sexta-feira, 30 de abril de 2010

Mônica, a feminista esquecida

 

 extraido de JC On Line

O papo é pop

Mônica, a feminista esquecida

Publicado em 12.03.2010, às 14h30

Coelhinho azul na mão, vestidinho vermelho e pés descalços formam uma das imagens mais independentes, poderosas, impetuosas, valentes e desinibidas do ser feminino já conhecida
Coelhinho azul na mão, vestidinho vermelho e pés descalços formam uma das imagens mais independentes, poderosas, impetuosas, valentes e desinibidas do ser feminino já conhecida

Mês da mulher e ninguém lembra dela, uma das grandes feministas brasileiras. É brincadeira, mas é sério. Desde os anos 60, não se deixa dominar por homem nenhum, ao contrário, manda neles. Mônica, por justiça, devia ser um símbolo de luta.

Coelhinho azul na mão, vestidinho vermelho e pés descalços (o gorducha, baixinha e dentuça, melhor esquecer) formam uma das imagens mais independentes, poderosas, impetuosas, valentes e desinibidas do ser feminino já conhecida.

É comparável à Mulher-Maravilha. Líder em um mundo masculino, superativa, destemida, feminista no muque, rejeita a submissão, fala de igual para igual, superior em muitos momentos.

Tem lá seus problemas. Mandona, opressora até, apela para a violência, impaciente e precipitada ao extremo. Menininha quando quer ser. Vaidosa, delicada, romântica aos suspiros, inclusive, frágil e chorona quando pode. Qualidades e defeitos que a colocaram no paredão. Disseram que ela incentivaria o bullying entre as crianças, representa o poder da tirania, uma descontrolada emocional. Exageros.

Querem muito de uma personagem na faixa dos 7 anos de idade



Teses agressivas que não percebem a menina que ensina as outras a não baixar a cabeça, a ir à luta desde cedo, a se impor, mesmo não dotadas de superforça.

Na superforça mora o segredo. As garotas sabem ser impossível levantar carros, erguer pedregulhos, bater em todos os meninos da rua. Achar que têm mente vazia, que não refletem, não distinguem o lúdico do real, mesmo sendo crianças, é subestimar a inteligência infantil.

Mônica é contradição e combinação. Brinca de boneca, gosta de maquiagem, laços, fala "paizinho", "fofinho", "que amor". É mimosa. Ela se irrita, perde a cabeça, bate sem culpas, só quando a provocam, se arrepende às vezes. É durona. É como qualquer pessoa.

Mas exigem dela um exemplo de comportamento. Que poderia resolver tudo no diálogo, ser menos autoritária, mais reflexiva, cerebral, menos impulsiva. Querem muito de uma personagem na faixa dos 7 anos de idade.
Se ela fosse tão adequada, reclamariam de ser irreal demais, precisar de mais incoerências, dúvidas, defeitos e anseios para ser mais humana, mais próxima ao público. Nunca, por mais que fizesse, o caminho que escolhesse, iria agradar.

Altiva, sem dar ouvidos, nossa menina escolheu o caminho da liderança. Cresceu assim, dona de si. Em sua adolescência, por exemplo, mostrada desde 2008, ela ainda está no comando. Sua turma é, sempre foi e sempre será a Turma da Mônica.

Houve mudanças. Mudanças, bom frisar, radicais. Nela e em seus parceiros de vida Magali, Cascão e Cebolinha. Agora são high-tech, antenados e descolados. Também efêmeros, consumistas, loucos por shoppings, tendências, roupas, tênis, skates, tudo o que um adolescente ambiciona.

Cascão toma banho, trocou a sujeira pela bagunça. Magali vive de dieta para preservar o corpinho. Cebolinha (não o chamem mais assim, é coisa de criança) é Cebola, encorpou o cabelo moicano (pois é, ele tinha e a gente nunca se tocou) e só troca o "R" pelo "L" ao ficar nervoso, na hora das paqueras principalmente. Mônica ainda é esquentada, mas se controlar melhor, continua liderando.

E outra vez, a patrulha zangada, que só dá uma folheada nas revistas, cheia de má vontade, catando apenas os clichês, quer detonar os meninos. Fúteis, fugazes, estereótipos, reflexos da classe abastada, sem criar consciência da desigualdade social e lá se vai.

Outra vez, esquecem que eles estão aí para entreter. Fazem isso muito bem. E fazem mais. Não mudaram no que mais lhes é caro. Amorosos, companheiros, leais, se desentendem, se chateiam, birram, fazem as pazes, se mantêm juntos, para o que der e vier, desde a infância, exemplos de amizade da melhor qualidade.

Têm suas patetices, manias, caretices, frivolidades. E daí? Fossem diferentes, certinhos demais, seriam insossos, destoantes do cotidiano tumultuado adolescente. Ou seja, sacais.

Se Magali ainda comesse feito louca acabaria tachada de mau exemplo alimentar. Se Cascão continuasse se negando a tomar banho, a ir à escola, só ligar para futebol como antes, poderia estar na sarjeta, excluído, doente e até viciado. Cebola tendia a ser um solitário, retraído, mas assumiu e trata seu problema de fala. Mônica se esforça para ser mais estável. Ainda é briguenta, mas não um monstro autoritário e insuportável, longe disso.

Eles se corrigiram. Evoluíram. Nossos meninos (leia-se Maurício de Souza) fazem o possível para dar bons exemplos. Combatem o mal, defendem a ecologia, estudam, se divertem. Exigir perfeição? Como eles próprios diriam: dá um tempo, galera politicamente entediante.

E Mônica nem deve se preocupar. Nunca um plano infalível conseguiu derrotá-la. Desde 1963, quando foi criada; passando por 1970, sua primeira revista; até 2008, sua versão teen, ela vem sofrendo alterações, mas mantendo sua essencial dualidade valentona-delicada.

De pirralha a projeto de adulta, não é mais baixinha e gordinha (agora dá para falar), está menos dentuça por ação do aparelho ortodôntico. Mais bem-humorada, mais confiante, curtindo os amigos, novos e de longa data, e cativando leitores, idem.

Agora meiga e carinhosa, sem ser melosa, braba e atrevida, sem ser enfurecida, aprendendo que ser mulher não é fácil. Principalmente, quando se é uma líder.

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