela sentiu que o sangue subia ao seu rosto.
? Acalme-se, Tânia ? ele falava macio, numa voz quase musical. ? A United está pagando tudo e dando as ordens. Assinou um contrato com eles, então seu tempo
de trabalho pertence a eles. Tenho receio que interpretarão mal se você insistir em não acatar suas ordens.
Tânia percebeu que não tinha saída, mas mesmo assim continuava disposta a reagir. Quem Mark pensava que era, para lhe dizer o que podia ou não fazer?
? A companhia pode pegar suas ordens e engolir ? ela protestou, mais furiosa do que nunca.
Sabia muito bem que tinha reagido como uma idiota, mas não se sentia arrependida.
Mark não falou nada até a entrada do luxuoso Green Park Hotel. Tânia mantinha seu olhar fixo na paisagem, que se descortinava através das janelas do carro.
Nem uma só vez olhou para o homem a seu lado. Tivesse feito isso e ficaria surpresa com a expressão quase terna estampada no rosto dele.
O carro atravessou o Piccadilly, entrou num estacionamento e parou. Então Mark saiu rapidamente e abriu a porta do lado dela.
? Podemos ir, Tânia?
? Parece que não tenho escolha, não? ? respondeu bruscamente. Mark, gentilmente, segurou-a pelo braço para ajudá-la a descer.
Irritada com os gestos galantes dele, ela se esquivou para se livrar e escorregou no meio-fio.
Mark agarrou-a antes que caísse, pela segunda vez em menos de uma hora. Mantendo-a presa em seus braços, ele a olhava com um jeito meio endiabrado.
? Isto pode se tornar um hábito bem agradável ? comentou, rindo.
? Solte-me, sim?
? Controle seus modos, Tânia. Diga "por favor".
Os olhos dela fuzilavam no rosto pequeno. Tânia lutava para se livrar daqueles braços, bastante consciente da facilidade com que ele a segurava.
? Por favor, me deixe ir. ? pediu afinal, ainda lutando para se livrar dele.
Sorrindo, Mark soltou-a.
? Você não é um cavalheiro ? ela disse, quando se dirigiam para a porta de entrada.
? Não sou mesmo? ? Mark chegou à porta na frente e a abriu para Tânia. ? Bem, ainda posso corrigir isso. Por aqui, por favor.
Sem querer discutir com ele no elegante salão de recepção do hotel de luxo, Tânia deixou que a guiasse até o elevador.
Lá, John entregou a mala a um carregador do hotel e avisou:
? Agora, preciso voltar ao carro, Mark.
? Pode ir. Desço assim que acomodar a srta. Cameron em seus aposentos.
Então o todo-poderoso Anders desejava vê-la acomodada, não é? Tânia ficou ainda mais furiosa.
Mark começou a conversar sobre futebol com o carregador. O bate-papo continuou até a porta da suíte da companhia. Tânia admitiu que Mark era uma pessoa gentil.
Com a mesma facilidade com que conversou sobre os dias gloriosos das primeiras explorações de petróleo com seu avô e sobre os poetas escoceses com sua mãe, ele agora
discutia as intrincadas jogadas do futebol como um aparente conhecedor do esporte.
Vai ser interessante descobrir de que maneira ele tentará fazer charme para mim, Tânia pensou. Mas ele que não se iludisse: uma mulher prevenida vale por
duas!
Tânia cruzou a sala toda acarpetada para olhar o Green Park da janela. Era encantador, como aquelas árvores maravilhosamente verdes que faziam um lindo contraste
contra o céu cinzento da manhã. Com seu bom humor restaurado, ela voltou lentamente para perto de Mark.
? Acha que pode agüentar isso por algumas noites, Tânia? ? Mark perguntou, um pouco irônico.
Ela olhou à sua volta como se não acreditasse naquela pergunta. A sala era lindíssima! Tinha uma decoração sóbria, mas elegante, numa combinação de tons
dourados, creme e marrom-claro, harmonizando peças antigas com modernos e confortáveis sofás forrados de cetim. Flores em encantadores arranjos estavam distribuídas
por todos os cantos, dando um suave aroma ao ambiente. Do lado de cada sofá havia uma luminária antiqüíssima. O teto da sala tinha um grande desenho em dourado.
? Você deve estar brincando! ? Tânia exclamou afinal. ? A United Petroleum recebe muito bem seus visitantes. Isto é um encanto. ? A covinha dela apareceu
em seu rosto, e sumiu. ? O que pode acontecer quando descobrirem que uma rude pesquisadora de petróleo ocupou este chão santificado?
? Trate apenas de não sujar os lençóis de petróleo e nós estaremos salvos. ? Ele abriu um sorriso de dentes brancos e lindos. ? Aqui estão os quartos e o
banheiro ? Mark apontou para a porta entreaberta. ? Sinta-se em casa. O dever me chama, mas estarei de volta cm algumas horas para levá-la para almoçar.
Dirigiu-se para a saída depois parou, com a mão na maçaneta. Virou-se e olhou para ela por um momento. Então saiu, fechando a porta atrás.
Recusando-se a lutar com o pensamento de que ele representava uma ameaça ao seu ordeiro e satisfatório modo de vida, Tânia foi explorar seus luxuosos aposentos.
Parou com prazer na entrada do banheiro.
Abaixo do nível do chão, azulejada e dourada, a banheira mais parecia uma piscina. Toalhas macias e bonitas pendiam de trilhos. O chuveiro era um sonho depois
de tanto tempo tomando banho naquele banheiro precário a bordo da plataforma.
Tânia abriu a banheira, borrifou um óleo perfumado na água, tirado de uma coleção de delicados potinhos que estavam ao lado da banheira. O som da água correndo
das torneiras parecia a ela uma bênção dos céus.
Descansando dentro d'água, ela imaginava se seria o próprio hotel quem oferecia aquelas mordomias todas para seus hóspedes mais distintos. Ou tudo aquilo
seria obra da United?
Esse pensamento fez com que desse uma risadinha nervosa. Não tinha importância. Era um puro êxtase relaxar naquela banheira, com aquele calor sedutor da
água perfumada.
Algum tempo depois, ouviu baterem com insistência na porta da suíte. Contrariada, saiu da banheira enrolada numa enorme toalha, como um sarongue. Foi até
a entrada, passando os dedos pelos cabelos molhados.
? Quem é? ? perguntou.
? John, srta. Cameron. Tenho uma coisa para lhe entregar. ? Meio a contragosto, ela abriu a porta. ? Desculpe tirá-la do banho, srta. Cameron ? disse John,
educado. ? Mark mandou lhe entregar isto. Obrigado, até logo. ? E foi embora.
Capítulo III
O telefone tocou estridente, no silêncio do quarto. Tânia levou um susto. Depois, atirou o caríssimo casaco de vison no sofá mais próximo e atendeu. Claro,
só podia ser Mark.
? AIô? Achei melhor avisá-la que John vai entregar um casaco para você.
? Um casaco? Por que ele me entregaria um casaco? Não comprei nenhum.
? Coisas da companhia. Eu explico quando for apanhá-la. Não tenho condições de sair daqui antes de meia hora. Pode esperar? Não quero matar de fome a mais
nova contratada da United.
? Você disse "coisas da companhia"? Eu não sou idiota, Mark Anders. Qual é a empresa que entrega suntuosos casacos de vison às novas empregadas ou as coloca
em suítes deste tipo?
? Ah... então John já esteve aí. Já expliquei que são coisas da empresa. Darei os detalhes quando chegar. Esteja pronta. Até logo. ? E cortou rápido a ligação.
Tânia olhava para o aparelho pensando em Mark com raiva.
? Esse mandão petulante! Quem diabos ele pensa que é? ? ela protestou em voz alta.
Bateu o fone no gancho e, ajeitando o sarongue improvisado, foi se aprontar, resolvida a ir até o fim com o joguinho sujo de Mark Anders.
O que será que ele estava pretendendo? E ela, por que resistia tanto às aproximações dele? Tânia não conseguiu encontrar uma resposta satisfatória para nenhuma
das duas perguntas e resolveu se vestir. Queria estar muito bem preparada, física e emocionalmente, para quando Mark chegasse.
Pisando descalça no carpete fofo, foi para o quarto. Só então viu o lindo pacotinho sobre a mesa. Pequeno e elegante, tinha um cartão com seu nome e a assinatura
de Mark Anders.
Passou o dedo pelo papel fino e chique, imaginando que a coisa mais sábia a fazer era deixá-lo fechado como estava. Mas não resistiu e abriu.
A curiosidade ainda me pega! pensou.
O papel caro embalava um perfume francês, num luxuoso vidro de cristal. A parte superior da tampa tinha uma pequena pomba em pleno vôo. Incapaz de resistir,
Tânia experimentou o perfume no pulso. A fragrância era maravilhosa. Sentou-se em frente à penteadeira e ficou admirando o vidro. Quando levantou os olhos, deu com
sua imagem refletida no espelho com uma expressão marota.
Mark Anders! Como alguém podia lidar com um homem como aquele? Tinha ficado o dia anterior em Dawn Cottage, dormindo em sua cama a manhã inteira e resolvendo
negócios à tarde. Depois passou a noite no trem. Onde ele conseguiu tempo para fazer compras e ainda mandar entregá-las? E, por que ele se incomodava em fazer isso?
Bem, era melhor parar de pensar e se vestir, antes que ele chegasse.
Ela tinha desfeito a mala e dependurado algumas roupas. Depois virou sua valise de mão na cama e arrumou tudo direito. Devagar, pegou a carteira de couro
e ficou olhando a foto de Kurt com tristeza, mas agradeceu o sentimento de amor e carinho que ele transmitia, mesmo depois de tanto tempo.
? Oh, Kurt! Sinto tanta falta de você... ? ela sussurrou as palavras. Sentiu um aperto na garganta e as lágrimas chegarem aos olhos. Então fechou a carteira
rapidamente. Amando Kurt Grady, como o tinha amado, sentindo falta dele como sentia às vezes, conseguia passar tempos sem chorar. Por que hoje estava tão deprimida?
Não soube responder.
Com um ar de desafio, pegou o vidro e espalhou uma névoa perfumada ao redor de si. Depois vestiu uma saia justa de tweed marrom, um cashmere de gola rolê
bege e um colete de camurça. Calçou suas eternas botas de couro, amarrou uma echarpe de seda da cor da saia no pescoço e, depois de um ligeiro exame, achou que estava
ótima para o almoço. Esperando ir diretamente para o aeroporto e depois seguir para o Texas, Tânia tinha levado apenas o essencial, algumas saias, jeans e suéteres.
Trouxe também algumas blusas bonitas e uma caríssima calça de camurça, mas não achou que fosse o momento de usá-la.
Havia decidido deliberadamente viajar com pouca bagagem, pensando em gastar parte de seu fabuloso salário em roupas, quando estivesse nos Estados Unidos.
Geralmente vestia-se bem, mas não tinha tempo nem temperamento para grandes produções. Pés no chão, ela era uma pessoa voltada basicamente para seu trabalho. Respeitava
cada homem pelo grau de sua dedicação à equipe e recebia o mesmo tipo de respeito por parte deles.
Nunca tinha lhe ocorrido que ela pudesse ser mais do que simplesmente agradável aos olhos. Não se preocupava, em geral, com a aparência, preferindo sentir-se
bem numa roupa do que usar algo desconfortável mas bonito. Não tinha a mínima consciência de sua doce e extraordinária beleza.
Talvez fosse assim por ter passado a maior parte de sua vida na companhia de adultos, com pouca influência feminina. Como os Cameron estavam constantemente
em poços de petróleo afastados da civilização, mesmo sua mãe tinha sido quase uma figura masculina para Tânia, que se acostumou cedo à vida dura. A maioria dos lugares
onde seu pai e seu avô trabalhavam não possuía qualquer tipo de comodidade. E Tânia se habituou com isso.
Até a educação dela havia sido diferente das crianças de sua idade. Como viviam se mudando, raramente freqüentou escolas. Sua professora foi Joan. Aliás,
era essa sua profissão, que abandonou para seguir o marido ao redor do mundo.
Antes de Tânia entrar para a Universidade, Kurt Grady apareceu na sua vida. Simpático, inteligente, Kurt a cortejou e finalmente a conquistou. Era um homem
maduro e experiente, carinhoso ao extremo. Ele também se assustou ao descobrir-se apaixonado pela filha do seu chefe, mas os dois levaram adiante o namoro, e depois
o noivado, com a aprovação de toda a família.
Tânia desabrochou com ele, sentiu que crescia. Mas nunca acreditou que Kurt sentisse atração pela sua beleza, não importava quantas vezes ele repetisse isso.
Ela quase não usava maquilagem. Somente um leve batom e um pouco de sombra em ocasiões especiais. Suas sobrancelhas eram negras e bem-feitas. Tinha cílios
razoavelmente longos e curvos, que não precisavam ser realçados. Usava seu cabelo curto porque achava mais prático. Era magra e vestia jeans constantemente. Não
tinha idéia de como parecia bonita mesmo em roupas simples, mais adequadas ao seu trabalho.
Aos vinte e sete anos, incapaz de esquecer Kurt, ela nada fazia para atrair a atenção masculina. Gostava de festas, cinemas, jogos e dança. Era boa violinista,
mas quase só tocava para seu próprio entretenimento, na quietude de seu quarto.
Tinha aprendido a se defender de qualquer abuso masculino, e, em geral, conseguia evitar uma aproximação indesejada antes que começasse, sempre com controle
total da situação. Agora, mais uma vez, Tânia se via em guarda, preparada para lutar contra o assédio de um homem.
Ela estava pronta, com seu velho casaco de pele de carneiro dependurado no encosto da cadeira, quando Mark bateu.
Abrindo a porta, olhou com toda a calma possível para ele. Mark tinha mais de um metro e oitenta de altura, o que a forçava a levantar a cabeça para poder
encontrar seus olhos. Ele a encarava com aquele brilho sedutor no olhar. Percebeu, quando aspirou o ar, o perfume que tinha lhe dado. Pareceu satisfeito por ela
tê-lo usado, o que deixou Tânia mais irritada ainda.
Será que ele dá esse perfume para todas as mulheres com quem sai?, ela se perguntou, indignada.
Sorrindo, Mark perguntou:
? Pronta para almoçar, Tânia?
? Sim, obrigada. ? Deliberadamente pegou seu velho casaco, mas Mark apanhou o vison em cima da cama.
? É para você usar enquanto estiver em Londres. Faz parte da política da companhia que seus empregados tenham boa aparência. ? Tânia tentou recusar, mas
Mark não lhe deu tempo de dizer uma única palavra, acrescentando: ? Posso assegurar que o casaco não é seu, Tânia. Quando sairmos de Londres, você o deixará. Não
fique com essa cara de quem não compreende nada. É muito simples: como você esperava ir direto para o seu trabalho nos Estados Unidos, é evidente que não podia ter
trazido o tipo de roupa adequada para representar a companhia aqui. Então, eles estão cuidando disso, sem custo algum para você, nem obrigações. Isso significa...
sem nenhum compromisso.
Quando ela concordou e se vestiu, ele deu um passo para trás para admirar aquela figura esguia e elegante, envolta no caríssimo casaco. Então seus olhos
brilharam de satisfação.
? A United espera que você os represente esta noite. Será uma recepção íntima para alguns sheiks do petróleo, homens de grande influência. É por isso que
deve usar o casaco. É por esse motivo também que vou levá-la para fazer compras depois do almoço.
? Compras? ? Tânia achou que ele estava indo longe demais. ? Você é um louco completo se pensa que acredito que sua companhia vai comprar roupas para mim.
? Deixe de encrencas, Tânia. São apenas ordens que tenho de cumprir. Agora vamos comer. ? Ele apanhou a bolsa dela que estava junto com o casaco velho e,
segurando Tânia pelo braço, conduziu-a para fora, fechando a porta.
Quando chegaram embaixo, na porta de entrada, Mark disse gentilmente, com seu imperturbável bom humor:
? Vamos andando? Fica perto, em Knightsbridge. Poderemos ir pelo parque.
? Sim, andar um pouco vai me fazer bem.
Mais tarde, sentada com Mark em um agradável restaurante perto de Sloane Street, tomando cafezinho depois de um excelente almoço, Tânia se perguntava como
é que ele conseguia coisas extraordinárias dela e por que a perturbava tanto. Nas últimas horas, havia conversando com ele como uma adolescente. Achou fácil responder
a tantas perguntas sobre sua vida, sua família, seu trabalho. Como ele conseguia quebrar sua reserva? De algum modo Mark a tinha feito confiar nele. Tânia procurava,
naquele rosto másculo, algum sinal de perigo, mas nada encontrava.
Sabia que nenhuma mulher, em seu juízo perfeito, poderia recusar as atenções de Mark. Mas, por que ele a incomodava tanto?
? Podemos agora voltar aos assuntos da United Petroleum, por favor? Já lhe disse que fui contratada como uma trabalhadora... ? Ela sempre se sentia mais
segura falando de trabalho.
? Uma geofísica, claro. Já sei o que você vai dizer: que não entende por que a United quer que uma geofísica ande bem vestida e vá à recepções. Vou lhe explicar:
a recepção desta noite é extremamente importante para a companhia. Os árabes estão aqui, porque fizemos uma descoberta que pode ser muito importante para o Oriente
Médio. Se a United convencê-los a firmar um contrato, isso significará milhões de dólares para nós. É meu pensamento e da companhia que existe uma tremenda diferença
entre o total das reservas conhecidas de petróleo no mundo todo e o seu real potencial. Talvez relacionando a história geológica de cada região com os dados que
temos de ocorrências reais de petróleo, seja possível descobrir vastos campos desconhecidos.
? Qual a técnica que você acha que será mais eficiente? ? Tânia perguntou curiosa, pois sabia que a descoberta de novas áreas para poços produtivos, além
de muita sofisticação técnica, ainda requeria muita sorte.
? Tenho uma teoria nova, mas a companhia acha que vale a pena correr o risco de investir nela. Usando como base a completa análise geológica de todas as
áreas que produzem petróleo no mundo, nossos técnicos fizeram uma projeção, por computador, descobrindo que há uma grande chance de existirem, em algumas regiões,
lençóis em camadas mais profundas e mais extensas do que as que já estão sendo exploradas. As duas regiões que provavelmente têm o maior potencial inexplorado são
o golfo Pérsico e o golfo do México. Se os produtores árabes acreditarem nisso, assinam um contrato com a United. Entendeu, Tânia, o que acha?
? Bem, se houver novos lençóis de petróleo abaixo dos já conhecidos, isso significa que as reservas de petróleo da terra podem durar mais mil anos do que
supomos hoje, no mínimo.
? Claro. Pontos marcados, dra. Cameron. A United precisa exatamente de uma pessoa que acredite nesses planos e tenha a habilidade de convencer os árabes
de que a mina de ouro deles esconde outras minas embaixo.
? E, por que tenho de ser eu, particularmente? Posso entender o que a companhia tem em mente, mas daí a...
? Pensamos que você tem mais chance de garantir a atenção dos árabes. Essa combinação de inteligência, beleza e experiência técnica será imbatível. Os sheiks
são uns tipos sofisticados e muito fechados. Estamos contando com sua habilidade para atrair o interesse e a curiosidade deles. Eu estarei lá para convencê-los de
que a United está habilitada a fazer a exploração.
Tânia fez uma careta.
? Estou sendo usada como uma espécie de isca?
? De maneira nenhuma! ? Ele parecia horrorizado. ? É apenas uma questão de mostrar a eles o potencial e convencê-los de que a United Petroleum está qualificada
para fazer o trabalho. Isso é muito importante para a companhia. Pode nos dar essa ajuda? ? A sinceridade dele era evidente.
? Bem, como minhas horas de trabalho pertencem à empresa... ? Ela deu um suspiro.
? Obrigado, Tânia.
Ele levantou e segurou o casaco para ela vestir.
Tânia gostou daquele contato das mãos dele, mesmo sobre a pele do casaco, e seu coração disparou.
Ela observou a jovem loira do caixa se deixar envolver imediatamente pelo charme de Mark, enquanto ele pagava a conta, sorrindo. Pensou, meio irritada, que
provavelmente as mulheres caíam por ele como moscas mortas. Ela mesma já tinha sido vítima desse fascínio. Quando, em sua vida, conversou com alguém com tanta intimidade
como havia feito durante o almoço, agora mesmo?
Mark veio em sua direção, olhando direto nos seus olhos, enquanto recolocava a carteira no bolso depois de pagar a conta. Subitamente, o olhar dele mudou.
De terno e meigo, tornou-se implacável, decidido. Tânia julgou ver uma fria determinação nele. Era o olhar de um macho acostumado a dobrar facilmente as fêmeas,
para conseguir seus objetivos; um olhar de quem não admitia receber uma negativa!
Ela sentiu-se tocada pela força da masculinidade que emanava de Mark e um tremor de desejo percorreu-lhe o corpo. De repente, estava consciente demais da
presença dele e da proximidade, querendo experimentar pelo menos mais uma vez o sabor daqueles lábios.
Para fugir a esse pensamento aterrador, Tânia abaixou rapidamente a cabeça. Sentia-se incapaz de sustentar o desafio daquele olhar masculino e sedutor!
? Agora vamos andando, Tânia, vamos fazer compras ? Mark disse. E ela não conseguiu descobrir, pela expressão dele, se estava tão abalado quanto ela.
Capítulo IV
No táxi, sentou-se no canto do banco, para ter o mínimo contato físico com Mark. Seu coração batia num ritmo fora do comum. De algum modo, Tânia instintivamente
percebia que ele despertava nela uma coisa tão antiga como a humanidade; uma clara atração entre um homem e uma mulher.
E isso a assustava. Muito acostumada a lidar com homens fortes e decididos, não entendia por que se sentia tão perturbada e vulnerável com Mark. Não se lembrava
de ter experimentado essa sensação com nenhum outro homem, nem mesmo com Kurt.
Consolou-se pensando que nem tudo estava perdido, já que continuava sentindo uma tremenda antipatia por Mark. Mas seria realmente antipatia ou medo de se
envolver emocionalmente com ele?
Procurou se controlar quando ele a ajudou a sair do táxi diante do elegante ateliê de um dos mais famosos e exclusivos costureiros de Londres.
O porteiro abriu a suntuosa porta para eles entrarem. Tânia não conhecia nada do mundo da alta costura, mas percebia que ali qualquer movimento era preparado
e estudado como a coreografia de um bale. Nada era apressado, nessa atmosfera altamente sofisticada.
Mark comandava e decidia com precisão. Atento, ele apreciou a maravilhosa seleção de vestidos que desfilava diante deles, nas lindíssimas manequins, e rapidamente
escolheu três, com um olhar de profundo conhecedor.
Tânia estava fascinada. Logo depois, entrou numa sala de provas, calçou finíssimos sapatos de saltos muito altos e experimentou os vestidos, que uma costureira
ia ajeitando em seu corpo com alfinetes, liberando-a depois, para que pudesse se ver no enorme espelho. Ela se encantava com os modelos, o corte, o tecido, o caimento
das roupas. Cada vestido que experimentava mostrava a Mark, que examinava com atenção. Tânia ficou linda com todos os modelos. Talvez, pela primeira vez na vida,
ela se olhasse num espelho se achando realmente adorável!
Desacostumada a provocar impacto nos homens, agora Tânia desejava muito que Mark ficasse impressionado com sua aparência. Conseguiu isso quando colocou um
vestido dourado, com um decote profundo nas costas, todo bordado com paetês. A cada movimento seu, o vestido inteiro reluzia. O tecido macio caía como uma luva em
seu corpo, modelando-o.
Tânia tinha levantado a cabeça num ângulo orgulhoso e desafiador, ao entrar na sala onde Mark esperava. Agora, via a admiração evidente nos olhos dele e
se deliciava com isso. Estava certa, pelo menos nesse momento, de que Mark a desejava tanto quanto ela o havia desejado desde o beijo no carro.
? Gostei desse, Tânia, e você, o que acha? ? ele perguntou, sem desgrudar os olhos dela.
? Também acho que é o mais bonito.
Depois de decidirem pelo vestido dourado, Mark teve que usar seu formidável poder de persuasão para que a chefe da costura concordasse em fazer as adaptações
necessárias e entregar a roupa no hotel a tempo para a recepção. Mesmo sabendo que o vestido precisava de alguns reparos, ele se recusava a admitir que uma casa,
tão fina quanto aquela, não tinha condições de providenciar o que fosse necessário até a noite.
Voltando do provador com suas roupas habituais, Tânia ouviu a chefe da costura garantir que a roupa estaria pronta e entregue na hora desejada.
Mark sempre consegue o que quer, ela pensou, impressionada!
Ele reparou na expressão dela, enquanto pensava isso, e sorriu, meio constrangido.
? Você, às vezes, não aprova meus métodos, não é Tânia?
Ela encabulou.
? Eu não aprovo nem desaprovo você, Mark Anders. Não o conheço o suficiente e também não tenho o direito de me meter em sua vida privada.
? Não tem? ? Ele fez uma cara de admiração e ajudou-a a subir no táxi que esperava. ? Você continua a me espantar.
Sem tempo quase para respirar, Tânia viu-se em seguida num salão de beleza finíssimo. Ela foi tratada, penteada e maquilada como se fosse uma verdadeira
princesa. Saiu de lá com as unhas mais bem-feitas de sua vida e de cara nova. Depois de novo corte de cabelo, eles lhe fizeram uma maquilagem discreta, já que ela
não se sentiria bem muito pintada, mas perfeita para realçar seus olhos azuis, a boca bem desenhada e as covinhas. Tânia aprovou inteiramente a imagem que viu refletida
no espelho. Certamente ia fazer sucesso de noite. Ela nunca tinha imaginado que pudesse ficar tão sofisticada e atraente.
? A companhia talvez tenha cometido um grande engano ? disse a Mark quando já se dirigiam para Bowater House, a impressionante sede da United Petroleum,
depois de sair do cabeleireiro. ? Como podem esperar que eu volte ao trabalho duro, depois deste tipo de tratamento? Agora que provei todo este luxo, talvez decida
continuar assim, como uma boneca.
? A companhia sabe exatamente o que está fazendo, Tânia. ? Mark olhou-a demoradamente, fazendo o coração dela bater feito louco. ? Esses caras do deserto
certamente nunca viram nada como você. E quando descobrirem a massa cinzenta que tem armazenada nessa linda cabecinha, então queridinha, vão cair de quatro. Virão
comer em suas mãozinhas encardidas de petróleo e vão adorar!
Tânia riu, sem saber o que responder. Achava tudo em Mark adorável. Principalmente aquele sotaque enrolado do Texas que ele usava às vezes.
? Falando sério, você vai nocautear esses sheiks todos, Tânia Cameron.
? Sua bondosa opinião é apreciada, senhor ? ela respondeu, rindo feliz.
Sabia muito bem que estava sendo manipulada. Porém, seria somente desta vez, ela decidiu com firmeza. Nunca mais ia deixar que Mark Anders se achasse no
direito de usá-la.
? O que, exatamente, vamos tentar conseguir na recepção de hoje, Mark? ? Ela mudou de assunto.
? Esses homens que vamos recepcionar hoje são simplesmente os que dão a última palavra sobre qualquer projeto de exploração de petróleo no golfo Pérsico.
A Organização dos Países Produtores de Petróleo exerce cada vez mais um controle estrito sobre as atividades das companhias ocidentais em áreas de sua propriedade.
Seu papel será convencê-los de que, se a United estiver certa, isso representará um lucro astronômico para eles.
? Creio que a companhia está jogando muito alto em mim, Mark. Não gosto disso. E se eu não conseguir?
? A companhia não pensa assim, e se me permite dizer, ela jamais erra no jogo. Por isso, esqueça suas dúvidas, Tânia. Se a companhia está convencida de que
você é capaz de assegurar o sucesso do empreendimento, então fique tranqüila, relaxe: você é capaz. Apenas divirta-se. ? Aquele brilho maroto no olhar dele disparou
novamente o coração de Tânia e lhe tirou o fôlego. ? O jogo vale o preço ? ele acrescentou suavemente ?, posso lhe garantir.
? Bem, desde que saibam o que estão fazendo.
? A United possui bases financeiras para suportar tais experiências. Podemos ter muito lucro se os contratos forem redigidos corretamente. E serão.
Tânia aceitou o desafio com confiança, decidindo que ia tentar fazer o melhor por causa de Mark. Contudo, ainda estava em dúvida se uma mulher era uma boa
escolha para apresentar a idéia a um grupo de sheiks árabes, tradicionais defensores do conceito da superioridade masculina.
Depois de resolver algumas coisas no escritório, finalmente Mark levou-a de volta ao hotel para descansar um pouco. A recepção seria realizada nos reservados
salões de Claridge Hotel.
Que dia estranho e diferente tinha sido esse, Tânia pensava, enquanto abria a porta da suíte. Ainda estava encostada nela quando viu a grande pilha de caixas
na mesa do café. Grandes e pequenas, de vários formatos, as caixas cobriam completamente a superfície da mesa. Negras e brilhantes, tinham o nome, em letras douradas,
do ateliê da alta costura.
Tânia olhou para tudo aquilo intrigada.
Certamente houve um engano, pensou, começando a abrir as caixas. Meia hora mais tarde, ainda estava sentada no meio de todas aquelas coisas, sem acreditar.
Não tinha havido engano algum. Era tudo pata ela mesmo: roupas de baixo, leves como um sopro, no seu tamanho; os três vestidos que provou; os dois lindos sapatos
Gucci, mais a sandália e as bolsas que experimentou no ateliê. Um verdadeiro sonho!
Não, não havia engano. Estava certa disso, como estava de seu próprio nome. Mas quem Mark Anders pensava que era? E ainda mais importante, quem ele pensava
que ela era? Alguma ridícula adolescente que ia ficar impressionada pelos gastos extravagantes de seu empregador? Ou talvez uma mulher fácil a ser comprada ou convencida
com presentes como esses?
Rapidamente recolocou as coisas dentro das caixas e empilhou-as perto da porta. Pensou se devia ou não se recusar a usar o vestido que escolheu para a recepção
e finalmente decidiu que precisava cumprir o compromisso assumido, a despeito de tudo. A United nada tinha a ver com Mark Anders. Ela precisava se apresentar adequadamente
vestida. Sim, vestiria aquela coisa linda e o devolveria no dia seguinte; juntamente com o casaco de vison e qualquer outro acessório que usasse.
Tânia estava pronta. Sentia-se linda como nunca, num vestido luxuoso como aquele. Mas faiscava de raiva quando abriu a porta do quarto para Mark e foi logo
avisando:
? Mande remover isto daqui agora mesmo, ou eu não acompanho você esta noite.
Surpreso, ele brincou:
? Nem um passo?
? Nem um passo.
Ele olhou com admiração o corpo bem-feito de Tânia, sedutor naquele vestido que parecia coberto de estrelas. Demorou o olhar, de propósito, na boca dela,
lindamente pintada mas contraída de ódio.
? Se me deixar entrar, vou chamar John para pegar as caixas ? ele disse, ainda na porta.
Tânia deixou Mark passar e ele foi até o telefone, pedindo à recepção que mandassem John até lá. Depois esperou em silêncio até que o empregado chegasse
e levasse tudo.
Ela foi até o quarto buscar a bolsa, um pouco frustrada por ver todas aquelas coisas lindas irem embora. E também um pouco decepcionada por Mark não ter
sequer tentado persuadi-la a ficar com todos os presentes.
? Por que me mandou tudo isso? Devia saber que eu não ia ficar com eles! ? Tânia o agrediu.
? Hoje eu a vi nelas, lembra-se? Achei que tinham sido feitas para você. Não pude pensar em ninguém mais usando. Somente você.
Tânia quase parou de respirar. Seus olhos procuraram aquele rosto impassível que olhava dentro dos dela. O estranho é que ele parecia tranqüilo e sincero.
? Sinto muito se a ofendi. Todos cometemos enganos, mesmo eu, infelizmente. Vamos indo? ? Ele pegou o casaco dela e Tânia achou que fosse colocá-lo em suas
costas. ? Agora não, Tânia. ? Ele passou à frente e abriu a porta. ? É um absurdo cobri-la com isto, antes que seja preciso.
? Você também está extremamente atraente ? ela disse, irônica, para atacá-lo. Mas achava isso mesmo. O smoking de Mark era muito elegante e ele estava mais
bonito que nunca. Ela continuou, sem piedade: ? Ficaria espetacular com rendinhas no pescoço e nos pulsos. Pena que a moda tenha mudado!
Ele deu uma risada jovial.
? Não preciso de rendas esta noite, mas de capa e espada, para impedir que algum simpático sheik de olhos negros se precipite e leve você embora.
Tânia parou na porta do hotel com aquelas palavras cantando em seus ouvidos, e Mark segurou o casaco para ela. Enfiando os braços nas luvas sedosas, ela
tentava não olhar para Mark. O braço dele sobre seus ombros era acariciante e perturbador. Tânia não protestou, quando ele segurou sua mão ao se dirigirem para a
limusine que os esperava.
John abriu a porta do veículo, esperou que entrassem, e foi para seu lugar. Os pacotes negros não estavam à vista.
Uma vez a caminho no majestoso carro, Mark voltou a fazer um breve relato sobre as atividades da noite. Tânia suspirou aliviada, ao ouvir aquela voz grave
dar-lhe instruções diretas, acalmando seu inexplicável alvoroço.
Logo chegaram à entrada do Claridge. Tânia estava tranqüila, pronta para assumir o controle da situação.
Tudo correu com perfeição e, duas horas depois, ela sentava-se em meio a uma multidão de homens de negócios.
? Absolutamente perfeito, Tânia ? Mark murmurou, antes de levantar junto com os outros convidados e se espalhar pelo salão. ? Soberbo!
? Obrigada. ? As covinhas dela estavam à mostra; nunca tinha sido tão cumprimentada na vida.
? Encantador, srta. Cameron. ? O sheik à sua esquerda sorria com aprovação. ? Mal posso acreditar que uma jovem, tão adorável como você, seja tão inteligente.
Que linda surpresa está sendo para mim e meus conterrâneos.
Que belo homem, pensou Tânia. E quase tão alto quanto Mark. Suas feições perfeitas eram muito morenas e tinha um interessantíssimo par de misteriosos olhos
negros que brilhavam para ela, exprimindo admiração.
Tânia o encarou. Uma felicidade que nunca tinha experimentado antes fazia seus olhos resplandecerem.
? Quanta amabilidade sua dizer isso! ? Ela sorriu, feliz.
? Nada disso. É apenas a verdade. ? Ele sorriu também.
Ela estava de repente achando muito agradável ser o centro das atenções de tantos homens. Havia passado muitos anos recusando essas atenções, mas, naquela
noite, gostava de tudo aquilo. O que teria despertado nela essas sensações tão femininas? Mark? Tânia o procurou com os olhos, mas não o viu. Ficou aliviada, conseguia
agir com mais naturalidade quando ele não estava por perto.
? Tome, srta. Cameron. ? O sheik segurou a mão dela e colocou uma moeda. ? Uma moeda por seus pensamentos, como dizem em sua terra.
? Como? ? Ela sorriu, espantada. ? Ah! Sinto muito, eu estava longe, mas meus pensamentos não valem nem uma moeda.
? Ah, srta. Cameron, nem tem idéia de quantos homens nesta sala dariam tudo o que possuem para você dividir seus pensamentos com eles. Eu sou um desses homens.
Quer vir tomar um café comigo, por favor?
Aquela mão longa e morena ainda estava apertando firmemente a sua. A expressão do sheik mostrava que ele não podia imaginar que ela fosse recusar seu convite.
? Sim, vamos tomar café, obrigada, mas com uma condição ? ela falou, com ar muito sério.
? E qual é?
? Tenho que receber minha mão de volta.
Ele riu sedutoramente e, levantando a mão dela até seus lábios, roçou um beijo, antes de pegá-la pelo braço e levá-la até uma pequena mesa vazia.
? Eu sou príncipe Hussein Ibn Saul, srta. Cameron. Sou um beduíno com botas sujas de areia, que chegou às suas praias vindo da minha terra, Bahrain, para
partilhar de sua cultura. Nunca pude imaginar que conheceria uma mulher tão bonita falando de petróleo como você. ? Sentaram-se e ele chamou o garçom.
? Seu inglês é impecável e vou devolver sua moeda. Não tenho nenhuma intenção de dividir meus pensamentos. ? Tânia colocou a moeda sobre a mesa.
? Seria talvez porque seus pensamentos estão voltados para Mark Anders?
? Claro que não! ? Tânia respondeu rápido, mas seus olhos a desmentiram.
O homem sorriu docemente, os olhos negros brilhando como nunca.
? Perdoe meu atrevimento. Eu a vi olhando para ele, durante o jantar, e então pensei que houvesse algum envolvimento entre vocês. Assim sendo, eu seria um
intruso em demonstrar meu interesse por você.
? Está perdoado, é claro, mas não imagino como pôde fazer tal suposição. ? Tânia bebia o café e olhava séria para ele. ? Mark Anders é um companheiro de
trabalho apenas. Um novo... colega. ? Ela não se atreveu a dar explicações.
? Não posso lhe dizer quanto estou feliz por ouvir tal coisa. Sou um homem afortunado. Por um momento tive medo de ter descoberto sua existência tarde demais
e que... Anders já tivesse assumido a responsabilidade de... digamos... de seu bem-estar.
Tânia reprimiu um risinho nervoso.
? Certamente deve saber que tenho bastante idade, para não ter que dar satisfações a ninguém nestes dias de liberação da mulher, príncipe Hussein?
? Ah, sim! O Movimento de Liberação Feminina! Desculpe, mas damos muito pouca atenção a isso em minha terra. Mesmo assim, você é desejável demais para não
ter nenhum homem interessado em seu bem-estar, srta. Cameron. ? Ele sorriu com todo o seu charme. ? Perdoe-me... mas eu achei Mark Anders um tanto íntimo e tive
a impressão de que ele era o homem.
? Não, não é ? Ela negou com voz firme. Mas, no íntimo, sabia que bem que gostaria se Mark fosse o acompanhante dela.
Terminaram o café e voltaram ao salão principal. Logo Mark se reuniu a eles, junto com outras pessoas, e recomeçaram a falar sobre trabalho.
O príncipe ficou ao lado de Tânia, quieto e observador, prestando muita atenção em tudo o que ela dizia. Os árabes, depois de terem se recuperado do choque
de saber que ela era uma geofísica de sucesso, a ouviam com grande interesse. Tânia notou que Mark estava orgulhoso do sucesso que ela vinha obtendo.
Pouco depois, o sheik Hussein conseguiu afastar Tânia do grupo, propondo que o acompanhasse até o bar.
Hussein sorria, inclinando-se para ela.
? Permita-me tomar a liberdade de pedir a você, que é uma mulher sem compromisso, que almoce comigo amanhã?
Ela pensou que qualquer mulher ficaria feliz em ser convidada por um homem tão agradável.
Hussein continuou sorrindo e explicou:
? Estou pedindo que almoce porque tenho que partir para Bahrain amanhã à tarde, para minha desolação. ? Seus olhos quentes e negros imploravam. ? Preciso
vê-la uma vez mais, por favor?
Tânia tinha a impressão de que ele não estava acostumado a ouvir um não. Mas, por que não aceitar?
? Aceito com prazer ? disse, sorrindo.
Quando se voltou, viu o olhar de Mark grudado nela, mas aceitou o desafio e falou para Hussein:
? Podemos nos encontrar em algum lugar em torno de meio-dia e meia. Quero marcar já, pois tenho várias coisas a fazer pela manhã e não vou aparecer no hotel.
Dali a pouco, Mark decidiu que já era hora de irem embora e foi pegar o casaco dela. Ele e Hussein trocaram olhares significativos quando se despediram,
mas se havia alguma tensão entre os dois, Tânia nem chegou a notar.
Ela sugeriu a Mark que voltassem a pé para o hotel. Precisava do ar fresco para trazê-la de volta à realidade. Sentia-se meio embriagada com o próprio sucesso.
Respirava fundo, adorando o ar frio da noite nos pulmões. Subitamente, arriscou um olhar ao seu parceiro.
Ele sorriu, charmoso, para ela.
? Bem... nós conseguimos, não foi? ? Segurou sua mão. ? Nós dois fazemos uma dupla infernal! A velha United Petroleum devia estar comemorando esta noite!
? A voz dele saía alegre e o carinho parecia completamente inocente.
Tânia sorria, contente com o trabalho que tinha realizado para Mark. Pensava nele, e não na companhia.
? Os árabes me pareceram convencidos. Você acha que eles vão mesmo levar adiante a idéia?
? Claro que sim! Você ganhou todos eles. Eu sabia que o efeito seria esse. Eu apenas tive que juntar os pedaços, depois que você estraçalhou qualquer possível
resistência. Afinal de contas, qual homem, em seu juízo perfeito, poderia resistir a uma deusa dourada falando a linguagem deles... petróleo? ? Ele ria, apertando
a mão dela. ? Amanhã tenho uma reunião com os advogados. Vamos começar a negociar os contratos. E tudo graças a você, Tânia, que soube defender nossas idéias como
ninguém!
? Estou feliz por ter podido ajudar ? ela respondeu simplesmente, surpresa com o entusiasmo e a aprovação dele.
Caminharam em silêncio numa doce intimidade. Tânia gostava de sentir o vestido macio tocando sua pele, o casaco de vison aquecendo-a e a mão forte de Mark
apertando a sua.
Estava cada vez mais consciente da presença de Mark a seu lado. O corpo dele lhe transmitia um calor agradável, gostoso de compartilhar.
Subitamente, ela retirou a mão e ele ergueu as sobrancelhas, admirado. Mas Tânia não conseguia suportar mais aquela intimidade que ameaçava perturbar todos
os seus sentidos.
Mark começou a falar, numa voz doce e calma, como se os dois fossem velhos amigos. Falou sobre a partida deles para os Estados Unidos, sobre seus planos
de testar a nova teoria sobre petróleo em uma área do golfo do México que era propriedade da United, sobre a equipe com que Tânia ia trabalhar. Ela respondia baixinho
e apenas quando necessário, achando difícil concentrar-se nas palavras que Mark dizia, ligada apenas no tom musical da voz dele.
Chegaram finalmente ao hall do hotel, deserto aquela hora. Mark acompanhou-a até a porta do quarto, ficando estranhamente silencioso enquanto o elevador
subia.
Ao chegarem à porta, Tânia procurou na pequenina bolsa dourada, mas não encontrou a chave. Confusa, olhou para Mark. Ele deu um risinho diabólico e pegou
a chave dentro do próprio casaco. Depois, abriu a porta para ela, que entrou depressa.
? Tânia... ? Ele a chamou num fio de voz. Ela sabia que devia resistir ao apelo de Mark, mas sabia também que jamais conseguiria se negar a ele.
? Sim? ? O coração dela batia, descompassado.
? Olhe para mim, Tânia. Tenho uma coisa importante para lhe dizer.
"Pare de bater tanto, coração!", Tânia ordenou a si mesma. "Por que fica tão abalada só com a presença e a voz de um homem?" Mas e se Mark tentasse beijá-la
de novo, o que faria? Ora, Tânia Cameron, ela pensou, você já foi beijada antes, não há motivo para se perturbar tanto!
? Você me parece esquisita. O que há, Tânia? Está com medo de mim? ? Mark perguntou, percebendo o jeito dela.
? Você é o mais abusado dos homens, Mark Anders. É claro que não tenho medo de você. Espero e confio que continue um cavalheiro.
Ele não respondeu logo. Olhou para ela e foi deslizando a ponta do dedo pelo contorno de seu rosto, lentamente, parando na covinha do queixo.
Tânia estava completamente sem ar. Cada pedacinho de seu corpo vibrava com aquele toque.
? Você está exigindo muito de mim, menina. Neste momento, eu não tenho absolutamente nenhuma vontade de ser um cavalheiro. ? Não havia como fugir daquele
mágico momento de intimidade. Tânia estava muda. ? Você esteve absolutamente soberba esta noite. Encantou aqueles homens do deserto. Quero agradecer.
? Eu... eu... ? Tânia respirou fundo. ? Não é necessário agradecer nada. É apenas parte de meu trabalho, não é? ? Não podia deixar de pensar se ele também
estaria encantado.
? Nós não vamos para o Texas antes de quinta-feira. Quer ir ao teatro comigo amanhã e depois jantar?
? Claro, se você quiser. ? Ela estava ansiosa para romper aquele contato íntimo com Mark e recuperar sua razão.
De repente, Mark deu um suspiro e seu jeito mudou.
? Uma palavra de aviso, Tânia. Tenha cuidado com Hussein. Ele acaba de se divorciar de uma esposa após dez anos de casamento. Está procurando alguém.
? Mas que coisa horrível para me dizer agora! Por que pensa que estou interessada na vida particular dele?
? Não estou preocupado com seu interesse e sim com o dele. Tenho certeza de que o desejo dele é levá-la para o deserto. ? Ele escorregou a mão pela nuca
de Tânia, que sentiu um arrepio percorrer suas costas. ? A United Petroleum não gostaria de perder sua última contratada. Isso me preocupa.
? Você sabe por que ele se divorciou?
Mark sorriu, encolhendo os ombros.
? Parece que ela não podia ter filhos. Hussein a amava, mas é seu dever, como príncipe, deixar herdeiros. As leis de seu país determinam que o príncipe deve
se divorciar, caso sua esposa não lhe dê filhos. Agora, está à procura de uma noiva que possa ser mãe. Eu preferia que você não fosse a esse encontro com Hussein
? ele murmurou, beijou a testa dela e desapareceu sem olhar para trás.
Tânia ficou olhando Mark se afastar, sentindo um estranho desapontamento. Será que estava frustrada porque ele não a tinha beijado?
Capítulo V
Tânia ficou pensando um pouco e tomou uma decisão que a deixou bastante aliviada. Levantou-se, colocou dentro das caixas todas as peças lindas que usou na
noite anterior, inclusive o perfume, dobrou o casaco por cima dos embrulhos, depois chamou a portaria pedindo uma pessoa para fazer uma entrega. Deu instruções para
que as caixas fossem deixadas na sede da United Petroleum Company, na Bowater House. Satisfeita, tomou seu café da manhã. Pretendia mostrar, com a devolução das
coisas, sua desaprovação ao modo como Mark Anders usava o dinheiro da companhia, para seus próprios fins. Nem por um momento se preocupou em pensar qual seria o
valor que Mark estava autorizado a gastar com ela.
Depois de comer, passou a manhã visitando uma velha colega de escola, Marge Hansome, a companhia que precisava para tirar Mark da cabeça. As duas conversaram
muito e, ao se despedir, prometeram se ver com mais freqüência.
Era uma hora da tarde, quando Tânia desceu do táxi na porta de um famoso restaurante em Mayfair, onde o príncipe a esperava. Ele roçou os lábios em seus
dedos, num gesto encantador. Tânia sorriu encorajadora, como nunca teria feito uma semana atrás.
Tiveram um almoço perfeito. Quase no fim, Tânia viu Hussein se levantar, sorrindo para alguém atrás dela.
? Mark! Não esperava vê-lo antes de ir embora. Seja bem-vindo, velho amigo. Quer sentar-se conosco? ? ofereceu o príncipe.
? Sinto muito. Linda e eu já almoçamos e temos que voltar ao escritório. Tenho trabalho para fazer, antes de ir buscar Tânia esta noite para o teatro. Não
gostaria de me atrasar ? respondeu Mark, petulante. Queria deixar bem claro ao príncipe que ia sair com ela à noite.
Tânia virou para Mark. Ao lado dele estava uma das ruivas mais lindas que já tinha visto, de enormes olhos verdes e pele perfeita. Era mais alta que Tânia
e tinha um corpo escultural, que chamava a atenção.
Anders apresentou-a como Linda Wells, sua assistente pessoal. A extraordinária beleza dela irritou profundamente Tânia, que não conseguia deixar de olhá-la.
A admiração de Hussein era evidente, quando ele se inclinou para beijar a mãozinha tão graciosa oferecida por Linda.
? Desculpem a intromissão ? murmurou Mark polidamente, mas de cara fechada ?, mas encontrá-lo foi uma sorte. Poderia, por favor, me telefonar antes de tomar
seu avião, Hussein? Existem alguns pontos que preciso esclarecer diretamente com você. Linda e eu estaremos trabalhando toda a tarde.
? Mas certamente, meu amigo. Está certo de que não quer conversar aqui?
? Infelizmente preciso dos documentos que meus assistentes redigiram esta manhã. Se eu puder consultar você antes de ir, não precisarei voar até Bahrain.
Entre aqueles dois homens havia um certo tom de disputa que Tânia não conseguia compreender. Mas ela quase podia jurar que a frieza entre eles não tinha
nada a ver com os negócios da United.
? Muito bem. Então telefonarei assim que terminar este almoço agradável com minha convidada ? o príncipe decidiu.
Mark colocou a mão no ombro de Linda Wells, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
? Então, não desejamos interromper por mais tempo. Vamos, Linda. Voltemos ao nosso trabalho. ? Olhando para Hussein, ele se despediu: ? Até logo mais. ?
E para Tânia: ? Pego você às sete e meia, Tânia. Esteja pronta.
Tânia encabulou. Não tanto pelas palavras, mas pelo tom daquela voz, que tinha um velado toque de posse.
O príncipe a observou atentamente, depois comentou:
? Mas que coincidência! Com tantos ótimos lugares para se almoçar em Londres, eu e Mark escolhemos o mesmo restaurante para trazer nossas lindas companhias.
Estranho, não é mesmo? ? Seu sorriso tinha uma ponta de ironia.
? É... provavelmente vocês dois gostam da qualidade da comida daqui ? ela disse, bem evasiva.
Começou a imaginar por que Mark teria vindo ali com aquela esfuziante ruiva. Será que uma de suas tarefas, na United, era vigiar todos os seus passos? Tentou
se convencer que era excesso de imaginação de sua parte.
Deu um suspiro, fazendo um esforço para relaxar e aproveitar a companhia daquele homem charmoso. Mas Mark não saía de seus pensamentos.
Mais tarde, quando se despediu de Hussein, Tânia prometeu vê-lo de novo quando o tempo e as circunstâncias permitissem. Ela não disse que seguia viagem no
dia seguinte para o Texas. Achou melhor assim. Hussein era o tipo de homem capaz de avançar perigosamente, como diria sua mãe. Principalmente se percebesse que aquela
era sua última chance.
Quando desceu do suntuoso Mercedes esporte, Tânia sentiu um certo alívio por ficar livre daquela forte e envolvente personalidade. Era difícil relaxar perto
de Hussein.
Passou a tarde revivendo sua velha paixão por Londres e fazendo compras. Gastou uma boa quantia em uma linda blusa de seda pura que encontrou na Liberty.
Na Foyles comprou um livro de poesias que sua mãe ia adorar, com certeza. E descendo a Shaftesbury Avenue até Piccadilly, comprou uma lata de tabaco Dunhill, o favorito
de seu avô.
Depois, foi até o correio de St. Martin, despachou os presentes e admirou os quadros de um artista na calçada, ao lado da National Gallery. Terminou o dia
adorando tudo, satisfeitíssima por estar em Londres.
Já era tarde quando chegou ao hotel. Mark estava esperando na recepção, irresistivelmente lindo, com calça de lã cinza-escuro, uma suéter preta de decote
V, que mostrava seu peito atlético e um paletó de camurça jogado sobre o ombro. Caminhava com elegância quando veio até ela:
- Divertiu-se muito? Onde deixou Hussein? - Sua voz estava fria e áspera.
Tânia riu com o interrogatório dele.
- Sim, me diverti. Mas saiba que não é da sua conta onde nem com quem - ela respondeu, também de uma forma áspera.
Mark olhou-a sério e concordou:
- Tem razão, é claro. Não é da minha conta. Tânia, não vamos discutir esta noite. Vamos fazer uma trégua e ver se nos divertimos um pouco, está bem?
- Para variar, talvez seja bom.
- Então é hora de irmos andando.
- Só me dê alguns minutos para me arrumar um pouco.
- Cinco minutos? - Ele riu. - Depois te carrego embora. ? Tânia subiu e dez minutos depois estava de volta com a maquilagem refeita, e vestindo a blusa de
seda nova por baixo do seu velho casaco.
- Disposta a pegar um ônibus? - ele a desafiou.
- Claro que sim. - Adorava andar nos ônibus vermelhos de dois andares, de Londres, mas duvidava que Mark achasse qualquer graça nisso.
- Temos que nos apressar. Lá vem ele. - Mark agarrou sua mão e correram na direção do ponto.
Subiram no ônibus quase sem fôlego e foram para o segundo andar, onde sentaram. Mark praticamente caiu, numa curva, ao se levantar para tentar abrir uma
das janelas do veículo.
- Está bem? Machuquei você? - perguntou ele, passando o braço por trás do ombro de Tânia.
- Não... não... tudo bem.
Mark virou para a cobradora que tinha acabado de subir a escada estreita. Tânia notou logo a troca de gentilezas entre ele e a moça loira, enquanto ele procurava
dinheiro nos bolsos. A garota flertava com Mark que respondia às suas brincadeiras.
"Eu devo ser a única mulher por aí imune ao seu charme", Tânia pensava com superioridade. Mas no fundo, bem no fundo, suspeitava que era menos imune do que
pensava. Senão, por que se importaria tanto com ele?
Desceram do ônibus em Charing Cross, caminharam pela Villiers Street e cruzaram o rio, andando na ponte da estrada de ferro, na direção do teatro. A peça
a que iam assistir era uma comédia extremamente engraçada. Tânia saiu vermelha de tanto rir. Mark também adorou o espetáculo, parecendo muito mais descontraído.
John esperava por eles na porta do teatro, com o Rolls-Royce.
Foram a um restaurante pequeno, aconchegante e muito chique em Knightsbridge.
Mark é uma companhia fantástica quando quer, pensou Tânia, que ficou tão à vontade com ele, a noite toda, que tomou vinho demais e acabou se sentindo meio
zonza.
Quando retornaram ao hotel, Mark pegou a chave da suíte, chamou o elevador, e a levou até a porta. Tânia, desta vez, achou ótimo que ele assumisse o comando
de tudo. Sozinha, ela certamente ia dar algum vexame. Tropeçar no elevador, tentar abrir o quarto errado, algo assim.
- Não vai me convidar para o último gole, Tânia? - ele perguntou, parado na entrada da suíte, exibindo todo o seu charme.
- Sinto muito, mas não tenho nada para oferecer, Mark - ela disse com um certo alívio, achando que ele ia desistir.
Mas ele deu uma risada.
- Com sua permissão... - falou, entrando direto e fechando a porta. Pendurou o casaco de camurça no encosto da cadeira, foi até o móvel que estava contra
a parede e apertou um botão oculto. Uma porta abriu; havia um bar, atrás, com um bom estoque de garrafas e copos de cristal. Tânia olhou para aquilo admirada.
Desistindo de mandar Mark embora, jogou seu casaco em cima do dele, atirou sua bolsa sobre a mesa e pegou o cálice que ele oferecia, aspirando o suave aroma
do licor de laranja. Bebeu devagarinho o primeiro gole. Era delicioso e espalhava um calor por todo o corpo. Ela sorriu, olhando para ele, levantou o cálice em sinal
de "saúde" e tomou outro gole. Mas, desta vez, errou na dose, engasgou e teve de cuspir tudo, quase sem fôlego.
Através das lágrimas que a cegavam, Tânia percebeu que Mark se preparava para ir em seu auxílio. Instintivamente, quis evitar o toque dele dando um passo
para trás, mas, confusa do jeito que estava, acabou esquecendo da mesinha baixa colocada ali e caiu sobre ele tossindo, desesperada. Na queda, o cálice de cristal
voou de suas mãos, derramando todo o licor na blusa nova e também no carpete fofo e caro.
Atrapalhado com aquele caos, Mark pegou um guardanapo de linho para limpar a blusa mas, desajeitado, esfregou forte demais e os botões, que prendiam o tecido,
voaram longe. Agora, Tânia estava ainda mais embaraçada, com a blusa totalmente aberta na frente deixando seus seios quase à mostra.
Ela percebeu que Mark a olhava, cheio de desejo. Tinha vontade de negar aquela atração mágica que existia entre eles, mas sentia que era impossível. Bastava
eles se aproximarem, para uma força estranha conduzi-los cada vez mais para perto.
Um calor gostoso derramou-se pelo seu corpo todo quando as mãos fortes e bonitas de Mark começaram a acariciá-la. Ela prendeu a respiração, quando aqueles
dedos experientes passaram a tocá-la onde nenhum homem jamais havia tocado antes...
Tânia fez um tímido movimento para escapar de Mark, mas ele a beijou delicadamente, enquanto a deitava no tapete fofo.
- Não! - Ela fazia um esforço imenso para sair debaixo daquele corpo que a aprisionava.
- Ah, sim, Tânia. Sim... - Ele colou sua boca na dela, mais uma vez, só que agora de uma forma muito mais apaixonada, mais intensa. Tânia, como que despertando
de um sonho encantado, lutava, determinada a empurrá-lo para longe.
Mark resistia, falando baixinho palavras de amor em seu ouvido e apertando mais seu abraço. O calor daquele corpo contra o seu, e aqueles lábios carnudos
e experientes pressionando sua boca, fizeram Tânia se render e perder definitivamente a vontade de lutar.
Uma onda de doçura correu sobre ela, levando-a ao êxtase. Sem se dar conta direito do que acontecia, começou a responder com paixão àquela boca sedutora
que explorava a sua, com uma habilidade que ela desconhecia.
Tânia tremia toda de desejo ao toque dos dedos de Mark, que corriam de seu pescoço até seus seios. Sob aquelas mãos sensíveis, ela sofreu uma transformação:
tornou-se uma mulher ardente, querendo mais, exigindo, sentindo uma onda incontrolável de prazer. Seus braços se enrolaram ao redor do pescoço de Mark, enquanto
ela murmurava coisas e colava seu corpo ao dele.
Mark ofegava, parecendo tão cheio de desejo quanto ela. Tânia recebia todos os carinhos dele passivamente, ouvindo o ribombar do coração dele. Ou seria o
dela? Agora não importava mais, nada importava, exceto aquela sensualidade que partia dos dois, envolvendo-os. Em segundos, Mark tinha dado a ela a sensação de ser
uma mulher completa, capaz de atender ao chamado do amor.
Tânia se emocionou, sentindo-se plena, comovida com a beleza daquele momento, comovida com sua própria capacidade de entrega. Faminta por mais, ela juntava
a paixão de Mark à sua, consciente apenas das suaves carícias dele em seu corpo.
Ela suspirou quando Mark, levantando a cabeça, afastou-a um pouco. Os lábios dele pousaram nos dela, fechando-os. Terna e suavemente, ele procurou com a
boca a sedosa maciez dos seios dela, e a rigidez dos bicos rosados. O choque dessa invasão fez o corpo de Tânia estremecer, colocando abaixo todas as suas defesas.
Ela murmurava o nome de Mark loucamente, enquanto passava os dedos pelos cabelos dele.
Sem agüentar mais as deliciosas sensações que Mark lhe provocava, Tânia tentou tirar aquela boca dos seus seios. Mas Mark apenas mordiscou-lhe o bico rosado,
num terno protesto por ter sido perturbado. Esse pequeno castigo provocou uma leve dor que fez com que Tânia abrisse os olhos e desse de cara com a fotografia de
Kurt, que tinha caído da sua bolsa no momento da confusão.
Ficou olhando para aquela foto, sentindo uma imensa vergonha e um profundo desgosto por si mesma. O que ela estava fazendo? Que tipo de mulher era para agir
desse modo e corresponder assim a um homem que tinha conhecido a menos de uma semana?
- Oh, Kurt! - As palavras saíram alto de sua garganta como um lamento. Num segundo, ela ficou rígida como pedra. Mark levantou a cabeça, procurando entender
seu repentino retraimento. Completamente atônito, nada fez para detê-la quando ela se soltou dos seus braços e correu para o quarto, batendo a porta.
Ele ainda ficou alguns minutos parado, onde ela o deixou. A frustração estava estampada no seu rosto, especialmente nos olhos opacos e sem vida. Virando-se
lentamente, ele afinal percebeu a foto caída no chão. Levantou-se e foi apanhá-la.
O palavrão que murmurou quando pegou seu casaco e deixou a suíte não foi dos mais bonitos. Nem pretendia ser.
Capítulo VI
Na manhã seguinte, Tânia lutou para acordar. Estava com uma terrível dor de cabeça: ressaca de vinho e de emoções descontroladas. Não sabia mais como agir
e o que pensar. O que tinha acontecido na noite passada havia abalado todas as suas convicções. Daí para a frente, ela nem imaginava o que poderia acontecer, quando
se encontrasse novamente com Mark.
Estava profundamente decepcionada com seu comportamento em relação a ele. O que estava acontecendo com ela, meu Deus? O que quer que fosse, certamente tinha
acabado com sua certeza de que era capaz de controlar a seu modo suas relações com os homens. Com Mark, nada acontecia como planejava. Como ia conseguir trabalhar
ao lado dele desse jeito?
- Oh, diabos! - ela praguejou e foi para o banheiro. Tomou um banho, vestiu sua calça de camurça e um suéter de lã, e calçou suas botas. Passou um rápido
pente nos cabelos negros, sentindo-se toda trêmulas, ainda presa a uma emoção intensa. Chamou o serviço de quarto e pediu um chá e duas aspirinas.
Olhava dentro da xícara sem ver, com uma calma aparente vinda do desespero. Era essencial encontrar uma maneira de escapar ao apelo sexual de Mark Anders.
Se não pudesse fazer isso, as coisas ficariam insustentáveis e ela não devia ir para os Estados Unidos, onde estariam, por obrigação, em constante proximidade.
Mark é desprezível!, pensou com raiva, o que deixava escuros seus olhos azuis.
Era indesculpável que ele tomasse vantagem da sua fraqueza.
Mas só de lembrar tudo o que tinha se passado, uma apaixonada necessidade dele explodiu nela novamente. Suspirava por experimentar de novo aquela intensa
excitação de estar nos braços de Mark e de sentir seus beijos e carícias. Bebeu nervosamente seu chá, fazendo um esforço para ignorar o desejo que brotava em seu
corpo.
Não precisava pensar muito. Sabia que a maneira mais fácil de garantir sua paz de espírito era se recusar a ir para os Estados Unidos. Por um momento, teve
o desejo de atirar o contrato na cara arrogante de Mark. Mas, pensando bem, era um contrato e tanto! Eles estavam lhe oferecendo uma casa mobiliada com empregada
e jardineiro, um carro novo à sua disposição. Além disso, ganharia de saída um salário impossível de encontrar em outro lugar, com seu atual nível de experiência,
e ainda teria a oportunidade de ouro de trabalhar com o mais atualizado equipamento computadorizado, coisa que ela adoraria fazer. Pesou cuidadosamente essas vantagens
todas contra Mark Anders. Acabou decidindo que não ia ser tão burra em se recusar a cumprir esse contrato, só por causa de um homem.
Não, definitivamente não podia deixar que aquele homem arrogante atrapalhasse sua vida, a ponto de fazê-la desistir de um trabalho que tinha tudo para ser
interessante.
"Ele que vá para o inferno!", pensou com raiva.
Cedendo a um impulso, pegou no telefone e ligou para a mãe, sentindo uma necessidade incrível de ouvir sua voz calma e sensível.
Depois de uma breve troca de perguntas e respostas, a mãe foi direto ao ponto:
- O que está aborrecendo você, querida? Tem algum problema?
Tânia pensou em falar, mas desistiu. Como poderia explicar à mãe o que estava acontecendo, se nem ela sabia?
- Tânia - continuou Joan -, não gaste seu tempo lutando contra seu coração, minha querida.
Tânia ficou intrigada.
- Mamãe... eu não entendi... o quê?
- Vai entender, Tânia, você vai entender. Até logo.
Tânia desligou e foi atender a campainha da porta. Lá estava John. Tinham que se apressar para ir até o aeroporto. O motorista avisou que Mark os encontraria
lá.
Já estavam em Heathrow há algum tempo e nem sinal de Mark. Tânia decidiu tomar uma xícara de chá. Cruzou o salão de espera repleto de passageiros e, ao passar
por uma porta, viu Mark. Ele procurava por alguém... talvez ela.
Agradeceu quando os alto-falantes; chamaram os passageiros do Concorde. John e ela embarcaram. O empregado ficaria à disposição da companhia por uns dois
dias, nos Estados Unidos, depois voltaria a Londres.
Tânia estava ocupada com seu cinto de segurança, quando Mark entrou. Ainda vestia a calça cinza e o suéter preto que tinha usado na véspera. O paletó, sempre
no ombro, mostrava sinais de umidade, como se Mark tivesse andado na chuva. Na verdade, não parecia ter dormido.
Ela sentiu um calor queimar seu rosto. Abaixou os olhos, incapaz de sustentar a intimidade daquele olhar. Diabos com aquele homem! E diabos com aquela indesejável
reação que tinha sempre que estava na presença dele.
Ele a olhou um instante, depois deixou cair uma pilha de papéis no colo dela.
- Aqui estão alguns relatórios burocráticos, Tânia. Dê uma olhada neles e vai ficar sabendo como trabalhamos. Há uma parte só sobre nossos computadores.
Por favor leia para entender como alimentamos os computadores com nossos dados.
Foi sentar ao lado de John e Tânia ficou estudando os relatórios, fazendo anotações nas margens. O lanche foi servido. Ela comeu com os olhos pregados nos
papéis, inteiramente alheia aos olhos cor de avelã que a inspecionavam de vez em quando. De repente, o comandante da aeronave entrou na cabine de passageiros, quando
ela ainda estava atenta ao trabalho.
- Senhoras e senhores, estamos a trinta minutos de nossa aterrissagem em Washington, D.C. Talvez vocês estranhem eu não falar pelo rádio, mas desta vez preferi
conhecer meus passageiros pessoalmente e ver se alguém, por acaso, tomou o avião errado.
Tânia riu, como todos a bordo, mas por algum motivo que não saberia explicar, chamou a atenção do comandante, que olhou especialmente para ela e deu uma
piscada. Surpresa, ela sorriu para ele.
- Em Washington, vamos entregar vocês aos cuidados de uma tripulação americana, que seguirá para Dallas. Ficarão em terra apenas o tempo necessário para
passar pela alfândega americana. Posso lhes assegurar que estarão em Dallas, no grande coração do Texas, na hora prevista, com tempo para o almoço a bordo. - Ele
falava a todos os passageiros, mas seu olhar voltava sempre para Tânia e para a covinha que aparecia e se escondia, conforme ela sorria, despreocupada, apreciando
o bom humor do comandante. Todos pareciam encantados com ele menos Mark, que estava de cara fechada. Depois que o comandante saiu, Tânia pegou sua valise de mão
para retocar a maquilagem. Abriu a carteira instintivamente e percebeu, com um choque, que a foto de Kurt não estava lá. Remexeu tudo para cá e para lá, e quando
levantou a cabeça, desesperada, percebeu Mark junto dela.
- Tânia, o que foi? Está tão pálida! - Ele inclinou-se para ela, atencioso.
- Perdi a foto de Kurt. Deve ter caído da minha bolsa ontem à noite no hotel. - Tânia não se lembrava de tê-la visto no chão, ou quando apanhou sua valise
de mão. Agora ela olhava irritada para Mark, ainda inclinado a seu lado, culpando-o. Se ele tivesse se comportado como devia, a foto ainda estaria segura com ela.
Jamais poderia perdoá-lo!
- Não leve isso tão a sério, Tânia. Afinal, é apenas uma fotografia.
- Mas é tudo o que tenho dele - ela se lamentou.
- John vai voltar para Londres. Ele pode ir ao hotel procurar essa maldita foto, se é tão importante para você.
Tânia olhou para ele, incapaz de entender a raiva expressa naquele rosto.
- Obrigada, Mark. Ficarei muito agradecida. Essa foto significa muito para mim.
- É, avalio quanto. Quem é ele? Seu amante?
- Isso é uma coisa que não é absolutamente da sua conta. Mark sorriu e voltou ao seu lugar, com cara de quem achava que era da sua conta.
Oh, minha nossa! Como ela o detestava com toda aquela presunção. Só esperava ficar tão ocupada no trabalho, a ponto de fazer Mark desistir naturalmente e
procurar outra pessoa como foco de suas indesejáveis atenções. Não podia nem imaginar como ia conseguir trabalhar se Mark Anders fizesse parte da mesma equipe que
ela!
Ainda pensava nisso tudo, quando deixou o Concorde e se encaminhou para a fila no balcão da alfândega.
- Me permite carregar isso para você, srta. Cameron?
A pergunta a trouxe de volta à realidade. Quem falava era o comandante do Concorde. Sem outra palavra, ele abaixou e pegou a mala das mãos dela. Sorrindo
de sua expressão escandalizada, juntou-se a ela na fila que se movia, vagarosa.
- Sabia que comandantes podem invejar carregadores de malas? - Seu bem modulado sotaque britânico era brincalhão. Tânia ainda estava perplexa. Comandantes
de vôos internacionais raramente acompanhavam seus passageiros na fila da alfândega. - Posso perguntar quanto tempo vai ficar nos Estados Unidos?
- Por quê? Eu... eu... honestamente, não sei. Alguns meses, espero.
- Excelente.
Tânia mudou de posição, desajeitada, percebendo as intenções dele.
- Excelente, como? - perguntou, sem graça, tentando disfarçar.
- Gostaria de vê-la de novo, se for possível.
- Mas como? Não há ninguém em Londres ansiosamente esperando sua volta?
É estranho, pensou Tânia, como estou achando agradável atrair a atenção de um homem interessante. Eu nunca agi dessa maneira, antes de conhecer Mark. Dê-se
ao diabo com o que é devido!
Tinha de admitir que Mark havia aberto para ela um novo mundo de atraentes possibilidades. Nesse momento, sentia que o comandante bonitão que lhe falava
estava interessado em conquistá-la e, com toda honestidade, admitiu que isso podia ser bem agradável.
Ele sorria da pergunta dela.
- Ninguém me espera. Meu nome é Mike. Mike Lane - disse, com um jeito simpático.
- Bem... vou estar em uma plataforma de extração de petróleo em algum lugar no golfo do México, acho que vai ser um pouco difícil você fazer contato comigo.
- Deve estar brincando! - Ele parecia incrédulo. - O que uma garota como você vai fazer em uma plataforma no golfo do México?
- Procurar petróleo! Que mais poderia ser?
Tânia olhou para o inspetor da alfândega e viu Mark atrás dele. Ele franzia as sobrancelhas, como se estivesse aborrecido.
Deu-lhe as costas e sorriu propositalmente para Lane, levada por um impulso diabólico.
O inglês ficou sério, quando perguntou:
- Está com Anders?
- Oh! Não imaginei que o conhecia.
- Conheço sim. Ele viaja regularmente comigo. Está com ele? - repetiu.
- Não! Bem... sim, de certo modo. Viajamos juntos pois vamos trabalhar juntos.
- Pois eu não tinha imaginado que ele fosse empregado de ninguém. - Lane estava pensativo. - Ele viaja constantemente de cá para lá. Pensei que fosse algum
manda-chuva todo-poderoso.
- Ele é todo-poderoso o suficiente. Porém não é manda-chuva. Apenas trabalha para seu sustento como eu e você.
- Bem, vamos voltar ao nosso assunto. Deve haver algum telefone para eu entrar em contato com você.
Tânia concordou em deixar que ele lhe ligasse, avisando que a United Petroleum era seu único endereço no momento. Deu-lhe o número do escritório central
da United, em Galveston. Eles a localizariam e a avisariam.
Mike ficou com ela até liberarem sua mala, quando então um membro da tripulação veio chamá-lo para transferir o Concorde para uma tripulação americana. Tânia
o observou afastar-se, divertida com aquela conquista imprevista.
Assim que Mike Lane saiu, John apareceu para se despedir. Desejou-lhe sucesso em seu novo trabalho e prometeu procurar a foto de Kurt e mandá-la para ela.
Só então Tânia foi para o avião que ia levá-la a Dallas.
Mark esperava por ela.
- Posso sentar a seu lado, srta. Cameron?
- Não ouviu dizer que esta é uma terra livre? Pode sentar onde quiser.
- Uma vez que vamos trabalhar juntos, penso que é tempo de fazermos uma trégua. Vamos tentar?
Tânia percebeu que não estava a fim de enfrentar Mark.
- Não há nada para tentar. - Ela queria se controlar, mas era óbvio que estava nervosa.
- Não é isso que percebo, Tânia. Eu pareço irritá-la apenas por respirar o mesmo ar que você. Por quê? Pelo que sei, sou um homem razoável para se trabalhar,
mesmo que alguns façam objeções à minha personalidade. Posso saber por que reage tão negativamente a tudo o que faço?
"Bem, você perguntou, então saberá", ela pensou.
- Porque não gosto de você. É mandão, arrogante e insolente. Sua companhia parece estar bastante impressionada com você, mas isso é com eles. Eu não sou
obrigada a concordar com esse ponto de vista. Certamente é um profissional competente, mas quem ganha diretamente com isso é a United, e não eu. Estou muito mais
preocupada com o fator humano. Sinceramente, não acho que conseguiremos trabalhar juntos como uma equipe. - A expressão dele não se alterou e ela continuou: - Costuma
usar as pessoas, manobrando-as para que ajam como você deseja. Essa é sua principal característica pelo que pude observar esses dias. E eu não vou entrar no seu
jogo, Mark Anders. Realmente não vejo como poderemos trabalhar juntos.
Tânia terminou seu discurso sem fôlego, tentando não se mostrar nervosa.
Mark ouviu tudo com aquele ar de superioridade que a tirava do sério. Sentiu uma súbita vontade de esbofeteá-lo. A intensidade daquele impulso chegou a surpreendê-la.
Mordeu o lábio e virou a cabeça para esconder seus sentimentos, Mark afinal falou:
- Bastante justo; eu pedi, você me disse. Mas agora diga-me: está preparada para fazer seu trabalho a despeito desses seus sentimentos?
- Certamente que sim. Sou capaz de colocar meus problemas pessoais de lado e fazer meu trabalho corretamente.
- Certo, então vamos em frente. Posso ver aquelas anotações que fez? Pretendemos colocar um novo poço em operação dentro de três semanas, e precisamos ter
o computador operando para obter as informações que necessitarmos. Estou interessado em saber quais as sugestões que você deu para aumentar a eficiência de nossos
métodos. Sei que é excelente para isso.
Incrível como Mark era capaz de falar como se nada tivesse acontecido entre eles. Tânia gostaria de entender esse homem, mas simplesmente não conseguia.
Mark sorriu como se o pensamento dela estivesse escrito como uma legenda em seus olhos azuis.
Nas horas seguintes, os dois estudaram e discutiram vários problemas do novo poço. Tânia ficou encantada com o entusiasmo e o profundo conhecimento que Mark
demonstrava da indústria de petróleo. Parecia que ele já estava na área há anos, dando opiniões de um profundo conhecedor do assunto.
Depois de algum tempo, ela encaixou na cadeira da frente a mesa onde tinham espalhado seus papéis, endireitou seu assento, e soltou o cinto de segurança.
Mark fez o mesmo.
- Afinal, não foi tão mau assim, foi? Se fizermos um real esforço, creio que poderemos trabalhar como uma equipe - ele disse, rindo.
Tânia ia rebater com ironia, mas vendo o sorriso dele, rendeu-se e sorriu também.
- Foi quase sem dor - brincou. Mark suspirou.
- Pena que não possamos ser amigos, Tânia. Você me pareceu bastante amigável com Mike Lane. Vai vê-lo de novo?
- Não vou discutir isso com você - foi a resposta furiosa dela.
- Apenas tenha cuidado, é só. Ele age rápido e é um conhecido conquistador.
- Se disser mais uma só palavra, Mark Anders, sobre qualquer coisa que não diga respeito ao nosso trabalho, vou tomar o primeiro vôo disponível para fora
deste país. Estamos entendidos?
- Sabe que fica linda quando se zanga? Sabia disso, Tânia?
- O que sei é que não vou tolerar interferência alguma em minha vida particular - respondeu, furiosa.
"Realmente, quando parece que vai haver um pouco de harmonia, ele distorce tudo. Sem dúvida, é o mais irritante e insuportável homem que tive o infortúnio
de encontrar", ela pensou.
Mark apenas lhe respondeu, com um franzir de lábios:
- Você deixou tudo bem claro. Achei que era meu dever enviar um aviso a esses inocentes ouvidos seus. Já tive oportunidade de ver Mike em ação. Ele digere
garotas como você no café da manhã.
Certo, ela pensou. E quem sabe quantas garotas suas ele já digeriu? E você, Mark Anders, prefere no almoço ou no jantar?
Tânia estava furiosa, quando passou pelas portas automáticas do vasto e luxuoso Aeroporto Fort Worth, de Dallas, no Texas.
Capítulo VII
Um homem extremamente bonito saudou Mark, com a familiaridade de um velho e íntimo amigo.
- Amigão! - Os olhos negros bem abertos brilhavam com real prazer. O homem bateu nos ombros de Mark, agarrou sua mão e sacudiu-a com entusiasmo. - Madre
de Díos! Estou feliz com sua volta, companheiro!
Falava com sotaque americano, mas misturava palavras num espanhol perfeito. Provavelmente era mexicano. Parecia tão alto quanto Mark e tão charmoso ou mais
que ele.
- Temos que mandá-lo embora com mais freqüência, amigo mio, se prometer voltar sempre em tão boa companhia. Onde a encontrou?
- Tânia, é com grande relutância que apresento nosso dom-juan oficial. Francisco de La Cruz. Frank, esta é a dra. Tânia Cameron. Ela é nossa engenheira-chefe
de operações em alto-mar, para o projeto do golfo.
Tânia deu a mão a Frank. Ele levantou-a e tocou seus dedos com os lábios.
- Díos! Como as coisas mudaram! Estou feliz por ter vivido para ser testemunha de um acontecimento como este. - Sacudia a cabeça rindo e afastando as mechas
de cabelo que caíam em sua testa. Imediatamente, Tânia sentiu o poder de seu charme.
Ao mesmo tempo, ela percebeu que ele usava seu encanto natural, como o ar que respirava.
Um homem como esse é um perigo ambulante para qualquer mulher, pensou, retirando a mão. Ele provavelmente vivia cercado delas por toda parte.
- Como vão as coisas em West Coast? - Mark segurou o braço de Tânia, num gesto possessivo. Foram caminhando através do grande aeroporto com Tânia entre os
dois.
- Tudo parece em ordem. Eu cheguei há uma hora e fiquei esperando seu avião, conforme instruções.
- Frank é nosso piloto-chefe - Mark explicou a Tânia. - Ele é responsável pelos dois jatos da companhia e pela frota de helicópteros que temos. É um piloto
competente, apesar de não parecer - brincou.
- Eu o levo a salvo para qualquer lugar que deseja ir e veja como ele me paga! - Frank fez um gesto de desânimo e sacudiu a cabeça. - Faz pouco de mim na
primeira chance que tenho de impressionar uma garota adorável. Madre de Díos!
Mark foi retirar a bagagem, depois os homens começaram a conversar a respeito de West Coast, falando de coisas que não interessavam a Tânia. Quando pegaram
o carro, ela ficou olhando pela janela, distraída. Nunca tinha visto tanta extensão de terra. Parecia que não acabava mais, perdendo-se de vista. O solo era todo
verde e o ar quente.
O veículo do aeroporto que os deixou perto de um jatinho branco e brilhante, que os levaria até Galveston, sede da United, foi afinal descarregado. Mark
ajudou Tânia a entrar no avião, enquanto Frank alojava a bagagem.
O avião, por dentro, era típico dos altos executivos das grandes companhias. Não tinha assentos normais, mas poltronas colocadas de modo que uma conferência
pudesse ser realizada ali facilmente. Entre elas, estavam espalhadas várias mesas pequenas. Sobre uma delas havia uma grande caixa de papelão, com um trem elétrico
de brinquedo. Ao lado da caixa, havia uma lindíssima boneca, vestida de bailarina espanhola com um cabelo negro sedoso, parecendo de verdade, e segurava um leque
de rendas na delicada mãozinha de louça.
Tânia não conteve a admiração e pegou a boneca, maravilhada.
- Você gostou dela? - Frank aproximou-se com os olhos brilhantes de prazer. - Eu a comprei para Karen. O trem é para o garoto, Clint.
- Sim, qualquer mulher gostaria disto - disse Tânia.
Frank olhou de relance e viu a expressão de Mark, enquanto Tânia examinava a boneca.
- É melhor colocá-la em lugar seguro - falou, pegando a boneca da mão dela. - Eu trouxe isto desde México City. Seria uma vergonha se quebrasse tão perto
de casa.
- É... - A voz de Mark estava gelada. - Seria uma vergonha.
- Vá pro inferno, Mark - Frank explodiu com violência. - Que diabo! Quando vai entender que estou apaixonado por Karen? Você abusa da minha paciência. Afinal
de contas, que amigo você é? Devia me conhecer melhor que minha própria mãe.
Tânia ouvia, atenta. Os dois homens pareciam ter esquecido completamente sua presença.
- Frank, seja razoável - Mark respondeu, numa voz que parecia autoritária e gelada. - Karen tem apenas vinte e um anos e já sofreu demais na vida, você sabe,
eu não tenho que dizer. Então, pare com isso e vá pegar alguém por aí que não possa magoar.
Tânia pensou que Frank fosse dar um soco em Mark. A respiração dele estava profundamente alterada, os lábios apertados e a pele, antes morena, branca como
cera.
- Você abusa demais, velho amigo! Um homem não atura tanto desaforo.
Uma expressão de sincero pesar passou pelo rosto de Mark.
- Diabos, Frank, você sabe que eu não deixaria nada neste mundo interferir em nossa amizade. Em nome dessa amizade, eu peço: deixe isso para lá, sim? Eu
sei de seus sentimentos, mas também sei que Karen não tem chance de realmente levar isso adiante.
- Não pode impedi-la de me ver, você sabe!
- Eu sei e não impediria, mesmo se pudesse. Tudo que estou pedindo é que dê a ela tempo para crescer e para amadurecer. Sabe de que estou falando. Não forçá-la
a fazer algo que iria lamentar pelo resto de seus dias. Ela não precisa disso agora.
- Mas ela precisa de mim. E Deus sabe como eu preciso dela também.
- Posso compreender o que quer dizer. - Ele deu um suspiro de desânimo e, só então, percebeu que Tânia estava ouvindo com toda a atenção. - O que me diz
de colocarmos este bicho no ar e irmos para Galveston? Sinto muito pela cena, Tânia. Sente-se lá por favor e vamos embora.
De repente, a vontade de brigar parecia ter desaparecido de Frank. Ele foi para dentro da cabine, carregando a boneca nas mãos.
Tânia ficou imaginando quem seria aquela jovem chamada Karen, que tinha um garoto chamado Clint. Por que Mark a protegia tanto?
E por que se preocupava daquela maneira com Frank? Era claro que a jovem não poderia resistir ao simpático mexicano, mas por que as relações dela com Frank
eram de interesse de Mark? E a criança, seria filho dela?
Decidindo que nada disso era da sua conta, Tânia olhou para fora, estudando a paisagem. Aquela era uma terra bastante diferente da sua e definitivamente
muito maior, observou, quando aterrissaram na pista de Galveston.
Frank foi o primeiro a deixar o avião. Sempre carregando a caixa e a boneca, ajudou Tânia a descer também, com uma delicadeza exagerada.
- Bem-vinda a Galveston, Tânia! Espero que goste do lugar, tanto quanto gostamos de tê-la aqui. - Seus olhos negros brilharam e seu sorriso era afetuoso.
Mark estava certo. Este homem tinha o poder de forçar qualquer mulher a fazer coisas das quais se arrependeria depois, pensou Tânia.
- Vamos partir em duas horas, Frank. - A ordem de Mark foi rápida e direta e apagou de repente o sorriso do piloto. Frank olhou para Mark de um jeito abertamente
agressivo, mas não discutiu suas ordens.
- Certo, Mark. Estarei aqui. Enquanto reabastecem o avião, vou ver Karen.
Mark ficou olhando Frank se afastar. Tânia o encarou e reparou que o rosto dele parecia uma máscara, era pura censura e raiva. Seus olhos cintilavam e as
linhas do rosto tinham uma forma implacável, como de um homem decidido a tomar uma atitude drástica.
Mas Frank ia fazer o que queria, pensou Tânia. Qualquer que fosse o conflito entre os dois homens, talvez conhecessem e entendessem um ao outro o suficiente
para continuarem sempre amigos, mesmo depois de uma discussão desagradável como esta.
Mark foi caminhando, com uma das malas em cada mão, para o gradil que separava o campo dos edifícios. Tânia o seguia. Frank, já do outro lado, abanou a mão.
Apenas ela respondeu, Mark só deu ao amigo um olhar raivoso.
O sol estava se pondo, mas a temperatura continuava alta. Não era desagradável porque soprava uma brisa constante. Tânia estava praticamente fascinada com
o cheiro diferente que sentia no ar, e com o ruído do vento nas folhas das palmeiras, que encostavam uma na outra. Ela nunca tinha visto palmeiras tão altas.
Sentia-se feliz, agora que estava ali. Tinha tomado a decisão certa. Sua experiência no golfo do México parece que ia ser maravilhosa, mesmo tendo que enfrentar
a arrogância de Mark Anders.
- Ei, cara, aqui! - alguém gritava.
Mark parou. Um gigante bronzeado, de ombros largos, chamava por eles, acenando. Sua camisa de seda, desabotoada até o peito, não combinava nada com a jaqueta
felpuda. Usava uma calça bem apertada, enfiada nos canos das botas altas de cowboy. Um chapéu texano sobre os cabelos encaracolados, empurrado displicentemente para
trás, lhe dava um ar descontraído.
Ele apertou a mão de Mark e bateu com energia em suas costas. Depois examinou Tânia com evidente interesse.
- Olá, primo! Deve estar orgulhoso, desta vez. - Ele tirou o chapéu e solenemente curvou-se em um galante cumprimento, prendendo depois os dedos de Tânia
entre as suas mãos fortes. - Onde achou esta preciosidade, Mark? E como a convenceu a vir com você a este pobre e perdido fim de mundo?
- Tânia, este é meu primo Greg Sims. Você vai vê-lo um bocado. A gente leva algum tempo para se acostumar, mas ele não é realmente tão insuportável quanto
parece. Teve uma educação muito negligente e não tem boas maneiras. Mas sabe supervisionar trabalhadores numa plataforma de petróleo como ninguém, graças a Deus!
Houve um tempo em que sua única ocupação era caçar garotas por aí!
Tânia percebia uma certa censura, debaixo daquelas afetuosas palavras. Mas se Greg também percebeu, preferiu ignorar sem problema algum.
- Obrigado, primo. - Seus olhos tinham um brilho malicioso. - Até onde posso entender, meus talentos são muitos. Esta linda jovem, por exemplo, poderia arrancar
o melhor de mim. Posso garantir, Tânia, que nunca vi ninguém como você antes, por estes lados.
Mark fechou a cara, passando a mão pelos cabelos, impaciente, e pigarreando forte. Greg piscou para Tânia, que ficou sem graça com o comentário.
- Cuidado, Greg. Esta senhora é a dra. Cameron. Acontece que é sua nova chefe.
- Nossa! Nossa nova engenheira de operações em alto-mar? Esta vida é danada de injusta, se me perdoa, dra. Cameron.
A covinha de Tânia apareceu quando ela riu, divertida. Que era possível fazer com um homem como aquele? Mark Anders já não era suficiente? Como ia trabalhar
com os dois ao mesmo tempo?
- Até onde me lembro, você é um homem casado, Greg Sims. - Mark interferiu. - Tânia está aqui basicamente como engenheira. Seus outros atributos são devidamente
notados, mas ela não está aqui para se encarregar de satisfazê-lo e sim trabalhar para a equipe de exploração. Posso garantir que seus encantos nada têm a ver com
o fato de ocupar essa posição.
Tânia ouviu o discurso sentindo-se completamente ultrajada. .Quem tinha dado a Mark o direito de falar como se ela não estivesse ali? Abriu a boca para protestar,
mas viu o olhar magoado de Greg, que falou primeiro:
- Sei, Mark. - Ele ficou subitamente sério. - Olhe, tenho que falar com você sobre Ginny Lee, assim que tiver um minuto. Ela diz que vai se divorciar de
mim.
- Não estou nada surpreso - foi a resposta seca de Mark, parado ao lado do Jaguar branco que esperava por ele. - Vocês têm tido problemas um dia atrás do
outro. - Abriu a porta do carro para Tânia entrar. - Faria bem a vocês dois se você aplicasse a palma de sua mão naquele traseiro bem apanhado que ela tem e fizesse
valer seus direitos naturais.
Greg riu, divertido.
- Me danaria todo, Mark. Sabe o que aconteceria se eu pusesse mão firme em Virgínia Lee? Você ia me ver morto!
- Você tem que tentar uma vez.
- O pai dela ia cair em cima de mim como uma tonelada de rochas. E não esqueça do irmão dela, também. Tem que haver uma solução melhor. - Os dois foram na
direção do porta-malas e Tânia não ouviu mais suas vozes.
Então Greg Sims precisa dos conselhos do primo?, pensou Tânia. Será que Mark era capaz de bater numa mulher, como tinha aconselhado? Ele parecia decidido
quando queria alguma coisa, mas ela não podia imaginá-lo cometendo uma violência física contra alguém. Usava seu charme, que era mais fácil e mais prático. Só com
ele, já era capaz de fazer qualquer mulher se derreter toda. Com ela mesma não era assim?
Sentada no carro, seu corpo vibrou sem querer, apenas com a lembrança do que tinha sentido, quando teve Mark em seus braços.
Fora tão bom! Ela se esforçou para prestar atenção na conversa e esquecer aqueles momentos de intimidade.
Seria até um alívio começar a trabalhar e ter a cabeça ocupada, pensou amargurada.
Assustou-se quando Mark fechou o porta-malas com força. Tânia olhou Mark e Greg pelo espelho retrovisor. Eram bastante parecidos. Ambos tinham ombros largos,
musculatura igual e mais de um metro e oitenta de altura. Elegantes e atléticos, encarnavam o ideal da beleza masculina. Ambos mostravam um cabelo castanho-dourado,
sendo o de Mark um pouco mais escuro. Só os olhos de Mark eram diferentes, claro, pois ninguém mais tinha olhos cor de avelã. As vozes eram bastante semelhantes,
só que Greg falava com o arrastado sotaque sulista.
Mark abriu a porta e sentou-se ao lado dela.
- Vou levá-la para sua nova casa. Está tendo maus pensamentos sobre trabalhar conosco, Tânia? Posso assegurar que pelo menos Greg é inofensivo. Ele é muito
bem casado com Virgínia Lee. Infelizmente, Ginny, como nós a chamamos, foi mimada toda sua vida e tem uma tendência a certos acessos de raiva difíceis de controlar.
As brigas desses dois são legendárias, mas no final sempre se beijam e tudo se ajeita, como sem dúvida vai acontecer desta vez.
Tânia ouvia com interesse, no entanto, sentia vontade de lhe dizer que seus probleminhas familiares não eram da conta dela, simplesmente porque não queria
intimidade com ele. Mas conteve seu impulso. Afinal de contas, era obrigada pela companhia a conviver com esses homens.
- Eu não seria tão inofensivo. - Mark riu, dando a partida e fazendo o poderoso carro arrancar. - Está começando a perceber, não, Tânia?
- O que quer dizer com isso?
- Não percebeu que tenho estado observando você de perto, estes últimos dias? - Ele deu uma guinada e entrou rapidamente, na corrente do tráfego. - Vi três
homens se interessarem por você. Cuidado, Tânia.
Ela se irritou.
- Deve estar brincando! Eu sou uma pessoa comum e não costumo flertar com cada homem que cruza em meu caminho. - Ela olhava para ele, indignada.
- Hummm... É possível que não saiba como afeta os homens, eu suponho. Nesse caso, recomendo que seja mais discreta, Tânia Cameron. Se não fizer isso, vai
me ver brigando com todos os homens da nossa equipe, tentando tirá-la de apuros.
Tânia lhe deu um olhar de desdém e decidiu que a melhor coisa a fazer era ignorá-lo, quando ele começava a provocá-la. Aliás, ela estava seriamente desconfiada
de que ele adorava fazer isso. Por isso, fingiu indiferença.
Mark inclinou-se diante dela, reparando no seu rosto, e deu uma boa risada.
- Tem que me perdoar, garota. Não posso resistir à oportunidade de amolar você - ele disse, todo sorridente, confirmando as suspeitas dela.
O carro seguia veloz por uma larga avenida, cujo canteiro central tinha inúmeras árvores ornamentais desconhecidas para Tânia. Elas formavam uma espécie
de tela, entrelaçadas umas nas outras.
- Você pode ser facilmente provocada, sabia? O azul de seus olhos fica escuro e você fica vermelha, quando isso acontece - Mark continuou, rindo.
Tânia virou a cabeça de lado e ficou olhando pela janela. Olhos mais escuros! Realmente!
Nesse momento, Mark parou o Jaguar diante de uma casa alta, linda. Deu a volta e ofereceu a mão para que ela saísse.
- Venha conhecer Ma Ruddy. Ela é quem toma conta desta casa para a United Petroleum. Conheço-a desde menino: trabalhou em nossa casa, praticamente me criou.
Tânia o acompanhou na direção de um portão e depois por um caminho que levava a uma atraente residência.
No centro do terreno, a casa de dois andares era cercada de árvores antigas. Pintada de branco, combinando com suas grandes janelas e varandas com grades
de ferro trabalhado, ela tinha um aspecto delicado. Seus balcões eram enfeitados com vasos de plantas e poltronas de vime, que lhe davam um ar de uma casa de cinema.
- Mark, eu vou ficar aqui? Por quê? - Tânia quis saber.
- Acha ruim? Esta casa está temporariamente vazia e a United pensou que poderia hospedá-la aqui. No futuro, se for necessário, uma outra casa será providenciada.
Quando subiram os degraus e a porta dupla se abriu, Mark foi recebido com um grande abraço por uma mulher enorme.
- Mark, querido! Estou tão feliz de ver sua cara feia! Quebrou os braços ou coisa assim? Então, por que não me escreveu? Mark retribuiu o entusiástico abraço
e deu dois beijos estalados no rosto corado e alegre.
- Não tive um momento livre, Ma. Conheci Tânia e passei todo meu tempo convencendo-a a vir comigo. Ela é teimosa. Tive de usar toda a minha lábia para convencê-la.
Depois dessa mentirosa declaração, Mark escondeu-se prudentemente atrás da empregada. Ma Ruddy sacudiu a cabeça quando notou a cara feia de Tânia, e sorriu
para ela dando boas-vindas no olhar.
- Mark tem lhe dado o que fazer, não tem, senhorita? Mas não lhe dê muita atenção. Ele é inofensivo.
Inofensivo, ela pensou. Essa agora! É o mais perigoso indivíduo que já conheci.
Sorriu para Ma, que não se conteve.
- Nossa! Que linda garota você é! Onde estão seus modos, Mark Anders? Apresente-nos. Onde a encontrou?
- No meio do mar do Norte, Ma. Um dia olhei ao redor e lá estava ela com suas covinhas. - Com expressão complacente, ele estudava Tânia, mostrando a satisfação
de um garoto que achou seu brinquedo favorito, debaixo da árvore de Natal. - Esta é a dra. Tânia Cameron, Ma. Ela é uma qualificada geóloga e paleontóloga, e uma
bem-sucedida descobridora de poços de petróleo. Vai chefiar nossas operações em alto-mar, em nosso próximo trabalho.
Tânia o fuzilou com o olhar e decidiu que teriam uma séria conversa logo, logo. Ia fazer com que Mark parasse de provocá-la. Tudo o que ele dizia, parecia
implicar numa intimidade. Provavelmente esse era o jeito dele, mas ela não queria que os outros tirassem Conclusões erradas a respeito do seu relacionamento com
ele.
O sorriso, que Ma Ruddy deu, era um testemunho do que Tânia temia. Sem dúvida a mulher pensava que havia algum tipo de relação entre os dois. Também, do
jeito que Mark falava, parecia mesmo que existia uma grande intimidade entre eles. Isso Mark não notava. Ele colocou um braço carinhoso ao redor da rechonchuda mulher.
- Ma Ruddy foi o terror da minha infância, e o horror de minha juventude. Só devido aos esforços dela eu consegui sobreviver. Mas foi duro, para ela, conseguir
me educar. Tivemos que brigar muito. - Ele inclinou a cabeça e acariciou com o queixo o rosto bronzeado e os cabelos grisalhos de Ma.
- Se o conhece desde que era um rapaz, merece minhas condolências, sra. Ruddy. O fato de não tê-lo estrangulado no berço prova sua grande bondade - Tânia
disse, irônica.
- Admito que muitas vezes fui tentada a fazer isso. Sim, muitas vezes. - A mulher virou para Mark e deu uma risada desaforada. - Conte-me, o que quis dizer
com "encontrei-a no meio do mar do Norte"? O que estava fazendo no mar do Norte? E como teve a sorte de encontrar uma moça tão bonita por lá? E como fez para convencê-la
a vir para cá?
- Eu contei um monte de mentiras e prometi a ela que você estaria aqui para protegê-la, se precisasse de proteção. Não vá contar a verdade a ela, ouviu bem?
Estou tendo um trabalho danado para conservá-la, agora que a encontrei.
- Uh, uh! Bem, me parece que você vai ter uma pequena concorrência, meu menino. - Ela sorriu para ele e Tânia. - Venha comigo, srta. Cameron. Quero lhe mostrar
uma coisa.
Empurrou uma das portas duplas que davam para o hall de onde vinha uma luz que iluminava a escada graciosa e curvada que levava aos terraços, ao redor da
casa. Todo o ambiente estava impregnado, pelo cheiro de dúzias de rosas vermelhas, colocadas em lindos vasos e potes.
Atordoada, Tânia virou para a mulher, percebendo a cara de Mark, séria, a seu lado.
- Elas são absolutamente lindas - murmurou, sorrindo. - Nunca vi nada como isto. De onde são?
Quando fez a pergunta, olhou de novo para Mark e viu sua expressão sarcástica. Parou um momento, então percebeu, mesmo antes que Ma Ruddy falasse, que as
flores só podiam ter sido mandadas por Hussein!
- São para você, srta. Cameron - Ma esclareceu. - Parece que um sheik árabe comprou todas as rosas do Texas e mandou para cá. Pelo menos, foi o que o homem
da floricultura disse, na última entrega que fez. Ele teve um dia cheio hoje. Mas aqui está o cartão, veio junto com a primeira entrega.
Ela pegou o cartão das mãos de Ma Ruddy, percebendo o ar de pouco-caso de Mark, a forte fragrância das flores e o toque surdo do telefone dentro de casa.
Fez um desesperado esforço para manter-se calma, mas se lembrou do sarcástico comentário de Mark sobre os três homens com quem ela tinha flertado e não pôde deixar
de se perturbar.
Hussein tinha transcrito no cartão um poema de John Keats sobre a beleza, acrescentando uma linha sua:
"Beleza é verdade; a verdade é beleza
Isso é tudo o que precisamos saber na terra.
Exceto o que pensas de mim, oh beleza minha".
Embaixo estava assinado "Hussein". Tânia olhou para Mark, que não tentava disfarçar o que sentia, mas nem pôde dizer nada, porque um homem colocou a cabeça
na porta e a chamou.
- Deve ser a srta. Tânia Cameron, não? Há uma chamada internacional para a senhorita.
Tânia pensou que fosse sua mãe e seu avô, e correu para onde o homem indicava: o telefone estava sobre uma mesa na biblioteca. Pegou o aparelho, percebendo
que a porta tinha sido fechada atrás dela. Ia começar a falar quando uma risada masculina veio do outro lado da linha.
- Hussein!
- Sim, Tânia Cameron, Hussein - ele caçoou. - Entendeu minha mensagem?
- Hussein, eu nunca vi nada tão extravagante e doido. Todas aquelas rosas são lindas!
Ele a interrompeu, rindo.
- Eu queria apenas garantir que você não ia ser capaz de me esquecer, adorável criatura. Se apenas uma rosa já fala de amor, o que então diriam as vozes
de centenas de rosas, hein? Diga-me, querida Tânia.
Aquela voz sensual ainda tinha o poder de mexer com os sentidos de Tânia mesmo a quilômetros de distância. Ao ouvi-la, ela se lembrou do brilho selvagem
que percebeu no olhar dele, quando se despediram. Não havia acreditado quando Mark disse que ela conquistara Hussein. Mas ali estava a prova. Agora não podia negar
o interesse do príncipe. O que poderia desencorajá-lo?
Tânia não sabia, mas tentou. Repreendeu-o pela extravagância mostrando que o exagero era de mau gosto e pediu que ele se moderasse.
Hussein suspirou, fingindo desespero, depois riu e disse a ela que o esperasse em breve. Despediu-se e desligou.
Capítulo VIII
Tânia não queria acreditar no que tinha acabado de ouvir.
- Veja só que machão arrogante e autoritário! - ela falou alto, sem perceber que Mark estava logo atrás dela.
- Hussein? Que foi que ele disse?
Mas Tânia já tinha atingido seu limite de paciência com esses machões que se intrometiam em sua vida.
- Como se atreve a ouvir minhas conversas? - protestou, furiosa. - Minha vida particular é só minha e não vou tolerar nenhuma interferência.
- Sabe que fica ainda mais bonita quando se zanga, Tânia? O que ele queria? Saber se você estava impressionada pelo seu gesto grandioso? Foi mesmo um grande
gesto, não foi?
Tânia achou melhor ficar muda. Quem sabe assim Mark se convencia de que não pretendia dar satisfações de sua vida?
- A chamada era de Bahrain. Tem idéia de que hora do dia é agora por lá? - ele insistiu.
O telefone tocou de novo, cortando a conversa para alívio de Tânia. Em dois passos Mark alcançou o aparelho, e Tânia aproveitou para sair da sala. Aquele
homem estava mostrando uma tendência insuportável a controlar sua vida. Às vezes, tinha a impressão de que havia perdido o controle sobre o seu próprio destino,
o que não a deixava nada satisfeita. Será que ele não desconfiava de seu atrevimento? Tânia suspirou, desconfiando que não.
Ma Ruddy percebeu sua expressão zangada e apressou-se a levá-la para cima, para conhecer o quarto que seria dela.
- Pa vai trazer sua mala até o quarto - ela disse. Pa, deduziu Tânia, devia ser o marido dela.
Ma empurrou uma das portas de veneziana e introduziu Tânia em um quarto lindo, com teto alto e grandes janelas com cortinas de cetim. Era todo decorado em
tons de pêssego e ouro. A cama era enorme, coberta com uma colcha em tecido igual ao das cortinas. Ma abriu outra porta, que dava para um quarto de vestir com grandes
armários e espelhos e também para o banheiro. Este, parecia saído de um sonho. Era pequeninho, mas muito bem decorado com plantas espalhadas por toda parte e um
boxe de vidro, que deixava à mostra uma banheira grande, redonda.
- Mark sempre traz pessoas importantes para cá - disse Ma, como se a cama fosse dela e não da United. - Agora, não há ninguém além de você. Vamos fazer uma
boa amizade, vai ver só.
- Pois eu não sei se isso é uma boa idéia - Mark disse, de repente, da porta. Ele estava encostado no batente e olhava sério para a empregada. - Tome cuidado,
Ma.
Ela riu, sem se impressionar.
- Está tentando conquistar esta menina, não está, seu danado? Mas olhando para ela, posso adivinhar como será um pouco mais difícil do que de costume.
Mark chegou perto de Tânia e colocou a mão em seu ombro.
- Este quarto está bom para você, Tânia? Gosta dele?
Ela tentou fugir daquele contato, mas ele a prendeu com mãos firmes. Parecia decidido a ter uma resposta.
- Gostei muito - Tânia admitiu, com raiva dele.
- Muito bem. Agora tenho que ir. Vou dizer a Greg para trazer seu carro para cá. É um modelo americano, mas não tem qualquer mistério. Greg mostrará a você
como dirigir. Acha que é capaz de fazer isso sem mim?
- Vai ficar fora muito tempo? - Tânia perguntou. Em seguida se condenou por demonstrar tanto interesse por Mark.
Ele a olhou, surpreso.
- Não sei, por quê? Vai sentir saudades?
Havia um indisfarçável clima de sensualidade entre os dois. Mark olhava para Tânia de um jeito, que ela tinha a impressão de que ia derreter. Não queria
que ele percebesse isso, mas por mais esforço que fizesse, não conseguia se controlar totalmente. Afinal, não era nenhum robô, ela se consolou.
Ma olhava os dois sem dizer nada, parecendo entender que havia uma coisa misteriosa no ar. Por causa dela, Tânia queria conservar a dignidade e se esquecer
de Mark, mas com ele ali tão perto, parecia impossível. Ele a olhava nos olhos e ela fazia força para sustentar seu olhar. Mas a onda de magnetismo que aquele olhar
transmitia era tão forte, que Tânia abaixou os olhos para o chão, perturbada como nunca.
Tentou mais uma vez escapar da mão de Mark que a prendia. Ele puxou-a para mais perto e tocou sua boca com os dedos, num carinho suave. Tânia ficou louca
de desejo. Não conseguia explicar, mas bastava Mark encostar a mão nela para seu corpo inteiro vibrar pedindo o dele! Agora, tinha até esquecido a presença de Ma.
Era como se só existissem ela e Mark naquele quarto.
- Não vou demorar, preciso passar uns dias na Califórnia - Mark resolveu, afinal, contar. - Quero que você sinta saudade minha, Tânia - ele completou, levantando
o queixo dela com um dedo. De novo, como lá no hotel em Londres, Tânia teve a impressão de que ia beijá-la. Não beijou. Dando um sorriso matreiro, ele tocou a covinha
no rosto dela e foi embora rapidamente.
Ma pigarreou e foi abrir a mala de Tânia sem fazer qualquer comentário. Também, o que ela poderia dizer?, Tânia pensou. Agora estava mais claro do que nunca
que havia algo de especial que a ligava a Mark. Se isso era evidente até para Hussein, por que não seria a Ma, que conhecia Mark a vida toda e, provavelmente, era
uma boa observadora?
Mark, Mark. Tânia repetia aquele nome mil vezes, enquanto ajeitava suas roupas no quarto. Como ele tinha conseguido interferir tanto na sua vida, fazendo-a
esquecer-se de Kurt, deixando-a perturbada só com sua presença? Ele devia ser um conquistador irresistível, desses capaz de deixar uma mulher sem fôlego. Afinal,
ela, Tânia, não era nenhuma garota inexperiente. E havia se envolvido perdidamente nas malhas de Mark Anders... Como podia escapar dele antes que fosse tarde demais?
Ou será que era melhor desistir de lutar contra ele?
Tânia dormiu profundamente até a manhã seguinte. A casa estava quieta quando acordou. Tomou um banho e vestiu uma calça jeans, a mais velha que tinha, e
uma camiseta vermelha. Deu uma rápida escovada no cabelo, sem se preocupar em se maquilar. Queria sair logo. O dia estava lindo lá fora.
Chegou lá embaixo a tempo de ver Greg entrando com suas botas de cowboy. Ele empurrou para trás seu grande chapéu de vaqueiro, correu os dedos pelos cabelos
rebeldes e abriu um grande sorriso.
- Dra. Tânia Cameron - disse, solenemente -, você é uma bênção para estes olhos cansados. Se não se ofende com o que digo, saiba que nunca vi uma mulher
ficar tão bonita de jeans.
- Greg Sims, você vai direto ao ponto. - Ela sorriu. Como podia resistir a Greg?
Ma apareceu na porta.
- Mark vai saber se você não tratar muito bem da srta. Cameron, ouviu, Greg? Já sei que está de barriga vazia e doido para que eu satisfaça seu enorme apetite.
- Isso mesmo, Ma. - Ele passou o braço forte pelos ombros de Tânia e levou-a para a sala, passando pela empregada. Na passagem, estalou um beijo na bochecha
gorducha de Ma. - Você sabe que eu sou incapaz de resistir a qualquer coisa que ponha na mesa. Quando é que vai servir?
A sala onde eles estavam era arejada e agradável, com mobília de cana-da-índia pintada de branco e cheia de plantas, espalhadas em vasos pelo chão, em cima
de mesinhas ou penduradas no teto. Já dava para sentir no ar o cheiro maravilhoso da comida de Ma. Greg sentou e jogou seu chapéu de abas largas sobre o móvel ao
lado, sem se preocupar com Tânia.
Ma fez uma cara zangada.
- Greg, acho que nunca vai aprender a ter modos.
- Acho que nunca, Ma. Isso é o que Ginny Lee sempre diz. - Tânia percebeu uma ponta de tristeza por trás da brincadeira. Ma também notou.
- Aquela outra! - ela resmungou com pouco-caso. - Não tem um pingo de bom senso naquela cabeça. - Indignada, sumiu da sala. Greg riu e ofereceu suco de laranja
a Tânia. Estava na mesa, em uma jarra de cristal, maravilhosamente gelado. Ma voltou trazendo, numa grande bandeja, panquecas, bacon, dois filés e suflê de cenoura.
Tânia examinou as panquecas, meio desconfiada. Pouco se assemelhavam aos delicados crepes que sua mãe fazia. Será que eram gostosas?
Ficou horrorizada com Greg, que amontoou várias no prato, depois espalhou manteiga sobre elas, derramou uma geléia e, por cima de tudo, colocou várias tiras
de bacon.
- Não me diga que nunca provou essa comida, Tânia? - ele perguntou, vendo a cara espantadíssima que ela fazia, sem conseguir disfarçar sua surpresa.
- Panquecas e esse xarope sou capaz de entender. Mas bacon? Meu Deus!
- Garota, as panquecas de Ma com bacon são um manjar dos deuses. Prove só. Dou minha palavra de cavalheiro e de entendido em assuntos gastronômicos que você
vai gostar.
- Não aceite a palavra dele para nada, srta. Cameron - Ma avisou. Vinha chegando com um bule de café quentinho e cheiroso. - Greg não tem um parafuso certo
na cabeça. Além disso, não percebeu que está se exibindo?
- Ora, Ma, você está dando a esta senhorita uma impressão completamente errada de mim - ele protestou, já começando a se deliciar com a comida.
- Espero que a srta. Cameron seja capaz de formar sua própria opinião. Por isso mesmo, veja seus modos e comporte-se, se deseja impressioná-la bem.
Tânia ria para os dois.
- Ê melhor também me chamar de Tânia, Ma - ela pediu. - Que geléia deliciosa é essa?
- Geléia de morango. Mark manda buscar direto de Vermont.
- Nunca provei nada tão delicioso. Geralmente ponho um pouco de limão e açúcar nas panquecas. Isso é uma delícia!
- Genuínas delícias americanas. Um segredo bem guardado que herdamos de nossos antepassados, que por sua vez o roubaram dos índios!
- Sua comida é divina, Ma! - Tânia elogiou, sincera.
- Que é isso, menina! É comida trivial - disse Ma, modesta.
- Sim... Se continuar fazendo essa sua comidinha trivial, vou virar um barril.
Depois que acabaram de comer, Greg levou Tânia para ver o carro e receber todas as instruções necessárias para dirigi-lo. Era um brilhante conversível vermelho,
totalmente novo. Greg avisou que ela merecia esse privilégio por fazer parte da equipe de Mark e se recusou a guiar o carro, dizendo que Tânia precisava aprender
logo.
- Então, é meu dever preveni-lo: não sou apenas uma mulher dirigindo. Sou também inglesa. Portanto, costumo dirigir do outro lado da estrada e do outro lado
do carro. Como vê, suas chances de sobrevivência não são muitas - ela brincou.
Tânia passou duas horas tentando se habituar a ficar do outro lado da pista e aprendendo as malícias do temperamental carrinho vermelho. Acostumada com outro
tipo de carro, a princípio achava tudo muito difícil. Finalmente recebeu a aprovação de seu professor.
Ela gostou de Greg. Era cativante e simpático, mas não tinha aquele ar de conquistador de plantão que a irritava profundamente.
Terminada a lição, Greg a levou para os escritórios centrais da United. Tânia havia conhecido o escritório de Londres, e, portanto, estava esperando encontrar
instalações luxuosas. Não se decepcionou. Era um prédio imponente, com um enorme hall de portas de vidro, chão de mármore e uma dezena de elevadores.
Greg lhe explicou quais departamentos que funcionavam em cada setor. O dela, diretamente ligado aos novos projetos de exploração e produção, ficava no último
andar. Evidentemente, Tânia passaria a maior parte de seu tempo nas plataformas em alto-mar, mas teria seu escritório em terra. "Todo marinheiro precisava de um
porto seguro", ela costumava dizer.
Depois de percorrerem vários andares, eles pararam diante de um elevador. Quando a porta se abriu, saiu um homem alto que sorriu ao vê-los.
- Oi, Greg! - Ele não tirava os olhos de Tânia. - Não pense que vai entrar neste elevador sem me cumprimentar. Todo dia você corre atrás de mim, em geral
para pedir dinheiro. Hoje, insisto que fique.
- Não preste atenção nesse palhaço, Tânia. É apenas um trabalhador desqualificado que Mark contratou como geofísico, por pena. Sua mãe o chama de Johnson
Tait Johnson, não se sabe por que razão. Nós o chamamos de Sandy. Ele tem uma fileira de letras esquisitas depois do nome, só porque é doutor em filosofia.
Tânia deu uma risada e apertou a mão do estranho.
- Eu sou Tânia Cameron - ela se apresentou.
- Ela é nossa nova engenheira de operações em alto-mar - explicou Greg.
- Muito prazer em conhecê-la, srta. Cameron. Mas veja, deve escolher melhor suas companhias. Uma pessoa precisa cuidar de sua reputação, ou se prejudica
facilmente. - Ele olhou para Greg com cara de horror.
- Alguns homens são os piores inimigos de seus infelizes amigos - Greg sentenciou, fazendo uma careta.
Sandy riu e entregou a Greg um maço de relatórios.
- Foi bom te encontrar. Mark quer que viaje para a Califórnia agora mesmo. Precisa de você lá.
Greg ficou subitamente sério, passando os olhos pelos papéis.
- Bom, então é melhor me apressar. Ia apenas apresentar a dra. Cameron àquele bando com o qual está condenada a trabalhar, lá em cima. Pode fazer isso para
mim?
- Vá tratar logo de seus negócios. A nossa linda doutora está em mãos seguras.
Só quatro dos elevadores serviam o último andar e davam num hall forrado por um macio carpete cor de mel. Sandy cumprimentou o porteiro, que puxou uma lista
da gaveta para verificar se o nome de Tânia estava lá. A identificação das caras novas era rigorosa na United.
Uma vez liberados, Sandy empurrou a pesada porta de vidro, depois outra, e finalmente introduziu Tânia em seus novos domínios. Foram andando por um corredor
larguíssimo, para onde davam dezenas de salas, cada uma com uma etiqueta de identificação na porta. Toda hora uma delas se abria, mostrando uma atividade absolutamente
fervilhante. Um monte de gente passava de lá para cá, segurando papéis, livros, calculadoras.
O corredor terminava no conjunto de escritórios de Mark Anders. Sandy deu uma batidinha e entrou. Tânia ficou impressionada com a vista fantástica que se
tinha dali; as enormes janelas de vidro iam quase até o chão, mostrando o mar azul-marinho do golfo do México.
Ela já tinha visto, entre uma e outra porta que se abria quando estava passando pelo corredor, que todos os escritórios davam para o mar. Mas provavelmente
nenhum possuía uma paisagem tão fantástica. Aquela era a posição mais privilegiada para se ter um escritório. Bem, precisava admitir que Mark Anders não devia ser
pouca coisa na United Petroleum.
Sandy a levou até uma jovem de olhar doce que comandava vários telefones, interfones, vídeos e arquivos. Tinha uma aparência tranqüila, mas parecia bastante
eficiente. Tânia sentiu uma simpatia instintiva por ela.
A jovem sorriu, quando viu os dois, e levantou imediatamente.
- Apresentando a dra. Tânia Cameron - Sandy disse, batendo continência.
Ela estendeu as duas mãos.
- Eu sou Karen Prescott, a secretária executiva de Mark e também sua assistente pessoal. Deixe-me mostrar-lhe a sala de Mark. - Karen abriu a porta bem atrás
da mesa dela. Era um escritório amplo, com duas poltronas, estantes por toda a parede e duas mesas de trabalho, grandes.
- Mark quer que trabalhe aqui, se não se incomoda. Ele gosta de ter contato direto com os principais envolvidos, quando o projeto está no começo. Se achar
que precisa de mais espaço ou mais privacidade, nesta casa de doidos, tem apenas que pedir um escritório particular. Ali do lado é a salinha de telex, onde Mark
também tem um microcomputador.
A vista era absolutamente espetacular. Tânia movia-se em um ângulo de noventa graus nas duas paredes de vidro e olhava toda a cidade. Um largo lençol d'água,
como um lago, estava a esquerda, e além dele, o sol cintilava atrás da torre de controle do aeroporto. A praia estendia-se por quilômetros com o azul brilhante do
golfo do México, enchendo o horizonte.
Tânia suspirou e disse para a jovem a seu lado:
- Não me responsabilizo por minha concentração no trabalho, diante dessa paisagem. Eu geralmente trabalho em uma cabine apertada numa plataforma, no meio
do mar, e o meu trabalho em terra costuma ser executado em lugares que se assemelham muito a um alojamento de quartel.
- É, Mark nos trata muito bem. Mas arranca de nós tudo o que podemos dar. - Sandy falava sério, embora seus olhos brincassem. - Temos uma reunião na sala
de conferências, em uma hora. Deixo você com Karen, que pode lhe apresentar o pessoal com quem vai trabalhar. Depois nos encontramos de novo, na reunião. Está bem
para você?
- Perfeitamente, sr. Johnson.
- Chame-me de Sandy. - Ele piscou e sumiu.
Karen riu e levou Tânia para uma sala enorme, ao fundo. Todo o equipamento da companhia era moderníssimo, especialmente ali, onde ficava o sistema de microondas
de controle de vôo. Esse sistema era usado pelo piloto do helicóptero, que estava na cobertura do prédio, bem em cima deles.
- Esse sistema permite ao piloto levantar o helicóptero com qualquer tempo - explicava Karen. - Isso assegura que as equipes de trabalho sejam trocadas normalmente,
sejam quais forem as condições meteorológicas.
Tânia se lembrou de Frank. Ele era o piloto-chefe da companhia. Então não seria esta a Karen por quem estava apaixonado? Arriscou a pergunta:
- Quem é mesmo o piloto-chefe da United, Karen?
- Ele é Frank de La Cruz - disse Karen, ficando vermelha. - É muito bom piloto e trabalha na companhia há muito tempo, por isso não se preocupe.
Tânia sorriu para ela. Não tinha mais dúvida. Era mesmo a Karen que estava envolvida com o simpático piloto.
- Tenho certeza de que ele deve ser muito bom, para trabalhar para Mark Anders - Tânia murmurou.
Karen sorriu, feliz.
- Você já conhece bem Mark. - Ela puxou uma porta que levava ao corredor lateral. Depois continuou falando: - Mark é incansável no trabalho. Ele exige um
alto nível do pessoal que contrata, mas é um homem bom e aprecia o esforço de cada um. Bem, este é o salão de conferências.
Pararam um pouco diante da porta do salão e Karen mais uma vez explicou:
- Você não conhece Mark há muito tempo, conhece? Ele é uma pessoa maravilhosa. Sempre tem tempo para cada um que trabalha para ele. Isso é fora de comum
nas grandes corporações. Agora, está pronta para conhecer a quadrilha com quem vai trabalhar?
Tânia riu. Estava se sentindo mais em casa do que nunca. Karen tocou um botão. A porta abriu eletronicamente. Já havia muita gente dentro do salão e outras
começavam a chegar. Karen apresentou Tânia a todo o grupo presente e saiu da sala.
Ela conheceu cada um, aprendeu sua posição no grupo, discutiu com eles alguns aspectos do funcionamento da empresa e, então, desceu para trabalhar. Fatos,
números e projeções flutuavam ao redor de sua mesa, na ordem que eram pedidos. Em poucas horas, Tânia tinha conseguido o respeito do grupo, e antes do fim do dia,
era parte integrante dele.
Já era tarde quando chegou em casa. Não teve nenhum problema em achar o caminho de volta. Não era difícil andar em Dallas. Tânia encontrou um jantar delicioso,
que Ma havia preparado. Comeu e depois deu um longo passeio pela praia deserta.
O ar estava morno, quase refrescante, o que, segundo Ma Ruddy, era fora do normal nesta época do ano.
- O mar fica assim por uns tempos - explicou Ma, com seus modos tranqüilos. - Então sopra um daqueles malditos ventos do norte e nos gela até a alma. Aqui,
quando dá para esfriar, faz frio de verdade. E chove muito.
- Mas é muito melhor do que ter sempre tempo ruim. Já vivi em lugares onde ele é ruim constantemente - comentou Tânia.
As rosas de Hussein tinham enchido a frente da casa e ainda estavam lá, conservadas pelos cuidados de Ma. Tânia deu ordem à empregada para que mandasse as
flores para dois hospitais da cidade. Estava encabulada com aquele gesto extravagante do príncipe e esperava que não se repetisse.
No sábado, Tânia foi fazer compras. Encontrou uma loja com coisas exatamente de seu gosto e comprou uma porção de vestidos e sapatos. Andou pelos arredores
de Galveston, explorando a ilha e adorando tudo.
No dia seguinte, recebeu um telefonema de Mike Lane, que estava em Dallas.
- Conseguiu rápido meu número, hein? - Ela se admirou.
- Tenho meus informantes. Quero vê-la na quinta-feira.
- Acho que não vai ser possível, Mike. Estamos a ponto de começar uma exploração e ando terrivelmente ocupada.
- Vai achar tempo. Até quinta. - Desligou, sem dar a ela a chance de protestar.
Bem... realmente! Tânia olhava o telefone, contrariada. O que estava havendo com ela? Cada homem que conhecia parecia determinado a controlar sua vida. Mike
veria só! Simplesmente não ia aparecer no encontro. Mas ela no fundo sabia que não faria isso, pois estava começando a gostar das atenções dos homens simpáticos
que, de repente, começavam a aparecer em seu caminho.
Na segunda-feira Tânia trabalhava com Karen nos dados que seriam entregues ao analista do computador, Dick Handy. A porta se abriu e ambas levantaram a cabeça
para ver quem era: uma linda mulher olhava friamente as duas, balançando seus cabelos cor de cobre, semilongos.
- Alô, Karen. Soube que agora trabalha para Mark. Onde está ele, se posso saber?
- Está fora a negócios - Karen respondeu com educação, mas sem qualquer simpatia. - Vai demorar uns tempos.
- Se quer trabalhar para Mark, tem que aprender boas maneiras, senhorita. Eu perguntei onde ele está. Vai ser melhor para você se me disser.
Karen levantou-se com calma dignidade e foi até a porta.
- A dra. Cameron não tem a menor obrigação de ficar ouvindo seus desaforos, Virgínia Lee. Quer vir comigo, por favor?
- Não, não quero - a mulher disse, encostando seu corpo perfeito na porta. Vestia uma calça bem moderna, cor de canela, e uma blusa de seda cor de palha,
aberta o suficiente para mostrar o começo da curva de seu busto firme. Sua pele parecia a de um bebê. Sem dúvida, era deslumbrante. Tânia tentava adivinhar por que
tinha tanto ódio no olhar.
Ela olhou para Tânia, parecendo só então vê-la.
- Então é a dra. Cameron. Eu imaginava como você seria. Não pensei que fosse tão bonita. Isto não vai ser bom para você, trabalhando com Mark e Greg.
Tânia ficou espantada e não falou nada. Achou Virgínia Lee extremamente vulgar.
Dirigindo-se a Karen novamente, ela acrescentou:
- Será melhor para você se aprender a responder às minhas perguntas, Karen. Mark não vai permitir que seja rude comigo. - Saiu, deixando no ar seu caríssimo
perfume.
Tânia olhou para Karen e riu. Não podia se agüentar, pois nunca tinha visto ninguém tão petulante.
Karen também caiu numa gostosa risada.
- Mark vai achar mesmo ruim se souber que você colocou a madame em seu lugar? - Tânia perguntou.
- De modo algum, estou aqui porque sou uma secretária eficiente e não divulgo por aí onde meu chefe está nem suas coisas particulares. Virgínia está classificada
no item "geral", então para ela nada de informações. Na verdade, estou esperando Mark a qualquer momento. Frank enviou um rádio há alguns minutos dizendo que vão
aterrissar em meia hora.
O coração de Tânia pulou, estranhamente emocionado. Sem graça, achando que Karen ia perceber o fenômeno, mexeu numas folhas de papel e mudou de assunto.
- Então essa é a mulher de Greg. Ela é linda mesmo.
- Bonito é quem se faz bonito. Essa beleza aí é exterior, não vale nada.
Tudo indicava que Karen não gostava de Virgínia.
- É melhor entregar logo isto a Dick Handy. É o que falta para ele programar o grande computador.
Enquanto Karen se afastava, Tânia ficou pensando na estranha reação que teve ao ficar sabendo da volta de Mark. Por que havia reagido daquela forma? Com
grande dificuldade, conseguiu se concentrar no monte de relatórios que tinha em sua mesa, fazendo de tudo para não levantar os olhos ao menor ruído que ouvia. Por
fim, conseguiu se concentrar no trabalho. Estava totalmente absorta no que fazia, quando percebeu uma sombra parada em sua frente.
- Foi dureza - Mark comentou baixinho, mostrando-lhe mais uma pilha de relatórios. - Trouxe mais trabalho para você.
Tânia sorriu, feliz demais para conseguir dizer alguma coisa. Mais uma vez sentia-se perturbada com a presença de Mark. A chegada dele lhe provocava uma
inesperada alegria.
- Foi dureza mesmo - Mark repetiu. - Já viu o resultado da análise destes relatórios?
- Não, você acha que já temos algum indício?
- Talvez.
Tânia reparou que Mark estava frio, com a cabeça só no trabalho. Ele pegou a sua cópia do relatório e leu tudo, depois pediu a ela que o acompanhasse até
a mesinha do microcomputador. Duas horas depois, ainda estavam lá, discutindo o projeto, tentando classificar, analisar e chegar a conclusões.
Tânia estava impressionada com a competência daquele homem e sua incrível capacidade de absorver conhecimentos para utilizá-los depois. Não importava que
ele fosse tão convencido.
Já estava escuro quando ele finalmente se levantou, espreguiçou-se e deu a Tânia um olhar satisfeito.
- Eu acho que a senhora preenche todos os requisitos, dra. Tânia Cameron- ele brincou, massageando a nuca. - Tem uma inteligência aguda.
- Oh, muito obrigada, estou feliz por agradá-lo, senhor.
- De verdade, Tânia? Então me agrade e venha jantar comigo.
- Oh! - Ela ficou um momento surpresa e depois agarrou a primeira desculpa que encontrou: - Não posso, o jantar já deve estar pronto a esta hora.
Mark sorriu e estendeu a mão para o telefone. Tânia soube imediatamente que estava perdida. Ma não ia resistir a ele: ia lhe garantir que não teria o menor
problema em levar Tânia para jantar. Ela ficou confusa com isso e, ao mesmo tempo, aliviada com a atitude de Mark. No fundo, bem no fundo, precisava admitir que
queria desesperadamente jantar com aquele homem.
- Vamos indo, Tânia? Estou morto de fome.
Tânia rendeu-se ao charme de Mark e sorriu para ele.
- Tenho que mudar de roupa. Estou horrível assim.
- Se todas as mulheres da terra fossem horríveis como você, nenhum homem perderia seu tempo em busca de petróleo, princesa. Você está ótima assim.
Mark propôs que fossem a um restaurante em Houston. Tânia achava incrível a idéia de percorrer oitenta quilômetros só para jantar.
- Você é um louco, Mark - ela protestou. - Andar a mesma distância entre Oxford e Londres só para comer!
- Essa distância até que não é muito grande. Às vezes vou até San António para comer no meu restaurante favorito, perto do rio. Vou levar você lá, algum
dia.
- Acho que não vai me levar nada. Estou trabalhando demais, não me sobra energia para fazer uma viagem dessas só para comer. Vim aqui para trabalhar, lembra-se?
- São apenas quatrocentos quilômetros. É só uma manhã inteira dirigindo. - Ele ria da desaprovação dela.
Depois de ajudá-la a descer do carro, quando chegaram, ele ficou segurando a mão dela. Tânia sentiu um arrepio na espinha mas manteve-se firme: não retirou
a mão. Estavam na famosa Galeria, uma espécie de shopping center de artes e diversões, luxuosíssimo. Candelabros pendiam do teto, havia uma pista de patinação no
gelo, cinemas, teatros, galerias de arte, lojas de decoração e diversos restaurantes.
Mark não lhe deu muito tempo para apreciar tudo. Estava com fome e a levou direto para um restaurante pequeno, mas muito luxuoso, com serviço impecável e
comida deliciosa.
Uma hora mais tarde, Tânia teve certeza de que Mark estava de fato flertando com ela. Olhava-a com olhar derretido, sorria o tempo todo, elogiava-a e acariciava
sua mão de vez em quando. Aquela voz, dizendo palavras adoráveis e aquele sorriso deslumbrante, agia como um verdadeiro afrodisíaco para Tânia.
Ela fazia o maior esforço para não se envolver. Afinal, estava ali para trabalhar e não para namorar seu chefe num restaurante à luz de velas. Mas era difícil
resistir.
- Hora de voltar para casa, Tânia.
A declaração de Mark teve um estranho efeito sobre ela. Ficou pensando em como seria fazer parte da vida dele e ir, realmente, para casa com ele. Descendo
pela escada rolante junto com Mark, ela tomou uma decisão: precisava mantê-lo longe, estava se envolvendo demais com aquele homem, deixando que seus sentimentos
por ele crescessem muito. E o que poderia esperar de Mark? Nada, provavelmente. Portanto, era melhor afastá-lo.
Resistiu ao impulso de relaxar no assento macio do Jaguar. Sentou-se reta, com os olhos na estrada, e começou a fazer perguntas técnicas a Mark.
Ele tinha um ar divertido, de quem percebia tudo, mas respondia com toda a seriedade, dando-lhe as explicações necessárias.
Ma tinha deixado a luz da varanda acesa. Tânia saiu rapidamente do carro e virou para agradecer o jantar a Mark. Mas ele já estava a seu lado.
- Ma me arrancaria a pele se eu fosse negligente com meus deveres para com uma mulher. Ela passou a vida tentando ensinar boas maneiras a Greg e a mim. -
Segurou o braço de Tânia, ajudou-a a subir os degraus, abrindo a porta da casa para que ela passasse.
Entraram e Tânia parou no hall, com o coração aos pulos, totalmente embaraçada: o hall estava novamente cheio de rosas, desta vez, amarelas!
Mark resmungou baixinho, vendo aquilo. Em seguida agarrou Tânia, puxando-a para seus braços.
- Durma bem, Tânia - disse, depois de beijá-la.
Tânia não conseguia se mover, depois que ele foi embora. Tinha a sensação de que Mark ainda estava ali, nos seus braços. Ficou parada um tempão naquele lugar,
pensando no beijo dele.
Suspirou profundamente e foi para cima, completamente esquecida das rosas que perfumavam todo o hall.
Sem dúvida, Mark é um mestre na arte de seduzir, ela pensava, enquanto tomava um chuveiro e caía na cama. Adormeceu sentindo o calor daquele beijo suave,
que só tinha lhe deixado boas lembranças.
Na manhã seguinte, quando desceu para o café, Mark estava sentado à mesa. Na frente dele, via-se uma omelete que parecia deliciosa.
- Bom dia! - ele a cumprimentou, passeando os olhos pelo corpo de Tânia, vestido com um jeans justíssimo. - Ontem nós esquecemos de pegar seu carro no escritório,
então passei para te dar uma carona e matar minha vontade de comer a omelete de Ma. - Ele deu um sorriso encantador.
- Muito obrigada. Nem lembrei que o carro tinha.ficado lá. - Sentou-se perto de Mark, enquanto Ma trazia um prato.
- O que vai fazer com todas essas flores que o tal árabe mandou de novo, Tânia? - Ma quis saber.
- Por favor, Ma, ponha nos vasos e espalhe pela casa, como da outra vez.
- Ele ligou ontem à noite. Lá pelas nove. Pareceu surpreso por você ter saído com Mark. - Ma percebeu a fúria que essas palavras provocaram em Mark e sorriu,
divertida, abanando a cabeça.
- É? - Tânia passava manteiga na torrada, com exagerada atenção. - O que foi que ele disse?
- Não muito. Mandou lhe dizer que vem logo. Só isso.
Tânia olhou para Mark que parecia impassível.
- É verdade - disse ele. - Hussein vem com uma equipe de técnicos, inclusive alguns que estavam naquela recepção em Londres, para nos assessorar numa operação.
- Quando eles vão chegar? - Ela fez a pergunta parecer impessoal.
- Não foi marcada ainda uma data definitiva. Vai levar ainda alguns dias até que fique tudo acertado. Esta omelete está uma delícia, Ma!
Tânia percebeu que Mark queria mudar de assunto. Ficou meio constrangida, mas não soube o que falar. Além do mais, pensou com raiva, ele não tem que se meter
no meu relacionamento com Hussein.
- Posso perguntar o que fez com as rosas vermelhas, Tânia? - ele perguntou de surpresa.
Ma respondeu, entrando com um prato de pãezinhos de queijo.
- Ela mandou tudo para o hospital. Olhe só, feitos especialmente para você, seu malandro. Veja se não come sozinho e dá para Tânia.
- Comida de rei! - Ele parecia imensamente feliz. Ofereceu os pãezinhos a Tânia e mordeu um gulosamente.
Terminaram de comer, deram adeus a Ma, foram para o escritório e mergulharam instantaneamente no trabalho. Estavam na fase final, que exigia uma total concentração
de esforços. Logo, as turmas estariam trabalhando noite a dentro.
Com freqüência, quando Tânia levantava os olhos do trabalho, surpreendia Mark observando-a, pensativo.
Capítulo IX
Na tarde de quinta-feira, Karen entrou na sala de reuniões para anunciar um visitante. Tânia levantou o rosto do trabalho e deu de cara com Mike Lane.
Ela tinha esquecido do inglês. Rindo, apresentou-o a Karen, que o cumprimentou e saiu da sala encantada.
- Ria, se deseja, minha garota - ele disse, imitando o estilo dos vilões do cinema -, mas fique avisada! Você não me escapa! Está destinada a cair nas minhas
garras!
- Ora, Mike Lane, você é um bobo. - Tânia levantou e o abraçou, virando a cabeça para evitar um beijo.
Ele chegou bem perto dela e continuou brincando:
- Não faça pouco de mim, a menos que esteja pronta a pagar por isso. - Mike olhava fixamente para a boca de Tânia, que percebia claramente que ele pretendia
beijá-la.
Neste momento, Mark entrou. Os dois homens se cumprimentaram com frieza.
- Gostaria de pedir sua engenheira emprestada, se permitir, Anders. Tenho que voltar a Dallas antes da meia-noite de hoje. Perdoe-me se estou interrompendo
o trabalho de vocês, mas como avisei antes, pensei que ela estaria livre.
Mark olhou Tânia, mostrando indiferença.
- Você tem trabalhado demais, Tânia. Pode tirar uma folga hoje.
Esperando tudo, menos a concordância de Mark, Tânia tentou inventar uma desculpa. Não queria sair com Mike. Não sabia direito por quê, mas não queria.
- Muito obrigada, Mark. Mas... mas... eu preciso acabar estes relatórios amanhã... para a reunião, não é?
- Esqueça isso. Dou um jeito.
Mark sentou-se, apanhou alguma folhas e fez um gesto para despedi-la. Tânia sentiu vontade de dar um soco em Mark, mas com que justificativa?
- Obrigado, velho - ela ainda ouviu Mike dizer, quando já saíam da sala deixando Mark mergulhado no trabalho.
Felizmente, Mike não lhe deu muito tempo para se preocupar com Mark. Era um brilhante contador de histórias. Sabia casos muito engraçados dos passageiros
que carregava para os lados do Atlântico. Ele conseguia imitar diversos sotaques, com toda facilidade. Tânia passou algumas horas bem agradáveis com ele.
Já era tarde quando Mike a levou de volta para casa. O táxi esperou, enquanto ele dava um beijo de boa-noite. Tânia ainda ficou na varanda vendo o carro
desaparecer, com o rosto pensativo. Ela gostava de Mike Lane. Ele era atraente, simpático, boa companhia. Por que então tinha ficado como uma estátua quando ele
a beijou?
Na manhã seguinte, encontrou Mark com uma cara péssima no escritório.
- Ainda bem que Mike levou você para casa a tempo de dormir o suficiente para trabalhar hoje.
- Estou certa de que Ma aprovou as maneiras dele. Agora, as suas deixam muito a desejar.
Mark jogou uma pasta sobre a mesa dela, sem se dignar a lhe dar uma resposta.
- Este é o relatório que você abandonou a noite passada. É sua responsabilidade discuti-lo na reunião desta manhã. Eu quero que saiba exatamente o que contém
e se alguma dessas informações podem alterar nosso cálculo de custo.
Tânia espumava de tanta raiva, precisava prender o fôlego para se conter.
- Você pensa que eu sou capaz de fugir à minha responsabilidade? Tenho feito muitas horas extras neste projeto, não tenho?
- Tem mesmo, é? Bem, nós esperávamos que fizesse, apesar das exigências de sua atribulada vida amorosa.
- Caso se lembre, foi por insistência sua que eu parei de trabalhar ontem à tarde. Esqueci que Mike estava chegando, mas não tinha combinado sair com ele.
Não marquei nada pelo telefone. Ao contrário: disse que estava ocupadíssima.
- Então ele tem telefonado para você? Liga cada vez que chega a Dallas, suponho?
- Então supõe erradamente! - Ela abriu a bolsa, de onde tirou um bloco amarelo cheio de anotações. Depois bateu a gaveta, com os olhos fuzilando. - Karen
me disse que você me providenciaria um escritório particular se eu tivesse dificuldade de trabalhar aqui. Por favor, faça isso. Sou completamente incapaz de me concentrar
nas atuais circunstâncias - ela desabafou afinal, louca da vida. Depois desse discurso, saiu batendo a porta.
- Para onde está indo? - Mark correu e abriu a porta. Estava surpreso e ansioso, parado atrás dela.
- Vou trabalhar no salão de reuniões, até que me arranje uma sala privativa.
A reunião começou com atraso, mas correu bem. Greg não estava, ainda não tinha voltado de viagem.
Virgínia deve estar louca atrás de notícias dele, Tânia pensou, maldosa.
Já havia anoitecido e a cidade estava coberta por um nevoeiro denso, quando eles acabaram de discutir. Karen tinha ido embora há muito tempo. Tânia decidiu
ir também. Pegou suas coisas e foi para o hall. Mark alcançou-a um segundo antes de ela entrar no elevador e colocou a mão em seu ombro.
- Quer vir pescar comigo amanhã à tarde, Tânia? - ele perguntou, amável.
Tânia continuava zangada com Mark, apesar de ele ter sido ótimo na reunião. Nas poucas perguntas em que ela se atrapalhou, ele a ajudou brilhantemente. O
problema é que nada dava certo com Mark fora das horas de trabalho. Sabia que não podia correr o risco de sair novamente com ele, por mais que quisesse.
- Não, creio que não. Prefiro escolher minhas atividades e minhas companhias - ela disse, decidida.
Não havia nada no contrato com a companhia que me obrigasse a ser amável com Mark Anders, disse a si mesma, quando entrou no carro. Até chegar em casa, já
tinha deixado Mark de lado e antecipava o prazer de passar um fim de semana completamente livre.
Mark havia dado folga, finalmente, a todo o departamento. Ele queria que todos estivessem descansados na segunda-feira.
Ela passou horas conversando com Ma, no sábado, colocou seu guarda-roupa em ordem, passeou à toa pela casa, escreveu cartas, adorando poder dispor finalmente
do seu tempo.
Foi dar um passeio até a praia, já no fim da tarde. Prometeu a Ma voltar para o jantar, mas assim que saiu se arrependeu: talvez quisesse comer fora, algo
assim. Mas, tudo bem. A comida de Ma era ótima e valeria a pena voltar.
O golfo era um emocionante festival de cores. O azul do mar era escuro e misterioso, a mata uma variante em todos os tons de verde, as montanhas, cinzentas
ao fundo, escondiam-se debaixo das nuvens. Vários corredores em roupas esportivas passavam por Tânia, em busca de perfeição física. Alguns sorriam para ela, que
retribuía, satisfeita.
Estava se sentindo muito bem. Gostava de olhar as gaivotas mergulhando no mar e esses homens que se moviam elasticamente pela areia. Prestar atenção em corpos
masculinos era coisa nova para ela. Parecia que da noite para o dia tinha descoberto o sexo oposto.
Mais adiante, Tânia viu um homem sentado na areia, olhando o mar. Não era um corredor: vestia uma calça comum e uma jaqueta de couro. Achou a figura familiar
e chegou perto dele. Era Frank de Ia Cruz.
Ele levantou, limpando a areia úmida da calça. Pegou a mão dela e beijou.
- Tânia! Que bom vê-la. Sou mesmo um homem de sorte por encontrá-la na beira deste mar gelado.
- Gelado? Eu acho delicioso.
- Meu sangue latino requer mais calor que o seu. E suponho que você ainda não teve o prazer de conhecer nosso repentino e gelado vento norte? A temperatura
cai de uma hora para outra e a gente fica instantaneamente gelado. Não sei como todo mundo consegue viver num lugar destes, acho simplesmente detestável.
- Ainda não tive o prazer de conhecer esse tal de vento norte, mas fui devidamente advertida por todos a respeito dele. Quem sabe, quando ele vier eu já
esteja preparada. Você não é daqui do Texas, é, Frank?
- Eu, querida mia, nasci na Califórnia, de pais mexicanos. Estou aqui em cativeiro, como Mark. Se incomoda se eu acompanhá-la em seu passeio?
- Planejo ir além do cais. Acha que pode agüentar?
- Não posso fugir a um desafio vindo de uma mulher linda como você.
Frank começou a acompanhá-la. Tânia percebeu que ele dizia coisas alegres mas, no fundo, parecia terrivelmente amargurado. Seria por causa de Karen? E se
fosse como poderia ajudá-lo? Frank parecia um homem bom e honesto, ela não entendia por que Mark se opunha ao relacionamento dele com Karen. Mas Mark era assim mesmo:
implicante, arrogante. Era melhor nem pensar nele.
- Eu não imaginei que você e Mark fossem da Califórnia - Tânia comentou.
- O quê? Ah, sim. - Ele virou para ela, com um sorriso apagado. - Sinto muito por estar distraído, mas estou realmente atravessando uma fase ruim. Sim...
eu e Mark somos da Califórnia. Nós nos conhecemos desde criança. Crescemos juntos, fomos à escola e à guerra juntos. Ele é o melhor amigo que tenho e isso está sendo
um problema para mim.
- Karen... - ela arriscou.
- Karen - ele concordou. - Estou apaixonado por ela, de fato, pela primeira vez nesta droga de vida. Mark me conhece muito bem. Bem demais, e não acredita
que esteja sendo sincero desta vez. Quero dar um lar para Karen e o filho dela, mas Mark acha que este casamento não vai durar.
- Mas não é absolutamente da conta dele. Só você pode saber se está apaixonado ou não.
- É. É da conta dele, sim. - Frank parecia seguro. - De fato, se eu fosse ele, sentiria a mesma coisa.
- Eu não entendo.
Ele sorriu e tocou o rosto dela, gentilmente.
- Não, minha querida, não vou dizer mais nada. A coisa é entre Mark e eu e tenho que resolver isso.
- E Karen? Ela nada tem a dizer? Por que Mark decide a sua vida e a dela e vocês obedecem? Além do mais, você não tem que se submeter a Mark. Tem que aceitar
tudo que ele diz, só porque é o poderoso chefão por aqui?
- Você seria uma advogada e tanto, Tânia. Mas veja, como Mark, tenho trinta e cinco anos e Karen tem apenas vinte e um. Mark não consegue ver Karen como
uma pessoa que possa me controlar. O que ele não sabe é que ela nunca vai ter que me controlar. Eu adoro aquela mulher. Vou até o inferno e volto por ela, e ainda
me sinto feliz. Mas não consigo convencer aquele imbecil disso.
- Frank, você não tem que convencê-lo de nada. Se Karen te ama, leve-a embora e case com ela.
Frank se abaixou e beijou Tânia na testa.
- Eu posso fazer isso, mas não quero. Quero casar com Karen com as bênçãos de Mark. Quero que ele seja nosso padrinho de casamento. Isso - ele suspirou -
seria a melhor coisa deste mundo. Mas veja, Tânia, o nevoeiro! Devemos voltar já.
Voltaram rapidamente, mas quando chegaram à entrada da casa, Frank convidou Tânia para passear mais um pouco.
- Venha tomar um café, aqui perto.
- Que seja bem rápido, Frank. - Ela olhou o relógio. - Prometi a Ma voltar para o jantar.
- Ma Ruddy está aí com você? - ele quis saber, curioso, enquanto andavam pela calçada.
- Está sim. Ela é ótima.
Sentaram e continuaram conversando, enquanto tomavam café.
- É uma festa particular, ou qualquer um pode participar? - Tânia virou e soltou uma exclamação involuntária, ao dar com o olhar severo de Mark Anders.
- Amigão! - Frank levantou e apertou a mão de Mark, que se sentou na frente de Tânia. Frank pediu imediatamente mais um café.
- Gostou do seu dia de folga, Tânia? - Mark perguntou.
Sem que Tânia entendesse a razão, Frank resolveu ir embora, deixando-a com Mark. Levantou-se e se despediu:
- Obrigada por ter me agüentado, Tânia. Tenho que ir agora, mas deixo você em boa companhia.
- Frank, me telefone lá pelas oito - Mark disse, como se fosse uma ordem.
- Novo trabalho?
- Apenas me telefone, sim?
- Está bem, amigo. Farei isso. - Virou para Tânia. - Mark conhece um bocado de Galveston e pode mostrar tudo que a cidade tem de interessante. E falar sobre
histórias antigas não é o meu forte.
Foi embora, sem mais um olhar.
Tânia ficou quieta, olhando o café na xícara.
- Foi pescar? - perguntou, de repente.
- Fui. Você devia ter ido. O tempo esteve ótimo e os peixes mortos de fome. E você, passou bem o dia?
- Passei. Há pouco, encontrei Frank na praia. Ele andou um pouco comigo. - Ela percebeu, pela expressão gelada de Mark, que tinha escolhido o assunto errado.
- É... eu vi.
- Ele é uma ótima pessoa. Gosto dele.
- E também, minha querida Tânia, dúzias de outras mulheres.
- Por que não? Ele é um homem muito charmoso.
Mark pensou um pouco e pareceu querer dizer mais alguma coisa, mas mudou de idéia e continuou a beber seu café bem devagar.
- Quer mesmo conhecer um pouco de Galveston?
- Gostaria - Tânia logo ficou na defensiva -, mas prefiro andar por aí e descobrir as coisas por mim mesma. Não se preocupe. Não precisa gastar seu tempo
comigo.
- Não me preocupo. Gostaria de levar você amanhã, mostrar toda a cidade e contar as coisas que conheço sobre ela.
O primeiro impulso de Tânia foi se recusar a passar o domingo com ele. Depois, pensou que talvez surgisse alguma oportunidade de falar sobre Karen e Frank,
e aceitou.
- Obrigada, a que horas você passa?
- Cedo. Tenho que receber umas pessoas importantes à tarde. - Ele deixou uma nota na mesa, sem esperar pela conta. - É melhor irmos andando. Ma não gosta
quando a gente chega tarde para comer.
- Oh, Deus! Esqueci da minha promessa a ela.
Eles andaram em silêncio, até o portão de ferro da casa. Mark deu um frio boa-noite e desapareceu na escuridão, deixando Tânia com a impressão de que estava
até aliviado por se livrar dela.
Esse pensamento a deixou indignada. Foi para dentro com a absoluta certeza de que nunca iria entender aquele homem.
Capítulo X
Mark chegou realmente cedo na manhã seguinte. Tânia mal tinha terminado seu café, quando o viu conversando com Ma. Subiu para pegar sua bolsa e saíram. Mark
segurava a mão dela de um jeito possessivo. De repente, seu simpático sorriso sumiu e ele disse, parecendo irritado:
- Que diabos ele está fazendo aqui?
Espantada, Tânia seguiu o olhar de Mark e viu um magnífico Mercedes entrando na alameda de pedrinhas e parando na frente da casa.
Logo adivinhou quem iria saltar do veículo depois que o motorista uniformizado abrisse a porta.
De fato, foi o príncipe Hussein quem saiu, sorrindo simpático e parecendo plenamente convencido de que seria bem-vindo. Mark apertou a mão dele com frieza.
- Hussein, não o esperava antes da tarde!
- Felizmente consegui antecipar a nossa chegada, para poder passar a manhã nesta cidade adorável. Eu tinha todo o interesse de chegar aqui bem cedo. - Ele
sorriu, ainda mais cativante. - O tempo não espera por ninguém, velho amigo. Ah, Tânia! - Ele virou-se para ela com um enorme sorriso. - É um prazer reencontrá-la.
Hussein era tão charmoso e gentil que Tânia não conseguiu se irritar com sua aparição repentina. Sentiu que Mark lhe apertava o braço e depois soltava, quando
Hussein beijou de leve sua mão.
- Mark, você sabe quanto é um homem de sorte, por ter esta linda mulher trabalhando diariamente a seu lado? - O árabe continuou, imperturbável, como se não
percebesse a cara feia do outro.
- Que bom vê-lo, príncipe Hussein. Eu não sabia que ia chegar hoje - Tânia se adiantou.
Hussein virou para Tânia, com uma expressão estranha.
- Não pensei que ia manter minha chegada em segredo, meu amigo. Queria muito que Tânia soubesse da minha chegada hoje.
- Eu apenas esperava a confirmação da sua chegada. Agora que já chegou, não há mais problemas - Mark disse, numa voz gélida. - Nós vamos fazer um passeio
em Galveston. Tânia tem estado ocupada demais e precisa se divertir, ela ainda não conhece a cidade. Pretendemos ver alguns monumentos históricos. Gostaria de nos
acompanhar?
- Mas sim, claro! Que idéia encantadora! Vamos?
- Onde está o resto de sua comitiva? Não deseja entrar em contato com eles? - Mark agia como um perfeito anfitrião.
- Não é preciso, ele estão num hotel em Houston. Estarão prontos para tratar de negócios amanhã, depois de um descanso.
- Vamos indo, então.
- Podemos ir no meu carro - Hussein se adiantou e deu instruções ao motorista. Logo, estavam os três confortavelmente instalados no luxuoso Mercedes.
Mark ficou frio e sério o dia inteiro, tentando ignorar o príncipe e suas gentilezas. Quando voltavam para o centro, ele alegou que precisava mandar um telex
urgente e pediu para pararem um instante na companhia.
O sheik sorriu, deixando-o na porta do prédio.
- Vá, meu amigo. Sou incapaz de entender os americanos, que abandonam tão agradável companhia por qualquer negócio. Vou fazer o possível para entreter esta
agradável jovem, enquanto você passa o telex. Não se preocupe.
- Não me preocupo nem um pouco. Por que vocês não vão até a cobertura? Podem ficar no bar, ao lado do heliporto, e apreciar a paisagem dali.
Tânia ficou pensativa, depois que Mark os deixou lá. Tinha a incômoda impressão de que ele ia fazer alguma coisa que ela precisava saber.
- Ah, Tânia. Não ouviu uma palavra do que eu disse. Não estou habituado a ser ignorado e você já fez isso uma vez comigo, quando nos conhecemos - protestou
Hussein, como um menino malcriado.
- Desculpe, Hussein, continue falando, por favor.
Ela e Hussein estavam discutindo sobre as qualidades do potente S-58 Sikorsky, o helicóptero pousado na pista de aterrissagem. O sheik tinha acertado a compra
de seis aparelhos iguais.
- É uma máquina versátil e eficiente, se for bem usada - ele dizia agora. - Espero que Ia Cruz seja capaz de ensinar meus pilotos a lidar com ela corretamente.
- Frank? - Tânia exclamou, espantada.
- Sim. - O árabe parecia surpreso. - Mark concordou em ceder Frank para treinar meus homens. Não há dúvidas de que é um dos melhores pilotos desse tipo de
helicóptero nos Estados Unidos. Ele estava hesitando em assinar o contrato, mas hoje me disse que vai aceitar minha proposta. Tivemos uma conversa agradável pelo
telefone, quando cheguei.
Então Mark não tinha feito nada para reter seu piloto-chefe! É claro que Frank podia se recusar a ir para o outro canto do mundo, se não quisesse deixar
Karen. Mas algo dizia a Tânia que havia o dedo de Mark nessa história. Ele devia ter encontrado alguma maneira de pressionar Frank a ir. Que argumentos poderia ter
usado? Ela não sabia, mas daria tudo para descobrir.
Nesse momento, Mark apareceu de volta.
- Eu estava justamente dizendo a Tânia que tive a sorte de persuadir Ia Cruz a ser o instrutor de meus pilotos - explicou Hussein.
- Torceu o braço de Frank, para ele aceitar o convite de Hussein, Mark? - desafiou Tânia. - Por que motivo ele ia concordar em deixar o Texas, agora?
- Dinheiro, minha cara. Montes e montes desse lindo e querido papel. Hussein não faz a menor economia quando quer algo. Ele fez uma oferta irresistível a
Frank.
Depois dessa conversa, eles foram até o Strand, o distrito que tinha sido completamente destruído nos últimos dias do século dezenove, quando os cidadãos
de Galveston ainda acreditavam que sua cidade seria uma das maiores e mais importantes da nação, inferior somente a Nova York e San Francisco.
- E o que aconteceu, então? - Tânia quis saber.
- Furacão - respondeu Mark. - Um matador que veio e varreu Galveston para fora do mapa, quase em 1900. Strand foi mantido em ruínas, para ficar como uma
espécie de trágico monumento de nossa arquitetura. O resto da cidade foi toda restaurada. Espero que nós nunca precisemos descobrir se nossas casas são mais resistentes
do que as de antigamente.
Conversando amigavelmente, eles visitaram a vila Italiana, que agora estava restaurada, e uma exposição da arquitetura típica de antes do furacão, quando
a velha Galveston era conhecida como a "rainha do Sudoeste". Depois jantaram em um restaurante bem simpático, freqüentado principalmente por turistas.
Hussein continuava atencioso e encantador e Mark, cada vez mais taciturno e reservado. Era quase noite quando os dois levaram Tânia para casa.
Ela tomou banho e estava indo para a cama quando o telefone chamou. Achando que seria Hussein, ficou surpresa ao ouvir a voz de Mark.
- Tânia, acha que pode ir amanhã cedo com a equipe de exploração sísmica para o golfo? Sandy Johnson quer que vá com ele.
- Para quê? - Ela não conseguia entender por que precisariam da presença dela.
- Você é a engenheira de operações, não? Ele acha que é essencial ter sua colaboração, enquanto ele tenta estabelecer os parâmetros sísmicos da área. Essa
é uma parte fundamental do projeto. Se começarmos a perfurar num local sujeito a abalos, todo nosso trabalho poderá ir pelos ares.
- Bem... se ele precisa de mim, eu vou, claro. Quanto tempo vamos ficar lá?
- Ele precisa realmente de você, Tânia. O carro da companhia vai apanhá-la por volta de quatro e meia da manhã. Durma bem. Vocês devem ficar lá alguns dias.
Tânia desligou e foi arrumar uma maleta com algumas calças, blusas e roupas íntimas. Como o tempo estava quente, pegou alguns shorts e o único maiô que possuía.
Depois, acrescentou uma jaqueta de lã para o caso de surgir o falado e famoso vento norte. Viu a caixa de seu violino em cima do armário e resolveu levá-lo também.
Talvez tocasse, de noite.
Sandy Johnson recebeu-a com alegria, quando foi apanhá-la no escuro da madrugada e viu o violino.
- Eu sabia que era um anjo enviado do céu para aliviar minhas misérias, na primeira vez que a vi. Vamos fazer música juntos e bestificar esses palermas com
quem somos forçados a trabalhar. Saiba que eu sou um exímio tocador de gaita.
A caminhonete estava cheia dos ditos palermas, que receberam os dois com gritos e vaias que devem ter acordado toda a vizinhança. Os homens abriram um lugar
para ela.
- Se pensa que Sandy toca, prepare-se dra. Cameron: não se pode classificar de tocar esse barulho de partir o coração que ele produz - disse John Hendrix,
o analista-chefe do computador.
- Não tem receio de ferir a sensibilidade dele, John? - ela rebateu, rindo à vontade.
- Sensibilidade? - repetiu outro membro do grupo. - Como pode ter alguma sensibilidade um homem que toca gaita?
Chegaram ao cais. Ainda estava escuro quando o navio sísmico partiu para fora do canal de Galveston e entrou nas águas do golfo.
Tânia ajeitou suas coisas na pequena cabine que lhe fora destinada e saiu à procura do café da manhã a bordo.
Nem percebeu que não tinha pensado uma só vez no príncipe Hussein. Nem pensou nos próximos dias, e muito menos na real razão da visita dele. Estava ocupada
demais com seu trabalho.
Como já esperava, os dias estavam quentes no golfo e ela e os homens trabalhavam de short, calção e bermuda. Havia entre eles um agradável ambiente de camaradagem.
Eram todos americanos e verdadeiros especialistas em seus respectivos ramos. O trabalho sísmico avançava rapidamente. Cada dia, as séries de ondas de som que ecoavam
de volta dos buracos feitos nas rochas do fundo do mar eram registradas e os resultados informados ao sofisticado computador a bordo, que fazia correções e cálculos
com incrível velocidade.
O grupo buscava o melhor local para a perfuração, com o entusiasmo de verdadeiros exploradores. Trabalhavam duro de dia e à noite se divertiam. Tânia e Sandy
eram responsáveis pelo entretenimento. Os dois tocavam no deck e todo mundo cantava em coro.
Tânia trabalhava muito, mas tinha a impressão de que, na verdade, Sandy não tinha tanta necessidade de sua presença como Mark deu a entender. Ele a destacava
para trabalhos de pouca importância e lhe fazia algumas consultas dispensáveis.
Quando resolveu perguntar por que ele a tinha requisitado a bordo, ele parou um momento o que fazia e olhou-a surpreso, como se procurasse uma resposta para
dar.
- Bem... eu precisava de você, Tânia. Eu... achei que uma vez que é nossa engenheira encarregada das operações em alto-mar, deveria acompanhar os testes
sísmicos. Eles são fundamentais para estabelecer precisamente onde deve ser nossa primeira perfuração. Achei que podia ajudar. No seu último trabalho, não foi você
quem escolheu o local? E foi direto na meta, no lugar certo, não foi?
Tânia admitiu que sim.
- Mas você sabe muito bem que deve ter sido muita sorte minha, Sandy. A chance de acontecer uma segunda vez é muito remota.
- Com esse novo computador, estou inclinado a apostar que essas chances são altas.
- Talvez. Eu não conto com isso.
Sandy dava a impressão de não querer mais falar no assunto e Tânia perguntava-se por quê.
Será que Mark havia mandado Sandy levá-la para o golfo? Por que faria isso? Para afastá-la de Hussein? Seria ridículo!
Eles já estavam voltando a Galveston, quando Tânia teve esse pensamento. A caminhonete deixou o pessoal diante do prédio da United. Tânia não queria enfrentar
Mark, mas subiu com Sandy e John Hendrix. Entrou no banheiro de senhoras para pentear os cabelos e colocar um pouco de maquilagem e encontrou Linda Wells. Olhou
atônita para a outra inglesa.
Linda sorriu ao vê-la.
- É a dra. Cameron, não é? Eu a conheci num restaurante em Mayfair uma vez, lembra-se? Não me lembro do nome do restaurante, mas lembro que estava com o
príncipe Hussein.
- Isso mesmo. Mas o que está fazendo em Galveston?
- Eu fui a assistente pessoal de Mark, em Londres. Agora, sou seu oficial de ligação para o novo projeto do golfo do México. Estive aqui a semana toda vendo
e aprendendo.
- Oh! - Tânia não conseguiu dizer mais nada.
- Foi pena você ter estado fora toda a semana. Eu gostaria de conhecê-la melhor.
- Sim... obrigada. Vai ficar por aqui?
- Preciso sair imediatamente para pegar o vôo de volta a Londres. Já devia estar lá embaixo há cinco minutos. Preciso ir voando. Até logo! - Ela apanhou
uma pequena valise do chão e saiu correndo.
Tânia passou um pente nos cabelos, fez uma careta para seu rosto queimado de sol no grande espelho e foi para a saía de Karen. A jovem recebeu-a com prazer.
- Que bom que está de volta! Todos estão na sala de conferências. Quer ver seu novo escritório antes de ir para lá?
- Novo escritório? - Tânia tinha esquecido sua exigência.
- Vou te contar! É lindo! Mark fez todo mundo pular como doido, para que ficasse pronto até a sua volta.
- Eu realmente não esperava isso. Vejo depois.
Foi para a sala de conferências. Mark cumprimentou-a friamente e indicou uma cadeira para que se sentasse. Por duas horas se ocuparam dos relatórios da viagem.
- Então é isso - Mark disse, no final. Depois inclinou-se para trás na cadeira e jogou o lápis longe. Quando ouviu uma batida, foi até a porta.
Hussein entrou, cumprimentou Mark, acenou para os demais e foi direto para Tânia.
- Tânia, como está lindamente bronzeada! Mark me explicou por que teve que viajar, mas meu coração recebeu isso como um dano irreparável. E agora sou eu
que preciso deixar o país. Não quer vir comigo para Dallas? Poderemos, pelo menos, passar a tarde e o dia de amanhã juntos, antes da minha partida.
Tânia percebeu que os homens iam deixando lentamente a sala. Sandy olhou por cima do ombro do sheik e piscou para ela, que deu um desesperado olhar a Mark.
Ele nem se moveu, mas seu rosto expressava uma proibição tão evidente, que ela levantou o queixo em desafio.
- Quanta amabilidade sua em me convidar, Hussein. Vou com prazer. - Nem olhou mais Mark, que praguejava baixinho atrás dela. - Tenho que ir pegar minhas
coisas e trocar de roupa.
- Terei prazer em acompanhá-la até sua casa. Meu avião particular está esperando em Houston e não vai levantar vôo enquanto não estivermos a bordo.
- Até logo, Mark. - Tânia saiu sem olhar para trás. Ela ouviu Hussein murmurar qualquer coisa quando os dois se apertaram as mãos, mas não esperou para saber
o que era. Nem ficou para ver seu novo escritório.
Sentiu alívio quando Hussein a alcançou e entraram num Mercedes. De Mark, nem via sinal. Tinha a sensação de ter desertado de uma batalha, que não via a
menor possibilidade de ganhar.
Outro Mercedes estava esperando no meio-fio, quando saíram pelas portas automáticas do Aeroporto Fort Worth, de Dallas. O possante jato de Hussein cobrira
rapidamente a distância entre Houston e Dallas.
Ele perguntou se ela se incomodaria em acompanhá-lo para fazer algumas compras.
- Bugigangas - ele disse -, para a família e amigos.
Antes, porém, Hussein a levou para o suntuoso Fairmount Hotel e colocou-a em uma fantástica suíte. Deu meia hora para que se arrumasse. Depois, levou-a ao
Neiman-Marcus, a famosa loja de departamentos de Dallas, onde se podia comprar quase tudo, até mesmo uma piscina cheia de champanhe, garantiu Hussein.
Tânia estava muito impressionada. Olhava espantada, enquanto ele comprava as "quinquilharias" que chegavam a milhões.
Finalmente, Hussein deu ordens para que suas compras fossem entregues em seu jato, no aeroporto, e levou Tânia de volta ao hotel, insistindo para que pusesse
seu mais lindo vestido. O hotel, ele avisou, tinha um excelente restaurante e justamente naquela noite apresentaria um show com dois de seus cantores favoritos.
Tânia encontrou flores no quarto e, quando desceu, foi recebida por olhares apaixonados de Hussein.
Ele dava muito mais atenção a ela, do que ao espetáculo que estava sendo apresentado. Ela procurava desviar suas atenções e intimidades. Flertava com ele,
mas percebia que Hussein não a interessava como homem. O pior é que ele estava ficando exasperado por ver que não era correspondido.
Com honestidade, chegou a querer não ter reagido com tanta raiva ao desejo de Mark de mantê-la longe do príncipe. Devia ter ficado em Galveston, especialmente
porque Hussein dava a impressão de não ser alguém que desiste facilmente, quando põe algo na cabeça.
Tânia notou um árabe a uma certa distância, com suas roupas flutuantes, procurando alguém na multidão. Ele dirigiu-se ao maitre, que acenou e fez um gesto
na direção da mesa deles. A orquestra tinha começado a tocar e alguns pares se dirigiam à pista de dança, quando o maitre se aproximou da mesa. Pediu licença e entregou
um bilhete a Hussein.
Quando leu, o príncipe franziu a testa.
- Precisamos ir, Tânia. Sinto muito, mas recebi uma mensagem que não posso ignorar. - Entregou algumas notas ao homem que esperava. - Isso é o bastante para
pagar a conta, creio eu. Pode guardar o troco.
Eles saíram do salão.
- Venha, Tânia. Preciso arranjar um meio de mandá-la de volta para Galveston. Estou desolado, mas nada posso fazer.
- Posso voltar para Galveston sozinha, Hussein. Por favor, não se incomode comigo. Não é preciso, pode ir.
Hussein falava com o mensageiro. Os dois homens trocaram rápidas palavras em árabe.
- Venha, Tânia. Vou acompanhá-la até seu quarto. Desculpe ter estragado nossa noite.
- Não pense nisso, Hussein. Foi perfeita, maravilhosa. Muito obrigada.
Ele apanhou na portaria a chave dela e levou-a até o elevador.
- Vou voltar, Tânia, então passaremos um longo e ininterrupto tempo juntos, se quiser.
Ela queria? Não tinha certeza.
Hussein lhe deu um olhar de derreter corações e beijou seus dedos delicadamente.
- Até logo, Tânia.
- Até logo, Hussein. Novamente obrigada.
Foi para a cama tentando adivinhar o que conteria a mensagem que o tinha apressado tanto.
Na manhã seguinte, batidas enérgicas na porta a acordaram.
- Quem está aí? - Tânia estava certa de que era muito cedo.
- Serviço de quarto. O café que pediu.
Ela vestiu o robe e foi descalça abrir a porta. Hussein devia ter pedido o café, marcando a hora, na noite anterior. Muito gentil, mas por que tão cedo?
Olhando pelo visor, viu que era um empregado do hotel. Abriu a porta e o homem sorriu. Deixou a bandeja na mesa e ela foi buscar uma gorjeta.
- Nunca ande descalça em quarto de hotel, Tânia.
Ela virou-se bruscamente. Mark estava encostado no batente da porta, vestido com as roupas do dia anterior.
O garçom olhou indeciso para ela.
- Não se preocupe, está tudo bem. Esse homem é meu chefe. Infelizmente não tem boas maneiras, pelo que dizem os que o conhecem bem. Mas ele é inofensivo.
- A senhora é quem sabe. O garçom pegou a gorjeta e foi embora.
- Não me convida a tomar o café com você? O café que eu pedi?
- Você pediu? Pensei que tivesse sido Hussein.
- Não, eu fiz isso. Hussein estava com um diabo de uma pressa! Até esqueceu suas maneiras impecáveis.
Ela fez um gesto na direção da mesa.
- Pelo menos, espero que me ajude a comer isso tudo que pediu.
A mesa estava posta para dois, com cristais, porcelana e talheres de prata. Uma rosa solitária fora colocada no guardanapo, ao lado de um dos pratos.
Tânia foi escovar os dentes, lavar o rosto e se pentear. Voltou rápido para a mesa.
- Posso saber por que essa súbita aparição em Dallas, neste hotel, em meu quarto, a esta hora? E a propósito de quê? - Ela colocou café na xícara e passou
manteiga na torrada.
- Eu sabia que estava aqui e que Hussein tinha ido embora. Como quero lhe mostrar uma coisa, achei que era uma boa hora para vir.
- E como soube que eu estava neste hotel?
- Simples dedução. O príncipe Hussein tem um infalível gosto pelo melhor e este hotel é o melhor de Dallas.
- Hummm... E como sabia que o príncipe tinha ido embora?
- Espiões. Espiões por toda parte, prontos a cumprir minhas ordens.
Ela sorriu, sacudindo a cabeça.
- Você é um homem impossível. O que é tão importante que quer me mostrar?
- Uma extravagância da natureza - ele murmurou.
Tânia sentiu como se ele a tivesse acariciado e parou de rir. Algo nos olhos dele mostravam a intimidade daquele café da manhã, no hotel. Ela levantou de
repente, procurando fugir.
- Bem, se estamos indo a algum lugar, tenho que me vestir.
- Não se apresse por minha causa. - Ele sorria, com charme. - Não estou com pressa... agora.
Tânia escapou, certa de que ficar ali era um convite ao desastre.
Duas horas mais tarde, Mark entrou por uma estrada auxiliar. Tinham andado uns cento e cinqüenta quilômetros.
"Só Mark para inventar esses passeios de horas de viagem!", Tânia pensou, divertida.
- Feche os olhos - ele pediu, de repente, com um sorriso irresistível. - Não abra até que eu mande.
Olhou para ele e recebeu em troca um sorriso tão doce, que fechou os olhos instantaneamente, pensando no efeito que aquele sorriso tinha sobre ela.
Mark andou mais uns quinhentos metros e parou o carro. Foi até o lado dela e abriu a porta. Sua mãos pegaram gentilmente nas dela e a ajudaram a sair.
- Não trapaceie. Apenas segure-se em mim e mantenha esses lindos olhos azuis fechados. - Com as mãos nos ombros dela, ele virou-a. Ela sentiu o sol no rosto.
- Agora, abra Tânia.
Tânia abriu e ficou completamente maravilhada. Eles estavam na borda de uma pequena colina, à beira de um lago cercado por milhares de árvores carregadas
de flores de um azul incrível. Os botões se espalhavam como um tapete sob as árvores, sobre as colinas, até o horizonte.
- Ah, Mark, que lindo! O que são?
- Centáureas azuis do Texas. Este ano estão ainda mais lindas, por causa desta longa primavera fora de tempo que estamos tendo. É uma coisa que poucas pessoas
privilegiadas vêem. Estou feliz por você ser uma delas. Isto aqui é o Parque Florestal Big Thicket.
- Estou feliz também, Mark. É fantástico... incrível. - Virou-se impulsivamente e segurou a mão dele, com o rosto vibrando. - Obrigada por repartir isso
comigo.
O olhar de Mark mostrava que ele estava disposto a dividir muito mais com ela, mas nada disse. Seu rosto falava por si só.
Eles caminharam para cima e para baixo nas colinas, ao redor do pequeno lago. Depois voltaram para o carro, e Mark tirou uma grande cesta de piquenique,
do porta-malas. Tânia ficou encantada. Não esperava por essa surpresa.
Sentaram preguiçosamente debaixo dos galhos de um carvalho, conversando como velhos amigos. Depois de comerem, Tânia recolheu o que sobrou e foi encostar
no tronco da árvore, com os olhos fixos no lago.
- Sente-se aqui. - Mark abriu seu paletó no chão para ela. Tânia aceitou com um gesto gracioso e sentou-se, suspirando alto. Mark sentou-se do lado dela,
sem tocá-la.
O silêncio era quebrado unicamente pelos pássaros e o assobio do vento nos galhos. Estava tudo tão pacífico... tão lindo e tão... certinho!
Tânia subitamente ficou tensa com a proximidade de Mark. A masculinidade dele lhe invadia todos os sentidos, envolvendo-a de maneira irresistível. Ela sentia
o coração palpitar feito louco, comovida com a beleza daquele lugar e com a presença daquele homem sedutor. Finalmente, virou-se para Mark, incapaz de ignorar a
sensualidade que emanava dele. Ele tomou-a nos braços.
Seu beijo era pura doçura e desejo. Tânia relaxou completamente e se deixou dominar pelo prazer. Abraçou Mark com mais força e foi deitando com ele, sobre
o paletó. Sentia-se livre, solta e, ao mesmo tempo, ternamente presa naqueles braços poderosos.
Então Tânia sentiu algo estranho e duro pressionar suas costas.
- Mark - ela protestou -, alguma coisa está me machucando. Ele levantou a cabeça, voltando devagar à realidade. Vendo a expressão dela, afastou-se.
- Deixe-me ver. - Ele empurrou-a um pouco de lado, procurando atrás dela com a mão livre, até que enfiou a mão no bolso do casaco. Pareceu encontrar, afinal,
o objeto que a machucava, mas ficou estranhamente calado.
- O que é Mark? - Tânia perguntou, curiosa. - Eu esqueci isto, Tânia. - Era a carteira de couro que ela tinha perdido no quarto do hotel, em Londres. Estava
no bolso de seu paletó.
Tânia pegou-a, furiosa. Como ele podia ter guardado aquilo, deixando que pensasse que estava perdida?
- Você estava com isto todo o tempo, Mark Anders. Está usando esse paletó desde Londres.
- Eu mandei John procurar para você, lembra-se? Ele achou e Linda trouxe agora, quando esteve aqui.
- Está dizendo que John deu a Linda para me devolver?
É, até podia ser verdade, ela pensou. Quem sabe Linda, na pressa de pegar o avião, naquele dia, tinha esquecido da carteira.
- Por que não me deu na reunião?
- Olhe, Tânia, não pretendo continuar este bate-boca. Vamos embora? - ele disse, levantando.
Gelada pela mudança de atitude dele, Tânia levantou sem aceitar a mão que ele lhe oferecia. Começou a limpar a saia com exagerado cuidado. Foi então invadida
por uma profunda e inesperada mágoa. Olhava a beleza do lugar, pensando que Mark havia desejado compartilhar daquela beleza com ela que estragara tudo!
Mark nem olhou para ela, enquanto pegava as coisas do piquenique e jogava tudo com maus modos no porta-malas, que fechou com raiva. Voltaram em completo
e gelado silêncio.
Capítulo XI
Tânia começou a segunda-feira com mau humor, com a perspectiva de enfrentar Mark Anders logo de manhã. Qual seria o melhor tratamento a dar ao dinâmico executivo
da United Petroleum? Decidiu adotar uma pose fria e distante.
Entrou e viu Greg ao lado da mesa de Karen. Sem querer ouviu o que ele dizia e ficou surpresa.
- Você é uma pequena idiota! - A voz dele estava alterada. - Sabe muito bem que Mark não faria isso para magoá-la. Ele apenas deseja o melhor para você.
Greg sacudia Karen pelos ombros com as duas mãos energicamente. O rosto dela estava lavado de lágrimas.
Tânia parou, atônita. O que era aquilo, meu Deus?
- Ele não tem esse direito - choramingava Karen. - Frank não teve tempo nem de me ver, para se despedir, porque esse horrível Hussein exigiu que ele fosse
na mesma hora.
- Mas ele telefonou, não foi? - A exasperação de Greg era evidente, embora Tânia não pudesse entender o que ele tinha a ver com o romance de Karen e Frank.
- Ele não é o tipo que deixa Mark ou alguém mais lhe dizer o que fazer. Você o conhece bem. Se ele foi para o Extremo Oriente, é porque decidiu ir. Ninguém, mas
ninguém mesmo, empurra Frank para onde não queira ir.
- Eu... eu sei, Greg. Mas Mark foi tão insistente. Ele toma conta de mim como se eu ainda fosse uma adolescente. Ele se recusa a acreditar na sinceridade
de Frank. - Ela engoliu mais um soluço sentido.
Greg a olhava afetuosamente. Puxou-a para si e Karen aninhou-se em seu peito.
- Não chore, gatinha. Vocês estão realmente apaixonados um pelo outro, e é isso que importa. Tudo vai dar certo. La Cruz viajou apenas por algumas semanas.
É melhor ter certeza agora, do que chorar depois.
Só então foi que Greg percebeu a presença de Tânia. Piscou para ela, por cima da cabeça de Karen.
- Alô, Tânia.
Tânia olhava os dois sem entender algumas coisas. Por que Karen parecia aceitar a interferência de Mark e os conselhos de Greg? Até agora, ela não conseguira
descobrir uma boa resposta para isso.
- Oi, Tânia... - Karen deu um sorriso tímido, enxugando as lágrimas. - Eu tive alguns problemas esta manhã e desabafei minha tristeza sobre a camisa de Greg
- disse, afastando-se dele. - Posso mostrar seu novo escritório? Mark mandou mudar todas as suas coisas para lá. - Ela engoliu um soluço, e enxugou as lágrimas com
o dorso da mão. - Meu rosto deve estar um desastre. Espera um segundo, enquanto me arrumo?
Tânia concordou e Karen saiu.
- Mark às vezes exagera um pouco, não? - Greg comentou, quando Karen já estava longe.
- Mark tem uma tendência a ser um tanto ditador - respondeu Tânia.
- É. Mas geralmente o danado está certo. Bem... é hora de ir ganhar meu pão de cada dia. Quando Mark está fora, nós, pobres escravos, temos que trabalhar
em dobro.
- Hummm... - Tânia sentiu um estranho desapontamento invadi-la. - Onde nosso ilustre líder foi, desta vez?
- Ao Oriente Médio, ver Hussein é claro. - Greg mostrava-se um tanto surpreso. - Pensei que soubesse. Mark é extremamente cuidadoso no trato com os árabes.
Esses príncipes fazem a maior parte de seus negócios pessoalmente e sempre querem o chefão para tratar com eles. Bem, quer ir ver seu escritório?
Tânia concordou. Greg empurrou a porta para ela entrar. A sala possuía uma discreta elegância, com janelas de vidro de alto a baixo, como a de Mark. A mesa
era elegante e funcional e a cadeira tinha um design moderníssimo para móveis de escritório: giratória, regulável, preta. Havia muitas estantes e armários embutidos,
um arquivo pessoal, um terminal de computador já ligado. A sala era forrada com o carpete mais macio que Tânia já tinha visto na vida. A maior surpresa foi a gravura
das centáureas azuis do Big Thicket.
Quer dizer então que Mark já havia planejado tudo quando me levou ao Big Thicket, ela pensou, meio decepcionada. Se fosse realmente assim, será que ele teria
também planejado a cena de amor no lugar onde finalmente ia seduzir-me?
Pensar uma coisa dessas, só serviu para deixá-la com mais raiva ainda de Mark. Quem ele pensava que era, para planejar tudo daquela maneira?
Com toda honestidade, admitia que Mark teria sido bem-sucedido na sua tentativa de seduzi-la, se a foto de Kurt não a machucasse. Isso é que era pior!
- Você gosta, Tânia? - perguntou Greg. - Mark realmente se empenhou para dar o melhor escritório do mundo para você.
- É uma beleza, Greg. Adorei! - Tânia estava sendo sincera. Ficou furiosa com a gravura por outros motivos, mas o escritório era um verdadeiro luxo.
- Achei que gostaria. Tem um presente para você. Mark recomendou que eu entregasse pessoalmente. - Ele abriu a porta do armário e pegou um vaso de cristal
com um botão de rosa vermelho-escura, quase cor de vinho. O pequeno cartão dizia: "Pense em mim" e tinha um "M" como assinatura.
Ao entregar o vaso, Greg sorriu, meio sem graça.
- Mark disse que ia saber o significado - falou, sem maiores comentários.
Claro. Hussein manda dúzias de rosas. Mark pretende provavelmente provar que é melhor que o príncipe, mesmo dando só uma. Mark não tem mesmo jeito, pensou
Tânia.
Greg continuou a falar sobre Mark, como se isso fosse a coisa mais natural do mundo.
- Ele parece um camelo rabugento, mas os árabes se consideram lisonjeados pelo esforço dele em aprender sua língua. E isso é bom para os negócios, doutora!
Tânia não pôde deixar de rir.
- Um camelo rabugento! Greg, você é impossível!
- Faz parte do meu inegável charme. Falando sério, Mark é um cara esperto e os árabes gostam disso, admiram o esforço dele para aprender sua língua.
- Eu imagino!
- Ei, senhorita, não seja sarcástica. - Ele saiu depressa em defesa do primo. - Mark faz isso apenas como cortesia. Aqueles príncipes são orgulhosos como
Lúcifer, mas apreciam um esforço como esse. O árabe é uma língua muito difícil, enquanto que o inglês hoje é uma língua universal. Todos eles falam inglês, como
você mesma viu. Então, não é necessário aprender árabe para negociar com eles, mas é uma cortesia que apreciam. É claro que ajudou muito Mark ter sido colega de
Hussein na Universidade.
- Eu não sabia disso.
- Foram sim. Estudaram na Southern Califórnia University. Mark os entende mais que um ocidental costuma entender, e eles confiam nele. De fato, Hussein o
trata como um familiar. Essa amizade não afeta a United Petroleum mas toma um diabo de tempo de Mark. O tempo nada significa para um árabe. Nada pode ser mais importante
do que um negócio, seja família, amigos ou o governo.
- Falando em perder tempo, Greg, eu tenho um monte de relatórios para enfrentar.
- Sim, eu sei. Mas eu geralmente não começo o meu dia conversando com uma mulher tão linda.
Tânia o fuzilou com o olhar.
- Está bem, está bem, já estou de saída - Greg protestou, levantando-se.
Ouviu-se uma batida suave na porta.
- Posso deixar entrar? - Greg perguntou indo para a porta e abrindo.
Era Karen, com um ar muito ansioso.
- Há um homem aí que quer ver você, Greg.
O homem não esperou ser anunciado. Entrou, com ar agressivo.
- Gregory Powers Sims? - Seu modo de falar fez com que Tânia levantasse, inquieta.
- Sim, o que há? - O bom humor de Greg desapareceu.
- Estou trazendo estes documentos por ordem da Corte Superior do Condado de Harris. - Ele entregou um envelope oficial a Greg. Este pegou-o e o homem sumiu.
- Ei, Greg... Más notícias? O que é isso? - perguntou Karen.
- Não sei, queridinha. Se me permitem, garotas, vou descobrir. - Ele entrou na sala de Mark.
Karen foi atrás dele logo depois, parecendo curiosa. Tânia fechou a porta e foi para sua mesa, controlando a curiosidade.
Greg parecia não confiar nela. Não lhe disse o que significava aquela ordem da Corte Superior do Condado de Harris durante toda a semana. Boa coisa não era,
porque ele passou a ter um eterno ar de preocupação que ninguém entendeu, acostumados que estavam com seu jeito alegre e expansivo. Cada pessoa que tentava restabelecer
seu bom humor era bruscamente rejeitado. A partir do meio da semana, o pessoal começou a evitá-lo, sempre que possível. Na sexta-feira Tânia decidiu falar com ele.
Chamou-o em sua sala, dizendo francamente que era impossível trabalhar daquela maneira.
- O que está errado, Greg? Acha difícil trabalhar comigo porque sou mulher?
- Bom Deus, Tânia. - Ele passou as mãos sobre o próprio rosto, impaciente. - Tem que me desculpar. Esta semana foi um inferno.
- Foi mesmo. Todos sentimos isso.
Greg mergulhou a cabeça nas mãos e ficou em silêncio. Tânia esperou.
- Ginny Lee me mandou os papéis do divórcio na segunda-feira - disse, com amargura. - Nunca pensei que ela fizesse isso.
Tânia olhou para ele, comovida. Era evidente que Greg não desejava a separação.
- Sinto muito, Greg.
- Obrigado, mas eu já devia esperar por isso. Mark sempre disse que ela... - Ele parou, com um som que parecia um soluço. - Bem... aconteceu! - Levantou
e estudou a expressão de Tânia. - Você estaria disposta a ir a uma festa comigo esta noite, por acaso?
Ele parecia tão infeliz e desesperado, que Tânia não viu como recusar.
- Será um prazer, Greg. Faz tempo que não vou a uma festa. A última foi uma recepção de negócios.
- Vou ser uma droga de companhia, mas vou tentar melhorar. Obrigado, Tânia, você faz um magoado coração de homem sentir que ainda há esperança neste velho
mundo. Eu a pego lá pelas oito.
Naquela noite, Tânia resolveu colocar um vestido de seda azul, bem decotado atrás, e passar um pouco de maquilagem. O vestido acentuava seu bronzeado e deixava
seus olhos com um tom de um azul profundo. Calçou sandálias de salto altíssimo. Ficou realmente bonita.
Quando ela se mexia, o vestido inteiro rodopiava. Sentiu-se bem naquela roupa e, de repente, pegou-se pensando que era uma pena Mark não vê-la.
Alguns minutos mais tarde, ouviu Greg no hall. Pegou sua bolsinha de noite e desceu as escadas, satisfeita de poder sair e usar seu vestido novo.
- Você está muito mais bela do que merece um pobre coitado como eu. - Greg assobiou em aprovação.
Tânia percebeu, preocupada, que ele já tinha bebido bastante.
- Greg, tem certeza que deseja ir?
- Vamos sim. Mark vai cortar minha cabeça se eu não for. Além disso, não perderia a festa por nada deste mundo. Você será a mulher mais linda de lá e meus
amigos precisam vê-la. Vamos mostrar que ainda não estou morto!
- Oh, Greg, mas só vou com uma condição: eu dirijo, está bem? - Tânia pediu, prevenida. Não queria sofrer um acidente por excesso de bebida.
- Adorável criatura, você está absolutamente certa. Seu desejo é uma ordem. Dirija - Greg disse, procurando nos bolsos as chaves do carro.
A princípio Tânia estranhou aquele carro enorme. Estudou o painel, que tinha mais botões do que um avião, com toda atenção, e começou a andar bem devagar.
Logo sentiu-se segura. Greg sorria e ensinava o caminho até Houston, onde seria realizada a recepção.
A festa era num imenso e luxuoso clube particular. Flores perfumadas enfeitavam todas as dependências. O salão principal estava iluminado por um grande candelabro
de cristal. As toalhas das mesas eram de renda branca, a louça de porcelana e os talheres de prata. Havia um centro de flores em cada mesa. Tânia e Greg olhavam
o salão de jantar e o de baile, mais adiante, onde o chão brilhava, convidativo. Ouvia-se uma música suave, acima de vozes que riam e conversavam. Mas pouca gente
dançava.
Quase todos os convidados tinham um copo na mão. O garçom, serviu gim-tônica para Tânia e uísque para Greg. Este parecia à vontade e conhecia todo mundo.
Em algum lugar, Tânia perdeu Greg de vista. Mas não ficou preocupada com isso, pois em nenhum momento chegou a ficar sozinha. Sempre tinha alguém conversando
com ela, tirando-a para dançar, trazendo bebida. Logo, estava com o terceiro copo cheio na mão.
Conversava com um texano alto e queimado de sol, quando sentiu um súbito calafrio. Não via, mas sabia que Mark devia estar lá. Virou-se e encontrou os olhos
dele, do outro lado da sala, perto da entrada. Ficou encarando-o com o coração na garganta. Que emoção Mark provocava nela! Sacudiu a cabeça, tentando recuperar-se.
Nisso, as pessoas encobriram Mark e ela fugiu para dentro de um banheiro, arrasada com aquela aparição súbita.
Olhou-se detidamente no espelho. Agora, sabia que não podia mais fugir da verdade: estava apaixonada por Mark! Atordoada e desgostosa consigo mesma, ficou
sentada um tempo com a cabeça entre as mãos, sentindo as emoções descontroladas.
Isso não pode ser. Simplesmente, não pode ser. Essas coisas não podem acontecer assim, de um lado só. O amor exige correspondência, interesses mútuos, afinidades.
Não consegue florescer no terreno inóspito do desentendimento, ela pensou. Mas seu bom senso a fazia ver que seu amor tinha crescido num terreno exatamente assim.
"Como pode ser tão idiota?", ela se perguntou. Ao ver um grupo de mulheres encarando-a, deu-se conta de que havia falado alto. Saiu dali depressa, para procurar
Greg e pedir que a levasse embora.
Chegou no salão bem a tempo de ver a entrada triunfal de Virgínia Lee. A mulher ficou parada na porta, numa pose sedutora, dando a impressão de procurar
alguém. O vestido dourado que usava caía, com perfeição, por seu corpo escultural, e era apenas um complemento para seus sedosos cabelos avermelhados. Seus olhos
verdes estavam muito bem maquilados, dando-lhe um ar exótico.
Ela ficou lá, procurando, enquanto cada homem na festa desejava ser o objeto da sua procura. Fingia não reparar que era o alvo das atenções quando, provavelmente,
tinha preparado toda a cena.
Ginny Lee sorria de leve, como que aceitando todas aquelas homenagens. Andou pelo salão, como uma deusa descendo do seu pedestal. O brilho do vestido realçava
todos os movimentos que ela fazia, ao caminhar.
Que aparição! Tânia sacudiu a cabeça em simpatia por Greg e foi à sua procura. Quinze minutos depois, tinha percorrido o clube todo e nem sinal dele. Estava
na última sala, quase vazia, quando Mark entrou e fechou a porta atrás.
Tânia ficou quieta, sem saber o que dizer. Ele estava elegante de smoking. Parou na entrada, rindo da expressão atordoada dela.
- Tânia...
Seu nome parecia uma carícia nos lábios dele. A voz de Mark fazia os joelhos dela dobrarem e as mãos tremerem. Uma onda de calor percorreu-a toda, quando
captou o fogo daqueles olhos. Olhos de um animal prestes a dar o bote, ela pensou, resistindo a um impulso louco de se atirar naqueles braços. Não só estava apaixonada
por Mark, como também o desejava com total descontrole, constatou, meio constrangida com essa inesperada descoberta.
- Teve saudade de mim, Tânia? - Ele estava diante dela, quase tocando seu corpo.
- Certamente que não. Tenho estado tão ocupada que nem notei que tinha partido.
- Hummm... deixa eu ver, deixa? - A intenção de Mark era clara demais.
Tânia fugiu para trás da grande poltrona de couro. Ficou encostada na janela, com as costas contra o veludo das cortinas. Estava como uma prisioneira ali
e olhava Mark, sem dizer uma palavra.
Mark foi chegando perto bem devagar, fazendo suspense. Tânia nunca sentiu emoções tão contraditórias: queria com a mesma força que ele sumisse e que a abraçasse.
Por um momento, ele não a tocou, mas só aquele olhar irresistível reduziu a nada as defesas dela.
Já não tinha qualquer vontade de lutar contra o desejo, quando ele a pegou pela cintura e beijou-a na boca, com paixão. Correspondeu totalmente, sem coragem
para negar o desejo que brotava em todo o seu corpo. Os dois estavam tão agarrados um ao outro, que pareciam totalmente esquecidos do mundo, envoltos num clima mágico
de onde não tinham a mínima vontade de escapar.
A porta abriu de repente, trazendo-os de volta à realidade. Tânia e Mark se separaram, tontos e surpresos.
Ginny Lee olhou de um modo fulminante para a mulher que estava nos braços de Mark, mas logo disfarçou.
- Mark querido, todos estão procurando você. - A suavidade da voz dela fez Tânia perceber que devia estar fingindo, só para confundi-los. - O senador Johns
deseja vê-lo imediatamente. Depressa, por favor. Ele me disse, querido, que vai embora em dez minutos e você sabe quanto ele é importante.
- Eu sei - ele concordou, olhando com atenção para o rosto de Tânia.
Ignorando a presença de Ginny Lee, tocou o rosto de Tânia com o dedo e riu quando ela baixou os olhos. Então, beijou a ponta de seu nariz, dizendo:
- Fique aqui, por favor. Vou ver esse homem e volto já.
Ginny esperou Mark se afastar. Aproximou-se e segurou o braço de Tânia, que já ia sair.
- Sente-se aqui, querida. - Sua voz mal escondia a raiva. - Estou vendo que Mark voltou aos seus velhos truques, tentando seduzir cada nova mulher que aparece
no pedaço. Com você, ele começou depressa.
- Desculpe, mas...
- Não precisa bancar a fina senhora comigo. Eu conheço todos esses machões e Mark é um dos piores. Nenhuma garota está a salvo com ele. Nem mesmo a amada
mulher do primo dele.
Tânia olhava Ginny como se estivesse vendo fantasmas.
- Não precisa ficar horrorizada. Isso acontece todo o tempo, sabe. É tão conveniente para nós... Mark apenas tem que mandar Greg para fora, a serviço, e
então pode me ter quando quiser. Há bem pouco tempo ele decidiu que me queria para tempo integral. Por que mais eu estaria me divorciando de Greg? Ora, querida,
deixe de bancar a idiota, e pense que Mark não tem mais nada em mente do que alguns momentos de prazer, com uma nova mulher, que além de tudo, é bonita.
Tânia não queria ouvir mais nada. Pegou a bolsa e saiu da sala, com a maior dignidade possível, controlando o impulso de cobrir Ginny Lee de pancadas. Essa
mulher tinha acabado de assassinar um caso de amor recém-nascido!
Ao sair do clube, sozinha, percebeu que tinha esquecido o casaco, mas não ia voltar para pegar. Nenhum frio podia ser comparado ao gelo que derretia seu
coração naquela noite.
Com lágrimas escorrendo, pegou as chaves do carro. Esperava que Greg a perdoasse por fugir com seu carro e deixá-lo a pé, mas precisava ir embora daquele
lugar imediatamente, e encontrar um canto para desabafar as suas mágoas.
O estacionamento estava repleto. Um vento úmido batia em seus cabelos e sua roupa. Tânia tentava se lembrar onde tinha deixado o carro. Todos eram iguais.
Finalmente o encontrou e abriu; então viu Greg deitado no banco de trás, dormindo, completamente encharcado.
Soluçou aliviada e deu a partida, correndo para longe... longe de Mark e sua traiçoeira sedução... longe daquela mulher horrível que estava tendo um caso
com ele.
A chuvarada apanhou-os antes que se encontrassem a meio caminho de Galveston. A chuva estava tão pesada que Tânia desistiu e parou o carro no acostamento
da estrada. Tinha medo de seguir adiante, pois o pára-brisa não dava conta de toda água que caía.
Gelada até os ossos, se enrolou como um gatinho no banco da frente. Não esperava dormir, mas só acordou com a luz do dia. A chuva ainda caía sobre o automóvel.
O paletó de Greg estava sobre ela. Tânia virou-se para trás.
Greg estava em mangas de camisa, roncando profundamente. Acordou quando ela levantou e, com surpreendente agilidade, passou para o banco da frente, ao lado
dela. Recusou o paletó que Tânia lhe oferecia.
- Hummm, está meio úmido lá fora, não está? Deus! Sinto-me como se alguém tivesse tirado minha tampa e me esvaziado todo.
Tânia sorriu.
- Sempre costuma chover tanto nesta parte do mundo? - Ele olhou através do vidro.
- Você chama de chuva essa garoinha aí? Deus, senhora, devia ver o que acontece quando realmente resolve chover.
- Acha que podemos tomar um café por aqui? - Greg consultou o relógio.
- Há uma lanchonete fantástica aqui perto, que já está aberta.
Era realmente um lugar agradável. Ficaram quase uma hora lá. Greg não fez referência alguma a Ginny Lee, e Tânia também não disse nada. Não queria mexer
nas próprias feridas.
Mais tarde, voltaram tranquilamente até Galveston. Quando chegaram em frente à casa, Greg embrulhou-a em seu paletó e ambos correram até a porta, debaixo
da chuva. Mark estava lá dentro, com uma cara de pouquíssimos amigos.
- Onde diabos você estiveram até agora? - ele perguntou, sem nem ao menos se dar ao trabalho de cumprimentá-los.
(*) CAPITULO XII
Tânia sentiu o coração apertado. Mas sacudiu os cabelos molhados e, com um olhar de desafio, passou por Mark a caminho do seu quarto.
Mark agarrou-a com força pelo braço, mas ela deu um puxão para se libertar dele.
- Nunca mais me toque de novo, sr. Mark Anders. Se eu não tivesse que trabalhar com você, nunca mais queria vê-lo em toda a minha vida. Ouviu bem?
Ele a olhava com os olhos apertados e uma expressão furiosa, que não escondia sua vontade de socá-la.
- Você ouviu bem? - ela repetiu, enfrentando-o com a mesma raiva, sentindo que tinha toda razão para maltratá-lo.
Depois dessas palavras, correu para cima e se trancou no seu quarto, tão desesperada quanto qualquer mulher apaixonada pode se sentir, numa circunstância dessas.
E tudo aquilo acontecera por sua culpa, ela se lamentava. Por que não teve o bom senso de evitar Mark com firmeza desde o início? Não>, tinha se esquecido de tudo,
atraída por aquele charme fatal.
Sabia muito bem que sua própria natureza selvagem tinha muita culpa naquela história. Foi essa natureza selvagem que a ligou tão profundamente a Mark e que a fez
vir para os Estados Unidos em busca de novas emoções. E, agora, estava apaixonada! O que podia fazer para lutar contra isso?
O amor que sentia por Mark era completamente diferente do que tinha por Kurt. Agora ela era uma mulher adulta e não uma adolescente inexperiente. Agora seus desejos
eram outros. Sentia falta do corpo de Mark colado ao seu, ansiava pela presença dele cm vez de se contentar com um amor platónico.
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Deus do céu!, Tânia pensou, desconsolada, como faço para esquecer Mark?
Entendendo como ele era, sabendo que não se contentava só com uma mulher, ficava mais claro do que nunca, para ela, que precisava esquecê-lo o quanto antes. Afinal,
não tinha ido para os Estados Unidos para fazer parte da coleção de mulheres de Mark Anders!
Depois de se arrumar, Tânia foi trabalhar apavorada com a ideia de ter que encontrar Mark. Mas, chegando à United, viu que não precisava se preocupar pois ele não
estava lá, nem Greg. Karen contou que Mark tinha ido para Nova York, a negócios, e Greg para o Caribe. A plataforma Sea Venture estava em dificuldades por causa
das chuvas que caíam há dias por lá.
Mark e Greg viajando. Sem querer, as palavras de Ginny Lee voltaram à cabeça de Tânia. "Mark manda Greg viajar a serviço para me ter só para ele..." Será que Mark
tinha viajado mesmo ou estava ocupado com Ginny? Talvez tivesse viajado com ela, pensou.
De qualquer forma, foi ótimo Mark ter sumido pois Tânia mergulhou no trabalho. Ia para casa exausta, sem energia para mais nada a não ser dormir. Assim, não sofria
tanto. Dor de amor é difícil de se curar e ela sabia muito bem disso.
No sábado à noite, trabalhou até tarde e foi a última a deixar o escritório. Foi para casa tão cansada, que nem guardou o carro na garagem. Deixou-o na porta mesmo,
pensando que não faria mal nenhum se ele dormisse fora só um dia.
Quando empurrou a porta da casa, quase caiu nos braços de Mike Lane que vinha para recebê-la.
Ele a segurou, rindo.
- Oi, tenho que vir aqui com mais frequência, só para ter uma recepção dessas!
- Mike! Como veio parar aqui? Você não devia estar em Dálias a uma hora destas?
- Voaria distâncias muito maiores apenas para ter o prazer de ouvir essa doce fala inglesa, linda senhora. Quer ir a Houston comigo ou já tem planos para esta noite?
- Seria fantástico, Mike. - Tânia esqueceu temporariamente o cansaço imenso que sentia, animada com a perspectiva de dar um passeio. - Vou trocar de roupa. Em dois
minutos fico pronta.
Tânia vestiu uma saia vermelha, nova, com uma camiseta preta
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chiquíssima e sapatos de salto alto também pretos. Pegou uma bolsa vermelha, pequena, e um blazer preto. Pôs uns brincos dourados, uma pulseira, deu uma escovada
nos cabelos e correu para baixo. Lá, chamou por Ma e explicou que ia jantar fora.
- Sei que não é da minha conta, mas onde vai?
Tânia achou estranho que Ma perguntasse, mas não teve tempo de responder.
- Estamos indo para Houston - Mike disse antes dela, sorrindo todo charmoso para Ma. - Vamos a um cinema ou talvez dançar um pouco. Provavelmente voltamos tarde.
Ma examinou bem o rosto simpático de Mike e depois falou:
- Divirtam-se, mas cuidado! Não confio nesses motoristas do Texas. Eles andam feito loucos por essas estradas.
Mike achou graça e, quando saíram, perguntou:
- Quem é ela? O dragão encarregado de proteger sua virtude?
Tânia riu da piada, mas não estava muito satisfeita. Ma, na verdade, parecia exatamente o dragão protetor de uma donzela. Mark teria a audácia de instruí-la para
que vigiasse seus passos?
Impossível! Isso era simplesmente ridículo! Tânia decidiu colocar esse pensamento de lado e divertir-se, na companhia do agradável comandante.
Comeram no Boston Half Shell, um restaurante de frutos do mar que servia porções generosíssimas. Depois de se deliciarem com os quitutes, foram ao cinema. Na saída,
Mike sugeriu que fossem dançar num lugarzinho gostoso, que uns amigos tinham recomendado.
Era uma espécie de bar-dançante. Numa sala, ficava a pista de danças; na outra, mesas baixas, iluminadas por velas, separadas entre si por bonitos biombos de madeira.
Em vez de cadeiras, havia sofás macios, de couro, muito confortáveis. Tânia imediatamente sentiu-se à vontade ali.
O bar estava cheio de gente interessante, rindo e conversando. Mike pegou uma mesa, pediu a bebida e convidou Tânia para dançar. Ela gostou de acompanhá-lo no ritmo
da música.
Depois de várias faixas, a orquestra fez uma pausa e eles voltaram para a mesa. No caminho, ainda rindo de uma das piadas de Mike, Tânia foi direto na direção de
Mark, sem vê-lo por causa da escuridão. Ele estava na beira da pista com o braço ao redor da cintura de Ginny Lee.
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- Bem. . . bem, o que temos aqui? - perguntou macio, olhando firme para Tânia, que chegou a pensar que ele a tinha seguido até ali.
A verdade crua era que Mark estava com Ginny Lee, enquanto Greg viajava, atendendo às ordens dele.
- Mark Anders! Engraçado encontrá-lo aqui - comentou Mike, tão sereno quanto Mark.
Sim, engraçado mesmo, pensou Tânia, realmente engraçado.
- É. . . Alô, Tânia. Você conhece Ginny Lee, claro. Virgínia, este é Mike Lane, comandante do Concorde - Mark apresentou.
O sorriso de Ginny Lee era uma coisa Ifnda de se ver, como se escondesse uma eterna promessa.
- Estou completamente encantada por conhecer o piloto desse avião fantástico - Ginny disse, com um tom de voz sedutor.
- Obrigado, srta. Sims.
Ninguém corrigiu para "senhora" Sims.
- Parece que estamos bloqueando a passagem. Não querem sentar com a gente? - perguntou Mike.
Tânia odiou aquela ideia, mas hão tinha saída. O que ia dizer: me recuso a sentar ao lado deste crápula? Sentaram e pediram vinho. Mike convidou Tânia para dançar
assim que a orquestra voltou a tocar. Dançaram duas músicas e Mark chegou perto deles.
- Você me concede a honra de dançar com sua encantadora parceira? - perguntou, olhando para Mike.
- Desde que não abuse - Mike respondeu, rindo.
Nenhum dos dois prestou atenção ao protesto dela. Tânia não viu saída: dançava com Mark, ficava sem par no salão, ou fazia uma cena em público? Desistiu e resolveu
dançar, mesmo contra a vontade. Mas foi só Mark prendê-la em seus braços para ela se arrepender profundamente da decisão.
A cabeça de Tânia girava. Ter que se controlar nos braços de Mark depois de todo vinho que havia tomado era demais para ela. Sentia que o odiava por tudo que ele
era capaz de fazer mas, ao mesmo tempo, queria-o perdidamente.
Como podia amá-lo tanto? Isso não era direito e ela precisava lutar contra esse sentimento. Involuntariamente, afastou-se mais de Mark. Ele percebeu, deu um sorriso
disfarçado e, apertando-a contra o corpo, roçou seus lábios nos cabelos dela. Tânia não sabia como impedir aquela proximidade que já ameaçava pôr abaixo todas as
suas defesas.
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A orquestra mudou para um ritmo bem lento, e Mark a apertou mais junto do corpo. O rosto dela encostou no ombro dele e ela aspirou o perfume de Mark. Tânia
não agüentava mais sentir o calor daquele corpo contra o seu. Era demais!
Parou, de repente, e disse a Mark que queria voltar à mesa. Falou tão decidida, que ele nem discutiu, acompanhando-a de volta. Chegando onde estavam sentados,
ela percebeu que Ginny Lee tinha saído.
- Mike, eu gostaria de ir embora. É tarde e estou cansada - Tânia pediu, num fio de voz.
- Claro, Tânia. Você ainda fica, Mark?
- Estão indo para Galveston? Posso pegar uma carona? Eu vim com Ginny Lee no carro dela e ela foi embora em um de seus acessos de raiva. Nunca vou achar
um táxi a essa hora da noite. Minha única solução é a carona de vocês.
Mark olhava sério para Mike, que estava morto de vontade de recusar, mas concordou educadamente, como Mark já sabia que faria.
No carro, Tânia sentou-se entre os dois, sentindo o braço de Mark displicentemente colocado sobre as suas costas. Afastou-se para mais perto de Mike, mantendo-se
rígida até Galveston. Mas o tempo todo estava consciente da presença de Mark ali junto dela, sentindo seu conhecido perfume e ouvindo sua voz grave e musical.
Quando chegaram à cidade, ele ofereceu hospedagem a Mike.
- Tenho quartos demais em casa. Se quiser ficar lá, será um prazer.
- Obrigado, Anders. Vou aceitar.
- Ótimo. Deixamos Tânia e vamos para minha casa.
Tânia queria enforcar Mark. Certamente tinha mandado Ginny Lee na frente, esperá-lo na cama, e ficou só para atrapalhar a noite dela com Mike.
Mike saltou com ela no portão e passou o braço pela sua cintura.
- Vou apenas levar Tânia até a porta, lá em cima. Volto num minuto, Anders - ele avisou.
- Não há pressa.
Mike parou na porta e levantou o rosto dela.
- Preciso estar em Dallas no começo da tarde, amanhã. Toma café comigo de manhã?
O pedido tinha um significado especial. Ela lembrou-se do comentário de Mark sobre a habilidade de Mike em conquistar as mulheres. Então, sacudiu os ombros,
indiferente ao perigo que poderia correr.
- Com prazer, Mike.
Ele abaixou para beijá-la, mas Mark bateu a porta do carro com tamanho estrondo, que alguém acendeu a luz da varanda, para ver o que estava acontecendo.
- Durma bem, Tânia - disse Mike, dando um beijo rapidíssimo, que mal tocou os lábios dela. - Até logo mais, então.
Quando Tânia ia entrar, Ma abriu a porta.
- Achei que era você, então acendi as luzes para que não caísse no escuro. Divertiu-se?
- Sim, obrigada. Não devia ter esperado. Boa noite, Ma. - Ela começou a subir a escada.
- Eu não esperei. Apenas vim tomar uma xícara de café. Mark encontrou você? Ele acabou de chegar.
- Mark? Ele esteve aqui procurando por mim?
- Claro que esteve! Chegou logo depois que você saiu. Ginny Lee estava aqui procurando por ele. Saíram juntos. Eu contei que você tinha ido a Houston com
aquele piloto.
Então ele sabia que Tânia estava em Houston com Mike!
- Por que Ginny veio procurar Mark aqui?
- Essa Ginny Lee não tem nada na cabeça - a empregada resmungou. - Ela é apenas uma criança mimada. Apronta mil e uma confusões. Não sei por que ela queria
encontrar Mark, mas sei que passa um pente fino pela cidade quando decide encontrá-lo. Sempre foi assim. Ginny anda atrás dele o tempo todo.
Tânia subiu para o quarto, sentindo uma incrível necessidade de ficar só. Então Mark sabia que ela estava com Mike e tinha ido procurá-la. Mas não entendia
por que levou Ginny Lee com ele.
Na manhã seguinte, Tânia foi tomar café da manhã com Mike em um dos restaurantes do Old Strand. Na volta, passaram pela Igreja do Sagrado Coração e Tânia
decidiu ficar lá. Despediu-se de Mike e entrou na igreja. Embora não costumasse freqüentá-la muito, sentia que naquele lugar talvez pudesse encontrar alguma paz.
Entrou devagarinho e sentou-se na frente.
À pequena distância, reconheceu Karen Prescott, com uma criança do lado. Tânia chegou perto. Quem sabe Karen não queria dar um passeio nessa linda manhã
de domingo? A jovem levantou, de repente, com o garoto nos braços. Tânia parou, chocada. O menino era a cópia de Mark! Tinha os mesmos olhos cor de avelã, os mesmos
cílios escuros e curvos, os cabelos castanho-claros caindo na testa. Ele sorriu para alguém, com o mesmo sorriso maroto.
Karen não tinha visto Tânia, pois a igreja estava cheia, e ela não teve tempo de chamá-la. Como a jovem e a criança já estavam saindo, lentamente foi atrás
e chegou na escada a tempo de ver o Jaguar de Mark aparecer. Ele parou, saiu e carregou o menino, que gritava de alegria. Mark abriu a porta do carro para Karen
entrar e pôs o garoto no colo dela. Deu a volta, sentou no lugar do motorista e partiu.
- Chocante, não?
Enquanto olhava a cena, Tânia não tinha percebido Ginny Lee chegar. É, parecia que Ma estava certa: quando Ginny queria encontrar Mark, sabia aonde ir.
- Ele nunca vai casar com ela, é claro, mas a mantém muito bem. Muito bem... mesmo. - Ginny comentou, sarcástica. - Ele vê sempre o menino, não descuida
um momento de sua educação. Mark não se importa com o que os outros pensam, age só como deseja e é isso que o faz um homem como ninguém. É claro que eu nunca falo
em Karen ou no menino. Ele sabe como sou tolerante. Isso nunca poderia afetar o que existe entre nós.
Tânia queria morrer. Foi embora, sem olhar para Ginny. Como ela podia ser assim? Como podia? Karen era uma pessoa tão doce. E esse garotinho...
As lágrimas escorriam pelo rosto de Tânia. E esse homem, o pai da criança de Karen, era o homem que ela amava...
Andou quilômetros perdida em seus pensamentos, incapaz de chegar a qualquer conclusão. Quanto mais cansada ficava, mais impossível achava decidir alguma
coisa a respeito de Mark. Negava aquele amor que sentia com uma violência que beirava ao desespero, mas não sabia como obrigar seu corpo ardente a cooperar com ela.
Desejava Mark como o ar que respirava.
Repentinamente, o famoso vento norte começou a soprar. O céu ficou cinzento em um minuto e a temperatura caiu com incrível rapidez. A roupa de Tânia, levinha,
encharcou logo. Ela agradeceu à sua boa estrela quando encontrou uma cabine telefônica e, com dedos trêmulos, mal conseguiu pôr uma moeda para ligar para Ma.
Do outro lado da linha, o telefone tocava, tocava e ninguém atendia. Por favor, Ma, atenda, Tânia implorava. Mas a empregada e o marido provavelmente tinham
saído e todos os apelos dela foram em vão. Desligou, desanimada.
O que poderia fazer numa circunstância dessas? A imagem de Mark lhe veio à cabeça, como se ele fosse um anjo salvador que poderia tirá-la daquele embaraço.
Sim, Mark era a única pessoa capaz de resgatá-la e levá-la para casa, Tânia concluiu, mais esperançosa. Mas onde poderia encontrá-lo? Ele tinha acabado de sair junto
com Karen e o menino, provavelmente iria levá-los em algum lugar para passar o domingo em família. Esse pensamento irônico serviu para deixar Tânia desesperada.
De repente, achou que era uma perda de tempo querer contar com Mark numa hora dessas.
Sem se lembrar de mais ninguém a quem pudesse recorrer, ela discou para a telefonista e explicou seu problema. A moça pediu sua localização e prometeu mandar
um táxi especial imediatamente. Provavelmente, já estava acostumada com esse tipo de emergência.
Mas os minutos se passavam e nada do carro aparecer. Tânia estava completamente gelada, sentindo as roupas molhadas colarem em seu corpo. Ali, naquela cabine
apertada, ela não tinha como se esconder do vento norte que soprava com uma fúria fantástica, parecendo disposto a derrubar tudo que encontrasse no seu caminho.
Nunca havia visto um vendaval igual. E ter que se submeter a fúria de um, sozinha, pela primeira vez na vida, não era nada agradável. Os maus pensamentos tomavam
conta da cabeça de Tânia, que já estava plenamente convencida de que não sairia dali viva.
O táxi demorou quinze minutos que pareceram séculos. Quando o motorista abriu a porta do carro, Tânia estava completamente dura de frio. Seus dentes batiam
tanto, que mal pôde dar o endereço da sua casa.
Chegando lá, encontrou tudo em completo silêncio. Ma e o marido tinham, realmente, saído. Tânia correu para o banheiro, tomou um banho bem quente e depois
foi deitar, se enrolando embaixo dos cobertores. Mas demorou muito tempo até conseguir se esquentar e mais tempo ainda para conseguir dormir, depois daquela manhã
que tinha começado bem e terminado tão mal.
Capítulo XIII
- Psiu... Tudo bem, Tânia. É apenas uma pesadelo - disse Mark, carinhoso.
Ela se debatia sem parar na cama, tentando sair daquele labirinto em que estava. Mas mãos firmes a seguravam.
- Ela está queimando de febre - Ma avisou.
- Ma, traga o dr. Allen, mas diga para ele vir já.
Tânia reconheceu a voz de Mark e quis bater nele com os punhos fechados. Ele a agarrou com firmeza, forçando-a a se deitar novamente.
- Homem horrível, desprezível - Tânia murmurava, olhando Mark fixamente. - Eu te odeio, me solte! me solte!
- Tânia, acorde, acorde! - Ele a sacudiu de novo.
- Eu... estou... acordada. Tire essas mãos nojentas de mim!
Mark soltou-a, extremamente pálido, e se voltou para Ma:
- Encontrou o dr. Allen?
- Sim. Ele vem vindo.
- Tome conta dela até que ele chegue - Mark recomendou friamente, antes de deixar o quarto sem ao menos dar um olhar a Tânia, que se debatia na cama. Depois
disso, ele nunca mais veio vê-la durante todo o tempo em que esteve doente.
A febre tomou conta de Tânia, enfraqueceu seu corpo e derrubou todas as suas resistências. Parecia que ela estava vivendo um eterno pesadelo. Sentia-se tão
mal que queria morrer. Sua temperatura não baixava e ela não tinha vontade de comer nada.
O médico que Ma havia chamado veio várias vezes. Disse à empregada que Tânia não estava nada bem. Era melhor não insistir com ela para comer, mas não devia
descuidar dos líquidos. Era preciso beber muito para não ficar desidratada.
Tânia sabia que estava doente pelo amor de um homem que a desprezava. A febre passaria, mas sua doença real, nunca.
Na sexta-feira, Karen apareceu no fim do dia.
- Você acha que dá para voltar ao trabalho na próxima semana?
- Espero que sim. Por quê? Algo errado?
- Bem, Dick Handy teve um enfarte antes de ontem. Aparentemente vai se recuperar, mas vai ser duro substituí-lo, nessa altura do campeonato. Como se não
bastasse, Hendrix hoje caiu e quebrou a perna. Está hospitalizado. Por algum tempo não poderá se mover muito. Mark está viajando e não vai passar por aqui exceto
para reuniões de emergência. Isso deixa você com uma sobrecarga de responsabilidades.
Tânia estudava o rosto de Karen. Ela não demonstrava nenhum sinal de emoção, só parecia mesmo preocupada com a United e a saúde da amiga. Se sentia saudade
de Mark, sabia esconder muito bem. Que diabo de relação eles dois tinham? Karen não parecia se interessar muito por esclarecer isso.
- Para onde Mark foi desta vez? - Tânia perguntou, sem levantar os olhos.
- Agora está na África do Sul, depois precisa ir ao Japão e à Austrália. Ele tem negócios no mundo todo, você sabe, e tem negligenciado ultimamente.
Tânia estava curiosa.
- Não, eu não sabia. Por que tem negligenciado seus interesses ultimamente?
- Não sabe? - Karen explodiu de rir, mas não deu maiores explicações.
- Não, não tenho idéia. - Tânia estudou a expressão da outra. - Você sente saudade dele quando viaja?
- Oh, sim! Claro. Mark é uma pessoa formidável e Clint, meu garoto, fica desolado quando seu tio viaja. Mas ele não pode ter tudo e precisa aprender isso,
para dar valor às coisas que Mark faz por ele.
- Tio Mark. É assim que seu filho o chama?
- É claro. - Karen mudou de assunto, aparentemente achando que Tânia tinha feito uma pergunta óbvia. - Mark empregou um novo analista para o computador,
mas ele vai demorar até que possa se integrar no trabalho. Precisamos realmente de você na United.
Segunda-feira, Tânia chegou ao escritório bem cedo e num abrir e fechar de olhos estava envolvida com trinta mil providências urgentes que requeriam sua
atenção. Dan Lewis, o novo analista, dominou o computador com inteligência e rapidez. Era competente como qualquer pessoa contratada por Mark.
Lá pela terceira semana de março, o equipamento de perfuração foi colocado em posição. Greg apareceu. Estava sério e deprimido pelo divórcio. Ficou chocado
com a magreza de Tânia e começou a chamá-la de "magrela", insistindo que ia levá-la para jantar várias vezes em sua companhia, até que ganhasse de novo os quilos
perdidos. Seu bom humor melhorou o estado de espírito de Tânia, fazendo-a sorrir, pela primeira vez, desde que Ginny Lee tinha anunciado a paternidade de Mark.
Na ausência de Mark, era Greg quem supervisionava a instalação final do equipamento. Voava diariamente de helicóptero, indo e vindo até a plataforma situada
duzentas milhas dentro do golfo.
Mark tinha aparecido duas vezes na companhia, para reuniões extraordinárias com o pessoal de outros departamentos, mas Tânia não o viu. Ficou sabendo disso
depois. Melhor assim, pensou. Quanto mais tempo ficasse sem vê-lo, mais depressa o esqueceria.
Ainda não estava preparada para encontrá-lo quando deu de cara com ele na sua sala, ao levantar os olhos de uns papéis que examinava. Sorriu, sem graça,
sentindo o coração disparado.
- Espero você na reunião, em quinze minutos - foi só o que Mark falou, sem um sorriso.
Tânia respirou fundo, pegou alguns papéis na mesa e foi para a reunião. Precisava de um dobrado autocontrole para encobrir seu turbilhão interior.
A rotina da United continuou normal. Finalmente, todo o equipamento de perfuração foi colocado em posição e a plataforma ficou pronta para entrar em funcionamento.
Toda a equipe teve que ir para lá.
O poço ia ser perfurado logo. A corrida contra o tempo e a natureza começava. Ian Taylor, que tinha trocado a Empire Petroleum de Londres pela United, ficava
fechado em sua cabine de vidro, lá no alto da gigantesca perfuradora, de olho nos registros do painel que o informavam sobre as variações do desempenho das perfuradoras.
Toda vez que Tânia e Mark se encontravam, o clima ficava péssimo. Ela continuava doente de amor por ele. Quando o observava de longe, reconhecia que Mark
tinha qualidades: era um ótimo chefe e um excelente organizador. Sabia escolher, como ninguém, o pessoal que trabalharia para ele e conseguia tirar o máximo proveito
do trabalho de todos. Decidido e infatigável, ele estava sempre disposto a resolver qualquer problema da United e conhecia, nos mínimos detalhes, o projeto de que
Tânia participava. Aliás, era informado de tudo que se passava na companhia.
Mas se por um lado Tânia admirava o Mark profissional, de outro, detestava profundamente o Mark que a beijara e a tinha enganado tão facilmente. Achava que
não poderia perdoá-lo nunca e também não se perdoava pela sua impotência em controlar seus sentimentos.
Por que eu não consigo esquecê-lo?, se perguntava mil vezes. Não havia resposta. Só se consolava no trabalho, quando ia para seu canto e se ocupava com o
computador, que a informava sobre tudo o que acontecia no buraco que estavam cavando nas profundezas do mar.
Uma manhã, Mark foi para Galveston no primeiro helicóptero. Tânia ficou triste e aliviada ao mesmo tempo. Ela o desejava por perto, queria vê-lo e ouvir
sua voz e seu riso, mas, ao mesmo tempo, o odiava. Como podia viver com sentimentos tão contraditórios?
Bastava ela dormir para sonhar com Mark. Nesses sonhos, eles estavam sempre se beijando, se acariciando, perdidos no mundo das sensações. Tânia acordava
louca de desejo, sabendo que essa vontade de amar Mark jamais seria saciada. Tinha se convencido de que não havia futuro para ela ao lado dele. Racionalmente, estava
decidida a deixá-lo de lado, e tentar achar outra pessoa mais honesta. Mas seu coração apaixonado não se convencia facilmente e ela sofria, por amor. Começou novamente
a perder peso.
Uma noite, estava comendo distraída quando Greg sentou-se na frente dela na mesa do refeitório. Enquanto a bandeja dele tinha umas quatro travessas, a de
Tânia mostrava apenas um prato de salada e um copo de suco.
- Tenho que fazer como você - Greg suspirou -, senão vou ficar como um barril.
Tânia riu, vendo que ele falava mas comia feito louco.
- Ainda está sem apetite? Pelo amor de Deus, Tânia, você me preocupa - Greg disse, quando terminou.
- Estou bem, Greg, não precisa se preocupar comigo.
- Bolas! Alguém deve. Não sei o que anda errado com aquele primo meu. Eu teria jurado que... - fez uma pausa. - Talvez seja falta de exercício.
- Greg, você é um amor, mas eu já pedi para não se preocupar. Posso tomar conta de mim e creio que não vou aceitar interferência de quem quer que seja. Gosto
muito de você, mas não pode se responsabilizar por mim. Não vou permitir isso.
- É. Eu soube o que aconteceu com o pobre velho Mark, quando ele tentou...
Tânia cortou, rápido.
- Pobre velho Mark... até que gostei dessa! O seu primo é o mais arrogante, insuportável, odioso e imoral homem que eu tive o azar de conhecer. Não há ninguém
neste mundo capaz de penetrar naquela armadura e feri-lo.
Greg a olhava, espantado.
- Uau, Tânia! Não quis... - Ele parou, tomando um grande gole de café. - Mark não é assim como você está dizendo, ele na verdade é um grande sujeito.
- Sim... bem... defenda-o, se precisa. Tenho certeza de que ele dá um jeito de fazer o que bem entende com as pessoas, com a colaboração delas.
Greg decidiu não discutir, vendo o ar raivoso de Tânia.
- Gosta de andar de barco, Tânia? - Ele mudou de assunto.
- Adoro.
- Que tal ser a tripulante do meu catamarã?
Greg tinha um barco chamado Sea Breeze e pretendia participar do campeonato mundial de catamarãs, no próximo verão. A competição seria na South Padre Island,
no golfo do México. Ele precisava de mais uma pessoa na tripulação.
- Se quiser, pode ser a tripulante oficial. Acho que você é a pessoa que eu precisava, Tânia.
- Mas eu nunca andei num catamarã, Greg. Não saberei como agir se der algum problema.
Ian Taylor passou por perto nesse momento e chamou Greg.
- Não vou roubá-lo por muito tempo, Tânia. Preciso mostrar uma coisa rápido, aqui no painel da perfuradora.
- Tudo bem, Ian. Não vou subir com vocês, espero aqui.
Os dois subiram na máquina pela escadinha estreita, de metal, e Tânia ficou perdida em pensamentos.
Como Mark podia partir o coração de seu primo com tanta indiferença? Certamente ele tinha muitas mulheres disponíveis para satisfazer sua imagem de machista.
Ela nunca o perdoaria e nunca iria se curar do mal que ele havia provocado ao seu coração. Nunca.
Agora até já admitia a si mesma que nunca esteve realmente apaixonada por Kurt, seu noivo. O que sentia por Mark era tão diferente daquilo que antes considerava
amor! Tão diferente quanto a paisagem do Texas da sua terra natal!
Com crescente desespero, ela encarava o fato de que nunca mais seria capaz de amar outro homem, em tempo algum no futuro. Era mulher de um homem só, como
sua mãe. Mas como era possível amar um homem cuja moral e ações ela achava desprezíveis?
Apesar de tudo, ainda amava Mark Anders. Então, presa àquele trabalho pelo insaciável desejo de ficar perto dele, de vê-lo, de fazer qualquer coisa em que
ele estivesse incluído, ela ficava. E sofria a agonia de uma natureza por demais orgulhosa para se render às suas próprias necessidades.
As últimas semanas tinham sido um inferno para ela, que lutava para manter a cabeça fria e apresentar a Mark e às demais pessoas uma fachada indiferente.
Até que poderia ter conseguido seu objetivo, se Mark não tivesse mudado sua atitude com ela.
Desde aquela noite da febre e de seu pesadelo, quando o atacou rudemente, ele mudou radicalmente. As únicas conversas, que puxava com ela, eram estritamente
de trabalho.
Frio, preciso, ele não a provocava como antigamente. Nem tentava vê-la a sós como antes. Não fez nenhuma tentativa de reatar as relações de amizade que ele
tanto lutou para estabelecer, durante as primeiras semanas de conhecimento.
Tânia fazia seu trabalho e ia para casa toda noite à beira da exaustão. Ela atribuía seu sono entrecortado e sua falta de apetite à grande responsabilidade
que estava carregando e a tudo, exceto à depressão que a mudança de atitude de Mark provocava nela.
No fundo de seu coração, uma certeza se formava. Precisava deixar esse lugar de uma vez. Estava se tornando claro que as coisas não iam melhorar. Precisava
voltar para sua casa, onde teria capacidade de curar suas mágoas em paz e acabar com aquela paixão que a estava destruindo.
Decidiu ir embora assim que o poço entrasse em funcionamento. Seu orgulho profissional não permitia que fosse antes disso! E ela amava seu trabalho.
Greg cortou subitamente todas essas considerações.
- Você vai adorar a corrida de cataramã! Tire todas as coisas desagradáveis de sua cabeça, Tânia. Que tal treinar domingo, depois da reunião, em Galveston?
Vai lhe fazer bem.
No domingo, depois da reunião, Tânia suspirou aliviada quando Mark reuniu seu pessoal e foi embora. Passou em casa, tomou um demorado banho quente, vestiu
um jeans, um suéter de lã, uma jaqueta de náilon e tênis. Estava esperando embaixo quando Greg chegou para buscá-la, puxando uma carreta com um barco lindo. Tânia
ficou entusiasmada como Greg queria. Seu oferecimento de ajuda foi rejeitado e ela apenas observou Greg lidar com a carreta, prendendo-a bem para que não se soltasse
do carro.
Foram para a praia, do outro lado de Galveston. Greg era um excelente instrutor e, o que é mais importante, apaixonado pelo catamarã. Quando chegaram em
alto-mar, ele deu um show, fazendo mil e uma acrobacias.
Velejaram horas pelo mar, que estava bravo naquele dia de sol. Tânia se revelou uma boa aluna. Aprendeu depressa as lições básicas de como manejar as velas
e o leme.
Foi contagiada pela alegria de Greg. Ela ria e o obedecia em tudo. Greg agarrou o leme e eles foram empurrados pelo vento para longe. O mar brilhava, convidativo.
Tânia sentia o sol queimar suas costas e experimentava um prazer indescritível. Esqueceu seus problemas, esqueceu Mark, esqueceu tudo para se entregar àquelas sensações
deliciosas. O vento desarrumava seus cabelos e ela achava que estava flutuando sobre as fortes ondas do mar.
Quando voltaram à praia, estavam exaustos, mas felizes.
- Bem, que tal? - perguntou Greg, enquanto dobrava as velas. - Quer ser minha tripulante?
- Se atreva a convidar outra pessoa! - Tânia respondeu, rindo.
Sentia-se mais leve do que nunca e totalmente relaxada, agora que o passeio tinha terminado.
Greg pensou um instante e depois disse:
- Será que Mark não vai se importar?
- Mark nada tem a ver com minha vida! - foi a resposta dela
- Não tem mesmo? Eu pensei que você e ele tinham algum tipo de... relação. - Greg procurava as palavras.
- Claro que não. O que lhe deu essa impressão? - Ela dispensou a resposta dele e mudou de assunto: - Qual a velocidade desse seu barco, Greg? - Não queria
permitir que Greg descobrisse seus sentimentos por Mark. Seria humilhante demais se ele percebesse que amava um homem, que não demonstrava o menor interesse por
ela.
Continuaram conversando, enquanto voltavam para casa. Greg combinou pegar Tânia para jantar.
Esse foi o primeiro dos muitos dias de treinamento que tiveram. Mais ou menos em meados de maio, já formavam uma equipe tão entrosada, que Greg até fantasiava
a possibilidade de ganharem a competição. Tânia achava que ele exagerava um pouco, mas estava adorando a experiência, de qualquer modo.
Exceto pelas rápidas reuniões, quando se encontravam todas as turmas de trabalho, Mark continuava a deixá-la a sós. A atitude dele era fria e distante. E
Tânia tentava se convencer de que essa era a melhor coisa que podia ter acontecido. Ela agora passava duas semanas na plataforma e duas em terra. Quando estava em
terra, ficava dispensada de trabalhar muito, pois na plataforma as tarefas eram exaustivas.
Karen a tinha convidado para ir à sua casa, algumas vezes. A princípio Tânia não queria aceitar, para não ver aquela criança linda que se parecia tanto com
seu pai. Mas Karen insistia tanto e parecia tão magoada com suas eternas desculpas, que finalmente concordou em ir um domingo à tarde.
Naquele mesmo dia, depois do treino, Greg disse:
- Ei, Tânia. Sissy está louca para você ir jantar com ela. Quer ir hoje?
Sissy era sua amada irmã, a quem Tânia prometia mas nunca ia conhecer.
- Sinto muito, Greg, mas hoje já tenho compromisso para o jantar.
- Ah! Alguém que conheço?
- Claro que sim, mas não vou contar, seu abelhudo.
- Bolas, Tânia! Estou só protegendo os interesses da família.
- Que interesses de família. Gregory Sims? - perguntou impaciente.
- Você sabe... - ele respondeu, enigmático. - Além disso, não quero te ver perdida no meio desses machos insaciáveis que andam rondando por aí.
- Muito obrigada, urso velho. - Ela começou a imitar seu sotaque texano, falando arrastado. - Mas já sou uma garotona, me cuido direitinho?
- É... eu já tinha notado isso...
Greg estava saindo aos poucos da depressão em que tinha caído por causa do divórcio. Tânia gostava dele. Os dois eram realmente amigos. Pensava em Greg como
um irmão.
Ele a deixou em casa e Tânia foi tomar um banho e se vestir para ir à casa de Karen. Não tinha muita vontade de fazer essa visita, sabendo antes mesmo de
ver Clint que seria penoso ficar o tempo todo comparando-o com Mark.
Capítulo XIV
Karen vivia com Clint em uma casinha branca, que ficava sobre uns pilares como tantas outras de Galveston. Tânia se lembrava de ter perguntado a Mark a razão
daquele tipo de construção, no dia em que passearam pela cidade com Hussein. Como isso lhe parecia longe, agora!
Karen contou que Mark tinha comprado a casa para ela seis meses atrás, quando chegou da Califórnia. Ela não parecia se preocupar com isso.
- Mark tem sido muito bom para mim - confidenciou, quando se sentaram no aconchegante living, depois do jantar. Clint já tinha ido para a cama. Era uma criança
viva, que conversava o tempo todo e parecia feliz. Se sentia falta do pai a seu lado, pelo menos não demonstrava isso.
- Clint é o retrato de Mark, não é? - Tânia arriscou.
- Sim. - Karen sorriu. - Também vai ser um homem bonito, creio. Tem sorte.
Tânia não sabia por que, mas achava que Karen aceitava a situação bem demais para seu gosto.
- Ele gosta de Clint? - perguntou, finalmente.
- Oh, sim. Mark arranja sempre algum tempo para passar com ele. Está convencido de que um garoto deve crescer tendo um homem como modelo para seguir. Greg
também aparece muito. Com os dois, acho que Clint está bem servido de modelos masculinos.
- Eu não sabia que Greg ajudava.
- Greg é um tio fantástico - Karen respondeu. - Não tão bom quanto Mark, porém mais do que adequado.
- Ele chama os dois de tio? - Tânia não tentava mais esconder sua surpresa, com o conformismo de Karen com aquela estranha posição.
Já tinha percebido que Ginny não gostava de Karen. Seria por causa desse papel de "tio" que Greg assumia? Mas como Greg, que tinha um coração tão bom, não
criticava Mark pela sua conduta esquiva com Karen?
- Nenhum garoto jamais teve melhores tios - continuava Karen. - Vivo de olho nos dois, pois têm mania de mimar Clint demais, embora Mark seja mais disciplinado
do que Greg. Se eu deixar, Greg estraga qualquer um. Ele não consegue negar nada a alguém que ama.
- Talvez Mark se sinta responsável por Clint.
- Sim, ele se sente. Nós temos sorte. Á maioria dos homens não agiria como Mark.
Tânia entendia cada vez menos. Achou seu café amargo e não conseguiu mais bebê-lo. Sentia-se doente por dentro.
Karen olhava para o vazio e nem percebeu a súbita palidez de sua convidada. Continuou falando:
- Quando descobri que estava grávida, pensei em desaparecer, sumir do mapa. Fugi e fui trabalhar num restaurante no deserto da Califórnia. Mark me localizou
um pouco antes de Clint nascer. Eu não queria que ninguém soubesse, mas ele colocou um pouco de bom senso na minha cabeça e me fez vir morar aqui, com Ma Ruddy.
Depois que Clint nasceu, ele insistiu que eu voltasse à minha escola, na Califórnia, para completar meus estudos. Ma tomou conta do meu filho para mim. Quando terminei
o curso, Mark me empregou como secretária iniciante no escritório de Los Angeles. Foi lá que aprendi tudo que sei hoje.
- É mesmo? - Tânia estava perplexa, quase muda de espanto. Mas Karen, mais uma vez, não notou e seguiu com sua história:
- Tive que me esforçar muito mas não me importei. Fui sendo promovida e em dois anos tinha chegado à posição de assistente administrativa do grande chefão
de Los Angeles. Isso justificou a fé de Mark em mim. Então, seis meses atrás, ele me convidou para ser sua assistente pessoal. Estou muito feliz aqui, principalmente
por causa de Clint. Isso só aconteceu porque Mark não me abandonou quando eu precisei. Sem querer ser piegas, devo a minha vida e a de Clint a ele. Acho que Mark
é o homem mais maravilhoso do mundo. É claro, depois de Frank.
Tânia achou que agora tinha entendido tudo. Mark e Karen haviam feito uma espécie de acordo: ele a sustentava e ela vivia sua própria vida. Mas como Frank
de La Cruz podia permitir que um homem como esse pudesse interferir no seu amor? Isso sim ela não conseguia entender.
Ela se despediu de Karen e nunca mais voltou a visitá-la. Achava melhor ficar distante da mulher que tinha um filho do homem que ela amava, embora sem esperanças.
Continuou vendo Mark só uma vez ou outra e, geralmente, no meio de outras pessoas. No primeiro domingo de junho, quando a perfuração já estava bem adiantada,
deparou com ele, de pé na porta da sala de reuniões da companhia, conversando com John, o motorista.
- Diabos, John, você não pode fazer isso. Eu preciso dos seus serviços, não pode me deixar agora - ele estava dizendo.
Tânia não se fez de rogada em interromper a conversa dos dois.
- John, ainda não agradeci por ter procurado e me devolvido aquela fotografia. - Ela estendeu a mão ao motorista, que pegou-a olhando para o patrão sem entender.
- Foi um prazer, srta. Cameron - ele disse, afinal. - Como está? Parece muito bem.
- Estou bem obrigada - ela murmurou e, virando as costas, entrou na sala barulhenta de reuniões.
Mark também entrou e sentou-se ao lado dela. Mas, como fazia ultimamente, não lhe deu uma palavra.
Mais tarde, Karen apareceu na sala de reuniões.
- Telefone para você, Tânia.
Distraída, ela pegou o aparelho das mãos da secretária.
- Mike! Como está você? - falou, feliz ao reconhecer do outro lado a voz do comandante.
Mark virou subitamente a cabeça, parecendo interessado na conversa. Tânia percebeu um brilho de raiva nos olhos dele e pensou que era porque estava interrompendo
a reunião.
Mike convidou-a para sair.
- Tenho andado muito ocupada - ela se desculpou.
- Certamente esse feitor que tem como chefe vai permitir que descanse um pouco. Eu quero ver você - Mike falou, decidido.
- Mike, não vai dar. Quando sair daqui vou direto para a plataforma. Você devia ter me avisado antes.
- Estive fora do país por três semanas.
- Bem, quem sabe dê para a gente se encontrar. Na volta da plataforma, eu vou treinar com Greg no lago Dallas. Por que não nos encontra lá? - Tânia explicou
rapidamente sobre o barco e a competição, contou como andavam os treinamentos, conversou mais alguns minutos e até riu de uma piada de Mike. Sentia-se desconfortável
sabendo que Mark ouvia atentamente a conversa, mas não queria demonstrar que se abalava com isso.
- Eu vou mesmo encontrá-la no lago, princesa - Mike concluiu. - Não perderei essa oportunidade por nada deste mundo.
Eles se despediram e Tânia desligou, reparando que Mark estava com uma cara péssima.
Aos diabos com ele! Quem Mark achava que era, para controlar meu tempo livre? E é até bom mesmo que sinta um pouco de ciúme dela.
Tânia não queria admitir, mas já estava achando falta das atenções de Mark. Queria que ele a olhasse de novo com aquele olhar quente e sensual. Sentia saudade
do toque de suas mãos, principalmente à noite, quando acordava com o corpo ardendo de desejo. Nessas horas, daria tudo no mundo para tê-lo novamente em seus braços.
Mas Mark nunca saberia disso, nunca!
Karen interrompeu de novo a reunião, pouco depois, para entregar a Mark um boletim das condições do tempo. Depois de lê-lo atentamente, ele avisou:
- Há uma tempestade tropical no Caribe, pessoal. Preparem-se.
- Puxa!, hoje não vai ser fácil - comentou Greg. - Temos que ir direto para a plataforma.
- Há algum perigo? - Tânia quis saber.
- A plataforma é a mais segura que já tivemos, mas nunca se sabe quando começa uma tempestade violenta.
A reunião acabou pouco depois. Tânia foi com os outros para o heliporto. Chegando lá, colocou o salva-vidas, já que iam atravessar o golfo, e seu capacete.
De repente, lembrou-se dos seus relatórios.
- Lacy - disse para o piloto -, esqueci uma coisa importante. Pode me esperar um segundo. Volto já.
Tânia correu para cima. A porta da sua sala estava parcialmente aberta. Intrigada, empurrou devagarinho.
Mark estava sentado na mesa dela, com a cabeça apoiada nas mãos. Parecia um homem desesperado e infeliz. Tânia sentiu pena dele, nunca Mark se mostrara assim
na sua frente. Ela desconhecia esse lado da personalidade dele.
Estendeu a mão para tocá-lo mas deve ter feito algum barulho, pois Mark virou-se subitamente. Encarou-a com tal desespero, que ela teve vontade de puxar-lhe
a cabeça contra seu peito, acariciá-lo, confortá-lo e acalmá-lo. Mas, de repente, a expressão dele mudou.
- Que diabos está fazendo aqui? - ele rugiu, recuperando a expressão severa que tinha ultimamente com ela. - Lacy precisa ir já, agora. Cada minuto de espera
põe em risco o helicóptero e os homens. - Seus olhos faiscavam e sua boca era uma linha dura. Um músculo pulsava no seu pescoço. Ele olhava Tânia como se mal conseguisse
conter o impulso que sentia de bater nela.
Tânia gaguejou, assustada:
- Meus... meus relatórios...
- Pegue logo esses papéis e caia fora daqui.
Tânia obedeceu e voou para longe da sala. Nunca ia compreender aquele homem. Num momento, parecia frágil e inseguro, no outro, era durão como ninguém.
Vinte e quatro horas mais tarde, o tempo tinha piorado muito. Todos estavam tensos na plataforma. A gigantesca perfuradora de petróleo enfrentava as imensas
ondas como um veterano das tempestades do mar do Norte. Tinha sido construída para continuar perfurando sob quaisquer condições de tempo. O trabalho se tornava mais
duro e mais perigoso a cada momento, mas seguia em frente.
Um grande helicóptero apontou ao longe, se dirigiu ao seu acanhado ponto de pouso, do outro lado da plataforma, baixou por um momento e voltou a levantar
vôo.
Tânia estava na cabine superior da plataforma, quando a porta se escancarou empurrada contra a força do vento, e Mark entrou. Ele a dispensou com um gesto
e chamou Greg e Muddy Waters para uma reunião, a fim de estudarem as medidas que deveriam ser tomadas caso o furacão, que estava a duzentas milhas ao sul, continuasse
com seu curso atual. A Sea Venture estava diretamente em sua direção. O vendaval que soprava sobre eles era apenas uma tênue amostra dos grandes ventos que podiam
atingi-los dali a pouco.
Tânia tentou várias vezes entrar na conversa e dar sugestões. Estava certa de que a plataforma poderia enfrentar qualquer coisa, desde que não sofresse um
impacto direto. Mark a ouvia com o rosto impassível e um brilho estranho nos olhos. Quando ela terminava de falar, ele desenvolvia sua própria linha de raciocínio.
Era como se não a tivesse ouvido!
Frustrada, Tânia pediu licença e se retirou. Foi para sua cabine, tirou a roupa, tomou um banho e subiu para o apertado beliche. Ficou no escuro, e de repente
seu corpo magro foi tomado por soluços inesperados e incontroláveis. Não sabia por que chorava. Ou sabia? Quando conseguiu dormir, exausta, sonhou com o rosto de
Mark, do jeito que o tinha visto no escritório, naquele dia. Sofrendo e morrendo de raiva, ele a olhava de um jeito desesperado. Por que a odiava? Por que sofria?
Seus sonhos não lhe deram nenhuma resposta.
Pela manhã, Tânia ficou sabendo que o furacão tinha mudado seu rumo e se dirigia para a península de Yucatán. Mark já fora embora. Ian não gostou daquela
aparição inesperada de Mark.
- Será que ele duvidou que eu soubesse dirigir bem a Sea Venture?
Waters também achou que Mark tinha posto em dúvida sua habilidade de comandar a plataforma e a tripulação, caso o furacão não mudasse o rumo. Greg apenas
olhou para Tânia, mas não fez comentários.
Tânia continuou trabalhando normalmente, mas sentia que agia como um robô. Não tinha vontade de comer nem de brincar com os colegas.
Greg a observava, de vez em quando, com uma expressão preocupada. Uma vez não se conteve e disse:
- Depois que terminamos nosso trabalho aqui, vamos, nós dois, tirar duas semanas de folga, certo?
- Certo - ela respondeu, contente.
- Então sabe o que vamos fazer?
- O que tem na sua cabecinha, garotão?
- Vamos levar nosso barco para o lago Dallas e passar duas semanas acampando, enquanto treinamos para a competição.
- Mas acampar! Por que não ficamos num bom hotel?
- Vai ser divertido, você verá. Alugarei tendas e equipamentos de camping. Sou sócio do clube náutico do lago e eles têm uma comida ótima, se não quisermos
cozinhar sempre. Pensei que você ia gostar de voltar à natureza. Não tem medo de ficar sozinha, comigo, tem?
Tânia riu, afetuosa.
- Não, Greg, não tenho medo.
- Não tem mesmo? Ai meu Deus, lá se vai o resto da minha imagem de símbolo sexual. Vou ter que melhorar isso, agora que voltei a ser um solteiro disponível.
- Não seja ridículo, Greg! Você é um homem sexy. Qualquer garota ficaria orgulhosa de tê-lo como companhia. É que eu... - Ela parou de falar, com medo de
se trair.
Greg suspirou.
- É... eu sei, Tânia. Mas não me zango por servir de consolo. Gosto de ser seu amigo.
- Também gosto, Greg. Você não imagina como tem sido importante para mim ter um amigo como você. Bem, então vamos acampar no seu lago Dallas e ter boas semanas
de treinamento.
Eles foram para Dallas no jatinho executivo da companhia, que Greg pilotava. Ele garantiu que teriam umas férias fantásticas. Passariam os dias no lago e
as noites comendo e bebendo. Iam gastar dinheiro como nunca e ela ia brincar e ser feliz.
- E você vai esquecer Mark - Greg acrescentou, por fim.
- Esquecer Mark? Por que ele entra nisso, Greg?
- Ora, Tânia! Você está apática como uma semimorta e Mark não consegue suportar a companhia humana. Conheço bem meu primo, Tânia, ele é um bom sujeito. Está
vivendo num inferno e eu aposto meu último dólar que você é a causa disso.
- Não sei o que quer dizer. - Tânia pensava em Karen, Clint e em Ginny Lee. Não, Mark não podia estar preocupado por causa dela.
- Desculpe se tenho sido uma péssima companhia, Greg, mas isso nada tem a ver com Mark - ela disse. - Ele não se importa se eu vivo ou morro, desde que faça
o trabalho para o qual fui contratada.
Em Dallas, um carro grande, com ar-condicionado, esperava por eles. Greg passou numa loja de camping e alugou um equipamento sofisticadíssimo.
Ele parecia ter um suprimento de dinheiro sem fim. Tânia insistia em pagar suas coisas, mas Greg recusava. Encheu o carro com mil e uma bugigangas.
Foram para o lago enorme e acamparam nas margens, num terreno que pertencia ao clube. Greg armou as duas pequenas tendas e encheu os colchões de ar. Depois
montou uma cozinha improvisada e uma churrasqueira com tijolos. Por fim, sentou-se à sombra de uma árvore e exigiu que Tânia lhe preparasse um café.
Passavam o dia velejando no catamarã, para treinar. Aliás, vários outros competidores faziam a mesma coisa. Depois de um tempo, eles conheciam todo o pessoal
e viviam trocando de barco, só para experimentar.
Ao anoitecer, iam até Dallas, algumas vezes sozinhos. Greg dançava bem e era um parceiro incansável. Tânia queria se divertir e esquecer o que não tinha
remédio. Pelo menos, estava mais alegre e saudável. Vivia de biquíni e já estava com um bronzeado lindo.
Um dia, voltando do treino, encontraram Mike Lane na praia. Tânia tinha os cabelos negros presos por um boné de capitão e havia passado uma fina camada de
creme branco sobre o nariz e os lábios, para protegê-los das queimaduras do sol. Mike ficou espantado ao vê-la de um jeito tão diferente.
Apesar de gostar de velejar, Mike não queria ficar no lago e convidou Tânia para ir com ele a Dallas. Greg fez o possível para evitar que isso acontecesse,
argumentando que haveria um churrasco aquela noite e que ela precisaria tocar violino porque já tinha prometido. Quando queria, Greg sabia ser insistente.
Mas Mike também estava decidido a ficar apenas com Tânia e acabou convencendo-a a ir a Dallas só por uma noite. Ele levou-a para jantar no Fairmont e depois
viram um show de primeira classe. Por fim, foram para um barzinho mais sossegado.
Mike estava gentil e romântico e, sem que Tânia esperasse, começou a falar dos sentimentos que tinha por ela.
- Quero que case comigo, Tânia - ele pediu.
- Mike, eu... eu desejava poder... mas...
- Mas não pode. - Ele acendeu um cigarro, sem procurar esconder seu desapontamento. - É por causa de Anders, suponho.
Tânia não negou. Sentia que Mike estava sendo sincero e preferia agir da mesma maneira que ele.
- Eu bem que pensei nisso. Perguntei a você na primeira vez que nos falamos, lembra-se? Nós estávamos na fila da alfândega, em Washington. Parece que faz
tanto tempo...
- Eu sinto muito, Mike. Eu... eu não sabia...
- Bem... mas eu sabia. Eu vi o jeito que ele te olhava, tanto que perguntei. Mas não pude resistir a você. Apaixonei-me no minuto em que a vi no avião. Tinha
que tentar conquistá-la.
- Não fale assim, Mike. Eu gostaria de amar você.
Mike parece um homem decente, ela pensou desesperada. Não é do tipo que se envolve com a esposa dos outros.
Ele pediu a conta e saíram. No volta, Mike guiava o carro lentamente, imerso em seus pensamentos. Tânia estava confusa com seus sentimentos. Como podia amar
um homem do tipo de Mark e sentir somente amizade por Mike?
Quando chegaram ao lago, Mike ajudou-a a sair do carro. Ao chegarem perto das luzes do acampamento, ele parou.
- Adeus, Tânia. Lembre-se de mim de vez em quando. - O beijo foi rápido e triste. Ele lhe deu as costas e foi embora. Tânia ficou ali, até que as luzes do
carro desapareceram.
"Que droga eu fiz da minha vida!", pensava, com raiva. Por que não posso amar Mike?
- Divertiu-se bastante? - Mark estava esperando por ela.
- Isso não é da sua conta - Tânia se recuperou do susto de vê-lo. Ele devia estar no Sea Venture, a trezentos quilômetros dentro do golfo. Sem ligar para
Mark, ela foi andando para sua barraca.
- Vamos viajar amanhã bem cedinho para o Extremo Oriente, Tânia - ele informou, mexendo nas cordas da barraca dela.
- Você, pode ser, eu não. - Ela entrou na tenda, tentando ignorá-lo.
- Você vai comigo. Foi por isso que vim até aqui.
Hoje é o dia! pensou, revoltada. Mas não se dignou a responder nada a Mark.
- Boa noite, Greg. - Gritou da sua barraca. Como resposta, ouviu apenas um resmungo.
Tirou os sapatos e foi direto para a cama, pois estava muito cansada. Não ouviu Mark ir embora. Nem se importava se ele ficasse a noite inteira ao relento.
Felizmente adormeceu em alguns minutos, recusando-se a lutar com suas confusas emoções.
Capítulo XV
- Acorde, magrela - Greg a chamou na manhã seguinte, antes de o sol nascer.
Tânia resmungou um protesto, mas ele insistiu. Ela levantou e pôs a cabeça para fora da barraca. Já tinha comida no fogão improvisado. Uma grande lanterna
iluminava a área. O café borbulhava na cafeteira, misturando seu cheiro ao do bacon, recém-preparado.
- Greg, me lembre de te matar algum dia, de preferência pela manhã. Será um homicídio justificado, aposto.
- Vamos, magrela, tem que viajar para longe.
Foi então que Tânia se lembrou de Mark. Correu os olhos ao redor do campo.
- Ele está nadando - Greg observou. - Depressa, Tânia. Vocês têm que pegar um avião.
- Isso meu caro, é o que você pensa. Vou voltar para Galveston.
- Meu doce, Mark deseja que vá para o Oriente Médio com ele. Não pode se recusar. Foi convidada para o casamento de Hussein, depois de amanhã. É um convite
especial.
- Eu não tenho que ir e não quero ir. Mark Anders pode se danar por isso.
- Nossa! Nunca vi você praguejar antes. - Ela entrou de novo na barraca e gritou:
- Não me amole.
- Vamos, Tânia, pelo menos venha tomar seu café e conversar com Mark.
Tânia nem respondeu. Mark Anders não merecia consideração alguma, não se importava o que seu primo pensasse. Vestiu rapidamente uma calça jeans desbotada,
uma camiseta sem mangas, apanhou uma esponja, a escova de dentes, a toalha e saiu da tenda. Se Mark Anders queria uma confrontação, ia tê-la.
Ele tinha voltado da água, pendurado um espelho num galho e estava fazendo a barba. Usava apenas uma sunga sumária e a lanterna ressaltava sua pele brilhante
e seu corpo bem torneado.
Tânia sentiu o perfume de seu sabão de barba. Ela encheu uma bacia que estava perto com água fria e lavou o rosto. Quando acabou de escovar os dentes, Mark
tinha desaparecido dentro da tenda de Greg.
Ela foi até a beira do lago olhar os pássaros que acordavam e gradualmente sua raiva passou. Então Hussein ia casar! Ficou imaginando quem seria a noiva.
Provavelmente, alguém da raça dele. Não era comum as princesas árabes casarem com os príncipes? Sinceramente, desejava que ele fosse feliz e que sua esposa lhe desse
um herdeiro. Talvez estivesse realmente apaixonado por alguém. Que bom se fosse assim! Ele era uma ótima pessoa, gostava muito dele. Estranho que a convidasse para
o casamento!
Greg armou a mesa fora, junto ao fogão. Tinha feito café, mexidos de ovos com milho, tomate e bacon. Tânia chegou perto e. nisso, Mark saiu da tenda. Vestia
um terno escuro, camisa de seda cinza-pérola e uma gravata elegante. Ele sentou-se do lado oposto ao de Tânia.
- Está pretendendo usar jeans no Oriente Médio, Tânia? - perguntou, com toda a calma do mundo.
- Na verdade, eu não planejo ir para o Oriente Médio.
- Sinto muito, mas creio que não tem escolha. Para que a United Petroleum continue a ter lucros naquela área, precisamos manter boas relações com Hussein
e sua família. Ele nos convidou para esse casamento. É uma honra que não podemos recusar. Temos que ir.
- Eu julguei que essas cerimônias fossem assistidas só pelas famílias e amigos íntimos dos noivos.
- Certo, mas Hussein e eu somos amigos íntimos. Nos conhecemos desde os tempos do colégio. Nesses anos todos, ele aprendeu a confiar em mim. Ter a confiança
de um árabe, significa ser como um familiar para ele.
- Mas eu não trouxe roupas adequadas para o casamento de um príncipe. - Ela ainda insistiu.
- Ele mandou comprar um vestido em Paris, para você, de um costureiro famoso. Estará esperando por você no hotel, junto com os outros acessórios que vai
precisar.
- Por que ele iria fazer uma coisa dessas, Mark? - Tânia estava realmente admirada.
- Creio que Linda pediu a ele.
- Linda?
- Ele está casando com Linda Wells.
Tânia encarou, muda, aquele rosto que tanto amava e odiava. Mark atirou Linda nos braços de Hussein para afastá-lo do caminho, ela concluiu. Mas por que
teria tanto trabalho para se livrar de Hussein?
Ela não soube mais do príncipe desde aquela noite em Dallas, quando ele teve que partir de repente. O que teria acontecido desde então?
- Mark, satisfaça minha curiosidade: você tem alguma coisa a ver com esse casamento? - perguntou, sem conseguir se conter.
- Sim, eu mandei Linda para lá, deliberadamente. - Mark deu-lhe o sorriso mais inocente do mundo, como se sua ação fosse plenamente justificável. - Ele estava
procurando uma esposa, lembra-se?
- Então mandou Linda Wells para lá como um cordeiro ao matadouro!
Greg e Mark caíram na risada.
- Posso garantir a você que Linda não é nenhum cordeirinho. Vai se passar muito tempo antes que alguém consiga domá-la. Linda sabe exatamente o que está
fazendo e para onde está indo. Se alguém precisa de proteção, esse alguém é provavelmente Hussein.
- Espero que saiba o que está dizendo. Não pense que é coisa fácil para uma mulher viver dentro de uma sociedade fechada daquelas, especialmente numa família
tradicional como a de Hussein.
- Linda foi avisada, mas ela quer ser princesa e ter tratamento real. Se você está imaginando um enclausuramento para o resto da vida, no harém de Hussein,
esqueça isso. Ele viaja pelas capitais do mundo continuamente e Linda vai acompanhá-lo, como sua esposa. As restrições impostas a ela quando estiverem em casa, não
funcionam quando viajarem. Além disso, estou certo de que os cuidados com que Hussein vai cercá-la, a compensará de todos os aborrecimentos.
Mark não parecia entender o interesse de Tânia pela sorte que Linda pudesse ter. Mas, como ela continuava a olhá-lo com os olhos arregalados, ele explicou:
- Além disso, eles deram um jeito de se apaixonar de verdade, apesar de tudo. Não se preocupe com eles, Tânia. - Olhou o relógio de pulso. - Precisamos ir.
Estamos no vôo que faz conexão de Dallas até Bahraim.
Tânia olhou para Greg, que deu uma piscada.
- Ande, magrela. Eu vou cuidar bem do nosso velho catamarã, enquanto você se diverte no meio daqueles sheiks do deserto. Mas tome cuidado para não ser carregada
por algum deles para uma tenda.
- Isso é muito pouco provável. Quando saímos Mark?
- Agora. Já peguei seu passaporte com Ma. Ela colocou numa valise algumas coisas que você poderia precisar. Está no carro.
Ah! Então Mark sabia que ela ia concordar, não sabia? O que podia fazer com um homem arrogante como esse? Tânia fez um gesto de desânimo, mas resolveu ir
com ele.
- Vou empacotar tudo isto e voltar para Galveston. Não se preocupe com nada, Tânia - disse Greg.
- Obrigada. Sinto deixá-lo sozinho com todo esse equipamento.
- Não tem problema. Quando pretende voltar, Mark?
- Lá pelo fim da semana, o mais tardar. Devo estar um Galveston na sexta-feira ou sábado.
Foram até o aeroporto em silêncio e viajaram assim através do Atlântico. Quando chegaram a Londres, entraram na sala dos VIPs, reservada às pessoas importantes.
Mark indicou uma porta.
- Ali há um confortável toalete de senhoras. É melhor trocar de roupa. Seremos recebidos pela família de Hussein e você não pode chegar vestida assim. Eles
são muito tradicionais, respeitam todos os hábitos do país. Eu sei que não concorda com isso, mas é melhor não chocá-los, pelo menos de saída.
Tânia pegou sua maleta sem olhar para trás e sumiu dentro do toalete, imaginando até quando Mark continuaria a lhe dar ordens. Era insuportável aquela mania
dele de pensar que sabia de tudo!
Não via a hora de chegar na Arábia para ficar livre de Mark. Pelo menos lá estaria cercada de gente e não seria obrigada a aturá-lo. Além do mais, morria
de curiosidade de ver Linda e Hussein juntos. Deviam formar um exótico casal!
Havia dois vestidos na maleta, um de seda preta com gola chinesa e um conjunto de seda azul. Havia também uma capa preta, com capuz, um par de sapatos do
seu número e uma bolsa preta.
Vestiu o vestido preto, que moldava lindamente seu corpo esguio, caindo até abaixo do joelho. Escovou os cabelos e os dentes, se maquilou, calçou os sapatos
de salto alto, jogou a capa sobre os ombros, e voltou para onde Mark estava esperando.
Ele a examinou com expressão fria.
- Devo dizer que está corretamente vestida.
- Andou fazendo compras para mim? - Tânia perguntou, curiosa.
- Sim. Muitas mulheres ocidentais enfrentam dificuldades nas conservadoras terras do Oriente, porque se vestem incorretamente. Coloque o capuz de sua capa
na cabeça quando desembarcarmos, mantendo os olhos baixos, e me siga colada em mim como um carrapato.
- Está. brincando!
- Posso garantir que nunca falei tão sério em minha vida. Se quiser evitar aborrecimentos, seja discreta. Vai precisar de proteção masculina sempre que não
estiver dentro de uma casa, ou outro ambiente fechado. A menos que esteja interessada em atrair a atenção de um árabe. Os homens de lá são muito tradicionais.
- Acho que está exagerando, Mark Anders. Estamos no século vinte, afinal de contas. Esse povo viaja, vê televisão.
- Gente como Hussein viaja, é educada fora do país, lê e observa os costumes de outras civilizações. Mas aqui na terra dele, não é todo mundo que tem essa
chance. Qualquer árabe acha que uma mulher, qualquer mulher, seja sua irmã, sua mãe ou esposa, é uma fêmea em risco se olhar para um homem estranho. Uma mulher desprotegida
pelo seu homem é uma mulher procurando sexo, na visão deles. E você não vai fazê-los mudar de idéia.
Tânia se lembrou de sua infância, quando viveu no Oriente Médio. Nessa época sua mãe nunca saía de casa sem a companhia de seu pai ou de seu avô e nunca
dirigia. Sempre teve motorista, enquanto morou no deserto. Não, Mark não devia estar exagerando, devia saber o que dizia.
- Fique tranqüilo. Vou me comportar de maneira correta - ela prometeu e se afastou, para evitar mais discussões.
Subiram no jato que tinha sido reabastecido e Tânia dormiu a maior parte do tempo.
Desceram no Aeroporto internacional de Muharraq, localizado em uma pequena ilha ligada à ilha de Bahrain por uma estrada. Tânia percebeu que estava feliz
por pisar novamente em terra. Gostava de voar, mas tinha estado no ar por dezesseis horas!
A longa viagem aparentemente não havia afetado Mark, que caminhou para a alfândega com seu jeito descontraído de sempre. Será que aquele homem não se cansava
nunca?
Hussein mandou um motorista esperá-los. Era um árabe alto, vestido de branco, que os cumprimentou com intimidade.
- Não estou vendo Frank - Mark disse. - Mandei um recado que estávamos chegando.
- Ah, seu piloto! - respondeu o árabe falando inglês corretamente. O nome dele era Faisal e ele parecia espetacular naquelas roupas brancas, flutuantes.
Seus cabelos eram encaracolados e uma barba curta escondia seu rosto moreno.
Distraída, Tânia o encarou de frente. Instantaneamente os olhos dele brilharam e ele deu seu mais charmoso sorriso. Lembrando o aviso de Mark, ela baixou
os olhos, chegando mais perto dele, como que pedindo proteção.
- Sim, Frank é meu piloto, veio para cá só por uns tempos. - Mark tocou de leve com os dedos o capuz de Tânia. O árabe entendeu imediatamente o gesto. Queria
dizer que Mark era o protetor dela.
- Frank se atrasou, mas pediu que lhe dissesse que vai chegar antes do casamento de Hussein, esta noite - Faisal explicou, num inglês corretíssimo.
- Obrigado. Foi bondade sua vir nos receber.
- Foi um prazer. Nós desejamos que os amigos de arusa se sintam felizes aqui. Eu sempre fico satisfeito quando passamos algum tempo juntos, Mark.
- É bondade sua dizer isso, Faisaf. Onde vamos ficar?
- Reservamos uma suíte no Marriott para vocês. É o mais novo e o melhor hotel da cidade. O príncipe sente muito não hospedá-los desta vez, mas aqui é costume
o casal ficar em casas separadas até a noite do casamento, quando o pai da noiva a acompanha até a casa do noivo. A família da srta. Wells está no mesmo hotel que
vocês. Achamos que ela ficaria feliz se a srta. Cameron estiver lá também. A sua suíte é ao lado da dela, srta. Cameron.
- Frank vai estar no casamento, com certeza? - perguntou Mark.
- É mais que certo. Ele se tornou um bom amigo do príncipe desde que chegou. Venham por aqui, por favor.
Passaram pelas portas automáticas e sentiram o impacto do calor de fora.
- Sinto muito causar-lhes este desconforto - Faisal se desculpou. - Temos que andar neste calor até o carro.
Enquanto andava, Tânia perguntou baixinho a Mark quem era a arusa a quem Faisal havia se referido. Ele lhe explicou que chamavam assim à Linda, a noiva.
No caminho cruzaram com um outro árabe que cumprimentou Faisal com "Sua Excelência".
- Você é irmão de Hussein? - perguntou Tânia, quando entraram no carro fresquíssimo pelo ar condicionado. - Sinto muito, não quis ser indelicada. - Ela se
desculpou, mal tinha acabado de falar.
Ele sorriu.
- Você é encantadora demais para ser indelicada, srta. Cameron. Essa é uma pergunta natural. Não, não sou irmão dele. Sou primo.
Faisal então virou-se para Mark e começaram a conversar sobre os progressos da perfuração da United. Tânia ficou apenas ouvindo. A limusine levou-os diretamente
para Manama, a capital de Bahrain, perto do lugar onde Hussein vivia. Tânia estava ansiosa para saber o que encontraria quando chegassem.
Capítulo XVI
Horas mais tarde, Tânia tomou um banho e começou a se preparar para o grande casamento.
Mark e Faisal tinham saído, depois de deixá-la na esplêndida suíte de três dormitórios e uma enorme sala, que ainda oferecia uma vista magnífica da cidade.
Tânia podia calcular, só de olhar os aposentos em que fora instalada, que o casamento de Linda e Hussein seria realmente grandioso.
O banheiro da suíte era todo de mármore, com espelhos do chão ao teto. Era imenso e todo cheio de flores. Saindo dali, Tânia pegou o vestido que o príncipe
mandou comprar para ela. Era de seda transparente e renda cor de marfim. Caiu como uma luva sobre seu corpo esguio. Parecia que fora feito sob medida.
Ela se olhou no espelho. Céus! Se o vestido dela era assim, o de Linda devia ser verdadeiramente fabuloso! Hussein estava gastando uma fortuna com aquele
casamento!
Passou perfume e foi ver a noiva. Primeiro atravessou o salão onde se realizaria a cerimônia.
Tinham colocado uma passadeira vermelha, de veludo, do centro do salão até o fundo, numa espécie de palco, baixo, coberto de flores. A passagem central também
era definida por flores. Linda ia atravessar esse corredor florido, para esperar a chegada de Hussein no salão.
Hussein viria pelo mesmo caminho, acompanhado pelo pai de Linda e outro parente, para pedir a noiva. Depois, se aproximaria dela, levantaria seu véu e a
beijaria como um sinal de que a aceitava como sua esposa. Então voltariam juntos, pelo corredor florido.
Linda e sua mãe, a sra. Wells, estavam completamente deslumbradas com esse reino encantado, saído diretamente das Mil e Uma Noites. As duas falavam sem cessar,
excitadas, quando Tânia chegou.
Contaram que depois da cerimônia haveria uma festa no suntuoso salão de banquete do hotel. Pelo menos duzentas pessoas tinham sido convidadas.
Além dos convidados, iriam também as mutfarrajeen. Linda explicou que esse termo designava as mulheres que apareciam como curiosas, sem serem convidadas.
Desde que estivessem pesadamente ocultas, por véus, elas tinham permissão de assistir a todas as cerimônias importantes. Eram toleradas por todos e geralmente chegavam
cedo à cerimônia para pegar os melhores lugares.
Tânia notou que realmente duas delas já haviam chegado e colocado suas cadeiras perto do local da cerimônia. Ficou olhando-as, admirada, pensando que aquelas
mulheres pareciam saídas do outro mundo. Depois, resolveu voltar para o quarto de Linda.
- Oh, Tânia, como você está deslumbrante! - a noiva a elogiou.
- Como é que Hussein conseguiu encomendar, à distância, um vestido estonteante, que cai em mim sem uma ruga? - Tânia quis saber, curiosa.
- Creio que ele teve ajuda. - Linda ria, maliciosa. - Sei que telefonou para Mark, antes de falar com o costureiro em Paris.
- Mark? Como ele... - Tânia ficou quieta, lembrando das compras que tinham feito juntos em Londres. - Oh, aquele homem!
- Quando você vai casar com aquele homem? - Linda perguntou calmamente, enquanto penteava os cabelos ruivos, mais bonitos do que nunca.
- Nunca! - A palavra saiu com violência. Linda virou-se, atônita.
- Nunca? Mas eu pensei... Mark tinha dito a Hussein...
Tânia ficou quieta, esperando que Linda continuasse. Mas a outra aparentemente percebeu o que tinha dito e não falou mais nada. Tânia desabafou:
- Não há nada no mundo que poderia me persuadir a casar com Mark Anders. Nada.
- Oh! Sinto muito. Eu não quis ser intrometida. Acho que me enganei quando pensei...
- Não se preocupe, Linda, você não é a primeira pessoa que faz interpretações erradas a respeito de Mark e de mim. Acho que ele se diverte dando impressões
falsas, provavelmente faz isso de propósito.
- Bem, eu tenho que ficar esperando agora. Mandei mamãe tirar uma soneca e papai está fora com Hussein e Mark. - Linda mudou de assunto. - Eu tenho bastante
tempo. Olhe, Tânia, que véu fantástico. Já tinha visto coisa mais deslumbrante em sua vida?
- É maravilhoso - Tânia concordou, pegando o véu das mãos de Linda e sentindo o tecido com os dedos.
- Bem, vou tomar um banho caprichado. Quer ficar para ajudar a me vestir depois, Tânia? Por favor...
- Tente só me mandar embora.
- Não demoro - Linda disse sorridente, desaparecendo no banheiro.
Tânia foi até a mesa diante do grande espelho, o véu ondulando suavemente atrás. Como ficaria sobre seus cabelos negros?, pensou, com uma pontinha de inveja.
Abaixando-se com cuidado diante do espelho, levantou aquela coisa linda sobre a cabeça, sem, no entanto, colocá-lo no lugar.
Nesse momento, a porta da sala atrás dela abriu silenciosamente e ela assustou-se, deixando o véu cair um pouco sobre o rosto. Duas mutfarrajeen espiaram
curiosamente, com os rostos escondidos atrás dos véus.
Tânia olhou, aliviada, para a porta fechada do banheiro. Pelo menos Linda estava protegida daqueles olhares.
- Sinto muito - ela disse. - Acho que devem esperar na sala de recepção. Este é um aposento privado - explicou, enquanto colocava o véu sobre a mesa.
- Inti min beit meenn? - perguntou a mais alta.
-- Sinto realmente, mas não entendo o que diz - respondeu Tânia com um certo alarme. As duas fecharam a porta, sem sair do quarto.
Uma das mulheres repetiu a pergunta, piscando atrás do véu negro. A mais baixa tocou a manga do vestido de Tânia, todo enfeitado de rendas.
Tânia encolheu-se, assustada. Então resolveu falar com elas num tom mais enérgico, para ver se as duas se decidiam a ir embora.
- Precisam sair agora - falou com autoridade, apontando para a porta. - Vão embora, saiam!
As estranhas mulheres trocaram olhares e balançaram os ombros. Então, a mais baixa moveu-se com a velocidade de uma serpente no ataque. Tânia deu um grito
abafado, quando dois braços de aço a envolveram. No mesmo instante, a mais alta colocou um chumaço de algodão embebido em éter cobrindo sua boca e o nariz, para
forçá-la a desmaiar.
Tânia gritou e se jogou contra a mulher que a segurava. Quase conseguiu romper o círculo que prendia seus braços. O algodão caiu no tapete, enquanto as duas
lutavam para prendê-la novamente.
Tonta pelo éter, Tânia esforçava-se por permanecer lúcida. Ainda viu as mulheres pegarem uma espécie de manto e jogarem sobre sua cabeça, puxando para baixo
para encobrir seu rosto. O manto ia até o chão, escondendo seu vestido.
Meio inconsciente, percebeu que estava sendo empurrada para fora do quarto, pelas duas mulheres. Algo lhe dizia que tinha que respirar pouco e devagar. Cambaleou
e se deu conta de que era empurrada pelo corredor para a escada.
Sentiu que alguém a levantava e carregava no ombro, com sua cabeça dependurada atrás, balançando dolorosamente. Foi levada assim até embaixo. Quando chegaram
ao térreo, Tânia tentava se controlar, esforçando-se para raciocinar com toda rapidez possível.
Mas o homem que agora a carregava percebeu que ela estava consciente e parou. Então tirou o manto de sua cabeça e amarrou uma forte mordaça em sua boca,
prendendo-a com firmeza.
Ela entrava pelos cantos da boca de uma maneira insuportável. Tânia sabia que não ia conseguir tirá-la para pedir socorro, mesmo antes de suas mãos serem
amarradas firmemente juntas. Novamente, o manto foi jogado sobre sua cabeça. Então, ela desistiu de resistir e desabou no chão.
O homem soltou uma praga levantando-a, passou um braço ao redor dela, segurou-a contra seu corpo e a arrastou até a porta. Tânia sentiu quando saíram do
hotel para o ar livre da noite, passando pelos fundos do estabelecimento. Lá fora, atravessaram um estacionamento até chegar a um carro, que já estava com o motor
funcionando.
O manto escorregou um pouco e Tânia viu um homem fechando a porta de seu carro, no mesmo estacionamento. Ele parou para olhar, curioso, o grupo apressado.
Frank de Ia Cruz! Tânia reconheceu-o segundos antes de ser empurrada para dentro do carro de seus raptores.
Com um grunhido de desespero, atirou a cabeça contra o ombro do homem que a segurava e bateu com violência. O manto escorregou mais e seu rosto ficou por
alguns segundos exposto ao estranho que olhava tudo, estarrecido. Frank teria tido tempo de reconhecê-la?
A velocidade com que o carro arrancou dissipou ainda mais as esperanças de Tânia. Ele podia não tê-la visto ou não saber quem ela era.
Bom Deus! O que ia fazer agora? Quem eram aqueles três homens e por que queriam raptá-la? Não conhecia ninguém nesse lado do mundo, senão Hussein. Ficou
sentada quieta entre os dois que estavam no banco de trás sentindo um medo terrível.
O motorista atravessou a cidade como louco. Os outros dois homens ficavam de olho na janela traseira, aparentemente com medo de serem pegos em flagrante.
Eles ignoravam Tânia até aquele momento.
Finalmente, pareceram convencidos de que não estavam sendo seguidos. Então, começaram a brincar um com o outro e com o motorista.
Tânia entrou em pânico total. Frank não a reconhecera e ela estava à mercê desses homens, que tinham uma aparência terrível. Como podia conversar com eles
e explicar que era apenas uma inocente visitante de seu país, se não entendia uma palavra de árabe? Não havia jeito.
Quando atingiram os limites da cidade, ela tinha se convencido de que não poderia fazer nada. Estava inteiramente à mercê daqueles estranhos, naquela terra
também estranha. Como poderia proteger-se, se eles tentassem algum tipo de violência contra ela?
Seus maxilares doíam terrivelmente e sentia a boca seca por causa da mordaça. Suas mãos, presas no colo, queimavam com a aspereza da corda que as prendia.
Viajaram muito tempo, até que o homem à esquerda deu algumas ordens ao motorista. Este passou imediatamente a dirigir mais devagar, tomando cuidado com o
caminho.
Mais ou menos, uma hora depois o motorista parou de repente no acostamento da rodovia. Ela foi retirada do carro e forçada a andar para a frente, enquanto
os dois homens faziam sérias recomendações ao motorista que ficou no carro. Eles sabiam para onde iam e a empurravam para diante. Não havia luz alguma, mas estavam
preparados. O mais baixo tinha uma lanterna acesa.
A visão da pequena luz desencorajou ainda mais Tânia. Devia haver gente ali por perto e eles estavam tomando cuidado para não serem vistos.
Depois de uma longa caminhada, a lanterna iluminou a entrada de uma caverna, em uma recessão da montanha. Um dos homens empurrou Tânia para o buraco negro.
Tomada por um pânico incontrolável, ela tentou se livrar, mas ele capturou-a facilmente. Atrapalhada pelo vestido longo, sem falar no manto e nos sapatos
altos, ela não tinha chance alguma.
A caverna era grande, com chão de areia. O homem que a empurrava para dentro ria.
Tânia correu para o centro e virou-se para enfrentar os dois raptores. O mais baixo focalizava a lanterna no rosto dela, enquanto o outro avançava, mostrando
suas intenções.
Ela virou um pouco de lado, devagar, pronta para usar as mãos amarradas, como se fossem um bastão, se ele a tocasse. Não tinha mais consciência de dor ou
entorpecimento, pois instintivamente preparava-se para batalhar por sua vida.
O homem aproximou-se com a ameaça estampada em seu rosto e puxou o manto, tirando-o dos ombros dela. Tânia balançou o corpo com as mãos amarradas no ar e
golpeou o homem no maxilar, com toda força.
A pancada machucou sua própria mão. Ela se desequilibrou e antes que se endireitasse, ele a agarrou e empurrou-a brutalmente. Tânia caiu pesadamente na areia,
mas quando sentiu as mãos dele em seu corpo, voltou à ação. Chutou e esperneou em desespero, mas sua inferioridade era total. Ele rasgou suas roupas, e jogou seu
peso contra o dela, no chão, para imobilizá-la. Contra ele, de nada valiam os débeis esforços de Tânia para escapar.
Mesmo assim, ela não desistiu. Levantou a cabeça para trás e bateu contra a boca do homem com tanta força, que esfolou a pele nos dentes dele.
O homem pareceu indignado com isso. Começou a esbofeteá-la com a mão aberta, atirando sua cabeça de um lado para o outro. Já ia perdendo a consciência quando
ouviu um som, acima do barulho dos tapas. O assaltante jogou-se instantaneamente sobre ela, prendendo-a sob seu corpo. Tânia ficou quieta, sem conseguir entender
o que estava acontecendo e por que ele parou de espancá-la.
Um ligeiro movimento perto deles fez com que se virasse naquela direção. Viu que o outro homem estava lá, parado, ouvindo atentamente. Ele tinha colocado
a lanterna numa cavidade de uma rocha, para observar seu companheiro lutar com Tânia. E agora era impossível recuperar a luz, pois não podia correr o risco de sair,
desprotegido, sem saber se alguém se escondia na escuridão.
Segurava uma arma na mão, que Tânia olhava, apavorada. Viu quando ele mirou no escuro, parecendo que ia atirar.
Nesse momento, uma pedra enorme voou da escuridão e bateu no homem em pé, atingindo seu pulso. A arma dele disparou e caiu bem ao lado de Tânia.
O homem em cima dela tentou alcançar a arma mas não conseguiu. Nessa hora, foi atingido em cheio por uma pedra, bem na cabeça. Tânia reuniu todas as forças
que ainda lhe restavam e empurrou-o para o chão, depois rolou e cobriu a arma com o próprio corpo.
Nesse momento, ela viu Frank saindo da escuridão e dando uma surra no outro homem que caiu, desacordado.
Em um instante Frank estava ao lado dela. Ele ergueu seu corpo esfolado, cortou a corda que lhe prendia as mãos e tirou a mordaça com todo cuidado. Embrulhando
Tânia no manto, abraçou-a carinhosamente, enquanto tentava acalmá-la.
- Querida, por favor não chore. Está tudo bem agora, vamos sair daqui imediatamente, não se afobe.
- Espere... espere apenas um momento, Frank. É que eu ainda estou um pouco baqueada.
Ele soltou uma praga em espanhol.
- Faça uma força, querida. Estou ferido e precisamos cair fora antes que um desses bandidos acorde.
- Oh, Frank! O que aconteceu? - Tânia passou a mão pelo ombro dele e percebeu, com um grito, que estava todo ensangüentado.
- Aquela maldita bala me pegou no ombro e parece que penetrou bem fundo. Temos que ir para o carro, antes que eu desmaie. Bater nesse desgraçado não me ajudou
muito. Queria muito saber onde foi parar a arma.
- Está ali - Tânia apontou.
Ele pegou a arma, aliviado. Depois sentou-se no chão para descansar um pouco. Tânia percebeu que devia estar sentindo muita dor. Mas Frank felizmente não
parecia disposto a desistir.
- Vamos dar o fora. Temos que mandar os homens de Hussein tratar desses dois - ele disse, levantando-se.
Apanharam a lanterna e começaram a andar. Frank disse a ela que tinha seguido o carro dos raptores o mais longe possível, para não ser percebido, e dirigiu
com as luzes apagadas no último trecho.
Seu ombro sangrava muito quando chegaram no carro. Ele piorava a cada instante, com a perda abundante de sangue. Encostou no carro e começou a procurar as
chaves.
A ansiedade de Tânia crescia e ela olhava a cada minuto para trás. Um lobo uivou na distância. Um cão latiu.
- Depressa, Frank. Aqueles homens devem estar nos seguindo.
- Abra... a... porta. Me deixe entrar no banco traseiro.
Tânia tentava abrir a porta, mas não achava a fechadura, de nervoso. Quando uma chave entrou, ela suspirou de alívio.
- Aí no banco de trás... Rasgue para fazer uma bandagem. - Frank se movimentava com esforço. Deitou no banco de trás, aliviado.
- Como você está? - Tânia quis saber.
- Temos que ir depressa, senão eu não vou agüentar. E aqueles bandidos daqui a pouco começam a nos seguir.
Tânia tremia, enquanto tirava a camisa dele ensopada de sangue. O ferimento parecia grave. O sangue havia se espalhado pela pele, formando uma enorme mancha
negra. Tânia pegou a maleta de vôo de Frank que estava no fundo do carro. Lá encontrou uma tesoura, que usou para cortar uma camisa de algodão em faixas. Trabalhando
o mais depressa possível, porque o tempo era precioso, ela pegou várias cuecas de algodão na mala e apertou contra o ferimento. Com a ajuda de Frank, conseguiu prender
a bandagem improvisada em seu ombro, tentando estancar o sangue.
Improvisou um travesseiro para ele com uma das calças. Ele sorriu de leve e caiu, meio inconsciente.
Tânia vestiu uma calça e uma camiseta dele. Pelo menos assim, podia se movimentar com maior liberdade.
Os cães latiram de novo, produzindo um som sinistro no meio do deserto. Apagando a lanterna, ela entrou no banco da frente e procurou no chaveiro a chave
da partida do carro. No horizonte, onde a estrada fazia uma longa reta, viu uma luz fraca ao longe. O pânico tomou conta dela. Na certa eram os bandidos voltando!
O que poderiam fazer?
Virou rápido a chave do contato e acendeu as luzes. Quando acendeu o mostrador da gasolina, percebeu que estava perto do sinal de "vazio".
- Frank - ela não podia esconder o medo em sua voz -, estamos quase sem gasolina e o carro vem vindo. Este lugar é longe da cidade?
Ele abriu os olhos, estonteado.
- Muito... longe... querida, Seu sussurro era um som fraquinho. - Vá para o oásis.
- Que oásis? Onde é? Oh, Frank, não me abandone agora!
Ele fez um esforço enorme para olhar o rosto ansioso de Tânia.
- Para trás, alguns quilômetros... eu vi... um campo beduíno... estaremos salvos.
Beduínos! Cruzes! Esses homens não eram selvagens do deserto? Mas Frank devia saber o que dizia.
Tânia colocou o carro em movimento e começou a rodar com cuidado. As luzes que vinham em sua direção ainda eram um borrão no horizonte. Ela não tinha idéia
de qual seria a distância entre eles e seus perseguidores. Procurava ansiosamente pelo oásis que Frank havia visto. De repente, lembrou-se dos latidos que ouvira.
Deviam vir de lá! Tentou ouvi-los de novo, mas não conseguiu.
Frank não havia dito nada sobre a direção a seguir. Seria para a direita ou para a esquerda? Desesperada, apagou as luzes e fechou os olhos alguns segundos.
Quando abriu de novo, percebeu uma definida linha de palmeiras, no horizonte. Ela virou e pegou uma trilha, se guiando pelas folhas das palmeiras.
Depois de andar um pouco, uns cachorros vieram correndo, latindo ao lado do carro. Tânia parou, sem saber se devia ou não continuar. Decidiu-se a retomar
a marcha, quando olhou para a estrada e viu o outro carro consideravelmente perto.
Os cães latiam em volta do carro! O que devo fazer, meu Deus?, Tânia pensava, desesperada. Certamente alguém ia ouvir. Logo, três homens apareceram dentro
do seu campo de visão. Ela percebeu que carregavam rifles. Será que iam ajudá-la?
Um grito de comando silenciou os cães. Tânia abriu, o vidro da janela e gritou, desesperada:
- Preciso de ajuda. Meu amigo foi ferido.
Eles falavam árabe e ela não conseguia entender nada. Tapou os ouvidos e chorou de desespero. Como poderia fazê-los entender o que queria? Eles pararam subitamente
de falar ao ver seu gesto aflito.
- Vou mostrar - Tânia disse. Saiu do carro e abriu a porta de trás. Frank estava inconsciente, e a bandagem em volta do peito, completamente ensopada de
sangue.
- Não morra, Frank, não morra agora. - Ela chorava sem parar, diante daqueles olhos curiosos. - Oh, por favor, façam alguma coisa. Depressa.
Um dos homens indicou com um gesto o banco traseiro. Tânia entrou. Os outros entraram na frente e um deles deu a partida para dentro do campo dos beduínos.
Na escuridão, Tânia segurou o rosto de Frank, molhado de suor, com suas mãos trêmulas e sujas.
Uma luz brilhou em uma das tendas. O beduíno-motorista desceu diante da tenda e deu explicações a um homem, que tinha vindo recebê-los.
Ele ouviu atentamente e foi até o carro, abaixando-se perto da janela de Tânia.
- Está precisando de nossa ajuda, senhorita?
Quando ouviu o homem falando um inglês impecável, Tânia sentiu um imenso alívio e desmaiou.
Capítulo XVII
Tânia abriu os olhos e achou que estava morta, no céu. Viu pelo menos umas seis mulheres morenas e sorridentes, cobertas por muitos panos coloridos, em volta
dela. Estava deitada numa cama de massagem, num banheiro. Seu corpo era lavado e tratado.
- Esperamos você acordar para lhe dar banho - disse uma jovem de tranças e enormes olhos negros, num inglês carregado de árabe.
- Ai, preciso mesmo de um banho longo. Mas e esses ferimentos, não vão doer? - Ela estava coberta de hematomas e aranhões.
- Passamos um ungüento especial, e tornaremos a passá-lo depois do banho. Amanhã você estará muito melhor.
As mulheres cuidaram dela como se fosse uma princesa. Depois de lavá-la, deram-lhe uma túnica de seda branca, longa, para vestir, e mostraram seu quarto.
Parecia coisa de cinema: a cama tinha lençóis de linho branco e almofadas de cetim.
Deitada nos finos lençóis, ela tomou chá e dormiu. Acordou no meio da noite, ouvindo o barulho de um helicóptero. Mas dormiu de novo e só acordou com o dia
já claro. Deu um pulo na cama.
- Frank! Onde será que ele está? - Ela olhava em volta procurando o amigo, desesperada. As mulheres morenas, correram para fora da tenda.
Subitamente, Mark e Hussein entraram.
- Tânia! - O rosto de Mark estava branco como um lençol. Ele parecia preocupadíssimo e, ao mesmo tempo, louco de ódio.
- Tânia! Graças a Deus - Hussein também parecia preocupado e caiu de joelhos perto dela.
Mark estava parado aos pés do colchão e olhava para ela.
- Está bem agora? - perguntou numa voz fria.
- Ainda não sei. - Ela olhou para Hussein. - Obrigada por ter vindo. Você não devia estar em lua-de-mel?
- Lua-de-mel? Como poderia ter me casado quando você tinha desaparecido da face da terra? Linda está desesperada. Nós reviramos a cidade de cabeça para baixo.
Ninguém havia visto você. Nos sentimos completamente inúteis. Depois, as autoridades receberam um aviso dos beduínos de que vocês estavam a salvo. Mark...
Mark o interrompeu.
- Estou feliz por você estar bem, Tânia. Precisamos ir ver como está Frank. - Virou-se e saiu da tenda.
Tânia ficou olhando, mas ele desapareceu sem olhar para trás. Bem, o que podia esperar de um homem como esse?, ela se perguntou. O rapto dela provavelmente
tinha mudado os planos dele e, por isso, Mark estava zangado assim. Era claro que ele não havia se preocupado nem um pouco com sua saúde. Só pensava na United e
no futuro da companhia sem a sua engenheira de operações.
Hussein olhou com carinho para ela.
- Mark tem estado como louco. Nunca tinha visto um homem se preocupar tanto com o bem-estar de seus empregados. Ele...
- Ele só estava preocupado com a United Petroleum - Tânia o interrompeu, não querendo ouvir mais nada. - Mark não se interessa por ninguém.
- Tânia, ele estava muito ansioso para encontrar você e ter certeza de que não estava ferida. - Hussein a contradisse. - Provavelmente já entrou em ação
para caçar os bandidos.
- Ele foi ver Frank.
- Sim, isso também o preocupa. Mas eu não invejo o homem que se atreveu a fazer mal a você. Jamais vai conseguir escapar da justiça de Mark. Ele é implacável.
- Já notei isso. - Não havia nenhum agradecimento no comentário de Tânia.
- Esses cães vão pagar caro. - Hussein passou seus dedos gentis e suaves na testa ferida e no rosto cheio de hematomas provocados pelas bofetadas.
Um motor foi ligado lá fora, chamando a atenção dele.
- Agora preciso ir, Tânia. O doutor virá vê-la assim que acabar de atender La Cruz. Então você será levada para a cidade.
- Como está Frank? Ele salvou minha vida. Atiraram nele. Fiquei tão assustada com seu estado, ontem, quando chegamos. - Ela tremeu, lembrando de todo o horror
que tinha enfrentado.
- Ele vai ficar bom. Não se preocupe. É muito forte.
- Mas, por que fizeram isso? Por quê?
- Até que sejam presos e interrogados, não saberemos. Talvez estivessem pensando que você fosse Linda. Eu ouvi rumores de que uma parte do meu povo não gosta
da idéia de eu me casar com uma estrangeira. Mas não podia imaginar que chegassem a isso. Se tivesse imaginado... - A culpa estava escrita no seu rosto moreno.
- Está bem, tudo acabou agora - interrompeu Tânia, já ansiosa por esquecer o incidente.
Mark enfiou a cabeça na porta da tenda.
- Hussein! Estamos prontos para ir! Frank disse que os homens ficaram na caverna, e me descreveu o local. É melhor irmos. - Ele sumiu de repente, como tinha
aparecido.
O príncipe levantou-se.
-- Eu não posso me desculpar o bastante pelo trauma que sofreu nas mãos daqueles meus maus patrícios. Agora preciso ir, mas asseguro que eles receberão o
castigo justo. Você não tem mais nada a temer, Tânia.
- Tenham cuidado... vocês dois.
- Não se preocupe. Eu trouxe muitos homens para nos ajudarem. - Ele sorriu.
- Só estou um pouco assustada com tudo. Obrigada por ter vindo, Hussein.
- Eu não poderia ter feito menos que isso.
- Hussein... - Ela parou, sem saber como dizer o que queria. - Estou muito feliz por você e Linda. Parabéns.
- Eu também estou feliz - ele admitiu abertamente, com olhar amoroso.
Se Hussein tinha sentido alguma coisa passageira por mim, havia esquecido disso em seu amor pela noiva, pensou Tânia com alívio.
Hussein beijou docemente a mão de Tânia, e se foi. Ele ficava lindíssimo em suas roupas árabes. Quando saiu apressado, suas vestes esvoaçaram ao redor de
sua figura alta. A cobertura de lã branca que levava na cabeça, presa com cordões dourados, acrescida à sua imperial presença, deixou Tânia com uma nítida impressão
de majestade.
Lá fora, várias máquinas roncavam. Pelo barulho dos motores, deviam ser caminhões, que os beduínos dirigiam, em vez de cavalgarem os camelos, quando andavam
pelo deserto. Depois disso tudo, ela ia ter que rever suas românticas idéias a respeito dos legendários sheiks do deserto.
Tânia foi hospitalizada para observação e ainda estava internada, vinte e quatro horas depois. Linda e sua família tinham ido visitá-la. Os noivos haviam
concordado que o casamento seria o mais simples possível, no dia seguinte, assim que Hussein voltasse.
Ela não tinha visto nem Mark nem Hussein, mas o príncipe ligou, querendo saber do seu estado. Era realmente muito gentil!
Mark e Tânia tinham reservas para o vôo daquele dia e iam perder o casamento. Mark mandou a mala de Tânia para o hospital. Ela colocou o lindo vestido de
seda azul, com a capa, para viajar. As dobras e o capuz ajudaram a disfarçar os estragos no seu rosto. Tinha um galo na testa, manchas roxas nas bochechas, o nariz
inchado, o queixo arranhado.
"Estou mesmo com uma aparência monstruosa!", falou para si mesma, olhando-se no espelho.
No avião, foi direto para o banheiro, e vestiu sua calça jeans e sua camiseta, respirando de alívio. Estou machucada, mas pelo menos estou confortável, pensou.
Mark veio para bordo quando o avião já se preparava para decolar.
- Sente-se bem, Tânia?
A pergunta dele a irritou. Não queria olhar para ele para não cair em lágrimas. Simplesmente virou o rosto.
Mark demonstrou que estava magoado com a frieza dela. Abriu a pasta e começou a trabalhar. Não trocaram uma dúzia de palavras durante quase meia-volta ao
redor do mundo.
Uma vez de volta a Galveston, ela dormiu doze horas, depois voou para a plataforma. Ainda tinha uma semana de seu turno para cumprir e o fez com tanta determinação,
que seus subordinados tomavam cuidado, sempre que fosse necessário aproximar-se dela para resolver algum problema. Ela estava completamente transtornada.
Capítulo XVIII
Uma semana depois, Tânia entrou no prédio da United, .em Galveston, temendo encontrar Mark. Preocupação inútil. Karen informou que ele estava na Califórnia
e não sabia ao certo quanto tempo ficaria lá.
- E Frank, Karen, tem notícias?
- Claro. Ele escreve e telefona. Está se recuperando do ferimento e volta assim que cumprir seu contrato.
- Que bom! E como vai o romance de vocês? A garota corou.
- Mark finalmente concordou comigo - confidenciou, feliz. - Desistiu daquela atitude tola. Eu e Frank vamos nos casar logo que ele voltar.
- Por que a aprovação dele é tão necessária para vocês? - Tânia queria que Karen confessasse seu antigo relacionamento com Mark.
- Por causa de Clint, é claro. Não posso prejudicar seu futuro casando com alguém que Mark não aprova, posso? Além disso, Frank não deseja arruinar sua amizade
com Mark, se puder evitar. Ele sempre sonhou que Mark ia mudar de idéia e agora mudou mesmo!
Essa conversa apenas aumentou a depressão de Tânia.
"Tenho mesmo que ir embora desse lugar", disse a si mesma, decidida.
Na plataforma, chegou novamente a hora de trocar as equipes e Mark ainda não havia voltado. Ele dirigia tudo por telefone, da Califórnia. Queria que estivessem
sempre em contato com ele, pois pela análise do computador, a perfuração atingiria uma zona de vital importância a qualquer momento. Gostava de saber de cada mudança,
cada progresso que os indicadores apontavam. Todos trabalhavam como fanáticos.
Um dia, a perfuradora atingiu uma bolsa de gás. Isso era totalmente inesperado. Tânia mandou cessar a atividade e convocou uma reunião de emergência, com
todos os técnicos e outros engenheiros. Decisões importantes seriam tomadas.
- Existe ouro nesse buraco e nós vamos pegá-lo - Greg dizia, disposto a continuar a perfuração.
Como chefe de operações, Tânia tinha amplo poder de decisão.
- Sim, Greg, mas vamos dar um tempo - ela disse, cautelosa. - Podemos incendiar o gás e explodir tudo num minuto.
- Esse é um risco que temos que correr - respondeu Greg. - Nós estamos num jogo, Tânia. Não há no mundo um homem do petróleo que não tenha corrido esse risco.
Como você pensa que a United fez seus bilhões em sete anos? Foi se arriscando onde outros sujeitos com muito mais dinheiro desistiram. O que diz? Vamos em frente?
Eu digo que não vamos explodir.
- O que você acha, Ian?
- Há um bocado de gás aí dentro, Tânia, você sabe, mas tenho que concordar com Greg. Provavelmente vamos encontrar óleo e gás, pelo que mostram as análises
de lama, mas creio que podemos passar através deles e chegar ao reservatório de petróleo sem maiores problemas.
- E Mark? Vamos perguntar o que ele acha disso? - ela insistiu.
- Diabos, não! Ele está muito longe. Não podemos perder tanto tempo. Vamos avisar, e ele vem quando puder, mas nós começamos já!
Finalmente Tânia concordou com os testes de pressão. O perigo era enorme. Hora após hora, cada um deles continuava concentrado nos instrumentos sob seu controle.
A pressão embaixo aumentava. O tempo passava e a tensão era insuportável.
Subitamente o helicóptero chegou trazendo Mark..
- Venha comigo, Tânia! - ele ordenou.
Ela o seguiu até o helicóptero, sem dizer nada. Ele virou e, rápido, levantou-a do chão, colocando-a no aparelho que zunia sem parar. Antes que ela abrisse
a boca para dizer qualquer coisa, Mark fez um sinal para o piloto e Tânia viu-se no ar, retirada da zona de perigo.
Em vez de ficar grata, ela ficou aborrecida por ele a ter tirado do seu serviço. Terrivelmente preocupada, foi para os escritórios da companhia, para acompanhar,
pelo rádio, os trabalhos na plataforma. A noite chegou, se foi e tornou a ir. Ela esperava. Ia em casa comer e tomar banho, depois voltava.
Nas primeiras horas da manhã do terceiro dia, Greg apareceu. Cansado e sujo, parecia perto de um colapso. Tânia resolveu levá-lo com ela para casa. Ma Ruddy
faria uma boa comida e ele tomaria um banho antes de descansar um pouco.
Quando chegaram, aparentemente não havia ninguém, pois não responderam aos seus chamados. A casa estava escura.
- Ma Ruddy não está. Tudo bem, eu cozinho - ela disse.
- Pode me fazer uns ovos mexidos, Tânia? Eu poderia comer um boi. Café também, por favor, vou tomar um banho.
Greg subiu a escada e Tânia começou a explicar onde era seu quarto. Mas ele não a ouviu e, em vez de dobrar à direita, virou para a esquerda.
Tânia ficou olhando intrigada, pois ainda não havia explorado a parte superior da casa. O que teria lá? Ma tinha dito que Mark freqüentemente hospedava pessoas
importantes naquela ala, mas nenhuma apareceu desde que ela chegou. Talvez Greg costumasse ficar lá e esse fosse o quarto que ocupava sempre.
Tânia voltou para a cozinha e continuou preparando o café da manhã. Queria botar uma roupa confortável, mas decidiu tomar banho só depois de comerem.
Tudo estava pronto e Greg não aparecia. Esticou a cabeça para fora e não ouviu nenhum ruído. Subiu a escada, esperando encontrá-lo dormindo.
Pensou que Greg tinha entrado num quarto de hóspedes, mas ele estava num quarto evidentemente habitado, que revelava um inconfundível gosto masculino. Os
móveis eram modernos e escuros, o carpete bege-claro, uma colcha grossa cobria a cama.
Artigos de toalete masculinos estavam espalhados em cima de um móvel com gavetas, onde havia fotos, em moldura de prata, de Greg mais moço, um casal idoso
e de Karen com Clint.
Tânia percebeu imediatamente que Mark vivia naquele quarto, mesmo antes que Greg saísse do banheiro. Ele parou, espantado, quando a viu e sorriu, sem graça.
- Sinto, Tânia. Não sabia que tinha subido. Jogue o robe de Mark para mim, por favor? Aquele à esquerda.
Então era mesmo o quarto de Mark. O robe de Mark e o banheiro de Mark. Como podia ser isso?
Foi até o armário e abriu a porta. Estava cheio de roupas masculinas: paletós, calças, jeans, suéteres dobrados em sacos individuais, sapatos finos e brilhantes,
enfileirados, um robe curto de veludo no cabide atrás da porta. Tudo cheirava a Mark. Na última porta, mais mistérios: estavam dependurados o casaco de vison, o
maravilhoso vestido prateado que ela usou na recepção aos árabes, em Londres, e mais os outros vestidos e as coisas que Mark comprou e Tânia recusou. Tudo parecia
muito bem arrumado, como se estivesse há muito tempo naquele lugar. Será que Ma tinha mexido lá?
Atordoada, ela apanhou o robe de veludo e jogou para Greg que esperava, ainda sem graça. Correu de volta para a cozinha e começou a mexer nas coisas, sem
saber o que fazia. Colocava os pratos na mesa quando Greg surgiu na porta.
- Desculpe se demorei no banho.
- Tudo bem - ela murmurou, tão perplexa que nem sabia direito o que dizia.
- O que está acontecendo, Tânia? Está tão pálida. Confesse a este seu amigo, vamos.
- Esta casa é de Mark, Greg?
Ele ficou em silêncio por um momento.
- Sim. Tânia, você não sabia?
- Sabia! Sabia! Como eu podia saber? - Ela começou a chorar. - Ele dorme aqui... naquele quarto?
Greg estudava seu rosto.
- Tânia - ele começou -, quer dizer que você não... Está querendo me dizer que não... vive com Mark? - O embaraço dele era evidente.
- Não! Claro que não!
- Pois me enganaram... e à metade da população de Galveston, também. Você vive nesta casa, ele lhe comprou um carro, paga bem demais pelo seu trabalho, embora
você faça por merecer seu salário. Bem... Juntando isso tudo, o que mais poderíamos pensar?
- Isso tudo faz parte do meu contrato com a United Petroleum, e Mark nada tem a ver com isso. É meu contrato com a companhia.
- Corta essa, Tânia. Eu sei, você sabe e todos sabem que Mark é a United. A United Petroleum Company pertence a Mark... Cada prego ou trabalhador dali é
propriedade dele.
Tânia se levantou da mesa, sentindo que todo o sangue fugia de sua cabeça.
- Calma, não desmaie agora, garota.
- Nada disso, Greg. Não faria nada tão idiota. Só preciso de umas respostas diretas de você e as quero agora.
- Está bem. Ponha mais café e vamos nos sentar um pouco, por Deus. Depois lhe conto tudo.
Eles tomaram café e então Greg começou a falar, explicando que Mark e ele, depois de perderem os pais, ficaram sob a tutela do avô. Greg tinha uma irmã de
oito anos chamada Sissy, os três viveram na casa do avô muito tempo. Mark era ajuizado, estudioso e curioso em aprender tudo, enquanto Greg era incapaz de seguir
as regras do avô. Este vivia na Califórnia, mas tinha um pequeno e produtivo poço de petróleo no Texas. Os garotos foram juntos para a Universidade. O velho morreu
enquanto ainda estavam lá, deixando sua propriedade no Texas para os três, com Mark no controle de tudo. Era a melhor coisa que ele podia fazer, pois Mark sempre
trabalhou e se interessou mais e tinha mais competência, Greg admitiu. A empresa que haviam herdado vinha lutando com dificuldades, porém Mark a fez crescer e dar
lucros. Ele a transformou em uma companhia de um bilhão de dólares, em poucos anos.
- É tudo dele? Vocês não possuem nada, agora?
- Não, não possuo, Tânia. Nem Sissy.
- O que ele fez? Tapeou vocês?
- Não seja ridícula! Mark não é disso. Eu casei com Ginny Lee. Ela queria meu dinheiro e exigiu que eu vendesse tudo. Mark não achava bom eu me desfazer
da minha parte. Implorou para que eu não vendesse. Por fim, desistiu e acabou comprando o que era meu. Ele fez o diabo para conseguir o dinheiro, mas se arranjou,
isso foi há cinco anos. Agora, não tenho Virgínia e nem o dinheiro. Por esse motivo, sou apenas um trabalhador, dependente de Mark para um emprego, sem um tostão
em meu nome. Mas não culpo Mark. Eu devia ter ouvido o que ele dizia.
- Então Ginny Lee deixou você porque seu dinheiro acabou?
- Isso ajudou muito, mas ela teria me deixado de qualquer maneira. Ela não me amava. Mark me disse isso há muito tempo, mas eu não quis ouvir. Posso dizer
que vivi para ver.
- E Sissy, por que não tem mais nada?
- O mesmo aconteceu com Sissy. Ela exigiu sua parte em dinheiro e se recusou a ouvir qualquer das sugestões de Mark. O nojento com quem casou pegou tudo
e desapareceu. Mark quase enlouqueceu de ódio. Ele é um inimigo terrível, mas é um amigo danado de bom.
"Oh, Greg, se pelo menos você soubesse da verdade", Tânia pensou. Achava abominável que Mark pudesse trair um primo que o adorava.
Levantou-se da mesa e saiu. Greg a seguiu.
- Tânia, o que está pensando fazer? Não faça nada precipitado, sim?
Tânia foi até a grande sala que era usada como biblioteca e, pegando uma folha de papel, sentou na máquina de escrever.
- Estou batendo minha demissão, Greg. Não fico nesta casa nem mais um minuto.
Seus dedos voavam pelo teclado. Procurou uma caneta, puxou o papel da máquina com violência, e assinou, deixando a carta sobre a mesa.
- Já que esta é a casa de Mark, ele vai encontrá-la. Ela subiu a escada com Greg atrás dela, implorando.
- Tânia, não se vá assim. Mark vai me matar por isso. Ouça, por favor. Fale com ele. Dê-lhe uma chance de explicar.
Na porta de seu quarto, ela virou-se para Greg, sentindo uma raiva imensa.
- Greg, estou indo embora, agora! Sinto se isso vai deixá-lo encrencado com seu ilustre chefe, mas ele deixou de ser o meu chefe. Vou fazer minhas malas.
Tânia podia ver no rosto de Greg a confusão de sua cabeça para resolver o problema que sua partida ia criar. Pobre Greg, parecia uma criança.
Deu um tapinha em seu rosto. Ele segurou a mão dela, virou-a e beijou a palma.
- Tânia, não deve fazer isso. Está planejando desaparecer, não está?
- Não seja tolo! Por que eu desapareceria?
Greg olhava com uma expressão estranha.
- Você não sabe, não é? Não tem realmente idéia de como Mark se sente em relação a você.
- Está exagerando. Mark não sente nada por mim. Não tem nenhum sentimento. Talvez tenha se sentido atraído no início, mas já nem pensa nisso. Eu nem sei
por que teve o trabalho de me instalar aqui e deixar que todos pensassem que eu era sua... amante. Greg, não quero mais discutir isso. Tenho que ir embora. Não posso
continuar nesta casa, aceitando a hospedagem de um homem que odeio mais do que ninguém.
Sentado na cama, Greg olhava tristemente Tânia apanhar as malas no armário e começar a enchê-las com suas coisas.
- Você está errada, sabe? Eu vi Mark olhar para você. E o olhar dele não me deixou dúvidas.
Tânia não respondia nada, mas lembrava-se de ouvir Mike Lane dizendo aquelas mesmas palavras.
- Mark está apaixonado. Eu o conheço como a mim mesmo, talvez até melhor. Ele nunca foi como está agora, nestes últimos tempos. E você nem mesmo gosta um
pouco do pobre diabo, gosta?
Tânia não respondeu. Fechou a mala com uma batida. Deu as costas a Greg e começou a apanhar as coisas das gavetas da cômoda.
- Você me fez uma promessa, Tânia. Esta você tem que cumprir. Não pode me deixar na mão.
Ela demorou, mas se lembrou do que era.
- Ah, o campeonato no próximo sábado! Você terá que treinar outra pessoa para me substituir.
- É. Mas não vou conseguir fazer isso em tempo. Eu preciso de você. Não há mais ninguém que possa usar. Você me prometeu!
Tânia terminou com as gavetas e foi até o banheiro apanhar seus artigos de toalete, enquanto pensava.
Velejar num catamarã era excitante, um desafio que ela adorava. Essa corrida significava muito para Greg, como ela bem sabia. O tempo que tinham passado
treinando havia atenuado o impacto da rejeição de Ginny Lee, e o ajudara a sair de seus problemas íntimos.
Embora Tânia achasse que tinham pouca chance de ganhar, pensou que não podia abandonar Greg agora. O campeonato era importante e ele não era culpado de ela
ter caído na armadilha de Mark.
- Está bem, fico uma semana em Los Angeles e, depois de disputar a corrida, deixo o país para sempre. Mas só vou com você na semana que vem com uma condição,
Greg - ela disse, decidida.
- Qualquer uma, Tânia. É só dizer.
- Tem que me prometer não contar isso a Mark. Não dizer a ele de modo algum.
Greg pegou a mão dela e apertou.
- Certo, magrela! Meus lábios estão selados. Nem uma palavra ao figurão Mark Anders.
- Então estarei lá. Agora diga a hora e o lugar.
Combinaram encontrar-se em Porto Isabel, na noite anterior à corrida. Tânia foi para o aeroporto e pegou o primeiro vôo para Houston. Uma vez lá, tomou um
avião para Los Angeles.
Capítulo XIX
O grande jato voava sobre o Pacífico. Tânia estava confortavelmente instalada dentro dele, tentando se consolar pensando que existiam problemas muito maiores
do que os seus. Ela mesma já tinha vivido piores dias, por que não conseguiria se recuperar?
- Deseja um drinque, senhorita? - A aeromoça parou ao lado dela.
- Não, obrigada. Aliás, quero sim, um uísque puro com gelo, por favor.
A bebida não ajudou muito. Não acabou com sua dor de cabeça nem melhorou o humor. Recusou o almoço, sentindo um pouco de náuseas, e fechou os olhos. Mas
o sono não vinha.
A vista de Los Angeles não conseguiu interessá-la. Ela não dormia há mais de trinta e seis horas. Isso, combinado com os últimos acontecimentos, contribuía
para seu atordoamento. Ter descoberto a verdade sobre Mark fora demais, mesmo para uma pessoa controlada como ela.
Fatigada, Tânia foi aos poucos entrando numa espécie de sonolência. Estava em estado de choque. O avião aterrissou e ela não percebeu. O homem sentado na
janela esperou que ela saísse primeiro, mas Tânia não o viu. Ele perguntou:
- Alguma coisa errada, senhorita?
- Eu... o que disse? - Tânia olhava, com olhos embotados.
- Precisa de ajuda?
- Não... obrigada. - Deu passagem, virando o corpo. Não notou que tinha que sair também.
- Aqui é o fim da linha. Tem que sair do avião - o homem informou.
Tânia agradeceu, pegou suas coisas e entrou no estreito corredor para sair. A aeromoça olhou-a com curiosidade e se despediu desejando um bom-dia.
- Se tem bagagem venha por aqui para apanhá-la - disse o homem.
Tânia olhou, sem- entender. Não tinha consciência de nada, nem de que estava linda, mesmo naquele jeans velho, com a blusa toda amassada.
- Como também tenho que retirar minha mala, posso mostrar-lhe onde é - o homem ofereceu-se.
Tânia o seguiu por um longo corredor rolante, até o salão onde ia pegar a bagagem. As primeiras malas estavam começando a sair sozinhas da esteira giratória,
onde ficavam rodando sem parar.
- É inglesa? - Tânia fez que sim com a cabeça para o homem, olhando as malas que chegavam. - Vindo de Miami?
- Não... de Galveston.
Achou que sua mala estava demorando a chegar. A esteira virava e virava diante de seus olhos cansados. As pessoas vinham, apanhavam a bagagem e iam embora.
A dela não aparecia.
O sinal eletrônico indicou que agora a esteira ia passar a recolher as bagagens para o próximo vôo.
Tânia suspirou e já ia embora. Tudo que precisava era encontrar o lugar no aeroporto onde se reclamava bagagens perdidas.
- Onde está indo? - o homem perguntou atrás dela.
- Reclamar minha mala. Obrigada pela ajuda. Posso me arranjar sozinha, agora.
- Tânia! - Duas mãos firmes a agarraram e Tânia virou-se, dando de cara com Mike Lane. - Meu Deus, Tânia. O que aconteceu? Você está horrível.
Ela fechou os olhos. Mike não parecia ser imaginação sua. Tornou a abri-los, ainda não acreditando no que via.
- Anders está com você? - Os olhos dele correram a multidão.
- Claro que não!
- Então, por que está aqui? Pensei que ele nunca deixaria você sair de sua vista.
- Eu... ele... Mark Anders não tem nada a ver comigo. Estou indo para casa, mas preciso ficar por causa de Greg, a corrida sabe. Depois dela eu vou embora.
Perdi minha mala...
Ela percebeu vagamente que Mike estava sem uniforme. Usava uma calça preta e um suéter branco. Carregava uma espécie de mochila, muito chique, e puxava uma
mala com rodinhas. Para onde ia? Isso aumentou sua confusão. Mike percebeu o estado dela.
- Certo. Vamos conversar mais tarde, Tânia - ele propôs. Tânia fez que sim com a cabeça. Sentia-se subitamente cansada demais para falar ou fazer qualquer
esforço.
- Agora, venha comigo - Mike continuou. - Eu não sei que diabo aconteceu com você, mas garanto que vou descobrir. Procure relaxar e ficar tranqüila, está
bem?
Tânia piscou com a luz do sol, quando saíram do aeroporto para o estacionamento.
- Minha mala... - protestou, vagamente.
- Não se preocupe. Mando buscar mais tarde. A bagagem extraviada pode demorar a ser localizada, e você não está em condições de ficar de pé, esperando.
Foi a última coisa que Tânia ouviu. Já estava dormindo quando Mike entrou no fluxo de tráfego na avenida.
Algum tempo depois, ela fez um vago e descoordenado esforço para ajudar alguém a tirar sua roupa. Mergulhou no conforto dos lençóis com um profundo suspiro.
O sono veio instantaneamente. Dormiu dezesseis horas. Quando acordou, demorou para recuperar-se totalmente.
Espreguiçou-se e virou na cama. Então, percebeu que estava numa cama estranha. Não sabia como tinha chegado lá, e, o que é pior, estava nua. Mike Lane! De
repente, lembrou-se de tudo! Com medo, puxou os lençóis e se enfiou debaixo deles como um coelho assustado.
Sentiu cheiro de comida. Hummm... bacon, café, torradas. Como seria bom tomar um café. Estava faminta!
Devia ser de manhã, supôs. Onde estaria Mike? Nesse instante. Mike botou a cabeça pela porta entreaberta.
Isso é que é força do pensamento!, ela pensou.
- Ora! A Bela Adormecida acordou sem esperar pelo beijo. Como príncipe oficial, preciso expressar minha objeção formal.
Tânia apertou os lençóis contra o corpo. Percebendo o desconforto dela, ele ficou na porta. Vestia um robe branco e curto, de espuma, que ia até o meio das
coxas revelando suas pernas bronzeadas. Calçava sandálias brancas cruzadas na frente. Tomando fôlego, Tânia perguntou o que queria saber.
- Onde nós estamos Mike? E por que estamos aqui? De quem é esta casa?
Ele riu.
- Uma das coisas mais deliciosas em você, Bela Adormecida, é a sua habilidade em ir direto ao coração das coisas. - Ele foi até os pés da cama e apanhou
um robe colocando-o atravessado sobre os lençóis. - Vista isto. Espero que esteja com fome. O banheiro é logo aí - terminou, fazendo um gesto.
- Onde estão minhas roupas?
- Na lavanderia. Estarão de volta pela manhã.
- Lavanderia? Manhã? Que horas são?
- Nove horas da noite.
Tânia fez um gesto de desânimo e entrou no banheiro. Quando terminou de comer, pegou uma xícara de café com os olhos fixos em Mike.
- Vamos conversar, você precisa me contar tudo - pediu.
- Está se sentindo descansada, Tânia?
- Me sinto muito melhor, obrigada. Mike sorriu.
- Tânia, você dormiu dezesseis horas. Sabia?
- Deve estar brincando!
- Que nada. Você estava à beira da exaustão quando a encontrei quase nas garras daquele lobo no aeroporto.
- Que lobo?
- Deixa pra lá. Não é importante. Se lembra por que veio a Los Angeles?
- Sim, sei porque estou aqui. Prometi a Greg Sims que ia tomar parte com ele na competição em South Padre Island, na próxima semana. Depois, volto para casa.
- Está evitando o principal, Tânia. O que aconteceu entre você e Mark Anders? Eu sei que você ama aquele safado, por alguma razão totalmente inexplicável.
Então, larga tudo e vem para cá sozinha, parecendo uma morta-viva, e tem a petulância de me dizer que nada aconteceu? Vamos lá, Tânia, me diga o que houve!
- Não é da sua conta.
- Não ama mais o Anders?
- Eu nunca o amei. Bem... para ser honesta, uma vez achei que o amava mas...
- Tânia... - ele a repreendeu.
- Está bem. Estou apaixonada por Mark, pronto. Fim da história. O que vai fazer? Rir?
- Deus, Tânia! Está me dizendo que Anders não te quis?
- A pergunta é irrelevante e inconveniente. Por que não se mete com seus negócios? Por que estou aqui?
-- Porque eu a encontrei vagando como uma alma penada no aeroporto desta cidade. Que mais poderia fazer, a não ser trazê-la comigo?
Ela o olhou, angustiada.
- Sinto muito estar sendo tão agressiva, Mike. Estou agradecida, você sabe...
- Tânia, a forte... até o fim da linha.
- Não sei o que quer dizer.
- Estou certo que sabe. Não era da minha conta, mas você parecia tão horrivelmente desamparada e triste. Eu liguei para Galveston.
- Com quem falou? - Tânia ficou em pânico. E se Mark tivesse atendido o telefone?
- Falei com Greg Sims. Ele levou um choque. Anders ainda está fora, não sabe de nada. Sims ficou preocupado com você. Disse que tem trabalhado como uma doida.
- Ele é um bom amigo.
- Bom demais. Pensei que viria direto pela linha do telefone para me dar um soco. Parece que não confia em mim nem um pouco. Quando soube que estava comigo,
queria pegar um avião e vir em seu resgate. É um perfeito cavalheiro, com armadura e tudo.
- Não fale assim. Greg é ótima pessoa. Não caçoe dele.
- Ele parecia sincero em seu desejo de proteger você. Foi difícil convencê-lo de que seria inútil vir a Los Angeles. A princípio ele pensou que nós tivéssemos
combinado este encontro. Ficou aliviado quando soube que nos encontramos por acaso. Ele deixou escapar que você largou a United Petroleum.
- É mesmo?
- Ele não me disse por quê - Mike disse, sem querer perguntar diretamente o que tinha acontecido.
Tânia fez que não entendeu e mudou de assunto:
- Quais são suas intenções comigo, Mike? Más?
- Provavelmente. Tive más intenções desde a primeira vez que a vi. Você sabe disso.
Tânia suspirou.
- Eu sei que estou a salvo aqui... não importa o que Greg pense.
- Vamos esclarecer isso já. Não está a salvo, coisa nenhuma. Eu quero você pra valer! Vou ter você antes que deixe esta cidade, se puder convencê-la a me
dar uma chance.
Tânia olhou séria para Mike.
- Não estou brincando, Tânia. Sei que não me ama e que está convencida que ama Anders. Está bem. Aceito até isso. O que quero é que aceite o fato de que
eu amo você, e não ligo a mínima para aquilo que sente por Anders, agora. Se deixar, eu mudo sua cabeça. Ouça minha proposta e me dê uma oportunidade de conquistá-la.
Não será tão ruim assim, vamos.
- Mas... Mike!
- Cala-se e ouça. Esta casa é de um amigo meu, que está em Londres no meu apartamento e com meu carro. Estivemos juntos na Universidade e somos como irmãos.
Antes de ontem quando a encontrei, foi que percebi que idéia genial tinha sido essa troca. Eu tinha planejado ficar aqui um mês, me entregar a prazeres ilícitos
e fazer as piores coisas para esquecer Tânia Cameron. - Ele riu e ela também. - Ajeitei as coisas para que meu último vôo fosse para Houston. De lá, peguei aquele
avião para cá e achei você. Destino, Tânia. Puro e banal destino. E você estava tão tonta que mal me reconheceu!
- Então me raptou e me trouxe para cá.
- Não resisti. Tinha de trazê-la para o meu território para convencê-la a ficar comigo.
- Por que não dormiu comigo a noite passada? Mike deu uma gargalhada.
- Que é isso? Eu ainda não cheguei ao ponto de precisar tirar vantagem de uma mulher inconsciente. Não faz meu gênero.
- E como joga, Mike? O que quer de mim?
- Quero você em minha cama. Eu a quero de qualquer jeito. Quero fazer amor com você até que desista e aprenda a me amar do modo que penso que ama Mark Anders.
- Seus olhos brilhavam de paixão.
Tânia prendeu o fôlego e endireitou-se. A última coisa que queria ouvir no mundo, agora, era uma declaração dessas.
- Você... - Ela parou, confusa.
- Quero dizer que não vou tocá-la, a menos que concorde, mas fique aqui esta semana comigo. Sabe que eu a amo e sei que posso fazê-la me amar. Quer tentar
isso?
- Não é tão fácil - ela protestou. - Nenhum homem jamais será capaz de tomar o lugar de Mark.
- Será? - Ele a desafiou.
Tânia ficou pensando que, por anos e anos, também tinha achado que nenhum homem tomaria o lugar de Kurt. Mas Mark o substituiu em seu coração sem nenhum
esforço, quando chegou a hora. Seria possível Mike conquistar o espaço do homem que ela amava agora? Será que conseguiria se entregar a Mike como se entregava a
Mark? Molhou os lábios, subitamente secos.
- Bem, quais são minhas opções?
- Suas roupas logo estarão aqui. Pode vesti-las e ir embora, sã e salva. Não vou fazer nenhum esforço para detê-la ou convencer você de nada, além do que
já disse.
- Conseguiu localizar minha mala?
- Ainda não, mas pedi a um amigo para se encarregar pessoalmente disso. - Ele parou um minuto, depois falou, de repente: - Deus, Tânia, não vá. Fique comigo.
Me dê uma chance de lutar por você.
E por que não?, ela pensou. Toda esperança de vida com Mark estava encerrada e morta. Por que não arriscar com Mike e ver no que dava?
Ele gostava dela; ela também o achava interessante. Quem sabe o interesse se transformaria em amor? Com os homens, nunca se sabe...
Duvidava que pudesse encontrar a felicidade com alguém mais, mas nunca teria certeza se não tentasse. Decidiu-se:
- Está bem, Mike, se me prometer não ficar magoado se eu descobrir que não sou capaz de te amar.
- Eu fui avisado! - Ele levantou-se e segurou-a nos braços, contente.
- Não... Mike.
Ele riu, suspirou e soltou-a.
- Vá para a cama, Tânia, antes que eu esqueça nosso acordo de cavalheiros.
Tânia foi, mas dormiu pouco nessa noite... e nas outras. Nada a entusiasmava. Ela tinha perdido a vontade de gozar a vida. Mike fez de tudo para tirá-la
dessa depressão monumental, mas ela não conseguia se distrair.
Mike levou-a a praias incríveis, de areia dourada, e com céu completamente azul; mostrou-lhe as montanhas, convidou-a para o teatro, cinema, boates, bares
da moda, tudo enfim. Mostrou a ela todos os pontos interessantes de Los Angeles, mantendo-a ocupada o tempo todo. Mas bastava Tânia ter um momento de folga para
pensar em Mark e suspirar, angustiada. Será que nunca conseguiria esquecer aquele homem? Provavelmente a essa hora ele estaria nos braços de outra mulher, totalmente
esquecido dela. Ah! era tão triste pensar nisso!
Na penúltima noite, foram sentar ao luar, no terraço da casa que ocupavam, encaixada no alto de Hollywood Hills. Mike fez mágicas de sedução para ela, mas
não conseguiu atingir o gelado e torturado coração de Tânia.
Ela estava angustiadíssima por causa disso. É claro que Mike pediu a ela que ficasse, com certeza de que a conquistaria. E agora? No começo da semana, ainda
achou que Mike poderia quebrar aquele gelo, mas à medida que os dias passaram, percebeu que continuava rejeitando-o do mesmo jeito. Como dizer a ele que não o amava?
Ela sabia que não seria fácil.
Era o último dia de Tânia em Los Angeles. Ela teria que dizer o seu não.
O telefone tocou, de manhã; Tânia pulou da cama, mas ouviu que Mike tinha atendido. Suspirou e foi para o banheiro.
Mike apareceu na porta.
- Um amigo meu telefonou. Vou ter que sair um pouco. Tudo bem? - A voz dele estava meio azeda.
- Claro, Mike. - Tânia agradeceu aos céus! Assim teria uma folga para pensar.
- Volto daqui umas três horas, aí vamos bater um papo. Até logo, amor.
Tânia percebeu que seu prazo tinha terminado. Teria só três horas para ganhar coragem!
Foi tomar seu café. "Serei capaz de viver com esse homem que não amo, só porque ele me quer?", pensou.
Qualquer que fosse sua decisão, porém, ia participar da competição. Mike precisava entender que ela não poderia deixar Greg na mão. Elegera um bom amigo,
não queria decepcioná-lo.
Estava terminando o café, quando o telefone tocou de novo. Ela atendeu. A voz do outro lado disse:
- Capitão Mike Lane, por favor.
- Ele acaba de sair. Posso ajudar?
- Temos aqui uma bagagem que foi guardada para ele. Meu chefe deseja saber quando seu dono virá retirá-la.
- Vocês estão guardando a mala?
- Sim, senhora. Geralmente não fazemos isso, mas sendo o comandante do Concorde, sabe como é, o chefe disse que era para guardar. Agora precisamos saber
quando o dono da mala vem buscá-la, pois está aqui desde sábado.
Sábado! O dia que ela tinha chegado de Houston.
- Um momento, por favor. Tânia foi buscar sua valise de mão, procurando o canhoto da mala. Achou, voltou ao telefone e leu o número.
- Certo. É essa mesma, senhora. A mala é sua?
- É sim - Tânia admitiu com raiva. - Vou apanhá-la ainda hoje. Pode me dar o endereço, por favor?
O homem deu o endereço. Ela chamou o táxi e, antes de sair deixou um bilhete para Mike. "Estou indo buscar minha mala, depois vou embora. Obrigada por tudo,
Mike. Sinto muito, mas simplesmente não consigo dominar meu insensato coração. Boa sorte! Tânia."
Não teve dificuldade em localizar e retirar a mala.
O homem disse que a bagagem tinha chegado no vôo seguinte ao dela. Mike a apanhou e pediu que a guardassem, enquanto ela dormia.
Tânia lamentou tudo isso. Mais uma vez um homem tentava enganá-la.
Registrou-se num hotel perto do aeroporto. Não tinha muito dinheiro na bolsa, mas seu cartão de crédito salvaria a situação. Embarcou cedo no primeiro vôo
para Harlingen, depois foi de táxi até Porto Isabel, logo adiante. Greg apareceu, e a levou de carro até um prédio onde tinha alugado um apartamento.
O prédio estava cheio de gente que participaria da competição e que contagiou Tânia com seu entusiasmo. Formou-se logo um grupo animadíssimo que ia de lá
para cá, de praia em praia, de festa em festa, trocando impressões sobre quem venceria a prova. Eram moças e rapazes bronzeados, usando constantemente shorts e jaquetas
a prova d'água, com os ombros queimados pelo sol forte. Vinham de toda a parte do mundo e falavam as línguas mais diferentes, mas tinham em comum o porte atlético
e a paixão pelo mar.
Os homens bebiam latas e mais latas de cerveja, depois saíam para treinar. Tânia não entendia como eles conseguiam aquela resistência fantástica, mas via
Greg fazer a mesma coisa e acabou se acostumando com o comportamento boêmio do pessoal.
No dia da corrida, Tânia acordou depois de um sono profundo e tomou uma decisão: ia participar da competição e voltar para casa imediatamente. Quando chegasse
à Escócia, recolheria os pedaços da sua vida e tentaria reconstruí-la. Sabia de muitas mulheres que tinham sofrido terríveis desilusões amorosas, nunca haviam se
casado mas nem por isso levavam uma existência inútil e sem graça. Ela também ia achar um jeito de fazer isso.
Pegou sua roupa de borracha e o salva-vidas, botou numa sacola de náilon, vestiu o maio e uma saia curta. Fechou a porta do apartamento e saiu. Ia tomar
um café reforçado. De barriga vazia, não era capaz de fazer nada direito.
Pediu uma vitamina e uma coalhada, depois comeu torrada com queijo branco. Por fim, foi para a praia encontrar-se com Greg.
Ajudou-o um pouco com o barco e vestiu a roupa de borracha que a protegeria contra a força da água, quando o catamarã atingisse uma velocidade alta. Colocou
o salva-vidas por cima.
Junto com Greg, empurrou o barco para a água. De repente, sentiu um arrepio na nuca. Antes de levantar a cabeça soube que Mark estava por perto.
Ele tinha parado ao lado de um barco e segurava o mastro com as duas mãos, enquanto examinava atentamente as nuvens brancas no céu. Estava em posição de
quem ia competir e vestido a caráter. Mas como isso era possível?
Tânia abaixou a cabeça, mexeu em alguma coisa no casco do barco e gritou para Greg que saísse. Ele se inclinou, empurrando a embarcação contra o quebra-mar,
e ficou em posição. Não entendeu por que Tânia estava com tanta pressa e nem pôde perguntar.
Ela lidava com o barco quase automaticamente, respondendo às ordens de Greg. A água batia no catamarã com força e, às vezes, cobria totalmente Tânia. Mas
ela nem notava. Sua mente estava na praia, em Mark. Será que ele tinha vindo atrás deles? Por que não a deixava em paz de uma vez? Provavelmente o veria de novo
quando fosse dada a largada para a competição, o que só aconteceria dali a pouco, quando todas as embarcações já se encontrassem em alto-mar.
O vento estava forte e a água agitada. Saindo dos seus pensamentos, Tânia se deu conta de que ela e Greg nunca tinham enfrentado um mar assim. Rezou baixinho
para que tudo desse certo. Greg também parecia preocupado e agora dava ordens cada vez mais enérgicas. Tânia procurava segui-las, mas sentia que era cada vez mais
difícil controlar o frágil catamarã.
Então, aconteceu. O vento mudou de direção subitamente, batendo com muita força na vela, justamente quando Greg estava dando o último nó na corda. O barco
todo balançou, eles tentaram segurá-lo mas acabaram virando.
Num segundo Tânia se viu embaixo da embarcação virada, de cabeça para baixo dentro da água do golfo. Não podia se soltar do catamarã porque seus pés estavam
presos pelo cabo de náilon que a sustentavam na borda do barco, onde ficava para fazer as manobras.
Lutando para libertar seus tornozelos, ela sentia o pânico dominá-la. Prendeu a respiração, mas percebeu que não agüentaria por muito tempo. Greg, debaixo
d'água, tentava puxá-la, mas a força das ondas o afastava dela.
Ela sabia que tudo aquilo estava acontecendo há segundos, embora lhe parecessem horas. Sabia também que não podia se desesperar, senão tudo estaria perdido.
Fazia força com as mãos, tentando se libertar com a ajuda de Greg. Os cabos de náilon não se rompiam. De repente, percebeu que Mark estava a seu lado, parecendo
estranho embaixo d'água. Com o coração batendo forte e os pulmões sem agüentar mais, ela instintivamente estendeu os braços para ele. Mark a agarrou, quando Tânia
perdeu o controle e desmaiou.
Capítulo XX
Tânia recuperou a consciência tão subitamente como a perdeu. Estava em um quarto de hospital para duas pessoas, mas não havia ninguém na outra cama.
Ficou deitada pensando em tudo o que tinha acontecido. Lembrava do rosto de Mark debaixo d'água. Ele a havia salvado, mas não vinha vê-la. Mark era ridículo:
pronto a ajudar a todos que se escravizassem a ele.
Enfermeiras entravam e saíam, verificando seu estado. Um médico veio acompanhado por um especialista chamado por Mark, segundo disse. Tânia se submeteu aos
exames com boa vontade. Queria confirmar que estava fisicamente bem. Isso ia melhorar seu estado emocional.
O médico realmente disse que ela estava em boa forma, mas queria que ficasse no hospital aquela noite, para observação.
Tânia, porém, não tinha a mínima intenção de fazer isso. Mal o médico saiu e a enfermeira terminou suas tarefas, saindo também, ela desceu da cama e foi
procurar algo para vestir.
Acontece que tinha chegado no hospital de maiô, jaqueta e sandálias. Era tudo o que havia no armário. Vestiu-se assim mesmo e pediu um táxi pelo telefone
do quarto, normalmente, como se fosse uma visita de algum doente. Conseguiu sair do quarto sem que nenhuma enfermeira percebesse. Naquele hospital, uma mulher de
maiô e jaqueta de náilon não chamava tanta atenção assim, quase todo mundo por ali tinha barco e se vestia como Tânia. Ela atravessou o hall de entrada e saiu rapidamente.
O táxi já estava esperando.
Deu ao motorista o endereço do prédio em South Padre Island, pedindo que esperasse quando chegassem ao edifício. Não havia ninguém no apartamento, quando
abriu a porta. Podia ver pela janela os barcos lá fora no golfo, cortando a água azul.
Colocou um conjunto de calça e camisa de brim, escovou os cabelos, passou um pouco de blush e batom. Estava bonita, bronzeada. Pelo menos voltaria à Escócia
com uma cor que todo mundo ia invejar. Se tivesse voltado na semana anterior; chegaria lá com cara de fantasma. Desceu com a mala e entrou no táxi, pedindo que a
levasse ao aeroporto.
Greg tinha acabado de virar a esquina quando ela entrou no táxi. Reconheceu-a imediatamente, mas quando gritou, o carro arrancou e Tânia não ouviu. Ele a
seguiu, no carro dele.
Assim que ela saltou do táxi, viu Greg estacionando bem atrás deles. O motorista ainda não tinha tirado sua bagagem do porta-malas.
- Onde você pensa que está indo? - Greg perguntou, segurando seu braço com força.
- Precisa de ajuda, senhorita? - O motorista colocou-se na frente de Greg, ignorando sua cara de raiva.
- Tudo bem, obrigada. Pode deixar.
- Está bem, Tânia Cameron - disse Greg, recuperando seu bom humor. - Vamos tomar um café e, com calma, você me explica exatamente por que está indo embora
daqui dessa maneira.
- Primeiro vou comprar minha passagem. Depois, tomamos café. Explico tudo o que você quiser, com a passagem na mão.
A maneira mais rápida de ir para Londres, naquele dia, era seguir para Houston, de lá para Chicago e então para Londres. Um trajeto complicado, mas ia assim
mesmo. Comprou as passagens.
Tânia estava certa que Greg a tinha traído. Ela havia lhe pedido que não dissesse nada a Mark sobre a competição. Ele prometeu e não cumpriu.
- Bem feito pra você. Merece ter perdido. Quem mandou contar tudo a Mark? - ela quase gritou com Greg, no café.
- Mas, Tânia, eu prometi não dizer a Mark e não disse. Foi falta de sorte ele ter também entrado na competição. Mark adora esse esporte. Foi quem me introduziu
nessa história de catamarãs. Esse é seu hobby.
Greg só não explicou que tinha contado a Karen, com a certeza de que ela passaria a informação a Mark.
- O que me aconteceu? Como me tirou de lá? Eu pensei que estava me afogando.
- E estava, menina. Estava mesmo. Mark velejava no barco que nos seguia e nos alcançou em segundos. O surpreendente é que nenhum homem pode partir aqueles
cabos de náilon, e Mark conseguiu. Estava fora de si, creio eu. Foi a primeira vez que vi uma coisa dessas acontecer. Ele te ama, Tânia.
- Não, não me ama nada. Nunca amou. Nem foi me ver!
- Ele ama, sim. Quase me matou depois, me culpando por arriscar sua vida. Dê a ele uma chance, Tânia.
O traiçoeiro coração dela implorava. Por que não, Tânia? Por que não?
Greg continuava com seus argumentos.
- Não é bom para sua carreira sair correndo desse jeito, você sabe. Aquele poço é excelente. A United vai dar um salto por causa dele, agora que está sob
controle e produzindo. Ian Taylor jura que foi a sua boa sorte, mais uma vez. O resto do pessoal também pensa assim. Eles querem você junto no próximo trabalho.
- Você não compreende. Não posso mais trabalhar para Mark. Tenho que me afastar dele.
- Eu disse antes que Mark é um bom sujeito. Acredite nele, Tânia. Você está jogando fora sua felicidade.
- Greg, não vai dizer a Mark para onde eu fui, vai? - ela insistiu.
- Não seja tola! Não vou ter que dizer nada a ele. Mark, se quiser, descobre sozinho.
Os alto-falantes do aeroporto anunciaram o vôo de Tânia. Greg tirou um envelope do bolso e entregou a ela, já diante do portão de embarque.
- É de Sissy. Ela quer que você venha ao casamento dela.
- Ela quer? Que pena, Greg? Dê um beijo nela por mim. Não vou poder, você sabe. Não vou voltar.
- Leve isso assim mesmo. Ela gostaria que estivesse aqui. Sente como se você fosse da família. Adeus, magrela. Vou sentir saudade, mas sei que não ficará
longe muito tempo. Não acredito que a United vai deixar escapar sua melhor engenheira de operações em alto-mar.
Tânia subiu os degraus do avião, tentando ignorar aquela profecia. Depois de fazer conexão em Houston, chegaram em Chicago. Ela já estava exausta quando
finalmente tomou o jato para Londres.
O comissário de bordo já estava anunciando a aproximação do Aeroporto de Heathrow, em Londres, quando Tânia se lembrou do envelope que tinha guardado na
maleta de mão. Era um convite bonito, estilo tradicional. Ela leu as letras antigas, impressas em dourado.
"Sr. Gregory Sims solicita a honra de sua presença no casamento de sua irmã, Karen Ann Sims Prescott"
Olhou as palavras sem entender. Karen Prescott... Sissy Sims? Então Karen era irmã de Greg? Sissy! É claro que nesse caso Clint podia ser a cara de Mark,
pensou. Esmagou o envelope na mão, lembrando as insinuações maldosas de Ginny Lee sobre o parentesco de Mark com o filho de Karen.
- Eu sou uma idiota, uma estúpida e patética idiota! O que fui fazer? - ela disse, em voz alta.
Num segundo, seus encontros com Mark nos últimos meses passaram por sua cabeça, como um filme. Ele a atraiu, desde o princípio. Recordando agora, via como
era óbvio que Mark não se comportou com ela como um patrão com sua contratada. Ele a havia provocado, tentado e fascinado com seu inegável charme e sua irresistível
masculinidade. Tinha usado seu poder para mimá-la e dar a ela o máximo que poderia querer de um novo cargo. Mas depois de tudo o que aconteceu, ela o deixou inteiramente
só.
Não podia culpá-lo. Mark Anders era um homem orgulhoso. Provavelmente, tinha pisado em seu orgulho de forma irrecuperável. Oh, Mark, ela pensava, é muito
tarde agora? Posso voltar atrás? O que devo fazer? O quê?
Com o orgulho nas mãos, decidiu que no dia seguinte ia voltar para Galveston e ir até ele, não importa onde estivesse, não importa a que hora do dia ou da
noite. Ia dizer a ele exatamente como se sentia, entregar seu coração nas mãos dele.
E se ele respondesse que tudo estava acabado, que já tinha agüentado o bastante da parte dela? Se ele não quisesse mais nada com ela? Bem... precisava tentar,
precisava correr o risco. Faria tudo para conquistá-lo.
Chegou a Edimburgo com a cabeça nas nuvens. Pegou um ônibus para a casa da mãe. Encontrou o aconchegante chalé encantador como sempre.
Se Mark não me quiser mais, de jeito nenhum, vou voltar e ficar aqui por muito tempo, pensava enquanto subia os degraus da entrada.
Virou a chave da porta, empurrou-a, entrou e colocou as malas no chão. Achou estranho o silêncio da casa. Acendeu as luzes e fechou a porta. Foi até a cozinha,
ao quintal, no quarto do avô. Jock e sua mãe tinham saído. Teriam uma surpresa quando chegassem.
Pegou uma das malas e foi para seu quarto. Acendeu as luzes do hall e entrou. Encontrou a porta entreaberta. Parou de repente. Tinha alguém na sua cama,
embaixo do cobertor, adormecido.
- Mamãe? - Tânia sussurrou, largando a mala.
A pessoa evidentemente acordou, se mexeu, mas ficou imóvel de novo.
Tânia foi na ponta dos pés até a beirada da cama. Ia dar um beijo de leve, na mãe. Se ela não acordasse, a deixaria descansar mais.
A luz do hall jogava uma suave penumbra no quarto. Ela percebeu, então, que não era Joan que estava em sua cama. Era Mark.
Capítulo XXI
Caiu de joelhos ao lado da cama, com o coração batendo como se quisesse se libertar de seu peito. Naquele momento, toda a sua vida parecia em suspenso. Então,
subitamente, as lágrimas vieram. Silenciosa e copiosamente.
Chorou tudo o que estava guardando há muito tempo. Com os olhos vermelhos e inchados, cheios de lágrimas, não percebeu que Mark se mexia e a encarava bem
de frente.
Em um momento ela estava em seus braços, soluçando descontroladamente, agarrada nele, sem consciência de que segurava a cabeça de Mark com toda a força,
completamente entregue àquela boca apaixonada que se movia sobre a dela.
A paixão que sentia por Mark a queimava como ferro em brasa, como sempre, como desde o primeiro beijo, o primeiro olhar. Todo seu corpo se inflamava em resposta
ao mínimo toque dele. Não ia parar agora, não ia parar mais. Não podia se controlar, nem queria. Ela não tinha, naquele momento, existência separada da dele. O corpo
dela e o dele eram um só.
Tânia se deixou perder completamente na glória de seu amor. Toda ela pulsava, do coração à cabeça, respondendo a cada carícia, a cada palavra de amor de
Mark. Não ia se deixar vencer pelo medo e pela incerteza, agora. Queria se entregar àquele homem e ele entendia o que significava sua rendição.
- Tânia... Tânia... Tem certeza? Sabe o que está pedindo? - Mark murmurava, no ouvido dela.
Ela abriu os olhos para ele... ardente, com o corpo quente pelo desejo que tanto tinha negado. Mark fechou seus olhos com um beijo e com mãos macias, começou
a tirar sua roupa.
Ele a tocava... carinhoso, de um jeito que a levava ao êxtase. Ele a subjugava e aprisionava, fazendo-a sua para sempre. Ela correspondia ao delírio dele,
movendo-se ao ritmo mágico de seu corpo, submetida, encantada. Era seu complemento, a outra parte dele.
Mark então gemeu e a queimou com aquele fogo contido, derramando dentro dela a chama de seu desejo, completando a união. Tânia gemeu também de dor e prazer,
o corpo dele imerso no seu. Ficaram assim segundos, mergulhando uma, duas, dez vezes naquela louca paixão. Nada existia para Tânia, naquele momento, além do homem
que amava.
Não soube quanto tempo dormiu, mas acordou nos braços de Mark e era isso que importava. Estava feliz demais com aquele aconchego. Sentia que poderia flutuar
sobre a cama, se ele deixasse, tal era sua felicidade agora que tinha encontrado finalmente a paz ao lado do homem amado.
Ficou quieta ali, juntinho dele, atenta aos ruídos da noite, que entravam pela janela parcialmente aberta. Alguns carros passavam, ao longe, na estrada.
As cortinas da janela balançavam revelando o luar. A luz do hall, que tinha acendido, há séculos atrás, também iluminava o quarto.
Agora, ela era uma mulher completa. Virou-se nos braços de Mark. olhando bem de perto o rosto do homem a quem tinha se entregado. Ele a apertou mais ainda,
recusando-se a libertar seu corpo, e começou a passar as mãos, suavemente, por suas costas, o pescoço, a nuca. Prendeu as pernas dela com as dele. Continuou de olhos
fechados, mordendo a ponta de sua orelha e murmurando:
- Ah! Vejamos o que temos aqui? Hummmm... Ah, sim, creio que me lembro. Aquela mulher com olhos azuis.
- Nunca conheci alguém mais impossível em toda minha vida. Sabia disso, Mark Anders?
- Agradeço a Deus, por isso. Já que gosta do impossível, certamente eu teria perdido você se fosse diferente. - Ele começou a beijá-la com paixão crescente.
- E isso eu não poderia suportar, Tânia Cameron. Mas tenho que admitir: você quase conseguiu me derrotar.
- Mark! Como pode dizer uma coisa dessas?
- Com absoluta autoridade, meu amor. - O rosto dele mudou, de repente. - Por Deus, Tânia! O que me fez passar nesses últimos meses! Várias vezes estive a
ponto de torcer seu pescoço, mas resisti a tempo. Você roubou uns bons dez anos de minha vida, sabia? Eu passei dias, semanas, absolutamente doido, incapaz de pensar,
porque tinha medo que você nunca aprendesse a me amar.
Ele se apoiou no cotovelo e a encarou com olhar magoado.
- Você me transformou num bobo, num capacho, e agia como se não ligasse a mínima para o meu sofrimento atroz. - Deu um beijo no nariz dela. - Ainda bem que
sou vaidoso e tenho uma auto-estima à prova de inglesas teimosas. Resisti porque no fundo sempre soube que ia tê-la para mim.
- Ah, sabia? Então sabia?
- Bem, tinha quase certeza. - Virando, Mark alcançou um papel dobrado na mesa ao lado e entregou a ela.
Tânia leu e releu, não acreditando no que via.
- Olhe isso, sua bruxa! Olhe a data... prova documentada das minhas boas intenções!
Era uma licença de casamento, emitida em Edimburgo, em fevereiro.
- Foi o dia em que viajamos de Londres para Dallas? - ela sussurrou.
- O dia que viajamos de Londres para Dallas, sim senhora - ele confirmou. - Voltei aqui depois do teatro. Eu tinha que saber tudo sobre aquele sujeito por
quem você estragava sua vida. Depois mexi meus pauzinhos e tirei esta licença, que vamos usar antes que o dia de hoje termine. Você vai ser minha legalmente, senhorita.
Tânia respondeu com um beijo apaixonado, com o calor que negou a Mark e a ela mesma por tanto tempo. Ele já mergulhava num torpor delicioso, quando ela se
assustou.
- O que fez com minha família, homem impossível? - perguntou.
- Por Deus, Tânia, você sempre estraga nossos momentos melhores. Como pode falar nisso agora? - Mark suspirou fundo. - Vou registrar uma queixa oficial sobre
isso. Quer saber sobre sua família, não é mesmo? Vou dizer, mas antes preciso passar a mão sobre a curva de suas costas, cheirar seus cabelos gostosos e beijar seus
olhos.
Ele fez isso tudo e depois disse:
- Agora eu falo: sua mãe e Jock foram a Vancouver, passar uma semana com sua tia-avó. Eles nos emprestaram o chalé para nossa lua-de-mel. Isso depois da
indispensável visita ao padre local, que já foi avisado para nos esperar a qualquer momento. Eu, desde já, aviso que tenho a firme intenção de passar a maioria dos
dias e das noites das duas semanas de nossa lua-de-mel na cama, provando as delícias que minha esposa tem para me oferecer.
- Com quem pensa que vai casar, moço? Acha que estou aqui para satisfazer todos os seus desejos e caprichos?
- Eu te aviso, Tânia Cameron, você já me envelheceu dez anos nos últimos tempos. Tem que parar antes que eu me torne prematuramente... bem... senil. Não
quero, de jeito nenhum, voltar ao pequeno inferno em que você me jogou. Deus, como sofri! Primeiro Hussein, depois aquele maldito piloto... Mike.
- Sofreu sem motivo. Não queria nenhum dos dois. Você é que não enxergava que, apesar de dizer o contrário, estava apaixonada por você desde o começo.
- Quando disse a Mike Lane que não o queria?
- Na última vez que o vi.
- Em Dallas. Foi o que Greg pensou. - Ele beijou Tânia, que tomou naquele instante uma irreversível decisão. Nunca, nunca, ia contar a ele que tinha encontrado
Mike em Los Angeles e passado aqueles dias em sua casa. Mark continuava: - Depois disso, fiquei esperançoso, mas você continuou tão áspera como um porco-espinho.
Por quê, Tânia?
- Eu pensei que você tinha... que você fosse...
Ela parou. Como podia ter se enganado daquela maneira infantil com Mark? Não sabia o que lhe dizer, agora. Se pelo menos o tivesse ouvido, quantas dores
podiam tem sido evitadas!
- Ginny Lee insinuou que você era o pai de Clint, e que tomava conta de Karen porque era responsável pela criança. - Ela enrolou o dedo em uma das mechas
do cabelo de Mark, sem graça. - Gosto de Karen e não podia suportar a idéia de que você a mantivesse presa daquele jeito. Achei também que afastou Frank por ciúme.
- Ela parou, assustada com a expressão de Mark.
Então ele começou a falar. Primeiro, explicou por que se preocupava com a irmã de Greg. Karen havia casado com um canalha, irresponsável, que pegou todo
seu dinheiro e sumiu, deixando-a grávida. Ela sabia que Ginny Lee a odiava e por isso não podia pedir ajuda a Greg. Pediu a Mark, que no princípio negou, mas depois
a ajudou.
- Mas Greg sempre a chamou de Sissy, nunca de Karen. Eu não sabia... - Tânia tentava se desculpar.
- Porque não é do tipo bisbilhoteiro. Se fosse, não teria sido vergonhosamente enganado por Ginny Lee, como foi. Bem, mas agora terminou e eu decreto que
deve esquecer tudo isso imediatamente. Clint se parece comigo. Eu tinha aquela cara com a idade dele. Você vai produzir uma casa cheia de cópias dele, não vai?
- Isso vamos ver, meu senhor. Devo lembrá-lo de que ainda não disse que queria casar com você.
- Ah, você não tem escolha, meu amor. - E beijou-a tantas vezes, que qualquer mulher na posição dela adoraria não ter escolha.
- Por que não foi me ver no hospital?
- Porque você ordenou que eu não a tocasse, lembra? Para visitá-la apenas como seu chefe, preferi não ir.
- Agora, me conte uma coisa: Greg estava tomando conta de mim, não estava?
- Claro. Coloquei Greg para tomar conta do que era meu. Sabia que ele ia proteger meu amor e manter os outros caras longe, até que eu achasse um jeito de
amaciar sua cabeça dura. Eu avisei Greg que você era minha.
- Parece que temos muito o que conversar, não é, Mark? Por exemplo, eu soube por fontes que não posso citar, que estive morando todo o tempo em sua casa,
em Galveston, dirigindo o carro que você comprou para mim, e sendo cuidada por seus empregados pessoais, e que a United é apenas uma fachada para encobrir você.
- Sinto muito, mas eu precisava pôr você em minha casa e prendê-la para sempre.
- Metade de Galveston achava que eu era sua amante.
- Ninguém tinha nada a ver com isso! Eu queria você lá e tratei de ter. Pelo menos até saber que me queria.
- Onde dormia? Fiquei chocada quando abri seu armário e vi suas coisas.
- Bem, não pretendia que descobrisse assim. Greg me contou o que aconteceu e que você teve uma péssima reação, mas eu não me preocupei. Sabia que ia voltar
para a competição de barcos. Greg prometeu não me dizer, mas contou a Karen, que gentilmente me informou.
- Aquele demônio sem-vergonha! Ele me jurou com os olhos mais inocentes do mundo que não tinha dito nada.
- Eu planejava explicar tudo lá, mas aí o seu barco virou, e nada funcionou como tinha imaginado. E o pior foi você deixar o hospital sem me dar uma chance.
Por que saiu correndo?
- Pensei quê não quisesse me ver. Greg disse para onde eu tinha vindo?
- Não, meu amor, nem precisou. Sabia que viria para cá e tomei um avião particular para chegar antes.
- Eu te amo, Mark Anders. - Ela agarrou os cabelos dele, que estava com a cabeça encostada em seu peito. Ele virou e tocou seus seios, com lábios de veludo.
- Você me encantou, Tânia, no momento em que pus meus olhos em você.
- Mmmmm... e quando foi isso?
- Não sabe, então? - Ela balançou a cabeça. - Eu saí de um helicóptero no meio do mar do Norte e vi um anjo de olhos azuis. Instantaneamente soube que não
poderia viver sem ele. Mas ele nem notou que eu existia!
- Notei você quando se jogou sobre mim!
- Deus, Tânia, nem me lembre disso. Sabe o que tem feito desde então? Um guindaste quase esmagou você, um vendaval quase a joga no golfo e depois de tudo
isso, quase morre afogada naquele maldito catamarã. Isso, sem contar o rapto.
- É, tive uma passagem movimentada pela Arábia e os Estados Unidos. Por falar nisso, é verdade mesmo que você é a United Petroleum?
Ele sorriu, inabalável.
- Claro, você acha que eu deixaria outra pessoa fazer isso tudo por você? Foi por isso que a levei para o longínquo Texas, para isolá-la de todos e entreguei-a
à terna doçura de Ma. - Mark puxou-a para si, enterrando o rosto nos cabelos dela.
Depois de muitos carinhos, ele tornou a dizer:
- Eu te amo tanto. Vamos nos casar.
Ela concordou, colada aos lábios dele. Nunca mais ia dizer não a Mark.
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Super Júlia 08 - Tormenta de Paixões - Jessica Logan
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