quarta-feira, 28 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} A CRISE DA MORTE - ERNESTO BOZZANO NO 4SHARED

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A crise da morte – Ernesto Bozzano

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{clube-do-e-livro} BIOGRAFIA DE ERNESTO BOZZANO

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Biografia de Ernesto Bozzano:

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terça-feira, 27 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} LIVRO ANEXADO: O MORRO DA ILUSÕES - Zíbia Gasparetto /Lucius (19)




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domingo, 25 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} PISCOGRAFIA NO 4SHARED

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N°22 Psicografia

 

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domingo, 18 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} REUNIÃO MEDIÚNICA ESPÍRITA

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21)Reuniões Mediúnica Espírita

 

http://www.4shared.com/document/zwqZ82tT/REUNIES_MEDINICAS_ESPRITAS.html

 

 

 

 

 

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{clube-do-e-livro} REUNIÕES DE EDUCAÇÃO E MEDIUNIDADE

 

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20)Reuniões de Educação e Mediunidade:

 

http://www.4shared.com/document/bppPRsbP/Reunies_de_educao_da_mediunida.html

 

 

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sábado, 17 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} RECICLAGEM MEDIÚNICA NO 4SHARED

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19)Reciclagem Mediúnica:

 

http://www.4shared.com/document/PKpxZYmR/Reciclagem_Medinica.html

 

 

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{clube-do-e-livro} LIVRO ANEXADO: O MORRO DAS ILUSÕES - ZÍBIA GASPARETTO LÚCIUS

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sexta-feira, 16 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} PREPARANDO O MÉDIUM NO 4SHARED

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17)Preparando o Médium e a  mediunidade(39)

 

http://www.4shared.com/document/Obp8ZcgR/Preparando_o_mdium_e_a_mediuni.html

 

 

 

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{clube-do-e-livro} PRECIOSA FERRAMENTA NO 4SHARED

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16)Preciosa Ferramenta(19)

 

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{clube-do-e-livro} O PERIGO DA MEDIUNIDADE NO 4SHARED

 

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15º) O Perigo da Mediunidade:

 

http://www.4shared.com/document/m4nmIc6M/Os_perigos_da_mediunidade.html

 

 

 

 

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quinta-feira, 15 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} LIVRO ANEXADO: A Verdade de Cada Um (psicografia Zíbia Gasparetto - Espírito Lucius

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terça-feira, 13 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} LIVRO ANEXADO: Um amor de verdade -Zíbia Gasparetto





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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} LIVRO ANEXADO: Esmeralda -Zíbia Gasparetto


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{clube-do-e-livro} LIVRO ANEXADO: Tudo Tem seu Preço - Zíbia Gasparetto



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domingo, 11 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} LIVRO DE MEDIUNIDADE NO 4SHARED: O PERIGO DA MEDIUNIDADE

 

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{clube-do-e-livro} LIVRO ANEXADO: O CASTELO DOS SONHOS - VERA LÚCIA M. DE CARVALHO

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{clube-do-e-livro} LIVRO DE MEDIUNIDADE: O USO INDEVIDO DA MEDIUNIDADE

 

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13)O USO INDEVIDO DA MEDIUNIDADE:

 

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sábado, 10 de setembro de 2011

{clube-do-e-livro} O QUE É MEDIUNIDADE ?

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12)O QUE É MEDIUNIDADE

 

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{clube-do-e-livro} LIVRO ANEXADO: Onde está Tereza ? - Zíbia Gasparetto(45)

SEMPRE-LENDO O MELHOR GRUPO DE TROCA DE LIVROS DA
INTERNET

Onde está Teresa?


Pelo espírito Lucius
Zibia Gasparetto

1ª Edição
Dezembro-2007

Centro de estudos Vida& Consciência
Editora Ltda.
São Paulo-SP.

Aprendi a ler aos quatro anos de idade e,
aos oito, muitas vezes passava horas
sentadas, escrevendo histórias. Com a
chegada da adolescência, deixei esse
comportamento de lado e só o retornei na
forma de psicografia quando, anos
depois, meu marido e eu, uma vez por
semana, estudávamos os livros de Allan
Kardec. Meu braço doía e a mão mexia
contra minha vontade. Colocados papéis e
lápis na minha frente, comecei a escrever
rapidamente.
Nós freqüentávamos as sessões da
Federação Espírita e eu participava como
médium de incorporação, psicografava e,
algumas vezes, utilizava o dom da
xenoglossia (faculdade de falar ou
escrever línguas estranhas). Nessa
época, recebia contos, mensagens de
orientação, histórias e, assim, os
romances começaram a fluir.
A sensibilidade se abre e vemos muitas
coisas que não entendemos. Venho
estudando há muitos anos e ainda não
tenho todas as respostas. Mas sei que é
melhor disciplinarmos o emocional,
enfrentar os medos e tomar posse de nós
mesmos para que as energias dos outros
não nos envolvam.
Se conseguirmos isso e nos ligarmos aos
espíritos evoluídos, a mediunidade é uma
fonte de conhecimento, saúde e lucidez.
Estudar a vida espiritual abre as portas
do futuro, derrotando a morte e nos
mostrando que somos seres imortais.
ZIBIA GASPARETTO


LUCIUS

ESSE AMIGO ESPIRITUAL, QUE VEM ME
INSPIRANDO EM TODOS OS ROMANCES,
TRABALHOU SEM REVELAR SEU NOME
QUANDO EU COMECEI A PSICOGRAFAR.
EU SENTIA SUA PRESENÇA, CHEGUEI A
VÊ-LO ALGUMAS VEZES, MAS NUNCA
PERGUNTEI NADA. PREFIRO AS
MANIFESTAÇÕES ESPONTÂNEAS. SÓ
QUANDO TERMINEI O LIVRO O AMOR
VENCEU, NA ÚLTIMA PÁGINA, ELE
ASSINOU LUCIUS.
A RESPEITO DE SUA TRAJETÓRIA SÓ SEI
QUE ELE REVELOU NO LIVRO O FIO DO
DESTINO, EM QUE RELATA DUAS
ENCARNAÇÕES NA TERRA: A MAIS
ANTIGA COMO MEMBRO DO PARLAMENTO
INGLÊS E A OUTRA COMO ESCRITOR E
JUIZ NA FRANÇA. PARA MIM ELE TEM
SIDO UM MESTRE. SUAS ENERGIAS SÃO
PRAZEROSAS E QUANDO ELE SE
APROXIMA, MEU PENSAMENTO TORNA-SE
CLARO, LÚCIDO. SINTO-ME MUITO BEM.
NOS PRIMEIROS TEMPOS EM QUE
TRABALHAMOS JUNTOS, ELE COSTUMAVA
ANDAR COMIGO E, CONFORME O LUGAR,
AS CENAS QUE EU PRESENCIAVA ME
ORIENTAVAM, FAZENDO-ME IR MAIS
FUNDO NAS OBSERVAÇÕES. DEPOIS DE
ALGUM TEMPO, ELE PASSOU A VIR
APENAS NOS MOMENTOS DE TRABALHO.
APRENDI MUITO, TANTO COM SEUS
CONSELHOS QUANTO COM AS HISTÓRIAS
QUE ELE ME PASSOU.
ALGUMAS PESSOAS ME PERGUNTAM "POR
QUE VOCÊ".
NÃO SEI POR QUE ELE ME ESCOLHEU, MAS
SINTO QUE OS LAÇOS QUE NOS UNEM
SÃO ANTIGOS E CONTINUARÃO
EXISTINDO PELA ETERNIDADE.
ZIBIA GASPARETTO.


PRÓLOGO
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Caminhando depressa pela rua solitária,
Marília pensava nos últimos
acontecimentos. A cena trágica de
momentos antes não lhe saía da cabeça.
A noite estava escura e algumas pessoas
caminhavam apressadas, ouvindo o ruído
de alguns trovões com receio da
tempestade que se alinhava. Marília,
porém, estava mais voltada ao seu drama
interior do que à chuva que ameaçava
cair.
A cena de momentos antes a fizera rever
seus dez anos de casada. Dez anos
tentando levar adiante um
relacionamento que desde o início havia
sido difícil, não pelas exigências de Otávio
como pelo temperamento maldoso, vendo
em tudo e em todos más intenções.
Desde o nascimento de Altair, há cinco
anos, ele havia se tornado pior, mais
exigente, mais implicante. Apesar disso,
Marília tentara levar casamento adiante.
Alimentava a esperança de que ele
mudasse, entendesse melhor sua
responsabilidade de família.
Durante a tarde, alguém colocara uma
carta debaixo da porta de sua casa.
Marília a apanhara e no envelope não
havia remetente, apenas seu nome. Abriu
e procurou a assinatura: Um amigo!
Começou a ler:
Você é uma boa pessoa e não precisa
aceitar a companhia de um marido
perverso, que não valoriza a família,
entregando-se a toda sorte de vícios e
envolvido no crime. Afaste-se dele antes
que seja tarde. Se não acredita, vá hoje à
noite, às dez horas, até o endereço abaixo
e terá a confirmação do que estou
afirmando. "Um amigo".
Marília sentiu um aperto no peito. Há
muito tempo desconfiava das atividades
de Otávio. Ele nunca comentava sobre seu
trabalho, dizia apenas que era
representante comercial, mas ela nunca o
via anotando pedidos, saindo para visitar
clientes; ainda assim, de vez em quando
ele aparecia com dinheiro, pagava o
aluguel sempre com atraso, comprava
alguns alimentos, e quando ela lhe pedia
algum dinheiro para as despesas, dizia
que não tinha.
Ela sabia que o que ele dizia não era
verdade. Otávio vestia-se muito bem, saía
quase todas as noites, voltava tarde, e se
a via acordada ficava nervoso, brigava.
Por esse motivo, mesmo que não
estivesse dormindo, Marília fingia a fim
de evitar discussões.
Ao ler a carta ela sentira necessidade de
descobrir aonde ele ia quando saía à noite
e acabar com o mistério. Com o coração
aos saltos, cinco minutos antes das dez
ela chegou ao endereço indicado.
A noite estava escura e ameaçadora, mas
toda a atenção dela estava focada na casa
térrea que tinha diante de si.
Nenhuma luz acesa, certamente não
havia ninguém. Fora bobagem acreditar
em uma carta anônima. Ela fora
enganada. Em um gesto natural,
empurrou a porta e para seu espanto, ela
se abriu.
Ficou alguns instantes indecisa, mas a
curiosidade foi maior. Entrou e foi
caminhando cautelosa, tateando as
paredes em busca do interruptor.
Sob uma luz fraca e amarelada apareceu
uma sala de estar; os móveis estavam
revolvidos, as gavetas abertas, como se
alguém chovesse estado lá, procurando
alguma coisa. Assustada, Marília recuou,
ia sair, quando teve sua atenção
despertada para outra sala de onde saía
uma luz pálida. A curiosidade foi mais
forte e ela caminhou até lá.
O que viu a fez parar estarrecida. Sob a
luz fraca de um abajur, havia uma cama
de casal e sobre ela um homem e uma
mulher, ambos seminus, os lençóis
manchados de sangue e revirados.
Marília quis gritar, mas a voz morreu na
garganta. Aterrorizada, sem sabre o que
fazer, procurou o interruptor e acendeu a
luz. Nessa hora reconheceu Otávio, a
mulher, não muito jovem, mas bonita, era
desconhecida.
Marília sentiu que ia desmaiar e reagiu,
não podia perder os sentidos, precisava
pedir socorro. Aproximou-se mais e
percebeu que ambos estavam mortos.
Horrorizada, ela respirou fundo e saiu
correndo daquele lugar.
Seu marido estava morto! Provavelmente
ao lado da amante. Talvez um marido
ofendido houvesse feito aquilo. O que
fazer? Pedir socorro não adiantaria. Eles
estavam mortos. Teve medo. Poderiam
pensar que ela estivesse envolvida no
crime. Decidiu ir embora.
A chuva começou cair, confundindo-se
com as lágrimas que rolavam de seus
olhos aflitos. De repente, um pensamento
de medo a acometeu. E se alguém a
tivesse visto sair daquela casa? Nesse
caso poderiam culpá-la.
Quem escrevera a carta talvez fosse o
próprio assassino, preparando uma cilada
para que ela parecesse culpada.
Marília tremia sem saber se era medo ou
de frio, sentindo o corpo gelado, os pés
encharcados e a água escorrendo.
A tempestade desabara violenta e não
havia mais ninguém na rua. Marília,
porém, não queria parar, com receio de
ser vista próxima àquele lugar.
Parou no ponto do ônibus onde havia uma
pequena cobertura. Pouco depois ele
chegou, ela subiu e notou que estava
quase vazio.
O cobrador olhou-a penalizado e
murmurou qualquer comentário que ela
sequer ouviu. Não via à hora de chegar
em casa. Quando ia descer ouviu o
motorista aconselhá-la:
- Tome um chá bem quente para não ficar
doente!
Marília desceu e andou até sua casa,
entrou e imediatamente foi tomar banho
quente. Vestiu o roupão, enrolou a toalha
nos cabelos e foi devagar até o quarto de
Altair com o coração aos saltos.
Abriu a porta lentamente e respirou
aliviada. Ele dormia e Dorita, também. Ela
não a vira sair, o que era bom. Voltou ao
quarto, secou os cabelos, vestiu a
camisola, mas não parava de tremer.
A cena que presenciara ficara gravada em
sua mente e ela não sabia o que fazer.
Pensou em ligar para a polícia, mas teve
medo. Para os pais de Otávio, nem
pensar. Como lhes dizer que estivera na
cena do crime e não chamara a polícia?
Decidiu que o melhor seria esperar pelos
acontecimentos. Ela não havia feito nada
de mau. Ao contrário, estava arrasada
pela traição e pela morte do marido. Era
uma vítima, não uma criminosa.
Mas o fato de não falar a ninguém o que
tinha visto a deixava aflita. O que dizer
quando a polícia viesse para dar-lhe a
triste notícia? Suspeitaria dela? Afinal,
uma mulher ciumenta é sempre perigosa.
Mas apesar de haver sido traída, Marília
estava triste pela morte de Otávio. Era
um aperto no peito, uma sensação de
perda e piedade pela morte terrível que
ele tivera.
Deitou-se, mas não consegui dormir.
Ficou se revirando na cama, lutando com
os pensamentos tumultuados e desejando
esquecer, sem conseguir".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO



CAPÍTULO 01
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Marília abriu os olhos assustada e olhou
em volta. Por um instante pensou que
nada havia acontecido e seu marido
estivesse dormindo ao seu lado. Mas não
havia ninguém. Sentia a cabeça pesada e
o aperto no peito continuava. Havia
pegado no sono quando o dia já estava
amanhecendo. Olhou no relógio: sete
horas.
Altair já deveria estar se vestindo para ir
à escola. Levantou-se, lavou-se, vestiu
um robe e foi ai quarto do filho. O menino
não queria levantar e Dorita tentava fazê-
lo vestir com dificuldade.
Marília aproximou-se:
- Deixe comigo. Vá aprontar o café.
Dorita saiu aliviada, e Marília, alisando a
cabeça do menino, disse:
- Vamos filho. Está na hora. Não era hoje
que você ia começar a jogar no time da
escola?
Essas palavras soaram como uma mágica.
Altair abriu os olhos e pulou da cama.
- Que horas são? Estou atrasado?
- Ainda não. Mas está em cima da hora.
Vamos ao banheiro. Eu o ajudarei.
Em poucos minutos Altair estava pronto
para tomar café. Eles desceram e foram à
copa. O cheiro de café gostoso fez Marília
recordar-se que desde que recebera a
carta não havia comido nada. Sentia o
estômago vazio e certa fraqueza.
Sentou-se ao lado do filho, serviu-o, e
enquanto ele comia, ela serviu-se de café
com leite, apanhou um pão, passou
manteiga e começou a comer.
Agora mais do que nunca precisava
sentir-se forte para enfrentar o que viria
logo mais.
Dorita foi levar Altair à escola, que ficava
a alguns quarteirões dali, e ela voltou ao
quarto para se vestir. Ao abrir o guarda-
roupa viu os ternos de Otávio, alinhados
com cuidado e teve um sobressalto. Sabia
que ele nunca mais voltaria para casa.
Lágrimas voltaram a seus olhos, mas ela
enxugou-as com raiva. Não podia
fraquejar. Quando a polícia aparecesse,
precisava fingir que não sabia de nada.
Não podia contar que estivera na cena do
crime e não quisera dar queixa.
Caprichou na maquiagem, tentando
dissimular seu abatimento. Talvez não
tenha conseguido completamente, pois
quando Dorita voltou da escola disse
logo:
- A senhora está abatida. Não dormiu bem
à noite?
- É. Perdi o sono, fiquei esperando Otávio
chegar e como ele não chegou ainda
fiquei preocupada.
- Não deveria. Ele já fez isso várias vezes.
Daqui a pouco ele chega.
- É verdade. Bobagem minha.
Dorita suspirou, ia dizer alguma coisa,
mas desistiu. De que adiantaria? Por
essas e outras é que ela não ia na
conversa de homens. Nunca aceitaria um
marido como aquele. Certamente, deveria
estar com outra.
Ele foi cuidar do serviço e Marília foi
arrumar as gavetas de Altair, que sempre
remexia tudo e deixava bagunçado.
As horas foram passando e nenhuma
notícia. Na hora do almoço, Dorita havia
ido buscar Altair e de volta com o menino
perguntou:
- Dona Marília, o seu Otávio ainda não
chegou?
- Não, Dorita. Estou muito preocupada
- Vai ver que ele teve algum negócio
urgente e precisou viajar. Já fez isso uma
vez sem avisar.
- É, poder ser.
O tempo foi passando, já estava
escurecendo quando a campainha tocou.
Marília estremeceu. Dorita foi atender e
pouco depois voltou, olhando com ar
assustado.
- Dona Marília, é a polícia.
Marília empalideceu e levantou-se
imediatamente. Foi até a sala onde dois
policiais a esperavam.
- Dona Marília Marques de Oliveira?
- Sim.
- Precisamos conversar com a senhora em
particular
Altair estado ao lado mãe, olhando-os
com curiosidade.
- Dorita, leve Altair para o quarto, veja se
ele já acabou a tarefa da escola.
O menino não queria ir, mas um olhar
imperioso da mãe o fez obedecer. Quando
ficaram a sós, ele continuou:
- Podem falar.
- Seu marido se chama Otávio de
Oliveira?
- Sim.
- Ele está em casa?
- Não senhor. Ele saiu ontem à noite e não
voltou.
- E a senhora não ficou preocupada?
- Um pouco, mas ele costuma fazer isso e
às vezes até viaja sem avisar.
Os dois policiais trocaram um olhar de
cumplicidade, e depois um deles disse:
- Infelizmente, as notícias que trazemos
não são boas. Seu marido está morto.
Marília sentiu uma tontura forte e teria
caído se um deles não a houvesse
amparado. Apesar de saber a verdade, de
ter visto a cena terrível, ao ouvir a notícia
dita cruamente pelo policial tornou-se
mais consciente da verdade.
Um deles correu à cozinha, apanhou um
copo de água e deu-o a ela:
- Acalme-se. Beba.
Ela apanhou o copo com as mãos trêmulas
e bebeu alguns goles. Depois perguntou
com a voz fraca:
- Como foi?
- Ele foi assassinado.
As lágrimas corriam pelas faces de Marília
e ela não estava fingindo. Eram
verdadeiras. A lembrança da cena que
presenciara não lhe saía do pensamento.
- A senhora sabe se seu marido tinha
brigado com alguém ou tinha inimigos?
- Não. Meu marido não trazia seus amigos
em casa e nunca me contava o que fazia
quando saía.
- A senhora não perguntava?
- Sempre, porém ele ficava irritado e não
respondia.
- Ele foi encontrado na cama com outra
mulher, ambos mortos. A senhora
conhecia essa mulher?
- Não. Quando ele passava as noites fora,
eu desconfiava. Perguntava a ele brigava.
Dizia que ficava bebendo com os amigos e
cuidando de negócios. Com o passar do
tempo não perguntei mais.
- A senhora vai precisar vir conosco para
reconhecer o corpo
- Agora?
- Sim.
- Preciso avisar os pais dele.
- Pode nos dar o nome e endereço, nós
faremos isso.
Marília tremia e eles a observavam
calados. Ela foi até a mesinha do telefone,
apanhou um bloco e escreveu o nome, o
endereço e o número do telefone dos pais
de Otávio, destacou a folha e entregou
aos policias.
- Vou subir para me trocar, não vou
demorar.
Eles concordaram e Marília subiu a
escada, sentindo as pernas trêmulas, as
mãos frias, o coração apertado. Assim
que entrou no quarto, Altair correu para
ela indagando:
- É verdade que o papai está morto?
Antes que Marília respondesse, Dorita
entrou aflita:
- Não consegui segurá-lo. Infelizmente os
policiais falavam alto e ouvimos o que
disseram. Eu disse ao Altair que não era
verdade.
Marília abraçou o menino, dizendo com
voz que procurou tornar firme:
- É verdade, sim. Seu pai morreu. Mas eu
estou aqui, com você.
Altair tremia e perguntou:
- Você não vai morrer, vai?
- Não. Vamos continuar juntos: eu, você e
Dorita. Não tenha medo.
- Com você eu não tenho medo de nada.
- Isso meu filho.
- Agora eu preciso sair com os policiais.
Mas assim que puder estarei de volta.
- Posso ir com você? Tenho medo de ficar
sozinho.
- É melhor ficar com a Dorita. Não há
perigo de nada. Saia um pouco, meu filho,
preciso me trocar.
Dorita puxou-o pela mão e eles saíram.
Marília arrumou-se o mais rápido que
pôde, apanhou a bolsa, mas quando abriu
a porta do quarto, Altair a estava
esperando.
Seus olhos aflitos procuraram os dela:
- Eu quero ir com você, tenho medo de
ficar aqui.
Eles desceram e Marília disse aos
policiais:
- Meu filho está muito assustado. Não
quer ficar sozinho com Dorita.
- Pode levá-lo com a moça.
Dorita rapidamente fechou as janelas e
saíram. Alguns vizinhos estavam olhando
curiosos e Marília entrou rapidamente no
carro da polícia, puxando Altair pela mão.
Dorita acomodou-se em seguida e os
policiais ligaram o veículo e saíram.
Uma vez no carro, um deles esclareceu:
- Passaremos antes no local onde está o
corpo para fazer o reconhecimento e
depois teremos de ir à delegacia.
Marília arrepiou-se ao lembrar-se da cena
que presenciará na noite anterior, mas
sentiu-se aliviada ao perceber que não
estava sendo levada para lá.
Passava das nove da noite quando
entraram em um prédio onde algumas
pessoas entravam e saíam. Os policiais
acomodaram os três em uma sala e se
foram. Pouco depois voltaram e um deles
disse:
- A senhora vem conosco, os dois
esperam aqui.
Marília sentou as pernas tremerem. Altair
segurou o braço da mãe e ela, procurando
aparentar calma, disse:
Não tenha medo. Vou à sala ao lado e
volto logo. Fique calmo. Não vai acontecer
nada.
Os policiais a levaram por um corredor
mal iluminado até uma porta onde um
homem vestindo jaleco cinzento, fé-los
entrar. Havia algumas mesas vazias e
duas onde estavam corpos cobertos com
lençol.
O homem encaminhou-os para uma delas,
pediu a Marília que se aproximasse,
depois levantou a ponta do lençol. Ela
olhou o corpo procurando controlar a
emoção.
- É ele!- afirmou sem conter as lágrimas. -
É meu marido Otávio.
- Tem certeza?- indagou um dos policiais.
- Sim. É ele.
O homem cobriu o rosto do morto
imediatamente, e levou-a até a outra
mesa, pedindo que se aproximasse.
Ela percebeu que o outro corpo que
estava ali era da mulher e sentiu uma
tontura forte, suas pernas bambearam.
Um dos policias segurou seu braço com
força dizendo:
- Coragem. É preciso que olhe para ela e
veja se a identifica. Não sabemos quem é.
Seu marido estava com os documentos,
mas não achamos nada dela. A senhora
precisa nos ajudar.
Marília respirou fundo e depois
respondeu:
- Está bem.
O homem levantou a ponta do lençol e ela
olhou. A mulher era mais velha do que
notara naquela noite. Em seu pescoço
havia uma enorme gaze que cobria um
ferimento.
- Pode nos dizer quem é ela?
- Não. Não a conheço.
- Está certa disso?
- Estou.
- Está bem. Vamos embora.
Os policiais conduziram Marília para fora
da sala. Ela soluçava e um deles
entregou-lhe um lenço de papel que ela
pegou, enxugou o rosto, assuou o nariz.
Ao chegarem à porta da sala onde Altair
estava ela parou.
- Preciso-me controlar-disse - Meu filho
está muito assustado. Não quero que
fique pior.
- Ele não se envolvia muito com o
trabalho da casa. Era D. Marília que me
dizia o que fazer.
- Sei. Que dizer que ele não conversava
com você?
- Só às vezes, para perguntar pela D.
Marília, quando não a via por perto. Ele
quase não parava em casa.
Monteiro fez uma ligeira pausa, depois
continuou:
- Ele tinha muitos amigos?
- Só se tivesse na rua, porque em casa
nunca apareceu nenhum.
- Pelo jeito ele não era apegado à família.
- Não mesmo. Ele mal olhava para o filho
e brigava quando o menino falava mais
alto ou corria pela casa.
- Pelo seu tom percebo que não gostava
muito dele.
- Não é porque ele está morto que eu não
vou dizer a verdade. Eu não gostava
mesmo dele.
- Por quê? Alguma vez ele a maltratou?
- Não. Ele mal me dirigia a palavra. É
porque eu via como ele tratava a D.
Marília. Ela sim, é uma mulher bondosa,
boa esposa e boa mãe.
- Ele tinha motivos para não tratá-la
bem?
- De forma alguma. Como eu disse, ela
sempre foi uma mulher muito correta e
vivia para a família, enquanto ele...
- O que tem ele?
- Saía quase todas as noites, muitas vezes
nem voltava para casa.
- Por esse motivo ela brigava com ele?
- Não, pelo contrário. Se ela lhe
perguntasse aonde ia ou aonde tinha
estado, ele brigava. Virava o bicho. Tanto
que com o tempo ela não perguntou mais.
- Seu patrão trabalhava em quê?
Não sei. Ele nunca falava sobre o seu
trabalho.
- Há alguma coisa diferente ou estranha
que você tenha notado nos últimos dias?
- Não.
- Nem na noite do crime?
- Não senhor. Seu Otávio costumava
passar algumas noites fora e até voltava
no fim da tarde do outro dia. Teve uma
ocasião em que ele foi viajar e não avisou
nada. Ficou quase três dias sem aparecer.
- O que você pensava disso?
- Bom senhor delegado, para mim quando
um homem casado dorme fora, tem
mulher no pedaço. Pelo que sei, ele não
estava sozinho quando foi morto.
- Você nunca desconfiou de nada?
- Não senhor.
- Está bem. Pode ir. Se lembrar de mais
alguma coisa, ainda que lhe pareça
insignificante, entre em contato comigo.
Tudo pode nos ajudar a descobrir que
cometeu este crime.
Dorita deixou a sala mais tranqüila. O
delegado mostrara-se cordial e ela se
sentira valorizada por poder desabafar e
contar que sabia.
- E então, como foi?- indagou Marília
quando a viu.
- Bem. Eu estava com medo, mas o
delegado soube conversar. Eu contei o
que sabia. Disse a verdade.
- Fez bem.
- O que vai acontecer agora? É tarde e
Altair está morto de sono.
- Perguntei quando eles cão liberar o
corpo de Otávio, estou esperando uma
resposta.
Nesse momento, um casal entrou na sala,
ela em lágrimas, ele com o olhar
assustado. Vendo-os, Marília levantou-se:
- Dona Emilia, viu que tragédia?
A mulher procurou conter-se dizendo com
a voz abafada:
- Eu ainda não estou acreditando! Isso
não aconteceu com meu Otavinho!
- Infelizmente, é verdade. Eu queria que
não houvesse acontecido-respondeu
Marília, tentando abraça - lá.
Ele fingiu que não viu, voltou-se para o
marido, abraçando e soluçando. Marilia
deixou cair os braços desanimados. Ela
sabia que a sogra nunca aceitara seu
casamento com Otávio. Sempre que podia
procurava deixar claro o que sentia com
relação a ela, comentando com amigos e
parentes que Marília não era boa o
suficiente para seu filho, um rapaz bonito,
cheio de qualidades e com futuro
brilhante.
Marília não sabia como ela chegara a essa
conclusão, uma vez que Otávio não era
como ela dizia. Era alto, forte, mas
intolerante, fechado e maldoso. Embora
ficasse revoltada com o comportamento
da sogra, que chagava a dizer ao filho o
que pensava dela, tentando separa-los,
ela procurava não levá-la a sério.
Nos primeiros dias de casada, Marília
perguntava ao marido porque a sogra a
tratava daquela forma. Mas ele dera de
ombros e lhe dissera que não se
importava com o que a mãe dizia e que
ela deveria fazer o mesmo. Proibiu-a de
voltar ao assunto.
Já Herculano, seu sogro, era menos
implicante e ficava em volta da esposa
fazendo-lhes todas as vontades
elogiando-há o tempo todo, indiferente ao
seu mau humor contumaz. Ele sempre
conservava um sorriso nos lábios fosse
qual fosse à situação. Mas Marília não
confiava muito nessa postura do sogro.
Emília era desagradável, esnobe, exigia
do marido coisas difíceis de suportar.
Certamente, ele fingia aceitar para
acalmá-la. Contudo, esse procedimento
contribuía muito para que ela ficasse mais
insatisfeita a cada dia e se colocasse na
postura de vítima da ignorância dos
outros.
Emilia continuava chorando abraçada ao
marido, que abatido, tentava acamá-la.
Um policial apareceu e Herculano
identificou-se e pediu informações sobre
a morte do filho, solicitando autorização
para ver o corpo.
- O delegado vai conversar com os
senhores.
- Eu quero ver o corpo!- pediu Emilia com
voz chorosa. – Ainda não acredito que ele
esteja morto. Pode ser um engano.
- Infelizmente, não há nenhum engano. O
corpo foi reconhecido pela esposa.
Emília lançou um olhar duvidoso sobre
Marília que havia s sentando novamente:
- Ela pode ter se enganado. Eu quero ver
esse corpo.
- A senhora diga isso ao delegado. Agora,
sentem-se vou avisá-lo que estão aqui.
O policial afastou-se. Emilia lançou um
olhar de repulsa para as pessoas que
esperavam ali. Ela não desejava sentar-se
ao lado delas.
Mas Herculano viu que havia dois lugares
em um banco logo depois do lugar onde
Marília se sentara e conduziu a esposa
para lá. Contrariada, ela sentou-se
empertigada.
Vinte minutos depois, o policial voltou e
convidou-os a falar com o delegado, que
os recebeu atencioso, convidando os a
sentarem-se a sua frente.
- Meu nome é Monteiro- disse- Lamento o
que aconteceu ao filho de vocês.
- Não acredito que esteja morto. Quero
ver o corpo.
- O corpo já foi identificado pela esposa,
além do que, no local do crime, havia uma
carteira com os documentos dele.
Emilia teve uma crise de choro:
- Não pode ser! Meu filho, não!
Como foi isso?- indagou Herculano triste.
- Em uma casa que não era a dele, foram
encontrados dois cadáveres, o de seu
filho e o de uma mulher que ainda não foi
identificada.
- Uma mulher? Quem poderia ser? –
indagou Emilia admirada.
- Ainda não sabemos. Na sala da casa os
móveis estavam revirados e no quarto, os
corpos do casal morto na cama. Estamos
fazendo as primeiras investigações e
quero fazer-lhes algumas perguntas.
Saber mais sobre a vida de Otávio para
tentar descobrir alguma pista do
assassino.
- Estamos dispostas a colaborar. - tornou
Herculano-, mas penso que não podemos
fazer muito.
- Neste momento todas as informações
são importantes. Quero que falem tudo o
que se lembrar a respeito dele. Seus
hábitos, seus amigos etc.
- Fale você- pediu Emília.
- Otávio sempre foi uma pessoa discreta.
Não tinha o hábito de falar sobre sua
vida.
- Qual seu grau de escolaridade?
- Otávio não gostava de estudar. Com
muito custo conseguimos que chegasse
ao ensino médio.
- Ele tinha irmãos?
Desta vez foi Emília que respondeu:
- Era filho único. O que será de mim agora
sem ele?
- Otávio era muito apegado á senhora?
- Ele não era apegado a ninguém -
interveio Herculano. - Ela é que era muito
apegada a ele, era Deus no Céu e
Otavinho na terra.
- Otavinho sempre foi um bom filho. Era
calado, mas de vez em quando ia nos ver
e dava-nos dinheiro.
- Ele trabalhava em quê?
- Era representante comercial. Tinha um
escritório e até um funcionário.
- Quero o endereço desse escritório.
Os dois entreolharam-se e não
responderam logo. Depois Herculano
disse:
- Não sei onde fica. Ele nunca me deu o
endereço.
- O senhor nunca foi lá?
- Não. Como eu disse, meu filho era
discreto, não gostava de falar muito e
quando eu perguntava, ele se irritava,
ficava nervoso. Então Emilia ficava
zangada comigo.
O delgado olhou-os sério, depois decidiu:
- Está bem. Esta foi uma conversa
informal. Vamos tomar algumas
providências e voltaremos a conversar
oportunamente.
- Eu quero ver meu filho!- Pediu Emilia.
- Vou pedir que os levem até ele.
- Quando vamos poder fazer o enterro?-
indagou Herculano.
- Não posse ser preciso. Depois da
autópsia e de algumas investigações o
corpo será liberado.
- Meu Deus!- gemeu Emilia nervosa. - Eles
vão cortar o corpo do Otavinho!
- Acalme-se, Emilia- pediu Herculano- É
de praxe.
Os dois deixaram a sala e Herculano olhou
em volta, procurando a nora e o neto. Não
os viu e comentou:
- Eu queria falar com Marília e consolar
Altair.
- Eu quero ver Otavinho logo e ir embora
desde lugar horrível o quanto antes.
Um atendente os chamou para leva-los
ver os corpos com a intenção de saber se
conheciam a mulher. Os policiais não
tinham descoberto a identidade por que
ela fora ferida nas mãos e não puderam
colher as impressões digitais, o que
impedira sua identificação.
A hipótese de que eles teriam sido mortos
por um marido traído era viável, mas
havia um complicador: a desordem da
sala sugeria que estivessem procurando
alguma coisa e que teria sido mais de um.
O casal foi morto na cama, o que afastava
a probabilidade de luta.
- O senhor viu onde minha nora foi?-
indagou Herculano ao atendente.
- Ela estava esperando para saber quando
o corpo seria liberado. Mas como ainda
não sabemos, ele foi embora.
Levados ao necrotério, diante do corpo do
filho, os dois choraram muito e Emilia
começou a passar mal.
- É ele mesmo! Até agora eu achava que
podia não ser nosso filho!
Herculano abraçou-a, tentando acalmá-la,
mas sentia o coração oprimido e decidiu:
- Agora vamos sair daqui. Precisamos
tomar um pouco de ar.
Ele a puxou pelo braço e, apesar de ela
querer ficar, acabou cedendo.
- Antes de ir precisam ver a mulher que
estava com ele e dizer se a conheciam.
Emilia não queria, mas Herculano forçou-
a a olhar o rosto dela. Eles disseram que
nunca tinham visto.
Uma vez fora da sala o atendente disse:
- Podem ir embora. Quando o corpo
estiver liberado nós os avisaremos.
Eles saíram cabisbaixos, pernas trêmulas,
peito oprimido. O rosto do filho e daquela
mulher não lhes saía do pensamento".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 02
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Marília estava sentada na copa, tendo
um bloco de anotações a sua frente,
calculando o montante de sua despesa
mensal. Mesmo fazendo muita economia
ela não sabia como iria manter a casa.
Precisava procurar um emprego. Havia se
formado em letras, porém nunca tinha
trabalhado e, além disso, estava bastante
desatualizada.
Encontrara algum dinheiro na gaveta que
Otávio costuma deixar sempre fechada e
que ela fora forçada a arrombar, mas o
montante mal dera para as despesas do
enterro. Seus sogros não ajudaram em
nada, pelo contrário, ela fora forçada a
ouvir reclamações da sogra que pretendia
para o filho um enterro mais luxuoso.
Marília suspirou triste. Ainda não se
refizera do golpe e a cena trágica que
presenciara naquela noite fatídica não lhe
saía da lembrança.
Conversar com Altair sobre o assassinato
do pai fora-lhe doloroso. Apesar de
insatisfeita com as atitudes do marido,
ela o poupava diante do filho. Preferia
que ele não soubesse dos pontos fracos
do pai e que guardasse dele uma
lembrança melhor. Mas o menino, muito
inteligente, percebera os fatos e ela não
pôde evitar que ele chegasse perto da
verdade.
Seus pais, que moravam no interior de
São Paulo, na cidade de Rio Preto, haviam
comparecido ao enterro tinham ido
embora ao dia anterior. Apesar de não
serem ricos, haviam lhe deixado algum
dinheiro que ela desejava economizar
pelo menos até que começasse a
trabalhar.
Conversara com Dorita sobre a
dificuldade que teria para lhe pagar o
salário, mas ela lhe dissera que ficaria
trabalhando mesmo que Marília não lhe
pagasse.
- Obrigada pela confiança, mas por
enquanto não sei o que fazer nem quando
terei dinheiro para lhe pagar. Se desejar
trabalhar em outro lugar, compreenderei.
Continuaremos amigas do mesmo jeito.
- De jeito nenhum. Estou aqui antes de
Altair nascer e esse menino é como se
fosse meu filho. Além disso, adoro
trabalhar para senhora, que vai precisar
que eu tome conta do menino quando
encontrar serviço. Vou ficar. Estou certa
de que juntas encontraremos uma forma
de resolver esse problema. Eu seu que vai
dar tudo certo.
Marília a abraçou comovida:
- Você é minha amiga e eu quero que me
trate por você. Otávio era quem exigia
que me tratasse de "senhora" e eu nunca
concordei.
- Não sei se vou me acostumar...
- Vai sim. Eu me sentirei melhor dessa
forma.
- Está bem.
Marília voltou às contas. O pior era o
aluguel. Seria preciso mudar-se para uma
casa menor e mais barata. Mas havia o
contrato. Teria de procurar o senhorio e
conversar com ele.
O telefone tocou, Dorita atendeu e
chamou-a:
- Marília, o Dr. Monteiro deseja falar com
você.
Ela atendeu prontamente. Depois dos
comprimentos ele disse:
- Preciso que venha à delegacia hoje.
Quero falar com a senhora.
- A que horas?
- Dentro de uma hora. Estarei esperando.
- Aconteceu alguma coisa? Encontrou o
assassino do meu marido?
- Ainda não, mas encontramos uma pista.
Uma hora depois, Marília chegou à
delegacia. Estava curiosa. O que iria
descobrir sobre a vida do marido?
Dez minutos depois foi introduzida na
sala do Dr. Monteiro que a olhou sério e
mandou que se sentasse na frente a sua
mesa.
- E então doutor, o que descobriu?
Ele perguntou com voz firme:
- A senhora conhecia a casa onde ocorreu
o crime?
- Não senhor
- Nunca esteve lá?
Marília estremeceu e hesitou um pouco
respondeu:
- Não...
- Suas impressões digitas foram
encontradas em dois cômodos da casa.
Como explica isso?
Marília empalideceu. O que temia tinha
acontecido. Só lhe restava contar a
verdade.
- A senhora mentiu e a aconselho a não
esconder nada porque a partir de hoje
passa a ser suspeita de haver
assassinado aqueles dois.
Marília desesperou-se:
- Não doutor. Não fui eu. Tenho horror a
sangue, nunca seria capaz de cometer
esse crime.
- Otávio não era bom marido. Não a
tratava bem, passava muitas noites fora,
certamente com a amante. A senhora
tinha sérios motivos para cometer esse
crime.
- Mas não fui eu... Juro... Só fui lá por
causa da carta anônima que recebi
naquela tarde.
- Que carta é essa?
- Está na minha casa, não sei quem a
enviou, estava assinada "uma amiga",
dizia que se eu desejasse descobrir onde
meu marido passava as noites, fosse
naquela noite às dez horas no endereço
escrito embaixo. Não contive a
curiosidade. Há muito eu me perguntava
isso. Também perguntava a Otávio, mas
em vez de me responder, ele brigava
comigo.
Lágrimas desciam pelas faces de Marília
que torcia as mãos aflitas.
- Quando cheguei lá, a casa estava às
escuras, pensei que não houvesse
ninguém. Mas quando empurrei
levemente a porta, ela abriu. Procurei o
interruptor e acendi a luz. A sala estava
revirada, as gavetas abertas, tiveram
medo e ia me retirar quando vi que no
cômodo da frente havia uma luz fraca. Fui
até lá, o quarto estava iluminado por um
pequeno abajur e eu vi os dois corpos
sobre a cama.
Ela fez ligeira pausa, a lembrança da
trágica cena ainda estava viva em sua
memória. Estava difícil continuar.
Notando o quanto ela estava nervosa, o
delegado apanhou um copo de água e
deu-o a ela:
- Beba. Acalme-se.
Marília apanhou o copo com as mãos
trêmulas e tomou alguns goles.
- Continue...
Ela respirou fundo e prosseguiu:
- Suspeitei que fosse Otávio. Eu estava
muito assustada, mas precisava saber a
verdade. Então, acendi a luz aproximei-
me da cama. O que vi foi horrível, jamais
esquecerei. Os dois corpos em meio aos
lençóis cheios de sangue, quase desmaiei,
foi preciso segurar-me na mesinha ao
lado da cama para não cair. Percebi que
estavam mortos. O medo foi tamanho que
saí correndo. Chovia muito e fiquei
ensopada. Tomei um ônibus e fui para
casa.
- Porque não chamou a polícia? Eles
poderiam ainda estar vivos e terem sido
salvos.
- Não, doutor. O rosto deles estava
petrificado, tenho certeza de que estavam
mortos. Pensei em chamar a polícia, mas
tive medo. Se estivesse vivos eu teria
feito isso, mas do jeito que estavam, de
nada adiantaria. A porta estava aberta e
logo alguém perceberia e avisaria a
polícia.
- Teve medo do quê?
- Eu imaginei que a carta poderia ter sido
uma armadilha do próprio assassino para
incriminar-me. E, infelizmente.
Monteiro passou as mãos pelo queixo
várias vezes, um gesto que fazia sempre
que estava pensando e não respondeu
logo. Marília tomou mais alguns goles de
água, tirou um lenço da bolsa e enxugou
as lágrimas que ainda teimavam em
aflorar.
- Se está dizendo a verdade, a senhora
pode ter razão. Guardou a carta?
- Sim. Está na minha casa.
- Nesse caso, vou mandar alguém buscá-
la. Ela pode ser uma boa pista.
- O senhor estava se referindo às minhas
impressões digitais quando disse ao
telefone que tinha uma pista?
- Também. Mas encontramos outras: a de
Otávio estava por toda parte, porém não
sabemos se as outras eram da mulher.
- O senhor já sabe quem é ela?
- Estamos investigando. Em breve
saberemos. A senhora não sabe mesmo
em que seu marido trabalhava?
- Ele se dizia representante comercial,
mas suspeito que minta.
- Vamos investigar suas conta bancárias.
- Ele não tinha contas em banco.
Costumava pagar as despesas com
dinheiro.
- A senhora está enganada. Ele tinha duas
contas bancárias e suspeitamos até que
mandava dinheiro para o exterior.
Marília admirou-se:
- O senhor tem certeza? Eu nunca vi
nenhum talão de cheques.
- Deve haver muitas coisas que a senhora
não sabe. Ele guardava os talões e outros
documentos na casa onde foi assassinado.
Tudo faz crer que seus negócios eram
suspeitos e operava lá.
- Estou surpresa. Nunca imaginei nada
disso. Ele pagava o aluguel com atraso e
dizia que estava com pouco dinheiro. O
senhor já sabe quanto ele tinha no
banco?
- Ainda não.
- Eu gostaria de saber. Estou sem
dinheiro. Tenho apenas um pouco que
meus pais me deram depois do enterro.
Mas não vai dar para manter a casa mais
do quê um mês, com muita economia.
- É melhor não contar com esse dinheiro
por enquanto. Há fortes suspeitas de que
seu marido se envolvia em negócios
ilícitos e enquanto não for provado o
contrário esse dinheiro não será liberado.
Marília suspirou resignada, depois disse:
- Estou procurado trabalho, mas como
nunca trabalhei não está sendo fácil.
Aceito qualquer coisa.
Monteiro a olhava pensativo. Apesar da
suspeita que pesava sobre ela, ele sentia
que Marília falava a verdade.
- A senhora pode ir agora, mas não se
ausente da cidade. Tem de ficar a
disposição da polícia.
- Está bem, doutor. Se precisar de mim,
sabe onde me encontrar.
Marília deixou a delegacia pensativa.
Vivera dez anos com um homem que lhe
era desconhecido. Não sabia em que
trabalhava, não conhecia seus amigos
nem os lugares que costumava
freqüentar. Como pudera aceitar uma
coisa dessas? Porque continuara vivendo
ao lado de um homem que a maltratava,
que não era bom nem para o próprio
filho?
Quantas vezes chorava desiludida,
aturando as grosserias de Otávio, a sua
indiferença com Altair? Há muito
compreendera que seu amor por ele foi
ilusão. Ele, que durante o namoro
mostrara-se educado e solícito, assim que
se casaram foi demonstrando seu lado
verdadeiro. Mas foi depois que Altair
nasceu que ela teve a certeza de que o
que sentira não foi amor. O homem que
ela imaginava que ele fosse é que
despertara seu interesse e a pensar que o
amava.
Apesar dessa certeza, Marília não teve
coragem de separar-se dele. As poucas
vezes que mencionara isso, provocava
reações tão violentas que teve medo de
tentar. Otávio ameaçava sumir para
sempre, levando Altair, o que a deixava
desesperada. Ela sabia que ele seria
capaz de cumprir a ameaça.
Agora estava livre, mas por outro lado
precisaria trabalhar para manter as
despesas. O dinheiro era pouco, não
podia perder tempo.
Marília chamou Dorita e pediu-lhe que
fosse comprar o jornal. O que ela fez em
seguida. Enquanto esperava ficou se
perguntando que tipo de serviço deveria
procurar. Ela não tinha nenhuma prática,
a não ser nos serviços caseiros.
Quando Dorita voltou, alguns minutos
depois, ela á havia decidido procurar o
que encontrasse dentro de suas
possibilidades. Quanto poderia ganhar em
um emprego desses? Esse era o ponto
mais difícil. O aluguel era caro. Enquanto
morasse naquela casa, teria de pagá-lo.
Apanhou o jornal, abriu-o sobre a mesa,
procurando a seção de empregos, e
começou a ler. Os que encontraram
exigiam experiência comprovada, o que
ela não possuía e o salário inicial não
cobririam o montante de suas despesas.
Depois de ler tudo, fechou o jornal,
desanimada. O que fazer? Mais do que
nunca se arrependeu de não ter pensado
nisso antes. Perdera dez anos de sua vida
naquele casamento infeliz, com medo de
separar-se, agüentar as conseqüências e
não ter como sustentar o filho.
A vida a colocara exatamente na situação
que temera e era preciso enfrentá-la.
- Se ao menos eu soubesse como! Estou
disposta a me esforçar, a fazer qualquer
coisa, mas o quê?
Dorita, vendo-a desanimada, aproximou-
se.
- Não desanime-disse, tentando motivá-
la. - Nós vamos encontrar um jeito.
Marília olhou-a triste:
- Eu preciso encontrar trabalho, mas
nunca trabalhei fora, assim fica difícil.
Não tenho formação profissional. Não sei
como encontrar um emprego.
- Deus não vai nos desamparar.
- Você sabe do pior. O delegado me
chamou para dizer que sou suspeita de
ter matado Otávio e aquela mulher.
Dorita exclamou assustada:
- Que absurdo! De onde ele tirou essa
idéia?
Marília foi até a gaveta da cômoda,
apanhou a carta anônima e mostrou-a
Dorita:
- Por causa disto. Vou contar-lhe tudo.
Em poucas palavras Marília contou por
que fora àquela casa na noite do crime e o
que vira lá. E finalizou:
- Fui ingênua. Talvez o próprio assassino
seja o autor da carta e tenha desejado me
envolver para livrar-se da culpa.
- Há muita gente maldosa neste mundo.
Mas esse delegado, com a experiência
que tem, deve ter percebido que você
jamais seria capaz de cometer um crime
bárbaro como aquele.
- Eu contei ao delegado toda a verdade,
mas não sei se ele acreditou em mim.
Hoje mesmo vai mandar um policial
buscar a carta. Disse que eu não posso
sair da cidade. Como vou arranjar um em
pego sendo suspeita de um crime?
- As pessoas são desconfiadas. Não vai
ser fácil. Teremos de trabalhar por conta
própria.
- Por conta própria? Em quê? Com que
capital? O delegado disse que Otávio
tinha dinheiro no exterior. Ele acha que é
um dinheiro ganho de maneira desonesta
e por esse motivo não vou poder recebê-
lo.
- Teremos de começar com pouco
dinheiro, devagar. Mas para quem tem
vontade de trabalhar, logo ele vai se
multiplicar.
- O dinheiro que ainda nos resta dá
apenas para comer até o fim desse mês.
Você não entende que não temos nada
para começar? O que poderemos fazer?
Dorita pensou um pouco, depois
respondeu:
- As pessoas gostam de comer. Vamos
fazer coisas gostosas e vender. Um pouco
só de dinheiro que temos, dará para
começar.
- Você pensa em fazer comida para
vender?
- Por que não? Coisas gostosas, petiscos.
Sei fazer coisas deliciosas com pouco
dinheiro.
- Ninguém vai querer comprar. As
pessoas fazem na própria casa.
- Qual nada. Muitas adoram comprar tudo
pronto. Se for bem gostoso, vai vender e
muito. Você tem receitas muito gostosa
de salgadinhos, doces que D. Eugênia
ensinou. Até que eu aprendi! Nós fazemos
alguns pratos e eu saio para vencer.
- Tenho receio de gastar dinheiro e não
dar certo.
- Podemos experimentar com um primeiro
prato. Aqueles pães de queijo de D.
Eugênia são deliciosos. Sei fazer
direitinho.
- Os seus ficaram iguais aos da vovó,
melhores do que os meus.
- Então, em vez de ficar esperando um
emprego, vamos começar hoje mesmo.
Ainda temos o queijo que sua mãe trouxe
do interior.
- Tudo bem, vamos experimentar. Você
faz?
Apesar de não acreditar que a sugestão
de Dorita desse certo, o entusiasmo dela
fê-la sentir-se mais animada.
- Enquanto você pensará em uma forma
de embalar.
Marília foi para seu quarto, na gaveta da
cômoda havia uma caixa onde ela
guardava algumas coisas. Abriu-a e
dentre outros objetos havia uma peça de
fita estreita de cetim vermelho. Sorriu
satisfeita. Ela compraria alguns saquinhos
de papel, colocaria os pães de queijo e
amarraria com a fita.
Foi à cozinha, onde Dorita já começara a
trabalhar, e disse-lhe:
- Vou até a papelaria comprar alguns
saquinhos de papel. Quantos você acha
que serão necessários e de que tamanho?
Dorita pensou um pouco, depois disse:
- Estou fazendo duas receitas de pão de
queijo do tamanho que D. Eugênia faz.
Você é boa nas contas.
- Está bem.
Marília saiu e voltou meia hora depois,
trazendo o que precisava. No fim da
tarde, os pães de queijo estavam prontos
empacotados. Dorita sorriu satisfeita:
- Estão lindos!
Marília calculou todas as despesas e fez o
preço. Depois perguntou:
- O que vamos fazer agora para vendê-
los?
- Deixe comigo. Amanhã eu vou sair
depois do almoço e tentar vendê-los.
Apesar de Marília não acreditar que esse
tipo de negócio desse resultado, sentia-se
satisfeita por ter se ocupado e esquecido
pelo menos por algumas horas a
insegurança daquele momento.
No fim da tarde do dia seguinte Dorita
voltou e colocou nas mãos de Marília
várias notas e algumas moedas.
- Vendi tudo!- disse triunfante-Se tivesse
mais teria vendido. Fui a um salão de
beleza, perto da casa da D. Rute, estava
lotado e vendi tudo. As pessoas gostaram
e algumas encomendaram para próxima
semana.
- Que bom! Não pensei que conseguisse
tão rápido.
- A Cleide, dona do salão, disse que eu
poderia passar lá todas as tardes para
levar salgadinhos.
- Estou começando a acreditar que pode
dar certo!
- Claro que pode. Vou experimentar
outras receitas e vamos ter variedades.
- Eu sei fazer algumas coisas deliciosas
que aprendi com a minha vó.
- Eu pensei em fazer para amanhã
empadinhas de palmito. O que acha?
- Faça isso. Eu vou ver meu livro de
receitas e escolher algo para fazer
também. Se o dinheiro que ganharmos
não der para todas as despesas, pode ser
suficiente para nossa alimentação.
- Do jeito que vi hoje, se trabalharmos
bem, pode ser suficiente para muito mais.
As duas continuaram conversando,
fazendo planos para o futuro. Marília
sentia-se encorajada e disposta a
esforçar-se ao máximo para que essa
primeira experiência desse certo".

"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 03
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Dias depois, Marília estava atarefada,
ajudando Dorita a fazer pão de queijo.
Haviam recebido uma encomenda grande
de uma freguesa do salão de beleza, para
a festa de aniversário de seu filho que
completaria dez anos e adorava pão de
queijo.
O telefone tocou e Marília atendeu:
- É o delegado Monteiro. Preciso que você
venha hoje à delegacia.
- O senhor descobriu o assassino do meu
marido?
- Estamos investigando. A senhora dever
estar aqui às duas horas.
Marília pensou um pouco, depois
respondeu:
- Está bem.
Depois que desligou o telefone ficou
pensativa. O que o delegado queria com
ela?
Se não encontrou o assassino, talvez
tivesse descoberto alguma pista.
Olhou o relógio, eram onze horas. Teria
tempo para ajudar Dorita mais um pouco.
Voltou à cozinha.
- Dorita, o delegado quer que eu vá à
delegacia hoje, às duas horas.
- Logo hoje que temos esta encomenda ...
Não dá para transferir para amanhã?
- Não. Ele estava com uma voz firme,
notei que tem pressa. Ainda temos
tempo. Só vou sair à uma e meia. Vou
explicar-lhe nossa situação e pedir-lhe
que me libere logo.
Às duas horas da tarde, Marília entrou na
delegacia e foi imediatamente conduzida
à sala do Dr. Monteiro. Depois dos
cumprimentos, ele fê-la sentar em frente
a sua mesa.
- O que deseja de mim?- indagou ela.
Monteiro fixou-a sério, estudando as
reações do rosto dela, disse:
- Descobrimos que é a mulher que estava
com seu marido. Trata-se de Teresa
Borges de Azevedo, esposa de um
empresário muito rico. Ela morava com a
família no Rio de Janeiro. A senhora a
conhecia?
Marília meneou a cabeça negativamente.
- Nunca ouvi falar nela.
- Tem certeza?
- Tenho. Como já lhe disse meu marido
nunca falava de suas amizades.
- Procure lembrar-se. Ela tinha sessenta
anos, mais de trinta de casamento, dois
filhos moços.
- É estranho que essa senhora tenha
deixado a família para morrer aqui, ao
lado do meu marido. Não entendo. Apesar
de tê-los visto juntos na cama, custo a
crer que ele estivesse procurando uma
mulher tão mais velha para relacionar-se.
- Esse fato é estranho mesmo, além do
que o marido acreditava que ela estivesse
descansando na Europa. Ficou chocado.
Veio imediatamente para São Paulo,
reconheceu o corpo hoje pela manhã. Eu
tinha esperança de que a senhora
pudesse me dizer alguma coisa a mais.
- Doutor, eu já lhe disse tudo o que sabia.
Meu marido era um homem cheio de
mistérios.
- Vou interrogar novamente os pais dele.
Talvez conheçam a mulher.
- Não creio. Otávio não se abria com os
pais. Eles não se relacionavam muito
bem.
- Mesmo assim, vou tentar.
- O que mais o senhor deseja de mim?
Como sabe. Fiquei sem dinheiro, então,
eu e Dorita estamos fazendo quitutes
para vender. É como pensamos
sobreviver, uma vez que nunca trabalhei
e não tenho experiência para conseguir
emprego. Hoje estamos com uma
encomenda grande e eu gostaria de
voltar logo para casa.
- Não posso liberá-la ainda. O marido de
Teresa vai chegar dentro de meia hora,
desejo conversar com vocês dois, juntos.
- Não sei como isso poderá ajudá-lo nas
investigações. Eu se quer o conheço!
- Precisa colaborar com as investigações.
Lembre-se de que enquanto não
encontrarmos o assassino, a senhora
continua sendo suspeita de haver
cometido esse crime.
Marília suspirou triste e respondeu:
- Está bem, doutor. Tenho todo o
interesse me colaborar.
Alguns minutos depois um policial entrou
e disse que o marido de Teresa havia
chegado.
- Mande-o entrar-ordenou o delegado.
Um homem alto, forte, cabelos castanhos,
um pouco grisalhos, bem vestido entrou.
Tinha o rosto moreno e olhos penetrantes
que se fixaram curiosos em Marília.
Depois de cumprimentá-lo, Monteiro
disse:
- Está é D. Marília, viúva de Otávio de
Oliveira, morto com sua esposa.
Ele estendeu a mão que Marília apertou e
disse:
- Alberto de Azevedo.
- Marilia Marques de Oliveira.
- Sente-se, Sr. Azevedo e diga-me:
conhecia Otávio de Oliveira?
- Não senhor.
- Nem sua esposa?
Ele meneou a cabeça negativamente,
parecia emocionado e nervoso.
- Não. Não consigo entender o que está
acontecendo. Custo a crer que Teresa
tenha tido uma relação intima com aquele
senhor. Estávamos casados há mais de
trinta anos e minha mulher sempre foi
muito correta.
- Mas é verdade. Ela foi encontrada na
cama com Otávio, seminua. Não dá para
negar este fato.
- Mesmo assim, custo a crer. Nós temos
dois filhos moços. Osmar de trinta e dois
anos e Vitório de vinte e nove. Ela sempre
foi muito dedicada à família. Eu vim para
cá sem acreditar que o corpo da mulher
assassinada fosse dela. Liguei para a
Itália onde ela deveria estar, mas me
disseram que Teresa nunca estivera lá.
Isso me assustou. Mas mesmo assim,
duvidei. Tanto que até agora não contei
nada aos meus filhos. Nem sei como dar-
lhes essa notícia.
- Ela viajou para a Europa sozinha?
- Com uma amiga. Nos últimos tempos,
Teresa andava deprimida, os médicos
aconselharam que ela saísse da rotina,
fizesse uma viagem, fosse fazer compras,
as mulheres gostam dessas coisas... Eu
não pude acompanhá-la. Tenho negócios
importantes em andamento e naquele
momento não dava para viajar.
Então ela encontrou uma amiga dos
tempos de faculdade que estava viúva e
concordou em ir com ela.
- O senhor conhecia bem essa amiga?
- Não. Teresa me apresentou pouco antes
de viajarem. Chama-se Elvira.
- È só isso que sabe sobre ela?
- Sim. Como eu lhe disse elas foram
colegas de faculdade. Teresa fazia
filosofia e Elvira, letras.
- Precisamos encontrar essa mulher. Ela
deve saber o que pode ter acontecido. É
provável que essa viagem nunca tenha se
realizado.
- O que me diz é um absurdo. Teresa não
ia me enganar desse jeito.
- Nós temos fatos, não suposições. Se
quisermos descobrir o assassino,
precisamos investigar todas as hipóteses.
Alberto tirou um lenço do bolso e
enxugou o suor do rosto. Estava
visivelmente nervoso e abatido.
Marília, que esperava ser esclarecida por
ele, não se conteve:
- Não consigo entender. Essa senhora era
muito mais velha do que Otávio. Se não
tivesse visto os dois juntos naquela cama,
seria difícil acreditar.
Alberto fitou-a sério e indagou:
- A senhora conhecia minha esposa?
- Não. Nunca a vi antes. Não sabia sequer
seu nome.
Alberto virou-se para o delegado:
- Está vendo doutor? Este caso está muito
estranho. Eu poderia jurar que minha
esposa nunca foi amante desse homem.
O delegado passou a mão pela testa. De
fato, apesar das aparências, era mais
misterioso do que parecera à primeira
vista.
Marilia remexeu-se na cadeira inquieta:
- O senhor conseguiu alguma pista sobre
a carta anônima?
- Por enquanto apenas suas impressões
digitais, o que deixa apenas duas
hipóteses: ou a senhora forjou aquela
carta ou a pessoa teria usado luvas.
- Eu não forjei nada. Como poderia se não
conhecia aquele endereço? Está claro que
a pessoa usou luvas.
- Como eu lhe disse, há duas hipóteses e
a senhora continua como suspeita.
Marília levantou-se indignada:
- O senhor acha que eu, uma mulher
franzina, poderia ter lutado à faca com os
dois e tê-los vencido? Sempre agüentei a
violência de Otávio porque ele era mais
forte e eu não tinha nenhuma chance.
- Por favor, sente-se D. Marília. Ainda não
tenho provas definitivas.
- para mim, quem matou os dois foi à
pessoa que escreveu aquela carta e
desejou incriminar-me.
Ela sentou-se novamente e Monteiro
perguntou para Alberto:
- O senhor sabe pelo menos o endereço
da amiga de sua mulher?
- Não. Teresa me disse que ela morava no
Flamengo. Não me deu o endereço.
- Não desconfiou de nada? Sua esposa vai
viajar com uma desconhecida e o senhor
não anotou sequer seu endereço? E se
fosse uma pessoa suspeita?
- Minha esposa nunca se relacionou com
pessoas suspeitas. Eu não tinha porque
desconfiar de Elvira. Teresa era muito
cuidadosa ao escolher suas amizades.
Monteiro suspirou desanimado. Apesar de
eles continuarem investigando
meticulosamente, ainda não tinham
encontrado nenhuma pista. Na tentativa
de encontrar alguma coisa a mais ele
determinou:
- Quero os dados de seus filhos.
- Para quê? Eles não sabem de nada.
- Vou intimá-los. Preciso do depoimento
deles.
- Eu ainda não tive coragem de contar-
lhes nada.
- Faça isso o quanto antes. Os jornais de
amanhã certamente vão noticiar o nome e
a foto de sua mulher e eles saberão de
qualquer jeito. Não dá para ignorar um
crime!
Alberto passou a mão pelos cabelos,
aflito. Depois disse nervoso:
- É...não vou poder evitar.
- O senhor deseja mais alguma coisa de
mim? - perguntou Marília.
- Por que pergunta?
- Tenho muito trabalho ainda para fazer
hoje.
- Pode ir, mas não saia da cidade. Posso
precisar da sua presença.
Marília levantou-se apressada. O
ambiente da delegacia a deprimia, a
presença do viúvo de Teresa também.
Durante o trajeto de volta para casa,
Marília não conseguia esquecer as
palavras de Alberto. Que Teresa havia
sido amante de Otávio era evidente, mas
desde quando isso acontecia? Alberto
dissera a verdade? Se ele fosse o
assassino e autor da carta anônima iria
negar que suspeitava de sua mulher.
Deveria sentir-se muito confortável
ouvindo o delegado dizer claramente que
ela, Marília, era suspeita. A carta tivera
essa finalidade.
Esse pensamento deixava-a nervosa.
Teria sido melhor que ela tivesse
ignorado a carta, porém a curiosidade foi
mais forte.
Ao chegar a casa, Marília encontrou
Dorita atarefada com a encomenda, lavou
as mãos e tratou de ajudá-la. Quando ela
perguntou o que o delegado queria,
Marília disse apenas:
- Depois que terminarmos contarei tudo
detalhadamente. Agora quero esquecer
esse assunto.
As duas entregaram-se ao trabalho com
vontade.
Depois de dar ao delegado o nome
completo e o endereço de seus filhos,
Alberto deixou a delegacia. Sua cabeça
doía, estava nervoso e aflito. Parou em
uma farmácia, comprou alguns
comprimidos, tomou logo dois. Se ao
menos a dor de cabeça melhorasse, talvez
ele encontrasse as palavras que
pudessem atenuar um pouco a realidade
para dar a notícia aos filhos.
Mas era inútil. A verdade era trágica e ele
não conseguia raciocinar claramente.
Parecia estar vivendo um pesadelo e dali
a pouco iria acordar e verificar que nada
havia acontecido.
Chegou ao hotel e o atordoamento
continuava. Sentou-se no quarto,
tentando tomar coragem. Para qual dos
dois ligaria? Pensou em falar primeiro
com Osmar. Ele era mais equilibrado do
que Vitório.
Respirou fundo, tomou coragem, ligou
para sua empresa e pediu para chamar o
filho. Seu coração batia descompassado e
sua voz estava um tanto apagada quando
ele atendeu:
- Pai? O que aconteceu? Você está
doente? Sua voz está diferente.
- As notícias não são boas e estou me
esforçando para contar a você.
- O que você foi fazer em São Paulo?
Porque saiu sem nos avisar?
- Fui intimado pela polícia para vir
reconhecer o corpo de uma mulher que foi
assassinada em circunstâncias
misteriosas. Eles suspeitavam que fosse
de sua mãe.
- Que loucura é essa? Mamãe não está de
férias na Europa?
- É o que todos nós pensávamos. Mas
quando cheguei aqui, tive a maior
surpresa...
A voz dele morreu na garganta e Osmar
falou assustado:
- Pai, fale logo, estou assustado. Você a
reconheceu?
- Infelizmente. O corpo era de sua mãe.
Osmar ficou silencioso por alguns
segundos.
Depois disse:
- Você deve ter se confundido. Talvez seja
apenas parecida.
- Não, meu filho. É ela. Eu reconheci o
corpo.
- Custo a crer!
- Mas é verdade. A polícia pretende
intimar você e seu irmão. Prepare-se para
vir a São Paulo.
- Mas pai, a empresa não pode ficar
abandonada. Você sabe que ninguém tem
competência para ficar em meu lugar.
- Não tem como evitar. E você terá de dar
a notícia a Vitório, eu não tenho coragem.
Sabe como ele era agarrado a ela.
- Ele vai dar trabalho. Não tenho
paciência. É melhor você mesmo falar
com ele.
- Nada disso. Faça-me esse favor. Fale
com ele e trate de recomendar ao Inácio
que cuide de tudo na empresa durante
sua ausência. Vocês fazem o depoimento
e vão embora.
- Em vez de procurar o assassino, esse
delegado está perdendo tempo querendo
nos interrogar. Nós não sabemos de nada.
- Foi o que eu disse a ele. Mas não
consegui nada. Vocês terão de vir. Mas
penso que poderão ir logo embora.
Quanto a mim, terei de ficar pelo menos
até que liberem o corpo. Então, o levarei
ao Rio para sepultá-lo.
- Isso não parece verdade.
- Mas é. Infelizmente. Estou com muita
dor de cabeça, tomei comprimido e desejo
me deitar para ver se passa. Não se
esqueça de falar com Vitório.
Osmar suspirou resignado. Ele não
suportava o modo de ser do irmão. Muitas
vezes recriminara a mãe,
responsabilizando-a pelo excesso de
sensibilidade de Vitório.
Desde pequeno ela fazia diferença entre
os dois. Com ele era mais dura, direta,
exigente; com Vitório tolerava suas crises
nervosas, dizendo que ele era muito
sensível e precisava apoiá-lo.
Osmar muitas vezes reclamara para o pai,
dizendo que o irmão precisava de mais
disciplina. Acreditava que ele estava
fingindo e que se lhe dessem uma boa
surra sua sensibilidade acabaria.
Mas como a mãe era irredutível e seu pai
fazia-lhe todas as vontades, ele não
conseguia o que desejava. Há muito
tempo os dois não mantinham um bom
relacionamento. Eles conversavam
apenas o indispensável.
Teresa sentia-se triste. Gostaria que tudo
fosse diferente,
mas se conformara, percebendo que
ambos eram muito diferentes e que o fato
de não estreitarem a amizade evitava que
os desentendimentos se repetissem como
quando eram adolescentes.
Osmar desligou o telefone e resolveu ir
embora. Estava escurecendo quando
chegou a casa. Deixou o carro na entrada
para que o caseiro o guardasse.
Era uma casa imensa, rodeada de árvores
e um jardim muito bem cuidado que a
cercava por todos os lados.
Indiferente à beleza do lugar, Osmar
entrou e rapidamente subiu até o quarto
do irmão. Ao chegar diante da porta, leu o
aviso pendurado na maçaneta: "Estou
ocupado. Não bata, não entre".
Irritado, ele arrancou o aviso e girou a
maçaneta. A porta estava trancada por
dentro. Bateu várias vezes, com força, o
que fez com que a governanta aparecesse
e dissesse:
- Você não leu o aviso?
Osmar fulminou-a com o olhar e mão
respondeu.
- O que deu em você? - continuou ela,
aproximando-se. - Seu irmão está
fazendo meditação e não pode ser
interrompido.
Apesar de irritado, Osmar não se atrevia
a reagir. Ela fora criada de sua mãe desde
o tempo de solteira, ajudara a criá-los
com bondade e firmeza, mas com Vitório,
ela também era tolerante, protegendo-o
sempre quando ele queria brigar com o
irmão.
- Aconteceu uma tragédia horrível. Não
posso esperar o Vitório querer me
atender.
- O que foi? - a indagou, olhando-o
preocupada.
- Papai ligou contando uma história que
custo a acreditar. Você sabia o que ele foi
fazer em São Paulo?
- Sabia.
- Ele disse que o corpo da mulher
assassinada era o de minha mãe.
Dinda segurou-se na maçaneta da porta
para não cair. Seu rosto estava pálido
quando ela disse:
- Era ela mesma?
- Era. Papai não quis nem falar com
Vitório. Estava chocado e passando mal. O
delegado vai nos intimar e preciso falar
com ele já.
A maçaneta rolou e Dinda apoiou-se na
parede. Suas pernas tremiam. Vitório
apareceu na fresta da porta.
- Por que você se fecha desse jeito?
Aconteceu uma desgraça e nós vamos ter
de ir a São Paulo.
Vitório estava pálido.
Olhou o rosto de Dinda e abraçou-a com
força.
- Dinda, diga que é mentira o que estou
pensando!
Ela chorava em seus braços e não
conseguia falar. Osmar olhou-os com
raiva e atirou as palavras sobre eles:
- Mamãe está morta. Foi assassinada em
São Paulo. O delegado vai nos intimar. É
bom parar com isso. Chorar não vai trazer
mamãe de volta. Seja homem ao menos
uma vez na vida.
Ele afastou-se irritado, enquanto Dinda e
Vitório, abraçados, continuavam
soluçando. Depois, entraram no quarto e
fecharam à porta. Quando conseguiu
falar, Vitório disse:
- Então era isso! Eu implorei para que ela
não fizesse aquela viagem. Eu sabia que
se ela fosse alguma coisa terrível
aconteceria. Mas ela estava determinada.
Desta vez não quis me ouvir!
- Estava marcado para acontecer. Você
sentiu.
- Não me conformo. Por que ela não me
ouviu?
Dinda abraçou-o, tentando controlar-se.
Precisava dar força a ele. Ficaram assim,
abraçados, sentindo uma imensa dor no
coração".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO



CAPÍTULO 4
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Eram dez horas da manhã seguinte
quando Osmar e Vitório chegaram ao
hotel onde o pai estava hospedado.
Bateram à porta do quarto e Alberto
abriu. Estava abatido e nervoso. Os dois
rapazes o abraçaram e Osmar disse:
- E então, como estão as coisas?
Alberto suspirou triste e respondeu:
- Do mesmo jeito. A polícia ainda não
liberou o corpo. Vocês já receberam a
intimação?
- Não. Achei melhor não esperar que ela
chegasse. Depois, desejei ver tudo de
perto. Ainda não acredito que esse corpo
seja de mamãe.
Vitório, que se conservara calado,
interveio:
- É ela. Eu tive um pressentimento de que
ela não deveria fazer essa viagem,
implorei para que não fosse. Ela, porém,
estava determinada e não quis ouvir-me.
- Lá vem você com suas loucuras. O
assunto é sério. Não é hora para você
fazer seu show.
- Vitório está certo. Aquele corpo é o dela.
Não há como duvidar.
Alberto hesitou um pouco, depois
continuou:
- Vou ligar para o delegado e perguntar
quando vocês devem se apresentar na
delegacia.
- É bom pai, porque preciso voltar à
empresa o mais breve possível. Tenciono
falar com ele o quanto antes e voltar
ainda hoje para o Rio de Janeiro.
Alberto ligou para a delegacia, conversou
com Monteiro que marcou para eles
estarem lá dali uma hora.
- Antes de ir, preciso contar-lhes o que se
sabe sobre o crime. Apesar das
aparências, não creio em nada do que a
polícia diz, mas certos fatos inexplicáveis
ferem a honra de sua mãe e de todos nós.
Vitório não se conteve:
- Mamãe sempre foi uma mulher
maravilhosa, de sentimentos nobres.
- É o que eu penso, meu filho. Mas o fato
existe e precisamos enfrentá-lo. Ao lado
do corpo de sua mãe, foi encontrado
morto um homem, e a polícia acredita que
ele era seu amante.
- Isso não pode ser! Ela não se atreveria a
fazer uma coisa dessas! - disse Osmar
pálido.
- É mentira! - gritou Vitório indignado.
Alberto suspirou triste.
- Ninguém mais do que eu lamenta o que
aconteceu. Mas como explicar o fato de
estarem ambos, lado a lado, na cama,
mortos?
- Ela estava deitada na cama com outro
homem? - perguntou Osmar indignado.
- Sim - balbuciou Alberto com um fio de
voz.
- Ninguém pode saber disso! - tornou
Osmar, bastante assustado.
- Infelizmente não pude evitar. Deve
estar tudo relatado nos jornais de hoje.
Não tive coragem de comprar nenhum.
- Como não? Você precisava ter impedido
isso de qualquer jeito.
- Como?
- Oferecendo dinheiro.
- Impossível. Os jornalistas estavam no
necrotério e na delegacia como ratos,
farejando as notícias. Fotografaram tudo.
Não havia como impedi-los. Nossa
imprensa é livre.
Osmar não se conformava:
- É uma vergonha, pai. Como vamos
enfrentar nossos amigos e clientes?
Tenho vontade de não voltar mais para
casa.
- Mamãe é inocente, tenho certeza - disse
Vitório.
- Vou ficar aqui, investigar esses fatos e
descobrir a verdade. Não posso permitir
que o nome de mamãe seja jogado na
lama.
Osmar olhou para o irmão com desprezo:
- Eles foram encontrados juntos na cama.
Não dá para duvidar. Nunca imaginei que
mamãe fosse tão leviana.
- Não fale assim, meu filho. Essa história
está mal contada. Vitório está certo. Com
o tempo, a polícia vai descobrir o
assassino e inocentar Teresa.
- Eu estou indignado. Gostaria que o chão
me engolisse. Vou precisar de muita
coragem para voltar ao Rio. Vou pensar
em um jeito de vencer essa desgraça.
Alberto olhou para Osmar angustiado.
Apesar de confiar em Teresa, havia
momentos em que ele também fraquejava
e suspeitava de que ela de fato tivera um
amante.
Alberto passou a mão nos cabelos como
que querendo espantar os maus
pensamentos, respirou fundo em busca
de força para continuar e disse:
- É melhor vocês irem para a delegacia.
- Quanto antes eu me livrar dessa
formalidade, melhor - considerou Osmar.
Eles chegaram na delegacia meia hora
antes da hora combinada, tiveram de
esperar que Monteiro voltasse do almoço.
- Eu quero ver o corpo da mamãe.
- Pois eu prefiro não ver. Para quê? Ela já
morreu mesmo - disse Osmar.
- Eu preciso ver - pediu Vitório a um
policial que estava ao lado deles.
- Só o delegado pode autorizar -
respondeu ele.
Pouco depois, Monteiro chegou, eles se
apresentaram e depois de cumprimentá-
los o delegado tornou:
- Aguardem um momento. Já vou chamá-
los.
Eles sentaram-se novamente um tanto
impacientes. Dez minutos depois, um
policial pediu a Osmar que entrasse na
sala.
Vitório insistia, queria pedir ao delegado
para ver o corpo da mãe, ao que o policial
respondeu:
- O Dr. Monteiro pediu para entrar um de
cada vez. Espere um pouco mais.
Monteiro pediu que Osmar se sentasse,
esperou que ele confirmasse os dados
pessoais e depois começou a interrogá-lo:
- O senhor sabia que sua mãe estava em
São Paulo?
- Não. Ela saiu de casa dizendo que iria
para a Europa com uma amiga. Pensei
que ela estivesse lá.
- Você conhecia Elvira?
- Quem é essa mulher?
- Amiga de Teresa em cuja companhia ela
saiu de casa para essa viagem.
- Nunca ouvi falar dela.
- Sua mãe costumava ter amigas sem que
a família soubesse?
- Até então eu acreditava que não. Mas
não conheço essa Elvira.
- Sua mãe foi encontrada morta, ao lado
de um homem, ambos na cama, em trajes
menores. Foram mortos a golpes de faca.
Osmar remexeu-se na cadeira e parecia
controlado. O delegado sentiu que seria
difícil extrair alguma coisa dele e tentou
provocá-lo, falando com certa malícia.
Mas ele não se alterou.
- O senhor parece estar falando de outra
pessoa. Minha mãe nunca faria uma coisa
dessas.
- Que outra explicação teria para esses
fatos?
Osmar respondeu:
- Não sei.
Monteiro olhou fixamente nos olhos dele
querendo penetrar-lhe os pensamentos.
Mas Osmar não parecia tenso, o que era
inesperado. Afinal, sua mãe fora
brutalmente assassinada e estava sendo
considerada adultera.
- O que pensa que pode ter acontecido?
Suspeita de alguém? Algum antigo
empregado ou conhecido da família?
- Minha mãe sempre foi uma mulher
disciplinada. Costumava selecionar muito
bem suas amizades. Esse acontecimento
nos surpreendeu muito.
Ela saiu para umas férias na Europa,
estava um pouco cansada, só isso. Ainda
estou tentando aceitar o que nos
disseram. Não tenho nenhuma opinião
sobre o fato. Aliás, eu vim esperando que
o senhor me dissesse alguma coisa que
pudesse nos dar pelo menos uma pista
sobre o crime. Esse é um assunto que
compete a policia resolver.
- Por enquanto não temos nenhuma pista.
Estamos colhendo informações, buscando
os motivos do crime e os possíveis
suspeitos. O senhor não respondeu ao
que lhe perguntei. Não suspeita de
alguém, algum empregado que foi
despedido ou algum parente insatisfeito?
- Não. Sempre fomos educados e tivemos
bom relacionamento com as pessoas que
trabalham ou trabalharam conosco.
Temos poucos parentes, que residem
longe e com os quais apenas mantemos
relações ocasionais.
Monteiro suspirou. Seria inútil continuar o
interrogatório com ele.
Osmar tornou:
- Eu já lhe disse tudo o que sabia. Se o
senhor já terminou preciso ir embora.
Pretendo voltar a minha cidade o quanto
antes. Não posso ficar tanto tempo fora
da empresa.
- Não vai assistir ao enterro de sua mãe?
- Claro que vou. Assim que o corpo for
liberado, papai o levará para o Rio de
Janeiro, ela será enterrada no túmulo da
família. Ele vai ficar aqui para tomar as
providências necessárias.
- Eu ainda posso precisar do senhor.
Novos fatos poderão ocorrer.
- Nesse caso, virei novamente.
- Como era o relacionamento de seus
pais?
Pela primeira vez Osmar demonstrou
alguma contrariedade. Aquele delegado
estava sendo impertinente. Procurou
controlar-se:
- O que isso tem a ver com o crime?
- Pode ter muito. E então?
- Eles tinham um bom relacionamento.
Meu pai sempre foi um marido atencioso e
presente.
- Eles nunca discutiam?
- Não. Eles conversavam. Sempre foram
educados e discretos.
- Não se esqueça de que sua mãe estava
em trajes menores ao lado de um homem
mais novo do que seu pai. Ele pode ter
descoberto tudo e praticado o crime.
Osmar levantou-se indignado:
- Apesar de tudo, meu pai não acredita
que mamãe tenha sido amante daquele
homem. Ela sempre foi uma mulher
honesta. O senhor não pode falar assim
dela.
- Sente-se Sr. Osmar. Não conheci sua
mãe nem sua família para poder acreditar
no que está dizendo. O que tenho de
verdade são os fatos e estes falam por si.
Osmar estava pálido, esforçava-se para
controlar a raiva. O delegado sentia que
estava conseguindo chegar onde queria.
Continuou:
- Até prova em contrário, Teresa era
amante daquele homem e qualquer um de
sua família está sob suspeita.
- Isso é um absurdo. Meu pai nunca faria
isso.
- Um marido traído tem motivo suficiente
para perder a cabeça. Um filho moralista
ou querendo evitar que o pai descubra
também pode cometer um crime.
- O senhor está supondo errado. Quando
aconteceu o crime estávamos longe
daqui. Minha mãe era uma mulher rica,
gostava de jóias. Pode ter sido um
assalto.
- Não creio. Segundo os peritos eles
foram surpreendidos na cama pelo
assassino ou os assassinos e mortos ali
mesmo.
- Pode ter sido mais de um?
- Não estou certo. Mas é provável. Tudo
deve ter acontecido muito rápido.
Naturalmente, eles não esperavam ser
surpreendidos.
Aquilo tudo parecia um pesadelo e Osmar
não via a hora de sair dali, respirar um ar
mais leve. O delegado continuou:
- Por enquanto estou satisfeito. Depois de
reconhecer o corpo pode ir. Se eu
precisar, o intimarei novamente.
Osmar levantou-se e saiu. Na ante-sala
viu o irmão, olhos vermelhos, rosto
pálido. Aproximou-se dele:
- Veja lá o que vai dizer ao delegado.
Quanto menos falar melhor.
Vitório não teve tempo de responder. Um
policial aproximou-se e disse:
- Pode vir comigo.
Vitório acompanhou o policial. Em
seguida, Osmar foi abordado por outro
que o acompanhou até o necrotério, que
ficava próximo a delegacia e onde estava
o corpo. Uma vez lá, disse logo:
- É minha mãe.
Estava com pressa de sair daquele lugar
horrível. Mas foi forçado a olhar o rosto
da mulher e dizer que a conhecia.
O policial o dispensou depois de anotar o
que ele dissera e Osmar voltou ao hotel.
Vitório entrou na sala do delegado
ansioso:
- Doutor, antes de qualquer coisa eu
quero ver o corpo de minha mãe!
- Sente-se rapaz. Antes, vamos conversar
um pouco. Você está nervoso. Quer um
copo d água?
- Obrigado, não é preciso. Não me
conformo com a morte de minha mãe. Dói
saber que alguém a matou de um modo
tão cruel.
Vitório a custo tentava reter as lágrimas.
- Compreendo. Você sentiu muito a morte
dela.
- Mamãe era tudo para mim. Custo a crer
que ela esteja morta. Por esse motivo,
preciso ver o corpo. Meu pai pode ter se
confundido... Ser alguém muito parecida.
- Infelizmente, o corpo é dela. Não há
engano.
- Nesse caso eu quero olhar para ter
certeza.
- Quando sair daqui poderá vê-lo. Antes,
quero que me responda algumas
perguntas.
Depois de pedir que ele desse seus dados
completos ao escrevente, o delegado
continuou:
- Como era o relacionamento de sua mãe
em casa?
- Ela era uma dona de casa perfeita. Com
ela tudo andava sempre bem.
- Tinha um bom relacionamento com seu
pai?
- Mamãe sempre foi muito discreta. Não
gostava de falar de seus sentimentos
íntimos. Com papai era atenciosa, cortês,
assim como com meu irmão. Apenas
comigo ela se permitia demonstrar seu
afeto.
- Por que ela fazia essa diferença?
- Sempre tivemos muita afinidade. Eu
também sempre fui muito ligado a ela.
Como sou muito sensível e tenho a saúde
mais delicada, talvez, por esse motivo,
ela tenha se aproximado mais de mim.
Monteiro olhou fixamente nos olhos de
Vitório como a querer penetrar em seus
mais íntimos pensamentos. Suspeitava
que talvez ele soubesse mais sobre
Teresa do que os outros.
- E com seu pai, como é o seu
relacionamento?
- Apenas educado. Nunca tivemos
nenhuma afinidade. Sempre fui muito
sensível e ele não aceita isso. Diz sempre
que um homem deve ser forte. Culpava
mamãe por eu ser tão emotivo, ela,
porém, entendia-me. Percebia meus
sentimentos e procurava apoiar-me.
- Ele achava que você era mimado?
- Talvez. Mas isso não é verdade. Sempre
que eu cometia um erro, ela não deixava
passar. Conversava comigo, chamando-
me à responsabilidade.
_ Seu pai relacionava-se bem com
Osmar?
_ Muito. Ele sempre foi o preferido. Os
dois saíam juntos, conversavam muito e
Osmar fazia-lhe todas as vontades. Tanto
que até hoje trabalham juntos.
_ Seu irmão parece que é muito
controlado. Apesar do que aconteceu,
mostrou-se calmo.
_ Ele não se emociona com facilidade. Não
sei como pode controlar-se tanto.
_ Seu pai também é assim?
_ Ele teve uma educação muito rígida.
Minha avó o criou sem agrados e foi muito
exigente em matéria de comportamento.
Ele considera as emoções como fraqueza
e empenha-se em dominá-las. Não quer
parecer um fraco. Por esse motivo irrita-
se tanto quando expresso minhas
emoções.
_ Seu pai disse que nos últimos tempos
sua mãe estava com depressão. Foi por
essa razão que ela decidiu viajar para a
Europa com uma amiga?
_ Eu implorei a ela que desistisse dessa
viagem...
_ Não. Eu sentia que ela precisava de
outras coisas.
_ Que coisas?
Ele notou que tinha falado demais e
tentou dissimular;
_ Um lugar calmo, no campo talvez, onde
pudesse retomar a simplicidade e serenar
a alma...
_ Teria sido esse o motivo de ela haver
preferido vir São Paulo a ir para a Itália,
conforme havia combinado?
_ Não sei o que teria feito mudar de idéia.
Quando lhe pedi que não fizesse essa
viagem ela disse que não podia de forma
alguma deixar de ir.
_ O que você temia?
_ Eu estava com um triste
pressentimento. De vez em quando eu
tenho isso e quase sempre o que eu temo
acontece. Eu sentia uma angústia muito
grande quando pensava que ela faria essa
viagem, mas como não posso dizer por
quê.
_ Esse seu pressentimento, infelizmente,
realizou-se.
Ela viajou em companhia de Elvira, uma
amiga dos tempos de faculdade. Você a
conhece?
_ Não. Ela nunca foi a nossa casa.
_ Não achou estranho sua mãe de
repente, aparecer com uma amiga e irem
viajar juntas para a Europa?
_ Eu estava muito angustiado e achei
essa viagem precipitada e estranha.
_ Por que precipitada?
_ Porque ela só me falou nela dois dias
antes de ir. Não era esse seu costume.
Quando viajávamos, ela costumava
programar com antecedência, checar
todos os detalhes, principalmente quando
era para sair do país.
_ Dessa vez então foi diferente?
_ Foi e isso só aumentou meu receio de
que iria acontecer alguma coisa ruim.
_ Você suspeita de alguém que possa ter
cometido o crime? Um empregado
despedido, alguém insatisfeito, alguma
pessoa que tenha se desentendido com
ela?
Vitório pensou um pouco, depois
respondeu:
_ Não. Mamãe sempre tratou bem nossos
empregados, as pessoas em geral. Nunca
soube de alguém que nos odiasse a ponto
de cometer esse crime.
_ Por hoje chega. Estamos procurando
pistas e por mais insignificante que possa
lhe parecer algum acontecimento, é
melhor nos contar. Pode ser o fio da
meada para descobrirmos tudo.
_ Não me lembro de nada.
_ Se você se lembrar de alguma coisa,
pode nos ligar a qualquer hora.
O delegado chamou um policial e pediu
que encaminhasse Vitório até o necrotério
onde estava o corpo.
Depois, o delegado foi se encontrar como
legista para conhecer mais detalhes sobre
a autópsia dos corpos.
Vitório estava trêmulo quando entrou no
necrotério. Indiferente ao que se passava
com ele, o policial levou-o até onde o
corpo estava, abriu a gaveta e Vitório
olhou para o rosto da mulher que estava
lá. Depois, sua voz saiu com dificuldade,
mas ele quase gritou:
_ Eu estava enganado! Não disse? Essa
não é minha mãe!
O policial olhou-o atônito, perdeu o ar de
indiferença que mantinha e retrucou:
_ Vamos ver o nome: está escrito aqui, no
cartão da gaveta: Teresa Borges de
Azevedo.
_ Você está enganado. Essa não é minha
mãe!" "ONDE ESTÁ
TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 5
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"O policial olhou para Vitório incrédulo:
_ Não pode ser! Olhe bem. Duas pessoas
já reconheceram esse corpo.
_ Não é ela! É bem parecida, mas não é
ela!
_ Tem certeza?
_ Tenho.
Ele fechou a gaveta.
_ Vamos falar com o Dr. Monteiro -
decidiu o policial.
Assim que entraram na sala do delegado,
o policial tornou:
_ Ele não reconheceu o corpo.
Monteiro olhou-o admirado:
_ Como não? Seu pai e seu irmão
disseram que é ela.
_ Eles se enganaram. É parecida, o
mesmo formato do rosto, mas a cor dos
cabelos não é bem essa e as mãos são
muito diferentes. Estou aliviado. Esse
corpo não é o de minha mãe. Isso
significa que ela está viva!
_É a sua palavra contra a dos outros dois.
Você olhou bem? Os documentos que a
perícia encontrou embaixo da cama,
identificaram-na como Teresa Borges de
Azevedo.
_ Afirmo que aquele corpo não é de minha
mãe.
_Vamos juntos até lá, você vai olhar
melhor.
O delegado o acompanhou, abriu a gaveta
e pediu que Vitório olhasse novamente o
corpo, insistiu para que ele o fixasse bem,
mas ele continuou afirmando que não era
Teresa quem estava ali.
Doutor Monteiro coçou a cabeça
pensativo, depois voltaram à delegacia, e
ele mandou que Vitório ficasse na sala de
espera:
_Sente-se, logo voltarei a chama-lo.
Uma vez em sua sala, Monteiro pediu à
telefonista que ligasse para o pai de
Vitório no hotel.
Alberto havia se deitado, tentando
descansar na esperança de que a terrível
dor de cabeça melhorasse. Apesar de ter
ingerido um comprimido ela continuava o
incomodando.
O telefone tocou e Osmar atendeu
prontamente.
_ Aqui é o delegado Monteiro. Quero falar
com o Sr. Alberto.
_ Aqui é Osmar. Papai tomou um remédio
para dor de cabeça e está descansando.
Pode falar comigo.
_ Seu irmão disse que o corpo da mulher
assassinada não é de sua mãe.
_ Como não? Eu o reconheci
perfeitamente e papai também.
_ Mas ele afirma que não é ela. Nesse
caso, vocês dois precisam voltar aqui.
Vamos ter de desfazer essa dúvida para
poder liberar o corpo.
Osmar sentiu vontade de desligar o
telefone. Por que fora atender? Procurou
esconder a irritação e respondeu:
_ Isso é um absurdo. É bom o senhor
saber que o que meu irmão diz não é
confiável. Ele é um desequilibrado. Ilude-
se com facilidade. Não quer aceitar a
morte de mamãe e imaginou que o corpo
não é dela. Meu pai disse que a polícia
identificou o corpo pelas impressões
digitais.
_ Isso não é verdade. Seu pai, com
certeza, entendeu mal. Os peritos
encontraram os documentos de sua mãe
embaixo da cama.
_ Isso prova que Vitório está confuso,
mentindo. Se ela tivesse ido para a Itália
conforme dissera, deveria ainda estar lá,
mas papai descobriu que ela nunca viajou
para a Europa. Não há mais dúvida,
doutor. Aquele corpo é mesmo de minha
mãe.
_ Pode ser. Mas espero vocês dois aqui
dentro de uma hora para resolvermos
essa pendência.
- Meu pai vai. Eu preciso voltar ao Rio de
Janeiro ainda hoje. Tenho um vôo
marcado para dentro de uma hora.
- Desmarque seu vôo. Se não vier
mandarei um policial buscá-lo. Só poderá
deixar a cidade quando eu autorizar.
Osmar segurou a vontade de dizer alguns
desaforos ao delegado, mas não fez para
não piorar as coisas.
- Está bem, doutor. Vou avisar papai e
estaremos aí daqui uma hora.
Osmar desligou o telefone com ódio do
irmão. Ele tinha o dom de complicar as
coisas. Por que não era igual a todo
mundo.
Foi ter com o pai, contou-lhe a novidade e
finalizou:
- Aquele idiota tinha que complicar tudo.
Alberto sobressaltou-se:
- E se ele tiver razão? E se aquele corpo
não for mesmo de Teresa?
- Você não o reconheceu?
- Sim.
- Eu também. Vitório é um visionário, está
metido com almas de outro mundo, vive
iludido. Essa é mais uma ilusão dele.
- Por que faria isso?
- Para fugir da realidade. Não quer
aceitar que mamãe está morta.
Alberto passou a mão nos cabelos
pensativa. Bem que ele gostaria que tudo
aquilo não tivesse acontecido.
- Você pode ter razão. Afinal, o corpo foi
identificado pelas impressões digitais.
- Você está enganado. O delegado disse
que os peritos encontraram os
documentos dela embaixo da cama.
- Nesse caso está na hora de fazer a
verificação e comprovar se é ela mesma.
- O delegado poderia fazer isso sem nos
incomodar. Ele me proibiu de viajar e
quer nos ver dentro de uma hora.
- Parece que esse pesadelo não termina
nunca.
- Graças ao Vitório que inventou moda
como sempre.
- Seja como for, temos que ir. Não vejo a
hora que esse pesadelo acabe. Depois de
tudo ainda teremos que transportar o
corpo para o Rio de Janeiro para enterrá-
lo.
- Você quer mesmo enterrá-la lá, em
nosso túmulo de família, ao lado dos seus
pais?
- Claro, ela é minha esposa, tem esse
direito.
- Não sei se tem. Afinal, ela traiu nossa
confiança, mentiu, estava com aquele
homem. Para mim ela não merece ficar ao
lado dos meus avós, pessoas de bem.
- Sua mãe sempre foi uma mulher de
bem. Não admito que fale assim dela.
- Nossos amigos devem ter lido nos
jornais o que aconteceu e certamente vão
nos criticar por levarmos o corpo dela
para lá.
Alberto apertou os olhos como fazia
sempre que estava com raiva e
respondeu:
- Quem decide isso, sou eu. Vou enterrá-
la lá e pronto. Ninguém tem nada com
isso. Não dou ouvidos para fofoca. Não
acredito que Teresa tenha sido amante
daquele homem. Ela era uma mulher
honesta.
Osmar ia retrucar, mas mudou de idéia:
- Vamos logo. Quero resolver tudo o mais
rápido possível e ver se o delegado me
libera para que eu possa viajar.
Uma hora depois davam entrada na
delegacia e foram logo conduzidos à
presença do delegado. Depois dos
cumprimentos ele mandou que Vitório
entrasse. Assim que o viu Osmar disse
nervoso:
- Que idéia foi essa de não reconhecer o
corpo de mamãe?
Osmar ia retrucar, mas Monteiro
interveio:
- Não quero discussões aqui. Quem faz as
perguntas sou eu! Sentem-se. Vamos
conversar.
Voltando-se para Alberto e olhando-o
fixamente nos olhos perguntou:
- O senhor tem certeza de que aquele
corpo é o de Teresa?
- Bem... parece ser ela, mas posso ter me
enganado. Eu estava muito nervoso.
Depois, disseram-me que a polícia já o
havia reconhecido pelas impressões
digitais.
- Quem lhe disse isso? Não nos foi
possível fazer isso porque na tentativa de
defender-se ela aparou os golpes com as
mãos. Os dois polegares foram cortados o
que tornou impossível o reconhecimento
pelas digitais.
Alberto empalideceu. A situação era por
demais penosa. Imaginar Teresa tivesse
passado por tamanha agressão deixou-o
sem palavras. Lágrimas desciam pelas
faces de Vitório. Osmar estremeceu,
porém conseguiu controlar a emoção
O delegado tentou amenizar a situação:
- Não contei esses detalhes antes para
não deixá-los impressionados. Da
maneira como os corpos estavam, dá para
saber que o assassino estava com muita
raiva. Se o senhor não olhou direito,
vamos até lá novamente.
E dirigindo-se a Osmar continuou:
- E o senhor, olhou bem aquele corpo?
- Claro. É ela, estou certo. Meu pai ficou
perturbado com as palavras de Vitório. O
senhor acha que eu não reconheceria
minha própria mãe? Claro que é ela.
- Vamos até lá para que vocês olhem
melhor. Trata-se de um fator importante.
Precisamos ter certeza da identidade
dela.
Osmar ia retrucar, mas pensou melhor e
decidiu que só iria prorrogar o impasse.
Com o delegado e um policial eles foram
ao necrotério.
Uma vez diante da gaveta aberta fixaram
novamente o corpo. Era chocante,
porquanto o corpo, além dos cortes de
faca costurados, tinha os da autópsia que
fora feita.
- Vamos, olhem bem todos os detalhes.
Osmar foi o primeiro a dizer:
- É ela. Não tenho nenhuma dúvida.
- Não é - disse Vitório. - Pai, olhe as mãos
dela. Mamãe tinha os dedos mais
delicados, os punhos mais finos.
- De fato-concordou Alberto. - O rosto é
igual ao dela, mas as mãos são
diferentes. Será por causa da agressão
que sofreu?
- Nem tanto-afirmou o delegado. -
Quando o corpo morre, geralmente volta
a ficar com seus traços normais.
- Estamos perdendo tempo-disse Osmar. -
Se é o rosto dela não sei por que a
dúvida. Ela foi ferida nas mãos. Isso
justifica essa pequena diferença, que,
aliás, seus nem noto.
Vitório aproximou-se mais e, apontando
para o dedo anular da mão esquerda,
tornou:
- Mamãe tinha nesse dedo a marca da
aliança de casamento que ela nunca
tirava. Uma vez, mostrando-me essa
marca, brincou dizendo que esse dedo era
mais fino por causa disso. Essa mão não
tem nenhuma marca de anel, portanto
essa mulher é muito parecida com
mamãe, mas não é ela.
O delegado olhou e, de fato, naquele dedo
não havia sinal de anel. Vitório poderia
ter razão. Voltando-se para Alberto
perguntou:
- Teresa tinha alguma irmã ou prima
parecida com ela?
- Que eu saiba não-respondeu Alberto.
- Está vendo, doutor?-interveio Osmar-É
ela. Não temos como duvidar. O rosto é
igual ao dela. Como pode ser isso? Vamos
acabar com essa dúvida de uma vez por
todas e encerrar o assunto.
O delegado pensou um pouco, depois
disse:
- Bem que eu gostaria de fazer isso. Mas
acho prudente investigar mais um pouco.
Vocês podem estar enganados e eu não
posso permitir que enterrem o corpo para
mais tarde exumá-lo. Minha obrigação é
descobrir a verdade.
- Se o senhor permitir, gostaria de trazer
Dinda para ver o corpo.
- Quem é Dinda?
- A governanta de nossa casa. Ela
trabalhava com mamãe desde que eram
mocinhas. Quando ela se casou, Dinda
veio junta. Foi ela quem nos criou.
- Isso é um absurdo. O que pode valer a
opinião de uma criada ignorante? Cale a
boca Vitório, chega de criar caso.
- Pois eu gosto da idéia-disse o delegado.
- Tragam-na hoje mesmo. Enquanto isso,
vocês devem ficar na cidade.
- Hoje é impossível, não dá tempo. Depois
ela é uma pessoa simples-disse Alberto. -
Não sei se conseguirá vir até aqui
sozinha.
Vitório interveio:
- Ela é simples, mas muito inteligente.
Estou certo de que virá sem dificuldade.
Vamos mandá-la vir de avião.
-Muito bem. Mande vir o quanto antes. Eu
mais do que os senhores tenho pressa em
resolver esse caso.
Assim que eles deixaram à delegacia,
Osmar não conteve o mau humor:
_Você é um idiota mesmo. Por que tinha
que inventar mais uma? Não vê que está
atrapalhando? Acho melhor não aparecer
mais para dar palpite na delegacia.
Aquele delegado me parece tão burro
quanto você.
Vitório não respondeu o que o irritou
ainda mais. Ia continuar quando Alberto
disse nervoso:
_Chega, Osmar. A empresa pode
sobreviver alguns dias sem você. Nós não
podemos enterrar aquele corpo sem ter
certeza de que é da sua mãe.
_Até parece que você esta acreditando
nas bobagens do Vitório.
_Se aquele corpo não for de Teresa, vou
tirar um grande peso do coração.
_Agora entendo por que você está do lado
de Vitório. Mas no fim terá de render-se à
verdade. Não entenderam que estão
iludidos?
_Teresa tinha mesmo a marca da aliança
no anular. Na mão daquela mulher não há
nenhum sinal.
_Ele pode ter desaparecido por causa da
agressão.
_Eu estou com o delegado. É preciso ter
certeza.
Apesar das reclamações de Osmar, Vitório
ligou para Dinda, contou-lhe tudo e
pediu-lhe para que se arrumasse e viesse
o mais rápido possível.
Alberto mandou Osmar pedir a um
funcionário da empresa que comprasse a
passagem para Dinda e a acompanhasse
ao aeroporto, orientando-a. Vitório
encarregou-se de buscá-la quando
chegasse.
Depois de tudo resolvido, Osmar foi para
o quarto por que precisava fazer algumas
ligações de negócios. Estava tão nervoso
que não suportava olhar para o irmão.
Vitório, no entanto, estava sereno,
confiante de que sua mãe poderia estar
viva. Onde ela poderia estar? Se não fora
viajar para a Europa, por que não se
comunicava com a família? Essas
perguntas sem respostas o incomodavam.
Sentia que havia um mistério em tudo
isso e ele pretendia desvenda-lo.
Algum fato muito grave teria acontecido.
Sua mãe não era mulher de mistérios. Sua
vida sempre havia sido um livro aberto.
Alberto foi descansar e Vitório refugiou-
se no quarto. Precisava pensar tentar
encontrar um caminho. Esperava Dinda
com ansiedade. Ela era uma mulher
prática, talvez pudesse ajudá-lo a
descobrir a verdade.
Tirou o sapato, estirou-se na cama
recapitulando os acontecimentos que
começara com a inexplicável depressão
de Teresa.
Lembrou-se de tudo nos mínimos
detalhes, até que cansado, adormeceu.
Sonhou que estava em um lugar escuro,
cheio de galhos secos. Vultos escuros o
cercavam enquanto lhe diziam:
_Não adianta procura-la. Você não vai
encontrá-la nunca mais!
Vitório sentiu que eles falavam de Teresa
e reagiu:
_Vou encontrá-la. Não tenho medo de
vocês. O bem é mais forte do que tudo.
_Desista. Não vai conseguir nada!
_Isso mesmo. Nós não vamos deixar!
Estamos com todo o poder. Somos
poderosos!
_Mais pode a luz divina! Ela está ao nosso
lado!-gritava Vitório angustiado.
Eles tentaram agarra-lo e Vitório correu
para o corpo adormecido e acordou.
Sentou-se na cama pensativo:
"Então era isso! Havia uma perseguição
espiritual contra Teresa e sua família".
Mentalizando luz ao seu redor, Vitório
pediu ajuda aos amigos espirituais que
sempre o visitavam. Aos poucos foi se
acalmando.
A situação estava difícil, porém ele estava
amparado.
Sentia em seu coração uma forte ligação
com o espírito amigo que sempre o
confortava em seus momentos difíceis.
Desde a mais tenra idade, ele via os
espíritos com tal nitidez que os confundia
com pessoas encarnadas, só percebendo
a diferença quando eles desapareciam
diante de seus olhos admirados.
A principio contara para a mãe o que
estava acontecendo, porém ela, temerosa
de que ele estivesse doente, sofrendo
alucinações, o levara ao médico que o
olhou com naturalidade, dizendo para
Teresa que ele sofria dos nervos e
precisava cuidar disso o quanto antes.
Assim, ele tomava vários remédios que
lhe traziam mal-estar, mas as visões
continuavam. Teresa, certa de que o filho
tinha saúde delicada, cercava-o de
cuidados especiais, o que sempre
provocava a raiva de Osmar, com quem
ela era mais firme, não lhe permitindo
fazer o mesmo que Vitório.
Ele passava mal por causa dos remédios e
ela acreditava que ele fosse doente. Por
esse motivo, era mais condescendente
com ele, sem perceber que ele apenas
tinha maior sensibilidade.
Quando ele cresceu e entendeu o que se
passava, parou de falar sobre o assunto e
seus pais pensavam que ele havia
melhorado com o tratamento. Assim ele
livrou-se dos medicamentos que o
incomodavam.
Não falando o que sentia, vivia mais
fechado em seu mundo interior e foi se
acostumando com as presenças de seres
de outras dimensões; procurava evitar os
que tinham as energias conturbadas e
aconchegar-se àqueles que tinham uma
energia melhor.
Foi assim que certa noite ele viu o espírito
de uma mulher, aparentando cerca de
quarenta anos, fisionomia serena, olhos
brilhantes e vivos, que se aproximou,
fixando-o séria e disse:
_Meu nome é Analú. Vim aqui para dizer-
lhe que nos conhecemos de outras vidas e
que conforme o prometido ficarei ao seu
lado daqui para frente, inspirando-lhe
pensamentos bons. Chegou à hora de
começar a trabalhar com a
espiritualidade.
O olhar dela penetrou nele, provocando
uma agradável sensação de bem-estar e
alegria. O que o fez indagar:
Quem você é realmente para mim? Sinto
uma sensação boa e uma alegria muito
grande.
_Um dia você saberá. O que importa é
que estamos juntos e continuamos
amigos como sempre fomos.
_O que é trabalhar para a
espiritualidade?
_É viver para o espírito de acordo com as
leis cósmicas, ensinando as pessoas a
enxergarem a realidade.
_Eu não conheço essas leis nem tenho
como ensinar ninguém.
_Seu espírito conhece tudo isso e, aos
poucos, você se lembrará do que precisa
para fazer o que é necessário.
_Mas eu não recordo de nada. Como
saber o que é certo ou errado?
_Esse é um conceito mundano. Ao
reencarnar, você esqueceu
momentaneamente o passado, porém ele
continua em seu inconsciente e quando
chegar o momento, de acordo com o que
você escolher, voltará à tona.
_Eu gostaria de saber muitas coisas: "Por
que eu sou diferente das outras pessoas?
Por que posso ver e falar com pessoas
que já morreram? Por que posso perceber
o pensamento das pessoas?". Isso tudo
me confunde e assusta.
_De hoje em diante estarei ao seu lado
para ajudá-lo, mas devo esclarecer que
não tenho nenhum poder sobre você. Só
posso mandar-lhe energias de
sustentação e inspirar-lhe bons
pensamentos. Mas as escolhas, as
decisões continuam sendo suas. Por esse
motivo eu disse que tudo dependerá
delas.
_Você não respondeu minhas perguntas.
- No mundo, não existem duas pessoas
iguais. Cada um é um, com suas
capacidades e experiências. Você é agora
o resultado de suas escolhas anteriores e
no futuro, será apenas o que escolher
hoje. Você é um sensitivo. Por esse
motivo pode ser além dos cinco sentidos.
Isso aconteceu porque você desenvolveu
sua sensibilidade em outras vidas e hoje
possui o sexto sentido mais desenvolvido.
- Tudo isso me assusta. Eu preferia não
sentir nada disso e ser como todos.
- Não diga isso. A percepção de como as
coisas é, traz lucidez e força. Estou certa
de que você já tem conhecimento para
fazer com uso dessas suas faculdade. Só
precisava observar um pouco mais o
processo, cuidar bem dos seus
pensamentos para ficar apenas com o
bem e não se ligar às idéias negativas.
- Eu gostaria de ser mais lúcido e sentir -
me mais forte. Por vezes as idéias
confundem-se em minha cabeça e eu me
sinto deprimido, sem forças.
- O que confunde sua cabeça são as
crenças erradas que você aprendeu desde
a infância e que destoam do
conhecimento que seu espírito possui.
Isso está criando um conflito entre a
ilusão aprendida e a verdade
conquistada.
- Eu desejo sair desse estado e encontrar
a paz.
- Nesse caso, precisa estudar suas
crenças e descobrir até que ponto é
verdadeira. Eu preciso ir, mas estarei por
perto. Pense em tudo isso e decida se
desejar fazer o que eu lhe disse. Fique
com a luz.
Ela desapareceu antes que Vitório tivesse
tempo para responder. A partir desse dia
ele começou a questionar suas crenças e
descobriu que algumas eram baseadas
apenas em opiniões de outros pensadores
e não podiam ser aprovadas nem
desaprovadas.
De vez em quando Analú o procurava e
conversavam trocando idéias. Ele, aos
poucos, foi reformulando seus conceitos
de realidade e descobrindo que para ser
forte, precisava acreditar em sua própria
força, usando-a sempre para encorajá-lo
e preservar em seus propósitos de
aprender e conquistar o próprio
equilíbrio.
Pensado no sonho que tivera, lembrou-se
de Analú. Precisava conversar com ela e
saber o que estava acontecendo com sua
mãe. Ela era sua amiga e sempre
conversava com ele sobre todos os
assuntos. Por que desde que sua mãe
desaparecera ela não viera para confortá-
lo.
Estava certo de que o corpo que vira no
necrotério não era dela, mas como
entender o desaparecimento, a
semelhança que ela tinha com a mulher
morta? Teresa estava viva, como ele
imaginava, por que não aparecera ainda,
mesmo depois da notícia de sua morte
estar em todos os jornais?
Essas perguntas ficavam se resposta e
agora havia aquele encontro no astral
onde descobriu que havia uma
conspiração de seres maldosos agindo
contra sua família.
Naquele momento evocou o espírito de
Analú, com todas as forças do seu
espírito. Então, ouviu sua voz:
- No momento não posso ir . Ore e confie.
Vitório suspirou angustiado. Precisava ser
forte e continuar confiando no bem e na
amizade dos amigos espirituais. Mas,
apesar disso, as perguntas sem resposta
continuavam em sua cabeça".

"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 6
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"Eram onze horas da manhã seguinte
quando Vitório foi ao aeroporto esperar
Dinda. Ela chegou fisionomia preocupada;
assim que o viu, aproximou-se,
abraçando-o com força.
- Estou agoniada, meu filho. Como você
está ?
- Angustiado com os acontecimentos.
Vamos embora, vou levá-la direto para o
hotel e logo iremos a delegacia. No
caminho lhe contarei tudo.
No táxi, durante o trajeto, Vitório contou
tudo a ela e finalizou:
- Sugeri ao delegado que você viesse
porque estou certo de que aquele corpo
não é o de mamãe. Você a conhece mais
do que todos nós. Não vai se enganar.
- Se o corpo não for dela, onde ela está?
Por que não se comunica conosco? Ela
nunca fez isso antes. Pelo menos comigo,
sempre me dizia onde estava.
- Mas desta vez ela mentiu. Não foi a
Europa como disse. E para você, ela falou
aonde deveria estar?
Dinda hesitou um pouco, depois disse:
- Não, Desta vez não disse.
Vitório olhou-a sério e respondeu:
Se você sabe de alguma coisa, é hora de
contar. Ela pode estar em perigo e temos
que descobrir o que aconteceu.
- Eu não sei. Mas se aquele corpo não é
dela, ela pode estar viva e logo estará de
volta.
- E se tiver lhe acontecido alguma coisa
ruim? Seus documentos foram
encontrados debaixo da cama, na cena do
crime. Ela esta envolvida nesta tragédia
de qualquer forma.
Dinda sobressaltou-se, mas não
respondeu. Ela também esta muito
assustada com os últimos
acontecimentos.
Ela sabia que Teresa não estava na
Europa como dissera para toda a família.
Mas não podia dizer nada, pois lhe
prometera sigilo. Se ela falasse, quando
Teresa voltasse, iria repreendê-la por ter
traído sua confiança. O assunto era muito
sério e ela jurara guardar segredo.
Chegaram ao hotel e foram para o quarto
de Alberto que os recebeu, abraçando-a
com carinho:
- Sinto ter de incomodar você, fazendo-a
viajar de avião e depor na delegacia.
- Não tenho medo de avião. Se não fosse
pela preocupação com Teresa eu até teria
gostado. Como o senhor está?
Alberto suspirou triste:
- Como posso? Esta tragédia não acaba
nunca. Estou cansado, preocupado,
sofrido. Espero que você consiga nos tirar
dessa dúvida. Você quer descansar um
pouco antes de ir à delegacia?
- Não. Estou muito ansiosa para ver se é a
minha ama que está lá.
- Irei com você-disse Vitório.
- Eu também irei. Acho que Osmar não vai
querer ir novamente.
Ele apareceu no quarto dizendo:
- Claro que vou. E você, Dinda, faça o
favor de acabar de uma vez com essa
palhaçada. Eu preciso voltar logo para
casa. Tenho muitas coisas para fazer e
não posso ficar aqui parado mais tempo.
Diga logo que o corpo é de mamãe e
acabaremos com isso.
- Só vou dizer que é, se for verdade-
respondeu ela.
- É ela. Não seja boba. Acha que eu ia me
enganar? Que não conheço minha mãe?
- Ele quis fazer sua cabeça. Mas é claro
que está enganado. É ela, infelizmente.
Vitório deseja tanto que ela esteja viva
que está se iludindo e tentando envolver
papai.
- Vamos embora-disse Alberto irritado. É
melhor você ficar. Já foi já deu sua
opinião.
- Se Vitório vai, também vou. Ele também
vai. Ele também não precisa ir. Quer
apenas induzir vocês a dizer o que não é
ela.
Irritado, Alberto saiu do quarto e os
outros três o seguiram em silêncio.
Uma vez na delegacia, o delegado os
esperava e pediu que Dinda entrasse em
sua sala. Os outros ficaram do lado de
fora.
Depois dos cumprimentos, Monteiro
convidou-a a sentar-se, e disse:
- Gostaria que me dissesse quando
conheceu Teresa e desde quando trabalha
para ela.
- Nós éramos crianças quando minha mãe
me levou na casa dela. Meu pai tinha
morrido há poucos meses e nós
precisávamos trabalhar para viver.
Teresa tinha treze anos, como eu, e logo
nos tornamos amigas. Ela era muito
bonita e fiquei encantada desde o
começo. Ela era muito bonita e fiquei
encantada desde o começo. Fazia tudo
para agradá-la e ficamos íntimas.
- Tanto que quando ela casou-se com o
Sr. Alberto, você foi morar na casa deles.
- Foi. Ajudei-a criar os meninos e
continuei a fazer tudo para que minha
menina fosse feliz.
Algumas lágrimas brilharam nos olhos de
Dinda e o delegado comentou:
- Você tornou-se o anjo da guarda de
Teresa.
- Eu faria tudo para que ela fosse feliz.
- Fale-me um pouco do casamento dela.
Como era a vida do casal, eles se davam
bem?
- O Sr. Alberto sempre foi muito bom e
tratava a família com respeito.
- E os rapazes? Como era o
relacionamento de Teresa com os filhos?
- Teresa sempre foi uma ótima mãe.
Dedicada, estava sempre cuidando da
felicidade deles.
- Os dois irmãos parecem que não
combinam.
- Sabe como é doutor, coisas de família.
Osmar sempre teve muito ciúme do irmão
porque como ele é mais sensível Teresa
está sempre atenta com sua saúde. Mas
não há nada de mais.
- A senhora sabe se Teresa tinha algum
inimigo, ou parente que não gostasse
dela?
- Não. Os parentes dela vivem distantes,
e ela se relacionava pouco com eles.
- Mas você deve conhecer a Elvira, a
colega de faculdade com quem Teresa
disse á família que iria viajar para a
Europa.
- Só a vi uma vez quando elas eram
estudantes.
- Pode descrever como ela era?
- Não me lembro bem. Faz muitos anos.
Era uma moça igual a muitas estudantes e
que eu vi com ela.
- Isso não esclarece muita coisa. Tente
lembrar-se. É importante.
- É inútil, doutor. Não me lembro mesmo.
- Pensei que pudesse me ajudar a
descobrir quem cometeu este crime.
- Não tenho nenhuma idéia. O que
aconteceu me assustou muito.
Monteiro levantou-se:
_ Vamos ver o corpo.
Eles saíram e do lado de fora os outros
três que os esperavam os acompanharam
até o necrotério.
Dinda estava emocionada, o coração
apertado se perguntava se Teresa estava
ou não morta. Logo iria saber.
Uma vez no necrotério, Monteiro puxou a
gaveta, o rosto da mulher apareceu e ele
levantou o lençol que cobria o corpo,
olhando fixamente para o rosto de Dinda.
Ela colocou os óculos, abaixou-se,
olhando fixamente para o corpo. Depois
pediu:
_ Alguém pode levantar um pouco o
corpo? Quero ver as costas.
_ Para quê? -indagou o delegado. _ É
Teresa ou não?
_ Teresa tinha uma pequena mancha de
nascença na curva da cintura.
_ O corpo está rígido e congelado. Não a
reconhece pela fisionomia? - tornou o
delegado.
_ O rosto é parecido com ela, porém as
mãos são diferentes. Eu preciso ver a
marca para ter certeza.
Osmar interveio irritado:
_ Claro que é ela! Por que você também
duvida?
Sem dar-lhe atenção, Monteiro chamou
dois auxiliares e pediu-lhes que virasse o
corpo de bruços. Devidamente protegidos
pelas roupas adequadas, eles
obedeceram.
_ E então? - indagou o delegado ansioso.
Dinda apontou um lugar na cintura e foi
categórica:
_ Não é ela. Este corpo não tem a marca
que Teresa tinha.
_ Eu sei que não é ela! - exclamou Vitório
satisfeito.
Osmar não se deu por vencido e interveio:
_ Como não? Isso não tem sentido. Como
vocês explicam o desaparecimento dela?
Nunca existiu outra pessoa tão parecida a
ponto de nos confundir. Depois, como o
documento de identidade dela apareceu
junto ao corpo?
_Isso é que eu preciso descobrir-
respondeu Monteiro. Voltando-se para
Dinda continuou: _A senhora pode
responder a essas perguntas?
_Não posso. Só sei que esta não é ela.
Disso estou certa.
Monteiro coçou a cabeça e perguntou a
Alberto:
_O senhor deveria ter visto no corpo de
sua esposa a marca a que a Dinda se
refere.
_Nunca notei. Teresa era uma mulher
discreta. Não gostava de tirar a roupa na
minha frente.
_Vamos para a outra sala conversarmos
um pouco.
Acomodados na sala ao lado, Osmar
estava inconformado. Não acreditava que
estivesse enganado. Era impossível não
ser o corpo de Teresa.
_Dinda sempre protegeu Vitório. O que
ela quer é fazer com que ele continue na
ilusão de que mamãe está viva. Uma
marca no corpo que só ela sabia me
parece uma desculpa arranjada para
consolar Vitório.
_Eu nunca brincaria com um caso desses -
protestou ela. _Estou dizendo o que
percebi. Aquela mulher não é Teresa.
Monteiro olhou para os quatro sentados
diante dele sem saber o que dizer. Ocaso
era complicado. Por um lado, Osmar
poderia ter razão. Vitório era muito
apegado à mãe, poderia estar enganado.
Por outro lado, Dinda era pessoa
confiável. Dava para perceber isso pela
maneira que se posicionava.
Ele não acreditava que ela se prestasse a
mentir apenas para consolar Vitório. Mas
isso tornava o caso muito mais difícil.
Ele não poderia liberar aquele corpo como
sendo o de Teresa, que poderia estar viva
e aparecer de uma hora para outra. Isso
lhe daria, além do trabalho de requerer
uma exumação, o fato de ter de admitir
publicamente que estava enganado.
Era um delegado muito conceituado,
ambicionava fazer carreira e um fato
desses certamente o deixaria
desacreditado. Nesse momento desejou
nunca ter sido designado para aquele
caso.
Mas não havia nada que ele pudesse fazer
a não ser tentar encontrar a verdade.
Pensou um pouco enquanto os demais
esperavam ansiosos pela sua decisão.
_ E então, doutor? Vai liberar o corpo
para o enterro?
_ Não. Diante das divergências, será
melhor esperar e investigar um pouco
mais.
Osmar fez um gesto de desagrado e
tornou:
_ Doutor, entenda, não posso ficar aqui
indefinidamente. Tenho muitas
responsabilidades. Preciso voltar para o
Rio o quanto antes.
_ Compreendo. Vou liberá-lo para voltar.
Mas se eu precisar de seu depoimento,
terá de vir novamente.
_ Virei quando precisar. O senhor sabe
onde moro. É só ligar. Agora, eu gostaria
que só o fizesse quando realmente
descobrisse alguma coisa.
_ Eu vou descobrir a verdade, custe o que
custar. É um ponto de honra. Estou certo
de que logo terá notícias minhas.
_ Dinda pode voltar comigo? Ela faz muita
falta em casa - justificou-se Osmar.
_ Todos podem ir para casa, desde que
prometam vir quando eu chamar.
- Eu quero ficar - disse Vitório. _ Quero
descobrir o paradeiro de mamãe. Se os
documentos dela estavam aqui, pode ser
que ela também esteja.
_ Por que está pensando isso? -
perguntou Monteiro.
_ Se ela estivesse viva e em São Paulo,
teria visto os jornais e certamente nos
procurado.
_ E se ela tiver sido seqüestrada e não
puder se comunicar?
_ Você está levando sua fantasia longe
demais - disse Osmar. _Eu não disse que
ele vive fora da realidade?
_ Pois eu penso que esta é uma hipótese
que poderia explicar a ausência dela, no
caso de estar viva. O contrário também
pode ter acontecido.
_ Nesse caso, aquele corpo seria o dela -
apressou-se a dizer Osmar.
_ Eu não afasto nenhuma hipótese. Agora
podem ir. Se alguém ficar em São Paulo,
deixe o endereço.
Assim que saíram, Osmar tornou:
_ Vou reservar passagens para todos nós.
Regressaremos hoje à noite.
_ Para mim, não. Pretendo ficar aqui -
disse Vitório.
_ Pra que? Quer complicar ainda mais
este caso? - reclamou Osmar.
_ Eu também vou ficar - tornou Alberto.
_ Isso é uma loucura. Vocês não sabem
quanto tempo esse delegado pode
demorar a enxergar que o corpo é de
mamãe.
_ Eu não gosto de ficar em hotéis -
decidiu Alberto. _ Vitório quer ficar. Estou
pensando em alugar um apartamento
para ficarmos mais à vontade.
_ Eu posso ficar com vocês - disse Dinda.
_ Nora pode cuidar de tudo lá em casa.
Ela é muito dedicada.
_ Está certo. Você fica para nos ajudar. Só
voltaremos quando desvendarmos a
verdade.
Osmar meneou a cabeça negativamente.
Não se conformava com a decisão. Para
ele a questão era simples e não precisava
tanta confusão. Era só enterrar o corpo de
sua mãe e terminar com esse caso tão
desagradável.
Ele não acreditava que ela pudesse estar
viva. Mas por outro lado, a idéia de que
aquele corpo não fosse de Teresa
começava a agradá-lo. Nesse caso, sua
mãe não seria adultera e ele não
precisaria envergonhar-se diante dos
conhecidos.
_ Hoje mesmo vou procurar um
apartamento para alugar - decidiu Vitório.
_ Faça isso meu filho. Vamos precisar de
três quartos.
Uma vez no hotel, Alberto foi descansar.
Sentia-se triste, deprimido. Aquela
situação era desgastante. Se o corpo
fosse de Teresa, ela seria considerada
adultera. Mas ele a enterraria e estaria
tudo resolvido. Se não fosse, onde ela
estaria? Morta, sem que eles pudessem
encontrá-la? Acreditava que se ela
estivesse viva e pudesse, teria se
comunicado.
De todas as formas, ela estava envolvida
em uma tragédia e não saber a verdade
tornava as coisas piores.
Dinda foi descansar, enquanto Osmar se
preparava para ir ao aeroporto. Vitório foi
para o quarto, sentou-se em uma
poltrona. Apesar de acreditar que Teresa
estivesse viva, o fato de ela não se
comunicar com a família, levava-o a crer
que estivesse impossibilitada.
Sua própria impotência o atormentava. Se
ao menos Analú aparecesse e lhe desse
alguma orientação!
Ela deveria saber o que tinha acontecido.
Por que não o procurava para lhe contar?
Talvez desejasse poupá-lo de uma notícia
ruim, porém nada seria pior do que não
saber. Fosse o que fosse conhecer a
verdade era preferível.
Suspirou triste. Desejava encontrá-la,
mas por onde começar? A polícia não
tinha pistas, estava perdida em
indagações sem resposta.
Lembrou do homem que morrera com
aquela mulher. Talvez devesse começar
por conhecer sua família. Sabia que ele
era casado e deixara um filho pequeno.
Imediatamente foi ao telefone, ligou para
a delegacia e pediu para falar com
Monteiro. Assim que ele atendeu, Vitório
falou do seu desejo de conhecer a viúva
do morto.
_ Para quê? - indagou o delegado. _ Você
não vai encontrar nenhuma pista lá.
_ Desejo conversar com ela mesmo assim.
_ Será inútil, mas é um direito seu. Anote
o nome e endereço.
Vitório anotou tudo e saiu. Apanhou um
táxi, deu o endereço. O carro parou em
frente à casa e ele desceu, olhando
curioso para o lugar. Era uma rua calma,
a casa, um sobrado com garagem, com
pequeno jardim na frente.
Decidido, tocou a campainha. Dorita foi
abrir:
_ O que deseja?
_ É aqui que mora D. Marília Marques de
Oliveira?
_ É.
_ Meu nome é Vitório Borges de Azevedo.
Gostaria de falar com ela.
_ Ela está ocupada. Não sei se poderá lhe
atender agora.
_ Por favor. Diga-lhe que o assunto é
muito importante.
_ Espere um momento.
Ela entrou e pouco depois voltou dizendo:
_ Entre, por favor.
Ele obedeceu e ela conduziu-o para a sala
de estar:
_ Sente-se e fique à vontade. Ela já vem.
Pouco depois, Marília entrou, olhando-o
com curiosidade. Ele levantou-se:
_ Desculpe a intromissão. Sei que a
senhora estava ocupada.
_ De fato. Estava trabalhando. Meu
marido morreu e ficamos sem recursos.
Você é um dos filhos da mulher... de
Teresa?
_ Sou Vitório. O filho mais novo. Vim
conversar com a senhora sobre o que
aconteceu.
_ Foi uma tragédia horrível que me
surpreendeu muito e deixou-me sem
chão.
_ Posso avaliar. A senhora tem um filho
pequeno?
_ Não me chame de senhora, por favor.
Meu filho tem cinco anos.
Marília sentou-se no sofá ao lado dele,
indagando:
_Por que você veio me procurar? Tudo o
que eu poderia dizer sobre o caso, contei
ao delegado.
_É que estou muito angustiado. Meu pai,
meu irmão Osmar, eu e até nossa
governanta, Dinda, viemos reconhecer o
corpo da mulher assassinada ao lado de
seu marido. Mas o fato é que o caso se
complicou, porquanto, meu pai, meu
irmão reconheceram o corpo como sendo
de minha mãe, porém eu percebi que
aquela mulher, apesar da grande
semelhança física, não é minha mãe.
Marília levantou-se assustada:
_Como pode ser? Seu pai disse ao
delegado que era ela!
_Por esse motivo mandamos vir à
governanta. Ela está com mamãe desde
que ambas eram adolescentes. Ela
também disse que não é mamãe.
Marília sentou-se novamente:
_Não sei o que lhe dizer. Como seu pai
pôde ter se enganado?
_Pela extrema semelhança que essa
mulher tem com mamãe. Mas eu notei
que ela tinha as mãos diferentes, sem a
marca da aliança que havia no dedo
anular. Depois, Dinda revelou que minha
mãe tinha uma marca de nascença na
parte de trás da cintura. Quando virou o
corpo da morta, essa marca não existia.
Marília estava confusa. Isso fazia com que
a identidade da morta permanecesse
ignorada. Então fez as perguntas naturais
da situação e Vitório explicou-lhe que sua
mãe não tinha nenhuma pessoa parecida
com ela na família, e continuava
desaparecida.
_Minha mãe é uma mulher discreta,
honesta e nunca se prestaria a estar em
uma situação como aquela.
_Mas e os documentos?
_Isso é que está me angustiando. De
alguma forma ela está relacionada com o
crime. Receio que esteja presa em algum
lugar, seqüestrada, talvez, e não possa se
comunicar conosco.
_Nesse caso, ela estaria em perigo! Mas
se fosse um seqüestro, alguém teria se
comunicado pedindo dinheiro ou algo
assim.
_Essa falta de noticias está me
angustiando. Posso imaginar o sofrimento
dela em uma situação dessas.
Ele estava visivelmente nervoso e Marília
sentiu-se penalizada.
_Acalme-se. Vai ver ela está bem, mas
distante, em algum lugar que não dá para
se comunicar. A qualquer momento pode
mandar notícias.
_Bem que eu gostaria de poder acreditar
nisso. Mas sinto que algo de ruim está
acontecendo.
_Você está nervoso, imaginando o pior.
Vou fazer um chá. Depois voltaremos a
conversar.
Ela foi para a cozinha, enquanto Vitório
recostou-se no sofá, de olhos fechados,
esforçando-se para ficar calma".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 7
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO



"Dorita trouxe a bandeja com o bule de
chá, duas xícaras, um pratinho com
alguns pães de queijo e colocou-a sobre a
mesa de centro.
Marília serviu o chá, entregou a xícara a
Vitório e ofereceu os pães de queijo
dizendo:
_ Experimente. Estão quentes.
_ Desculpe, mas estou sem fome.
Essa é a nossa especialidade. Estamos
começando e precisamos de opiniões a
respeito.
Apesar de não estar com fome, Vitório
não quis ser indelicado e apanhou um.
Marília sentou-se na poltrona ao lado,
serviu-se, tomou um gole de chá e fixou o
rapaz, esperando que ele experimentasse
o pão de queijo.
Ele começou a comer, estava delicioso. Só
então se lembrou de que havia dois dias
que não comia nada, só tomava água e
café.
_ Está ótimo.
_ É uma receita de minha avó.
Marília foi conversando, contando sua
infância no interior, em companhia dos
pais e da avó materno.
Ouvindo-a falar, Vitório foi tomando o
chá, comendo mais alguns pães de queijo
e sentindo-se mais calmo. Marília tinha
uma voz doce e um jeito alegre de contar
as coisas.
Apesar da tragédia que se abatera sobre
sua vida e das dificuldades financeiras,
ela se sentia livre, útil, tendo se libertado
da preocupação que Otávio lhe dava.
Apesar de ganhar pouco vendendo os
quitutes, sentia-se orgulhosa por poder
se sustentar com o próprio trabalho.
Depois que Vitório colocou a xícara sobre
a bandeja, Marília tornou:
_ O que pensa fazer para descobrir o que
aconteceu de verdade?
_ Ainda não sei. O delegado Monteiro não
me parece capaz de fazer isso.
_ Tenho a mesma opinião.
_ Fale-me um pouco sobre seu marido.
Como ele era em casa, no trabalho.
Marília suspirou pensativa, hesitou um
pouco, depois disse:
_ Eu também gostaria de saber a
verdade. Vou contar-lhe o que sei.
Conversando, talvez encontremos algo
mais.
Marília contou tudo. Sua vida conjugal, a
falta de carinho de Otávio com ela e
Altair. A carta anônima e a descoberta do
crime. Finalizou:
- Aquela cena ainda está dentro de mim.
Ao falar sobre isso, sinto como se
estivesse lá, apavorada, vendo os dois
naquele quarto. Nem sei como consegui
chegar a casa.
-Você não chamou a policia, não pediu
socorro?
- O delegado também fez a mesma
pergunta. Mas eu vi que ambos estavam
mortos, tive medo que suspeitassem de
mim e fugi. Mas como eu disse, o Dr.
Monteiro encontrou minhas digitais e fui
forçada a contar-lhe tudo. Ele disse que
eu era suspeita, mas penso que ele disse
isso para intimidar-me.
Eu possuo o corpo frágil, não teria
condições físicas de brigar com duas
pessoas e vencer. Ele não acreditava de
verdade que tenha sido eu.
- A família de Otávio não sabia onde ele
trabalhava?
- Não. Assim como ela não falava comigo
sobre seus negócios, fazia o mesmo com
eles. Otávio não dava dinheiro senão para
o estritamente necessário e reclamava
muito por fazer isso. Mas o delegado
descobriu que ele tinha duas contas
bancárias com dinheiro que ficou retido
enquanto eles investigam sua origem. Por
tudo isso, não recebeu nada e precisei
arranjar uma forma de ganhar alguma
coisa.
- Você é uma mulher de coragem. Já tinha
trabalhado para fora alguma vez?
- Não. Meus pais são de classe média,
pude estudar sem precisar trabalhar. Sou
formada em Letras, mas me casei cedo e
Otávio não deixou que eu exercesse
minha profissão. Ele não gostava que eu
saísse sozinha. Ficava muito irritado se eu
não obedecesse. Deixou-me apenas me
formar.
- Compreendo.
Dorita entrou para recolher a bandeja.
- Desejo apresentar-lhe Dorita. Ela está
comigo há muito tempo. É uma amiga que
tem me ajudado muito neste momento
incerto. Foi idéia dela fazermos os pães
de queijo.
- Estão deliciosos.
Dorita sorriu feliz.
- Está mais calmo? O senhor estava muito
abatido e nervoso quando chegou.
- Sim, Dorita. Seu chá fez milagre e o
apoio que estou recebendo aqui, está me
ajudando muito. Peço-lhe, que não me
chame de senhor.
- Está bem. Posso me intrometer um
pouco e fazer uma sugestão?
_ Faça - respondeu Vitório.
_ Vocês querem descobrir a verdade. Nós
no momento não temos dinheiro para
fazer isso, mas você pode procurar um
bom detetive e pagar-lhe para investigar
o caso.
Vitório olhou-a surpreendido:
_ É verdade! Como não pensei nisso
antes?
_ Você estava nervoso e as boas idéias
aparecem só quando estamos calmos.
_ É uma grande idéia. Vou fazer isso
mesmo. Mas não conheço ninguém nesta
cidade. Eu quero o melhor detetive. Vocês
conhecem alguém?
As duas sacudiram a cabeça
negativamente.
_ Não importa, eu vou achar. Mas seria
bom se vocês também procurassem.
Vamos nos juntar para descobrir a
verdade.
_ Não seria justo. Não temos dinheiro
para pagar as despesas. Isso deve custar
muito caro - objetou Marília.
_ Não precisam pagar nada. As despesas
correm por minha conta. O que eu quero é
que vocês me ajudem. Tenho estado
muito perturbado. Sozinho será mais
difícil. Vocês precisam trabalhar e eu vou
embora. Assim que contratar alguém,
voltarei para conversarmos e traçarmos
nossos planos.
Vitório despediu-se e saiu. Marília e
Dorita retomaram o trabalho, comentando
sobre aquela visita. Ambas gostaram
muito dele.
_ Nota-se que é um rapaz bom. Ele me
parece ter algo especial - comentou
Dorita.
_ Seu amor pela mãe é comovente.
Desejo que ela esteja viva e que volte
para casa sã e salva.
_ Não é só o fato de ele ser ligado à mãe.
Ele me parece diferente. Mais sensível,
sinto que podemos confiar nele.
_ É. Afinal, sou a viúva do homem que foi
morto com aquela mulher. Ele poderia ter
se mostrado desconfiado, mas não foi o
que me pareceu.
_ Ele está certo de que não é a mãe dele
quem foi morta com Otávio.
_ Será que ele não se enganou? O pai e o
irmão reconheceram o corpo.
_ Vai ver que é alguém da família que
eles não conheciam. Às vezes as pessoas
se distanciam e perdem o contato. Para
mim foi isso.
_ Não sei. Por mais que eu pense não
consigo entender. Por que Otávio iria se
relacionar-se com uma mulher tão mais
velha?
_ Um bom detetive vai descobrir. Vamos
trabalhar, já perdemos muito tempo.
_ Isso mesmo.
As duas decidiram-se com prazer ao
trabalho.
Vitório parou um táxi e sentou-se na
frente, ao lado do motorista. Deu o
endereço do hotel, depois entabulou
conversa com ele.
_ Eu vim recentemente para São Paulo e
não conheço bem a cidade.
_ Eu nasci no interior, mas moro aqui há
mais de vinte anos. Quinze dentro de um
táxi.
_ Você deve conhecer muita gente.
_ É verdade.
_ Meu nome é Vitório e o seu?
_Ronaldo.
_ É um prazer conhecê-lo. Talvez possa
me ajudar.
_ Em quê?
_ Estou precisando contratar um bom
detetive. E quero o melhor.
Ronaldo balançou a cabeça, pensativo e
perguntou:
_É coisa de mulher?
_ Como assim?
_ De traição, de adultério. Porque se for,
eu não vou me meter. Certa vez entrei
nessa e acabou sobrando para mim. Jurei
que nunca mais faria isso.
_ Não é nada disso. Minha mãe
desapareceu e preciso descobrir onde ela
está. Se você me indicar alguém, não
mencionarei seu nome, fique sossegado.
_ Bem, eu até conheço um muito bom.
Mas não sei se devo indicá-lo. Ele é
namorado de minha irmã e eu não gosto
de envolver minha família nisso.
_ Ele é bom mesmo?
_ Não há caso que ele não desenrole. É
formado em Direito, mas sempre foi
fascinado pela investigação.
_ Nesse caso, vou procurá-lo.
_ Hum... Não sei...
_ Será um grande favor que você estará
me fazendo. Além do que lhe darei uma
boa gratificação.
_ Isso eu não posso aceitar. Mas se me
prometer que me deixará fora disso,
talvez...
_ Claro. Vou procurá-lo e não direi que foi
você quem o indicou. Aconteça o que
acontecer, não envolverei sua família.
Ronaldo estava hesitante e Vitório
tentava convencê-lo. Quando o carro
parou diante do hotel, finalmente ele
concordou:
_ Está bem. Vou dar-lhe o número do
telefone dele.
_ Muito obrigado. Disponha de mim se
precisar de alguma coisa.
Vitório apanhou um cartão seu e deu-o a
Ronaldo que por sua vez escreveu um
nome e alguns números em um pedaço de
papel e entregou-o a ele. Vitório pagou a
corrida e despediu-se, agradecendo mais
uma vez.
Entrou no hotel, abriu o papel e leu o
nome: Paulo. Decidiu ligar
imediatamente. Subiu para o quarto e
ligou para o número indicado.
Uma voz de mulher atendeu:
_ Escritório de advocacia.
_ Quero falar com o Dr. Paulo.
_ O nome completo, por favor.
- Não sei. Um amigo me indicou e não me
deu o sobrenome.
- Temos dois com esse nome do
escritório.
- Estou precisando dos serviços dele, mas
ainda não o conheço pessoalmente. Só sei
que ele é especializado em investigações.
- Então deve ser o Dr. Paulo Rodrigues
Maciel. Vou passar a ligação.
Pouco depois uma voz de homem atendeu
e Vitório disse:
- Estou precisando de seus serviços
profissionais. Gostaria de ir até seu
escritório para conversarmos.
- Estou muito ocupado. Nesta semana não
será possível atende-lo.
- Eu não posso esperar. O caso é muito
sério. Gostaria pelo menos de falar com
você e saber se pode me ajudar. Caso
contrário terei de procurar outra pessoa.
Tenho urgência. Meu nome é Vitório
Borges de Azevedo.
Paulo fez silêncio por alguns instantes,
após perguntou:
- Você quer falar comigo sobre o
assassinato de Teresa Borges de
Azevedo? Ela é sua parenta?
- É. Mas não posso falar por telefone.
- Neste caso pode vir ao escritório. Vou
ver o que posso fazer.
Vitório pediu o endereço, desligou e
tornou a sair. Meia hora depois estava
entrando no prédio e notou que lá havia
muitos escritórios, a maioria de
advogados.
Encontrou o que procurava, entrou, deu o
nome à recepcionista e foi conduzido a
uma sala onde Paulo imediatamente
levantou-se para recebê-lo.
Era um homem alto, forte, moreno,
cabelos revoltosos, que ele tentava em
vão manter penteados, testa larga, olhos
castanhos, nariz reto, boca bem delineada
e barba que apesar de bem-feita deixava
em seu rosto uma sombra levemente
escura. Aparentava cerca de trinta e cinco
anos.
Vitório olhou-o nos olhos querendo sentir
as energias do advogado e depois sorriu
levemente dizendo:
- eu liguei meia hora atrás.
- Estava a sua espera. Eu não tinha tempo
hoje, mas quando ouvi seu nome, senti
que não podia deixar de atendê-lo. Seu
caso estava em todos os jornais dias atrás
e a policia não tem pistas. Sente-se, por
favor. Vamos conversar.
Paulo indicou um sofá e sentou-se ao lado
dele. Mostrou interesse e, apesar de
Vitório o estar fixando firmemente, não
desviou o olhar nem uma vez. Vitório
sentiu que podia confiar nele. Contou
tudo minuciosamente e, à medida que
falava, Paulo fazia anotações. Até que ele
finalizou:
- Foi isso. O corpo daquela mulher não é
de minha mãe, é só isso que eu sei. O
resto é sem resposta. Sequer sei por onde
começar. Mas como minha mãe
desapareceu e seus documentos estavam
no local do crime, estou aflito,
imaginando onde estará e como.
- Tem certeza de que não estão
enganados? Afinal, outras pessoas de sua
família reconheceram o corpo.
- Mas Dinda também não o reconheceu.
Alias, naquele corpo não havia o sinal de
nascença que minha mãe tinha nas
costas.
- É. Isso faz crer que vocês estão certos.
- Agora que lhe contei tudo, quero saber
você pode me ajudar a descobrir onde
está minha mãe? Não sei por onde
começar, mas estou disposto a insistir até
saber toda a verdade.
Paulo ficou pensativo por alguns
instantes, depois disse:
- Este caso me atraiu desde o começo.
Você está mesmo decidido a ficar em São
Paulo enquanto durar as investigações?
- Estou. Meu pai e Dinda vão ficar comigo.
- Neste caso é bom saber que a
investigação
Pode demorar. De minha parte vou fazer
tudo para que consiga encontra-la o mais
rápido possível, porém isso não depende
apenas de mim. Tenho algumas pessoas
que trabalham comigo e vão nos ajudar,
mas o aconselho a tentar se acalmar,
porquanto a ansiedade atrapalha muito.
Nós vamos precisar que todos vocês se
recordem dos acontecimentos dos últimos
tempos. Você disse que sua mãe estava
deprimida e decidiu viajar para Europa.
Sabe a causa da depressão?
- Não. Ela dizia apenas que estava
cansada, sem vontade de viver. Eu era
além de Dinda, a única pessoa com a qual
ela se abria, contava coisas da sua
juventude etc. Quanto a essa depressão,
cansei de indagá-la sobre o motivo pelo
qual ela sentia-se tão infeliz e
desanimada, porém ela desviava o
assunto.
- É evidente que tinha algum motivo.
Você disse que ela se relacionava bem
com seu pai e era mais firme com seu
irmão. Ela não se dava bem com ele?
- Isso aconteceu porque desde muito
pequeno eu ficava muito agitado, via
coisas, ouvia vozes e ela achava que eu
estava doente e precisava de mais
aconchego.
- Você tem mediunidade?
- Sou hipersensível.
- Pode falar abertamente sobre o assunto.
Sou um estudioso do espiritualismo.
- Sinto-me aliviado. Minha mãe me levava
ao psiquiatra, eu tomava remédios fortes
que me deixavam mal, nunca mais contei
a ninguém o que acontecia comigo.
- Infelizmente, ainda a pessoas que se
recusam a perceber essa realidade. Você
pode utilizar essa capacidade para evocar
os espíritos do bem, para que o ajudem a
ficar mais calmo. Assim, talvez, possa
lembrar-se de algum fato que nos ajude a
encontrar o fio da meada.
- Estou feliz de encontrar alguém que
conhece essa
Realidade. Eu tenho uma amiga
espiritual, chama-se Analú. Ela tem me
ajudado sempre. Entretanto, neste caso,
ela apenas me diz para confiar e esperar.
- Certamente ela não pode dizer o que
você quer saber. Nem sempre os espíritos
têm permissão para intervir em nossa
vida. Só o fazem aqueles que ainda não
tem
Eles ficaram conversando durante mais
de uma hora até que Vitório levantou-se:
- Desculpe ter tomado tanto o seu tempo.
Você é ocupado e eu estou abusando.
- Não se preocupe. Meu pessoal está
fazendo o que é preciso. Mas quero que
você volte aqui amanhã cedo para
começarmos a trabalhar no caso. Esta
noite farei um roteiro para iniciarmos as
investigações.
Satisfeito, Vitório despediu-se querendo
já pagar pela consulta, o que Paulo não
aceitou.
- Não precisa pagar nada. Vamos precisar
de algum dinheiro para as primeiras
despesas, mas só saberei quanto, depois
de programar tudo.
Vitório deixou o escritório satisfeito. Além
de um detetive que lhe passava
segurança e firmeza tinha encontrado um
amigo.
Estava muito bom para um primeiro dia.
Foi para o hotel. Sentiu que estava com
fome, mas queria tomar um banho
primeiro.
Foi para o quarto, tomou um banho
rápido, enxugou-se e estendeu-se na
cama relaxar um pouco.
De repente, sentiu um arrepio
desagradável pelo corpo e uma leve
tontura. Percebeu alguém no quarto.
Apagou a luz e sentou-se, procurando
livrar-se daquela energia ruim que o
envolvia.
Concentrou-se e pediu ajuda espiritual.
Foi quando viu em um canto do quarto
dois vultos escuros. Fechou os olhos e
fixou-os melhor. Divisou um casal. Ele,
olhos
Esbugalhados; ela, olhos raivosos que
expeliam chispas de energias escuras em
direção de sua testa.
Vitório notou que ela trazia as mãos e o
pescoço sangrando, enquanto ele, o peito
cheio de cortes, sangue e um corte na
face.
Ela percebeu que tinha diante de si o
casal assassinado. Procurou reagir ao
mal-estar que o incomodava e esforçou-
se para fazer as perguntas que
castigavam se cérebro.
Foi quando ela, olhando-o com raiva,
disse com voz rouca e entrecortada:
- Vocês vão me pagar por tudo. Caí na
armadilha. Mas vou me vingar.
- Vocês não perdem por esperar!-
ameaçou ele.
Fazendo um esforço enorme, Vitório
perguntou para a mulher:
- Quem são vocês? Onde está minha mãe?
Onde arranjaram os documentos dela?
Eles não responderam e antes que Vitório
pudesse dizer mais alguma,
desapareceram, deixando uma nuvem de
poeira escura no lugar onde estavam.
Vitório conseguiu reagir e vencer o torpor
desagradável que envolvia sua cabeça,
ficando apenas com um ligeiro enjôo.
Novas perguntas continuavam
martelando seu cérebro. Por que eles
estavam com raiva da família? Que
ligações teriam com sua mãe? Por que
juraram vingança? Ele precisava
descobrir.
Foi ao banheiro, lavou o rosto, os pulsos,
enxugou-se e sentiu certa fraqueza.
Resolveu vestir-se e descer para jantar.
Precisava comer o quanto antes para
repor as energias.
Foi ao quarto do pai e soube que ele
pedira um lanche no quarto. Então,
convidou Dinda para jantar com ele.
Ambos desceram para o restaurante do
hotel. Assim que se sentaram à mesa, ela
comentou:
_ Você está com uma cara de quem viu
fantasmas! Pálido, onde andou o dia
inteiro?
_ Eu vi fantasmas mesmo. Pra você posso
contar. Em poucas palavras ele contou
tudo, inclusive à presença dos dois
espíritos em seu quarto desejando
vingar-se.
Dinda ouviu com interesse. Depois
comentou:
_ Você precisa rezar muito, meu filho.
Essas almas estão revoltadas.
_ Estão com ódio de nossa família. Você
sabe me dizer por quê?
_ Eu não! Por que deveria saber?
_ Porque mamãe lhe contava seus
segredos. Deve ter acontecido alguma
coisa para que eles nos odeiem tanto.
_ Não sei de nada. Você precisa
descansar. Está imaginando demais. Tem
de se alimentar bem e ir descansar.
Amanhã é outro dia.
_ É, amanhã é outro dia.
Ele não disse mais nada. Tratou de comer
e depois subiu para o quarto. Mas em sua
cabeça continuavam os questionamentos
em torno dos acontecimentos". "ONDE
ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 8
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"Três dias depois, Vitório, acompanhado
de Paulo, tocou a campainha da casa de
Marília. Assim que Dorita abriu a porta ele
disse:
_ Espero não ter vindo atrapalhar de
novo.
_ Seria bom que fosse verdade, mas hoje
estamos com uma pequena encomenda
que já foi entregue. Entrem, vou chamar
Marília.
Levou-os para sala e Marília apareceu em
seguida, acompanhada de Altair. Vitório
fez as apresentações:
_ Marília, Paulo advogado que está
disposto a nos ajudar. Você, penso que
seja Altair.
_ Muito prazer Dr.Paulo. Altair!
Cumprimente o Vitório e o Dr.Paulo.
O menino estendeu a mão e
cumprimentou os dois. Era um menino
bonito, parecido com a mãe, porém
estava um pouco abatido. Marília tornou:
_ Altair não foi à escola hoje. Está
resfriado. Mas sentem-se, por favor. Já
conhecem minha amiga Dorita...
Ela acenou com a cabeça e retirou-se
discretamente, levando Altair pelas mãos.
_ Você pretendia arranjar um detetive
particular. Mudou de idéia?
_ Não, o Dr. Paulo é um advogado que se
especializou em investigações. Naquele
dia em que estive aqui, pedi a uma
pessoa que me indicasse um detetive, e
ela me indicou o Dr. Paulo. Ele atendeu-
me no mesmo dia e concordou em nos
ajudar. Na manhã seguinte, apresentou-
me um plano para começar seu trabalho.
Eu queria naquele mesmo dia vir até aqui,
porém apareceu um apartamento
mobiliado para alugar e meu pai quis
mudar logo. Estava cansado de viver em
um quarto de hotel. Ele está muito
abatido, não se conforma com o que
aconteceu. Não se alimenta direito. Fez
uma lista de nossas coisas que ele queria
que nos mandassem e o caminhão da
nossa empresa trouxe. Eu precisei
auxiliar na arrumação e só hoje pude vir.
_ Você conseguiu tudo para Paulo
continuou: _ Já iniciaram as investigação?
_ Sim. Primeiro fui à delegacia conversar
com Monteiro, que conheço há anos.
Informei-me sobre os laudos e as
impressões dele sobre o caso.
_ Ele me parece um tanto devagar –
comentou Marília -, até agora não
conseguiu descobrir nada.
_ A senhora está enganada. Monteiro é
um homem sagaz, inteligente. Mas as
pistas são poucas.
_ Não me chame de senhora. Faz me
sentir velha. O que foi que o delegado lhe
disse?
_ Ele ficou contente por eu ter entrado no
caso. Já trabalhamos juntos outras vezes.
Eu pude ver as fotos do crime, os laudos
da perícia, as declarações contraditórias
dos familiares.
_ Qual a sua conclusão?
_ É cedo para isso. Vim conhecê-la.
_ Vai interrogar-me e dizer que sou
suspeita de haver cometido o crime?
A voz de Marília tinha um leve tom irônico
que não passou despercebido a Paulo,
que respondeu:
_ Não. Você nunca teria como cometer o
crime, mas poderia ter sido a mandante.
Marília não gostou e retrucou irritada:
_ Poderia se eu amasse meu marido
Paulo baixou o olhar para que ela não
percebesse o brilho satisfeito que
apareceu em seus olhos. Baixou o tom de
voz e tornou:
_ Você não se casou por amor?
Ela arrependeu-se de suas palavras e
tentou corrigir-se:
_ Eu tinha dezoito anos quando me casei.
Depois de dez anos de vida em comum a
rotina acaba com todas as ilusões.
_ Pois eu na vejo assim. As ilusões é que
nos levam à dor. A verdade é sempre
melhor. Você tem uma crença
equivocada. Acredita que a vida seja
responsável pelos sofrimentos. Isso é
mentira.
Marília tentou controlar a indignação ao
responder com certa ironia:
_ Você acha que quando uma jovem se
casa ela sabe o que está fazendo?
Conhece como vai ser sua vida conjugal e
seu relacionamento com o marido? O
casamento é sempre uma aventura onde
algumas têm sorte, outras não.
_ Você acha que não teve muita sorte,
não é?
Talvez pelas emoções dos últimos dias,
pela insegurança do futuro, a falta de
dinheiro, ela não conteve as emoções:
_ Você acha que é bom uma jovem
ingênua casar-se com um homem frio,
calculista, que faz de seu trabalho um
mistério contínuo, que nunca conversa
sobre o que pensa! Que dá pouco dinheiro
para a mulher, não a deixa sair de casa
nem a leva a nenhum lugar? Que olha o
filho como se fosse um desconhecido, não
brinca com ele nem lhe dá carinho? Que
quando ela quer se colocar, conversar
sobre o relacionamento ele torna-se
violento e a espanca?
Vitório, a olhava admirado. Vira em
Marília uma doce e delicada mulher, não
imaginava o que ela guardava no coração.
As lágrimas corriam pelas suas faces e ela
continuou com voz entrecortada:
_ Pode imaginar o que eu senti ao receber
a carta anônima e acreditar que
finalmente iria descobrir onde meu
marido passava as noites? Quando a
porta daquela casa que estava às escuras
se abriu a um leve toque e a curiosidade
fez-me entrar, e, mesmo tendo visto os
objetos revirados, a luz acesa do abajur
no quarto me fez caminhar até lá e ver
aquela cena horripilante que quando eu
fecho os olhos continuo vendo como da
primeira vez? Pode imaginar o medo que
senti? A vontade de fugir quando acendi a
luz do quarto e reconheci meu marido
com o rosto pálido, cheio de sangue,
deitado naquela cama? Sai correndo, os
trovões reboavam sobre minha cabeça
tanto quanto meu coração aterrorizado,
fazendo meu corpo tremer, enquanto a
tempestade molhava-me e um frio imenso
me invadia. Eu queria chegar à casa de
qualquer jeito. Nem sei como consegui.
Marília se levantara, tremia e soluçava
convulsivamente.
Paulo aproximou-se dela e abraçou-a com
carinho:
_ Ponha para fora toda mágoa, sua
mágoa, sua revolta, sua dor. Chore, você
tem motivos.
Descansando a cabeça no peito dele,
Marília soluçou por alguns minutos,
depois, aos poucos, foi se acalmando e
parou de chorar.
Paulo tirou um lenço e colocou-o na mão
dela que enxugou o rosto, separando-se
dele e dizendo envergonhada:
_ Desculpe. Eu não queria fazer isso.
_ Você precisava desabafar. Deve estar
se sentindo aliviada – disse Paulo sério.
Marília suspirou e respondeu:
_ Estou aliviada, mas envergonhada
também. Não costumo fazer cenas como
esta.
_ Eu, a, provoquei um pouco – disse
Paulo. _ Quem lhe pede desculpas sou eu.
Mas eu precisava, conhecê-la melhor.
Vitório estava admirado e desejou ser
solidário com ela:
_ Não se preocupe, Marília. Eu sou assim.
Outro dia chorei aqui diante de você e
Dorita. Não me envergonho mais. Sou
muito sensível e às vezes não dá para
controlar.
Marília entendeu a intenção dele e
procurou sorrir.
_ Vocês vão me dar licença. Vou lavar o
rosto. Não quero que Altair me veja
assim. Vou subir e já volto.
Pouco depois, Dorita entrou com uma
bandeja onde havia café e um prato com
salgadinhos.
_ Marília os deixou sozinhos?
_ Ela subiu, mas vai voltar logo –
respondeu Paulo.
Dorita serviu o café, colocou o pratinho
sobre a mesinha e Paulo perguntou:
_ Há quanto tempo você está com
Marília?
_ Mais ou menos nove anos.
_ Deve ter acompanhado o
relacionamento do casal.
Dorita olhou-o séria. Ela não iria falar
nada do que se passara naquela casa.
Paulo continuou:
_ Marília nos contou suas desilusões
tendo se casado tão jovem com um
homem violento e ignorante que nem
ligava para o filho.
_ Ela contou?
_ Toda a verdade. Emocionou-se, chorou
muito e subiu, para lavar o rosto. Não
quer que o menino a veja de olhos
vermelhos.
_ É de admirar. Ela não gosta de falar
nisso. Nunca contou a ninguém. Mas eu
sei o quanto ela sofreu com esse marido.
Para dizer a verdade, ninguém merece
morrer daquele jeito, mas eu fiquei
contente por ele não estar mais aqui.
_ Você não gostava dele?
_ nem um pouco. Um homem que fez o
que ele fez com uma mulher sincera, boa,
carinhosa como Marília, merece ser
castigado.
_ Eles brigavam muito?
_ No começo, sim. Ela não se conformava
com a maneira dele não falar aonde ia, o
que fazia e perguntava. Então, era a hora
que ele ficava violento e até a agredia.
Uma vez ela ficou com o braço roxo por
muitos dias porque ele bateu nela com
um cinto de couro. Aí, ela deixou de
questioná-lo. Mal se falavam. Só as coisas
de casa.
_ Eles dormiam no mesmo quarto?
Relacionavam-se intimamente?
_ Isso eu não sei. Quando ele estava em
casa dormiam juntos na cama. O que eu
sei é que ela tinha horror de dormir com
ele. Muitas vezes dizia que Altair estava
doente e ia dormir na cama dele.
Marília desceu as escadas. Havia se
esforçado para disfarçar, mas seus olhos
ainda estavam um pouco avermelhados.
_ Eu estava fazendo companhia às visitas
– explicou Dorita, sorrindo, fazendo
menção de retirar-se.
Marília disse:
_ Fique, Dorita. Para você não tenho
segredos. Onde está Altair?
_ Na copa, fazendo a lição.
_ Então ele melhorou.
_ Melhorou sim. Comeu um bom lanche.
_ Que bom. Estou aliviada.
Os dois tomaram café, comeram os
salgadinhos, depois Paulo levantou-se:
_ Agora temos de ir. O café estava
delicioso e os salgados fizeram-me
lembrar de vovó. Ela faz umas empadas
tão boas quanto as suas.
_ Coisas de avó têm sabor diferente –
disse Dorita. Quando tiverem vontade,
venha, experimentar nossos quitutes.
_ Viremos – respondeu Vitório.
_ Vou acompanhá-los até a porta – disse
Marília.
_ Voltaremos quando tivermos alguma
notícia sobre o caso – prometeu Paulo.
_ Não precisam esperar, venham quando
quiserem. Você disse que estou enganada
quanto à dureza da vida. Gostaria que me
explicasse por quê.
Os olhos de Paulo brilham alegres, e ele
respondeu:
_ Você não se esqueceu... Qualquer dia eu
voltarei para lhe explicar melhor.
_ Desculpe por eu ter ensopado seu
lenço. Quando voltar eu lhe devolverei
devidamente lavado e passado. Obrigada
por vocês terem suportado meu desabafo.
Eles despediram-se com beijinhos na
face. Depois daquele encontro com
Marília sentia que havia encontrado
verdadeiros amigos.
Uma vez no carro, Vitório tornou:
_ Outro dia quando estive aqui pensei que
Marília tivesse superado o assassinato do
marido. Mas hoje...
_ Quando chegamos, notei logo que ela é
uma pessoa bastante fechada e que não
gosta de falar sobre seus sentimentos.
_ No começo me pareceu que você estava
sendo muito duro com ela.
_ Eu a estava provocando para que se
abrisse.
_ Não sei como uma mulher tão delicada
como ela pôde suportar tantos anos de
convivência com aquele marido.
_ O fato é que ela não se separou e se ele
ainda estivesse vivo, continuariam juntos.
Isso me intriga. Mas ainda saberemos por
quê.
_ Agora vãos falar com papai. Ele está um
pouco melhor e concordou em conversar
com você.
_ Ontem, quando fui ao apartamento, já
que seu pai preferiu deixar para falar
comigo hoje, quis conversar com Dinda.
Mas ela esquivou-se, dizendo que
precisava cuidar do Sr.Alberto. Talvez
saiba mais do que contou ao delegado.
_ Não creio. Se soubesse de algo mais
teria me dito. Ela é assim mesmo, muito
dedicada. Está preocupada com ele
porque desde que veio para cá tem
estado calado, triste, inconformado e
sentindo-se fraco, casado. O médico veio
examinou, ele e disse que ele está com
depressão. Receitou um medicamento e
estimulou-o a reagir, pediu-lhe que fosse
andar pela manhã e procurasse
alimentar-se bem.
Uma vez no apartamento com Vitório,
Dinda disse que Alberto continuava no
mesmo. Não fora andar pela manhã
conforme a recomendação do médico,
alimentara-se mal e continuava deitado,
muito abatido.
Vitório foi falar com ele. Bateu levemente
na porta e entrou. Alberto estava deitado,
abriu os olhos e, vendo-o, fechou os
novamente.
_ Pai, Dinda disse que você não fez o que
o médico pediu.
_ Estou muito cansado. Não consegui
levantar.
_ Você precisa reagir. Não pode entregar-
se ao desânimo. Desse jeito vai acabar
doente de verdade.
Alberto não respondeu. Vitório sentou-se
na poltrona que estava na cabeceira da
cama e disse:
_ Pai, o Dr.Paulo veio comigo e está
esperando para conversar com você!
_ Resolva isso. Não tenho vontade de
conversar com ninguém. O que eu sabia
já falei para o delegado!
_ Nós precisamos descobrir onde mamãe
está. Não podemos perder tempo.
_ Às vezes penso que você está enganado
e que aquele corpo é dela. É impossível
existir alguém tão parecida e ainda estar
com os documentos dela.
_ Eu não penso assim e contratei o
Dr.Paulo para investigar. Não vou
descansar enquanto não descobrir o que
realmente aconteceu.
_ Fale com ele. Toda vez eu falo sobre o
assunto me sinto mal. É muito difícil para
mim.
_ Faça um esforço, pai. É preciso. Não vai
demorar. Não precisa se levantar. Sente-
se e eu vou colocar alguns travesseiros
nas suas costas. Estou lhe pedindo!
Alberto suspirou desanimado, mas
concordou:
_está bem.
Depois de ajudá-lo a sentar-se e
acomodá-lo, Vitório chamou Paulo, que
entrou em seguida.
Após os cumprimentos, Vitório pediu que
Paulo se sentasse na poltrona ao lado da
cama e disse:
_ Vou deixá-los à vontade.
_ Eu prefiro que você fique – pediu
Alberto.
Mas Paulo interveio:
_ É melhor ele sair.
Quando se viu sozinho com Alberto, Paulo
disse:
_ O senhor também tem certeza de que
aquele corpo não é de sua esposa?
_ Tenho minhas dúvidas. Há momentos
em que penso que seja dela. São muito
parecidas. Seria difícil existir duas
pessoas tão iguais.
_ Se o senhor está tão deprimido é
porque, apesar do que afirmam Vitório e
Dinda, no fundo está certo de que sua
esposa está morta.
_ Se ela estivesse viva, já teria nos
procurado, a não ser...
_ A não ser...
_ Nada. Desde que isso tudo começou não
tenho tido um momento de paz. Muitas
idéias surgem em minha cabeça e não sei
no que acreditar.
Paulo olhou firme nos olhos de Alberto e
perguntou:
_ Sua mulher tinha algum motivo para
não querer voltar para casa?
Alberto hesitou um pouco, depois
respondeu:
_ Nos últimos tempos, Teresa andava
deprimida. Não tinha motivação para
nada. E, de vez em quando, dizia que
sentia vontade de desaparecer, sumir.
_ Teresa não era feliz?
Alberto estremeceu:
_ Não acredito nisso. Eu sempre fiz tudo
por ela. Cerquei-a de luxo, carinho, bem-
estar. Ela não tinha motivo nenhum para
ser infeliz.
_ A que o senhor atribui à depressão
dela?
_ Não sei. O médico disse que poderia ser
da idade.
_ Como se conheceram?
_ Faz muito tempo e isso não deve
interessar ao caso.
_ Interessa muito. Eu desejo conhecer a
personalidade de Teresa, compreender
por que ela se sentia infeliz.
Alberto remexeu-se na cama um pouco
irritado:
_ Eu já disse: ela não se sentia infeliz.
_ Mesmo assim, quero saber como se
conheceram.
_ Em uma festa, na casa de amigos. Foi
amor à primeira vista. Ela era alegre,
bonita, cheia de vida. Passei a cortejá-la
e ela, a princípio, não queria nada, mas
depois acabou se interessando por mim e
nos casamos.
_ Quando foi que ela começou a mudar?
_ Bem, desde que nos casamos ela foi
mudando um pouco. É natural, antes era
solteira e não tinha uma família para
cuidar. Eu sempre procurei fazer de tudo
para que ela não tivesse de se preocupar
com nada, cerquei-a de empregados e
Dinda sempre fez tudo para que ela fosse
feliz.
_ Mas mesmo assim, ela sentiu-se
deprimida, angustiada nos últimos
tempos. Ela não lhe contou os motivos?
_ Não. Mas penso que não havia nada. Ela
adoeceu. Eu queria viajar com ela, mas
Teresa não quis. Ela me disse que queria
ficar longe de tudo, que só assim iria se
refazer. Embora triste, eu respeitei sua
vontade. Como não queria que ela fosse
sozinha, Teresa apresentou-me Elvira.
Elas viajaram juntas.
_ O senhor as acompanhou ao embarque?
_ Sim. Levei-as ao aeroporto e deixei-as
no salão de embarque.
_Quem mais as acompanhou ao
embarque?
_ Ninguém. Elvira disse que era do
interior e sua família não veio com ela
para o Rio de Janeiro.
_ Como era Elvira?
_ Uma mulher muito fina, elegante, bem
vestida, com várias malas.
_ Como era fisicamente?
_ Alta, loura, esguia, olhos castanhos, não
aparentava ter a mesma idade de Teresa.
Era mais conservada.
_ É importante que se recorde dela. Essa
mulher pode ter todas as respostas do
que aconteceu.
_ Eu me arrependo de haver confiado
nela, sem querer saber seu endereço,
conhecer sua família. É que ela pareceu-
me tão fina, tão educada que não tive
coragem de perguntar nada. Nunca
poderia imaginar que fosse acontecer
alguma coisa ruim. Depois, Teresa
conversava com ela com alegria e eu até
pensei que sua companhia poderia ajudá-
la a se recuperar.
Paulo colocou a mão no braço de Alberto
e disse, olhando firme em seus olhos:
_ Eu prometo que vou descobrir toda a
verdade. Quero que me ajude. Para isso
precisa reagir, sair dessa cama, porque só
quando estiver melhor é que poderá se
recordar de mais algum detalhe. Tenha
em mente que qualquer coisa que se
lembre, por mais insignificante que lhe
pareça, pode ser o fio da meada que
procuramos.
_ E você, o que pensa de tudo isso?
Acredita que Teresa esteja morta?
_ Ainda não tenho uma opinião definida.
Estou começando a investigar. O que sei é
que o homem que foi morto naquela
cama, além de violento, levava vida
suspeita.
_ Isso me atormenta. Como Teresa
poderia envolver-se com um homem
daqueles?
_ Não se atormente. Ainda não temos
certeza de nada. Pode ser que Teresa
nunca o tenha conhecido.
_ Mas e os documentos?
_ Podem ter sido furtados. O que mais me
intriga é a semelhança. Mas se não for
Teresa, vamos descobrir quem é essa
mulher. Não se deixe abater antes da
hora. Levante-se e cuide da sua saúde. O
senhor deve confiar que dias melhores
virão.
_ Obrigado pelo conforto. Vou levantar-
me, tomar um banho para ver se me sinto
melhor.
_ Enquanto isso vou conversar com
Dinda, mas ficarei esperando para
tomarmos um café juntos.
Paulo saiu do quarto e Vitório o estava
esperando do lado de fora:
_ E então?
_ Ele vai se levantar, tomar um banho e
depois tomaremos um café juntos. Agora
quero falar com Dinda.
Ela estava na sala, ouviu a conversa e
respondeu:
_ Agora eu não posso. Vou preparar um
bom lanche para o Sr.Alberto e um café
reforçado.
Paulo sorriu e respondeu:
_ Conversaremos depois do café.
Dinda apressou-se a ir para a cozinha".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 9
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"Osmar chegou ao escritório da empresa
nervoso. Refugiou-se em sua sala,
sentou-se diante da mesa e manuseou a
correspondências que chegara durante os
dias em que estivera ausente.
Nenhuma notícia importante. O que ele
temia não tinha se concretizado.
Talvez seus adversários tivessem se dado
por satisfeito com o que fizeram e dali
para frente não o incomodassem mais.
Apesar do golpe sofrido, ele podia dar-se
por feliz com o resultado alcançado.
Pagara um favorável.
Podia tocar a vida para frente, sem que
ninguém desconfiasse. Seu pai estava
adoentado, deprimido, não se interessava
mais em controlar a empresa. Ele poderia
fazer tudo o que sempre sonhara.
Quando entrasse mais dinheiro, ele
poderia pagar o que devia e assim, limpar
o caminho para continuar seus negócios.
Quando vendesse aquela mercadoria
estaria rico. Muito rico.
Não haveria limites para ele. Em pouco
tempo triplicaria o capital. Com a mãe
morta, o pai ausente, e um irmão que não
tinha tino comercial nem se interessava
pelos negócios da família, ele teria
controle de tudo.
Se Vitório o incomodasse, o internaria em
uma casa de saúde de onde não o
deixaria mais sair.
Ele não notou que alguns vultos escuros o
abraçaram, dizendo-lhe:
- Você merece! É o mais inteligente, o
mais lúcido o único que sabe mandar.
- Família só serve para atrapalhar. Você
não precisa dela...
Embora Osmar não ouvisse as palavras,
pensava:
"Não preciso de ninguém. Vou ser muito
rico e então terei o mundo a meus pés.
Quero ver se Aurélia continuará
indiferente depois que eu me tornar rico e
poderoso! É ela quem virá arrastar-se a
meus pés, implorar pelo sei amor".
Nessa divagação, Osmar a imaginava em
seus braços, louca de amor, desejando
seus beijos, submetendo-se à sua
vontade.
A esse pensamento sorria enlevado. Para
obter isso, faria qualquer coisa. Tiraria do
seu caminho qualquer um que dificultasse
seus planos.
Ele era um vencedor. Nenhuma mulher
poderia rejeitá-lo como Aurélia fizera. Há
dois anos, quando ele se declarara e a
pedira em casamento, ela rira da sua
emoção, tripudiara sobre os seus
sentimentos.
Rejeitado e vingativo, ele jurara
conquista-la de qualquer forma. Era
questão de honra. Essa mulher tão
requestada, admirada em sociedade,
ainda se atiraria em seus braços.
Desde essa época, planejara que o
primeiro passo seria
Conseguir o que pretendia.
Ele não queria esperar. Tinha pressa,
muita pressa. Então, resolveu entrar na
marginalidade. Depois de pesquisar,
decidiu entrar no comércio de drogas.
Às escondidas, relacionou-se com
viciados, fingindo-se ser um deles e
conheceu alguns traficantes. Procurou os
maiores. Assim que se sentiu bem
informado, começou a desviar dinheiro da
empresa para negociar drogas.
Foi devagar. Fazia pequenos negócios. O
pai era muito ativo, vigilante, assinava os
cheques, participava de tudo e ele não
tinha como fazer o que planejara
rapidamente.
Mas com o tempo, tendo conseguido
aumentar os negócios da empresa de
maneira regular, captou a confiança de
Alberto, que dividia com ele tarefas mais
importantes. Osmar sempre fora o filho
preferido dele, que sonhara deixar a
empresa para os dois filhos. Vitório não
se interessava e, além disso, por ser
hipersensível, acreditava que o filho fosse
doente.
O interesse do pai pelo trabalho irritava
Osmar, desejoso de levar os planos
adiante.
Cada vez que ele via Aurélia assediada
por outros homens, alguns dos quais mais
importantes financeiramente do que ele
sofria crises de ciúmes. Como não podia
manifestar o que sentia, recolhia-se em
casa e repassava seus planos como forma
de enfrentar sua raiva.
Aurélia, linda, indiferente ao assédio
masculino, moça culta e rica, só pensava
em divertir-se, aproveitar sua mocidade.
Não desejava amarrar-se em um
casamento que tiraria sua liberdade. O
casamento dos pais e a convivência com a
vida formal, ausente de amor que eles
levavam e que ela odiava , fizeram-na
fugir desse tipo de compromisso.
Gostava de ir às praias, cantar, dançar,
freqüentar festas.
E lugares da moda, viajar. Filha única de
pais condescendentes fazia sempre o que
queria, sem se preocupar com nada que
não fosse seu prazer de viver.
Mesmo assim, pela sua beleza, sua
alegria e espontaneidade, eram amadas
por todos e sempre bem recebida onde
aparecia; sua reputação era muito boa.
Osmar sonhava em te só para si. Em ser
exclusivo na vida dela. Era possessivo e
não se conformava com a vida que ela
levava. Imaginava que quando se
casassem, (ele não divisava que
conseguiria isso) ela teria de fazer tudo
com ele queria.
O telefone tocou e ele atendeu:
- É você? Por que está ligando para cá?
Eu lhe disse para nunca fazer isso.
- É que precisamos conversar. Surgiu um
problema.
- Eu lhe pago para evitar problemas. Aqui
não quero tratar do assunto.
- Tenho urgência em conversar com você.
- Está bem. Hoje mesmo vou ter com
você.
- O quanto antes. Estarei esperando.
- Não ligue mais para cá.
Osmar desligou o telefone irritado. Um
problema agora seria perigoso.
Alguém bateu e ele lembrou-se de que
não havia destravado a porta. Foi abrir.
- O senhor desculpe, mas está aqui o Dr.
Nunes para tratar do caso do Anselmo.
Era uma causa trabalhista e Nunes era
advogado da empresa.
- Eu tenho um compromisso importante e
preciso sair,
- O Dr. Nunes disse que tem urgência. A
audiência é amanha e o risco de a
empresa perder é grande.
- Ele pode entrar, mas que seja breve.
O advogado entrou e embora Osmar
desejasse sair
Logo, o caso era complicado e ele
precisou ficar mais tempo do que
pretendia.
Só conseguiu deixar a empresa uma hora
e meio mais tarde. Apanhou o carro,
deixando-o no posto para lavagem. Disse
ao atendente:
- Capriche. Tenho um compromisso, volto
daqui à uma hora.
- Sim, senhor.
Osmar parou um táxi, deu o endereço e
foi rumo ao subúrbio. Quando o carro
parou diante da casa modesta, ele desceu
dizendo:
- Pode esperar. Não vou demorar.
Osmar deu três batidas, a porta abriu e
ele entrou. Um rapaz moreno, franzino,
cabelos revoltosos, gestos nervosos disse
logo:
- Puxa como você demorou!
- Não estou a sua disposição, sou um
homem ocupado. O que é tão urgente que
me fez largar tudo e correr até aqui¿ Sabe
que não gosto que nos vejam juntos.
- Hoje era dia de visitas e eu fui até o
sanatório. Mas os médicos me chamaram
e disseram que ela não pode mais ficar lá.
Está dando muito trabalho e eles querem
que ela vá para outro lugar.
- Isso é um absurdo. Eles que coloquem
uma camisa de força.
- É melhor ir falar com o Dr. Ernesto. Eles
se negam a fazer isso. Estou precisando
de dinheiro. O que você deu acabou o Jair
está reclamando.
Osmar pegou a carteira e deu algumas
notas dizendo:
- Agora só tenho isso. Amanha mesmo
deposito mais naquela conta.
- Está bem.
Osmar saiu, entrou no táxi, foi pegar o
carro no posto de gasolina e voltou para a
empresa.
Assim que chegou, ligou para o pai.
Precisava saber como estava à
investigação sobre o crime. Dinda
atendeu:
_Quero falar com papai.
_É melhor ligar mais tarde. Ele está
conversando com o advogado e não pode
ser interrompido.
_Advogado? Para que? Nós já temos um.
Vitório apanhou o telefone:
_Sou eu, Osmar. Papai está ocupado.
_Que história é essa de advogado? Nós já
temos um.
_Ele é o investigador que contratei para
descobrir onde mamãe esta.
_Você continua com essa maluquice?
Mande-o embora. Não há nada para
investigar. Quero falar com papai agora
mesmo.
_O assunto é importante e não vou
interromper. Papai não está bem de
saúde e não vou deixar que você perturbe
ainda mais a cabeça dele. Se quiser falar
com ele ligue daqui à uma hora.
Vitório desligou o telefone e Osmar fixou
com muita raiva. Ele precisava ter
controle de tudo e não podia permitir que
Vitório continuasse investigando.
Respirou fundo e procurou controlar a
irritação. Precisava de serenidade para
decidir os próximos passos.
A secretária entrou e entregou-lhe alguns
recados anotados durante sua ausência.
Ele passou os olhos rapidamente e
deteve-se em um que dizia: "Aniversário
de casamento do coronel Vilela às vinte
horas".
_Preciso me preparar. Não posso perder
essa festa. Aurélia com certeza estará lá.
Chamou a secretária e indagou se o
presente do casal Vilela havia sido
enviado. Havia escolhido uma dúzia de
rosas em um lindo arranjo e colocara
dentro uma caixa de veludo com uma jóia
para a esposa do coronel.
Sabia que agradando a esposa, teria
atenções do coronel. Ele não escondia a
paixão que sentia por ela. Recebera a
informação de que tudo fora feito
conforme pedira. Osmar tratou de fazer o
que era urgente e depois foi para casa.
Queria descansar e preparar-se com
esmero para ir à festa.
Faltavam alguns minutos para as vinte e
um horas quando Osmar parou o carro
diante dos portões da casa do coronel
Vilela e, entrou na alameda principal que
conduzia à entrada da casa.
Assim que parou diante da porta aberta
que dava para o saguão, um rapaz
elegante, vestindo um terno preto, abriu
a porta do carro dizendo:
_Boa noite, doutor. Pode entrar, eu cuido
do carro.
_Obrigado.
Osmar entrou no saguão finamente
mobiliado; havia muitas flores e podia se
ouvir a musica que vinha do salão de
festas.
O coronel Vilela e Ester, sua esposa,
estavam no saguão e apressaram-se a
dar-lhe as boas-vindas. Ele era alto;
forte; moreno; olhos, cabelos e bigodes
castanhos; aparentava cinqüenta anos e
vestia-se com sua farda de gala. No peito
algumas medalhas. Ela era alta, magra,
elegante e loura, demonstrava uma
postura altiva dentro de um vestido azul-
noite. Portava algumas jóias de
brilhantes que ressaltavam mais a beleza
do seu vestido.
Osmar cumprimentou, desejando
felicidades pelos vinte e cinco anos de
casamento. Trocaram algumas palavras
rápidas, pois vários convidados estavam
chegando e desejavam cumprimentar o
casal.
Osmar entrou no salão olhando em volta e
sorriu satisfeito. Estava diante da melhor
sociedade do Rio de Janeiro. Alguns
políticos, mas Aurélia não estava.
Ele sabia que ela costumava chegar
sempre depois das onze, quando a festa
estava no auge da animação. Osmar
Cumprimentou alguns casais amigos e
depois se deteve ao lado de Merca, a filha
mais velha do casal Vilela:
- Você está linda como sempre. Fica-lhe
muito bem esse vestido cor de prata.
- Obrigada. Você sabe se Vitório virá¿
Ela sabia que os dois irmãos não saíam
juntos.
- Não. Ele viajou com papai.
Mércia ficou silenciosa pro alguns
segundos. Havia lido os jornais, mas por
delicadeza evitou comentar o assunto.
- Eu não esperava que Você viesse... Isto
é... Eu pensei que você estivesse fora do
Rio.
Osmar assumiu um olhar triste. Baixou a
cabeça e respondeu:
- Eu vim porque não poderia deixar de
cumprimentar seus pais neste dia tão
importante para eles, e também para
tentar esfriar um pouco a cabeça e sair da
angustia que tem me consumido. De nada
adiantaria eu ficar em casa sofrendo, sem
poder nada para solucionar o problema.
- O momento não é próprio e não quero
ser indelicada, mas tanto eu como minha
família, sentimos muito o que lhes
aconteceu. Eu li que a policia não tem
certeza da identidade da mulher que foi
morta.
- De fato, esse é um problema difícil e a
causa da nossa angustia. Mas mudemos
de assunto, não quero entristecê-la em
uma noite que deve ser de alegria e
prazer.
alguns não disfarçavam a curiosidade,
olhando-o de forma diferente.
Se não fosse pela vontade de ver Aurélia
e a esperança de que o notasse um pouco
mais, ele não teria ido.
Pensando melhor, decidiu adotar o ar de
vitima, fingindo estar abalado com os
acontecimentos. Em vez de fingir que
nada acontecera, o melhor seria falar no
assunto, mas de forma que as pessoas
sofressem com sua desgraça e o vissem
como um filho vivendo a perda não
apenas da mãe, mas também da honra.
Os artigos dos jornais exibindo os corpos
mortos, meio desnudos sobre a cama, não
deixavam dúvida quanto ao
relacionamento dos dois.
Osmar era inteligente o bastante para
entender que ele nada valeria negar o
fato. Mas se ele assumisse o choque, a
dor terrível daquele acontecimento, iria
se tornar uma vitima, as pessoas iriam
aconchegá-lo, tentando minimizar seu
sofrimento.
Tendo decidido isso, Osmar adotou um ar
melancólico, isolou-se e percebeu que
alguns que antes o olhavam com
curiosidade, passaram por ele, dando-lhe
palmadinhas nas costas, sem dizer nada,
mas querendo demonstrar que entendiam
sua dor e estavam solidários.
Osmar observava a tudo, rindo por
dentro, pensando em como as pessoas se
iludem facilmente.
Aurélia chegou dentro de um vestido cor
de mel. Seus olhos verdes contrastavam
com o dourado de seus cabelos e
combinavam com o colar e os brincos de
esmeraldas que ele usava com distinção.
Ela entrou no salão ignorando o
burburinho que se fez com sua chegada.
Olhando em volta, dirigiu-se a Mércia e
abraçou-a com carinho:
- Você está linda.
- Não tanto como você.
As duas se conheceram na infância. Suas
famílias se visitavam e desde aqueles
tempos elas tornaram-se amigas.
Osmar aproximou-se, olhando Aurélia
com admiração
- Como vai Aurélia¿- indagou ele, com voz
triste.
- Bem. Não pensei vê-lo aqui esta noite.
Osmar suspirou triste e respondeu:
-Há momentos na vida em que é preciso
superar a dor e reagir.
Aurélia não se comoveu com o tom dele:
_ Quando a pessoa não está bem, é
melhor ficar em casa para não incomodar
a alegria dos outros.
_ Pois eu vim buscar um pouco mais da
sua alegria para tentar sobreviver.
_ Não conte comigo para isso. Eu me sinto
muito alegre nesta noite e não divido esse
estado com ninguém. Com licença, vou
cumprimentar alguns amigos.
Ela afastou-se e Osmar mordeu os lábios
com raiva. Era intolerável a maneira como
Aurélia o tratava. Mércia tentou suavizar:
_ Aurélia gosta de brincar. Não leve a
sério o que ela disse. Eu estou muito
contente por você ter vindo.
_ Obrigado pelo carinho.
_ Estes dias tenho pensado muito em
Vitório. Quisera poder fazer alguma coisa
para consolá-lo.
_ Ele faz muito drama e sofre mais por
esse motivo.
_ O que aconteceu não foi um drama para
você?
Osmar retomou o ar triste que esquecera
por alguns instantes:
_ Foi um drama para toa nossa família.
Mas enquanto eu reajo, tento disfarçar a
dor que estou sentindo, ele exagera
porque foi sempre muito mimado.
_ Cada um tem uma forma de encarar os
fatos.
Algumas pessoas chegaram para
cumprimentar Mércia e Osmar afastou-se.
Sua atenção estava sobre Aurélia.
Quem era aquele desconhecido com o
qual ela conversava animadamente? Um
rapaz alto, louro, corpo atlético,
elegantemente vestido, cujos olhos azuis
a olhavam com admiração? Ele precisava
descobrir. Aurélia não costumava dar
tanta atenção a um rapaz.
Pouco depois, antes que ele pudesse
satisfazer sua curiosidade, viu o casal
dançando, um olhando nos olhos do
outro, e a custa controlou o ciúme. Teve
vontade de ir lá e arrancar Aurélia dos
braços dele.
Aproximou-se da dona da casa, dizendo:
_ Parabéns pela linda festa!
_ Obrigada. Sinto muito ao que aconteceu
com sua família. Fico-lhe muito grata por
ter vindo nos cumprimentar, apesar dos
momentos difíceis que estão passando.
Osmar baixou o olhar, fingindo tristeza.
_ Eu não poderia deixar de vir
cumprimentá-los em nome de nossa
família. Meu pai e meu irmão estão em
São Paulo esperando a solução do caso.
Depois, aqui todos são nossos amigos e
eu me sinto mais aconchegado junto a
vocês. Só não conheço aquele rapaz que
está dançando com Aurélia.
Ela olhou o casal dançando e respondeu:
_ Aquele é o doutor Augusto Mendonça,
médico. O pai dele é muito amigo de meu
marido.
_ Eu nunca o tinha visto.
_ Nem poderia. Ele morava nos Estados
Unidos até semana passada. Voltou ao
Brasil para dedicar-se a pesquisas
científicas patrocinadas por uma
universidade americana.
_ Nota-se que é um moço fino e bem-
nascido.
_ De fato. Além de lindo ele é tudo isso e
muito mais.
Osmar tentou ocultar a raiva, baixando os
olhos. A partir daquele momento, ele não
teve mais paz.
O casal continuava dançando e
conversando. Aurélia parecia estar muito
bem ao lado dele, tratava-o muito
diferente do que costumava tratar seus
admiradores.
Quanto mais Osmar os via juntos, mais
pensava que precisava ultimar seus
projetos para que não viessem a
fracassar.
No dia seguinte tomaria novas
providências a fim de conseguir o que
desejava. Não seria por causa de um
intruso que ele iria perder Aurélia. Seria
muito bom que esse doutorzinho não se
metesse no seu caminho, porque ele
estava disposto a afastar todos os
obstáculos". "ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA
GASPARETTO

CAPÍTULO 10
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"Depois do café, Dinda não saia da
cozinha e Vitório foi buscá-la:
_ O Dr.Paulo está esperando.
_ Tenho que lavar esta louça. Agora não
posso.
Ele puxou-a pelo braço:
_ Pode sim. A louça pode esperar.
Dinda lançou-lhe um olhar irritado, mas
não teve como resistir, pois, ele
continuava segurando seu braço e
olhando-a sério.
_ Vai indo que eu já vou.
_ Não. Só saio daqui com você.
_ Está bem. Eu vou.
Ela lavou as mãos, enxugou-as, tirou o
avental e acompanhou Vitório até a sala.
_ Vou deixá-los a sós para que possam
conversar à vontade.
_ Sente-se, Dinda.
Ela obedeceu de cara fechada.
Paulo acendeu um cigarro com calma, deu
algumas baforadas, depois disse com voz
suave:
_ Você me parece nervosa. Não tenha
receio. Estou aqui como amigo. Não sou
policial.
_ Não tenho medo da polícia.
_ Notei que estava fugindo de mim.
_ Não estava fugindo. É que sou muito
ocupada. Estou sozinha para dar conta de
todo o serviço e ainda cuidar do
Sr.Alberto. Não posso perder tempo com
conversa.
_ Não vou demorar. Só quero fazer-lhe
algumas perguntas.
_ Tudo o que eu podia dizer, já disse ao
delegado. Eu acho que Vitório está
exagerando. É a polícia que
tem de investigar quem matou aqueles
dois.
_ Também acha que o corpo da mulher
assassinada não é de Teresa?
_ Tenho certeza.
_ E como explica o desaparecimento dela?
_ Eu penso que qualquer dia desses, ela
vai telefonar ou escrever dizendo onde
está.
_ Não acredita que ela possa estar em
perigo?
_ Não. Quando ela saiu para viajar estava
cansada e deprimida. Disse-me que
queria muito ficar só, sem ver ou falar
com ninguém. É isso que deve estar
acontecendo e o povo fazendo tanto
barulho.
_ Você a conhecia bem, sabe por que ela
estava tão triste e desanimada?
_ Isso não sei. Não costumo me envolver
na vida íntima dos meus patrões.
_ Vitório disse que você era íntima dela e
que Teresa lhe fazia confidências.
_ Só sobre os problemas dos meninos ou
da casa.
_ Ele disse também que vocês se davam
muito bem.
_ Eu gosto muito de D.Teresa e esta
família é como se fosse a minha.
_ Onde está sua família?
_ Meu pai morreu quando eu era menina
e minha mãe me deu para os pais dela. Eu
tinha treze anos, a mesma idade de D.
Teresa.
_ Vocês foram criadas juntas. Duas
adolescentes são natural que entre vocês
tenha se desenvolvido uma grande
amizade. Você faria qualquer sacrifício
para que sua amiga fosse feliz?
_ Isso é verdade. Eu gostei dela desde o
primeiro dia.
Ela sempre me tratou bem, deixava-me
brincar com seus brinquedos, dividia
comigo tudo o que comia, dava-me
vestidos novos, sapatos e me ensinava a
falar direito. Foi ela quem insistiu para
que eu freqüentasse a mesma escola que
ela.
_ Então você tinha mesmo que gostar de
Teresa.
_ Eu gosto muito dela e aprendi a gostar
dos meninos que ajudei a criar.
Paulo ficou calado por alguns instantes,
tirando baforadas do cigarro, depois disse
com a voz calma:
_ É natural que você guarde os segredos
que ela lhe contou e não queira contar
nada a ninguém.
Dinda fez um gesto e ia retrucar, mas
Paulo não lhe deu tempo e continuou:
_ Mas eu gostaria que você soubesse que
eu, pelas informações que colhi na polícia,
e por tudo que conversei com a família de
Teresa, acredito seriamente que ela
esteja correndo perigo. Acredito também,
que você sabe mais do que quer contar e
compreendo que pense estar sendo fiel a
sua amiga e protegendo-a, guardando
seu segredo. Mas eu temo que, fazendo
isso, você a esteja prejudicando. Se ela
estiver precisando de ajuda, e você não
nos contar o que sabe, pode acontecer
algo muito grave a ela e você será
responsável.
As palavras de Paulo a assustaram, ela
não conseguia encobrir a inquietação e
torcia as mãos nervosamente.
_ Deus me livre, doutor. Não posso
imaginar uma coisa dessas.
_ Não desejo assustá-la, mas é bom se
lembrar de que estamos lidando com um
assassino cruel que matou aquele casal
de maneira feroz e, embora você não
reconheça o corpo como sendo de Teresa,
os documentos dela estavam lá. Como
pode ter acontecido isso?
_ Não sei... – balbuciou ela, continuando
a torcer as mãos.
_ Há uma ligação direta de Teresa com
esse crime. Você não pode ignorar esse
detalhe. Além do que o homem
assassinado era ligado a traficantes
perigosos. Essa gente mata por qualquer
motivo.
A essa altura, Dinda já estava chorando
aflita:
_ O senhor acha mesmo que D. Teresa
pode estar em perigo?
_ Pode. Não há como negar. Por esse
motivo é que Vitório me contratou porque
eu, embora não seja da polícia, sou
advogado e gosto de investigar casos
complicados.
_ Acha que vai conseguir descobrir onde
D. Teresa está e saber se ela está bem?
_ As pistas são poucas e a situação é
difícil. Por esse motivo é que estou
pedindo. Se você sabe de alguma coisa, é
hora de contar pelo menos para mim, que
serei discreto e se possível guardarei o
segredo, desde que não atrapalhe a
solução do caso.
_ Se o senhor descobrir onde ela está e
ela estiver bem, sem correr nenhum
perigo, promete que não vai para a
família?
_ Você acha justo isso? O Sr.Alberto
doente, Vitório aflito, Osmar nervoso. Eles
amam Teresa.
_ Nem todos. O Sr. Alberto deve estar
doente de remorso e Osmar nervoso
porque ainda não pôde por a mão na
herança da mãe.
_ Os olhos de Paulo brilharam satisfeitos.
Aos poucos ele estava fazendo Dinda
falar. Fingiu aceitar suas palavras com
naturalidade.
_ Os problemas de família são sempre os
mesmos.
_ Eu não devia ter falado isso. Mas em
casa, eu e Vitório somos os únicos que
compreendemos e amamos Teresa.
_ Eu admiro você porque apesar de saber
tudo isso, tem se dedicado a tratar do
Sr.Alberto com carinho.
_ Quero dormir em paz. Não sou capaz de
maltratar nem um gatinho.
_ É por esse motivo que Vitório gosta
tanto de você.
_ E eu dele.
_ Ainda não conheci Osmar, Vitório me
disse que ele tem gênio difícil.
_ Quando quer uma coisa, não descansa
enquanto não consegue e para isso não se
importa de machucar os outros.
_ Você gosta mais de Vitório, não é?
_ É verdade, eu deveria gostar dos dois
igualmente, pois ajudei a criá-los desde
que nasceram. Mas como Vitório, é
amoroso e cordato, bom de lidar, tanto eu
como Teresa o tratamos melhor. Osmar é
muito ciumento e odeia o irmão, diz que
nós duas estragamos o Vitório. Mas não
para sermos bons com Osmar, ele é
mentiroso, maldoso, irritado, mal-
humorado, teimoso. Não podemos tratá-lo
do mesmo modo.
_ Eu concordo. Gostaria que você
soubesse que eu estou aqui para ajudá-
los não a penas a encontrar Teresa e
trazê-la de volta sã e salva, mas também
para que a família possa se entender
melhor. Certamente, depois do susto que
todos passaram, se ela voltar para casa,
eles vão ser diferentes. O Sr.Alberto terá
chance de consertar o que fez de errado e
Osmar de tratar melhor o irmão e a
família.
_ Ah! Isso é o que eu mais desejo. Pobre
da minha Teresa! Ela não suportava mais
a vida aqui em casa! Eram tantos os
desentendimentos...
Paulo notou que Dinda não se referia
mais a Teresa chamando-a de senhora,
revelando o tanto de intimidade que
usufruía ao lado dela. Fingiu que não
percebeu e continuou:
_ Mas para fazer o que eu desejo, tenho
que encontrar o assassino e ter a certeza
de que ninguém mais desta casa corre
perigo.
_ Como assim? O senhor acredita que
todos nós estamos correndo perigos?
_ Não posso descartar essa hipótese por
causa da ligação com o criminoso. A
mulher morta é muito parecida com
Teresa e o assassino pode ter confundido
as duas.
_ Teresa não tinha inimigos. Já o Sr.
Alberto...
_ Tinha algum desafeto?
_ Eu não quis dizer isso.
_ Já que começou, acabe. Você sugeriu
que ele não se dava muito bem com as
pessoas.
_ Coisas de negócios. Não entendo disso.
Mas algumas vezes um homem ligava
ameaçando ele.
_ Ameaçando de quê?
_ Não sei! Mas o Sr.Alberto ficava muito
irritado. Uma vez, logo depois de um
telefonema desses, eu o vi limpando a
arma que estava guardada no armário do
quarto.
_ Ele costumava andar armado?
_ Não. Isso não. Por esse motivo eu
estranhei quando naquele dia ele passou
a tarde limpando e lustrando aquele
revólver.
_ O revólver continua guardado no
mesmo lugar?
_ Um dia eu vi que ele estava guardado
lá, do mesmo jeito.
_ Como era o gênio do Sr.Alberto? Como
se relacionava com a família?
_ Sempre gostou mais do Osmar porque
ele se interessou pela empresa. Vitório é
diferente.
_ Em quê?
_ É mais amoroso e gosta de estudar as
coisas da vida.
Não quis seguir os negócios do pai.
Formou-se em letras. Dá aulas na
faculdade.
_ Ele me disse que está de licença e só
volta a trabalhar depois que tudo estiver
esclarecido.
_ É, ele não se conforma com o que
aconteceu. Quando vi que aquele corpo
não era de Teresa, fiquei calma, mas
agora, depois do que o senhor disse,
estou angustiada.
_ Teresa dava-se bem com o marido?
_ Ela não se casou por amor. Depois que o
pai dela morreu e deixou muitas dívidas,
a mãe dela, D.Mary, ficou em uma
situação difícil. Por esse motivo fez de
tudo para que ela aceitasse o pedido de
casamento do Sr.Alberto, rapaz rico e
bem posicionado. Teresa não queria se
casar, mas a mãe adoeceu e elas não
tinham dinheiro para fazer o tratamento.
Ele fez tudo para que D.Mary ficasse boa,
colocou à disposição os melhores
especialistas, pagou todas as despesas,
até que ela se curou.
Dinda fez ligeira pausa, olhos perdidos no
passado, e continuou:
_ Muitas coisas aconteceram naqueles
dias. Teresa estava apaixonada por um
jovem estudante de medicina, mas um
dia, desiludida do seu amor, acabou
aceitando casar-se com o Sr.Alberto para
alegria de sua mãe. Quando voltaram da
viagem de lua-de-mel, eles foram morar
em uma linda casa e fui com eles.
_ Por que ela de desiludiu do estudante
de medicina?
_ Eles se encontravam as escondidas
porque D.Mary não queria o namoro. Dizia
que ele era pobre e demoraria anos para
se formar. Que ela precisava se casar com
um homem rico que pudesse dar-lhes
uma vida boa. Ela saía escondido! E eu
encobria porque ela ficava muito feliz
quando o encontrava. Eles trocavam juras
de amor e juravam unir-se para sempre.
Mas uma noite ela voltou chorando muito
e disse que ele não era sincero, pois o
surpreendeu namorando outra.
_ Por esse motivo ela desistiu dele?
_ Sim. Ele tentou de todas as formas
reata - disse que podia explicar tudo,
mas ela não o ouviu. Cheia de mágoa,
marcou o casamento, casou-se e mudou
de cidade. Nem sei por que estou lhe
contando tudo isso. Esse passado está
morto e enterrado.
_ Alberto sabia que ela se casou estando
apaixonada por outro?
_ Sabia. Teresa sempre foi sincera.
Contou tudo a ele que não se importou e
casou-se assim mesmo.
Dinda levantou-se
_ Estamos aqui conversando sobre coisas
que nada tem a ver com o seu assunto. Eu
tenho de ver se o Sr. Alberto está
precisando de alguma coisa.
_ Responda-me apenas mais uma
pergunta. Como era o relacionamento
dela com o marido?
Dinda sentou-se novamente:
_ Apesar de casar sem amor, ela tornou-
se uma ótima esposa, dedicada,
atenciosa, mãe extremosa.
_ Mas você disse que ele deveria estar
doente de remorso. Por quê?
_ Eu falei demais.
_ Apesar de amar muito Teresa, Alberto
não foi feliz com ela. Uma pessoa feliz não
comete atos dos quais venha a se
arrepender.
_ Ela sempre foi muito boa, tolerava as
implicâncias dele com Vitório e suas
escapadas com outras mulheres.
_ Ele tinha outras mulheres?
Dinda levantou-se de novo:
_ Eu fui longe demais. Não vou dizer mais
nada Não estou aqui para falar mal dos
meus patrões. Não costumo fazer isso.
Espero que se esqueça de tudo o que eu
lhe disse. Sou uma pessoa ignorante, mas
de boa fé. Não deve confiar em minhas
palavras.
Paulo levantou-se, sorriu,segurou a mão
de Dinda e beijou-a com respeito:
_ Você é uma mulher maravilhosa.
Gostaria de levá-la para minha casa. Pena
que não posso!Vou à cozinha tomar mais
um café.
_ Eu trago para o senhor
_ Nada disso. O gostoso é ir tomar na
cozinha! Você ainda tem um pedaço
daquele bolo de milho?
Os lábios de Dinda abriram-se em alegre
sorriso:
_ Tenho sim.
Ele acompanhou-se até a cozinha e Vitório
apareceu na hora em que ele saboreava o
café e uma generosa fatia de bolo.
_ Já vi que Dinda conquistou Você.
_Completamente.
_O doutor é um homem sedutor. Com
esse ar de bom menino consegue tudo o
que quer.
Eles riram. Ela ficou séria. As palavras de
Paulo sobre os riscos que não só Teresa e
toda a família poderiam estar correndo a
deixaram angustiada. Quando Teresa
planejava viajar para a Europa com a
amiga, ela sabia que antes iriam para
outro lugar e depois é que viajariam para
a Itália. Mas aquele crime, a mulher tão
parecida com Teresa complicara tudo.
Paulo agradeceu o café e despediu-se
dela. Vitório pediu-lhe que o
acompanhasse até seu quarto. Estava
ansioso para saber se ele conseguira
alguma informação nova.
Assim que se viram no quarto, Vitório
fechou a porta e indagou:
_ E então? Conseguiu alguma coisa?
_ Nada de novo. Notei que ela sabe de
alguma coisa mais, contudo não quer
contar para não trair a confiança de sua
mãe. Por esse motivo, não a apertei
muito, prefiro primeiro ganhar sua
confiança. Conseguido isso, estou certo
de que ela me contará tudo o que sabe.
_ Você é esperto. Dinda é assim mesmo.
Fiel, e adora mamãe.
_ Ela me falou das diferenças entre você e
seu irmão.
_ Ele não gosta de mim.
_ Ela mencionou apenas que vocês
pensam de maneira diferente.
_ É verdade. Enquanto ele é materialista,
eu prefiro ser humanista. Mas somos
pessoas educadas, convivemos
normalmente, procurando evitar
problemas.
Paulo notou que a voz de Vitório tremia
um pouco ao falar do irmão. Olhando com
naturalidade perguntou:
_ Como seu pai vê essa diferença entre
vocês dois?
_ Ele fica ao lado do Osmar. Tem orgulho
dele por ser o filho mais velho e por
assumir a direção da empresa quando ele
precisa ausentar-se, como agora.
_ Seu pai está muito deprimido. Ele não
tem certeza de que aquele corpo não seja
de Teresa.
_ Ele sabe que não é. Mas mesmo antes
de acontecer tudo isso, ele já andava
meio deprimido. Havia perdido o gosto de
sair com os amigos como antigamente.
_ Como estão os negócios da empresa?
_ Que eu saiba, estão bem. Naquele
tempo, talvez papai já estivesse
começando a ficar doente e os problemas
que estamos enfrentando o fizeram
piorar.
_ Em depoimento ao delegado, seu pai
disse que seu relacionamento com Teresa
sempre foi muito bom. Mas se isso fosse
verdade eles não teriam entrado em
depressão. Se estivesse bem, teriam
viajado juntos.
_ Isso também me espanta. Mas o que sei
é que sempre se deram bem. Nunca os vi
brigar.
Paulo ficou pensativo por alguns
segundos, após disse:
_ Eram duas pessoas educadas, não
demonstravam o que sentiam.
_ De fato, meus pais condenavam
qualquer manifestação de contrariedade,
afirmando que era preciso não deixar
transparecer nossos sentimentos. Diziam
que os outros não precisam carregar
nossos infortúnios. Confesso que eu
nunca souber fazer isso. Sou emotivo, não
consigo esconder minhas mágoas ou
alegrias. Isso foi causa de muitos castigos
durante a infância.
_ Alguns pais acreditam que educar os
filhos seja conter suas expansões
emocionais. É um grande erro, porque o
indivíduo acaba colocando uma máscara
diante dos outros, mas por dentro existe
um vulcão que pode estourar a qualquer
minuto.
_ O pior é que eu sempre estouro. Osmar
se controla muito bem. Será por isso que
ele tornou-se tão vingativo e maldoso?
_ Talvez. Controlar o que se sente para
manter a aparência pode fazer muito mal.
De alguma forma, as energias, tanto da
alegria quanto da dor, precisam
expressar-se. Em vez de contê-las, é
melhor tentar compreender e expressa-
las de maneira que não nos machuquem.
_ Não acredito que algum
desentendimento grave tenha ocorrido
entre meus pais. Eles eram casados há
muitos anos e a rotina pode ter
desgastado o relacionamento,
conduzindo-os à depressão.
_ É, pode ser. Mas o desgaste natural de
um relacionamento de tantos anos não
deixa ninguém doente. Seu pai me parece
estar angustiado, inquieto e isso sempre
decorre de algum motivo em que o medo
aparece.
_ Isso eu também notei. Ele não tem
dormido bem, está inquieto, sempre com
dores de cabeça, e os remédios não têm
dado nenhum resultado. Mas o medo dele
pode ser pelo desaparecimento de
mamãe. Eu mesmo tenho tido pesadelos,
pensando no que poderia estar
acontecendo com ela.
_ Que tipo de pesadelos?
_ Eu sonhei que estava em um lugar
escuro e triste e lá havia duas pessoas,
parecidas com os dois que foram
assassinados. A mulher gritava que ia se
vingar de tudo quanto fizemos a eles.
_ Lembra-se das palavras deles?
_ Ela gritou: "Vocês vão me pagar por
tudo. Caí na armadilha. Mas vou me
vingar". E ele reforçou: "Vocês não
perdem por esperar". Então, eu
perguntei: "Quem são vocês? Onde está
minha mãe? Onde arranjaram os
documentos dela?". Eles não
responderam e desapareceram.
_ Você acha que esteve com os espíritos
dos assassinados?
_ Sim. Mas não entendi o que disseram.
Que armadilha teria sido essa? Quem
teria armado?
_ Termos de procurar as respostas. Mas é
bom que você fique alerta.
_ Eu pedi ajuda de Analú. A única coisa
que ouvi foi "Ore e confie". Ela afirmou
que estaria sempre ao meu lado. Por que
será que ela não vem para me contar o
que aconteceu?
_ Se ela não vem é porque não pode falar
sobre o assunto. Os espíritos evoluídos
não interferem diretamente nos assuntos
das pessoas, a não ser que tenham
permissão.
_ Por que não? Tudo seria mais simples
se eles pudessem nos contar o que
desejamos saber.
_ A vida tem seus próprios meios para
resolver os problemas humanos, sempre
visando à aprendizagem. Todos os
desafios aparecem para ensinar alguma
coisa que os envolvidos precisam
aprender. Vir e contar tudo! Seria,
impedir a aprendizagem, e atropelar os
acontecimentos. As pessoas têm livre-
arbítrio e precisam utilizá-lo.
Vitório suspirou dizendo:
_ Entendo. Nesse caso, ela poderia pelo
menos inspirar-me boas idéias.
Paulo sorriu e seus olhos brilhavam
alegres:
_ Sua esperteza não convencerá Analú a
fazer isso. Somos nós que precisamos!
Pensar, investigar, descobrir a verdade.
Estou certo de que quando chegar à hora,
tudo será esclarecido".

"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 11
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"Na manhã seguinte à festa de casa dos
Vilela, Osmar chegou ao escritório
indisposto. O fato de ver Aurélia toda
amável com o "tal" doutor o irritara
muito. Fora difícil controlar o desejo de
arrancá-la do lado dele. Agüentou a
insatisfação e só foi embora depois que
Aurélia saiu acompanhada pelo médico.
Chegou à casa cansado, deitou-se, mas
não conseguiu dormir logo. Revirou-se na
cama, remoendo os momentos
desagradáveis da festa. Quando
adormeceu, sonhou que Aurélia e o
médico estavam trocando beijos
apaixonados.
Apesar de haver dormido tarde, depois
daquele pesadelo acordou cedo e não
conseguiu mais dormir.
Para tentar esquecer a noite
desagradável, apanhou o jornal e
percorreu os olhos pelas manchetes. Ao
abrir uma das páginas, na coluna social,
viu uma foto do casal Vilela e outra de
Aurélia ao lado do médico. Embaixo, leu:
'A bela Aurélia abrilhantou a festa
acompanhada pelo Dr. Augusto
Mendonça, famoso médico recém-
chegado dos Estados Unidos.
Ambos sorriam e Osmar amassou o jornal
nervoso. Isso não podia ficar assim.
Precisava tomar algumas providências.
Enquanto ela não se interessava por
ninguém, ele sentia-se calmo, imaginando
que teria tempo de conquistá-la.
Mas agora aparecera esse rival famoso e
dava para notar que Aurélia se sentira
atraída por ele.
Apanhou a lista telefônica, procurou um
número e ligou, assim que atenderam
disse:
_ Quero falar com Norberto. _ Esperou
alguns instantes depois continuou: _ Aqui
é o Osmar, como vai? Estou precisando
dos seus serviços.
_ Quer que eu vá encontrá-lo?
_ Não. Passarei aí para falar como você
logo mais, no fim da tarde.
_ Hoje tenho um compromisso. Pode ser
amanhã?
_ Tem que ser hoje. É urgente.
_ Nesse caso darei um jeito. Pode vir. Vou
esperá-lo.
Osmar desligou. Ele gostaria de ir
imediatamente, mas havia uma reunião
importante na empresa, a qual ele não
poderia faltar.
A secretária entrou:
_ Está tudo pronto para a reunião. Todos
já chegaram e estão esperando pelo
senhor.
Com um suspiro resignado, Osmar
levantou-se:
_ Está bem.
A partir desse momento, Osmar
mergulhou no trabalho, o que o fez
esquecer um pouco o aborrecimento. Ele
gostava de chefiar as pessoas no lugar do
pai. Sentia-se à vontade, gostava de
mandar e decidir sobre o futuro da
empresa.
Seu pai doente e desanimado, depois dos
últimos acontecimentos, com certeza não
voltaria mais a ocupar a chefia. Ele se
sentia dono absoluto da empresa,
julgava-se mais inteligente e espero do
que o pai e estava certo de que sob sua
orientação eles iriam se tornar mais ricos.
Passava das cinco horas quando Osmar
parou o carro... Diante de um prédio em
um bairro popular da cidade. Desceu e
entrou no hall do prédio, esperou o
elevador e se dirigiu ao sexto andar.
Era um prédio antigo, cheio de pequenos
escritórios. Ele saiu do elevador e parou
diante de uma porta onde se lia:
'Norberto Simões - detetive particular'.
Ele bateu levemente e entrou. Um homem
baixo, negro, meio-calvo, aparentando
cerca de quarenta anos, levantou-se da
poltrona atrás da escrivaninha, caminhou
até a porta sorrindo, de mão estendida, e
disse:
_ Como vai, Osmar? Que honra recebê-lo
em meu humilde teto.
_ Bem, e você?
Norberto fez ligeira mesura e respondeu:
_ Melhor depois que você chegou. Sente-
se.
Ele indicou uma cadeira em frente à
escrivaninha e voltou a sentar-se em sua
poltrona.
_ Em que posso servi-lo?
_ Preciso de informações sobre um
sujeito.
_ Trouxe os dados dele?
_ Só tenho alguns. Ele estava morando
fora do Brasil, chegou há pouco tempo.
_ Passe-me o que você tem e eu
descobrirei o resto. O que quer saber?
_ Tudo que puder. Tenho pressa. Como
sempre pagarei bem. Você sabe.
_ Claro.
Osmar contou o que sabia sobre o médico,
descreveu como ele era fisicamente e
mostrou a foto que cortara do jornal.
Estava amassada, mas dava para ter uma
idéia.
_ Começarei hoje mesmo.
Osmar pegou a carteira, escolheu
algumas notas e colocou-as sobre a mesa:
_ Estas são para as primeiras despesas.
Assim que descobrir alguma coisa, ligue-
me.
_ Deixe comigo.
Osmar despediu-se e saiu. Estava mais
calmo. Norberto era muito bom não só
para investigar pessoas como para tirá-
las do caminho quando era preciso.
Em casa, Osmar sentiu-se cansado.
Tomou um banho e mandou Nora servir o
jantar.
O telefone tocou e a criada o procurou:
_ Tem na linha um advogado chamado
Paulo, disse que é da parte do Vitório.
_ O que ele quer de mim?
_ Ele disse que deseja conversar com o
senhor.
_ Peça para ele ligar outro dia. Estou
cansado e com fome. Não vou atendê-lo
agora.
Nora se foi, depois voltou dizendo:
_ Agora é o Vitório. Ele quer falar com o
senhor.
_ Não disse a ele que estou jantando?
_ Disse que o senhor ia sentar-se para
começar a jantar. Vitório disse para
atendê-lo que não vai se demorar.
Resmungando, Osmar apanhou o telefone
de má vontade e disse:
_ O que é tão importante para que você
atrapalhe o meu jantar? Trabalhei o dia
inteiro, estou cansado e com fome. Não
sou folgado como você que fica o dia
inteiro sem fazer nada.
_ Você não ligou mais para nós. Não
deseja saber como papai está?
_ Sei que ele também está descansando
como você. Foi para dizer isso que me
incomodou?
_ Não. Você não atendeu o Dr. Paulo,
nosso advogado que está investigando o
paradeiro de mamãe. Ele ia conversar
com você por telefone, mas como você
não o atendeu, pensei melhor e ele vai
até aí procurá-lo.
_ O que ele quer de mim? Sou um homem
ocupado, não tenho tempo a perder.
Estou sozinho administrando uma
empresa. Acha que tenho tempo para
conversar?
_ Ele vai procurá-lo e papai está dizendo
que quer que você o atenda e lhe preste
todas as informações.
_ Não posso passar informações sobre os
nossos negócios a um desconhecido. Não
farei isso.
_ Se não fizer terá de se entender com
papai. Aliás, ele está dizendo que se você
não fizer o que ele está pedindo, vai até
aí com o Dr. Paulo.
_ Pelo jeito ele não está tão mal como
vocês dizem.
_ Ele deseja resolver este caso o mais
rápido possível e saber onde mamãe está.
_ Por que insistem nessa história? Mamãe
está morta e o caso deveria ser
encerrado. Compete à polícia descobrir o
assassino.
_ Você vai ou não fazer o que papai está
mandando?
_ Está bem. Pode mandar esse advogado
metido a investigador. Mas diga-lhe que
seja breve. Não tenho tempo a perder.
Osmar desligou o telefone irritado. Além
de todos os problemas que tinha ainda
teria de aturar um metido que pretendia
investigar a vida da família.
No apartamento de Vitório, assim que ele
desligou o telefone, Paulo perguntou:
_ Seu irmão é sempre assim intratável?
_ Diante dos outros ele é mais manso.
Comigo ele é sempre assim. Mas com
papai ele não pode.
_ Estou curioso para conhecê-lo, visitar a
casa onde Teresa vivia tentar descobrir
mais sobre ela.
_ Entendo sua curiosidade, mas, para ser
sincero, não creio que isso possa ajudá-lo
a descobrir o que nos interessa. O
passado nós já sabemos, queremos saber
onde ela está.
_ Infelizmente, não temos nenhuma pista
nesse sentido. Estou tentando descobrir
alguma coisa que possa nos dar essa
pista. Vocês dizem uma coisa, mas os
fatos revelam que a verdade pode ser
bem diferente.
_ Como assim?
_ Vocês afirmam que seus pais se
relacionavam bem, porém por que ambos
estavam tão depressivos nos últimos
tempos?
_ Você acredita que essa depressão pode
ser fruto de alguma coisa ruim que teria
acontecido entre eles?
_ É uma hipótese. Eles tinham diante da
família uma atitude discreta e não
falavam sobre seus sentimentos. Se
acontecer alguma coisa séria entre eles,
faria tudo para escondê-la de vocês.
_ Mas mesmo que isso tivesse acontecido,
em que poderia esclarecer esse crime e
suas implicações com minha mãe?
Paulo ficou pensativo durante alguns
segundos. Depois disse sério:
_ Eu tenho visto muitas coisas neste
mundo e sei o quanto certas paixões
podem transformar uma pessoa. A
violência extrema com que esse crime foi
praticado, demonstra que o criminoso
estava com muita raiva e isso ocorre
quando as paixões obscurecem qualquer
raciocínio.
_ Eu já me perguntei isso inúmeras vezes.
Mas estou certo de que ninguém de
minha família seria capaz de tanto. Do
jeito que você fala dá impressão de que
está questionando se meu pai teria sido o
autor do crime. Eu não acredito nisso. Ele
nunca foi um homem violento ou
vingativo.
_ Não estou sugerindo nada disso. O que
desejo é conhecer como eram os
sentimentos dos envolvidos nesta
situação.
_ Você está achando muito difícil
descobrir o paradeiro de minha mãe?
_ Não se trata disso. Em investigação, não
se pode desprezar nenhum detalhe. O fio
da meada pode estar onde menos se
espera e surgir de repente, conduzindo-
nos aos fatos. Não se preocupe se estou
investigando os sentimentos de sua
família. Sou discreto, isso ficará entre
nós, aconteça o que acontecer.
Eles continuaram conversando e, aos
poucos, Vitório foi se acalmando. Quando
pensava na mãe sentia o peito oprimido
como se ela estivesse em perigo,
sofrendo, querendo comunicar-se com ele
sem conseguir.
Ficou combinado que na manhã seguinte
Paulo viajaria para o Rio de Janeiro e
procuraria por Osmar.
No dia seguinte, faltando poucos minutos
para as onze horas, Paulo foi introduzido
na sala de Osmar.
_ Seja breve, por favor. Não disponho de
muito tempo.
_ Seu pai me contratou para descobrir o
paradeiro de sua mãe.
_ De novo essa história. Eles gostam de
sofrer. Minha mãe está morta e eles não
querem se conformar.
_ Você acredita mesmo que aquele corpo
seja dela?
_ Claro. De quem mais poderia ser? É a
cópia perfeita de minha mãe e que eu
saiba não havia ninguém tão parecida
com ela. Não bastasse isso, há os
documentos. Que maior prova poderia
haver?
_ Você pode até estar certo, mas para a
Justiça o corpo não foi reconhecido por
toda a família. Isso fez com que ela
continue investigando e não libere o
corpo.
Osmar impacientou-se:
_ E isso faz com que todos nós estejamos
sofrendo uma situação angustiante,
continuando a procurar por uma pessoa
que não pode aparecer porque já está
morta e que precisa ser enterrada o
quanto antes para dar sossego a toda a
família.
_ Você está muito seguro do que afirma.
_ Estou. Você está fazendo seu trabalho e
com certeza deseja valorizar sua
atividade, mas neste caso ela é inútil,
porque jamais vai conseguir desvendar
qualquer coisa. Vitório não aceita a perda
de mamãe e fica criando uma série de
problemas. Dinda a vida inteira o apoiou.
Só faz o que ele quer e mais uma vez
ficou do lado dele.
_ Mas e seu pai? Ele tem muitas dúvidas.
_ Meu pai está na hora de aposentar-se.
Tem andado doente, e acredito que sua
cabeça já não esteja funcionando bem.
_ Seu pai ainda não tem sessenta anos.
Está deprimido, doente, mas continua
lúcido.
_ Não estamos aqui para conversar sobre
os problemas de meu pai. Vitório garante
que você é bom como investigador,
embora não seja essa sua profissão. Mas
por melhor que você seja, duvido que
consiga descobrir alguma coisa mais do
que a polícia.
Paulo sorriu levemente e respondeu:
_ Não subestime que você não conhece
nem se apresse a dizer que esse caso está
resolvido. _ Fez ligeira pausa e
perguntou: _ Qual é a especialidade desta
empresa?
_ Construção Civil. Estamos no mercado
há mais de vinte e cinco anos. Já
construímos muitos prédios nesta cidade
e prestamos serviços ao governo federal.
_ Seu pai aprecia seu interesse em ajudá-
lo nos negócios da família. Confia em sua
capacidade.
Osmar ergueu ligeiramente a cabeça,
satisfeito. Nada o agradava mais do que
ser reconhecido como um homem
inteligente e capaz.
_ Se eu não me esforçasse para cuidar
desta empresa, nosso patrimônio se
perderia. Como eu disse, meu pai está
doente e depois da morte de minha mãe
certamente não vai ter mais ânimo para
cuidar de mais nada.
_ E Vitório?
Os olhos de Osmar brilharam maliciosos
quando respondeu:
_ Está fora de cogitação. Não se interessa
pelos negócios, o que é uma sorte porque
não tem capacidade.
_ Por que não? Ele me parece um rapaz
inteligente.
_ Mas não é. Está sempre fora da
realidade, pensando em coisas ilusórias e
sem finalidade.
_ Você acredita mesmo que seu pai vai se
afastar e permitir que você assuma a
responsabilidade pela empresa?
_ Ele não tem outro remédio. Conheço
esta empresa desde criança e sei como
fazer com que ela progrida cada vez mais.
Quanto a ele, do jeito que está, vai acabar
incapaz para qualquer coisa.
Paulo fixou-o nos olhos e disse sério:
_ Ainda bem que você está seguro e
preparado.
Paulo estava tocando no ponto em que
Osmar mais gostava e por esse motivo ele
começou a responder com prazer. Havia
esquecido completamente a animosidade
com que recebera sua visita.
_ Estou certo de que em pouco tempo
aumentaremos nosso capital e
ampliaremos nossos negócios.
_ Sua mãe decidiu viajar porque estava
deprimida. Você saber por quê?
Osmar deu de ombros:
_ Nada importante. Ela não tinha motivos
para estar deprimida. Era uma mulher
rica, freqüentava a mais alta sociedade
do Rio de Janeiro, tinha uma família
respeitada e um marido atencioso que lhe
fazia todas as vontades. Esse deve ter
sido um pretexto para viajar sem a
companhia de meu pai.
_ Por que ela faria isso se os dois tinham
um bom relacionamento?
Os olhos de Osmar brilharam rancorosos
quando respondeu:
_ Talvez ela tenha se metido em uma
aventura perigosa e acabado morta
naquela cama.
_ Você acredita que sua mãe tenha sido
amante daquele homem?
Osmar olhou-o com raiva e respondeu,
com voz um tanto rouca pela emoção:
_ O que mais se poderia pensar vendo-os
juntos, desnudos, naquela cama?
_ Se aquele corpo é dela, não há o que
duvidar.
Osmar levantou-se nervoso:
_ Este assunto está me fazendo mal. Não
sei por que aceitei conversar com você.
Acho que nós não temos mais nada para
falar.
Paulo continuou sentado e respondeu
calmamente:
_ Sei como você deve estar se sentindo. O
orgulho ferido dói muito. Como era sua
mãe em casa, no dia-a-dia?
_ Preferia encerrar aqui nossa conversa.
Não há motivo para esticarmos este
penoso assunto. Depois, tenho muito
trabalho, não posso perder tempo.
_ Por favor. Responda o que perguntei. _
Olhou-o firme nos olhos e continuou: _
Você é a única pessoa da família que está
lúcido o bastante para dar-me uma
resposta confiável. Tenho de fazer meu
trabalho e peço-lhe que não me negue
este favor.
Osmar endireitou-se altivo e sentou-se
novamente:
_ Você está certo. Eu sou a única pessoa
lúcida nesta família. Embora acredite que
você não vai descobrir nada porque não
há nenhum mistério a ser descoberto,
para que não diga que estou de má
vontade, vou responder.
_ Muito obrigado.
Osmar pensou um pouco depois disse:
_ Minha mãe era uma mulher educada,
desde cedo nos ensinou a nos
comportarmos bem diante dos outros.
Exigente nas regras de etiqueta e
cumpridora dos seus deveres de mãe de
família e de dama de sociedade.
_ Como era sua maneira de ver a vida? Do
que ela gostava? Costumava falar dos
seus sentimentos?
Osmar olhou-o surpreendido:
_ Não. Ela era perfeita. Nunca
demonstrava insatisfação, controlava-se
perfeitamente, como convém a uma
senhora de sociedade. Não costumava
falar os seus sentimentos.
_ O delegado me disse que ela era mais
apegada a Vitório. É verdade?
_ Ela o estragou é o que quer dizer. Por
causa das atitudes chorosas dele, fazia-
lhe todas as vontades.
_ Não fazia o mesmo com você?
_ Não. Eu nunca precisei disso. Sempre
fui equilibrado e firme. Ela era mais dura
comigo, mas hoje sei que ela fazia isso
porque sabia que eu era capaz e não
precisava me pendurar nela.
_ Nesse caso você não guarda
ressentimento por ela ter se chegado
mais a ele.
O brilho de raiva reapareceu nos olhos
dele. Mas respondeu com voz calma:
_ Não. Por outro lado, meu pai sempre me
apoiou mais do que a Vitório. Ele desejava
que ambos ficássemos trabalhando na
empresa. Mas meu irmão nunca quis o
que foi muito bom porque ele só me
causaria problemas.
Paulo levantou-se sorrindo:
_ Obrigado, Dr. Osmar, por haver dividido
seu precioso tempo comigo e me ajudado
a entender melhor os fatos.
_ Espero que tenha esclarecido o que eu
podia. Por que não desiste do caso? Não
percebe que está perdendo seu tempo e
que não obterá sucesso? Não se preocupa
com seu desempenho? Ouvi dizer que é
famoso pelo sucesso que tem obtido em
suas investigações. Não tem medo de que
um fracasso possa ter uma mancha em
sua folha de serviços prestados?
_ Talvez tenha razão. Vou pensar no que
me disse.
Osmar sorriu satisfeito. Afastar daquele
investigador inconveniente seria um
alívio, principalmente naquele momento
em que se emprenhava em grandes
negócios que precisava ocultar.
"Paulo deixou o escritório de Osmar
satisfeito. Havia conseguido mais do que
esperava. Assim que o viu notou o quanto
ele era vaidoso e percebeu como poderia
conseguir alguma coisa dele.
Não lhe passou despercebido à raiva com
que ele se referia à mãe e ao fato de ela
ter tido um amante. Era o único na família
que aceitara isso sem questionar. Todos
os outros, inclusive Dinda, haviam frisado
que essa atitude não se coadunava com o
perfil de Teresa.
Osmar pareceu-lhe um homem vaidoso,
prepotente, disposto a conseguir o que
queria. Não duvidava também que ele
faria qualquer negócio para isso.
Havia qualquer coisa em Osmar que o fez
decidir colocar dois homens seus para
segui-lo durante alguns dias e verificar
como ele levava a vida.
Seu instinto lhe dizia que deveria
começar por ali. Pensando nisso, tratou
logo de planejar os próximos passos".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 12
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"Marília acordou cedo e animada. Apesar
da tragédia que presenciara, esforçava-se
para não pensar mais em Otávio.
Sentia-se livre, bem-disposta, alegre.
Pela primeira vez, depois de muitos anos,
sentia-se dona de si, confiante no futuro.
O fato de perceber que poderia ganhar o
suficiente para manter a casa com os
quitutes que ela e Dorita faziam, deram-
lhe a certeza de que dali para frente tudo
em sua vida correria bem.
De fato, a freguesia tinha aumentado e
elas estavam até pensando em contratar
uma auxiliar para cuidar dos afazeres
domésticos, porquanto ambas ficava o dia
inteiro trabalhando na cozinha, sem
tempo para mais nada.
Pensando nisso ela foi ao quarto de Altair
acordá-lo para o colégio.
Aproximou-se dele:
_ Acorde, meu filho. Está quase na hora
de ir para a escola.
O menino remexeu-se na cama
resmungando:
_ Não quero ir. Estou cansado."
Marília colocou a mão na testa dele e
notou que estava com febre. Preocupada
tornou:
_ Você está doente. O que está sentindo?
_ A garganta está doendo e estou com
frio.
_ Não precisa se levantar. Vou buscar um
remédio para baixar sua febre e ligar
para o Dr. Davi.
_ Não quero tomar injeção!
_ Ninguém ainda falou em injeção. Só vai
tomar se for preciso.
Ela deixou o quarto e voltou pouco depois
com um cálice e o remédio.
_ Sente-se, Altair, tome o remédio.
_ Não gosto de remédio. Vai doer minha
garganta.
_ Você precisa agüentar. Ele pode evitar
uma injeção. Beba que eu trouxe um 'tira-
gosto'.
Resmungando, o menino sentou-se,
segurou o cálice em uma mão e o gomo
de laranja na outra. Engoliu o remédio,
fez uma careta e chupou o 'tira-gosto'.
_ Agora se deite e descanse. Daqui a
pouco volto para saber como se sente.
Quer tomar seu café com leite?
_ Daqui a pouco eu tomo o café com leite.
_ Assim está melhor. Estou certa de que
logo vai mandar embora essa dor de
garganta. Você é um menino valente e
muito forte.
Os olhos de Altair brilharam quando
respondeu:
_ Sou mesmo, mãe. Vou ficar bom. Eu
quero sarar logo porque está doendo e
estou com frio. Mas gostaria de continuar
doente só um pouquinho para não ir à
escola amanhã também.
Marília sentou-se na beira da cama,
segurou a mão do menino e disse:
_ Por que isso? Você sempre gostou de ir
à escola. Aconteceu alguma coisa que
você prefere não ir?
_ Não, mãe. Eu gosto de escola. Mas eu
queria ficar mais tempo em casa com
você.
Marília alisou a cabeça do filho com
carinho, deu-lhe um beijo na testa e
respondeu:
_ Eu também gostaria de ficar o dia
inteiro com você. Mas agora estamos sós
nós três e se eu não trabalhar não vamos
ter dinheiro para manter a casa.
_ Antes, quando eu chegava da escola
você ficava comigo, contava histórias,
brincava. Agora está sempre ocupada.
Marília pensou um pouco, depois disse:
_ Eu tenho uma forma de resolver isso.
Seu pai não está mais aqui e você é o
homem da casa, portanto, pode ficar
sócio da nossa empresa e trabalhar
quando chegar da escola. Vai ser muito
divertido e, além disso, vai começar a
ganhar dinheiro porque, é claro, quem
trabalha merece ser recompensado.
O menino que havia se deitado, sentou-se
de novo:
_ Puxa, mãe, vai ser demais! Nenhum
amigo meu trabalha e ganha seu dinheiro.
Posso começar agora?
_ Sua garganta está doendo e você está
cansado.
_ Só dói um pouquinho quando eu engulo.
_ Vamos fazer assim: depois que sua
febre passar você começa. Está bem?
_ Está. Não vejo a hora que essa febre
passe.
Marília sorriu e respondeu:
_ Vejo que você vai ser um menino
trabalhador. Mas para isso terá de estar
bem e não deixar de fazer as lições de
casa. Nós estamos abrindo uma empresa
e você será nosso sócio. Um empresário
tem de ser instruído, saber fazer contas,
ler e escrever muito bem.
_ Eu ainda não sei fazer muitas contas,
mas ler e escrever eu já sei.
_ Você tem de ir à escola para aprender
tudo o que precisa para ser um bom
trabalhador.
_ Eu vou estudar muito e logo saberei até
conta de dividir. Meu amigo que está no
terceiro ano já sabe fazer essas contas.
_ Não tenha pressa. Você é mais novo do
que ele, mas estou certa de que quando
chegar ao terceiro ano, vai fazer tudo o
que ele faz. Agora se deite e descanse. Se
precisar de alguma coisa, chame. Daqui a
pouco trarei seu café.
Marília desceu e foi à cozinha. Dorita já
havia preparado o café e disposto tudo
quanto deveria fazer naquele dia.
Elas estavam contentes porque, além do
pão de queijo, as empadinhas eram muito
procuradas. O que as animara foi que
duas lanchonetes muito boas, onde Dorita
levara algumas amostras, haviam feito
encomendas grandes e a cada dia a
procura estava sendo maior.
Por tudo isso planejavam abrir uma
empresa e juntar algum dinheiro para um
dia poderem expandir o próprio negócio.
Marília conversou com Dorita sobre Altair
e finalizou:
_ Ele está sentindo falta da nossa
companhia. Nós não temos tido tempo de
brincar com ele.
_ Gostei da idéia de trazê-lo para
'trabalhar' conosco. É bom que ele se
interesse logo cedo e entenda sua
responsabilidade diante da vida. Vamos
fazer isso de uma forma tão prazerosa
que ele vai amar 'trabalhar' aqui.
Elas riram e ficaram trocando idéias de
como torná-lo um auxiliar na cozinha.
Quando Marília foi levar o café, Altair
sentou-se na cama dizendo:
_ Mãe, estou sem febre. Já posso descer e
trabalhar?
_ Vou medir sua temperatura. Depois
veremos. Tome o café com leite e vamos
ver como está sua garganta.
Altair segurou a caneca e tomou um gole.
_ Já melhorou _ disse contente.
Marília mediu a temperatura e, enquanto
ela conferia, ele indagou inquieto:
_ E então?
_ A febre baixou, mas você ainda está
febril. E sua garganta ainda deve estar
doendo um pouco, não é?
_ É, só um pouquinho. Mas vai passar
logo.
_ Meu filho, hoje é melhor você ficar na
cama descansando e se preparando para
começar amanhã.
_ E a escola?
_ Amanhã você também ficará em casa.
Depois voltará à escola.
_ Oba! Então eu posso trabalhar amanhã.
_ Pode. Estamos precisando muito de
ajuda. Temos muitos pedidos. Vai ser
ótimo contar com você.
_ Eu sou muito forte e disposto a ajudar
mesmo.
_ Isso mesmo. Coma o pão com manteiga
e deite-se novamente. Hoje você precisa
descansar.
Marília desceu as escadas sorrindo. Faria
tudo para ensinar Altair a trabalhar com
dignidade e honradez. Eles teriam de
viver do próprio trabalho e isso o ajudaria
a enfrentar os desafios da vida.
Havia o dinheiro no exterior que Otávio
deixara, mas não contava com ele. A
origem desse dinheiro era duvidosa e ela
estava certa de que ele seria confiscado.
Imaginava que seu marido havia se
envolvido com criminosos e, por esse
motivo, acabara morto.
Com satisfação ela entregou-se ao
trabalho. No fim da tarde as encomendas
estavam prontas. Felizmente, o
empregado da lanchonete viria buscá-las,
facilitando as coisas. Eles tinham uma
perua e enquanto elas acomodavam as
caixas com o material no veículo, Marília
imaginava como seria bom que pudessem
ter um veículo para fazer entregas.
Assim que eles se foram, Dorita disse
contente:
_ Foi bom terem vindo buscar. Em uma
viagem eu não conseguiria levar tudo.
Marília enfiou o braço no de Dorita
dizendo:
_ No futuro nós também teremos um
carro para fazer nossas entregas.
Dorita olho-a admirada:
_ Um carro, mesmo usado, custa muito
caro.
_ Teremos um carro novo e muito bom.
Estou certa de que vamos conseguir.
_ Como?
_ Pense bem, nós trabalhamos bem,
fazemos coisas de qualidade com muita
higiene e alegria. O dinheiro que
ganhamos é honesto e merecido. Por tudo
isso ele vai se multiplicar, nosso negócio
vai continuar crescendo e logo teremos
tudo o que precisamos.
_ Antes eu era mais otimista, mas agora
você está passando na minha frente. Eu
nunca pensei em chegar a tanto.
_ Por que não? Nós fazemos um produto
bom. As pessoas saboreiam com prazer,
elogiam, a cada dia compram mais... Se
os pedidos aumentarem não vamos dar
conta. Vou começar a procurar uma
pessoa para nos ajudar.
_ Acha que teremos como pagar o salário
dela? O que estamos ganhando dá apenas
para nossas despesas, isso porque
estamos economizando.
_ Com uma pessoa que nos ajude, estou
certa de que poderemos produzir muito
mais e não só pagaremos o salário dela
como aumentaremos nossos lucros.
De volta à cozinha, Dorita disse contente:
_ Você tem razão. Podemos tentar. Hoje à
noite vou falar com D. Ana. Ela tem uma
filha que gostaria de trabalhar. Falou
comigo ontem, perguntou se eu sabia de
algum lugar que estivesse precisando.
Respondi que não, mas pensando bem,
talvez ela fosse boa para nós.
_ Quantos anos tem?
_ Não sei, mas é bem-disposta, alegre.
Poderemos experimentar.
_ Está bem. Vá conversar com D. Ana.
Elas começaram a dar uma ordem na
cozinha.
_ Vou fazer uma boa sopa de feijão com
macarrão para ver se Altair come. Ele não
almoçou muito bem. Ele adora essa sopa.
Disposta, Marília colocou a panela no fogo
e ia começar a preparar a sopa quando
Altair desceu as escadas dizendo:
_ Mãe, mãe, eu achei um esconderijo!
_ Esconderijo? Do que está falando?
Altair entrou na cozinha e parou diante
dela:
_ Eu levantei um pouco, estava cansado
de ficar na cama, fui ao quartinho onde
você guarda coisas para procurar meu
carrinho amarelo. Eu tropecei,
escorreguei e bati as costas na parede.
Caí sentado no chão. Então ela virou e
abriu uma porta. É um lugar apertadinho,
mas está cheio de coisas.
Marília olhou para Dorita admirada:
_ Você sabia que existia esse lugar aqui
em casa?
Ela meneou a cabeça negativamente:
_ Não. Altair, você não está inventando
essa história?
_ Não. Acho que descobri o tesouro.
_ Vamos lá ver isso _ disse Marília.
As duas acompanharam Altair escada
acima até o local e entraram no quartinho
que por ser um tanto apertado, Otávio
determinou que ele serviria apenas de
despejo.
Lá havia coisas que eles não utilizavam,
mas não queriam se desfazer. Marília
raramente entrava lá, e Dorita de vez em
quando abria para deixar entrar um ar e
fazer ligeira limpeza.
Surpreendidas, elas viram que Altair
dissera a verdade. Havia uma abertura na
parede suficiente para passar uma
pessoa. Aproximaram-se e viram que
dentro havia uma pequena prateleira com
algumas caixas.
O lugar cheirava a mofo, mas Marília
susteve a respiração, entrou e apanhou
uma das caixas. Estava pesada, porém ela
esforçou-se para tirá-la de lá.
_ Será que foi Otávio quem colocou isso
aí? _ questionou Marília.
_ Se não foi ele pode ser sido alguém
antes de vocês virem para cá.
_ É. Está pesada. Vamos ver o que
contém.
Colocaram a caixa sobre uma mesa e
abriram a tampa. Dentro havia algumas
pastas e documentos.
_ Vamos ver as outras _ sugeriu Dorita.
Elas tiraram as seis caixas de papelão que
havia e uma menor de madeira que elas
abriram primeiro. Dentro, encontraram
um caderno e algumas chaves.
Marília apanhou o caderno e abriu:
_ São coisas de Otávio. Veja, a letra é
dele.
Folheando esse caderno, Marília
continuou:
_ São anotações de nomes de pessoas,
endereços e até telefones.
_ Por que será que ele os escondia aqui?
_ Certamente eram negócios fora da lei
que não podiam aparecer.
Elas abriram as caixas e nelas havia
anotações, algumas em inglês, outras em
espanhol.
_ Aqui pode estar registrado que tipo de
negócio Otávio tinha. Para a polícia pode
ser a chave do crime _ considerou Marília,
pensativa.
_ Você vai avisar o delegado?
_ Ainda não sei. Acho melhor falar antes
com o Dr. Paulo ou com Vitório. Eles
podem examinar tudo isso e nos ajudar a
decidir o que fazer. Pode ser também que
não seja nada importante.
_ É pode, mas os dois saberão nos
aconselhar.
_ Mãe, pensei que fosse um tesouro. Não
tem dinheiro dentro das caixas?
_ Não, filho. Mas papéis podem ser mais
importantes do que dinheiro. Vamos
investigar.
Eles desceram, Marília procurou o número
do telefone de Paulo e ligou:
_ Doutor Paulo? Estou ligando porque
aconteceu uma coisa que pode ser
importante.
_ O que foi?
_ Altair por acaso encontrou um
compartimento secreto em que Otávio
guardava caixas com documentos. Eu e
Dorita não sabíamos que havia esse lugar
aqui. Gostaria de mostrá-los a você e
Vitório. Alguns deles são em inglês e
espanhol.
_ Irei imediatamente.
Ela agradeceu e desligou.
_ Ainda bem que temos em quem confiar
para nos ajudar _ comentou com Dorita.
_ Tanto ele quanto Vitório parecem gente
boa.
_ É verdade. Volte para o quarto, Altair.
_ Eu já melhorei.
_ Mas se não descansar poderá piorar.
Talvez seja melhor voltar para a cama.
_ Ah! Mãe!... Eu não quero ficar na cama.
Já estou bom. Eu quero ver o que eles vão
falar do meu achado. Ainda penso que
pode haver um tesouro lá.
_ Não se preocupe Altair _ ajuntou Dorita
_, se tiver alguma coisa de valor,
daremos a você. Afinal, foi você quem
descobriu o lugar.
Ele obedeceu. Meia hora depois, Paulo
chegou com Vitório. Depois dos
cumprimentos, acompanharam as duas
até o local. Altair, vendo-os subir, os
acompanhou, olhos brilhantes de
curiosidade e prazer.
Assim que apanhou o caderno, Paulo
sorriu satisfeito:
_ Isto parece uma anotação que os
traficantes costumam fazer dos clientes
aos quais fornecem drogas. Deve haver
um outro com anotações dos
fornecedores. Temos que verificar.
_ Quer dizer que Otávio era traficante de
drogas?
_ Tudo indica que sim.
_ Apesar de desconfiar que havia alguma
coisa errada, não pensei que se tratasse
de drogas.
Num gesto instintivo de proteção, ela
abraçou o filho. Estava chocada. Tinha
verdadeiro horror desse tipo de profissão.
_ Vamos levar essas caixas para um lugar
onde possamos verificar tudo _ disse
Paulo.
_ Eu ajudo _ concordou Vitório. _ Pode
ser que aqui esteja o fio da meada que
procurávamos.
Marília sugeriu que eles levassem tudo
para a mesa da sala de jantar para
procederem a verificação.
Depois de transportarem todas as caixas
e de verificar se não havia mais nada no
local em que elas estavam escondidas,
abriram a primeira e depois de examinar
alguns documentos, Paulo considerou:
_ Isso vai levar tempo e requer
peritagem.
_ Acha que deveremos conversar com o
delegado? _ indagou Marília.
_ Com certeza. A polícia terá condições de
periciar todos esses documentos melhor
do que nós. Mas antes eu gostaria de
analisá-los em primeira mão para
recolher algumas pistas e continuar nossa
investigação.
_ Você acredita que poderemos encontrar
alguma pista sobre o desaparecimento de
minha mãe? É difícil para eu acreditar que
ela pudesse estar ligada a essa gente.
_ Não sei o que vamos encontrar, mas de
qualquer forma o nome de sua mãe está
ligado a esse crime e a Otávio, seja ele
traficante como parece ser ou não.
_ Esse mistério continua me
atormentando. Não consigo entender.
_ Seria melhor que você procurasse não
se atormentar criando hipóteses em sua
cabeça e sofrendo com elas. Assim,
poderia ligar-se aos amigos espirituais
que o auxiliam e talvez obtiver um
resultado melhor _ aconselhou Paulo.
Vitório suspirou e respondeu:
_ Você tem razão. Preciso encontrar a
serenidade. Eu sei que só quando
estamos serenos e confiantes é que
conseguimos ouvir o que nossos mentores
espirituais dizem. O desespero só
atrapalha.
_ Sei que não é fácil conseguir isso neste
momento, porém você é uma pessoa de
fé, já teve provas de que a ajuda
espiritual está presente em nossa vida.
Pense um pouco. A descoberta desses
documentos foi à maneira que eles
encontraram de nos ajudar. Altair
escorregou e a parede se abriu. Não acha
que os amigos espirituais nos deram esse
empurrãozinho?
_ Paulo, sinto-me envergonhado. Eu que
pensava ser um espiritualista convicto,
estou falhando diante dos desafios a que
estou sendo submetido pela vida. Vou
reagir. Pode estar certo. De agora em
diante vou pensar no melhor e manter a
serenidade. Depois do que aconteceu
hoje, só me resta confiar e acreditar que
tudo será resolvido.
_ Isso mesmo. Agora se sente e vamos
analisar o que temos aqui _ disse Paulo.
Depois, voltando-se para Marília,
continuou:
_ Vai demandar tempo.
_ Eu sei. Gostaria de poder ajudá-los _
respondeu ela.
_ Já ajudou muito nos chamando aqui.
Vamos ao trabalho. Vocês duas continuem
seus afazeres. Não quero atrapalhá-las.
_ Já terminamos por hoje _ respondeu
Marília. _ Se tiver alguma coisa que eu
possa fazer, é só falar. Vamos Altair, para
a cozinha.
_ Eu queria ver se eles vão encontrar o
tesouro.
_ Se encontrarmos alguma coisa
diferente, avisaremos você _ disse Paulo.
As duas e o menino foram para a cozinha
e os dois mergulharam nos papéis,
procurando a ponta do mistério que
envolvia aquelas famílias."
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 13
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"O despertador tocou e Osmar acordou
sobressaltado. A noite fora difícil
demorara em pegar no sono e quando
conseguiu sonhou com pessoas
maltrapilhas e feias, cobrando-lhe contas
de seus atos, ameaçando agredi-lo. Ele
tentara fugir, mas elas o seguiram por
toda a parte e quando estavam para
apanhá-lo, ele acordou suando frio,
angustiado e aflito.
'Foi apenas um pesadelo', pensou,
tentando minimizar o fato. Mas depois
disso não conseguiu mais dormir com
medo de rever as pessoas.
Sentia o peito angustiado, oprimido, como
se alguma coisa terrível fosse acontecer.
Levantou-se, apanhou o telefone e ligou
para Nelsinho. Quando ele atendeu, disse
irritado:
_ Onde você estava que demorou tanto
para atender ao telefone?
_ Estava dormindo. Assim que ouvi, vim
atender.
_ Tem alguma novidade?
_ Tudo continua na mesma. O
carregamento chegou bem e eles estão
conferindo a mercadoria.
_ Diga a eles que ainda não depositaram
o dinheiro. Tenho pressa.
_ Eles disseram que fariam isso hoje. É
melhor esperar. O chefe deles não goste
que duvidem de sua palavra.
_ Preciso falar com você sobre outro
assunto. Não saia que dentro de meia
hora estarei aí.
Osmar desligou e foi se arrumar para sair.
Em seu peito a angústia continuava e ele
apressou-se. Precisava ter certeza de que
tudo continuava bem.
Desceu, engoliu uma xícara de café puro
e saiu. Apanhou o carro e rumou para o
subúrbio. Parou diante da casa de
Nelsinho, desceu e bateu várias vezes na
porta.
Pouco depois, Nelsinho abriu, disfarçando
a cara de sono e o desconforto por ter de
levantar tão cedo. Ele estivera ocupado
até quase a madrugada e adorava dormir
até tarde.
Depois do bom-dia resmungado de parte
a parte, Nelsinho tornou:
_ O que o trouxe aqui tão cedo?
_ Estou preocupado com a mulher no
sanatório. Você tem ido lá saber como ela
está?
_ Fui naquele dia que liguei para o seu
escritório.
_ Como ela estava?
_ Do jeito que você pediu. Eles continuam
fazendo tudo direitinho.
_ Mas você disse que ela estava dando
trabalho.
_ Estava porque o remédio não fazia mais
tanto efeito. Mas eles disseram que iam
aumentar a dose e acho que fizeram
porque não se queixaram mais.
Osmar pensou um pouco, depois disse:
_ Vamos até lá. Quero ver isso de perto.
Não podemos facilitar. Já chega aquela
cochilada que está nos custando caro.
_ Eu não tive culpa. Eles desconfiaram de
nós e não cumpriram o prometido.
_ E agora ficamos nas mãos deles. Já
pensou o que pode acontecer se ela falar
o que sabe?
_ Do jeito que ela está não conseguirá
lembrar-se de nada, que dirá falar.
Conversando, foram para o carro,
entraram e Osmar deu a partida.
Passava das dez horas quando pararam
diante de um prédio em que se lia a
inscrição: 'Sanatório da Paz'.
Desceram do carro e entraram. No
saguão, Nelsinho procurou a atendente:
_ Preciso falar com o Dr. Ernesto.
_ Um momento. Vou ver se ele pode
atender.
Pegou o telefone, conversou, depois
disse:
_ Podem entrar. Primeira porta à
esquerda.
Os dois caminharam pelo corredor até
encontrar a porta; bateram levemente.
_ Como vai, Dr. Osmar?
_ Preocupado, Ernesto.
_ Sentem-se. Não há motivo para
preocupação. Tudo está sob controle.
_ Não sei. Sinto que alguma coisa está
para acontecer. Como está ela?
_ Dormindo. Como sabe, fomos forçados a
aumentar a dose da medicação; depois
disso, ela não nos incomodou mais.
_ Leve-me até lá. Quero vê-la.
_ Não confia em minha palavra?
_ Não se trata disso, Ernesto. Vendo-a,
saberei que tudo está bem.
_ Antes, desejo fazer-lhe uma pergunta:
Até quando pretende mantê-la aqui?.
_ Até quando meus problemas estiverem
solucionados.
_ Concordei em atendê-lo, mas não posso
ficar com ela indefinidamente. Isso pode
me causar problemas.
_ Pensei que a quantia de dinheiro que
lhe paguei e a que envio de vez em
quando cobrisse todos os seus medos.
_ Você tem sido muito generoso. Se não
fosse aquele crime, ela poderia ficar aqui
o quanto quisesse.
_ Já lhe disse que não tive nada a ver com
aquele crime. Jamais teria feito negócios
com aquela gente se soubesse que iriam
chegar a tanto. Você sabe que sou homem
de palavra. Eles duvidaram disso.
Ernesto coçou a cabeça, indeciso. Aquele
dinheiro fora muito bem-vindo, mas a
morte de duas pessoas o assustava
demais. Embora Osmar afirmasse que não
tivera nada a ver, ele não conseguia
acreditar.
Sabia que Osmar mantinha negócios com
o homem que foi assassinado, só não
entendia como a mãe de Osmar fora
morta com ele.
_ Você acha que fui culpado daquele
crime? Acha que eu seria capaz de
mandar matar minha mãe?
_ Você está certo de que o corpo
encontrado é o mesmo o dela?
_ Claro que estou. Eu mesmo fui
reconhecê-lo.
_ É que as demais pessoas de sua família
disseram o contrário.
_ Estão iludidos. De tanto desejar que não
fosse verdade, viram coisas que não
existem.
_ Seja como for, essa mulher chegou aqui
num dia próximo àquele crime. Ela deve
ter alguma coisa a ver com esse fato.
_ Você está enganado. Ela é uma mulher
que sabe demais sobre meus negócios e
eu a trouxe aqui para ver se ela esquece
o que sabe. Só isso.
_ Quando passar o efeito dos remédios,
ela poderá dar com a língua nos dentes. É
isso que me preocupa. Não desejo ver o
nome do hospital metido nisso.
_ Ela se esquecer de tudo depende de
você. Deve haver drogas que a façam não
se lembrar mais do passado.
Pelos olhos do médico passou um brilho
diferente, mas ele disse apenas:
_ Eu sei que tem. Mas não posso aplicar
nela. Seria contra a medicina.
_ Lembre-se de que posso fazer valer a
pena. Dentro em breve vou receber uma
boa quantia e certamente saberei
reconhecer seus serviços.
_ Vou pensar.
_ Agora desejo vê-la.
Doutor Ernesto levantou-se:
_ Venham comigo.
Os três caminharam pelos corredores,
subiram um lance de escada até que o
médico parou diante de uma das portas.
Abriu e convidou:
_ Vamos entrar.
O quarto era pequeno e a veneziana da
janela estava fechada. Havia uma cama
hospitalar, uma mesa de cabeceira e um
suporte de soro.
Deitada de costas havia uma mulher
magra, de cabelos castanho-claros sobre
os ombros, branca, pele delicada, um
tanto pálida, olhos fechados, os braços
estendidos para fora da coberta.
Aparentava mais de cinqüenta anos.
_ Está vendo? _ disse Ernesto. _ Ela
dorme tranqüila.
_ Espero que ela continue assim _
respondeu Osmar.
_ Vai continuar. Vamos sair.
Eles saíram e poucos minutos depois
deixaram o hospital. Osmar estava
satisfeito. Aquela mulher nunca poderia
contar como descobrira tudo.
Depois de deixar Nelsinho em casa,
Osmar foi para a empresa.
Sentou-se diante de sua mesa, mas não
estava em condições de trabalhar. A
angústia continuava e ele fechou os olhos
inquieto.
As lembranças o incomodavam e o medo
roubava toda sua calma.
Havia conhecido Otávio desde que se
interessara em negociar drogas. Ele
queria enriquecer logo, não desejava
esperar o progresso lento da empresa do
pai. Tinha pressa em conquistar poder e
em seu entender o dinheiro farto lhe
proporcionaria tudo, inclusive o amor de
Aurélia.
Conhecia Nelsinho desde a adolescência.
Ele vendia drogas aos alunos do colégio
em que estudava. Nunca desejara
experimentar nenhuma delas. Mas cedo
percebera o quanto poderia lucrar nesse
negócio.
Já adulto e formado, quando decidiu
entrar no negócio, procurou Nelsinho e
por meio dele fez os primeiros contatos
com alguns traficantes. Inteligente e
determinado, aos poucos conseguiram
seu lugar entre eles, mostrando
capacidade, respeitando suas regras e
negociando com cada um o espaço de
atuação.
Há dois anos conhecera Otávio, um
intermediário de dois grandes
exportadores. Era o que ele queria. Seu
capital não era grande, mas, nesse ramo,
ele estava se multiplicando rapidamente.
Tudo corria bem.
Certa tarde recebeu o recado de que
Otávio iria ao Rio de Janeiro e o estaria
esperando na casa de Nelsinho.
Nesse encontro, Otávio lhe dissera que
tinha em mãos um negócio espetacular.
_ Ninguém sabe. Trouxe para você em
primeira mão.
_ Do que se trata?
_ É um negócio grande, rendoso, é pegar
ou largar. Mas é preciso resolver rápido.
Hoje de manhã fui procurado pelo
companheiro do Argola. Ele foi preso esta
madrugada. Não vai sair tão cedo.
_ E daí?
_ Bem, o Arlindo procurou-me e disse que
o Argola comprou uma mercadoria barata
e de boa qualidade. Arlindo recebeu tudo,
guardou em sua casa, e o Argola ia buscar
esta noite, mas como ele foi preso; o
Arlindo está com medo. Quer livrar-se da
mercadoria o quanto antes. Faz por
qualquer preço. Eu não tenho como
retirar tudo. Sei que você tem.
_ Tem certeza de que é de boa qualidade?
_ Tenho. Ele me deu uma amostra.
_ Tem certeza de que a polícia não sabe
nada sobre ela?
_ Tenho. A polícia está mais preocupada
com um carregamento que apreenderam
há um mês. Sobre essa, eles não sabem
de nada.
_ Nesse caso, vou mandar retirá-la e
levar para nosso depósito.
_ Mas antes quero cinqüenta por cento do
lucro.
_ Só se você pagar a metade.
_ Não tenho capital. Afinal, essa
informação vale muito. Eu poderia ter
procurado outros.
Eles discutiram os detalhes e finalmente
acertaram o negócio. Osmar mandou
buscar a mercadoria e ficou de mandar o
dinheiro depois de conferir a remessa.
Otávio foi embora e Osmar fez o que
haviam combinado. Naquela noite, ao
chegar a casa, encontrou a mãe
atarefada, fazendo as malas. Ficou
sabendo que ela partiria no dia seguinte
para a Europa em companhia de uma
amiga.
Estranhou. Procurou o pai.
_ É verdade que mamãe vai para a Europa
sem você?
_ É. Ela está precisando descansar. Tem
andado deprimida, cansada. Acho que é a
idade.
_ Mas por que você não a acompanha
como sempre?
_ Não quero deixar os negócios.
_ Eu posso tomar conta de tudo.
Aproveite, vá com ela.
_ Não. Ela quer ir com uma amiga dos
tempos de faculdade. Concordei. Afinal,
não tenho vontade de viajar neste
momento.
Ele tentou convencer o pai que ele
deveria ir também. Para ele convinha
muito que o pai se afastasse durante
algum tempo. Assim ele estaria mais livre
para fazer o que desejava.
Na manhã seguinte, ele foi ter com a mãe:
_ Quando você vai?
_ Amanhã à noite.
_ Desejo-lhe uma boa viagem, mas ainda
acho que deveria levar o papai. Ele tem
andado desanimado, penso que uma
viagem lhe faria bem.
_ Se ele desejar viajar, que vá sozinho.
Eu, nesta viagem, desejo me recuperar.
Ficar só comigo mesma.
_ Mas você vai com uma amiga...
_ Vou. Faz muitos anos que nós não nos
encontrávamos. Vai ser bom revivermos
nossos tempos de juventude. Eu preciso
de alegria. Elvira vai me ajudar a
reencontrar o prazer de viver.
Foi quando Vitório apareceu e, vendo-a
na arrumação, disse triste:
_ Mãe... Eu preferia que não fizesse essa
viagem.
Teresa sorriu levemente:
_ Eu preciso ir. Você vai ficar bem.
Vitório segurou a mão dela e respondeu:
_ Estou com um mau pressentimento.
Algo me diz que você não deve viajar
agora.
_ Lá vem você com suas idiotices _
interveio Osmar. _ Não dê ouvidos a ele.
_ Eu sinto que você não deve ir. Por
favor, desista dessa viagem. Fique perto
de nós.
Ao rever essa cena, Osmar pensou:
'Dessa vez Vitório estava certo. Teria sido
melhor mesmo que ela não tivesse ido'.
Mas Teresa estava irredutível. Na hora
combinada, Alberto acompanhou-a até o
embarque e o Vitório, angustiado,
recolheu-se ao quarto.
Para Osmar teria sido mesmo melhor que
o pai tivesse ido viajar. Talvez assim
tivesse podido evitar o que aconteceu.
Mais tarde, Osmar encontrou-se com
Nelsinho e foram até o depósito conferir a
qualidade da mercadoria. Ficou satisfeito.
A compra fora mesmo muito boa.
Ele contava poder tirar dinheiro da
empresa para juntar ao que já possuía e
pagar a dívida. Mas quando chegou à
empresa, no dia seguinte, soube que o pai
tinha comprado uma quantidade enorme
de material e havia pagado metade à
vista.
Inconformado, foi conversar com ele:
_ Pai, você não podia ter feito esse
negócio. Ficamos sem nenhuma reserva.
_ Sei o que estou fazendo. Era um ótimo
negócio, preço muito bom e eu não podia
perder. Dentro de pouco tempo teremos
recebido o dobro ou mais.
_ Mas nós temos compromissos, contas a
pagar. O que faremos sem dinheiro em
caixa?
_ Você está reclamando sem razão. Antes
de fechar eu verifiquei tudo o que temos
de pagar neste mês. Vai dar e sobrar.
Osmar ficou nervoso. Ele contava com
esse dinheiro para acertar o negócio que
fizera. Sabia que como de praxe, eles só
faziam negócios à vista. Era receber, ver
a qualidade e pagar.
Pela primeira vez desde que se metera
nesse negócio sentiu medo. Sabia que
eles não eram de brincadeira. Por muito
menos eram capazes de matar.
Sua cabeça doía, e ele tentava encontrar
uma saída. Naquele mesmo dia recebeu
um recado marcando um encontro para
pagar o dinheiro.
Desesperado saiu da empresa, procurou
um telefone público e ligou para Otávio.
_ Preciso conversar com você.
_ Recebeu meu recado?
_ Recebi, mas estou com um problema.
Não tenho toda a quantia.
_ Como você fez um negócio desses sem
ter o dinheiro? Sabe o que isso significa?
_ Sei. Por esse motivo estou ligando para
você. Quero que diga ao Arlindo que hoje
vou mandar uma parte e que logo
mandarei o restante.
_ Não posso dizer isso a ele! Vai pensar
que o estou enganando.
_ Mas é verdade!
_ Você está dizendo, mas eu não sei se é
mesmo. Pode ser que você esteja me
passando à perna.
_ Eu nunca faria isso. Sou de palavra. Só
preciso de mais alguns dias.
_ Faça um empréstimo, faça qualquer
coisa, mas não me diga que não vai
pagar.
_ Ele quer receber ainda hoje, porém não
tenho todo o dinheiro.
_ Você me colocou em uma grande
enrascada. Isso não vai prestar. Se eu
soubesse que não teria confiado em você.
_ Você não pode me emprestar o que
falta? Eu devolverei logo.
_ O quê? Meu dinheiro está todo aplicado.
Não posso tirar de uma hora para outra.
Você vai ter de dar um jeito.
Osmar remexeu-se na cadeira inquieto.
Recordar esses momentos aumentava sua
angústia.
Naquele dia ele procurara solução sem
conseguir. O jeito era dar o que tinha e
pedir tempo para pagar o restante. Não
havia saída.
Resignado, procurou Arlindo levando o
dinheiro que possuía. Ele o esperava
ansioso e assim que o viu disse:
_ Eu vou me mandar, só estava
esperando você chegar. Preciso sair daqui
o quanto antes. Soube que o Argola está
sendo pressionado e pode dar com a
língua nos dentes. Manda logo a bolada
que eu tiro minha parte e entrego o
restante ao fornecedor.
Osmar entregou o envelope com o
dinheiro. Arlindo abriu, contou depois
disse:
_ E o restante?
_ Eu tinha todo o dinheiro na empresa,
mas meu pai fez uma compra grande e o
retirou.
Arlindo fechou a fisionomia e Osmar
continuou sem dar-lhe tempo para dizer
nada:
_ Não se preocupe. Tenho dinheiro para
receber, dentro de um ou dois dias
pagarei o restante.
_ O que você pensa que eu sou? Algum
idiota? Não quero pôr em risco minha
pele. Se eu aparecer lá sem todo o
dinheiro eles vão pensar que eu estou
mentindo. Além do mais preciso viajar
urgente, conto com minha parte. Não. De
forma alguma, não posso aceitar isso.
Você precisa dar um jeito.
_ Não tenho como. Quando Otávio me
procurou, eu fechei o negócio porque
contava em tirar a diferença da empresa.
Não esperava que meu pai fosse fazer o
que fez.
_ Isso é problema seu. Eu não tenho
tempo para esperar. Vou embora ainda
hoje. Se não puder dar o que falta terá de
entender-se com eles.
_ Você precisa me ajudar. É por pouco
tempo.
_ Não posso. Dei minha palavra de que o
negócio era quente, sempre fui confiável.
Osmar empalideceu. Sabia que os
fornecedores daquela mercadoria eram
grandes traficantes, cujas regras eram
duras e era muito perigoso desrespeitá-
las.
_ Nesse caso, é melhor eu devolver a
mercadoria.
_ O quê? Você que me complicar com a
polícia? De forma alguma posso aceitar
recebê-la de volta. Depois, nós somos
pessoas honestas, não crianças que
podem ser enganadas com facilidade.
Você não sabe com quem está metido.
_ O pior é que eu sei. Estou sendo o mais
honesto possível. Se vocês não podem
esperar mais alguns dias para receber o
restante, é melhor levarem a mercadoria
de volta.
_ Vamos fazer o seguinte: espero até
amanhã. É só o que consigo fazer. Se você
não trouxer o restante do dinheiro, terei
de contar a verdade aos fornecedores.
_ É muito pouco tempo! Não vai dar para
arrumar todo o dinheiro.
_ Eu vou sair daqui agora, ficar na casa
de um amigo. Mas amanhã, nesta mesma
hora, virei aqui esperar pelo dinheiro. Se
não trouxer, terei de contar a verdade.
Osmar deixou a casa de Arlindo muito
assustado. Em tão pouco tempo como
poderia conseguir tanto dinheiro?
Voltou para casa tentando encontrar uma
solução sem conseguir.
Naquela noite não conseguiu dormir.
Revirou-se na cama angustiado, mas
quando pegou no sono viu-se perseguido
por vultos negros que o queriam agredir.
Enquanto recordava esses fatos, Osmar
tentava descobrir de onde vinha essa
sensação de medo e de mau
pressentimento."
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 14
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Pressionado pelas lembranças, Osmar
continuava tentando colocar as idéias em
ordem para poder programar os próximos
passos.
Depois daquele encontro com Arlindo, os
acontecimentos se precipitaram. Ele foi
preso naquela mesma noite e Osmar
sentiu-se acuado. Certamente, Otávio
informaria os fornecedores que ele não
cumprira o prometido, o que era falta
grave.
Ele havia recebido o dinheiro da última
partida de mercadoria que negociara,
mas seu montante não era suficiente para
pagar tudo o que devia.
Tentou falar com Otávio, mas ele atendia
ao telefone. Foi quando começou a
receber telefonemas anônimos com
ameaças, chamando-o de traidor, de
desonesto, de sem palavra.
Assustado, ele sabia de onde vinham
esses telefonemas, mas ainda não tinha
conseguido todo dinheiro e, para seu
desespero, Otavio não atendia seus
chamados.
Mesmo sem ter o restante, na noite
seguinte Osmar foi ao encontro de
Nelsinho. Ele precisava fazer alguma
coisa.
Contou-lhe o que estava acontecendo e
finalizou:
- Estamos encrencados. Temos de
encontrar uma saída com urgência.
- Foi você quem fez negócio. Eu não tenho
nada com isso. Só ajudo na distribuição.
- Você acha que eles vão querer só a
mim? Como é ingênuo! Está metido nisso
tanto quanto eu.
- Nesse caso, vou me mandar. Não vou
esperar a bomba estourar.
- Você não vai me deixar sozinho nisso.
Depois, não adianta fugir. Eles têm
esquema perfeito e a essa altura já
devem saber de tudo a nosso respeito.
- Isso pode estar na mão do Nivaldo. Ele
morre de inveja de nós porque não
consegue nos vencer.
- Ele é café pequeno. Esqueça isso. Temos
coisa mais importante para pensar.
Juntos, tentaram encontrar uma saída,
porém a única que resolveria seria
arranjar o dinheiro imediatamente, o que
não era possível.
- Vou procurar me esconder durante
alguns dias- disse Nelsinho.
- Eu não tenho como.
O telefone tocou e os dois se
sobressaltaram. Nelsinho atendeu:
_ Alô. Sim, sou eu.
_ Quero falar com o vagabundo que está
com você.
_ Quem?
_ Eu sei que ele está aí. Passa logo o fone
para ele.
Nelsinho estendeu o aparelho para
Osmar:
_ É para você.
Osmar sentiu o coração bater mais forte.
Nervoso, atendeu:
_ Alô. Quem está falando?
_ Não interessa. Você está marcado.
Ninguém pode brincar com o Gil.
Gil Duarte era o nome do chefe dos
traficantes, dono da mercadoria que ele
comprara. Osmar respirou fundo e
respondeu:
_ Não estou brincando. Sou homem sério.
Se for por causa do dinheiro daquela
mercadoria, não precisa se preocupar.
Dentro de um ou dois dias levarei para
vocês.
_ Você não está falando sério. Não
podemos correr o risco de esperar esse
tempo. Depois, você sabia as condições
do negócio. Fechou-se, tem de pagar do
jeito combinado.
_ Eu vou pagar. Só que preciso de mais
alguns dias.
_ O máximo que podemos esperar é até
amanhã ao meio-dia. Vou ligar para lhe
dizer onde deve levar o dinheiro.
Osmar desligou suando frio. Ele sabia que
não conseguiria ter o dinheiro até o
horário previsto.
Deixou Nelsinho e foi para casa. Sua
cabeça doía e ele não conseguia
encontrar uma solução. Passava da meia-
noite quando o telefone do seu quarto
tocou.
_ Alô. Sou eu.
_ Nós temos aqui duas pessoas que você
conhece muito. Teresa e Elvira. Se não
arranjar o dinheiro, vamos acabar com
elas.
Osmar deu um pulo assustado.
_ É mentira. Minha mãe está na Europa.
Você está querendo me pressionar.
_ Eu posso provar.
_ Como?
_ Vá até o endereço que vou lhe dar e
encontrará as provas de que precisa.
_ Diga para eu anotar.
O homem passou o endereço, depois
desligou. Osmar passou as mãos nos
cabelos, tentando se acalmar. Iss não
podia ser verdade. Sua mãe em poder
daqueles bandidos o deixava
aterrorizado.
Procurar a polícia seria como denunciar
sua ligação com os traficantes. Precisava
saber se eles realmente tinham Teresa
em seu poder.
Isso poderia ser apenas uma maneira de
atrai-lo para uma cilada. Mas e se Teresa
estivesse mesmo com eles, não ir, seria
deixá-la à mercê deles e, o que o
incomodava mais, tornaria clara sua
participação nos negócios com os
traficantes.
Vencendo o medo, Osmar decidiu
verificar. Foi. O endereço ficava na
periferia de um subúrbio. O lugar estava
deserto àquela hora da noite. Ele parou o
carro diante da casa modesta, olhando
em volta receoso.
A casa estava às escuras e não havia sinal
de vida. Osmar não desceu do carro,
estava pronto para fugir se fosse preciso.
Esperou alguns minutos, mas vendo que
não aparecia ninguém, ligou o carro
disposto a ir embora.
Então, a porta da casa se abriu e uma
mulher saiu quase correndo. A porta
fechou-se novamente. Osmar não a
conhecia, mas ela aproximou-se dizendo
agitada:
_ Por favor! Ajude-me!
Vendo que ela não carregava bolsa nem
arma, Osmar abriu o vidro do carro e
perguntou:
_ Quem é a senhora?
_ Sou Elvira. A amiga da Teresa.
Osmar abriu a porta e disse nervoso:
_ Elvira? Entre, conte-me o que está
acontecendo? Onde está minha mãe?
Ela entrou no carro dizendo aflita:
_ Vamos embora. Vou contar-lhe tudo.
_ Minha mãe não está com você?
_ Não. Eles me trouxeram aqui sozinha.
Ela ficou em outro lugar.
Osmar ligou o carro e saíram. Depois de
alguns minutos ele perguntou:
_ Quem estava com você naquela casa?
_ Dois homens. Eles nos prenderam dias
atrás.
_ Meu pai as levou para o aeroporto e viu
vocês embarcarem. Como pode ser isso?
_ Nós não embarcamos. Seu pai se
despediu quando entramos na área de
embarque, nós esperamos um pouco e
saímos.
_ Não estou entendendo. Vocês não iam
para a Itália?
_ Não. Ela fingiu isso, mas sua idéia era
outra.
_ Como assim? Por que ela não disse a
verdade?
_ Esse é um assunto dela e não estou
autorizada a lhe contar.
_ Você vai ter de contar. A vida dela está
ameaçada.
_ Eu também acho. Nós temos de ir à
polícia.
_ Nada de polícia. Isso pode colocar a
vida dela em risco. Mas fale, por que
vocês desistiram da viagem?
_ Nós não desistimos de viajar. Apenas
programamos ir para outro lugar.
_ Por que tanto segredo? Por que mamãe
não disse para onde iriam?
_ Esse é um assunto dela. Depois você
pergunta a ela. Eu não posso entrar nisso.
Ela tinha programado ir para São Paulo e
foi o que fizemos. Lá, quando saímos do
aeroporto com nossas bagagens à
procura de um táxi, fomos seguidas por
dois homens que em determinado
momento se aproximaram, apontaram-
nos suas armas e nos obrigaram a entrar
no carro.
_ Você conhecia esses homens?
_ Não. Um era mal encarado, o outro
tinha uma aparência melhor. Eles nos
ameaçaram e nos levaram para uma casa
em um bairro afastado. Lá nos amarraram
e havia um outro que parecia ser o chefe,
ele nos disse que ficaríamos presas até
que você pagasse o que lhe devia.
_ Eu?
_ É. Ele quis nos assustar e disse que
você traficava drogas, estava devendo e
não queria pagar. Se você não trouxesse
o dinheiro, eles nos matariam. Teresa
ficou indignada, disse que isso não era
verdade, mas eles responderam que ela
não sabia o que você fazia na empresa da
família.
_ Eles estavam mentindo. Ela acreditou?
_ Teresa chorou muito, mas ele insistiu
tanto, que nós duas acabamos por
acreditar. Teresa não se conformava por
você ter entrado nesse caminho. Não
parava de chorar.
Ela fez ligeira pausa e depois continuou:
_ Esta noite, eles me colocaram no carro e
me levaram para aquela casa. No caminho
me disseram que era para lhe contar o
que estava acontecendo e que se não
arranjasse o dinheiro até amanhã ao
meio-dia, eles matariam sua mãe.
Elvira soluçava aflita e Osmar não sabia o
que fazer.
_ Apesar de tudo, eu ainda acho que nós
deveríamos procurar a polícia e tentar
salvar a vida de Teresa.
_ Procurar a polícia seria o mesmo que
matá-la. Temos de pensar em outro jeito.
_ Você pode pedir o dinheiro a seu pai.
Ele não vai se negar a dar.
_ Papai não pode saber o que está
acontecendo. Temos de arranjar uma
solução sem a polícia.
_ O tempo passa depressa. Logo o dia
estará amanhecendo e chegará à hora de
levar o dinheiro.
Osmar mal ouvia o que Elvira estava
dizendo. Em sua cabeça estava o receio
de que ela viesse a contar o que
descobrira sobre suas atividades. Não
podia levá-la para sua casa, nem para um
hotel. Temia que ela fosse à polícia pedir
ajuda.
Tinha que levá-la para um lugar onde ela
ficasse escondida e não pudesse dar com
a língua nos dentes. Lembrou-se do Dr.
Ernesto que tinha um sanatório de
doentes mentais. Havia prestado a ele
alguns favores e agora chegara o
momento de cobrar sua dívida.
Quando estava chegando ao sanatório,
Osmar disse:
_ Estou preocupado, você não parece
bem, está nervosa, agitada. Você conhece
alguém nesta cidade?
_ Não sei nem onde estou.
_ No Rio de Janeiro.
_ Pensei que ainda estivesse em São
Paulo. Não conheço ninguém aqui a não
ser seu pai.
_ Você vive com sua família?
_ Não. Meu marido morreu e não tive
filhos. Moro sozinha e não tenho outros
parentes. Encontrei sua mãe e ela
convidou-me para ser sua dama de
companhia. Aceitei.
_ Depois do que passou, você está
precisando de cuidados médicos. Por isso
eu a trouxe a este hospital, que é de um
amigo meu. Ele vai ajudá-la a se acalmar.
_ Eu não quero ficar em um hospital.
Estou preocupada com Teresa. Eu não sei
onde ela está. Eles vedaram nossos olhos
e eu nem sabia que estava vindo para o
Rio de Janeiro.
_ Você não vai ficar no hospital. Só fazer
um exame, verificar se está tudo bem e
descansar. O dia está amanhecendo e eu
preciso ir para ver se consigo o dinheiro.
Você pode ficar aqui e, amanhã, depois
que eu resolver tudo, voltarei para buscá-
la e veremos o que fazer.
Osmar parecia mais calmo e Elvira aceitou
fazer o que ele queria. O Dr. Ernesto não
se encontrava no local, mas seu
assistente atendeu Osmar:
_ Aí fora está uma mulher muito
desequilibrada, não fala coisa com coisa.
Não dá para entender, diz que foi
seqüestrada, perseguida, está com mania
de perseguição. Não dorme à noite, por
esse motivo eu a trouxe aqui. Gostaria
que você a atendesse e lhe desse algum
remédio para dormir. Pela manhã, falarei
com o Dr. Ernesto e pedirei que a
examine. Ela precisa descansar e a família
dela também.
_ Deixe comigo, Dr. Osmar. Vou tratá-la
com carinho. Ela vai dormir como um
anjo.
Osmar despediu-se de Elvira e saiu. Dela
estava livre, pelo menos por alguns dias.
O que aconteceria se ele não arranjasse o
dinheiro?
Nem queria pensar nisso, mas, por outro
lado, se conseguisse esse dinheiro, teria
dado um golpe de mestre. Ganharia muito
mais e poderia fazer sua independência.
O problema era que isso seria impossível
em tão pouco tempo.
O dia havia amanhecido e ele foi para
casa. Tomou um banho, vestiu-se e
mesmo sem apetite tomou um reforçado
café da manhã e foi para a empresa.
Uma vez lá, mergulhou nos extratos
bancários, nas aplicações, consultou o
fluxo de caixa, mas esses documentos lhe
mostraram que não havia mais o que
extrair da empresa.
Seu pai tinha raspado o fundo do tacho
para fazer aquela desastrada compra que
ocasionara todo o seu drama.
Uma onda de raiva o acometeu e ele teve
vontade de brigar com o pai. Tentou
acalmar-se e não demonstrar seu
nervosismo.
Alberto mostrava-se radiante com aquele
negócio que tinha feito, calculando os
ganhos que teriam, o que proporcionaria
à empresa maiores possibilidades de
investimentos e mais folga com relação
aos pagamentos futuros.
Osmar não tinha como falar no assunto e
precisou engolir sua raiva, seu desespero
e sua insatisfação.
Apesar de seu esforço, Alberto notou que
ele não estava bem e perguntou:
_ O que você tem? Parece nervoso.
Aconteceu alguma coisa?
_ Não aconteceu nada. Eu estou muito
bem.
_ Será por causa da notícia que saiu no
jornal de ontem?
_ Que notícia?
_ Aurélia em boa companhia. Você não
viu?
_ Não.
Alberto apanhou o jornal, encontrou o
que procurava e mostrou a ele dizendo:
_ Ela está namorando firme. Falam até em
casamento.
Osmar apanhou o jornal irritado. A foto
mostrava Aurélia e um moço, abraçados e
sorridentes. Ele leu a legenda: 'A linda e
charmosa Aurélia Saldanha e seu
namorado na festa dos Alves de Mello. O
casal não se larga. Tudo indica que esse
namoro é para valer'.
_ O melhor que você tem a fazer é
esquecer de vez essa mulher, uma vez
que ela não corresponde ao que você
sente por ela.
Osmar teve vontade de bater no pai,
jogar toda sua raiva sobre ele, a custo
conteve-se. Engolindo a raiva respondeu
com a voz trêmula:
_ É isso que eu vou fazer.
Alberto sorriu satisfeito. Achava o filho
um rapaz bonito, bom e de futuro. Não
entendia como uma mulher pudesse
rejeitá-lo.
Osmar respirou fundo e tentou colocar a
atenção no trabalho, mas não conseguiu.
Ele não pretendia desistir de Aurélia, mas
o caso dela precisava esperar.
As horas estavam passando sem que ele
encontrasse uma solução para o seu
problema.
Eram onze horas quando o telefone tocou
e Osmar atendeu:
_ Alô, sim, sou eu.
_ Você tem apenas mais uma hora para
entregar o dinheiro. Anote o lugar e a
maneira de fazer isso.
_ Eu ainda não consegui arranjar tudo.
Vou levar o que tenho.
_ Se não conseguir, ela vai pagar. O
problema é seu.
_ Minha mãe não sabe dos meus negócios
e não pode pagar por mim. Por favor, não
faça nada a ela. Dê-me a indicação de
como fazer que vou ver se consigo.
O homem passou os detalhes e Osmar
anotou tudo. Suas mãos tremiam e,
naquele momento, ele se arrependeu
amargamente de ter entrado nesse
negócio. Mas era tarde demais. Não tinha
como recuar.
Apesar de tudo, estava decidido a fazer
uma última tentativa. Seu dinheiro não
estava em banco. Ele o guardava em um
esconderijo, em casa mesmo. Tinha parte
em dólares e em moeda nacional, mas
como era dinheiro ilícito, não podia
aparecer oficialmente.
Depois, os negócios eram feitos em
dinheiro vivo e ele podia precisar valer-se
dele de uma hora para outra.
Apanhou uma pasta, colocou o dinheiro,
tendo conferido o montante e, mais uma
vez, percebeu que ainda faltava uma
quarta parte do que precisava.
Cinco minutos antes da hora marcada, ele
parou o carro no local combinado.
Tratava-se de uma praça e ele percebeu
logo o homem sentado em um dos bancos
lendo um jornal.
Reconheceu um dos homens de Otávio.
Era a ele que deveria entregar a pasta
com o dinheiro sem dizer nada e ir
embora. Depois de conferir, eles
libertariam Teresa.
Osmar cumpriu tudo conforme o
combinado, mas suas pernas tremiam.
Havia escrito uma carta e colocado junto
com o dinheiro, pedindo que esperassem
mais alguns dias, que libertassem sua
mãe, jurando pagar tudo.
Depois ele foi para a empresa. Seu
estômago estava embrulhado, não
conseguiu almoçar. Tomou um uísque
para relaxar e tentou se acalmar.
Sabia que teria uma resposta. Se eles
aceitassem esperar um pouco mais, não
fariam nada contra Teresa, porém
continuariam mantendo-a presa, caso
contrário, talvez até acabassem com ela.
A esse pensamento Osmar estremecia
nervoso. Era possível até que não se
dessem por satisfeitos apenas com isso e
atentassem também contra a vida dele.
Se eles a matassem, certamente o caso
estaria nas mãos da polícia. O que ele
faria para escapar de uma investigação
dessas? Sua participação nos
acontecimentos viria à tona. Isso para ele
seria pior até do que a morte.
Aquela tarde custou a passar e Osmar não
conseguia pensar em outra coisa. Fingiu
estar trabalhando, até tentou, mas sua
cabeça estava confusa e perturbada.
A noite chegou e ele não teve nenhuma
notícia. Não saber o que estava
acontecendo, deixava-o inquieto, irritado
e nervoso.
Durante o jantar, resolveu comer alguma
coisa. Seu estômago doía e ele estava se
sentindo enfraquecido.
Procurou reagir e comeu um pouco de
tudo. Alberto estava alegre e conversador
naquela noite e Osmar fez o possível para
não demonstrar seu desespero.
Em certo momento, Alberto fixou-o,
dizendo:
_ Noto que você está se esforçando para
parecer bem. Mas não está.
_ Confesso que aquela foto de Aurélia me
tirou do sério.
_ Eu sei, meu filho. Mesmo reagindo, você
não consegue esquecer. Uma desilusão
amorosa é muito penosa, mesmo. Mas
tudo passa. Estou certo de que logo
esquecerá, encontrará outra mulher que o
valorize e acabará rindo quando se
recordar desses momentos.
_ É o que desejo, pai.
Dinda apareceu e Alberto perguntou:
_ Vitório não vai mesmo jantar?
_ Não, senhor. Ele anda muito triste pela
falta de D. Teresa. Quase não tem se
alimentado.
_ Esse menino não pode ficar sem comer.
Precisa deixar essas manias de meditação
e de ficar fechado naquele quarto falando
com as paredes _ respondeu Alberto.
_ Eu vivo falando isso. Você precisa usar
sua autoridade para que ele procure
outro trabalho e deixe essas manias _
rebateu Osmar.
_ Qualquer dia vou obrigá-lo a ir
trabalhar na empresa. Assim ficará sob
nossos olhos.
_ De modo algum _ protestou Osmar,
irritado. _ Ele só iria nos dar trabalho.
Não gosta de nada. Ficaria lá, fechado na
sala, meditando, e nada o faria
interessar-se pelo trabalho.
_ Do jeito que vocês falam até parece que
Vitório é preguiçoso _ interveio Dinda. _
Vitório é muito trabalhador, mas gosta de
outras coisas. Cada um é como é as
pessoas não são iguais.
_ Você e mamãe gostam de ficar mimando
Vitório. Por esse motivo ele é tão folgado.
Osmar precisava jogar sua raiva, sua
impotência diante dos fatos sobre alguém
e o irmão sempre foi para ele motivo de
rancor.
_ Vamos mudar de assunto _ disse
Alberto. _ Vamos jantar em paz.
Osmar concordou, mas, para ele, naquela
noite não havia nenhuma possibilidade de
ficar em paz."

"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 15
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Osmar continuou se recordando.
Lembrou-se de que três dias depois,
quando entrou na empresa, apanhou o
jornal que a secretária como de costume
colocara sobre a mesa e começou a
folheá-lo. Até aquele dia não obtivera
nenhuma notícia sobre o dinheiro pago
aos traficantes, o que o enchia de
esperança de que os seqüestradores de
Teresa houvessem aceitado esperar pelo
restante do dinheiro.
Continuando a folhear o jornal
estremeceu assustado. Um crime havia
sido cometido em São Paulo. Um casal
fora assassinado na cama em condições
misteriosas. O homem morto era Otávio
de Oliveira cuja foto estava estampada na
matéria.
Osmar sentiu uma tontura, levantou-se,
apanhou um copo de água e tomou,
tentando acalmar-se. Respirou fundo e
leu a matéria.
A mulher morta era de identidade
desconhecida e tinha a idade de Teresa, o
que o fez pensar que, de fato, ela havia
sido assassinada.
A custo conseguiu controlar-se. O terror
tomou conta dele. Tentou reagir. A
mulher morta que estava na cama com
Otávio certamente seria sua amante e
não podia ser Teresa.
Otávio havia sido o intermediário do seu
negócio e fora punido por não ter levado
o dinheiro. Se essa hipótese se
confirmasse eles poderiam ter feito o
mesmo com sua mãe e, talvez, há essa
hora já estivessem à procura dele.
Como saber a verdade? Otávio tinha
vários negócios e poderia ter sido
assassinado por outros motivos. Aflito,
Osmar não tinha como encontrar a
resposta.
O telefone tocou, ele atendeu, era
Nelsinho:
_ Já leu os jornais de hoje?
_ Já. Eu disse para você não ligar para
empresa.
_ Se for o que estou pensando, estamos
correndo sério risco.
_ Depois passarei em sua casa e
conversaremos. Pelo telefone, não.
_ Estou nervoso. Desligue o telefone e
venha até aqui agora.
_ Não posso sair agora. Irei ao fim da
tarde.
_ Pode ser muito tarde.
Osmar sentiu medo, mas controlou-se.
_ Irei assim que meu pai chegar na
empresa. Estamos esperando uma
entrega de mercadoria e não posso sair
pelo menos até ele chegar.
Ele também tinha urgência em conversar
com Nelsinho, talvez ele conhecesse
alguém que pudesse colher informações.
Pensou em recorrer a Norberto, mas ao
mesmo tempo não queria que ele
soubesse detalhes dos seus negócios.
Geralmente o contratava para alguns
serviços, mas achava perigoso que ele
soubesse muito sobre sua vida.
Assim que desligou o telefone, chamou a
secretária e disse:
_ Meu pai já deveria ter chegado. Eu
tenho um negócio urgente para resolver,
mas não posso deixar a empresa
enquanto ele não chegar. Ligue para casa
e pergunte se ele vai demorar.
_ Não será preciso. O Dr. Alberto recebeu
um chamado de São Paulo, pediu que eu
reservasse uma passagem e há essa hora
já deve ter chegado lá.
_ Para São Paulo? O que ele foi fazer lá?
_ Ele não disse.
_ Sabe quando volta?
_ Não. Penso que ele não saiba, porque
ficou de ligar assim que tivesse uma
posição.
Osmar procurou controlar a
contrariedade. Por que seu pai teimava
em continuar dirigindo a empresa? Era
hora de ele aposentar-se e deixar tudo
em suas mãos.
A presença dele estava atrapalhando seus
negócios. Quando ele voltasse, trataria de
convencê-lo a afastar-se definitivamente
da empresa.
Passava das duas horas da tarde quando
ele conseguiu sair e procurar Nelsinho no
novo endereço. Encontrou-o fechando
uma mala e perguntou nervoso:
_ Aonde você vai?
_ Vou me mandar. A qualquer hora eles
podem pintar aqui e eu pretendo estar
muito longe.
_ De novo? Você está se precipitando.
Pode ser que esse crime não tenha nada a
ver com nossos negócios.
_ Não quero esperar para descobrir.
Minha intuição está me dizendo para
sumir.
_ Onde você pensa ir? Acha que não irão
a seu encontro onde estiver?
_ Sei me esconder e não vou ficar
esperando eles me encontrarem. Quer
saber? Aconselho você a fazer o mesmo.
Com esse povo não dá para brincar. Por
muito menos já vi um deles acabar com o
Juvenal. Lembra-se dele?
_ Aquele cara que tinha o rosto cheio de
marcas?
_ Esse mesmo. O apelido dele era Juvenal
Bexiguento. Um tiro certeiro na cabeça e
ele já era. Não disse um aí. Eu escapei
porque estava escondido, só observando.
Ainda quer esperar?
Osmar passou as mãos nos cabelos e
disse aflito:
_ O pior é que não temos como nos
informar. Eles não me ligaram mais, as
ameaças pararam, cheguei a pensar que
tivessem aceitado minha proposta.
_ A morte de Otávio é uma boa resposta.
Não há o que duvidar. Otávio trabalhava
com eles há algum tempo. Haviam feito
vários negócios juntos.
_ Essa gente não confia em ninguém.
Hoje o estão paparicando porque você
está sendo útil, amanhã o estarão tirando
do caminho por achar que você não serve
mais.
_ Você não deveria ter dado todo aquele
dinheiro a eles. Agora ficamos sem
recursos para fugir. Eu tenho algumas
economias, mas vou ter de batalhar para
conseguir viver. Talvez você possa me
arranjar mais algum.
Osmar meneou a cabeça negativamente.
_ Eu dei tudo o que tinha na esperança de
que eles aceitassem.
Nelsinho fechou a mala e tornou:
_ Vou desaparecer. Você não pode fazer
nada, não vou esperar.
Osmar insistiu para que ele não fosse
embora, mas foi inútil. Nelsinho estava
decidido. Apanhou a mala, fechou a casa
e despediu-se de Osmar.
_ Como vou saber de você? Não tenho
onde ligar.
_ Pode deixar que eu ligo para você. Não
sei ainda onde vou ficar.
_ Não ligue para a empresa.
_ Vou ligar para sua casa, à noite. Adeus.
Ele se foi e Osmar entrou no carro e
voltou para a empresa. Por que tudo
estava dando errado para ele?
Aurélia se comprometendo com aquele
rapaz, seu pai viajando para São Paulo
sem lhe dizer para quê... Nelsinho o
abandonando na hora em que mais
precisava de apoio.
Uma onda de angústia o acometeu ao
pensar que sua mãe poderia estar morta
ou correndo risco de morte, sem que ele
pudesse fazer nada.
Sua cabeça doía e ele tentava acalmar-se
em vão. Alguns vultos escuros o
envolviam e Osmar sentia arrepios
percorrer-lhe o corpo.
Um deles aproximou-se dizendo em seu
ouvido:
_ Não tenha medo. Nós o estamos
protegendo. Eles não vão lhe fazer mal.
Outro se aproximou e disse:
_ Enquanto você fizer o que nós
queremos, nada de mau vai lhe
acontecer. Não se preocupe, nós
tiraremos do seu caminho todos os que
desejarem prejudicá-lo.
Osmar não registrou as palavras, mas
reagiu pensando:
'Eu sou forte. Ninguém vai me fazer mal.
Nunca tive medo de nada. Não sou um
covarde. '
Os vultos o abraçaram satisfeitos:
_ Isso mesmo. Você é forte e nós estamos
juntos.
Aos poucos, Osmar foi se acalmando. Ele
estava se fazendo de fraco. Era forte,
sempre havia conseguido tudo o que
queria.
Pensou em conversar com Norberto e
contratar dois ou três homens que
cuidassem de sua segurança. Afinal, ele
tinha como se defender e enfrentar
fossem quem fosse.
Não ia se esconder como Nelsinho. Não
seria um covarde.
Esses pensamentos o acalmaram e ele
voltou à empresa. Finalmente conseguiu
trabalhar. No fim da tarde, porém,
recebeu um telefonema de Alberto,
contando o que fora fazer em São Paulo e
dando a notícia de que Teresa havia sido
assassinada.
Ela era a mulher encontrada na cama,
morta ao lado de Otávio. A custo, Osmar
conseguiu controlar seu desespero e
fingir que não sabia de nada.
Além de ter de ir a São Paulo reconhecer
o corpo, ainda teria de dar a notícia a
Vitório. Desligou o telefone e foi para
casa.
O que aconteceu depois passou pela sua
mente como um filme. Os traficantes não
o procuraram mais, dando-se por
satisfeitos com a morte de Otávio e de
Teresa.
Norberto investigara a vida do Dr.
Augusto Mendonça e o que descobrira
deixou Osmar com mais raiva. O médico
era de ótima família, rico e muito
estimado por onde passava.
Além de tudo, era um homem simples,
alegre e como se isso não bastasse,
prestava serviço como voluntário em um
hospital pobre da periferia.
Osmar desejava armar uma cilada para
desmoralizá-lo de alguma forma, a fim de
que Aurélia o desprezasse e o
abandonasse.
Mas estava difícil. Osmar sabia que
precisava programar muito bem o golpe
para que não fracassasse.
Teria de ser alguma coisa muito forte,
algo que destruísse aquela auréola de
herói que o médico possuía.
Para conseguir o que desejava, contratou
Norberto para observá-lo, conhecer seus
hábitos e poder programar como afastá-lo
de Aurélia.
Enquanto Osmar mergulhava nas
lembranças do passado, naquele
momento em São Paulo, Paulo, em seu
escritório esperava a chegada de Wagner,
seu auxiliar, a quem mandara investigar a
vida de Osmar.
Na véspera, Wagner tinha lhe telefonado
dizendo:
_ Estou voltando esta noite. Tenho
notícias muito importantes para você.
_ Vou esperá-lo amanhã cedo. É melhor
conversarmos pessoalmente.
Paulo e Vitório tinham examinado os
documentos encontrados na casa de
Marília e chegado à conclusão de que
eram reveladores. Por esse motivo, Paulo
os entregara ao delegado, que ficou
radiante com a descoberta.
Finalmente uma boa pista. Certamente
haveria nomes, ainda que incompletos
que poderiam conduzi-lo ao encontro do
assassino.
A opinião dos peritos estava dividida.
Havia quem achasse que fora apenas uma
pessoa que cometera o crime, enquanto
outros não descartavam a possibilidade
de terem sido duas ou até três.
Para Paulo, o que estava claro pela
brutalidade e violência com que fora feito,
é que mesmo que o motivo fosse por
questões de dinheiro e poder, uma vez
que havia traficantes de drogas
envolvidos, havia muito ódio no
assassino. Paulo suspeitava que fosse um
caso de vingança.
Ao ouvir algumas batidas na porta, Paulo
foi abrir, Wagner entrou e, depois dos
cumprimentos, sentaram-se um diante do
outro. Paulo perguntou:
_ O que tem para me dizer?
Wagner tirou da pasta alguns papéis e
respondeu:
_ Aqui estão os relatórios minuciosos dos
dias em que o seguimos.
Paulo apanhou os relatórios.
_ Vou ler depois. Você disse que tinha
notícias importantes. Relate-me o que
descobriu.
_ No primeiro dia em que o segui, ele foi
até o subúrbio conversar com um 'tal' de
Nelsinho. Descobrimos que ele é um
traficante conhecido por operar em
pequenos negócios. Mas tem lastro com
pessoas importantes desse meio, o que
faz crer que nos últimos tempos ele tenha
se relacionado com gente mais
importante.
_ Continue.
_ Nesse dia, os dois saíram juntos e foram
até um hospital de doentes mentais.
Mandei Mário entrar e tentar descobrir o
que os dois foram fazer lá... Com jeito, ele
conseguiu saber por uma auxiliar de
enfermagem que Osmar tem uma
paciente internada lá.
_ Descobriu quem é?
_ Não. O importante é que essa paciente
está sob a orientação direta do dono do
hospital e que apenas uma enfermeira
pode cuidar dela. Mandei o Mário ver se
descobria mais alguma coisa sobre essa
mulher. Você sabe que ele é sempre
muito bem-visto pelas mulheres e tem um
jeito especial para lidar com elas.
Conseguiu um encontro com a assistente
fora do hospital, mas nem assim pôde
saber mais alguma coisa.
_ Temos de investigar esse hospital.
Tenho a sensação de que é para ir por aí.
_ Foi o que pensei. Tanto que deixei o
Mário lá para ficar de olho. O nome do
hospital, do médico, ao qual ele pertence
consta no relatório.
_ Bom, porque vou pedir para o Dr.
Monteiro investigar. Qual a sua impressão
sobre o Dr. Osmar?
_ Você acertou na mosca quando pensou
em investigar a vida dele. É um
empresário, goza de uma boa posição
social e financeira, seu pai, o Dr. Alberto,
é muito respeitado no mercado onde
atua. Mas Osmar, embora seja um homem
de gosto requintado, freqüente a alta
sociedade do Rio de Janeiro, tem um lado
marginal, uma vez que é ligado a pessoas
suspeitas.
_ Como Nelsinho?
_ Sim. Ele foi procurar um detetive
particular chamado Norberto e segundo
descobrimos, trata-se de pessoa que
aceita negócios duvidosos e não merece
confiança. Isso mostra que Osmar anda
metido em assuntos pouco convencionais
para sua posição social.
_ Vamos continuar investigando.
Paulo apanhou os relatórios e leu-os,
enquanto Wagner esperava calado.
Quando terminou, comentou:
_ Bom trabalho.
_ Vai precisar de mim por hoje? Tem uma
pessoa que eu gostaria de visitar.
Paulo sorriu:
_ Não. Descanse hoje. Vou pensar nos
próximos passos. Assim que eu tiver
decidido algo, falo com você.
Wagner saiu e Paulo ficou pensativo.
Seria melhor não contar nada para
Vitório. Ele era muito sensível e talvez
não conseguisse esconder essa história
do pai.
Por enquanto, preferia manter sigilo para
não atrapalhar as investigações.
O telefone tocou e ele atendeu:
_ Paulo, é Monteiro.
_ Como vai?
_ Bem. Estou ligando para dizer que você
estava certo em relação àqueles
documentos encontrados na casa de
Otávio. Trata-se mesmo de tráfico de
drogas. Otávio era mesmo traficante.
_ Havia alguns nomes nesses papéis?
_ Sim. Apesar de não mencionarem os
sobrenomes, conseguimos identificar
alguns. Finalmente temos o motivo do
crime. Desentendimentos e vingança.
_ Sim, tudo isso e algo mais.
_ Como assim?
_ Suspeito que haja também alguma coisa
emocional, vingança sim, mas não apenas
pela questão das drogas.
Monteiro ficou calado durante alguns
segundos, depois respondeu:
_ Em que se baseia para chegar a essa
conclusão?
_ É apenas uma suspeita. Vou analisar
melhor os fatos e quando tiver algo mais
sólido vou trocar idéias com você.
_ Estarei esperando. Enquanto isso, meu
pessoal está investigando.
Paulo desligou e leu novamente os
relatórios que Wagner trouxera. Quanto
mais lia, mais acreditava que Osmar, de
alguma forma, estava envolvido naquele
crime.
A secretária avisou que Vitório havia
chegado e queria falar com ele.
_ Mande-o entrar.
Pouco depois, Vitório entrou e, depois dos
cumprimentos, disse:
_ Marília me telefonou dizendo que
recebeu outra carta anônima e está com
medo. Pediu que fôssemos até lá.
_ Claro. Vamos.
Meia hora depois, eles chegaram na casa
de Marília e a encontraram muito
assustada. A carta havia sido colocada
debaixo da porta como a anterior.
Paulo tirou do bolso uma pequena pinça e
explicou:
_ Não vamos tocar nela. Pode ter
impressões digitais.
_ Eu a peguei e abri _ confessou Marília,
preocupada.
_ Eu também a segurei _ disse Dorita.
_ Se acontecer novamente, não toquem
em nada e me avisem.
Ainda segurando a carta com a pinça ele
leu:
'Você não devia ter entregado aqueles
papéis à polícia. Isso vai lhe custar muito
caro. '
Não estava assinada.
_ Eu fiz mal em entregar aquelas caixas.
Estou sendo ameaçada por causa disso _
queixou-se Marília.
_ Não tenha medo. Nós saberemos
defendê-la. Não vai acontecer nada. _
Respondeu Paulo, continuando: _ Eu
preciso de um saco plástico para colocar o
documento.
Dorita correu até a cozinha e voltou
trazendo o que ele pediu. Paulo colocou
cuidadosamente a carta dentro dele,
fechou e colocou-o no bolso. Depois,
aproximou-se de Marília, que estava
pálida, segurou sua mão e disse:
_ Você é uma mulher corajosa e vai
superar isso.
_ É a mesma pessoa que escreveu a outra
carta. Tenho certeza. Se soubesse como
me arrependo de ter ido àquela casa... _
Fez ligeira pausa e continuou: _ Nós
somos duas mulheres e uma criança nesta
casa. Não temos como nos defender. Se
eu tivesse dinheiro me mudaria para
longe, onde pudéssemos esquecer tudo
isso e ninguém pudessem nos fazer mal.
Olhos marejados, Marília esforçava-se
para conter as lágrimas que, teimosas,
despontavam e começavam a descer
pelas suas faces.
Paulo abraçou-a delicadamente:
_ Tenha calma. Nós a protegeremos.
Falarei com Monteiro, colocaremos
vigilância vinte e quatro horas.
_ Eu não deixei Altair ir à escola. Tive
medo. Ele é minha única riqueza. Temo
por ele.
Em sua mente a trágica cena do crime
que presenciara estava presente,
fazendo-a estremecer.
Altair entrara na sala e Marília esforçou-
se para controlar-se.
_ Mãe, o que aconteceu? Está chorando
por causa daquela carta?
Marília tentou sorrir.
_ Não, meu filho. Não há perigo. Estamos
protegidos. O Dr. Paulo e o Dr. Monteiro
vão nos proteger. Nada vai nos acontecer.
_ Isso mesmo Altair _ interveio Paulo,
que tirara os braços que colocara em
volta de Marília. _ Não tenha medo.
O ambiente estava tenso e Dorita tentou
fazer alguma coisa:
_ Vamos todos tomar um lanche? Está na
hora. Vou fazer um chá e temos um bolo
delicioso que Marília fez hoje. Uma receita
nova está maravilhosa.
_ Isso mesmo _ tornou Marília. _ Vamos
tomar um chá com bolo, assim vocês me
dirão se ele está bom mesmo.
Eles foram para a copa, Dorita arrumou a
mesa e dentro de alguns minutos eles
estavam sentados tomando chá e
experimentando o bolo.
Marília esforçava-se para parecer calma,
mas Paulo sentia o quanto ela estava
apavorada. Naquele instante sentiu um
calor no peito e uma vontade muito forte
de abraçá-la e protegê-la contra todos os
perigos".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 16
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Depois que deixaram à casa de Marília,
Vitório foi para a casa e Paulo decidiu
passar na delegacia.
Com o delegado, Paulo examinou melhor
a carta. Resolveram entregá-la a um
departamento para exame pericial.
Sentado diante de Monteiro, Paulo
indagou:
_ O que você pensa dessa carta?
_ Pode ser uma boa pista, acredito que
tenha sido escrita pelo assassino. Mas por
outro lado, duvido que ele tenha deixado
algum rastro. Deve ter se prevenido.
_ É o que penso. Mas, também, sabemos
que o mais precavido dos assassinos pode
ter um deslize.
_ Contamos com isso _ disse Monteiro
sorrindo.
Ele estava satisfeito por ter a ajuda de
Paulo. Respeitava-o por sua inteligência e
pela folha de serviços prestados à polícia.
Pouco tempo depois, um policial apareceu
com a carta dizendo:
_ Não encontramos nada.
_ Eu temia isso _ respondeu Monteiro.
_ Marília ficou assustada. Eu prometi que
iríamos protegê-la _ disse Paulo.
_ Você sabe que não temos homens
disponíveis. Há muito trabalho e pouca
gente. Eu também estou preocupado com
eles. Duas mulheres e uma criança são
alvos fáceis para um bandido como esse.
Se você puder nos ajudar, seria muito
bom.
_ Vou ver o que posso fazer. Se for
preciso, eu mesmo ficarei na casa dela de
vigia.
_ Faça isso. Se notar qualquer sinal
suspeito, avise-me que mandarei meu
pessoal verificar.
Paulo deixou a delegacia pensando o que
poderia fazer para proteger Marília.
Decidiu passar na casa de Vitório para
trocar idéias.
Vendo-o chegar, Vitório admirou-se:
_ Você? Aconteceu mais alguma coisa?
_ Não. Nós precisamos conversar. Estive
com o delegado e ele não dispõe de
recursos para vigiar a casa de Marília
vinte e quatro horas como seria
necessário. Talvez você possa nos ajudar.
_ Pode contar comigo. Estou sem fazer
nada, esperando notícias, sem saber onde
está minha mãe, se está viva, se corre
perigo...
_ Os dois que trabalham comigo estão
ocupados e no momento não posso dispor
deles. Eu pensei em ficar na casa de
Marília para protegê-los, mas precisaria
de mais alguém para ajudar-me.
_ Eu gostaria de fazer isso.
_ Está bem. Já conversei com o Monteiro
que aprovou minha idéia, uma vez que
não têm policiais suficientes em seu
departamento para fazer isso. Vai ficar à
nossa disposição para o caso de notarmos
alguma coisa suspeita.
_ Você me diz o que deverei fazer.
_ Vou passar em meu escritório, dar
algumas instruções a Dóris, passar em
casa e ir para a casa de Marília, onde
pretendo ficar por alguns dias.
_ Quer que eu vá com você?
_ Não é preciso. Amanhã cedo você vai ao
meu encontro na casa de Marília. Juntos,
vamos programar os próximos passos. O
que não podemos é deixá-los sozinhos.
_ Está bem. Amanhã logo cedo estarei lá.
Paulo saiu para tomar as providências e
Vitório sentou-se na sala pensativo.
Sentia-se triste pensando no pai
deprimido e na mãe desaparecida.
Dinda aproximou-se dizendo:
_ Tristeza não vai resolver nossos
problemas. Seu pai já está doente e eu
não quero que você também fique. Onde
está sua fé? Onde está sua confiança na
vida?
Vitório olhou-a sério e respondeu:
_ Está difícil. Nunca pensei passar por um
problema desses.
_ Eu também fiquei triste, mas hoje
quando acordei, pensei: a tristeza só vai
me fazer mal e não vai solucionar nossos
problemas. Lembrei-me de uma frase que
li tempos atrás: na vida o que você
planta, colhe. Se eu plantar tristeza, vou
colher tristeza. Então, decidi reagir.
Pensar no bem. Acreditar que Teresa está
viva e vai voltar. Que esses momentos
difíceis vão passar e tudo voltará ao
normal. Pensando assim eu me senti
muito melhor.
Vitório sorriu e respondeu:
_ Como sempre você tem razão. Para
atrair coisas boas é preciso acreditar que
elas virão. Vou me esforçar para me
lembrar de mamãe bem-disposta, alegre.
Mandar para ela energias boas. Essa é a
maneira certa de ajudá-la.
_ Isso mesmo. É o que estou fazendo.
Seria bom que o Dr. Alberto fizesse o
mesmo. Tentei conversar com ele, animá-
lo, mas ele não me deu ouvidos.
_ Vou vê-lo e ver o que posso fazer.
Vitório foi ver o pai e encontrou-o
estirado no sofá, pensativo e triste.
Percebeu o quanto ele estava abatido. Se
continuasse assim seu estado poderia
agravar-se.
Aproximou-se, sentou-se ao seu lado e
perguntou:
_ Está melhor, pai?
Alberto abriu os olhos e respondeu:
_ Estou na mesma. O tempo não passa e
estou cansado de me culpar por haver
concordado que sua mãe viajasse sem
mim.
_ Você não tem culpa de nada. Nunca
poderia imaginar que ela iria desaparecer
dessa forma.
_ Às vezes me pergunto se estamos
certos. Se aquele corpo não é mesmo o
dela.
_ Não é, pai. Tenho certeza.
_ A dúvida me atormenta.
_ Mamãe nunca iria para a cama com
aquele homem. Não lhe basta isso para
saber que não é ela?
_ Às vezes nem eu mesmo sei se estou
raciocinando ou enlouquecendo. Não me
conformo com o que aconteceu.
_ Um dia saberemos a verdade. Por
enquanto, temos de aguardar. Paulo
continua investigando. Encontramos os
documentos na casa de Marília, a polícia
está pesquisando tudo. Hoje Marília
recebeu outra carta anônima.
Alberto abriu os olhos, endireitou-se no
sofá e pareceu mais desperto:
_ Outra carta anônima? Seria da mesma
pessoa que lhe mandou a primeira?
_ Tudo indica que sim. A carta a estava
ameaçando por ter entregado aqueles
documentos à polícia.
_ Talvez tivesse sido melhor que ela não o
tivesse feito.
_ Não diga isso. Qualquer pista é
importante para desvendar esse crime e
descobrir o paradeiro de mamãe.
_ O que vocês pensam fazer agora?
_ Paulo vai proteger Marília e eu vou
ajudá-lo.
_ É melhor não se envolver, pode ser
perigoso.
_ Já estamos envolvidos, pai. E, quanto
antes descobrirmos o assassino, melhor.
A vida de mamãe pode estar dependendo
disso.
Alberto meneou a cabeça negativamente.
_ Não sei... Eu gostaria de encerrar esse
assunto para poder ficar em paz.
_ Só conseguiremos ter paz quando tudo
estiver esclarecido. Eu preciso que você
nos ajude.
_ Eu?! Velho, doente? Minha vida acabou.
Não sou mais capaz de fazer nada. Até a
empresa que sempre me impulsionou
para frente, agora perdeu a razão de ser.
Não sinto mais vontade de viver.
_ Você está enganado. Sua maneira de
pensar está agravando nosso problema.
_ Como assim?
_ Só pensando no mal, no pior, você está
atraindo energias negativas em nossa
vida e dificultando os bons resultados.
Alberto abriu a boca, ia dizer alguma
coisa, mas mudou de idéia,
permanecendo em silêncio.
Vitório continuou:
_ Quando você dá força a pensamentos
tristes, pensando no mal, está atraindo
mais mal para sua vida.
_ Do jeito que você fala parece que sou
culpado pelo que aconteceu.
_ Não foi isso que eu disse. Nós estamos
atravessando momentos difíceis e se
ficarmos mergulhados no mal estará
dificultando ainda mais nossos
problemas. Você acredita que a sua vida
acabou que não há mais saída. Esse
pensamento o está enfraquecendo,
deixando-o doente e frágil. Nem parece o
homem forte, cheio de vigor que
construiu uma empresa sólida, um nome
respeitado.
_ Depois do que aconteceu nunca mais
nosso nome será respeitado. As pessoas
são maldosas e acreditam que Teresa me
traiu com aquele homem.
_ Você sabe que isso não é verdade. Não
era ela quem estava naquela cama.
Mamãe seria incapaz de fazer uma coisa
dessas. Dizendo isso você está dando
força aos maledicentes e atirando sobre
mamãe uma culpa que ela não tem.
Alberto suspirou, tentou sorrir e
respondeu:
_ Desculpe. Mesmo sabendo que ela não
me amava, sei que Teresa nunca faria
isso. Era uma mulher honesta. Esta
situação está me enlouquecendo.
_ É por esse motivo que deve reagir,
procurar encontrar a paz interior. Só
assim encontrará forças para superar
esta situação. Pense você não sabe o que
aconteceu. Não pode sentir culpa por algo
que não está claro.
_ É difícil. Não sei como reagir.
_ Use a imaginação. Pense que ela não
morreu que um dia vai voltar e explicar o
que aconteceu. Então, sim, você vai poder
formar uma opinião. Enquanto isso
procure se acalmar e pensar no melhor.
_ Você fala isso com uma certeza!
_ Tudo passa, meu pai. Dias melhores
virão. Agora faça um esforço, vamos
andar um pouco. Dinda já fez o jantar e
hoje você vai comer na mesa, comigo.
Chega de ficar fechado no quarto. Vamos.
Alberto ia objetar, mas Vitório o segurou
pelo braço, obrigando-o a levantar-se.
Foram caminhando devagar até a sala de
jantar, onde a mesa estava posta para
um. Vendo-os chegar, Dinda apressou-se
a providenciar mais um lugar.
Depois de acomodar o pai, Vitório sentou-
se também e logo a Dinda colocou a
sopeira fumegante sobre a mesa.
Vitório serviu o pai e começou a
conversar sobre vários assuntos com
desenvoltura e Alberto, sentindo o
carinho do filho, olhava-o como se o
estivesse vendo pela primeira vez.
Sempre o relegara a segundo plano,
julgando-o menos inteligente do que
Osmar, mas agora que ele estava
mostrando um pouco mais sua maneira de
ser, Alberto percebeu satisfeito que
Vitório era muito melhor do que julgara.
Esse pensamento o alegrou, fazendo-o
sentir-se mais animado.
Vitório sentia-se diferente. Mais sereno
disposto e com um carinho muito grande
pelo pai, como jamais sentira. Sempre o
julgara um mercenário só pensando em
dinheiro, sem tempo para outros
assuntos.
Mas naquela noite havia alguma coisa
diferente no ar. De repente, Vitório sentiu
que as coisas poderiam mudar para
melhor e percebeu o quanto era inútil e
pernicioso alimentar pensamentos
negativos.
O que ele não viu era que havia outros
espíritos naquela sala. Quando três
espíritos iluminados entraram na sala, lá
estavam dois espíritos de péssima
aparência que, ao verem a luz dos recém-
chegados, encolheram-se em um canto
assustados.
Enquanto o espírito de Analú aproximava-
se de Vitório, transmitindo-lhe
pensamentos elevados de confiança e de
fé, os dois de luz dirigiram-se aos outros
dois espíritos temerosos:
_ Queremos conversar com vocês. Chega
de sofrimento. É hora de perdoar e de
procurar viver em paz.
_ Não posso perdoar meu assassino. Não
adianta vir com essa conversa. O que
vocês querem é defender aquele infeliz.
Por que não vai castigá-lo pelo que fez?
_ Não estamos aqui para punir ninguém.
Isso compete à Justiça divina. Queremos
evitar maiores sofrimentos para vocês.
_ Não acredito nisso _ respondeu a
mulher. _ Caí numa armadilha. Não
merecia morrer daquele jeito.
_ Meu nome é Cássio. Não se recorda de
mim, Otávio?
O espírito de Otávio o fixou e depois
gritou nervoso:
_ Você deve ter saído dos infernos para
me atormentar. Você fala em perdão, mas
veio se vingar de mim.
_ Não é verdade. Há muito eu o perdoei.
Vim em missão de paz.
_ Eu não quero seu perdão.
_ Vocês não podem ficar aqui. Devem
seguir o novo caminho. Deixar as coisas
da Terra.
_ Eu não posso _ gritou Otávio. _ Eles
estão devassando todos os meus papéis.
Aquela louca de Marília os entregou à
polícia. Ela não podia me trair dessa
forma.
_ Sua vida na Terra acabou. Não adianta
se revoltar. O melhor é seguir adiante.
_ Eu não vou. Daqui eu não saio.
_ Vocês não podem mais ficar aqui.
_ Vou ficar até conseguir o que quero.
_ Teresa me enganou _ disse a mulher
com os olhos brilhantes de ódio. _ Ela já
começou a pagar, mas eu quero mais.
Cássio estendeu as mãos em direção a
eles e começou a orar. De suas mãos
começaram a sair raios de luz azul-claros
brilhante e o casal encolheu-se ainda
mais.
_ Vão embora, deixem esta família em
paz.
Os dois tremiam como que açoitados por
um vento forte e Otávio gritou:
_ Nós vamos embora, mas voltaremos.
Os dois desapareceram, enquanto os
outros dois uniram-se a Analú,
transmitindo energias positivas a Vitório,
Alberto e Dinda.
Ficaram assim por alguns instantes,
depois Analú beijou a testa de Vitório
dizendo:
_ Reaja. Você pode. Agora temos de ir.
Fiquem com Deus.
Foi nesse momento que Vitório viu o
espírito de Analú e seus companheiros e
entendeu o que estava acontecendo. Em
pensamento agradeceu a eles pela ajuda.
Terminando o jantar, Alberto comentou:
_ Estou me sentindo melhor. Foi bom eu
ter me levantado.
Vitório sorriu e respondeu:
_ Isso mesmo, pai. De hoje em diante
prometa que você vai reagir e se esforçar
para manter o otimismo.
_ Não sei se vou conseguir.
_ Pelo menos não alimente o pessimismo.
Já será o bastante.
Um pouco distante dali, os espíritos de
Otávio e de sua companheira esperavam.
Eles pretendiam voltar à casa de Vitório
assim que os espíritos que os expulsaram
fossem embora.
_ Por que não voltamos à casa de Marília?
_ indagou a mulher. _ Seria menos
perigoso. Aqueles homens são perigosos.
Você sabia que eles podem nos prender e
nos obrigar a segui-los?
_ Bobagem. Eles não têm tanto poder
assim.
_ Pois eu acho que têm. Na casa de
Marília estaremos seguros. Ninguém vai
nos atrapalhar.
_ Não gosto de ficar lá. Faz-me lembrar o
que perdi.
_ O que você espera ficando na casa de
Vitório?
_ Meu primeiro ajuste de contas será com
Osmar. Aquele safado vai me pagar. Por
causa dele acabamos daquele jeito.
_ Mas o assassino não foi ele.
_ Eu sei. Mas ele deu chance a que o Gil
Duarte nos descobrisse e fizesse o que
fez.
_ Eu nunca deveria ter ido no lugar de
Teresa.
_ Ela lhe pagou muito bem.
_ De que adiantou? Não vou poder colocar
a mão no dinheiro.
_ Veja, Renata, eles já foram embora.
Vamos voltar.
Os dois aproximaram-se do apartamento
de Alberto e tentaram entrar, mas não
conseguiram. Havia algo como uma
barreira. Eles tentaram, mas não
puderam passar.
_ E agora? _ indagou Renata.
_ Vamos até a minha casa.
_ Você não tem mais casa.
_ A casa de Marília, você entendeu.
Quando os dois entraram e se
aproximaram, Marília e Dorita estavam na
cozinha trabalhando.
Dorita comentou:
_ De repente me bateu um cansaço...
Estou sentindo um peso...
_ O que é isso, Dorita? Ontem
trabalhamos muito mais e você não se
queixou.
_ É mesmo. Mas agora comecei a sentir
dores no corpo e uma pressão na cabeça.
_ Vou fazer um chá de cidreira. Vai se
sentir melhor.
A campainha tocou, Marília foi abrir e
perguntou:
_ Quem é?
_ Pode abrir. Sou eu, Paulo.
Ela abriu imediatamente.
_ Paulo! Você voltou, tem alguma
novidade?
_ Sim. Estive conversando com o Dr.
Monteiro e decidimos que eu vou ficar
alguns dias aqui com vocês para protegê-
los.
_ Ficar aqui?
_ Sim. Não se preocupe. Eu fico em
qualquer lugar.
_ Você ficar aqui é uma boa notícia. Nós
estávamos com muito medo. Ainda agora
tive receio de abrir a porta.
_ Fez bem. Precisamos ter cuidado. Mais
tarde vou dar-lhes algumas informações
sobre os cuidados que deveremos tomar.
Paulo entrou, Altair correu para abraçá-
lo.
_ Você vai ficar aqui? Que bom. Pode ficar
no meu quarto.
Paulo sorriu e respondeu:
_ Eu vim para vigiar enquanto vocês
dormem. Não posso ficar no quarto.
_ Mas você não pode ficar sem dormir _
tornou Marília.
_ Vitório virá amanhã cedo. Ele ficará
durante o dia e eu à noite. Resolvi ficar o
tempo todo aqui porque não quero deixar
Vitório sozinho. Ele não tem experiência
para tomar providências se notar algo
suspeito. Durante o dia se precisar de
alguma coisa ele me chamará e farei o
que for preciso.
_ Que bom _ comentou Dorita que se
aproximara.
_ Você já jantou? _ indagou Marília.
_ Não quero dar trabalho. Tomei um
lanche reforçado antes de vir.
_ Não vai fazer cerimônia, não é? _
brincou Dorita.
_ Claro que não _ respondeu ele.
_ Nós ainda não saímos da cozinha e
comemos muito bem. Colocar mais um
prato ou dois na mesa não vai fazer
diferença _ explicou Dorita.
_ Isso mesmo. Assim nossa cozinha vai
ficar mais animada _ disse Marília.
Depois, Marília fez um chá de erva-
cidreira e levou uma xícara para Paulo,
dizendo:
_ Obrigada pelo que está fazendo por nós.
_ É minha obrigação.
Marília fixou-se nos olhos de Paulo e
respondeu com carinho:
_ É muito mais do que obrigação. É uma
prova de amizade que eu nunca
esquecerei. Você não sabe o bem que
está nos fazendo.
Os olhos dela brilhavam úmidos e Paulo
sentiu-se comovido.
_ Vocês podem contar comigo sempre. Se
continuarem me tratando assim, não vou
querer ir mais embora _ brincou,
tentando disfarçar a emoção.
O espírito de Otávio, que observava, disse
irritado:
_ Este infeliz não tinha nada que invadir
minha casa e ainda cantar minha mulher.
Renata riu e comentou:
_ O que você esperava? Que ela ia lhe ser
fiel? Não vê como os olhos dela brilham?
_ Cale a boca. Em mulher minha ninguém
põe a mão.
_ Agora você está morto e morto não
pode fazer nada para impedir.
_ Se ele continuar assim você vai ver se
eu posso ou não.
De repente, Paulo sentiu uma onda
desagradável e pensou:
'Tem espírito perturbado por perto. Logo
mais vou me ligar com meus amigos
espirituais. '
_ Cuidado que ele sentiu nossa presença
_ comentou Renata.
_ Eu não tenho medo de nada. Você tem
andado muito fraca para o meu gosto.
Renata deu de ombros e foi ficar em um
canto pensativa. Já tinha problemas
demais para envolver-se nos de Otávio.
Paulo tomou o chá, depois se sentou na
sala e ligou-se aos espíritos amigos que o
acompanhavam. Logo sentiu uma energia
suave e agradável no ambiente. Ficou
concentrado durante mais alguns
minutos, agradecendo a ajuda dos
amigos.
Enquanto isso, Otávio e Renata olhavam
admirados para a barreira que se formara
entre Paulo e eles, tornando-o imune às
suas energias negativas".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 17
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Teresa acordou um pouco assustada e
olhou em volta, querendo se recordar por
que não estava dormindo em sua cama
como de costume.
Em seguida, lembrou-se e passou as mãos
nos cabelos, angustiada. O que estaria
acontecendo com os seus? Como estariam
enfrentando os acontecimentos?
Do jeito que as coisas estavam, ela não
tinha como entrar em contato com eles e
esclarecer tudo. Se fizesse isso, logo seria
descoberta e sua vida não valeria nada.
Bem que Vitório lhe pedira para não
viajar. Mas na ocasião ela não teve como
evitar aquela viagem. Coagida como
estava, não lhe restava outro recurso
senão enfrentar e tentar resolver.
Nunca imaginara que a paixão tivera
cinco anos depois do casamento pudesse
transformar sua vida, tantos anos depois
de haver renunciado a ela, em um
inferno.
Casara-se com Alberto satisfazendo a
vontade de sua mãe que ficara viúva e
sem recursos. Seu pai tivera insucesso
nos negócios e lhes deixara dividas que,
depois de pagas, consumiram todo o
patrimônio delas.
Alberto era jovem, elegante, boa
aparência, embora.
Não fosse o tipo de homem que Teresa
apreciava, mas apaixonara-se por ela e
fizera todos os esforços para conquistá-
la.
Aos poucos , Teresa fora sentindo
envaidecida, amada e protegida por um
homem rico, que a colocava acima de
tudo e todos, assim acabou concordando
com o casamento.
Até então, ele tivera alguns namorados,
uma paixão na juventude que a
desiludira, fazendo-a reconhecer em
Alberto as qualidades essenciais para
uma vida calma e feliz. Nunca sentira
amor por ninguém. Casou-se com Alberto,
imaginando que amor fosse à amizade e o
respeito que ele parecia ter por ela.
Sua mãe sempre dizia que o verdadeiro
amor não existia, era apenas uma
fantasia da adolescência. Que o mais
importante era um bom partido para lhe
proporcionar uma vida tranqüila e
respeitável.
Depois do casamento, Teresa deu-se
conta dos ciúmes de Alberto sentia e
antes não deixava transparecer, mas que
se revelou quando ela, bonita e já mais
mulher, despertava admiração nos
homens por onde passava.
Teresa nunca lhe dera motivo para ter
ciúmes, mas ela não tolerava perceber os
olhares de admiração que ela despertava.
Por esse motivo, os desentendimentos
com ele começaram.
Foi em uma festa em casa de amigos que
ela conheceu Antero, trinta e dois anos,
alto, elegante, moreno, olhos verdes e
penetrantes que fizeram bater seu
coração desde que eles encontraram os
seus.
Uma atração irresistível brotou entre os
dois. A principio, Teresa tentou resistir,
mas, assediada por ele de forma
insistente, acabou sucumbindo.
Inteligente e apaixonada, Teresa usou de
vários subterfúgios para encontra-se com
Antero sem que ninguém percebesse. Ela
imaginou que com o tempo essa paixão,
Como a anterior, iria embora sem
comprometer sua relação familiar.
Disposta a usufruir enquanto durasse,
não se sentia culpada por trair o marido.
No seu entender, ela nunca o amara,
deixara-se amar por ele sem nunca se
entregar de coração. Por esse motivo, não
o estava traindo.
por mais de três anos relacionou-se com
Antero de forma vibrante e apaixonada.
Quanto mais estavam juntos mais
desejavam ficar. Ele, solteiro, insistia
para que Teresa deixasse o marido para
ficarem juntos, porém ela se recusava a
abandonar os filhos, porque sabia que,
vingativo e ciumento, Alberti jamais os
deixaria ficar com ela ao lado de outro
homem.
Depois, havia a sociedade, o falatório, os
nomes de família, e Teresa temia
enfrentar as conseqüências.
Até o dia em que Antero lhe disse que não
desejava mas viver assim. Para ele era
difícil despedir-se e pensar que ela iria
para os braços do marido a quem
pertencia por direito.
As brigas entre os amantes começaram a
tumultuar o relacionamento. Antero
começou a afastar-se, até que certo dia
contou-lhe que seus pais insistiam para
que ele se casasse com a filha de um
amigo da família.
Teresa sabia que Eunice, há muito tempo,
era apaixonada por Antero. Estava
sempre nos mesmos lugares que ele e
não raro era com ela com que ele dançava
ou conversava. Ele dizia para Teresa que
fazia isso a fim de despistar, porquanto
seus pais estranhavam que ele não saísse
com nenhuma mulher e ficavam
perguntando o porquê.
Num encontro ele comunicou que iria ficar
noivo de Eunice e não voltaria mais vê-la.
Eunice era uma boa moça, amava-o e ele
estava cansado de viver escondendo seus
sentimentos. Depois, pensava em
construir uma família, desejava filhos e
não queria começar a vida conjugal tendo
outra.
Foi difícil para Teresa se afastar de
Antero, principalmente por que as
famílias freqüentavam os mesmos lugares
e a presença dele com Eunice e fazia
sofrer muito.
O casamento foi anunciado e Teresa
sofreu ainda mais. Quando faltavam três
dias para a data do casamento, Antero
comunicou-se com ela pedindo para ir ao
seu encontro.
Vendo-se, atiraram-se um nos braços do
outro, beijando-se com desespero.
- Não quero que você se case com outra-
Reclamou Teresa
- Antes de fazer isso, vim fazer a última
tentativa. Eu sinto muito sua falta. Se
você quiser, podemos ir embora juntos,
deixar tudo e todos e viver em outro
lugar. Podemos ir para o exterior,
deixamos uma carta explicando nossos
motivos. Esperamos o tempo passar e
quando a poeira assentar voltamos.
Teresa olhou-o com amor. Ir embora com
ele era o que ela mais desejava na vida.
Mas pensou nos meninos quem amava
muito, no que eles pensariam dela por tê-
los abandonado e fugido com outro e
tremeu angustiada.
Ela sentou que não poderia fazer isso. Foi
com tristes que se recusou a fugir com
Antero. Esse foi o último encontro dos
dois.
A partir desse dia não se falaram mais.
Ele casou-se com Eunice, teve uma filha,
Aurélia, que cresceu e tornou-se uma
linda mulher, muito requisitada na
sociedade.
Teresa continuou ao lado do marido e
cada dia mais se afastava dele. Nos
últimos anos Alberto também foi se
afastando dela, que se sentiu aliviada.
Sabia que ele saía com outras mulheres,
mas não se importava. Apesar disso, ele
continuava ciumento e eles se
desentendiam.
Certo dia recebeu um telefonema de um
desconhecimento dizendo que precisava
marcar um encontro para falar de um
assunto que era do seu interesse.
Teresa se recusou:
- Não marco encontros com estranhos-
respondeu.
- Trata-se de um assunto muito
importante. É melhor me atender.
- Fale com meu marido.
- Quando souber do que se trata,
certamente não vai querer que eu fale
com ele.
- Como assim?
- Quero falar com a senhora sobre Antero.
Teresa estremeceu assustada, tentou
dissimular:
- Que Antero? Não sei de ninguém com
esse nome.
- Sabe sim. Eu tenho o endereço de um
apartamento em Copacabana onde vocês
costumavam se encontrar.
Teresa não consegui responder de pronto.
O homem continuou:
- Eu tenho alguns bilhetes trocados entre
a senhora e ele, bem como algumas fotos
comprometedoras. Ainda quer que eu
ligue para seu marido?
- Não... Não. Como é que você tem tudo
isso?
- Isso não lhe interessa agora. Eu tenho e
estou disposto a lhe entregar, é claro,
com uma recompensa.
- Não acredito que você tem tudo o que
diz.
- Vamos marcar o encontro e eu lhe
mostrarei.
Teresa hesitou um pouco, depois disse:
- Está bem. Quando?
- Eu moro no Rio. Estou de passagem.
Terá de ser hoje ou amanhã.
- Quando você quer para me entregar
tudo isso?
- Duzentos mil reais
- É muito dinheiro.
- A mercadoria vale. A senhora traz o
dinheiro e eu lhe entregarei tudo.
- Antes quero ver o que você tem.
- Eu não posso esperar. Preciso ir embora
logo.
- Vamos marcar hoje à tarde e se o que
diz for verdade, vou lhe entregar o
dinheiro amanhã.
Combinaram o local do encontro e a hora.
Ele não quis dar o nome nem descrever
sua aparência, afirmando que saberia
encontrá-la.
Teresa desligou o telefone muito nervosa.
Nunca imaginou que depois de tanto
tempo aquela história pudesse trazer-lhe
problemas. Os bilhetes cheios de amor
que havia trocado com Antero, as fotos
que ele tirara dos dois que ela vira, mas
nunca levara nenhuma para casa com
medo de ser descoberta, eram um
material que destruía sua vida familiar
que tanto se sacrificara para manter.
Seus filhos nunca poderiam saber o que
ela fizera no passado. Sempre passara
para eles a figura da mulher séria,
dedicada ao lar, austera até. O que
pensariam quando soubessem a verdade?
Isso não poderia acontecer. Mas o preço
era elevado. Como arranjar tanto dinheiro
sem recorrer a Alberto?
Pensou eu suas jóias.
Durante tantos anos de casamento
possuía. Alberto costumava presenteá-la
sempre com lindas jóias. Poderiam
vender algumas sem que ele desse falta.
Na mesma tarde, Teresa foi ao encontro
marcado, em uma confeitaria. Sentada
em uma mesa, conforme o combinado, ela
esperou.
Pouco depois, um homem alto, forte,
moreno, boa aparência, aproximou-se e,
depois de cumprimentá-la, sentou-se a
seu lado.
Sem dizer uma palavra, ele tirou do bolso
uma foto e mostrou-se. Teresa
estremeceu. Ela e Antero, juntos na
intimidade. Lembrava-se perfeitamente
quando e onde ela fora tirada. Depois,
juntou um dos bilhetes amorosos que ela
escrevera. Não havia como duvidar.
- Está certo. Vou pagar o que me pede. Só
preciso de um pouco de tempo.
- Não posso esperar. Preciso ir embora.
- Deve compreender que não tenho como
arranjar todo esse dinheiro de um dia
para o outro. Não posso pedir a meu
marido. Pretendo vender algumas jóias,
mas não sei se consigo tão depressa.
- Nesse caso, terei de oferecer a seu
marido. Estou certo de que ele pagaria
tão depressa.
- Talvez. Mas peço-lhe que me de alguns
dias. Irei levar o dinheiro onde você
quiser.
- Preciso ir embora. Tenho negócios em
São Paulo e de lá irei para outro lugar.
- Dê-me uma semana e eu levarei o
dinheiro a São Paulo, no endereço que
você quiser.
Ele pensou um pouco e depois disse:
- Se a senhora pensar em ir a polícia, vai
se arrepender. Tenho amigos que estarão
alerta e qualquer passo eu saberei.
Ele passou um numero de telefone para
onde ela deveria ligar, marcou o dia e a
hora e depois de tudo combinado,
despediu-se.
Naquela noite Teresa não conseguiu
conciliar o sono. Sua cabeça atormentada
não a deixava em paz. Ora recordava-se
de Antero, dos momentos de amor que
ainda fazia vibrar seu coração, ora temia
pelo destino que aquelas fotos e cartas
poderiam ter se não conseguisse pagar o
preço.
Se ela não arrumasse o dinheiro, o
chantagista certamente procuraria
Alberto e ele, com certeza, não se negaria
a pagar o que ele pedisse para ter acesso
aquele material.
No dia seguinte acordou cedo e pensou
como encontrar um comprador para as
jóias. Não conhecia nenhum agiota e
sequer sabia quanto elas poderiam valer.
As horas foram passando e Teresa não
sabia o que fazer.
Procurou anúncios nos jornais, na lista
telefônica, mas não encontrou nada.
À tarde teve idéia de ir a uma joalheria
para fazer uma avaliação e, quem sabe,
descobrir onde poderia vendê-las.
Carregando uma bolsa com as jóias, que
imaginava render a quantia desejada, foi
a uma lojas de jóias e descobriu que elas
cobriam o montante que ela precisava e,
ainda, sobraria algum dinheiro.
Conseguiu o endereço de um lugar que
negociava jóias usadas.
Satisfeita, Teresa procurou o endereço .
Não era uma loja aberta e ela tocou a
campainha. Uma moça veio abrir e Teresa
achou o rosto familiar.
- Entre Senhora. Sente-se. O Sr. Jonathan
saiu, mas deve voltar logo. Desejava uma
água ou café?
- Não, obrigada. Eu preciso vender
algumas jóias e na joalheria onde fui
avaliá-las me deram este endereço.
- Veio ao lugar certo. Mas quem faz o
negócio é meu patrão. Ele não deve
demorar. Desculpe, não quero ser
indiscreta, mas por acaso seu nome é
Teresa?
-Sim.
A moça sorriu satisfeita e continuou:
- Não se recorda de mim?
- Seu rosto é muito familiar, mas não sei
onde.
- Sou Elvira. Nós fomos colegas de
faculdade.
Teresa levantou-se , fixando-a bem:
- Elvira! É você mesma! Como não me
lembrei?
- Já se passaram mais de trinta anos e eu
mudei muito. Já você continua linda como
sempre. Parece que o tempo não passou.
- Mas passou sim. Por onde tem andado
que nunca mais nos vimos? Você morava
em São Paulo e veio ao Rio apenas para
cursar a faculdade...
- De fato, naquele tempo eu morava em
São Paulo, mas depois que me casei fui
morar em Campinas.
- Como vai sua mãe?
- Infelizmente, ela morreu. Meu marido
também faleceu em um acidente de carro
e eu fiquei só. Não tive filhos. Voltei para
São Paulo, passei um tempo difícil, até
que tive a oportunidade de trabalhar para
o Sr. Jonathan. Ele tem outra loja em São
Paulo e quando abriu esta aqui, no Rio,
convidou-me para trabalhar para ele.
Como não tenho família, aceitei.
Elas continuaram conversando,
recordando os tempos de faculdade até a
chegada do Sr. Jonathan. As jóias de
Teresa eram de primeiríssima qualidade e
depois de examiná-las cuidadosamente,
ele fez o preço.
Como ele desejava receber em dinheiro,
ele pediu-lhe que voltasse na tarde no dia
seguinte para buscá-lo.
Na tarde seguinte, quando Teresa chegou
para buscar o dinheiro, já era fim de
expediente e Elvira se preparava para
sair.
Teresa ofereceu-se para levá-la em casa,
o que ela aceitou de bom grado. No
trajeto, convidou-a para tomar um lanche
em uma confeitaria. Queria conversar
sobre um assunto muito importante.
Elvira aceitou.
É que depois de Tê-la encontrado na
tarde anterior, Teresa pensou em recorrer
a ela para traçar seu plano. Elas haviam
sido inseparáveis nos tempos de
estudante davam-se muito bem. Teresa
sabia que ela era confiável.
Assim que se sentaram na confeitaria,
Teresa contou-lhe seu problema e por que
estava vendendo as jóias. Depois, expôs
seu plano.
Teresa queria que Elvira fosse trabalhar
com ela como dama de companhia. Diria
para a família que estava estressada e
tiraria férias. Iriam a Europa.
Mas, em vez disso, viajaram a São Paulo
primeiro, entregariam o dinheiro, ela
queimaria as provas do seu deslize e
depois as duas iriam para a Itália,
tranqüilas, usufruir uma viagem
maravilhosa.
Elvira aceitou,encantada. Ela não
conhecia a Europa.
Rapidamente eles as levaram ao
estacionamento e as obrigaram a entrar
em um carro, onde já havia outro homem
na direção.
- Vamos embora, rápido - ordenou um
deles.
O carro saiu e as duas, muito assustadas,
nem pensaram em reagir. Os quatro
foram sentados no banco detrás. Os
bandidos vendaram os olhos delas e um
deles disse ameaçadoramente:
- Se tentarem alguma coisa, eu atiro. Não
quero nem um pio.
Quanto tempo durou aquela viagem elas
não conseguiram avaliar. Parecia que não
terminava nunca e, ao mesmo tempo, elas
não queriam chegar a lugar nenhum, com
medo de que eles as matassem.
Finalmente o carro parou e elas foram
obrigadas a descer. Ainda de olhos
vendados, foram levadas a uma casa em
que havia mais pessoas, mas elas não
conseguiram saber quantas.
Depois de subirem alguns lances de
escada e andarem um pouco, eles tiraram
suas vendas, fizeram-nas entrar em uma
sala e saíram, fechando a porta por fora.
As duas entreolharam-se nervosas.
Teresa foi a primeira a falar:
- São bandidos. Fomos assaltadas. Estou
com a bolsa, mas o dinheiro todo está em
uma das malas. Estou perdida. Não vou
poder pagar e Alberto descobrirá tudo.
- Calma. Pode ser que não encontrem o
dinheiro. Você colocou-o naquele fundo
falso.
Algum tempo depois, elas ouviram
passos, a porta se abriu e os dois homens
entraram, carregando as bagagens e
deixando tudo em um canto. Em seguida,
saíram, fechando novamente a porta pelo
lado de fora.
As duas correram ansiosas para verificar
se as malas haviam sido arrombadas, mas
as fechaduras intactas mostravam que
eles não haviam tocado em nada.
As duas entreolharam-se intrigadas. Por
que eles as haviam raptado se não era
para roubar?
O tempo começou a passar e elas
continuavam presas naquele quarto sem
que ninguém aparecesse. Já era noite
quando finalmente dois homens
apareceram, e elas viram que não eram
os mesmos que as haviam seqüestrado.
Um deles, homem muito bem vestido, de
meia-idade, dirigiu-se a elas, com meio
sorriso, dizendo:
- Desculpe a forma de trazê-las até aqui.
Sou pessoa educada e jamais maltratarei
uma mulher. Se fizerem tudo o que
desejo, nada vai lhes acontecer. Ficarão
aqui durante alguns dias e depois vamos
devolvê-las sãs e salvas, se tudo sair
como esperamos.
Teresa animou-se a perguntar:
- Quem é o senhor? Por que nos trouxe
aqui?
- Você não me conhece. O motivo de
trazê-las aqui, saberá no devido tempo.
Obedeçam as ordens e tudo acabará bem.
Esse é o meu desejo, no entanto, tudo vai
depender de como se comportarem.
A um gesto dele, o seu companheiro
colocou sobre a mesa alguns pacotes e
garrafas de água. Depois saíram fechando
novamente a porta por fora.
- Isto é muito estranho - disse Elvira. -
Eles não estão interessados em nossos
pertences. O que mais pode ser?
- Não tenho a menor idéia. Isto não faz
sentido. O que será que eles querem de
nós?
Elas foram abrir os pacotes. Havia pão,
frios, frutas e biscoitos. Elas estavam sem
fome. Sentaram-se na beira de uma das
camas, tentando encontrar uma
explicação.
Mas naquela noite, depois de se
alimentarem, Teresa, deitada, lembrou-se
das palavras de Vitório:
"Mãe, eu preferia que não fizesse essa
viagem. Estou com mau pressentimento.
Algo me diz que você não deve viajar
agora".
Antes tivesse atendido seu pedido".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 18
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"O dia ainda não tinha amanhecido
totalmente quando Teresa levantou-se,
aproximou-se de Elvira, que estava
estendida na outra cama, e disse:
- Não consigo dormir. Temos de fugir
daqui.
- Se tentarmos isso, eles vão nos matar.
- Não podemos ficar de braços cruzados.
Precisamos tentar descobrir onde
estamos e saber se eles vão ficar na casa
o tempo todo.
Ela caminhou até a porta e girou a
maçaneta. Na mesma hora ouviu um ruído
e uma voz gritou:
- Não adianta. A porta não vai abrir.
- Preciso de ajuda. Estou com uma dor de
cabeça horrível e não consigo dormir.
Você poderia arranjar-me um
comprimido? Eu pago o que quiser.
Depois de alguns minutos de silêncio, a
chave girou e a porta abriu. Um homem
que elas ainda não tinham visto,
apareceu, e Teresa colocou a mão na
testa, fingindo estar muito mal.
- É meu turno de vigia. Não posso sair
daqui.
- Mas está doendo muito. Eu sofro de
enxaqueca e quando fico nervosa ela
ataca.
Desta vez parece que vou ficar louca. Por
favor, arranje-me um remédio.
Ele olhou-a hesitante, depois disse:
- Não posso sair daqui, mas vou ver se
mando alguém arrumar isso.
- Obrigada. Você não se arrependerá.
Meia hora depois ele abriu a porta
novamente, entrou e disse:
- Aqui está o que eu consegui arranjar.
Espero que a ajude.
Teresa, fingindo mal-estar, apanhou o
envelope de comprimidos e disse:
- Espere um pouco.
Apanhou a bolsa, tirou uma nota da
carteira e deu-a a ele, que segurou o
dinheiro e respondeu:
- Não precisava.
- Faço questão. Você foi muito bom para
mim. Eu nunca esqueço de retribuir as
pessoas que me ajudam.
Ele fechou a porta de novo e Elvira
perguntou:
- O que você pensa em conseguir com
isso?
- Ganhar a confiança dele e descobrir o
que desejamos saber.
Ao meio-dia, um outro homem trouxe
uma bandeja com o almoço. Pela
embalagem em papel alumínio elas
perceberam que a comida havia sido
comprada, mas não havia nada escrito.
Teresa abriu e convidou:
- Vamos comer, Elvira. Precisamos nos
manter fortes. Tenho esperança de
podermos escapar daqui.
Depois que elas almoçaram, o homem que
parecia comandar o grupo reapareceu,
segurando uma pasta de couro.
Perguntou se haviam almoçado bem, se a
comida estava ao gosto delas e depois
sentou, pedindo que elas também se
sentassem em volta da mesa.
Elas sentaram-se e esperaram. Ele
começou, dirigindo-se a Teresa:
- Você vai escrever uma carta que eu vou
lhe ditar.
- Para quem e para quê? - indagou
Teresa.
- Para seu filho Osmar.
Teresa sobressaltou-se:
- Por isso você nos seqüestrou? Para
pedir dinheiro a meu filho?
Os olhos dele brilharam rancorosos
quando respondeu:
- Eu não sou um chantagista. Sou um
homem de negócios que seu filho passou
para trás. Ele me deve muito dinheiro e
precisa pagar.
Teresa abriu a boca e fechou-a, sem
encontrar palavras para responder. Ela
tinha o filho em conta de uma pessoa
equilibrada, bem-comportada, sem
grandes arroubos. Como ele poderia
dever muito dinheiro a alguém?
Quando se recuperou um pouco do susto
ela tornou:
- Se meu filho está lhe devendo, por que
não nos procurou de maneira civilizada?
Meu marido é um homem de bem, tenho
certeza de que ele não sabe dessa dívida
porque se soubesse não deixaria Osmar
passar por uma coisa dessas.
- Há muitas coisas que tanto a senhora
como seu marido ignoram sobre seu filho.
Os negócios que nós temos não podem
ser declarados oficialmente. São feitos
sob palavra. Nós somos homens de
palavra. Quando um não cumpre, temos
nossos próprios modos de fazer a
cobrança.
Teresa empalideceu. A descoberta de que
Osmar se dedicava a negócios ilícitos
feriu fundo seus princípios de
honestidade e de bom comportamento.
De pronto ela não encontrou nada para
responder. O homem entregou-lhe uma
caneta, um bloco e disse:
- Escreva o que vou lhe ditar.
Com a mão trêmula, ela segurou a caneta
e percebeu que não lhe restava
alternativa, senão obedecer.
- Escreva:
"Osmar,
Fui seqüestrada. Se você não mandar o
dinheiro que deve, eles vão me matar
com Elvira. Estou com muito medo.
Teresa".
Ela escreveu, ele apanhou o bilhete e
Teresa objetou:
- Ele não vai acreditar. Pensa que eu
estou na Europa.
O homem pensou um pouco, depois
colocou a carta dentro de um envelope e
respondeu:
- É. Pode ser que ele não acredite. Você,
Elvira, vai levar o bilhete.
- Eu?!
- Sim. Vou combinar um encontro com ele
e um dos meus homens a levará até ele.
Você entregará a carta pessoalmente.
Assim, ele vai acreditar.
E, voltando-se para Teresa, continuou:
- Eu quero seus documentos. Assim ele
não duvidará.
Teresa entregou sua identidade. Ele saiu
e após alguns minutos voltou levando
Elvira pelo braço. Teresa, embora muito
assustada, sentou certo alívio em saber
que Elvira falaria com Osmar que,
certamente, arranjaria o dinheiro e tudo
estaria resolvido.
Mas por outro lado, Teresa não podia
esperar muito. Ela havia prometido
entregar o dinheiro para reaver o
material que a preocupava e se não o
fizesse dentro do prazo estipulado,
certamente o chantagista procuraria
Alberto para tentar negociar. Isso não
poderia acontecer de forma alguma. Seria
o fim de seu casamento, do respeito dos
filhos, de tudo.
O tempo foi passando e Teresa, inquieta,
andava de um lado para o outro. Ela
precisava encontrar uma forma de sair
dali, não só porque seu prazo para
entregar o dinheiro estava acabando
como também pelo receio de que Osmar
não conseguisse arranjar o dinheiro.
Ele não teria coragem de pedir ao pai
porque para isso teria de explicar muito
bem o que andara fazendo. Ela não sabia
o montante da dívida, mas presumia que
devia ser uma grande quantia. Se ele não
conseguisse esse dinheiro, sua vida
estaria correndo riscos.
Depois, aquele homem se apresentara a
ela sem disfarce e isso poderia fazer com
que apesar de tudo ele a matasse para
impedir que ela o reconhecesse na
polícia.
Aos poucos foi elaborando um plano para
fugir. Ela apanhou os comprimidos para
dor de cabeça e com o cabo da faca os
amassou, colocando-os no copo. O que ela
precisava agora era conseguir alguma
bebida forte.
Na hora em que o rapaz entrou trazendo o
jantar, ela procurou conversar.
- Aqueles comprimidos que você me
trouxe ajudaram, mas ainda não passou
completamente. Estou muito nervosa.
Você não teria alguma coisa mais forte do
que esse refrigerante? Tenho certeza de
que se passar meu nervosismo, a dor vai
ceder.
- A comida está aí. É só o que eu posso
fazer.
Teresa colocou a mão sobre o braço dele
dizendo:
- Tenha piedade de mim. Eu poderia ser
sua mãe! Ajude-me a agüentar esses
momentos tão difíceis.
Ele hesitou e ela continuou:
- Você me parece um rapaz de bom
coração. Ela tirou um anel de brilhantes
do dedo e estendeu-o a ele dizendo:
- Se me trouxer uma bebida, eu lhe darei
de presente este anel de brilhantes.
Os olhos dele brilharam, mas ele
respondeu:
- Nós não podemos aceitar presentes de
ninguém.
- Ninguém precisa saber. Vamos, pegue.
Ele hesitou, depois pegou o anel,
olhando-o com olhos brilhantes de cobiça.
- Vá, fique com ele e me traga alguma
bebida. Eu sei que você deve ter em
algum lugar.
Ele guardou o anel no bolso, saiu e alguns
minutos depois voltou com uma garrafa
de uísque.
- Não posso deixar a garrafa toda.
Teresa apanhou a garrafa e colocou a
bebida em uma caneca, tomou alguns
goles, simulando estar saboreando com
prazer, depois segurou a garrafa dizendo:
- Eu não gosto de beber sozinha. Você vai
beber uma dose comigo.
Ele, que estava com a boca seca,
concordou:
- Está bem. Só uma dose.
Ela colocou a bebida no copo onde
estavam os comprimidos e notou que se
dissolveram rapidamente. A obscuridade
da sala não deixou o rapaz notar nada.
Teresa fez um brinde:
- Meu filho vai mandar o dinheiro e tudo
vai se resolver da melhor maneira. Assim,
depois que eu for embora daqui, não
esquecerei a sua boa vontade. Como eu
disse, nunca esqueço quem me presta um
favor.
Ela alçou a caneca, tocou o copo dele e
ambos tomaram. Depois, ele segurou a
garrafa dizendo:
- Não conte a ninguém que eu lhe trouxe
bebida.
- Os outros não viram você pegar a
garrafa?
- Não. Eu estou sozinho na casa.
Teresa baixou o olhar para que ele não
visse sua satisfação. Depois que ele saiu,
ela abriu os pacotes e tratou de se
alimentar. Queria estar bem-disposta
para fugir.
Uma hora depois, ela decidiu que estava
na hora da segunda etapa do seu plano.
Foi até a porta girou a maçaneta, mas o
rapaz não disse nada.
"Está na hora!", pensou ela.
Apanhou sua frasqueira, tirou tudo de
dentro, colocou o pacote de dinheiro,
segurou a bolsa e colocou tudo perto da
porta. Depois começou a forçar a
fechadura.
Estava difícil. Pegou um grampo de
cabelo e com ele tentou abrir a porta.
Afinal, conseguiu. Entreabriu a porta
lentamente e logo deparou com o rapaz
dormindo na cadeira, cabeça apoiada na
parede, pernas estendidas.
Apanhou suas coisas e saiu lentamente.
Ele dissera a verdade, a casa estava
vazia. Em pouco tempo, ganhou a rua.
Olhou em volta, não sabia onde estava à
única certeza que tinha era de que
precisava fugir dali o mais rápido
possível.
Caminhou quase correndo e, ouvindo
barulho de carro, procurou encontrar
lugar mais movimentado. Viu um ônibus
escrito Praça João Mendes, fez sinal e
subiu.
Passou os olhos sobre os passageiros e
sentou-se perto da janela. Precisava
respirar. Abriu o vidro, aspirando o ar
com alívio.
Tinha vontade de perguntar ao cobrador
onde estava , mas teve medo. Não queria
chamar atenção. Ela conhecia um pouco
de São Paulo. Sabia que essa praça ficava
no centro da cidade e resolveu ir até lá.
Durante o trajeto pensava no que fazer.
Não podia ligar para o marido, ele
imaginava que ela estivesse fora do país.
Pensou em falar com Osmar, mas
desistiu. Se ele continuasse pensando que
ela estava em poder dos seqüestradores
faria tudo para arranjar o dinheiro e
assim acabaria livre dessa dívida.
Aqueles homens eram perigosos e, se ele
não pagasse, ela temia que fizessem coisa
pior. Decidiu aguardar os acontecimentos.
Procuraria um hotel modesto para não
chamar a atenção e esperaria até que
tudo estivesse resolvido.
Talvez Alberto não precisasse saber nada
a respeito dos negócios ilícitos do filho.
Ele teria um grande desgosto e nos
últimos tempos sua saúde não estava
bem.
Passava das vinte e três horas e ela
resolveu caminhar e entrar no primeiro
hotel que encontrasse. Entrou em um
próximo à praça e na hora de fazer a ficha
lembrou-se de que não tinha documento.
Apanhou o passaporte, justificando que
havia sido roubada e hospedou-se.
Estava exausta, mas aliviada. No dia
seguinte tentaria ligar para o endereço do
chantagista. Tomou um banho, deitou-se
e logo pegou no sono.
Na manhã seguinte, Teresa acordou cedo,
vestiu-se, tomou café e ligou para o
número de contato do chantagista.
Ninguém atendeu. Ela saiu para dar umas
voltas, comprou algumas roupas, um guia
da cidade e voltou ao hotel.
Quando chegou na portaria, o porteiro
olhou-a admirado e disse:
- A senhora saiu de novo? O almoço não
estava bom?
- Como assim?
- Faz menos de dois minutos eu abri a
porta, a senhora tomou o elevador e disse
que ia almoçar.
- Saí cedo e estou voltando agora.
- Não pode ser. É, estou notando que a
roupa está diferente. Mas há uma
hóspede que é igualzinha a senhora. É
seu parente?
- Não. Não tenho parentes nesta cidade.
- Desculpe, mas a semelhança é
impressionante. A senhora não tem
nenhuma irmã gêmea?
- Não. Você está impressionado. Vou subir
e almoçar.
Teresa foi ao refeitório, curiosa. Decidiu
almoçar e depois tornar a ligar para
Otávio, o chantagista.
Ao entrar no salão procurou a mulher com
o olhar e surpreendeu-se. De fato, havia
grande semelhança entre ela e a mulher
descrita pelo porteiro. Os cabelos eram
diferentes, o corpo mais roliço, Teresa era
magra e há outra um pouco mais cheia.
Mas o rosto era muito parecido.
Ela aproximou-se da mesa dizendo
admirada:
- Bom dia. Sou hóspede do hotel, o
porteiro me confundiu com a senhora. De
fato, nós somos muito parecidas.
A mulher levantou os olhos, fixou-a e
respondeu:
- A senhora é igual minha mãe! Que
estranho!
As duas começaram a falar nomes de
parentes e nada as fazia pensar que
tinham alguma ligação familiar.
- Se veio almoçar, sente-se, faça-me
companhia.
Teresa sentou-se e continuaram
conversando. A mulher contou que havia
chegado da Espanha no dia anterior, para
onde se mudara por ocasião de seu
casamento há mais de vinte anos. Havia
se divorciado por ter surpreendido o
marido em adultério e, desiludida, estava
voltando ao Brasil para recomeçar a vida.
- Meu nome é Renata.
- Eu sou Teresa.
- Não conheço ninguém nesta cidade.
Alguns amigos que deixei aqui, não sei
onde estão. Preciso trabalhar para viver,
porquanto meu marido não era rico e o
que consegui com o divórcio não dá para
manter o mesmo padrão de vida a que
estou habituada.
Pela cabeça de Teresa passou um
pensamento louco.
Ela estava com receio de ir entregar o
dinheiro ao chantagista. Ela pretendia
esconder-se em um lugar discreto para
esperar que Osmar resolvesse seu caso.
Enquanto isso não a acontecesse estaria
correndo sério risco.
Estava certa de que, tendo descoberto
sua fuga, eles fariam de tudo para
encontrá-la, além do que estava
fragilizada e com medo de procurar o
chantagista.
Enquanto amadurecia a idéia que passara
pela sua cabeça, Teresa preparou o prato
e voltou à mesa. Durante o almoço
conversou com Renata, falando de sua
vida familiar, da empresa do marido e
quando chegou à sobremesa ela
perguntou:
- Você disse que precisa trabalhar, em
quê?
- Antes de casar eu era secretária, mas
depois do casamento nunca mais
trabalhei. Meu marido não queria. Estou
desatualizada. Por esse motivo aceitarei o
que aparecer. Sou pessoa discreta e sem
medo do trabalho.
- Eu gostaria de ajudá-la. Talvez meu
marido possa lhe oferecer um emprego
em nossa empresa.
Você se incomodaria de mudar-se para o
Rio de Janeiro?
- De forma alguma. Nada me prende a
esta cidade. Vim para cá porque foi aqui
que me casei, mas meus pais morreram e
não tenho filhos. Quanto aos tios, amigos,
conhecidos, eu perdi contato.
Os olhos de Renata brilhavam alegres. A
perspectiva de encontrar um emprego a
enchia de esperança.
Teresa baixou os olhos, demonstrando
tristeza.
- O que foi? - indagou Renata. - Você
ficou triste de repente.
Teresa olhou para os lados, depois baixou
a voz:
- Você é capaz de guardar um segredo?
- Claro. Pode falar sem receio.
- Minha família não sabe que estou em
São Paulo. Meu marido e meus dois filhos
acreditam que eu esteja na Itália com
uma amiga. Será que posso me abrir com
você?
- Sim. Pode confiar.
- Nesse caso, vou falar.
Sublinhando as palavras, Teresa contou
tudo a respeito de sua paixão por Antero
e a chantagem da qual estava sendo
vítima. E finalizou:
- Eu estou arrependida. Era jovem e
inexperiente. Se fosse hoje não teria feito
nada disso. Amo meu marido, é um
homem bom e não merece ser traído.
Meus filhos têm de mim um conceito
ilibado. Como ficariam sabendo dessa
nódoa em meu passado?
- Como será que esse chantagista ficou
sabendo?
- Não sei. Eles têm fotos e bilhetes que
me incriminam. Estou com medo de ir ao
encontro dele entregar o dinheiro. Você
poderia fazer isso? Eu lhe pagarei uma
boa quantia.
- Não sei... acha que não tem perigo?
- Acho. Você é muito parecida comigo e
ele não desconfiaria. Enquanto isso eu me
livraria desse encargo desagradável. Fico
enjoada só em pensar em ter de enfrentar
esse sujeito.
Você me prestaria um grande favor, eu
lhe darei dez mil reais. Depois, você vai
comigo para a Europa e voltaremos como
se nada houvesse acontecido.
- Você disse que viajou com uma amiga.
Como me apresentaria?
- Arranjarei uma desculpa qualquer.
Como está seu passaporte?
- Em ordem. Acabei de chegar da
Espanha.
- Você aceita minha proposta?
Renata pensou um pouco, depois
respondeu:
- Aceito. Se você garante que depois de
tudo vai me conseguir um emprego...
- Meu marido gosta de me agradar. Não
vai deixar de atender a um pedido meu.
- Então está combinado. Quando preciso
levar o dinheiro?
- Amanhã se esgota o prazo. Vou ligar
para um telefone que me foi dado para
pedir o endereço do lugar.
Depois que terminaram de comer, Teresa
levou Renata a seus aposentos e ligou
para o número indicado.
Uma voz de homem atendeu:
- Alô.
- Sou a pessoa que está esperando. Quero
saber o endereço de onde deverei retirar
a mercadoria e pagar.
Ele deu um endereço, ela anotou. Depois,
ele recomendou:
- Não fale a ninguém nem apareça
acompanhada.
Se fizer isso, estará colocando sua
segurança em risco.
- Pode deixar. Irei sozinha.
- Chegue às dezenove horas em ponto.
- Estarei lá.
Teresa desligou, depois disse:
- Vou arrumar o pacote do dinheiro bem
como dar algum para suas despesas.
Agora são quinze horas, temos algum
tempo. Vamos conversar.
Elas acomodaram- se no sofá e Teresa
começou a falar da empresa do marido,
do seus filhos, enquanto Renata relatava
sua desilusão no casamento, sua
frustração por não ter filhos, as traições
do marido, mulherengo e indisciplinado.
Uma hora antes das dezenove , Teresa
entregou a Renata a frasqueira com o
pacote de dinheiro e depois de contar
tudo disse:
- Eu a acompanho até o local. Fico
esperando do lado de fora. Você entrega,
ele confere você apanha o material e sai.
Quanto menos falar, melhor. Depois,
vamos embora.
Elas saíram, tomaram o táxi, deram o
endereço. Faltavam cinco minutos para as
dezenove horas quando o carro parou em
frente à casa que estava às escuras.
- Parece que não há ninguém- comentou
Renata.
- Vá. Certamente ele está sendo discreto.
Renata segurou a frasqueira com firmeza,
embora suas pernas estivessem tremendo
um pouco. Caminhou para a casa e
procurou a campainha, não encontrou.
Quando bateu na porta, a mesma abriu e
ela olhou assustada para Teresa, que fez
um gesto para que ela entrasse.
Ela entrou e fechou a porta. Alguns
segundos depois um carro parou atrás do
táxi que Teresa estava a três homens
desceram, dirigindo-se a casa.
Apavorada, ela reconheceu os homens
que a tinham seqüestrado.
Na tentativa de passar despercebida, ela
havia comprado um xale que quando saía
à rua colocava na cabeça.
Imediatamente, colocou o xale e pediu ao
motorista:
- Vamos sair daqui e esperar mais
adiante.
Ele obedeceu e parou na esquina mais
próxima. Teresa viu pelo vidro traseiro
que eles entraram na casa onde minutos
antes Renata tinha entrado.
Ela ficou dividida. Assustada, desejava
sair dali o quanto antes, mas ao tempo
não tinha coragem de deixar Renata à
mercê daqueles bandidos".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 19
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"O dia já havia amanhecido quando o
chefe dos seqüestradores e dois homens
voltaram a casa onde Teresa estava
detida. A porta de entrada entreaberta os
fez desconfiar de algo errado.
Imediatamente eles puxaram o revólver.
Com cuidado entraram na casa e tiveram
a surpresa de não encontraram ninguém.
O vigia, tendo descoberto a fuga de
Teresa, tinha fugido com medo do
castigo.
- Eu mato aquele desgraçado- disse o
chefe, nervoso esmurrado a mesa que
ainda continha os restos do jantar de
Teresa.
- Será que ele fugiu com ela?- indagou
um
- Não. Ela era muito velha para ele- Disse
outro.
- Calem-se. Vocês todos são uns idiotas.
Não servem para nada.
- Vou pegar o carro e dar uma volta. Eles
foram a pé, pode ser que estejam por
perto.
- Não vai adiantar, há essa hora ela deve
estar longe.
Ele pensou um pouco, depois disse:
- Chamem o Otero para vir aqui
imediatamente.
Os dois saíram apressados. Meia hora
depois voltaram, trazendo um homem
atarracado, de meia-idade, sorriso fácil,
olhos inquietos e traiçoeiros. Ele entrou.
- Assim que eu gosto. Você veio rápido.
- Chamado do Gil para mim é sagrado.
- Vocês dois podem sair. Sente-se, Otero.
Ela obedeceu e Gil continuou:
- Há dois dias quando você veio dar conta
de sua campana com Otávio, suspeitava
que ele estivesse armando uma grande
jogada. Era partida de mercadoria que ele
comprou e não pagou?
- Não era, chefe. Ele está envolvido com
uma dama e parece que vai entrar muito
dinheiro.
- Como assim?
- Ele está pressionando uma dama da
sociedade uma tal Teresa Borges de
Azevedo. Pelas conversas que ouvi, ele
conseguiu provas de que ela traiu o
marido e está pedindo muito dinheiro por
essas provas.
- Bem se vê que traste se contenta com
migalhas. Ele devia mais é estar na
cobrança do pagamento daquela
mercadoria que ele intermediou, dizendo
que o cara era de palavra e ia pagar tudo
na entrega. Faz tempo que estou de olho
nele.
- Desde que ele botou os olhos em D.
Anita.
Gil deu um soco sobre a mesa, irritado.
- Esse cara me tira do sério e qualquer dia
desses vai se ver comigo.
Otero tossiu, hesitou, pigarreou e Gil
interveio?
- Você está rodeando. Conheço seu jeito.
O que quer me dizer?
- É que eu vi quando ele saiu e foi até a
loja de D. Anita, falar com ela.
- Ele fez isso?
- Fez mais. Segurou a mão dela e beijou-
a, dizendo que ela era muito linda e
merecia coisa melhora do que estar
esperando por você.
Ele vai se ver comigo - ameaçou Gil,
tentando conter a raiva.
- Eu ouvi quando ele a convidou para
jantar naquela noite.
Os olhos de Gil brilhavam furiosos:
- E ela, o que respondeu?
- Ela sorriu, fez um jeito dengoso e ele
continuou segurando a mão dela. Depois
disse que não podia aceitar, mas quem
sabe um dia, ela iria jantar com ele.
- Desgraçada! Ela que nem tente sair com
aquele traste. Farei picadinho dos dois.
Você volta lá e fique de olho. Se eles
combinarem algum encontro, avise-me.
- Você sabe que ele tem uma casa onde
trata dos negócios. Lá também se
encontra com mulheres. O danado é
mulherengo como ele só. Quando ele
pediu a D. Anita para ir jantar com ele,
deu o endereço daquela casa. É para lá
que ele planeja ir com ela.
- Volte lá agora mesmo e fique
observando. Se ouvir qualquer coisa
suspeita, avise-me.
Otero saiu satisfeito. Ele sabia que Gil era
ciumento e estava muito apaixonado por
Anita. Fazer esse jogo para ele era muito
rendoso, porquanto Gil lhe pagava bem.
Depois, o prestígio era grande entre os
demais que disputavam a atenção dele no
grupo.
Naquela noite mesmo, ele voltou à casa
de Otávio e ficou espreitando. Mas ele
não saiu. No dia seguinte, ele deixou a
casa depois do almoço e Otero o seguiu
até a casa onde fazia seus negócios
ilícitos.
Ele tinha colocado uma escuta no telefone
daquela casa e à tarde, quando Teresa
ligou para entregar o dinheiro, ele ouviu
os dois marcarem o encontro para às
dezenove horas.
Imediatamente, ele ligou para Gil e deu a
notícia, finalizando:
- Era voz de mulher e eu não sei quem era
porque ela não deu o nome.
- É ela! Eu sei que é. Isso não vai ficar
assim...
- Vou ver se consigo descobrir o nome da
mulher.
- Eu vou de qualquer jeito. Este cara está
me tirando do sério. Primeiro, colocando-
me numa roubada com a mercadoria.
Depois, cantando minha mulher. Vou tirar
satisfações de uma vez por todas.
Assim que desligou o telefone, Gil teve a
idéia de escrever uma carta anônima e
mandar colocar debaixo da porta da casa
de Otávio. Sua mulher precisava saber
como ele era safado.
Escreveu o bilhete, tomando cuidado para
não ser identificado, limpando
cuidadosamente para não deixar suas
digitais. Depois foi pessoalmente à casa
de Otávio e colocou a carta debaixo da
porta.
Se tudo saísse como ele esperava, ela
estaria lá e surpreenderia o marido com a
outra.
Cinco minutos antes das dezenove horas,
Gil chegou na casa onde Otávio
costumava ir e percebeu que a casa
estava às escuras.
- O safado preparou tudo para uma noite
de amor.
Otero aproximou-se dele dizendo:
- Faz alguns minutos que a mulher
entrou.
- Viu se era minha mulher?
- Não vi o rosto. Ela saiu de um táxi e
entrou muito rapidamente. Parecia que
estava com medo.
Gil respirou fundo, tentando controlar a
raiva. Depois disse: vocês dois fiquem do
lado de fora vigiando. Otero vai comigo.
Eu vou entrar. Se precisar de vocês eu
dou o toque de costume.
Gil empurrou a porta e entrou na sala sem
fazer ruído. Viu Otávio sentado em frente
a uma mesa tendo um maço de notas a
sua frente. A mulher estava em pé, ao
lado dele.
"Não é Anita", pensou Gil, aliviado.
Já ia se retirar quando a mulher virou o
rosto e ele reconheceu:
- É Teresa! É a mulher que Otávio está
chantageando. Ela não vai me escapar.
Ele caminhou até eles dizendo:
- Você vai me explicar que dinheiro é
esse?
Otávio levantou-se assustado e vendo Gil
disse:
- É um dinheiro meu. Você não tem nada
com isso.
Gil pegou Otávio pelo colarinho, dizendo
irritado:
- Eu prendi essa mulher para garantir o
pagamento daquela mercadoria e você
deve ter negociado com ela nas minhas
costas.
Renata olhava o homem que estava perto
da porta impedindo a passagem.
Apavorada, ela pensava em fugir.
- Você está enganado. Eu nem sabia que
ela estava em seu poder.
- Não tente me enganar. Ela é a mãe
daquele safado do Osmar. Foi você que a
ajudou a fugir. O que você fez com o
homem que estava tomando conta dela?
Gil, furioso, sacudia Otávio que em vão
tentava explicar que não fizera nada
daquilo.
Renata tentou passar do lado de Otero
para fugir. Gil notou, empurrou-a e ela
caiu. Quando tentou levantar-se, Gil deu-
lhe forte soco no queixo e ela rolou
desacordada.
- Agora vou tratar de você. Esse dinheiro
é meu por conta do que vocês me devem.
- Esse dinheiro é meu. Você não vai levá-
lo.
Otávio puxou uma faca e enterrou-a no
braço de Gil que sentiu uma dor aguda e
soltou a arma. Otávio correu para
apanhá-la, mas Gil atirou-se sobre ele,
tirou a faca de sua mão e enterrou-a no
peito dele várias vezes, até vê-lo
estirado, sem vida.
Depois, examinou a ferida no antebraço;
o sangue escorria. Foi até a porta e
chamou os homens, dizendo:
- O desgraçado me feriu. Tragam a
maleta.
Um deles foi até o carro e voltou com uma
valise. Lá havia material de pronto-
socorro. O homem fez um curativo para
estancar o sangue e disse:
- Não foi muito fundo.
Renata, estendida no chão, começou a se
mexer.
- Chefe, essa mulher é aquela que fugiu?
- perguntou um deles.
- É.
Renata abriu os olhos e sentou-se no
chão, olhando-os apavorada. O corpo de
Otávio estava sangrando e ela sentiu-se
atordoada.
- O que vamos fazer com ela? - indagou
um.
- Apagar. Ela não pode sair daqui para
contar o que viu. Depois, desafiou-nos,
tem de pagar.
Renata ouviu e estendeu as mãos,
dizendo aflita:
- Deixem-me sair daqui. Eu não sou quem
vocês estão pensando. Não fugi de vocês.
Estão enganados.
Gil apanhou a faca, entregou a um deles e
disse:
- Faça o serviço sem barulho para não
atrair atenção, enquanto isso, eu ajunto o
dinheiro e decido o que vamos fazer com
os corpos.
Enquanto Gil friamente recolhia o dinheiro
que se espalhara pelo chão, o homem
segurou a faca e avançou em Renata, que
estendeu as mãos, tentando impedir que
ele se aproximasse.
Depois Gil olhou os dois corpos
estendidos no chão e resolveu:
- Logo mais, a mulher deste safado deve
chegar aqui. Vamos arrumar a cena.
Calmamente, Gil mandou tirar a roupa dos
dois e colocar os corpos na cama. Depois
tiraram do bolso os documentos de
Teresa e jogou-os embaixo da cama.
Enquanto eles faziam tudo isso, ao redor
estavam alguns espíritos trevosos,
satisfeitos com os acontecimentos.
- Eles tiveram o que mereciam - disse um.
- Estamos vingados - ajuntou outro.
Sem que eles notassem, a alguma
distância, o espírito de Analú e de um
rapaz, observavam tristemente.
Naquele momento, o rapaz disse entre
lágrimas:
- Eu tentei evitar, mas eles não me
ouviram.
Abraçando-o com carinho, Analú
respondeu:
- Eles escolheram o próprio caminho. Só
podemos aguardar que eles despertem
para o bem. Enquanto escolherem o mal,
nada poderemos fazer.
Os quatro homens saíram da casa,
deixando a porta encostada.
Teresa mandara o táxi virar a esquina e
eles viram quando os homens saíram.
O motorista aconselhou:
- É melhor irmos embora. Isso não está
me cheirando bem. Aqueles homens
parecem marginais.
- Não posso deixar minha amiga sozinha.
Ela foi só entregar uma encomenda.
Vamos esperar mais um pouco. Mas
Renata não voltava.
- Eu vou até a casa ver o que aconteceu.
Fique esperando aqui.
Ela desceu, caminhou até a casa,
encostou o ouvido na porta, mas não
ouviu nada. Depois, abriu e entrou. Foi
caminhando no escuro até o quarto onde
o abajur estava aceso. A cena que viu
quase a fez desmaiar. Renata estava
morta ao lado daquele homem.
Mesmo apavorada como estava, Teresa
lembrou-se dos documentos que viera
buscar. Precisava encontrá-los. Onde
estariam? Voltou à sala, abriu algumas
gavetas, mas não encontrou nada. Olhou
em volta e teve medo. Precisava sair dali
o quanto antes. Sem pensar em mais
nada saiu correndo, deixando a porta da
entrada encostada.
Sentia as pernas trêmulas e o coração
descompassado. Esforçou-se para manter
a calma. Respirou fundo, foi até o táxi e
disse ao motorista:
- Vamos embora. Minha amiga já foi em
companhia de outra pessoa. Podemos ir.
De volta ao hotel, Teresa não podia
esquecer a cena terrível que presenciara.
Ela sabia que Renata morrera em seu
lugar. Era ela quem deveria estar ali,
naquela cama, com aquele homem.
Ela precisava desaparecer. O que
aconteceria se eles soubessem que ela
continuava viva? Certamente a
procurariam para matá-la como fizeram
com a infeliz Renata, que pagara um
preço muito alto por ser parecida com ela.
Por outro lado, a situação a
impossibilitava que voltasse para a casa.
Agora mais do que nunca precisava
esconder-se. Felizmente, tinha o dinheiro
que reservara para viajar, o que
possibilitaria que ela se escondesse por
algum tempo.
Não conseguiu dormir naquela noite.
Quando estava pegando no sono,
acordava sobressaltada e a cena do crime
reaparecia diante de seus olhos.
Assim que amanheceu, Teresa tomou um
banho, esperou a hora do café, desceu,
tomou uma xícara de leite, voltou ao
quarto, apanhou uma lista telefônica e
procurou alguns hotéis modestos em um
bairro afastado.
Selecionou alguns, ligou para informar-se
e anotou tudo. Depois, apanhou a bolsa
de Renata que ficara no táxi quando ela
entrou na casa de Otávio carregando a
frasqueira. Abriu e viu que todos os
documentos estavam lá, inclusive os
passaportes. Olhando as fotos ela pensou
em usar a identidade dela, até que as
coisas se esclarecessem, era só mudar o
penteado e daria para passar.
Foi ao quarto de Renata, arrumou todas
as coisas dela, pagou a conta e deixou o
hotel.
Naquele mesmo dia, instalou-se em um
hotel modesto, próximo ao aeroporto.
Deitada no quarto, Teresa pensava nos
acontecimentos, angustiada. Quando a
polícia entrasse naquela casa e
encontrasse os dois corpos sobre a cama,
pensaria que eles tinham tido um
encontro de amor.
Seu nome sairia nos jornais, seria dada
como morta e sua memória estaria
manchada. Como sua família reagiria
diante da notícia?
Gostaria de procurá-los, relatar o que
acontecera, dizer que continuava viva e
que nunca se relacionara com aquele
homem.
Mas para isso, teria de procurar a polícia,
contar a verdade. Diante da família teria
de confessar o erro do passado que fizera
tudo para esconder. Não seria pior? Além
disso, confessar tudo não iria prejudicar
ainda mais Osmar?
Era possível que julgando que a tivessem
matado, eles se dessem por satisfeitos
com o castigo que acreditavam ter
impingido a Osmar e o deixassem em paz.
Teresa tinha esperança de que o filho,
pensando que ela estivesse morta,
vitimada pelos traficantes, sentisse culpa,
resolvesse mudar e desistisse desse triste
comércio. E se a polícia encontrasse os
documentos que a comprometiam? Teria
sido inútil todo seu esforço em preservar-
se. Sua família saberia de tudo. O que ela
tanto quisera evitar acontecera, e a
infeliz Renata pagara com a vida por ter
ido em seu lugar.
Ela estava sem saída. Se aparecesse,
fatalmente agravaria as coisas tanto para
si como para sua família. Mas por outro
lado, pensar que nunca mais poderia
voltar para casa, para os filhos e que
seria desprezada por eles era-lhe
insuportável.
As últimas emoções a deixaram deprimida
e cansada. Estava em um beco sem saída.
Teria de esperar que as coisas mudassem,
que a polícia prendesse os assassinos
para poder aparecer e contar a verdade.
Isso lhe parecia muito distante. Aqueles
homens eram bandidos experientes.
Ela sabia que Renata nunca se deitaria
com aquele homem. Eles armaram aquela
cena para despistar a polícia ou até para
ferir ainda mais a honra de Osmar.
Apesar de cansada, Teresa não conseguia
dormir. Sentou-se na cama pensando no
que fazer. Chegou à conclusão de que não
podia se entregar, precisava reagir
cuidar-se para não adoecer.
Mesmo sem fome resolveu descer e comer
alguma coisa. Não havia se alimentado
durante o dia inteiro. O hotel não tinha
restaurante, apenas uma lanchonete
simples.
Teresa sentou-se em uma das mesas,
pediu um refresco e um cachorro quente.
A sala era pequena e havia algumas
pessoas comendo.
Ela estava pouco à vontade, usava um
vestido de Renata que tinha um gosto
diferente do seu, mais alegre e colorido.
Precisava habituar-se, uma vez que
pretendia passar-se por ela, além do que,
suas roupas haviam ficado na casa dos
traficantes.
Estava comendo seu sanduíche quando
sua atenção foi despertada pelo aparelho
de TV que estava no alto em um canto da
sala.
Um homem falava sobre um crime
misterioso que havia acontecido na noite
anterior dando o endereço da casa e o
nome de Otávio de Oliveira. Dizia que a
polícia estava investigando a identidade
da mulher.
O pão parou na garganta de Teresa, que
tomou o refresco, procurando controlar-
se. Eles prometeram voltar com novas
notícias sobre o crime.
A custo Teresa conseguiu comer todo o
lanche. Depois, voltou ao quarto
pensando no que vira.
Se os traficantes descobrissem que
tinham matado a mulher errada, sua vida
estaria em perigo. Angustiada, ela decidiu
que procuraria um salão de beleza para
fazer com que seus cabelos ficassem mais
parecidos com os de Renata.
Dias depois, Teresa foi ao salão de beleza,
levando a foto de Renata e pediu para
que seus cabelos voltassem a ser como
eram naquele tempo.
Quando saiu de lá, estava mais parecida
com Renata. Passou por uma banca de
jornal e teve sua atenção despertada pelo
seu retrato na primeira página, ao lado de
Otávio. Comprou um exemplar e foi para o
hotel.
Ao entrar, algumas pessoas a olharam
admiradas e a moça que atendia na
lanchonete disse:
- A senhora viu o jornal de hoje?
Aparentando naturalidade, Teresa
respondeu:
- Comprei, mas ainda não li.
- A mulher que mataram é muito parecida
com a senhora. É seu parente?
Teresa abriu o jornal, olhou a foto e
respondeu com naturalidade:
- De fato, tem alguma semelhança. Mas
não é de minha família, graças a Deus.
Teresa foi para o quarto, nervosa. E se,
apesar da semelhança, a polícia
descobrisse que aquele corpo não era o
dela?
Decidiu procurar uma casa no subúrbio, o
mais barato que pudesse achar para
esconder-se. Dois dias depois, encontrou,
pagou dois meses adiantados e instalou-
se.
A casa possuía quarto, sala, cozinha e
banheiro. Era muito antiga, mas estava
mobiliada. Os móveis eram baratos e
estavam velhos, porém Teresa a alugou
assim mesmo.
Não estava em condições de exigir nada.
No dia seguinte compraria algumas coisas
que a tornassem mais habitável.
Os dias foram passando e Teresa só saía
para comprar alimentos e jornais.
Assim ficou sabendo das dúvidas quanto
a sua morte e isso a fez ficar mais reclusa
do que estava.
Comprava livros no sebo e procurava
passar o tempo. Fazia mais de um mês
que o crime acontecera e a polícia não
encontrara o criminoso.
Teresa pensava no motorista do táxi que
as levara até a casa onde acontecera o
crime. Não encontrou menção a ele em
nenhum jornal. Ele sabia que aquele lugar
era perigoso e chegara a mencionar isso
naquela noite. Vendo o noticiário, por que
não foi à polícia? Estaria com medo de se
envolver?
Havia dias, acordava e ficava
rememorando o que tinha acontecido.
Fazia isso procurando enxergar alguma
coisa que ainda não havia visto buscando
uma saída para a situação dolorosa em
que se encontrava.
A solução demorava, e Teresa pensava no
que faria quando o dinheiro acabasse.
Precisava encontrar uma forma de ganhar
algum. Mas como? Não podia procurar um
emprego. Além de ser perigoso, em sua
idade não conseguiria.
Lembrou-se de que havia estudado várias
artes e era boa pintora. Talvez pudesse
pintar alguma coisa simples e vender.
Naquele mesmo dia saiu, comprou
algumas telas pequenas, tinta e pincéis e
começou a pintar. Logo, sentiu que essa
atividade fez-lhe muito bem. Enquanto
pintava esquecia de tudo, absorta e
descontraída.
Vendo-a entretida naquele trabalho, o
espírito de Analú, que estava ao seu lado,
sorriu satisfeita.
Teresa estava começando há recuperar
um pouco o equilíbrio que perdera desde
que recebera a ameaça de Otávio pela
primeira vez".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 20
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"O telefone tocou, Paulo atendeu e
reconheceu a voz do delegado.
- Como vai Monteiro?
- Como sempre. Tenho novidades. Você
pode vir até aqui?
- Posso. Estarei aí dentro de quinze
minutos.
Fazia dois dias que Paulo se instalara na
casa de Marília e até aquele instante tudo
estava bem. Olhou o relógio, eram dez
horas. Foi até a cozinha onde Vitório se
deliciava com um chá e uma generosa
fatia de bolo, conversando com Marília e
Dorita.
- Monteiro pediu para eu ir até a
delegacia. Disse que tem novidades. Não
vou demorar.
- Você ainda não dormiu - tornou Marília.
- Estou bem. Dormirei quando voltar.
Desde que se instalara na casa, tanto
Marília como Dorita o tratavam com
carinho e atenção.
Ele se preparou para sair e Marília
acompanhou-o até a porta.
- Estou curiosa para saber o que ele
descobriu.
- Eu também. Logo saberemos.
- Não vejo a hora que ele descubra e
prenda os assassinos. Só assim
poderemos viver em paz.
- Aí eu irei embora e não as incomodarei
mais.
Marília colocou a mão no braço dele
dizendo séria:
- Não diga isso. Eu gostaria que você
nunca mais nos deixasse.
Um brilho emotivo passou pelos olhos
dele que sorriu e disse:
- Pois eu também gostaria de poder ficar
aqui.
- Altair adora conversar com você.
- Vocês me fazem sentir em casa. Voltarei
o mais rápido que puder.
Ele saiu, apanhou o carro e dirigiu-se à
delegacia. Uma vez lá, entrou e foi direto
à sala de Monteiro.
- E então, o que descobriu?
- Aquela pista que você me deu é quente.
Descobrimos que o filho de Alberto está
mesmo metido com traficantes de drogas.
- Então ele tinha ligação com Otávio?
- Sim. Os peritos encontraram o nome
dele e o número de telefone naqueles
documentos. Não só isso, eles
conversaram diversas vezes nos dias que
antecederam o crime. Parece que
estamos achando o fio da meada.
- Esse crime foi cometido por bandidos
experientes.
- Mais de um. E como você desconfiava,
eles não foram mortos naquela cama. A
cena foi forjada para nos confundir.
- Eu vi os sinais de luta na sala. Foi lá que
eles foram mortos.
- Isso mesmo. E tem mais. Osmar e
Nelsinho foram naquela clínica visitar
uma mulher que eles tinham internado
um dia antes do crime.
Paulo levantou da cadeira:
- Você sabe quem é ela?
- Não. Mas vamos descobrir. Vou fazer
uma diligência até aquele hospital no Rio
de Janeiro e chamei-o para nos
acompanhar.
- Você acha que pode ser Teresa?
- Não sei. Mas não custa verificar.
Também Elvira, a amiga de Teresa
desapareceu. Pode ser uma das duas.
Eles se prepararam para sair com mais
dois policiais. No carro, durante o trajeto,
Paulo indagou:
- Por que será que Osmar internou essa
mulher exatamente um ou dois dias antes
do crime?
- Também estou intrigado. Se ela for
Teresa será fácil reconhecer, porém se for
Elvira nós não teremos como.
Uma vez no hospital, eles entraram e
Monteiro dirigiu-se à secretária.
Identificou-se e disse:
- Recebemos uma denúncia que vocês
mantêm aqui uma paciente que foi
internada pelo Dr. Osmar Borges de
Azevedo, contra a vontade dela.
A secretária levantou-se assustada:
- É um absurdo, doutor!
- Quero ver essa paciente - exigiu
Monteiro.
- Não sei do que está falando - respondeu
a secretária. - Vou chamar o responsável
pelo hospital: o Dr. Ernesto.
Ela fez menção de sair, mas o delegado a
impediu:
- Chame-o pelo telefone.
Com as mãos trêmulas ela obedeceu e em
alguns minutos o médico apareceu. O
delegado renovou o pedido para ver a
mulher e o médico respondeu:
- Não será adequado conduzi-los ao
quarto dela neste momento. Trata-se de
uma paciente em estado grave, precisou
ser sedada.
- Desejo ver a ficha de internação - disse
o delegado.
A um sinal do médico, a secretária
apanhou uma ficha no arquivo e
apresentou-a.
Monteiro leu: Maria de Souza. Endereço,
idade, estado civil, ignorados.
- Essa mulher estava passando mal em
frente a empresa do Dr. Osmar que ficou
penalizado.
Ela estava fora de si, apresentando sinais
de demência. Ele então a trouxe a este
hospital para tratamento e está
procurando encontrar pessoas da família
dela. Até agora não conseguiu nada.
- Leve-nos ao quarto dela. Precisamos vê-
la.
- Ela está sedada, como eu disse. Não
vale a pena ir até lá.
- Quem decide isso sou eu - rebateu
Monteiro. - Leve-nos até lá.
Tentando esconder a preocupação,
Ernesto levou-os ao quarto de Elvira.
Abriu a porta e enquanto os dois policiais
ficavam do lado de fora, Monteiro e Paulo
entraram com o médico.
Viram logo que não era Teresa. Ela estava
debilitada e pálida.
- Ela parece mal - comentou Paulo.
- Não está - respondeu o médico. - A
palidez é porque está sedada.
Monteiro chamou um dos homens e disse:
- Tire uma foto dela bem de perto.
- Para quê? - indagou o médico.
- Vou levar para a delegacia e ver se
descubro sua identidade. Assim,
poderemos avisar a família.
- Claro - disse o médico. - Mas pode ver
que aqui ela está sendo muito bem
tratada.
Monteiro não respondeu. Depois de tirar a
foto, eles saíram e se despediram.
Na rua, Monteiro deu algum dinheiro a um
dos policiais e disse:
- Você, fique aqui vigiando e se observar
qualquer movimento suspeito nos avise,
entrarei em contato com a delegacia local
para agir. Nós vamos descobrir se essa
mulher é quem eu estou pensando.
- Eu também tenho a mesma suspeita -
tornou Paulo. - Vamos embora.
Os três saíram, enquanto o policial
escondeu-se e ficou observando.
- Vamos voltar para São Paulo, procurar
Alberto - decidiu Monteiro.
O carro saiu e quando chegaram a São
Paulo, apesar de cansados, foram ao
apartamento de Alberto.
Tocaram a campainha e Dinda
surpreendeu-se:
- Doutor delegado, a essa hora!
Aconteceu alguma coisa?
- Sim. Precisamos conversar com o Dr.
Alberto.
Eles entraram e a essa altura a foto
rápida já tinha sido revelada.
Alberto estava sentado na sala, lendo.
Quando não conseguia dormir, o que lhe
acontecia com freqüência nos últimos
tempos, levantava-se e procurava alguma
atividade que o distraísse.
Vendo-os entrar, levantou-se e
cumprimentou-os. Depois disse ansioso:
- Então doutor, tem alguma novidade?
Monteiro segurou a foto e mostrou-a a
Alberto, perguntando:
- Reconhece esta mulher?
Alberto fixou-a, dizendo admirado:
- Sim. É Elvira, a amiga que viajou com
Teresa. Ela também está morta?
- Não. Está apenas sedada em um
hospital.
- Sedada? Como assim, o que aconteceu?
Ela sabe o que aconteceu com Teresa?
- Como eu disse, ela está sedada em um
hospital. Foi seu filho Osmar quem fez a
internação.
- Osmar?! Não entendo. Ele não a
conhecia!
- Tem certeza disso? Ele a internou e está
custeando as despesas dela.
Alberto deixou-se cair no sofá, levando a
mão na testa, como que querendo clarear
o pensamento.
- Isso não é possível. Ele não faria isso
sem nos dizer nada. Ademais, ele não a
conhecia.
- Ainda não sabemos as razões de ele tê-
la internado naquele hospital - tornou
Monteiro.
- Vou ligar para ele e perguntar.
- Não faça isso. Por enquanto temos de
manter sigilo nas investigações.
- Vou falar com ele. É meu filho. Tem que
explicar como conheceu essa mulher.
- Prometa que não vai fazer isso - repetiu
o delegado. - Pode estragar nossas
investigações. Prometo que assim que
souber de tudo lhe contarei.
- Está bem. Vou aguardar com
impaciência.
- Fique calmo - interveio Paulo -, estamos
muito perto de descobrir o que aconteceu
a sua esposa.
Depois de certificar-se de que Alberto não
telefonaria para Osmar, eles deixaram o
apartamento.
- Vou providenciar para tirar aquela
mulher de lá o quanto antes. Penso que
depois de amanhã teremos tudo o que
precisamos. Levaremos uma ambulância e
a transferiremos para outro hospital aqui
em São Paulo, onde ela fará todos os
exames e trataremos da sua volta ao
normal. Levaremos autorização judicial e
uma viatura. Quero fazer essa visita
pessoalmente.
- E se o médico for cúmplice de Osmar,
avisá-lo e ele, nesse meio tempo, tirá-la
de lá? - indagou Paulo.
- Para evitar isso deixei um homem
vigiando. Vamos voltar à delegacia e
fazer o que é preciso. Não temos tempo a
perder.
Já era tarde e eles estavam cansados.
Monteiro encarregou Paulo de fazer o
pedido de um mandato ao juiz na manhã
seguinte, enquanto ele providenciaria
tudo para voltar ao hospital e retirar
Elvira.
Paulo foi para a casa de Marília e contou
as novidades. Vitório ficou esperançoso
de descobrir notícias da mãe.
- Arranje alguém para tomar conta delas.
Eu quero ir com vocês. Não vou suportar
ficar esperando.
- Vou ver o que posso fazer.
Na manhã seguinte, Paulo acordou cedo e
foi para seu escritório fazer a petição
para o juiz. Depois, foi para a delegacia
onde Monteiro também já tinha
conseguido a ambulância e estava se
preparando para iniciar a diligência.
Paulo falou com Monteiro que Vitório
queria ir junto, porém o delegado
respondeu:
- Não adianta ele ir agora. Elvira está
inconsciente e não poderá nos dizer nada.
Quando ela já estiver recuperada
prometo que o chamarei para ouvir o que
ela tem a nos dizer.
Quando Paulo ligou para dar a notícia a
Vitório, ele entendeu que o delegado
estava certo.
Tudo pronto, eram onze horas quando a
diligência deixou a delegacia. A
ambulância com o médico, uma
enfermeira e duas viaturas. Em uma delas
estavam Paulo e o delegado.
Passava das dezesseis horas quando o
policial que ficara no hospital ligou para
Monteiro dizendo:
- Nelsinho acabou de entrar no hospital.
Estava sozinho, mas parecia apressado.
- Fique preparado. Estamos chegando.
Dentro de mais uma hora estaremos aí.
Assim que chegaram na frente do hospital
eles pararam. O policial que ficara
vigiando aproximou-se. Monteiro
perguntou:
- Alguma novidade?
- Não. Nelsinho continua lá dentro. Não vi
nenhum movimento suspeito.
O delegado colocou dois homens na
entrada de serviço vigiando.
- Não deixem nenhuma ambulância sair e
me avisem se isso acontecer.
Dentro do hospital, na sala do Dr.
Ernesto, Nelsinho estava sentado,
nervoso, conversando com ele.
- Bem que eu disse ao Osmar para dar um
jeito nela.
Ele demorou demais.
- Essa história está cheirando mal. Não
posso manchar a reputação do hospital.
Osmar precisa tirar logo essa mulher
daqui. Por que ele não veio pessoalmente
cuidar disso?
- Ele disse que se aparecer aqui vai
complicar mais o caso. Encarregou-me de
resolver tudo.
- Eu posso colocá-la em uma ambulância,
mas preciso mandá-la para algum lugar.
Nem isso ele arranjou?
- Nós podemos abandoná-la bem longe
daqui, em um lugar deserto.
- Não posso correr esse risco. Ela não está
em condições de andar. Pode morrer caso
não tenha cuidados especiais.
- Isso seria um alívio. Bem que eu disse
ao Osmar para resolver logo, mas ele
ficou esperando não sei o quê.
- Vou tirá-la daqui e levá-la para sua casa
antes que a polícia volte.
- Não faça isso, pode despertar suspeitas.
Não quero nada com a polícia.
Ernesto levantou-se irritado:
- Este caso está indo longe demais. Vou
mandá-la para sua casa e pronto. Você e
Osmar que resolvam o caso.
Nelsinho levantou-se, ia protestar quando
ambos ouviram batidas na porta.
- Entre - disse o médico.
A secretária apareceu, mas não chegou a
falar porque o delegado Monteiro passou
à frente, apresentando um papel ao
médico e dizendo:
- Vim buscar aquela paciente. Tenho
autorização judicial.
A partir de agora ela está sob minha
responsabilidade.
Nelsinho quis sair, mas foi impedido pelo
policial que estava perto da porta.
- Deixe-me passar - disse Nelsinho -, não
tenho nada com isso.
- Quem decide se tem ou não sou eu -
tornou Monteiro com voz firme. - Você
está detido para averiguações.
O Dr. Ernesto tentava encobrir o
nervosismo. Quis segurar o papel que o
delegado lhe estendia, mas ele não o
deixou pegá-lo.
- Leia, doutor. Nós já identificamos a
paciente. Trata-se de Elvira, amiga de
Teresa Borges de Azevedo, mãe de Osmar
Borges de Azevedo que desapareceu com
ela. O senhor será intimado a prestar
declarações para explicar por que a
manteve aqui, dopada. Segundo sabemos
essa senhora nunca teve nenhuma
doença mental e o senhor e seu hospital
terá muito que explicar.
- Eu posso explicar tudo já. Sou apenas
um médico. Não conhecia essa mulher,
acreditei nas informações que nos deram.
- O senhor terá tempo de se lembrar bem
dos detalhes e nos contar tudo o que
sabe. Mas agora tenho pressa de retirar a
paciente. - Voltando-se para os policiais
continuou: - Chamem os enfermeiros para
buscá-la.
Monteiro, antes de entrar, tinha chamado
uma das viaturas e deu ordem a um dos
policiais para que levasse Nelsinho.
Depois, o Dr. Ernesto levou-os até Elvira e
os enfermeiros a transportaram até a
ambulância que partiu em seguida, sob
escolta de uma viatura.
O médico aproximou-se do delegado
dizendo:
- Agora que já cumpriu seu mandato,
pode conceder-me alguns minutos em
particular?
Monteiro fixou-o sério:
Tenho pressa. Não posso esperar.
- Vou ser rápido. Vamos a minha sala.
Monteiro o acompanhou em silêncio.
Entraram na sala e Ernesto fechou a porta
dizendo em voz baixa:
- Doutor, peço-lhe que esqueça a nossa
participação nesta triste história. Meu
hospital tem boa reputação e não pode
ser envolvido.
- O senhor deveria ter pensado melhor
antes de se envolver em uma situação tão
nebulosa.
- Tem razão, mas eu fiquei com pena da
pobre mulher. Depois, conheço o Dr.
Osmar como um empresário de bem e
nunca imaginei que ele pudesse fazer
algo errado.
Monteiro sorriu quando respondeu:
- Por favor, doutor, assim o senhor
subestima minha inteligência.
- Esqueça o nome do hospital e saberei
ser reconhecido. Posso melhorar muito
seu padrão de vida.
O rosto de Monteiro ruborizou-se
indignado. Controlou a raiva e respondeu
firme:
- Se continuar nesse tom, dar-lhe-ei voz
de prisão e terei certeza de que é
cúmplice de Osmar.
- Por favor. Não se ofenda. Eu pensei
apenas em livrar meu hospital dessa
confusão.
- O senhor e seu hospital já estão em uma
grande confusão, a única forma de ter
algo a seu favor é contar a verdade à
policia. Pense nisso. Passe bem, doutor.
Monteiro saiu e o médico sentou-se,
colocando a mão na testa e procurando
encontrar uma saída.
Entrando na viatura ao lado de Paulo,
Monteiro disse satisfeito:
- Tudo está caminhando bem. Só nos
resta esperar que Elvira recobre a
consciência e possa nos contar a verdade.
Nada mais tendo de fazer ali, eles
viajaram imediatamente de volta a São
Paulo.
Paulo ficou na companhia deles até a
internação de Elvira em outro hospital e
ouvir a opinião do médico que a
examinara cuidadosamente.
- Ela está muito enfraquecida. Primeiro,
vamos fortalecê-la bem, e depois fazê-la
voltar à consciência devagar.
- O senhor acha que ela vai se recuperar
completamente? - indagou Monteiro,
preocupado.
- Penso que pode demorar um pouco, mas
não me parece que ela tenha alguma
doença grave. Vamos ver como reage aos
medicamentos.
- Ela está sob meus cuidados e terá
vigilância durante vinte e quatro horas.
Não pode receber visitar em hipótese
alguma. Ela é testemunha importante no
crime que lhe falei e sua vida corre
perigo.
- Vou designar duas enfermeiras de
minha confiança para cuidar dela e não
permitir que ninguém mais se aproxime.
- Faça isso doutor. Se eu precisar
substituir um dos meus homens avisarei
com antecedência.
Eles saíram e Paulo voltou à delegacia
para apanhar o carro que ficara lá.
Era madrugada quando Paulo voltou para
casa. Estava cansado, mas contente.
Quando Elvira recobrasse a consciência
muitas coisas seriam esclarecidas.
A casa estava escura, mas Vitório, que
tinha ficado lá ansioso para esperar a
volta de Paulo, abriu a porta. Ele entrou e
Vitório não se conteve:
- E então, o que aconteceu?
Paulo ia responder, mas teve a atenção
voltada para Marília e Dorita que se
aproximaram.
Vitório estava angustiado, ansioso.
- Conte-nos como foi - pediu.
- Antes vou trazer alguma coisa para
Paulo. Ele está abatido, não dormiu e
penso que nem comeu - tornou Dorita.
- De fato, não tive tempo mesmo.
- Vamos para a cozinha - decidiu Marília. -
Lá, enquanto tratamos de Paulo, ele nos
contará tudo.
Logo Paulo estava sentado ao redor da
mesa tendo na sua frente uma porção de
salgadinhos e um copo de refresco.
Enquanto comia com apetite, ele contou
em detalhes o que se passara. E finalizou:
- O médico safado ainda tentou subornar
o delegado, mas pela reação dele
percebeu logo que ia se dar mal. Fazer
isso logo com Monteiro, policial honesto e
sério.
- Estou angustiado - disse Vitório. - Só
meu pai conheceu a Elvira, nós dois nunca
a vimos. Como ela pode ter sido levada a
esse hospital pelo Osmar? Tem certeza de
que foi ele mesmo quem a internou?
- O médico citou nome e sobrenome.
Depois eu sabia da ligação de Osmar com
esse tal de Nelsinho. Eu nunca lhes disse,
mas tive intuição e coloquei meu
assistente para seguir Osmar. Senti que
era para ir por ali. E assim, descobrimos a
ligação dele com esse sujeito que não
pertence ao meio de vocês e cuja fama
não é das melhores.
Paulo fez ligeira pausa, olhou em volta e,
vendo que todos o olhavam atentos,
continuou:
- É bom que vocês saibam que a polícia
encontrou ligação de Osmar com os
traficantes que trabalhavam com Otávio.
Vitório não se conteve:
- Ele sempre foi maldoso, mas eu não
esperava uma coisa dessas. Papai vai
sofrer muito quando descobrir.
- Vocês precisam ser fortes. A verdade vai
aparecer e ela pode ser dura. Por
enquanto, você pode poupar seu pai,
esperar um pouco mais para contar-lhe
certos detalhes.
- Quando Elvira acordar, saberemos onde
está minha mãe. Eu acredito que ela
esteja viva.
- Quanto a isso ainda é cedo para ter
certeza.
Osmar envolveu-se com traficantes
perigosos e essa gente mata facilmente.
Mas penso que podemos ter esperança.
Vitório pensou um pouco, depois disse:
- Se mamãe tivesse morrido, seu espírito
já teria me avisado. Mas não tive
nenhuma notícia, o que pode significar
que ela esteja viva e por uma razão que
desconhecemos, não pode aparecer.
- A vida tem seus mistérios e só os revela
na hora adequada - disse Paulo -, mas
algo me diz que estamos no caminho
certo e logo saberemos de tudo.
Todos concordaram e uma nova
esperança aqueceu o coração de Vitório".

"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 21
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Conversaram durante mais algum
tempo. Paulo se alimentou bem, sentiu
sono e disse:
- Eu vou dormir um pouco.
- Vá mesmo - concordou Vitório. - Vou
avisar papai e passarei o resto da noite
aqui.
- Você não precisa passar a noite. Se eu
descansar umas duas horas ficarei bem e
você poderá ir.
- Eu posso ficar - considerou Vitório. -
Papai está bem e você pode descansar em
paz. Se eu notar qualquer coisa diferente,
irei chamá-lo.
Paulo concordou e foi para o quarto de
Altair. Deitou-se. Estava muito cansado e
adormeceu em seguida.
Enquanto as duas mulheres trocavam
idéias sobre os novos acontecimentos,
Vitório sentou-se em um canto da sala
pensativo.
Muitas perguntas sobre os fatos surgiam
em sua mente e por mais que tentasse ele
não conseguia entender o que levara o
irmão a envolver-se com traficantes.
Ao pensar nisso sentia arrepios e um
pressentimento ruim o envolvia. Era
provável que sua mãe estivesse pagando
pelas loucuras que Osmar cometera.
A possibilidade de ela ter sido presa por
traficantes e até de ter sido morta voltou
a incomodá-lo.
Por que o espírito de Analú não aparecia
para ajudá-lo? Sempre que ele ficava
deprimido por causa dos
desentendimentos com Osmar ela
comparecia para confortá-lo,
estimulando-o a manter a calma.
Agora, diante de um assunto tão sério,
por que ela não vinha?
Na penumbra da sala, Vitório pensou nela
com carinho, rogando que o ajudasse.
Nesse momento ele notou duas sombras
escuras o envolvendo.
Fechou os olhos, sentiu a presença de
dois espíritos e percebeu logo que
estavam mal. Concentrou-se mais neles e
reconheceu o casal que fora assassinado.
Estavam com péssima aparência,
mostrando os ferimentos que lhes tiraram
a vida e mantendo na fisionomia horrível
expressão.
Na mesma hora Vitório sentiu forte mal-
estar. Dores pelo corpo, uma sensação de
fraqueza e o estômago enjoado.
Vendo que estavam sendo notados, a
mulher aproximou-se de Vitório gritando
com raiva:
- Você está querendo proteger aquela
malvada. Mas ela vai pagar por tudo o
que me fez!
Vitório esforçou-se para controlar o mal-
estar e respondeu em pensamento:
- De quem você está falando?
- De Teresa. Ela se aproveitou de mim.
Mandou-me para a morte. Eu que queria
começar uma nova vida e estava cheia de
esperança! Ela armou a cilada e eles me
mataram. Era ela quem deveria estar lá!
Ela garantiu que não tinha perigo e eu
acreditei. Ofereceu-me emprego,
amizade, mas era mentira. Fez isso para
se livrar de tudo.
- Não entendo do que está falando.
- Eu paguei pelo crime que ela cometeu
anos atrás. Ela me usou para safar-se.
Vitório continuou não entendendo, mas
sentiu que ela sabia o que tinha
acontecido com sua mãe. Precisava
aproveitar fazê-la falar mais e descobrir o
que pudesse.
Naquele momento, o homem empurrou-a
dizendo:
- Deixe disso. Ele não vai fazer nada por
nós. Ao contrário, está aqui em minha
casa, não sei fazendo o quê, sem me pedir
licença.
Vitório ouviu e percebeu que estava
diante do marido de Marília. Antes que
tentasse responder, o espírito de Otávio
aproximou-se, dizendo:
- Vocês estão se metendo onde não
devem. Vá embora e leve aquele
intrometido que está dormindo aqui. Não
quero ninguém em minha casa. Diga-lhe
que saia logo, antes que eu mesmo o
enxote. Eu vi que ele anda de olho em
minha mulher. Se ele continuar, vai se ver
comigo.
Antes que Vitório pudesse responder,
Otávio segurou o braço da mulher e
desapareceram.
- O que está acontecendo comigo? -
perguntou Vitório. - Como fui me ligar a
esses espíritos sofredores? Por que Analú
me abandonou quando eu mais preciso?
Aflito, deixou-se ficar recostado no sofá,
deprimido, triste. Alguns minutos depois,
levantou-se e foi telefonar para o pai,
avisando que não iria para casa.
Altair tinha ido dormir, Marília e Dorita,
depois de colocarem tudo em ordem na
cozinha, foram ter com Vitório e logo
notaram o quanto ele estava abatido.
- Você parece triste - arriscou Dorita. -
Logo agora que as coisas estão
melhorando...
- Isso mesmo - concordou Marília. -
Estamos perto de saber o paradeiro de
sua mãe.
- Paulo não se mostrou tão confiante.
- Ele está sendo cauteloso. Prefere
esperar para ter certeza.
Vitório fixou Marília e disse:
- Posso fazer-lhe uma pergunta?
- Faça.
- Seu marido era um homem violento?
- Sim. Para conversar com ele eu ficava
sempre escolhendo as palavras para não
irritá-lo. Por quê?
- Por nada. Eu estava pensando e fiquei
curioso.
- Nós vamos nos recolher - tornou Marília.
- Você deseja mais alguma coisa? Um chá,
um café?
- Não, obrigado. Estou bem.
Elas despediram-se e foram para o
quarto. Vitório sentou-se novamente,
revivendo aquele encontro inusitado,
tentando lembrar-se de cada palavra que
haviam conversado na tentativa de
entender o que estava oculto.
Passava da três da madrugada quando
Paulo entrou na sala e aproximou-se de
Vitório.
- Pensei que você fosse dormir até de
manhã.
- Não. Acordei e não consegui conciliar o
sono. Estou remoendo os fatos em busca
de mais alguma coisa que nos esclareça.
Vitório passou a mão nos cabelos:
- Foi o que fiquei fazendo até agora.
- E qual foi sua conclusão?
- Logo depois que você foi dormir, eu vim
para cá e aconteceu uma coisa inesperada
que me deixou ainda mais confusa.
- O que foi?
Vitório contou que vira o casal
assassinado, o que eles tinham dito e
finalizou:
- A mulher era mesmo muito parecida
com minha mãe, estava com raiva dela e
falando em vingança. Disse que caiu em
uma cilada e morreu no lugar dela.
- Isso faz sentido, uma vez que o corpo
encontrado era parecido com sua mãe,
mas não era o dela.
- Não entendo, minha mãe saiu para
viajar pela Europa. Como poderia ter-se
envolvido com essa mulher? Ela nunca
falou que conhecia alguma mulher
parecida com ela.
- Você pode não ter entendido bem. Ela
estava perturbada e você também pode
não ter captado tudo.
- Estava muito claro. Eu ouvi muito bem o
que eles disseram. Otávio o ameaçou,
quer que vá embora, disse que você está
interessado em Marília. Fala nela como se
ainda fossem casados.
Paulo sentou-se ao lado dele no sofá e
considerou:
- Nesse ponto ele está certo. Marília é
uma mulher especial. Eu seria o homem
mais feliz do mundo se ela se
interessasse por mim.
Vitório sorriu:
- Quer dizer que ele não se enganou?
Você está mesmo interessado nela?
Paulo ficou sério, pensou um pouco e
respondeu:
- Estou. Nunca uma mulher mexeu tanto
comigo. Perto dela me sinto motivado,
feliz.
- Ele acertou mesmo! Você não tinha uma
namorada?
- Tinha, mas desisti. Descobri que não a
amava como ela merecia.
- Hum! Você está mesmo apaixonado!
- Talvez. Mas isso não é para você ficar
repetindo. Alguém pode ouvir.
- Um dia ela vai ter de saber.
- Ainda não. Antes, preciso descobrir o
que ela sente por mim. Às vezes noto que
ela me olha com carinho, mas isso pode
ser apenas gratidão, amizade por eu a
estar ajudando. Não quero que ela se
ligue a mim apenas para ser grata.
- Está certo. Vou prestar atenção e ver se
descubro o que ela sente por você.
Paulo sorriu e respondeu:
- Parece que você está torcendo por nós.
- Estou mesmo. Eu nunca me interessei de
verdade por mulher nenhuma, mas se um
dia isso acontecer não a deixarei escapar.
Paulo olhou-o sério:
- Você anda triste. A presença de uma
mulher em sua vida traria motivação e
alegria.
- Enquanto esse pesadelo não acabar, não
terei paz.
- Entendo. Nós estamos nos esforçando
para resolver essa charada, mas, acima
de tudo, precisamos confiar na vida. Você
é um espiritualista como eu, acredito que
a vida tem seus próprios caminhos e
trabalha sempre em nosso favor.
- Nos últimos tempos tenho até duvidado
disso. O espírito de Analú me abandonou
justamente no momento em que eu mais
preciso de apoio.
- O fato de ela não ter se comunicado nem
lhe dito nada sobre o que aconteceu não
significa que ela não o esteja ajudando
como sempre fez. Pode ser que ela se cale
porque não tem condições de dizer nada.
- Eu pensei que os espíritos iluminados
como ela soubessem de tudo e sempre
pudessem nos esclarecer.
- Nem sempre eles sabem tudo porque
muitas coisas dependem do livre-arbítrio
das pessoas envolvidas e de fatores
alheios à sua vontade, mas mesmo que
ela saiba a verdade nem sempre tem
permissão para intervir.
- Ela podia pelo menos aparecer,
confortar-me.
- Em vez de reclamar que ela não
aparece, não seria mais sensato tentar
entender por que esses fatos estão
acontecendo com você? O que a vida
pretende ensinar-lhe com essa situação?
- Isso não tem sentido. Como eu poderia
entender e responder a essa pergunta se
está perdido, sem saber o que fazer?
- Todos os desafios que aparecem em
nosso caminho trazem um recado da vida.
É assim que ela conversa conosco. Para
encontrar essa resposta você terá de
refletir, buscar, perceber como esses
fatos estão mexendo com seus
sentimentos.
É notando o que mudou em você que vai
encontrar essa resposta.
- De fato, eu não sou mais o mesmo. A
angústia de perder minha mãe, que
representava até pouco tempo a minha
própria segurança, faz-me sentir sozinho,
abandonado. Também, meu
relacionamento com meu pai mudou.
Antes eu o imaginava uma pessoa
egoísta, indiferente, sempre preocupado
com dinheiro, mas hoje percebo que ele é
um homem sensível que nos ama e
embora não tenha sido o marido ideal que
eu gostaria para minha mãe, a ama de
verdade. Para mim, ele tornou-se mais
humano, mais gente. Sinto mais amor e
respeito por ele e mais vontade de ajudá-
lo a superar esses momentos de angústia
que vivemos.
Vitório fez uma pausa, olhos marejados, o
pensamento voltado aos próprios
sentimentos.
Vendo que ele se calou, Paulo tornou:
- Viu quantas coisas você aprendeu com
essa situação? Pense: quantas outras
ainda terá de aprender para que a vida
lhe traga momentos melhores?
- Você tem razão. Eu mudei. Não sou mais
aquele rapaz voltado apenas aos meus
problemas, sentindo-me sozinho no meio
da família. Pela primeira vez senti a força
dos sentimentos que nos une e percebi
que não estou sozinho, embora o
problema de minha mãe continue sem
solução. Ainda há pouco eu estava
preocupado com Osmar, um irmão com o
qual eu nunca me entendi e que sempre
fez tudo para me humilhar e botar para
baixo. Eu deixei a revolta de lado e
quando penso no envolvimento dele com
marginais sinto-me angustiado. Se eu não
tivesse sido tão intolerante, ele poderia
ter se tornado mais meu amigo e talvez
eu pudesse evitar que ele escolhesse esse
caminho.
- Não se culpe. Ele escolheu o próprio
caminho e terá de pagar o preço. Mas
você é um rapaz de bons sentimentos e
daqui para frente saberá relacionar-se
melhor com os seus.
- Certamente. Quantas coisas eu faria se
pudesse ter novamente minha família em
paz. Eu saberia valorizar essa
convivência, procuraria ser menos
mimado e mais interessado em criar ao
redor de mim um ambiente melhor, onde
não houvesse desentendimentos nem
rancor.
Paulo colocou a mão no braço de Vitório
num gesto de apoio e respondeu:
- Tudo o que aconteceu o fez amadurecer.
Você tornou-se adulto, com mais vontade
de viver melhor. Por esse motivo, sinto
que não vai demorar em esclarecermos
todos esses fatos. Eu sei que quando as
pessoas aprendem o que ávida deseja, o
desafio acaba e tudo volta ao normal.
- Eu estava angustiado, deprimido, mas
conversar com você fez com que eu me
sentisse melhor. Estou aliviado e mais
otimista.
- Isso mesmo. Não dê força aos
pensamentos negativos que
enfraquecem, deprimem e abrem nossas
defesas para que espíritos sofredores nos
envolvam, contaminando nossas energias
com suas perturbações.
- Analú falou-me sobre isso, mas eu
alimentei o medo, a insegurança, atraí
essas presenças desagradáveis e fiquei
pior.
- Claro. É que as energias perturbadas
que eles têm somaram-se às suas,
agravando seu mal-estar.
- Foi muito ruim. Eu senti aumentar
minha angústia, meu medo.
- Você acreditou que eles pudessem
fazer-lhe algum mal. Isso não é verdade,
um espírito desencarnado só poderá
prejudicá-lo se você baixar sua energia e
tornar-se vulnerável a eles. Caso
contrário, não conseguirão nada.
- É difícil manter sempre o pensamento
otimista. Principalmente quando estamos
passando por problemas tão graves.
- Concordo. Quando sentir que atraiu
esses espíritos sofredores, reaja,pense
que foi você quem abriu espaço para o
assédio deles e sendo assim pode mandá-
los embora. Se fizer isso com firmeza, vai
melhorar na hora.
- Não é fácil. Quando você diz isso, parece
que uma voz me diz que é mentira. Que
não tenho competência para fazer isso.
Que sou um fraco.
- Essa voz vem do seu subconsciente,
indica que você tem um padrão de
pensamento que o faz crer que é um
fraco. Não dê importância a essa voz,
pense que não é verdade e afirme que
você é forte e capaz. Assim ela vai se
calar.
- Onde você aprendeu todas essas coisas?
- Estudando os fatos da vida,
experimentando para saber o que
funciona.
- Talvez você tenha razão, mas eu não
saberia como começar. Confesso que me
encontro perdido.
- É fácil. Preste atenção nas suas
atitudes, depois analise o resultado do
seu comportamento. Se esse resultado for
bom, indica que você está no caminho
certo. Mas se for desagradável, saiba que
precisa observar melhor e descobrir a
crença que determinou essa atitude.
Assim descobrirá a causa do seu
insucesso. Basta modificá-la e obterá um
resultado melhor.
- Olhando assim até parece simples.
- As coisas verdadeiras são simples. Nós é
que costumamos complicar tudo com
nossa cabeça indisciplinada. Há algum
tempo eu descobri isso e adotei esse
sistema. Garanto, minha vida tornou-se
muito melhor.
- De fato, nossa cabeça é mesmo muito
louca. Às vezes passam por ela
pensamentos que nos espantam.
- O bom é que nós temos condições de
controlar isso e mudar a sintonia. Trocar
os pensamentos ilusórios,
desequilibrados por outros mais reais e
possíveis.
Os dois continuaram conversando
animados até o dia clarear e Marília
aparecer e surpreendê-los.
- Bom dia! Em vez de um anjo da guarda,
agora temos dois.
Dorita entrou na sala e, vendo-os, disse
logo:
- Ainda bem que podemos contar com
vocês! Vou já para a cozinha preparar um
café reforçado.
- Era isso que estava faltando! -
comentou Paulo.
- É mesmo. A conversa estava boa, mas
agora ficou melhor - reforçou Vitório.
- Você não dormiu? - perguntou Marília,
dirigindo-se a Paulo.
- Dormi, mas acordei cedo e ficamos
conversando. Vitório passou a noite
acordado.
Sempre rindo e conversando, eles foram
para a cozinha esperar pelo café. Em
quanto Dorita preparava as guloseimas,
os dois ajudavam Marília a arrumar a
mesa.
A cena era agradável e Marília disse:
- Eu estou feliz por ter vocês dois aqui
conosco logo de manhã. Começar o dia
assim traz alegria e bem-estar.
Paulo aproximou-se de Marília e,
olhando-a nos olhos, respondeu:
- Contar com o carinho de vocês no
começo do dia é bom demais. Vou sentir
falta quando tiver de ir embora.
- Você não precisa ir embora. Pode ficar o
tempo que quiser - respondeu Marília.
- Você gostaria que eu ficasse?
Os olhos dela brilharam quando
respondeu:
- Gostaria muito. - Um pouco corada
continuou: - Vocês trouxeram mais vida a
esta casa.
Vitório sorriu e interveio:
- Agradeço por me colocar nesse
contexto, sabe que pode contar comigo
sempre, mas noto que Paulo está muito
integrado a vocês, se pudesse mudaria
para cá e não iria mais embora.
Dorita, notando o embaraço de Marília,
colocou o bule de café sobre a mesa
dizendo:
- Sentem-se, vamos tomar café antes que
esfrie.
Depois do café, Vitório despediu-se e
voltou para casa.
Encontrou o pai lendo os jornais na sala.
- Ainda bem que chegou - disse Alberto. -
Estou preocupado com Osmar. Há dois
dias estou ligando e não consigo falar
com ele.
Vitório sentiu um aperto no peito, mas
não deixou transparecer a preocupação:
- Ele deve estar muito ocupado. Você
deve estar fazendo falta na empresa.
- Ainda ontem, quando o médico veio ver-
me, perguntei se estava em condições de
voltar ao trabalho. Ele aconselhou-me a
esperar mais um pouco.
- Você disse que ficaria aqui até
descobrirmos o paradeiro de mamãe.
- Eu disse, mas as investigações estão
lentas, não há nenhuma novidade. Estou
pensando que seria melhor voltar para a
casa. Sinto-me um pouco melhor e não
agüento ficar aqui, sem fazer nada.
- Tenha mais um pouco de paciência.
Paulo me disse que os peritos
examinaram os documentos encontrados
na casa de Otávio e está esperançoso.
- Não estou sabendo de nada. Ele
descobriu alguma coisa nova?
- Parece que sim, mas não contou o quê,
para não atrapalhar as investigações.
- Há pouco liguei para Osmar e ele ainda
não tinha chegado na empresa. Liguei
para casa e Nora me disse que ele saiu
muito cedo nem tomou café. Onde terá
ido?
Por que até essa hora não está na
empresa?
- Talvez ele tenha ido visitar algum
cliente, ou falar com os engenheiros de
alguma obra.
- Ele não costuma fazer isso. Daqui a
pouco vou ligar novamente.
- Procure se acalmar. Pode fazer mal a
sua saúde. Logo ele vai ligar e explicar
tudo.
- É, pode ser... Osmar sempre foi muito
dedicado à empresa. Estou impaciente,
cansado de ficar aqui parado.
- Se continuar reagindo, cuidando melhor
da saúde, logo vai estar bem e poderá
voltar à empresa. Eu ficarei aqui
acompanhando as investigações e
mandando notícias.
- É isso mesmo o que farei. Não posso me
entregar ao desânimo. Voltar a trabalhar
será para mim um santo remédio.
Vitório sorriu e assentiu com a cabeça,
mas sentia um aperto no peito,
imaginando o que seu pai faria quando
soubesse que Osmar havia se ligado a
bandidos e se tornado um traficante de
drogas".

"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 22
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Dois dias depois, às dez horas da manhã,
Marilia bateu na porta do quarto em que
Paulo dormia:
- Paulo, acorde. O Dr. Monteiro está no
telefone, quer falar com você, disse que é
urgente.
- Já vou - respondeu ele, tentando reagir
ao sono.
Levantou-se de um salto e atendeu ao
telefone:
- Alô.
- Paulo, o médico avisou que Elvira está
em condições de falar. Você quer ir
comigo?
- Quero. Dentro de quinze minutos estarei
aí.
Lavou-se rapidamente, vestiu-se e foi à
cozinha, onde Vitório e as duas mulheres
conversavam.
- Bom dia.
- Sente-se e tome café - convidou Dorita.
- Não vou nem sentar. Preciso de um café
para espantar o sono. O Dr. Monteiro está
a minha espera para irmos ver Elvira.
Parece que ela está melhor e já pode
conversar.
- Eu vou com você - disse Vitório. - Ela
pode nos dizer se mamãe está viva ou
não.
- Vou pedir ao Wagner para vir ficar aqui.
- Coma pelo menos uma fatia deste bolo.
Está quente e gostoso - sugeriu Dorita.
- Está bem. Comerei uma fatia, mesmo
porque os bolos que você faz são
irrecusáveis. Enquanto você coloca no
prato, vou falar com o Wagner.
Ele foi telefonar, voltou alguns minutos
depois:
- Ele estará aqui dentro de dez minutos.
Enquanto isso terei tempo para tomar o
café. Liguei para o delegado e em vez de
irmos à delegacia, iremos encontrá-los no
hospital. Assim teremos mais alguns
minutos.
Wagner chegou e os dois saíram rumo ao
hospital. Chegaram antes do delegado e
ficaram esperando por ele no saguão.
Monteiro chegou com dois policiais e
depois dos cumprimentos, disse a Vitório:
- Logo imaginei que você também viria.
- Estou ansioso para saber o que ela tem
a dizer.
- Nós vamos entrar no quarto, o médico
disse que ela está muito nervosa. Tanto
que ele ficará junto durante nossa
conversa. Talvez seja melhor eu entrar
sozinho.
- Por favor, doutor. Permita que eu entre.
- Nós não sabemos o que ela tem para
contar. Não sei se você terá calma
suficiente para conter-se. O médico disse
que a situação dela ainda é delicada. Ela
vai ter de rever os fatos e isso será
penoso.
- Eu prometo que ficarei calado e
aconteça o que acontecer, vou me
controlar.
- Está bem. Mas quem faz as perguntas
aqui sou eu. A menor interferência sua, o
colocarei para fora do quarto. Entendido?
Vitório concordou e eles foram ao
encontro do médico que os acompanhou
ao quarto de Elvira.
Entraram e encontraram-na sentada,
recostada nos travesseiros a espera
deles. O médico aproximou-se pela lateral
da cama e Monteiro o acompanhou. Os
outros dois ficaram mais atrás.
Os dois policiais ficaram na porta, do lado
de fora.
- Este é o Dr. Monteiro, delegado - disse o
médico. - Foi ele quem a libertou daquele
sanatório e a trouxe para cá.
Elvira estendeu a mão, dizendo
emocionada:
- Obrigada, doutor. Não sabe o bem que
me fez.
- Não fiz mais do que minha obrigação.
Quem descobriu onde a senhora estava
foi o Dr. Paulo - respondeu ele,
designando o advogado.
- Fico feliz vendo que se sente melhor -
disse Paulo sorrindo.
Elvira fixou Vitório e respondeu:
- Esse moço parece com o filho de Teresa.
É ele?
Monteiro interveio:
- É ele, sim. Ele quer saber o paradeiro da
mãe.
Elvira suspirou triste:
- Os senhores ainda não sabem onde ela
está?
- Contamos com a senhora para descobrir
o que aconteceu. Até agora não tivemos
notícias dela.
- Que horror! Eles ainda não a libertaram!
Vai ver que o Osmar não pagou o resgate.
Vitório não conseguiu controlar a
ansiedade e ia falar, mas calou-se a um
sinal de Monteiro.
- A senhora vai nos contar tudo o que
aconteceu. Vou chamar meu auxiliar para
tomar seu depoimento.
A um sinal do delegado, Paulo saiu e
pouco depois voltou, acompanhado de um
dos policiais que ligou um pequeno
gravador.
Monteiro iniciou o interrogatório:
- Segundo sabemos, a senhora foi
convidada por Teresa para acompanhá-la
a uma viagem para a Europa. O Dr.
Alberto as acompanhou ao aeroporto e
garantiu que vocês entraram na sala de
embarque.
Elvira torcia as mãos, aflita.
Ela não queria contar por que tinham ido
a São Paulo e o delegado, notando que
ela hesitava, disse sério:
- A senhora não deve esconder nada
porque isso pode significar a vida de
Teresa. Ela não apareceu até agora.
Elvira suspirou, engoliu em seco, depois
disse:
- Teresa tem um segredo que eu não devo
revelar.
- Um casal foi morto de maneira cruel e os
documentos de Teresa foram encontrados
no local do crime. A mulher assassinada
era muito parecida com Teresa, tanto que
o Osmar, o filho, reconheceu o corpo
como sendo dela, mas Vitório e a
governanta provaram que não era ela.
- Um crime! Tem certeza de que não era
ela mesma?
- Parece que não. Eu esperava que a
senhora nos contasse quem é essa mulher
tão parecida com ela.
- Não sei. Não conheço nenhuma mulher
parecida com ela.
Notando que Elvira estava assustada, o
delegado tornou:
- Está bem. Agora conte tudo o que
aconteceu depois que o Dr. Alberto as
deixou no aeroporto. Pelo jeito vocês não
embarcaram naquele dia.
- Não. Teresa tinha um segredo, mas eu
não posso revelar.
- Não precisa dizer o que era, conte
apenas os fatos.
- Bem, nós nos encontramos por acaso,
depois de muitos anos. Fomos colegas de
faculdade. Conversamos e ela contou que
seu segredo guardado há muitos anos
tinha sido descoberto por um homem que
queria dinheiro para não contar ao Dr.
Alberto. Ela estava deprimida, nervosa,
aflita e, sabendo que eu sou sozinha,
convidou-me para ser sua dama de
companhia e viajarmos juntas.
Ela fez ligeira pausa, notando que todos a
ouviam atentos, continuou:
- Ela tinha conseguido o dinheiro exigido
pelo homem e queria entregá-lo em troca
de algumas cartas que a comprometiam.
Assim que o Dr. Alberto nos deixou na
sala de embarque do aeroporto,
esperamos algum tempo, depois saímos e
fomos ao balcão de passagens, alegamos
estar passando mal e as trocamos para
alguns dias depois. Compramos
passagens para São Paulo, onde
desembarcamos naquele mesmo dia.
Quando saímos do aeroporto, alguns
homens armados nos abordaram e nos
obrigaram a entrar em um carro com toda
a nossa bagagem.
- Foi assalto? - indagou Monteiro.
- Foi seqüestro. Percebemos isso quando
vimos que eles não tocaram em nossas
bagagens nem em nosso dinheiro. Teresa
estava com muito dinheiro. Para a viagem
e para o pagamento do homem.
- Continue - pediu o delegado.
- Colocaram capuz em nossas cabeças.
Estávamos apavoradas, levaram-nos para
uma casa e tiraram os capuzes. Mais
tarde apareceu um homem bem vestido e
vimos logo que era o chefe. Tratou-nos
com respeito, disse que não iria nos fazer
mal se fizéssemos o que ele mandasse.
Claro que concordamos.
Ela parou novamente, olhos perdidos nas
lembranças. Depois de alguns segundos,
respirou fundo e continuou:
- No dia seguinte, depois de nos terem
servido um almoço, ele apareceu e
perguntou se tínhamos almoçado bem, se
faltava alguma coisa. Dissemos que não,
então ele estendeu um papel para Teresa,
um bloco e caneta, mandando que ela
escrevesse uma carta para Osmar.
- Era pedido de resgate?
- Não, doutor. Ele dizia que Osmar lhe
devia muito dinheiro e não conseguira
pagar, ele nos prendera até que ele
saldasse essa dívida. Ainda disse que era
homem de palavra e que para ele não
precisava de papel, que quando alguém
não cumpria o que prometera ele matava.
Teresa ficou aterrorizada por descobrir
que Osmar tinha se metido com aqueles
bandidos, fazendo negócios ilegais.
Percebemos que estávamos lidando com
pessoas perigosas. Ela escreveu a carta.
Teresa disse que Osmar não ia acreditar
porque estava certo de que nós tínhamos
embarcado para a Europa. Então ele
decidiu mandar-me com a carta para
provar que ela estava em poder dele.
Elvira serviu-se de um copo de água que
tinha na mesa de cabeceira e depois
prosseguiu:
- Eles me puseram o capuz novamente.
Entramos no carro e viajamos durante
horas. Levaram-me a um lugar onde me
obrigaram a descer, tiraram o capuz e fui
presa em um quarto. Algum tempo, que
não saberia dizer quanto, chamaram-me,
entregaram-me a carta dizendo que
saísse e a entregasse ao homem dentro
do carro parado diante da casa. Nem
acreditei quando me vi na rua. Era noite e
sem pensar em mais nada corri para o
carro:
- "Por favor, ajude-me" - repeti várias
vezes. O rapaz parecia mais assustado do
que eu. Finalmente abriu e eu entrei,
pedindo que fôssemos embora dali o
quanto antes. Entreguei a carta, dizendo
que era de Teresa e ele guardou no bolso,
interessado em sair dali o quanto antes.
Eu queria ir à polícia contar tudo, mas ele
disse que isso poderia custar à vida de
Teresa. Eu acreditei. Quando já
estávamos bem longe, ele disse que
estava preocupado comigo e que iria me
levar a um médico para uma consulta, se
tudo estivesse bem, eu iria embora com
ele. Mas assim que entrei no hospital, fui
levada para um quarto e deram-me uma
injeção. Eu perdi os sentidos. Não sei o
que aconteceu e só fui acordar aqui em
São Paulo, neste hospital que em tão boa
hora o senhor me trouxe.
- A senhora não teve mais nenhuma
notícia de Teresa?
- Não, doutor. Não sei o que aconteceu
com ela. Espero que Osmar tenha pagado
a dívida e ela tenha sido libertada.
- Ele não pagou, e ela ainda não
apareceu.
- Será que aqueles bandidos a mataram
conforme prometeram?
- Não sei.
Elvira torceu as mãos nervosamente
- Meu Deus! O que será que aconteceu? A
polícia ainda não sabe nada sobre esses
bandidos?
- Temos algumas pistas, estamos
investigando. Estou certo de que em
breve chegaremos a eles. Você teria
condições de identificá-los?
- Sim. Farei tudo o que for preciso para
ajudar a polícia. Depois do que fizeram
conosco, é o que me parece mais justo.
Elvira lançou um olhar receoso sobre
Vitório e disse:
- Osmar me pareceu mais preocupado em
escapar dos bandidos do que em salvar a
mãe. Eu teria movido céus e terra para
salvá-la se pudesse.
- Nós sabemos disso - respondeu
Monteiro - e contamos com sua
colaboração. Estou certo de que
haveremos de descobrir esses assassinos
e colocá-los atrás das grades.
- É o que eu espero. Tenho medo de que
eles descubram onde eu estou e queiram
acabar comigo. Afinal, eu posso
identificá-los.
- A senhora está neste hospital sob sigilo
absoluto. Desde que a trouxemos do Rio
de Janeiro, sua identidade tem sido
preservada. Conseguimos impedir até que
a imprensa mencionasse seu nome e seu
envolvimento neste caso.
- Fico aliviada. Confesso que quando me
recordo deles sinto um frio na espinha e
não consigo evitar o medo.
- Fique tranqüila, a senhora está sob
minha proteção.
Vitório aproximou-se de Elvira e, apesar
de frustrado, sentia-se emocionado.
- É bom saber que minha mãe tem uma
amiga corajosa e sincera como a senhora.
O médico nos disse que em breve terá
alta. Onde pensa ir quando deixar o
hospital?
- Ainda não sei. Quando Teresa me deu o
emprego, vendi todos os meus pertences
e entreguei a chave de minha casa. Tudo
o que eu tinha estava naquela bagagem
que ficou na casa dos bandidos. Sou
sozinha no mundo e ainda não sei o que
fazer.
Vitório colocou a mão sobre o braço de
Elvira dizendo:
- A senhora irá para a minha casa. Estou
certo de que papai concordará.
- Vocês moram no Rio de Janeiro, não é?
- Sim. Mas atualmente estamos aqui em
São Paulo. Alugamos um apartamento.
Apenas Osmar está no Rio de Janeiro.
Papai está comigo. Ficamos para
acompanhar as investigações até
encontrarmos minha mãe. Mas aconteça o
que acontecer, a senhora pode contar
com minha amizade e proteção.
- Obrigada, meu filho. Você é muito
parecido com Teresa. Tem o mesmo olhar,
o mesmo jeito de falar. Sua mãe foi minha
melhor amiga, guardo delas as mais belas
recordações dos tempos de juventude. Eu
também não vou ter paz enquanto não
souber o que lhe aconteceu e onde ela
está.
- Agora vamos deixá-la descansar - disse
Monteiro.
Depois de se despedirem, eles deixaram o
quarto e o delegado perguntou ao
médico:
- Quando ela terá alta?
- Ela está muito bem, notei que seu
raciocínio é rápido e em perfeito estado.
Desta forma, penso que dentro de dois ou
três dias ela poderá sair. Só não a libero
agora porque está muito debilitada e
precisa se fortalecer um pouco mais.
- Doutor - tornou Vitório -, pretendo levá-
la para casa e cuidar do seu
restabelecimento. Por culpa dos
desacertos de meu irmão ela passou por
todo esse sofrimento.
Cuidar da sua recuperação é o mínimo
que poderemos fazer. Depois, ela é amiga
de mamãe, para mim isso vale muito.
- Sua atitude me deixa feliz. Confesso que
estava um pouco preocupado com o
futuro dela. É uma pessoa muito só e
encontrar amigos far-lhe-á imenso bem.
- Minha mãe a contratou e eu assino
embaixo. Sinto que se mamãe a
encontrasse, faria o mesmo.
Eles saíram do hospital e depois de deixar
Paulo na casa de Marília, Vitório foi para
casa. Paulo garantiu que não iria dormir
mais e ele estava ansioso para contar ao
pai as novidades.
Alberto estava lendo na sala. Vendo-o,
indagou:
- Por que veio tão cedo? Não deveria
estar na casa de Marília?
- Houve um imprevisto e Paulo colocou
Wagner em meu lugar. O delegado ligou
para Paulo avisando que Elvira recobrou a
consciência e convidando-o para ir até ela
assistir ao interrogatório. Eu fui junto.
Alberto levantou-se ansioso:
- Você a viu, falou com ela? Ela contou
onde está sua mãe?
- Calma pai. Ela também não sabe o
paradeiro de mamãe. Mas soubemos
parte do que lhes aconteceu.
- Conte logo. Por que elas não
embarcaram naquele aeroporto quando
as levei?
- Vou lhe contar. Quando as deixou lá,
elas saíram da sala de embarque,
transferiram as passagens para alguns
dias depois e viajaram para São Paulo.
- São Paulo? Por quê?
- Elvira hesitou muito para contar o que
foram fazer em São Paulo. Disse que
mamãe tinha um segredo e não queria
que nenhum de nós soubesse. Há algum
tempo ela estava sendo chantageada por
um homem que exigia muito dinheiro
para não entregar a você alguns
documentos que a comprometiam.
- Então era isso! Eu notei que nos últimos
tempos ela estava muito nervosa, eu diria
descontrolada mesmo. Por que ela não
me contou tudo?
- Ela não teve coragem. Vendeu algumas
jóias para arranjar o dinheiro e teve idéia
da viagem. Como tinha reencontrado
Elvira depois de muitos anos, convidou-a
para ser sua dama de companhia. Elas
tinham planejado ir a São Paulo, entregar
o dinheiro, apanhar os documentos
comprometedores e viajar em seguida
para a Europa.
- Mas pelo visto isso não ocorreu...
Vitório hesitou um pouco, mas resolveu
contar a verdade. Mais cedo ou mais
tarde, seu pai iria saber mesmo.
Devagar, observando a reação de Alberto,
Vitório foi contando as descobertas da
polícia e o motivo pelo qual Osmar
internara Elvira no sanatório.
Alberto ouvia estarrecido. Parecia-lhe
que estavam falando de outra pessoa,
não de seu filho predileto. Mas o fato é
que não tinha como duvidar. A polícia
tinha provas e estava claro que ele tinha
internado Elvira para evitar que ela
contasse o que sabia.
Vitório finalizou:
- Apesar de Elvira não saber onde mamãe
se encontra, o delegado acha que está
muito perto de descobrir toda a verdade.
Já identificaram alguns traficantes que
tinham negócios com Otávio e Elvira vão
cooperar, identificando os
seqüestradores.
- Custo a crer que Osmar tenha feito isso
tudo. Sempre lhe ensinei a ser honesto,
não posso entender onde foi que errei em
sua educação.
- Não se culpe, pai. Osmar sempre foi
maldoso. Eu nunca tive ilusões sobre o
caráter dele. Só não pensei que ele
chegasse a tanto.
Alberto estava triste e abatido. Vitório
sentou-se ao seu lado no sofá, colocou a
mão sobre o braço dele e disse com
carinho:
- Pai. Sempre é melhor saber do que
ignorar. Você confiou nele, deixou a
empresa em suas mãos. Eu também sou
um pouco responsável por ter me omitido.
- Quando fechei um negócio excelente,
ele ficou furioso, foi além do natural.
Agora sei o porquê: ele estava
negociando drogas e pretendia desviar
dinheiro da empresa para fazer o
pagamento, como eu limpei as reservas,
não pôde fazer o que queria.
- O que você fez foi bom. Evitou que ele
lesasse a empresa.
- Mas pode ter sido a causa do seqüestro.
Meu Deus! Se eles mataram Teresa,
nunca me perdoarei.
- Pai, pare de se culpar. Tenho certeza de
que mamãe está viva, escondida em
algum lugar, com medo dos traficantes.
Assim que eles forem presos, ela vai
aparecer.
- Gostaria de ter sua confiança!
- Quando nós não podemos fazer alguma
coisa, colocamos nas mãos de Deus para
que ele faça.
- Quisera ter sua fé! No estado em que me
encontro, não sei se consigo acreditar em
dias melhores.
- Pois eu sim. São nessa hora que
precisamos reagir, pensar que não
estamos sozinhos, que ao nosso redor
espíritos de luz nos mandam energias de
conforto e equilíbrio. Mas elas só vão nos
ajudar se acreditarmos no bem, se
deixarmos de lado o medo, os
pensamentos dramáticos e fixarmos
nossas mentes naquilo que desejam que
aconteça.
Os olhos de Alberto estavam cheios de
lágrimas quando ele respondeu:
- Ajude-me a fazer isso, meu filho.
- O que de melhor você desejaria que
acontecesse agora?
- Que Teresa voltasse, viva, com saúde e
que Osmar reconhecesse seus erros e
procurasse recuperar-se.
- Pois então imagine que tudo isso
aconteceu. Veja mamãe chegando, cheia
de alegria e amor.
O rosto de Alberto distendeu-se e ele
disse:
- Sim. É isso o que eu quero.
- Então, pense constantemente nisso.
Pense em sua alegria no momento em
que ela chegar como vai abraçá-la e
sentir-se feliz.
- Seria o dia mais feliz de minha vida.
- Esse dia chegará. Estou certo.
Alberto não conteve o pranto e Vitório
abraço-o com carinho:
- Chore, pai, jogue fora toda sua mágoa e
encha seu coração de esperança.
Alberto deixou as lágrimas correrem
livremente por alguns minutos. Quando
elas cessaram, ele sentiu-se aliviado.
- Tem razão, meu filho. É muito bom
esperar o melhor e imaginar que é isso o
que vai acontecer.
Vitório concordou depois eles deixaram-
se ficar abraçados, calados, sentindo o
momento de entendimento e de
cumplicidade".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 23
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Sentada em um canto do pequeno
quarto, olhando através dos vidros da
janela a tarde que caía, Teresa sentia-se
triste. Estava difícil suportar a saudade
que sentia dos filhos, do marido, do
conforto de sua casa e das pessoas que
queria bem.
Sozinha, sem ter com quem desabafar
seus receios, aflita por não saber o que
estava acontecendo com os seus,
procurava passar o tempo e conter a
ansiedade, desenhando e pintando
algumas pequenas telas.
Quase não saía, com medo de que os
seqüestradores a descobrissem, e a cada
dia ficava mais difícil suportar essa
situação.
Em especial naquele fim de tarde, quando
o outono se aproximava e o céu estava
cinzento, ela sentia a saudade mais forte.
Relembrando os momentos que
desfrutara no aconchego da família,
percebia o quanto fora feliz sem se dar
conta.
A postura de Alberto, que antes ela
pensava fosse de desinteresse, agora era
vista com outros olhos.
Pequenos acontecimentos, momentos em
que ele perdera o controle, faziam-na
pensar que o amor que Alberto sentira
desde que a conhecera, ainda estava
vivo, apesar da falta de interesse que ela
demonstrara.
Sua paixão por outro homem depois de
casada a fizera ser cruel com o marido,
rejeitando seu amor, imersa na ilusão,
acreditando que Alberto era a causa de
sua infelicidade, impedindo-a de viver
para sempre ao lado de quem amava.
Odiava-o por ele ter aparecido em sua
vida, impedindo-a de ser feliz. Pela
primeira vez percebeu que esse
sentimento a impediu de retribuir o afeto
que ele lhe dispensava e de viver uma
vida melhor.
Recordando-se de tudo quanto
acontecera desde que o conhecera,
Teresa percebeu o quanto ele tinha
tentado vencer a barreira que ela
colocara entre ambos, fazendo várias
tentativas de aproximar-se dela
intimamente, de tornar-se um
companheiro de verdade.
Naquele momento, daria tudo para estar
em casa, sem que nada tivesse
acontecido, com os filhos e com Alberto.
Ah! Se pudesse algum dia voltar para
casa, agiria diferente. Trataria de
valorizar a companhia dos filhos,
procuraria o afeto do homem que sempre
estivera ao seu lado, mas que ela,
mergulhada em suas ilusões, recusara.
Além do nome, Alberto lhe dera o respeito
de uma vida digna, dois filhos que ela
amava. Como pudera sentir-se frustrada
tendo tudo isso? Ela tinha tudo, fora feliz
e não soubera valorizar.
Seria por esse motivo que a vida lhe havia
tirado tudo e ela agora estava à margem,
como uma folha morta levada pelo vento
forte, sem comando nem destino?
Lágrimas rolavam pelo seu rosto e
Teresa, olhando à tarde que morria frente
aos prenúncios do anoitecer, sentiu
vontade de se penitenciar, de rever seus
enganos e agir diferente. Teria tempo
ainda?
Lembrou-se de Vitório sempre dizendo
que a vida fala com cada um através dos
acontecimentos.
Se isso fosse verdade, o que a vida
estaria lhe dizendo por meio dos fatos
que lhe tinham acontecido?
Claro que ela errara ao entregar-se
àquela paixão sendo casada. Mas tendo
escolhido ficar com a segurança da
família, reconhecia que ao continuar
nutrindo a ilusão daquela paixão causara
a própria infelicidade.
Agora, via as coisas com outros olhos.
Mais experiente, notava que se ela
tivesse se esforçado em manter um bom
relacionamento com o marido, talvez
houvessem se entendido e vivido melhor.
Naquele momento sentiu vontade de
pedir à vida que lhe desse uma nova
oportunidade. Se ela lhe permitisse um
dia voltar ao convívio dos seus, faria tudo
o que pudesse para conseguir o afeto do
marido e o carinho dos filhos.
Vitório era um rapaz sensível e carinhoso.
Muitas vezes não fora para ele uma mãe
compreensiva. Estava fechada demais em
seu mundo egoísta, julgando-se infeliz,
sem notar as coisas boas que possuía.
Osmar era mais difícil e ela tentara ser
dura com ele, mas nunca tentara
compreender seu temperamento e chegar
de fato aos seus sentimentos íntimos.
Agora se arrependia. Mas talvez fosse
tarde. Por que ele se envolvera com os
bandidos? Se ela tivesse se aproximado
mais dele, talvez tivesse conseguido
notar alguma coisa e tê-lo impedido de
seguir esse caminho.
O que deveria fazer para ter uma nova
oportunidade de reparar seus erros e
tentar ser feliz?
Pensou em Deus. Teresa não era muito
devota. Dinda sempre lhe dizia que ela
precisava ligar-se mais à espiritualidade,
procurar Deus no fundo do coração e
conversar com ele para encontrar
respostas para suas dúvidas.
Fechou os olhos e, com toda a força,
procurou mergulhar no fundo do coração
e sentiu o quanto desejava sair daquela
situação infeliz.
Então, começou a conversar com Deus,
falando dos seus sentimentos, de como
sentia falta dos seus, de como gostaria de
poder voltar para casa, encontrar o
marido, os filhos. Se Deus lhe concedesse
mais uma oportunidade de estar com
eles, dar-lhes-ia todo o amor que agora
gritava em seu peito, procurando
entendimento e aconchego.
Quando ela terminou e abriu os olhos, a
noite já tinha caído e o quarto estava
escuro. Acendeu o pequeno abajur ao
lado da poltrona e respirou aliviada.
Aqueles momentos de reflexão lhe
fizeram enorme bem. Em seu coração
havia um sentimento de paz. Vitório tinha
razão. A meditação e a reflexão interior, a
ligação com a alma, fazia muito bem.
Ela sentia-se mais confiante. Algo lhe
dizia que não podia se desesperar. Que
tudo passaria e ela voltaria novamente há
viver um tempo melhor. Só precisava ser
paciente e esperar.
Ela não viu, mas o espírito de Analú
estava ao seu lado, inspirando-lhe
pensamentos de calma. De sua testa
saíam raios de luz colorida que
penetravam no frontal de Teresa,
fazendo-a sentir-se mais forte e com mais
coragem.
Inspirada, Teresa apanhou uma tela em
branco, dispôs o material e começou a
pintar. Analú sorriu e nesse instante o
rosto angustiado de Vitório apareceu em
sua mente. Ela decidiu ir ter com ele.
Encontrou-o sentado em seu quarto,
cabeça entre as mãos, pensando em
Teresa. Estava difícil aceitar o
desaparecimento dela. O fato de Elvira
não poder esclarecer seu paradeiro o
deixara aflito. A dúvida se ela estava viva
ou morta reapareceu forte e
desagradável.
A idéia de que os seus seqüestradores
poderiam tê-la matado o atormentava.
Momentos antes, tentaram encorajar o
pai, aparentando uma calma que não
tinha. Osmar era o culpado de tudo. Por
que ele não se abria com a polícia,
contando tudo o que fizera e procurando
ajudá-los para que encontrassem e
prendessem os traficantes, descobrindo o
paradeiro de sua mãe?
Osmar não parecia importar-se com o
desaparecimento dela e isso o deixava
nervoso. Não podia conceber que o irmão
fosse tão frio a ponto de deixá-la
entregue nas mãos daqueles bandidos,
sem que nada fizesse para tentar salvá-
la.
Continuava trabalhando na empresa como
se nada houvesse acontecido, na
costumeira pose de auto-suficiente, sem
importar-se com mais nada, como se tudo
estivesse bem.
Naquela mesma tarde, tinha conversado
com Paulo sobre esse assunto, aventando
a hipótese de ir ao Rio conversar com o
irmão para chamá-lo a razão, dizendo que
a polícia sabia dos negócios escusos que
fizera com traficantes, que ele estava na
lista dos suspeitos e tentar convencê-lo a
ir espontaneamente procurar a polícia
para contar a verdade e ajudá-la a
encontrar Teresa.
Ele acreditava que só quando os bandidos
fossem presos eles poderiam saber o que
aconteceu.
Mas Paulo pediu-lhe que não fizesse isso.
O delegado Monteiro estava empenhado
nas investigações, havia traçado um
plano para a captura dos traficantes e
essa sua atitude poderia pôr a perder
todo o trabalho deles.
Para que o plano do delegado desse
certo, Osmar precisava acreditar que
Elvira não contara nada ainda e que a
polícia ignorava sua ligação com os
traficantes.
Osmar acreditava que sua mãe não corria
perigo porque o pior tinha acontecido e
ela estava morta. A tragédia já tinha
acontecido e não havia nada mais a fazer
quanto a isso, o melhor era salvar a
própria pele.
Como não recebeu mais nenhuma ameaça
de morte dos traficantes, preferiu pensar
que eles já julgavam que o tinham
castigado o suficiente tendo matado sua
mãe.
Analú entrou no quarto de Vitório,
aproximou-se dele, colocando a mão em
sua testa com carinho e dizendo:
- Calma, Vitório. Eu estou aqui. Não tema.
A tempestade vai passar e tempos
melhores virão. Confie e espere. Não se
deixe levar pelo pessimismo. Se desejar
ajudar sua mãe, mantenha o pensamento
positivo.
Vitório estremeceu, fechou os olhos e viu
Analú na sua frente, sorrindo. Ouviu suas
palavras.
- Finalmente você veio! Por que me
abandonou no momento em que eu mais
precisava de ajuda?
- Eu nunca o abandonei. Mas há
momentos em que a vida está agindo, ela
tem seus motivos e nós não podemos
intervir.
- Estamos sem rumo. Sem saber se minha
mãe está viva ou morta. Você pode me
dizer alguma coisa?
- Só posso lhe dizer que Teresa está viva.
Espero que isso o anime e o ajude a não
se envolver no pessimismo. Você já
deveria ter aprendido que a queixa, o
pensamento ruim, não ajuda em nenhuma
situação, só atrapalha.
- Em uma situação como a que estamos
enfrentando, é difícil manter os
pensamentos otimistas.
- Onde está sua fé? Você já sabe que não
cai uma folha da árvore sem que Deus
saiba. Na natureza tudo tem uma razão
boa de ser. O que vocês precisam é
procurar entender o que ávida deseja
ensinar-lhes, quais as atitudes de vocês
atraíram todos esses acontecimentos.
- Nós somos pessoas de bem. Nunca
fizemos mal a ninguém.
- A vida deseja que vocês amadureçam.
Quando as pessoas presas em suas
ilusões demoram em entender essa
realidade, ela coloca em seus caminhos
fatos que os levem a refletir, a rever
certos valores e a perceber coisas que
antes não viam. Isso é amadurecer. É
tornar-se mais lúcido e mais adulto.
- Entendo. Nesse caso, o que será que ela
deseja nos ensinar?
- Essa pergunta cada um terá de fazer a si
mesmo, porque a resposta é individual.
Cada um terá de encontrar a sua. A vida
trabalha sempre em benefício de todos e
dispões os fatos de maneira a que cada
um encontre o que precisa.
- Isso me parece sábio.
- A vida é a inteligência do criador em
ação. Há muito mais coisas que eu
gostaria de poder lhe ensinar. Mas isso só
poderei fazer quando você estiver pronto
para receber.
- Eu gostaria muito de aprender todas
essas coisas.
- Nesse caso, terá de resistir ao mal,
procurando ver sempre o lado melhor das
coisas. Em todos os fatos, mesmo os que
chocam pela tragédia, haverá sempre o
lado do benefício que todos só
reconhecerão mais tarde. Portanto,
aceitar os fatos com entendimento e
tentar aprender o que eles querem nos
ensinar é o primeiro passo para a
conquista da sabedoria e da serenidade.
- Você pode me dizer se minha mãe está
bem?
- Já lhe disse o mais importante e o que
era possível. Tenha paciência. Não levará
muito tempo para que tudo se esclareça.
- Temo pela saúde de meu pai. Ele está
um pouco doente e abatido.
- Ele está aprendendo muito com esta
situação. Quando tudo se normalizar, terá
se transformado em um novo homem,
mais humano, mais afetivo, mais
verdadeiro.
- Tenho notado que ele mudou muito.
- Continue oferecendo seu apoio e
carinho. Isso fortalecerá os laços de
amizade entre vocês dois, eliminando os
desentendimentos de vidas passadas.
- Sempre senti que ele não me aceitava.
- Você também não fazia nada para
aproximar-se dele.
- É verdade. Eu sentia certa distância, que
desejava continuar mantendo.
- Coisas de um relacionamento difícil no
passado. Mas hoje, tocados pelos fatos
recentes, vocês estão se modificando,
tornando-se mais sensíveis. O amor e a
compaixão sempre levam ao melhor
caminho.
- De fato. Estou tocado de compaixão
pelos sofrimentos dele. O relacionamento
dele com a mamãe fizeram-me acreditar
que ele era um homem frio, voltado
apenas aos interesses financeiros. Mas
hoje posso ver que estava enganado. Ele
sente por minha mãe um amor imenso e
verdadeiro que nunca imaginei existir.
Descobrir isso provocou em mim um
carinho muito grande por ele.
- O amor verdadeiro comove e eleva. Você
está no caminho certo. Confie, seja
positivo, dê chance que esse sentimento o
envolva e procure demonstrá-lo. Isso os
unirá cada vez mais.
Vitório estava tocado por um sentimento
de alegria e plenitude. Toda sua angústia
tinha desaparecido.
- Obrigado, Analú, por ter-me esclarecido.
Sinto-me melhor e mais forte.
- Isso mesmo. Continue cultivando esses
pensamentos. Eles o fortalecerão cada
vez mais. Agora preciso ir.
- Venha ver-me de vez em quando. Sua
presença me ajuda e levanta.
- Lembre-se de que o fato de eu não me
comunicar não significa que esteja
ausente. Estou sempre ligada com você e
esteja onde eu estiver, é como se
estivesse ao seu lado. Sei de tudo quanto
lhe acontece.
- Gostaria que ficasse mais tempo comigo.
Ao seu lado me sinto muito feliz.
- Nossa ligação vem de muito tempo. O
laço que nos une é forte e verdadeiro.
- É por esse motivo que sua presença me
encanta e emociona.
- Eu também gosto de estar com você.
Vou embora, mas prometo que um dia
voltarei para contar-lhe coisas do
passado, que antecederam os fatos de
hoje, e por que eles aconteceram.
- Isso tem me preocupado. Esse crime
montou um quebra-cabeça difícil de
resolver. Por mais que eu tente não
encontro a ligação entre as pessoas
envolvidas.
- Um dia você saberá. Adeus.
Analú desapareceu e Vitório suspirou,
abriu os olhos pensativos. A presença
dela tivera o dom de encher seu coração
de esperança. Ela afirmara que Teresa
estava viva e isso no momento era o mais
importante.
Na casa de Marília tudo continuava igual.
Paulo permanecia vigilante, mas até
aquele momento não tinham recebido
nenhuma ameaça e ele não tinha notado
nada suspeito perto da casa.
Entretanto, a amizade dele com a família
crescia e era com prazer que depois do
jantar sentava-se na cozinha enquanto
Marília e Dorita estavam trabalhando,
preparando os quitutes com os quais
estavam conseguindo sustentar as
despesas.
A procura de seus produtos crescia dia a
dia e elas tinham contratado Estela, uma
jovem que morava perto e estava
procurando trabalho.
Estela tinha vinte e dois anos, era órfã de
pai, sua mãe trabalhava em uma oficina
de costura, mas o que ganhava não era
suficiente para pagar os estudos da filha,
que pretendia cursar uma faculdade.
Tanto Dorita como Marília simpatizaram
com Estela à primeira vista e a
contrataram como experiência, apenas
com uma comissão sobre os produtos
vendidos, prometendo rever a situação
conforme pudessem. Cheia de vontade,
Estela aceitou, afirmando que se
empenharia no trabalho.
Fazia três dias que Estela estava
trabalhando, Marília e Dorita estavam
satisfeitas com seu desempenho.
Chegava cedo, fazia tudo com boa
vontade, sem escolher serviço e
permanecia até mais tarde quando
tinham muitas encomendas para
entregar.
Além disso, era uma moça alegre, bem-
humorada, que tornava o ambiente, que
já era bom, ainda melhor. Elas
trabalhavam rindo e Altair, que nas horas
vagas gostava de cooperar no trabalho,
divertia-se muito com suas histórias.
Paulo sentia-se bem naquela casa. Altair,
que a princípio o tratava com certa
cerimônia, aos poucos tinha se
aproximado mais dele, que procurava
estimulá-lo a estudar, conhecer as coisas,
conversando, falando sobre a vida, suas
experiências, suas viagens pelo mundo e
suas descobertas.
Altair ouvia-o com olhos brilhantes, cheio
de interesse e curiosidade. Paulo
estimulava-o, trazendo-lhe livros,
mostrando-lhe gravuras, ensinando-o a
olhar as coisas pelo lado melhor.
Vendo os dois na sala, entretidos nessas
conversas, Marília sentia aumentar a cada
dia sua admiração por Paulo. Otávio
nunca tivera para com o filho esse
carinho. Tratava-o com autoridade, sem
se aproximar nem permitir que o menino
se aproximasse.
Ela adorava vê-los juntos, rindo,
conversando, como se fossem amigos há
muito tempo e sentia que seu afeto por
Paulo crescia a cada dia. Em certos
momentos notava que ela a olhava com
carinho, mas não sabia se era amor.
Quando Otávio morreu, Marília sentira
alívio. A presença dele era pesada.
Quando ele entrava em casa o ambiente
ficava carregado, mesmo que ele não
estivesse zangado. Por esse motivo,
prometera a si mesma nunca mais
envolver-se com ninguém. Mas tinha de
reconhecer que estava completamente
apaixonada por Paulo.
Dorita, quando a sós com ela, brincava
dizendo que ela parecia uma adolescente,
garantindo que ele também estava
apaixonado.
- Prepare-se porque um dia desse ele vai
se declarar - costumava dizer.
- Bobagem sua. Ele está apenas querendo
ser gentil. É um homem educado.
Dorita ria alegre e meneava a cabeça
negativamente:
- Parece que estou vendo vocês dois
juntos e agora que conquistou Altair,
penso que não vai demorar.
O rosto de Marília cobria-se de rubor e ela
tentava dissimular, fazendo com que
Dorita risse ainda mais.
O telefone tocou, Dorita atendeu e
procurou Paulo:
- O Dr. Monteiro quer falar com você.
Paulo atendeu em seguida. Depois dos
cumprimentos ele disse:
- Prepare-se, Paulo. Ontem fizemos uma
diligência que deu ótimos resultados,
Dentro de poucos dias teremos
novidades. Estou fazendo um plano que
me parece definitivo. Não posso dar-lhe
detalhes agora. Mas amanhã passe aqui
na delegacia no fim da tarde para
conversar. Vou precisar de você.
- Pode esperar, irei. Acha mesmo que
estamos para encerrar o caso?
- Estou quase certo. Espero você amanhã.
- Estarei aí.
Paulo desligou o telefone pensativo.
Marília que ouvira a conversa indagou:
- Você acha mesmo que o delegado está
para encerrar o caso? Já encontrou os
assassinos?
- Isso eu não sei. Mas foi o que ele quis
dizer. Esse assunto é delicado e não se
pode conversar pelo telefone.
Marília baixou os olhos, triste. Notando,
Paulo indagou:
- Parece que ficou triste. Não quer que os
assassinos de seu marido sejam presos?
Ela hesitou um pouco, depois o olhou nos
olhos e respondeu:
- Claro que eu quero que sejam presos,
mas isso fará com que você tenha de ir
embora.
Ele aproximou-se dela, segurando seu
braço:
- Você gostaria que eu ficasse mais?
Os olhos dela estavam brilhantes, com
lágrimas prestes a cair.
- Sim - respondeu baixinho.
Paulo abraçou-a com carinho, levantou
seu queixo e beijou seus lábios com amor.
Foi um beijo longo, cheio de ternura e
emoção.
O coração batendo forte, Marília
correspondeu cheia de carinho e eles
beijaram-se muitas vezes. Depois, ele
disse:
- Eu amo você. Nunca senti por ninguém o
que estou sentindo agora. Quero que
fique para sempre a meu lado.
- Eu também o amo. Não posso mais
conceber minha vida sem você.
Eles beijaram-se de novo, esquecidos de
tudo. Nem viram Dorita feliz, observando-
os, escondida atrás da porta da cozinha".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 24
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Osmar chegou à empresa irritado. Na
noite anterior fora a uma recepção e
encontrara Aurélia ao lado do rival, não
escondendo os sentimentos que nutriam
um pelo outro.
Apesar de tudo quanto Norberto tinha
feito na tentativa de armar alguma coisa
contra esse doutorzinho que cruzara seu
caminho, não tinha conseguido sucesso.
O homem tinha sorte demais. Contra ele
nada dava certo. Norberto talvez não
tivesse esse empenhado como deveria.
Ele era bom em desviar as pessoas
indesejáveis do seu caminho. Tinha feito
isso algumas vezes com sucesso. Por que
com o médico tudo dava errado?
Sentou-se atrás da escrivaninha, abriu o
jornal e lá estavam os dois, sorridentes e
felizes. Embaixo uma frase: "O casamento
de Aurélia Saldanha com o Dr. Augusto
Mendonça está marcado para daqui a um
mês. Depois do casamento, os noivos
viajarão para a Itália em lua-de-mel".
Isso não poderia acontecer. Ele teria
apenas um mês para separar os dois e
talvez fosse melhor procurar outra pessoa
para o serviço. Em último caso, faria o
médico desaparecer para sempre. O que
ele não podia era permitir que ele
roubasse a mulher de sua vida.
Naquele dia não conseguiu trabalhar. Sua
cabeça estava naquela foto e no futuro
casamento dos dois. Uma onda de rancor
o envolveu. Teve vontade de acabar com
o rival com suas próprias mãos.
Imerso em seu ódio, ele não percebeu
que duas sombras escuras estavam ao
seu lado, transmitindo-lhe pensamentos
de ódio e vingança.
Apesar de desejar a morte do médico, ele
preferia que outro fizesse o serviço sujo.
Mas ao mesmo tempo não queria colocar
outra pessoa a par do que planejava, com
receio de mais tarde ser chantageado.
Apesar de tudo, Norberto era de sua
confiança, já lhe prestara outros serviços
e nunca desejara tirar proveito, além do
que recebera como pagamento.
Uma das sombras colocou a mão na testa
de Osmar dizendo:
- Se você não fizer nada, eles logo estarão
casados e você nunca a terá. É muito fácil
tirá-lo do caminho... basta querer. Você é
forte, espere-o em uma esquina escura e
acabe com esse sofrimento!
Osmar não ouviu aquelas palavras, mas
pelo seu pensamento se via esperando o
médico em uma esquina próxima de sua
casa, com uma arma, pronto para atirar.
Olhava em volta e não tinha ninguém.
Por que ele mesmo não fazia o serviço?
Assim, além de não ter de pagar nada,
não correria o perigo de ser traído.
"Mas e se alguém aparecer e me ver?",
pensava.
- Que nada, não vai aparecer ninguém. Eu
vou ajudá-lo - continuou falando em seu
ouvido o vulto escuro.
O outro vulto aproximou-se:
- Ele é covarde, nunca vai fazer o que
você quer.
- Vai sim, Renata. Fique firme que vamos
conseguir.
- Esse desgraçado tem de pagar pelo que
nos fez.
- Por causa dele morremos daquela
maneira horrível. Olhe para mim, veja
meus ferimentos ainda sangram.
- Pois eu preferia encontrar aquela
traidora que me mandou para a morte.
Não tenho nada a ver com ele. Por causa
dela estou aqui. Veja minhas mãos, elas
ardem sem parar. Meus ferimentos
ardem.
- Eu morri inocente. Fui apenas o
intermediário da venda e também não fui
pago. Osmar é o culpado. Quero que ele
mate o homem e vá preso. Então ficarei
ao lado dele me sentindo vingado, vendo-
o sofrer em uma cadeia imunda.
- Pois eu preferia ficar onde Teresa está.
- Nós tentamos, mas não conseguimos
entrar. Ela deve ser protegida dos
maiorais.
- Eu não me conformo! Depois de tudo
quanto ela nos fez!
- Você aceitou fazer o que ela pediu
pensando no dinheiro que iria ganhar.
- Claro. Nunca poderia imaginar que
aqueles homens iriam aparecer para nos
matar.
- Nem Teresa sabia disso. Ela não pensou
que você poderia ser morta.
- Pensou sim. Por que não quis ir ela
mesma? Porque estava com medo.
Pressentia que tudo aquilo poderia
acontecer.
Enquanto os dois conversavam, Osmar
sentia a raiva aumentar. Não conseguia
trabalhar. Decidiu sair e procurar
Norberto. O que não podia era ficar
parado esperando o pior acontecer.
Saiu e foi à procura dele. Era cedo e o
escritório dele ainda estava fechado.
Osmar voltou para a empresa pensando
em retornar mais tarde.
À tarde, na casa de Marília, o ambiente
estava alegre e descontraído. Assim que
Vitório chegou, encontrou Marília e Paulo
conversando de mãos dadas e pela
fisionomia deles compreendeu que
tinham se entendido.
Depois dos cumprimentos disse contente:
- Parece que o inevitável aconteceu.
- O quê? - indagou Marília, acanhada.
- Aconteceu, sim - concordou Paulo,
sorrindo e apanhando novamente a mão
que Marília retirara quando Vitório
entrou. - Nós nos amamos e pretendemos
nos casar.
- Parabéns! - tornou Vitório, rindo. -
Olhando o rosto radiante de vocês sinto
uma ponta de inveja. Gostaria também de
encontrar alguém para alegrar minha
solidão.
- Você não tem porque não quer - disse
Marília, que tinha ficado mais à vontade.
- Não é bem assim...
- É jovem, tem boa aparência e um
grande coração. Estou certa de que logo
vai aparecer alguém para iluminar sua
vida.
Estela apareceu na porta e convidou-os
para testar um bolo que ela mesma fizera,
receita de sua avó alemã.
- Acabei de tirar do forno. Quero que
experimentem e dêem uma opinião. É
muito gostoso, faz vista e não fica caro.
Dá para ter um bom lucro.
Paulo olhou para Marília e disse:
- Além de tudo, Estela é uma ótima
negociante. Gostei de ver!
- Ela é das nossas! Parece até que sempre
estivemos trabalhando juntas.
Conversando alegres foram à cozinha,
onde Estela, rosto enrubescido pela
emoção, serviu-lhes uma generosa fatia
do bolo, cujo aspecto e odor eram
convidativos.
Eles saborearam satisfeitos e Dorita
comentou:
- Vamos colocá-lo em nossa lista de
produtos. Será o Bolo da Estela.
- Isso mesmo - aduziu Marília -, está
muito bom. Leve, gostoso, uma delícia.
Paulo olhou no relógio, depois comentou:
- Está na hora de falar com o Monteiro na
delegacia.
Ele preparou-se para sair e Marília
acompanhou-o até a porta:
- Volte logo - pediu.
Ele beijou-a levemente nos lábios e
respondeu:
- Talvez eu me demore. Vamos fazer uma
reunião com Monteiro. Ele vai expor seus
planos para o xeque-mate. Pode levar
tempo. Mas voltarei o mais rápido que
puder.
- Estou rezando para que ele prenda logo
todos esses bandidos.
- Eu também.
Enquanto isso, na cozinha, Vitório
aproximou-se de Estela e perguntou:
- Nós não nos conhecemos de algum
lugar?
- Não. Por quê?
- Desde que a vi tenho a impressão de
que já nos encontramos antes.
Ela sorriu, fez um ar malicioso e
respondeu:
- Eu também me pergunto de onde o
conheço. Estou certa de que não foi aqui.
Terá sido em outras vidas?
Vitório fixou-a admirado. Não esperava
essa resposta.
- Você acredita que tenhamos tido outras
vidas além desta?
- Eu sinto que já vivi muitas vidas antes
desta. Sei de coisas que não aprendi
nesta vida, que já faziam parte de mim
quando nasci.
- Eu também sinto isso. Sonho com
minhas vidas passadas.
- Eu sei como é isso. Nesses sonhos nos
encontramos com pessoas conhecidas
daqueles tempos, mas que não estão
aqui.
Vitório estava admirado. Ele evitava falar
nesse assunto por saber que muitos têm
preconceito por ignorar essa realidade.
Mas Estela falara com naturalidade e ele
ficou encantado.
Quando Marília voltou à cozinha, os dois
continuavam conversando e ela admirou-
se de ver Vitório tão falante. Ele sempre
se mantinha discreto, só falando o
essencial.
Elas voltaram ao trabalho e Vitório
continuou saboreando o bolo com prazer.
Era-lhe muito agradável ficar naquela
casa com aquelas mulheres. Sentia-se
muito à vontade e bem-disposto. O
encontro com Analú proporcionara-lhe
imenso bem. Acalmara sua ansiedade e o
fizera notar outros lados da vida que ele
esquecera, preocupado com a ausência de
Teresa.
Agora que Analú lhe garantira que ela
estava viva e que em breve tudo se
resolveria, sentia-se alegre e com
vontade de conversar.
Observando-a notou o quanto Estela era
graciosa e semicerrando os olhos ficou
surpreendido com o brilho de sua aura,
que refletia pensamentos nobres e
bondosos.
Reconheceu que aquelas três mulheres
eram muito especiais e decidiu fazer tudo
para continuar mantendo com elas um
relacionamento verdadeiro.
Estela surpreendeu os olhos de Vitório
fixos nela, e fixou os dela nele também,
momentaneamente, esquecida do que
estava fazendo.
Dorita cutucou Marília e deu uma piscada
maliciosa, chamando a atenção dela sobre
os dois. Marília notou e sorriu. Ela estava
feliz com o amor de Paulo, de bem com a
vida e desejava que todos fossem felizes
como ela.
- Está na hora de você também, Dorita,
arranjar um amor.
A outra se assustou:
- Eu?!
- Do que se admira? Você é muito moça
para ficar sozinha.
Ela riu bem-humorada e respondeu:
- No outro dia o filho do seu Mário, dono
da lanchonete que fez aquela encomenda
grande, queria sair comigo. Mas eu não
quis.
- Por quê? Não gostou dele?
- Sou uma pessoa ocupada. Não posso
perder tempo com namoricos.
Depois, ele era muito novo para mim.
Estou escaldada. Minha fé nos homens
está abalada.
Vitório, que ouvira tudo, interveio:
- Quero só ver a hora em que aparecer
um homem simpático, bem-
intencionado...
- Assim, quem sabe... - brincou ela.
O momento era de alegria e descontração
e eles continuaram conversando,
enquanto elas continuavam a tarefa.
Paulo chegou na delegacia e foi falar com
Monteiro. Assim que entrou, o delegado
recebeu-o bem-disposto. Depois dos
cumprimentos Paulo brincou:
- Estamos prontos para o xeque-mate?
- Tudo faz crer que sim. E o peixe que
vamos prender é dos maiores.
- Gil Duarte? O empresário de fachada?
- Esse mesmo, e seus comandados.
Estamos preparados para acabar com
toda a quadrilha. Mobilizamos policiais de
três Estados, mas a rede está pronta.
Nenhum vai escapar.
- E Osmar?
- Está acuado. Apertei o Nelsinho, prometi
ajudá-lo se nos dissesse toda a verdade e
ele cooperou. Contou-nos tudo.
- Ele sabe o que aconteceu com Teresa?
- Não. Mas saberemos tudo assim que Gil
estiver em nossas mãos. Há anos temos
tentado prendê-lo, mas ele nunca se
deixou apanhar. Agora temos provas.
Elvira e Nelsinho estão dispostos a
testemunhar. Osmar também será uma
testemunha valiosa.
- Terá de convencê-lo a falar. Ele não me
parece fácil. É astucioso e esperto. Vai
querer negar tudo.
- Ele pode fazer o que quiser. Nós temos
provas. Eu até acho que quando ele
perceber que não lhe resta mais nada,
tratará de tentar salvar a própria pele.
Abrirá o jogo.
- Por que tem tanta certeza?
- Esta manhã, depois que eu falei com
você, tive uma visita inesperada que
esclareceu muita coisa sobre aquele
crime. É mais uma testemunha do caso.
- Por esse motivo você está tão alegre?
Quem é essa testemunha?
- Um motorista de táxi. Naquela noite ele
levou Teresa na casa do crime.
- Não diga! Então aquele corpo é mesmo
dela?
Monteiro sorriu, fez um ar de mistério e
respondeu:
- Não. Quem morreu foi a outra muito
parecida com ela. Vou contar-lhe tudo.
Hoje de manhã, quando cheguei aqui,
soube que tinha um motorista de táxi a
minha espera. Ele me disse que tinha uma
revelação a fazer sobre o crime que
estamos investigando, mas que só falaria
comigo.
Intrigado, mandei-o entrar. Quando ele
entrou, notei que estava com muito medo
e procurei conversar com ele para que
ficasse mais à vontade. Perguntei seus
dados, quando o vi mais calmo indaguei o
que tinha a dizer e ele começou:
- Devo contar-lhe que estou com muito
medo. Trabalho com táxi há mais de
quinze anos e nunca me envolveu em
nada perigoso. Sou um homem de bem,
pai de família, cumpridor de minhas
obrigações de cidadão.
- Sei disso. Continue por favor.
- Desde o momento em que li as notícias
daquele crime nos jornais tive vontade de
procurar a polícia, mas tive muito medo
de ser envolvido. Afinal, era um crime
misterioso e muito cruel.
- O que o fez vir agora?
- O remorso. Tenho acompanhado o caso
pelos jornais, li a entrevista do filho de
Teresa desesperado por não saber o que
lhe aconteceu. Minha mulher me
convenceu a vir aqui, dizendo que eu
poderia pelo menos dizer que Teresa
estava viva depois daquele crime.
- Você esteve com ela naquela noite?
- Vou contar-lhe tudo.
Emocionado, ele contou que naquela noite
ele apanhou duas passageiras. Eram tão
parecidas que ele imaginou que fossem
irmãs gêmeas. Levou-as ao endereço
pedido, lembrava-se da conversa delas.
Uma chamava Teresa e a outra, Renata.
Teresa dava as instruções para ela entrar
na casa, entregar o dinheiro, que ele
presumia estar em uma frasqueira, e
voltar em seguida. Ele notou que as duas
estavam com muito medo. Renata foi,
entrou na casa e pouco depois chegou
outro carro do qual desceram quatro
homens que também entraram ali. Teresa
ficou assustada e pediu que ele saísse
dali e dobrasse a esquina. Ela desceu do
carro e ficou espiando o que acontecia na
casa. Assim, ele continuava seu relato:
- Eu notei logo que tinha alguma coisa
errada, queria ir embora e aconselhei-a a
isso, mas ela não queria deixar a outra lá.
Vendo que os homens saíram e foram
embora, esperamos, mas a Renata não
voltou. Então, Teresa foi até a casa
procurá-la, mas voltou logo, dizendo que
ela já tinha ido embora e que podíamos ir
também. Deixei-a em um hotel. Quando li
o crime no jornal, imaginei que a outra
mulher tinha sido morta. Pensei em vir
aqui, mas o medo foi maior. Se aqueles
homens soubessem que eu os tinha visto,
minha vida não valeria mais nada.
- De fato. Trata-se de traficantes muito
perigosos. Mas nós temos condições de
defendê-lo. Não precisa temer. Peço-lhe
que não fale a ninguém que esteve aqui e
que sabe quem são os assassinos.
- Só minha mulher é que sabe do caso.
Ninguém mais. Ela também não vai abrir
a boca.
O delegado finalizou:
- Esse taxista está à disposição. Deu o
endereço do hotel onde deixou Teresa
naquela noite. Mandei investigar e soube
que ela esteve lá, mas se mudou para
outro lugar.
Não sabemos onde.
- Está se escondendo com medo dos
traficantes. Pelo menos sabemos que ela
está viva. Assim que souber que os
bandidos estão presos, ela vai aparecer.
- Se não fosse pelo Vitório e pela Dinda,
nós teríamos enterrado essa Renata como
se fosse Teresa, o que teria sido um
tremendo engano.
- Ainda resta uma pergunta: Quem será
essa Renata que morreu no lugar de
Teresa, sem que ninguém da família
tenha ainda ouvido falar?
- Isso a própria Teresa poderá esclarecer.
O fato é que temos mais uma testemunha
contra Gil Duarte e desta vez ele não
poderá se safar.
- Qual será o próximo passo?
- Eu tenho um plano para prendê-lo com
todos os seus asseclas e faremos isso.
Com base no inquérito que ontem, vamos
conseguir uma ordem de prisão para
todos os envolvidos, inclusive Osmar.
Depois, faremos várias diligências ao
mesmo tempo. Quero apanhá-los de
surpresa.
- Quando pensa fazer isso?
- Se possível esta noite mesmo. Já enviei
os documentos para o delegado do Rio de
Janeiro e ele cumprirá o mandato de
prisão contra Osmar e enviará preso para
São Paulo.
- Vai ser um choque para Vitório e o pai.
- A verdade sempre dói. Infelizmente,
nada posso fazer. O moço escolheu esse
caminho.
- O pai o tinha como seu melhor filho. Era
nele que depositara todos os seus anseios
para o futuro.
- Quem se ilude candidata-se à desilusão.
Paulo sorriu e respondeu:
- Você disse uma grande verdade. Ele se
iludiu, acreditando que o filho fosse como
ele gostaria, criou expectativas fora da
realidade e, no fim, só poderia se
desiludir.
- Os pais nunca querem enxergar os
pontos fracos dos filhos.
- Isso impede que eles os ajudem a
escolher um caminho melhor.
- Estou contente porque acredito que
resolvemos mais um crime misterioso.
Mas como você sabe, só podemos "cantar
vitória" quando todos estiverem presos.
Vou reunir meus homens e planejar toda
a ação. Conto com você.
- Claro. Estou à disposição.
Monteiro reuniu os homens em uma sala e
começaram a planejar cuidadosamente
como iriam agir."

"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 25
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Paulo ligou para a casa de Marília e
quando ela entendeu disse-lhe que
aquela deveria ser a grande noite. Ele não
sabia a que horas poderia voltar para lá.
_ Monteiro pediu que eu fosse com eles e
eu aceitei. Se tudo sair como esperamos,
dentro de algumas horas teremos
chegado à solução do caso.
Marília ficou apreensiva:
_ Tome cuidado.
_ Fique tranqüila. Não vai nos acontecer
nada.
_ Ficarei esperando ansiosa. Só
sossegarei quando você estiver de volta.
_ Não tenha medo de ficar só. Vou pedir
para o Wagner ficar no meu lugar.
_ Não quero que nada lhe aconteça.
_ É bom saber que se preocupa com o
meu bem-estar. Mas não há perigo.
Sabemos nos defender.
_ Não me deixe sem notícias.
_ Ligarei assim que puder. O Vitório ainda
está aí?
_ Sim. Ele disse que só iria embora depois
que você chegasse. Está ansioso para
saber como vocês vão fazer.
_ Ele não vai gostar de saber que Osmar
vai ser preso. È melhor eu falar com ele e
lhe explicar tudo.
Marília chamou Vitório, que atendeu
prontamente. Paulo foi direto ao assunto:
_ Monteiro conseguiu um mandato de
prisão para todos os envolvidos e Osmar
está entre eles.
Vitório estremeceu:
_ Ele vai ser preso?
_ vai. Não podemos evitar. Ficou provado
que ele está metido com os assassinos e
até que pode ter sido a causa indireta dôo
crime.
Vitório ficou calado por alguns instantes,
depois disse:
_ Era isso o que eu temia. Meu pai vai
ficar arrasado.
_ Vou pedir ao Wagner para ficar aí, em
meu lugar, e assim que ele chegar você
pode ir para a casa ficar com seu pai e
tentar preparar o espírito dele para o que
vai acontecer.
_ Não sei como fazer isso. Ele vai sofrer
muito.
_ Vá para sua casa, ligue-se com os
espíritos amigos, peça-lhes inspiração e
força para superar o que virá e estou
certo de que vai encontrar a maneira
melhor de dar essa notícia a seu pai.
Vitório suspirou triste:
_ É o que vou fazer. Mas estou muito
triste, nunca pensei que Osmar fosse
acabar assim.
_ Ele procurou esse caminho. Pense que
talvez essa seja a maneira que a vida
encontrou para fazê-lo refletir sobre seus
atos e, quem sabe, mudar o rumo da sua
vida. Ele é moço, depois de resolver seu
caso com a justiça, mais amadurecido,
terá chance de recomeçar e seguir um
caminho melhor.
_ Tem razão. Assim que Wagner chegar
irei para a casa. Sei que você vai estar
ocupado, mas, por favor, assim que puder
me telefone.
_ Pode deixar.
Paulo desligou o telefone e juntou-se à
equipe que estava se preparando para
entrar em ação.
Vitório. Chegou, em casa e encontrou o
pai na sala, lendo. Vendo-o entrar.
Alberto fechou o livro:
_ Eu já jantei. Não o esperei porque não
posso comer muito tarde. Não me faz
bem. Você já jantou?
_ Não, mas estou sem fome. Na casa de
Marília estamos sempre comendo uma
coisa ou outra. Tudo o que fazem é uma
delícia.
_ Você não pode ficar beliscando dessa
forma. Tem de alimentar-se melhor.
_ Na verdade eu me alimentei muito bem.
Não se preocupe. Vou para o quarto, mas
voltarei em seguida. Quero conversar com
você.
Alberto fixou-o sério. Desde que soubera
das atividades de Osmar ele temia ouvir
as notícias. Sentia que chegaria uma hora
em que seu filho teria de ser
responsabilizado pelo que estava fazendo
e temia esse momento. Mas como Vitório
não disse mais nada ele guardou silêncio,
olhando-o com ar de preocupação!
Vitório foi para o quarto, sentou-se na
cama, fechou os olhos, colocou a mão
direita na testa, procurando concentrar-
se. Pensou em Analú, pedindo-lhe que o
ajudasse nessa hora.
A idéia de que Osmar seria preso o
deixava triste. Naquele momento, sentiu
que, apesar dos desentendimentos que
sempre houve entre eles, nunca lhe
desejara mal.
A idéia de vê-lo preso, humilhado, sendo
tratado como um bandido o fazia sofrer.
Não era só o sofrimento dos pais que o
incomodava, mas também o de Osmar.
Como ele enfrentaria a prisão?
Ele sempre fora arrogante, vaidoso,
julgava-se superior em inteligência e em
tudo o mais. Como ele reagiria?
Temia que se descontrolasse, não
quisesse aceitar a prisão, tentar fugir ou
cometesse alguma besteira.
Vitório tentou reagir. Ele precisava
controlar esses pensamentos e tentar o
contato com os espíritos iluminados.
Sabia que só conseguiria isso se
conseguisse entrar em uma energia
melhor.
Procurou entrar em seu coração, ficar no
bem e manter um sentimento amoroso.
Mentalizou Osmar e então brotou uma
ternura em seu interior, um sentimento
de amizade por ele como nunca sentira
antes e uma vontade muito grande de
ajudá-lo, de fazê-lo compreender que
precisava assumir seus erros, enfrentar
os resultados de seus atos para poder se
recuperar.
Teve vontade de empenhar-se para
conseguir que Osmar entendesse isso.
Conseguiria que ele o ouvisse?
Nesse instante, Vitório viu o espírito de
Analú na sua frente, olhando-o com
carinho. Não se conteve:
_ Analú. Você veio!
_ Eu estava aqui mesmo antes de você
chegar, mas só agora você melhorou suas
energias e pôde me ver.
_ Quero pedir-lhe que me ajude a
conversar com meu pai sobre Osmar.
_ Você colocou seu amor sobre Osmar.
Faça isso com seu pai. Essa é sua maior
força. Com ela você vencerá todos os
problemas.
_ Eu não sabia que gostava de meu irmão.
Nós nunca nos entendemos bem.
_Os laços que os unem são antigos. Antes
dos acontecimentos que provocaram seus
desentendimentos vocês se estimavam.
_ O afeto que estou sentindo por ele me
surpreendeu muito.
_ Quantos segredos ainda estão
guardados em seu coração? Quantas
passagens de outras vidas continuam
influenciando vocês até hoje?
_ É verdade. Por que não me conta tudo o
que aconteceu naquele tempo?
_ Prometo que voltarei para contar-lhe.
Mas ainda não é o momento. A
tempestade continua em andamento.
Quando ela passar, prometo esclarecer
todas as dúvidas.
_ Ajude-me a dar a notícia a meu pai.
Receio por sua saúde.
_ Pense nele com carinho e deixe seu
coração falar. Estou certa de que saberá
fazer isso muito bem. Vá! E, não tema
saiba que estarei ao seu lado.
Ela desapareceu, Vitório respirou fundo e
pensou no pai. Uma onda de carinho o
acometeu e ele levantou-se indo à sua
procura.
Uma vez na sala, sentou-se no sofá, ao
lado dele, dizendo:
_ Precisamos conversar.
Alberto olhou-o preocupado:
_ É sobre o Osmar?
_É. Como você sabe, ele sempre foi
ambicioso, desejou ter muito dinheiro,
poder por causa disso se iludiu. Não teve
a sua paciência. Acreditou que poderia
conseguir rapidamente o que desejava e
entrou em um caminho perigoso.
Alberto suspirou triste:
_ Foi por causa da insensata paixão que
ele tem por Aurélia. Ela nunca o amou,
mas ele pensou que se fosse um homem
importante, tivesse muito dinheiro e
poder, a conquistaria. Ele mesmo me
disse isso.
_ Essa ilusão o arrastou para a desgraça.
_ Traficar drogas é o que se pode chamar
de pior. Ele não pensou na desgraça que
estava espalhando, na dor das famílias
que têm um viciado em casa. Passou por
cima de tudo, alimentando sua ambição,
esquecendo-se de todos os ensinamentos
com os quais foi educado. Pensando
nisso, sinto-me derrotado, fracassado
como pai. Eu não fui capaz de perceber
nada nem de inspirar-lhe um
comportamento melhor.
_ Você não tem culpa de nada. Ele fez isso
sozinho.
_ Mas dói muito saber que ele vai ter de
pagar elevado preço pelo seu erro.
Vitório colocou a mão no braço do pai
dizendo com voz suave:
_ A vida vai responder a ele de acordo
com suas atitudes. Nós que amamos não
desejamos que ele sofra. Mas, pai, de que
outra forma ele poderia aprender, senão
respondendo pelo que fez? O remédio
pode ser amargo, mas lhe dará chance de
curar-se.
_ Pressinto que algo ruim vai acontecer
com ele. Você sabe como vão as coisas?
_ Há essa hora, Paulo está com o
delegado participando de uma diligência
para prender os traficantes envolvidos
naquele crime.
_ E Osmar está envolvido?
_ Está. O nome dele figura com os
traficantes e o delegado acredita até que
Osmar involuntariamente tenha sido o
causador dessa desgraça!
Alberto levou a mão à cabeça:
_ Meu Deus! Será possível?
_ Ele colocou Elvira naquele sanatório
com medo que ela contasse o que sabia
sobre o envolvimento dele com os
assassinos.
_ O que vai acontecer agora?
_ Bem, o delegado expediu uma ordem de
prisão para Osmar e nesta noite mesmo
ele vai ser preso.
Alberto levantou-se nervoso:
_ Era isso que eu temia!
Vitório puxou-o pelo braço, forçando-o a
sentar-se novamente.
_ Não podemos perder o controle. Agora
temos mais do que nunca enfrentar essa
situação com coragem.
_ Meu filho preso! Que vergonha. Ele que
sempre foi o meu orgulho, vai ser
humilhado, escarnecido, olhado como um
bandido!
As lágrimas rolavam de seus olhos e ele
deixou-as cair, sentindo-se impotente.
Vitório colocou o braço sobre os ombros
dele, dizendo:
_ Reaja, pai. Não se deixe levar pelo
desespero. Nós temos de ser firmes,
corajosos, olhar o que aconteceu de
maneira realista.
_ Nada pode ser mais real do que isso! A
desgraça chegou e não podemos fazer
nada contra ela.
_ Você está sendo pessimista. Vamos
olhar os fatos de outra forma.
_ Como não ser pessimista diante de uma
situação como essa?
_ Eu não vejo assim. Eu não estou
contente com o que está acontecendo,
mas prefiro olhar de forma diferente.
Quem nos garante que a humilhação da
prisão, o sofrimento a que Osmar deverá
passar, enfrentando essa vergonha, não o
levará a refletir melhor sobre seus atos?
Vendo revelado um lado seu que ele quis
ocultar, descobrirá que não é tão
"esperto" como se julgava e chegará à
conclusão de que é muito perigoso
enveredar por esse caminho. Esse poderá
ser o começo da sua recuperação.
_ Será muito doloroso.
_ O que mais ele poderia esperar depois
do que fez? Temos que apoiá-lo com
carinho, mas com firmeza, porque é
fundamental que ele assuma o que fez.
Sinta o alcance de seus atos e isso não
seremos nós que vamos fazer, mas a vida
que já está fazendo. Faremos tudo para
ajudá-lo, porém não vamos intervir nos
fatos que estão acontecendo, tentando
camufla-los, torcendo-os de forma a que
Osmar continue se iludindo. À hora da
verdade chegou e vamos aceita-la com
dignidade e vontade de daqui para frente
fazer nosso melhor.
_ Eu penso como você. Nunca imaginei
que me daria tanto apoio nesta hora
difícil. É que eu não sabia que você era
tão lúcido e bondoso. Não sei o que faria
neste momento sem seu apoio.
_ Eu estarei sempre ao seu lado. Os
traficantes serão presos. Tenho certeza
de que mamãe logo estará de volta.
_ Como estará ela? Como reagirá ao saber
que Osmar vai ser preso?
_ Ela foi a primeira saber sobre ele. Elvira
contou. Mas estou certo de que ela
também se juntará a nós para ajudar
Osmar e faze-lo entender como retomar o
caminho do bem.
_ É verdade. Isso! É bem dela. Dedicada,
mas digna.
_ Nós estamos sentindo muita falta dela e
eu imagino que ela também sente
saudades de nós.
_ De vocês talvez, mas de mim...
_ Por que duvida do amor dela?
_ Porque eu, muitas vezes, revoltado com
a indiferença dela, envolvi-me com outras
mulheres, mais para provocá-la do que
por desejo, e ela sempre soube. Há muito
tempo ela deixou de me amar, se é que
algum dia sentiu amor por mim.
Vitório olhou-o sério e respondeu:
_ Você pode estar muito enganado. Mas
mesmo que seja verdade o que diz! Você
poderá tentar reconquistá-la, reacender a
chama que lhe parece extinta.
Alberto meneou a cabeça negativamente:
_ Não creio...
_ Acredite, quando ela voltar, não perca
tempo. Jogue seu charme sobre ela, com
o amor que tem no coração. Estou certo
de que ela não vai resistir.
Alberto sorriu:
_ Em uma hora dessas!Você consegue me
fazer sorrir.
_ O que estou dizendo é verdade. Sinto
que depois de tudo quanto estamos
passando, merecemos um pouco de
felicidade.
Alberto suspirou e disse:
- Felicidade! Há quanto tempo não sei o
que é isso.
_ Sinto que depois do que estamos
passando, nenhum de nós será o mesmo.
Todos nós estamos aprendendo e
refletindo, percebendo emoções e
necessidades que antes não víamos e
jogando fora crenças inúteis que
colecionamos durante toda a vida e que
agora sabemos que não são verdadeiras.
_ Por que diz isso?
_ Porque estamos amadurecendo e
abrindo a mente, revendo nossos
conceitos de felicidade. Você teme que
mamãe não o ame mais, porém eu penso
o contrário. Vocês viveram mais de trinta
anos juntos, trocando experiências,
vivendo momentos que hoje, diante da
situação atual, revestem-se de outra
conotação e são mais valorizados. Eu
testemunhei desde que nasci o respeito
que demonstram um pelo outro, a
atenção, a amizade com que se tratam.
Para mim, isso é uma forma de amor
verdadeiro e sincero.
Alberto cerrou os olhos, pensativo. De
fato, se Teresa não tivera para com ele
arroubos apaixonados como ele gostaria,
sempre fora atenciosa, cuidando do seu
bem-estar, tratando-o com deferência.
Não seria essa uma forma de amor? Mas
não era apenas isso que ele desejava.
Queria mais.
Durante aqueles anos sonhara em tê-la
em seus braços ardente, apaixonada,
oferecendo-lhe todo o amor de que ele a
imaginara capaz. Ele sentia que Teresa
era uma mulher ardente. Por que ele não
tinha conseguido despertar nela essa
emoção?
_ Eu casei com Teresa por amor. Amizade
é um belo sentimento, mas não é o que eu
desejava que ela me oferecesse. Nunca
notei nela o fogo da paixão.
Vitório colocou a mão no braço do pai e
respondeu:
_ Uma intimidade de tantos anos deve
ter-lhe dado inúmeras oportunidades de
acender nela o fogo da paixão. Alguma
vez tentou ir por esse caminho?
Alberto olhou-o surpreendido, pensou em
pouco e depois tentou justificar-se:
_ Teresa sempre foi uma mulher discreta,
nunca conversamos sobre nossos
sentimentos íntimos.
_ Será que ela não pensou o mesmo de
você? Será que ela não imaginou que
você não a amasse o bastante e guardou
seus sentimentos, respeitando sua
maneira de ser?
_ Você acha mesmo isso?
_ No amor é preciso ousar, falar o que vai
do coração. Não dá para ficar imaginando
coisas no comportamento do parceiro,
sem saber se são verdadeiras, criando
barreiras que distanciam um do outro.
Alberto olhou Vitório surpreendido:
_ Como pode saber dessas coisas? Você
nunca se apaixonou!
_ Para valer mesmo, não. Mas tive
algumas paixões que logo passaram,
mostrando que não eram para ser levadas
a sério. Mas quando eu de fato amar
alguém, ousarei demonstrar todo o meu
amor. O amor é contagiante. Estou certo
de que vai atar esse fogo que você diz.
_ Gostaria de ver isso. Osmar não
conseguiu nada com Aurélia. Por que
pensar que com você será diferente?
_ O que Osmar sente por Aurélia é paixão,
não amor. São sentimentos diferentes.
_ Como assim?
_ Osmar gosta de Aurélia por seu porte
altivo, o carisma e a posição social que
ela ocupa. É o que ele deseja ter para si, e
como não consegue, projeta seus
sentimentos sobre ela, acreditando que
se conquista-la terá tudo isso. Deseja
apossar-se dela, isso é apego. O amor é
um sentimento diferente, não faz sofre.
Se for correspondido é maravilhoso, mas
se não for, satisfaz-se com a felicidade de
ser amado, contentando-se em cultivar
esse amor no coração.
_ Acho que eu nunca senti esse tipo de
amor.
_ Será que não? Depois que mamãe
desapareceu; você tem sofrido muito e eu
notei que há em seu coração um amor
sincero muito verdadeiro e talvez você
ainda não tenha se dado conta disso.
_ De fato. Sinto muitas saudades de
Teresa. A vida para mim tornou-se sem
sentido com sua ausência.
_ O que fará quando ela voltar? Vai
continuar escondendo seus sentimentos
ou vai mostrar-lhe o quanto à ama?
_ Tenho medo de que ela me despreze. É
uma mulher altiva e eu sempre procurei
mostrar-me a sua altura.
_ Você está enganado. Mostrar um
sentimento sincero jamais vai provocar
desprezo. Ao contrário, vai tocar as fibras
mais íntimas do coração dela. E quem
sabe o que poderá vir à tona depois?
Os dois continuaram conversando como
nunca tinham feito. Naquele momento
não eram apenas pai e filho, eram dois
homens, discutindo sentimentos de igual
para igual, estabelecendo laços de
intimidade indestrutíveis de espírito para
espírito".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 26
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Osmar chegou a casa, incomodado por
um sentimento depressivo e angustiante.
Ao comparecer em um restaurante
elegante para almoçar com um cliente
importante, tivera o desprazer de
encontrar Aurélia naquele local,
acompanhada pelo seu rival.
Ela estava tão entretida com ele, que nem
notou sua presença, apesar de Osmar tê-
la olhado com insistência, tentando ser
visto.
Ele marcara esse encontro para resolver
um negócio importante, mas foi-lhe difícil
concentrar a atenção no assunto,
porquanto não conseguia desviar o olhar
dos namorados e quanto mais olhava
mais nervoso ficava.
Indiferente ao que acontecia, o jovem
casal se entretinha em demonstrações de
carinho, sem perceber que Osmar estava
ao lado, sofrendo, tentando conter a
raiva, desejando prestar atenção ao que
seu parceiro dizia, sem nenhum interesse.
Esqueceu-se de tudo o que tinha
planejado para fechar aquele negócio e,
por fim, o cliente despediu-se sem
efetivar o projeto.
Osmar foi para a empresa, irritado.
Durante toda à tarde.
Continuou sentindo uma desagradável
sensação de fracasso que o deixou
deprimido e inquieto.
Ele não estava habituado a perder. Não
podia aceitar que Aurélia não lhe desse,
atenção. Precisava fazer alguma coisa
para acabar com aquele namoro.
Norberto não tinha conseguido nada
contra o médico. Tentara de várias
formas, envolvê-lo, armando ciladas, mas
o rapaz era esperto e saia-se bem de
todas elas, conservando-se neutro, não
entrando em situações novas.
O Dr.Augusto Mendonça sabia o que
queria e agia de maneira firme, clara, não
deixando um ponto fraco que Norberto
pudesse explorar.
Osmar não continha a impaciência. Não
era possível existir alguém que não
tivesse um ponto fraco, ao que Norberto
respondia:
_ Pois ele é assim. Escorrega de todas as
situações com classe, sem se envolver.
Nunca vi um cara igual a esse.
Essa superioridade do rival deixava
Osmar mais nervoso, levando-o a ter
vontade de cometer uma loucura.
Imaginava procura-lo pessoalmente na
calada da noite e dar-lhe um tiro. Há
custo conseguia conter esse impulso.
Nora, vendo-o entrar em casa, perguntou
se podia servir o jantar. Ele não estava
com fome e preferiu servir-se de uma
bebida, depois, sentou na sala, pensativo.
Não podia tirar da sua mente as cenas
que presenciara no restaurante: Aurélia
amável, acariciando o rosto do rival,
segurando sua mão com os olhos
brilhantes, e os beijos, que o médico dava
na mão dela, enquanto seus olhos se
encontravam com amor.
Osmar levantou-se e começou a andar
nervoso pela sala. Pela primeira vez
questionou sua paixão por Aurélia. Por
que não podia tirá-la de sua cabeça? Por
que se apegara a ela que nunca lhe dera
valor?
Quanto mais se questionava, mais
aumentava o medo de perdê-la. Era uma
loucura. Por causa desse amor envolvera-
se em coisas perigosas que custara a vida
de sua mãe.
Não se sentia culpado pelo
desaparecimento ou pela morte dela.
Afinal, por que ela fora fazer aquela
malfadada viagem sem o marido?
Estava tão entretido em seus
pensamentos que não ouviu a campainha
tocar. Pouco depois, Nora, toda
assustada, introduziu na sala dois
homens desconhecidos e só então Osmar
se deu conta e perguntou:
_ Quem são os senhores, o que querem
aqui?
Um deles exibiu as credenciais de policial
e perguntou:
_ O senhor é o Dr. Osmar Borges de
Azevedo?
_ Sim. O que desejam?
_ O senhor está preso e deve nos
acompanhar até a delegacia.
Osmar estremeceu:
_ Preso?! Eu? Sob que acusação?
_ Tráfico de drogas.
_ Os senhores estão enganados. Não pode
ser. Sou um empresário, um homem de
bem.
_ Não há nenhum engano – respondeu o
outro. _ Temos aqui a ordem de prisão. O
senhor tem o direito de ficar calado, mas
é obrigado a nos acompanhar.
Osmar pensou em resistir, mas depois
achou melhor contemporizar:
_ Está bem. Eu os acompanho. Estou certo
de que logo tudo será esclarecido.
Osmar vestiu o paletó e o policial
estendeu as algemas. Ele protestou
assustado:
_ Não é preciso fazer isso comigo. Não
sou um bandido. Vou de boa vontade.
_ Sinto muito, mas terei de algemá-lo. É
de praxe.
Osmar ainda tentou resistir, mas foi
inútil. Diante dos olhos apavorados de
Nora, os policiais algemaram Osmar e o
levaram para a viatura.
Assustada, Nora imediatamente ligou
para Alberto em São Paulo. Vitório
atendeu e ela contou o que tinha
acontecido e finalizou chorando:
_ O Dr. Osmar saiu daqui algemado. Estou
com medo. Vocês precisam voltar.
_ Acalme-se. Vou ligar para nosso
advogado tratar do caso. Vou falar com
papai e voltarei a ligar para você.
Vitório desligou o telefone preocupado.
Apesar de saber que isso iria acontecer, a
notícia o abalou. Alberto, que estava ao
lado, indagou:
_ Aconteceu o que temíamos?
_ Sim. Osmar foi preso. Nora pediu que
fôssemos para lá, ajudá-lo. O que acha?
_ Ligue para o Dr. Nunes e lhe conte o
que aconteceu. Peça-lhe para ir
imediatamente ver o que pode ser feito. É
melhor voltarmos para o rio hoje mesmo.
_ Está bem. Enquanto você e Dinda
arrumam à bagagem, vou ligar e
conversar com Paulo.
Ele ligou, mas Paulo não estava. Então se
lembrou de que ele tinha acompanhado o
delegado para surpreender e prende os
traficantes.
Desistiu de falar com ele. Tentou
conseguir passagens de avião, mas não
conseguiu. Apesar da vontade de Alberto
de viajar o quanto antes, eles foram
forçados a esperar pela manhã seguinte.
Monteiro tinha feito todo um plano para
efetuar a prisão de Gil Duarte. Há tempos
seus colegas que trabalhavam na área de
drogas conheciam não só a periculosidade
dessa quadrilha como o mal que eles
causavam, distribuindo drogas no Brasil
inteiro e no exterior.
Mas não conseguiam provas para prendê-
lo. Gil Duarte mantinha uma empresa de
cosméticos, intitulava-se importador e
exportador de mercadorias e sua
documentação era legal. Contudo, a
polícia sabia que ele era um dos maiores
traficantes do país.
Monteiro unira-se aos companheiros
dessa área, e analisando as provas que
possuíam, conseguiram o mandato de
prisão.
Gil freqüentava um clube de futebol
famoso onde era muito popular, e
adorava teatro. Era figura constante na
vida noturna de São Paulo onde
comparecia ao lado da mulher e de dois
seguranças.
Ele morava em uma linda casa no bairro
do Morumbi, cercada de muros altos, com
uma guarita na frente da entrada, onde
sempre ficava um dos seus homens.
A polícia sabia que na casa de Gil todos os
seus empregados eram homens da sua
quadrilha e por esse motivo programaram
prende-lo fora dali, quando saísse.
Eles armaram o cerco sem despertar
suspeitas no homem que vigiava a casa.
Alguns policiais estavam à paisana e
colocaram seus carros bem situados de
modo a observarem tudo. Ficaram se
comunicando pelo rádio.
Monteiro, ao lado de outros policiais,
esperava escondido dentro do carro com
as luzes apagadas. Paulo estava com eles.
A polícia queria evitar confronto,
porquanto sabia que estavam armados e
eram homens perigosos que não
hesitariam em atirar para matar.
Em silêncio eles esperavam. A noite
estava escura e a iluminação das ruas era
fraca em razão das árvores que
bloqueavam a luz. Passava das vinte
horas quando o portão principal abriu e o
carro de Gil saiu. Dois homens sentados
na frente e o casal atrás.
Procurando não despertar suspeitas, os
carros saíram atrás, fazendo o mesmo
trajeto. Quando chegaram ao local que
tinham programado, eles bloquearam o
carro de Gil, que foi forçado a parar.
Monteiro apanhou o megafone e gritou:
_ Polícia! Desçam do carro.
Gil abriu o vidro da janela e disse:
_ O que está acontecendo?
Monteiro desceu acompanhado de dois
policiais de uniforme e aproximou-se de
Gil, enquanto mais dois desceram do
carro do outro lado armados, abordando o
motorista e seu acompanhante para que
entregassem suas armas.
Antes que Gil pudesse reagir, Monteiro
abriu a porta do carro e deu voz de
prisão. A operação foi muito rápida,
apanhou o traficante de surpresa e ele
não reagiu.
A operação fora um sucesso,
principalmente porque Gil não acreditava
que pudesse ser preso e contava sair
rapidamente daquela situação.
A certeza de sua impunidade o impediu
de reagir. O fator surpresa foi importante
para que a operação policial obtivesse
êxito.
Em vão, Gil tentou explicar a Monteiro
que ele era um cidadão honesto, um
empresário respeitado. Quando percebeu
que não conseguiria convence-lo,
começou a exigir a presença dos seus
advogados. Monteiro, porém, determinou
que só, permitiria chamá-los no dia
seguinte.
Gil queria saber qual era o motivo de sua
prisão e Monteiro lhe disse:
_ Você está preso por tráfico de drogas e
pelo assassinato de Otávio de Oliveira e
uma mulher cujo nome, ainda não pode
ser revelado.
Gil empalideceu e a partir daí decidiu não
dizer mais nada e só falar depois de
conversar com seus advogados.
Monteiro começou os interrogatórios, mas
todos eles se fecharam e recusavam-se a
falar.
Era madrugada quando Paulo, cansado,
mas satisfeito, voltou para a casa de
Marília. Wagner abriu a porta, Paulo
entrou.
_ E então? – indagou Wagner. _ Como foi?
_ Tudo bem. A operação foi um sucesso.
Gil Duarte e parte de sua quadrilha está
presa. Os outros, a polícia está
procurando para prender.
_ Quero saber todos os detalhes. Gostaria
de ter ido junto.
_ A tensão foi grande, mas não foi preciso
dar nenhum tiro.
_ Vamos para a cozinha. Dorita deixou
algumas coisas para comer.
_ Estou com fome, mas contente. Deu
tudo certo. Osmar foi preso no Rio e já
está a caminho de São Paulo.
Os dois foram para a cozinha, estavam
comendo quando Marilda apareceu:
_ Acordamos você! – tomou Paulo. _
Falamos alto demais.
_ Não foi isso. Eu estava nervosa e não
consegui dormir.
Paulo sorriu e abraçou-a feliz:
_ Ficou pensando em mim?
_ Sim. Estava com medo que lhe
acontecesse alguma coisa. A cena
daquele crime ainda não saiu da minha
mente.
_ Não se deixe envolver por ela. Não vale
a pena.
_ Está difícil. Sempre que estou com
medo ela reaparece em minha mente.
_ Quando acontecer, procure não dar
importância e lembrar-se de alguma coisa
boa para que ela vá embora. As
impressões foram muito fortes, mas
agindo assim você acabará por apagá-las
de sua lembrança.
_ Eu gostaria muito. Mas, me conte como
foi? Conseguiram prende-los?
Paulo ia falar, mas Dorita apareceu,
dizendo contente:
_ Eu não consegui dormir. Ouvi que você
chegou e desci. Que bom que estão aqui.
Parece que deu tudo certo!
_ Deu mesmo. Paulo vai nos contar como
foi – respondeu Marília.
Paulo contou tudo nos mínimos detalhes.
Sentia-se feliz por terem efetuado as
prisões sem maiores problemas. E
finalizou:
_ Penso que até agora Gil Duarte, o chefe
da quadrilha, não acreditou que ficaria
preso. Não esboçou nenhuma reação.
Preferiu continuar representando o papel
de empresário honesto, boa gente,
personagem com o qual ele tem
ludibriado as autoridades até hoje.
_ Mas ele tem dinheiro, bons advogados e
as leis oferecem muita chance de
recursos que acabam levando à
impunidade. Não há o risco de ele livrar-
se da prisão? – indagou Marília
preocupada.
_ Desta vez, não. Antes nós não tínhamos
provas concretas contra ele. Agora temos.
O testemunho de Elvira será muito
convincente. Depois, espero que Teresa
apareça. Se como eu penso ela está
escondida com medo deles, quando
souber da prisão vai sentir-se segura e
voltar para casa. Ela também poderá
testemunhar contra eles. Há também o
motorista do táxi que as levou até a casa
do crime.
_ Você acha mesmo que ela está viva? –
perguntou Dorita. _ Será que eles não a
mataram também?
_ É uma possibilidade. Eles mataram
aquela mulher pensando que fosse
Teresa. O mais provável é que ela esteja
escondida com medo deles. Esta noite
mesmo Monteiro começou os
interrogatórios, ele vai apertar e alguém
vai acabar falando.
_ Quem será a mulher que foi morta no
lugar de Teresa? – desta vez foi Wagner
quem fez a pergunta.
_ Ainda não sabemos. Talvez Teresa
tenha a resposta. Por enquanto
precisamos esperar. Mas o pior já passou.
Eu sinto quando um caso está sendo
concluído. Para mim, dentro de mais
alguns dias tudo estará resolvido.
Eles continuaram conversando até o dia
clarear. Depois, Paulo ligou para Vitório
conforme tinha prometido.
Ele atendeu ao primeiro toque, o que
mostrou que ele também não tinha
conseguido dormir.
_ Está tudo bem, Vitório – disse Paulo. _
Deu tudo certo, estão todos presos.
_ Como você nos avisou, eles prenderam
Osmar no Rio de Janeiro. Eu e papai
queremos ir para lá e saber o que está
acontecendo. Só não fomos ontem porque
não consegui as passagens.
_ Vocês não devem ir. Osmar está sendo
trazido para São Paulo. É aqui que ele vai
ter que ficar.
_ Vou informar o nosso advogado. Você
compreende. Apesar do que ele fez, nós
não podemos deixar de ajudá-lo nessa
hora.
_ Ele vai precisar mesmo de um bom
advogado. Eu conheço um ótimo
criminalista aqui. Se desejarem, posso
indicá-lo.
Vitório suspirou triste e respondeu:
_ Obrigado. Falarei com papai. Ele está
arrasado. Mas apesar de tudo, nosso
dever é ajudar Osmar e desejar que a
dura lição tenha lhe ensinado alguma
coisa melhor.
_ Faço votos que seja assim. Saiba que
pode contar comigo para tudo o que
precisar.
_ Papai vai querer ir à delegacia e falar
com Osmar. Acha que vai ser possível?
_ Não sei se eles já chegaram. Monteiro
foi para casa de madrugada e deve ter
deixado todos incomunicáveis. Vocês não
vão conseguir conversar com Osmar. Vou
descansar um pouco e logo depois do
almoço, se quiserem, poderei ir até lá
com vocês. Monteiro já estará na
delegacia e tudo será mais fácil.
_ Está bem. Explicarei tudo a papai e
ficaremos esperando que você ligue para
irmos juntos. O nosso advogado é da área
trabalhista e acho melhor chamar esse
que você disse que é bom.
_ É o mais sensato. Anote o telefone.
Paulo deu as indicações e desligou,
prometendo encontrar-se com eles no
começo da tarde para irem juntos à
delegacia. Depois de colocar Marília a par
do que pretendia fazer, Paulo finalmente
foi para o quarto de Altair dormir.
Assim que Osmar foi levado à delegacia,
no Rio de Janeiro, ficou sabendo que
deveria viajar imediatamente para São
Paulo. A fisionomia indiferente dos
policiais, os olhares maliciosos das
pessoas presentes na delegacia, à
insistência de dois repórteres em
fotografá-lo, embora ele tentasse abaixar
a cabeça, irritaram-no muito.
Era humilhante ser tratado dessa forma,
estar algemado, ser conduzido por dois
policiais um de cada lado segurando seu
braço, indiferentes aos seus sentimentos,
como se tudo aquilo fosse normal. Aquilo
não podia estar acontecendo com ele.
Alguma coisa estava errada. Eles não
podiam ter feito isso, dessa forma.
Ao pensar que no dia seguinte suas fotos
poderiam estar no jornal como um
bandido, serem vistas por seus amigos e
conhecidos, inclusive por Aurélia, ficava
apavorado. Isso não era justo. Ele não
matara ninguém. Querer ganhar dinheiro,
ser rico, não era crime.
O mundo estava cheio de gente que
enganava a justiça, enriquecia e vivia
muito bem. A culpa do que estava lhe
acontecendo era do pai que tinha feito à
loucura de gastar o dinheiro com o qual
ele contava para pagar aquela dívida.
Sentado no banco traseiro, algemado, no
meio de dois policiais, que conversavam
entre si alegremente como se ele não
estivesse ali, Osmar tentava encontrar
uma forma de reverter à situação.
Tinha esperança de que quando chegasse
a São Paulo, o pai já o estivesse
esperando com um bom advogado. Ele
não pudera comunicar-se com ele para
contar o que estava acontecendo, mais
imaginava que Nora tivesse ligado
relatando que ele foi preso!
Certamente, o pai não o deixaria passar
por esse vexame e faria tudo para libertá-
lo. Ao mesmo tempo, tentava encontrar
uma explicação para fazer o pai acreditar
que ele era inocente. Apesar de saber que
Alberto era muito exigente em questões
de honestidade, contava em poder
ludibriá-lo com facilidade. Afinal, era seu
pai, sempre o apoiara e o amava. Isso
seria suficiente para desejar que ele não
ficasse preso.
O maior receio era que Nelsinho, que fora
preso no sanatório quando levaram
Elvira, desse com a língua nos dentes. Ele
era covarde. Se o apertassem um pouco,
não resistiria. Se ele revelasse alguma
coisa que o incriminasse, poderia negar e
seria sua palavra contra a dele. Claro que
a sua teria maior credibilidade. Nelsinho
sempre vivera à margem da Lei, enquanto
ele era empresário respeitado,
conceituado.
Quando a viatura chegou a delegacia de
São Paulo, eles desceram e entraram.
Osmar olhou em volta, esperando ver o
pai, mas não o encontrou. O dia estava
amanhecendo e só dois policiais, com cara
de sono, os receberam.
Eles conversaram e Osmar pediu:
_ Tirem as algemas. Preciso telefonar.
Um deles olhou-o como se ele estivesse
pedindo alguma coisa impossível e
respondeu:
_ Telefonar só quando o Dr. Monteiro
chegar.
_ Eu preciso avisar meu pai e falar com o
advogado.
_ Não posso fazer nada. Fale com o
delegado quando ele chegar.
Por mais que Osmar insistisse, não
conseguiu ser atendido. Foi levado por
um corredor, passaram por uma porta
onde havia dois policiais armados
montando guarda e o levaram para uma
cela que estava vazia. Em frente tinha
outra onde estavam algumas pessoas
deitadas em colchonetes e duas nas
camas.
O cheiro era muito desagradável e Osmar
conteve a respiração, tentando evitar
senti-lo. Quando abriram à porta e o
empurraram para dentro da cela, Osmar
revoltou-se e gritou:
_ vocês não podem fazer isso comigo! Eu
sou um empresário. Um homem de bem.
Quero falar com meu advogado. Não
quero ficar aqui!
Os dois policiais não responderam.
Limitaram-se, a sorrir e a trancar a porta.
Depois, foram embora.
Osmar olhou a cama estreita que estava
coberta por um cobertor pequeno e
escuro e tinha um travesseiro, cuja
fronha desbotada de cor indefinível
inspirou-lhe aversão. Decidiu permanecer
em pé. Ele não se deitaria naquela cama
grosseira e mal cheirosa.
Os outros presos o olhavam com
curiosidade, e Osmar encolheu-se em um
canto, procurando ignorar aquele lugar
horrível. Por mais que tentasse, essa era
a sua realidade naquele momento.
Ele sentia-se impotente naquela hora,
mas ainda esperava que o pai aparecesse
e tirasse-o dali."

"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 27
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"Teresa acordou cedo e saiu para comprar
pão. Ao passar na banca de jornal
deparou com a manchete:
"Presa quadrilha de traficantes. A polícia
suspeita, que dois deles foram
responsáveis pelo assassinato de Otávio
de Oliveira, e, da misteriosa, mulher, cuja
identidade até agora não foi comprovada.
Parabéns ao delegado Monteiro e seus
homens que com inteligência prenderam
essa perigosa quadrilha sem um tiro
sequer. Pág. 3".
Imediatamente ele comprou o jornal e até
se esqueceu de comprar o pão; voltou
para a casa, sentou-se, e procurou a
reportagem.
Numa das fotos ela reconheceu Gil
Durante e um ele seus homens; mais
abaixo uma foto de Osmar algemado fez
seu coração bater mais forte.
Seu filho estava preso! Logo ele, sempre
tão altivo e orgulhoso, ali, de cabeça
baixa, envergonhado, querendo esconder
o rosto. Apesar disso, ela o teria
reconhecido de qualquer jeito. Leu que
Osmar fora preso no Rio de Janeiro e
trazido para São Paulo.
Estava na hora de ela voltar. Procurou um
telefone e ligou para sua casa. Nora
atendeu e ela disse logo:
_Nora, sou eu, Teresa.
_ Deus seja louvado! Dona Teresa, que
bom, a senhora está viva!
_ Estou. Quero falar com Alberto.
_ Aqui não tem ninguém, o Dr.Alberto e o
Vitório estão morando em São Paulo
desde que tudo isso começou. Disseram
que só voltariam para casa quando
soubessem o que aconteceu. Todos nós
ficamos muito preocupados com o seu
desaparecimento e ainda essa mulher que
apareceu, igualzinha a senhora. Foi o
Vitório e a Dinda que descobriram a
verdade. Onde a senhora está?
_ Em São Paulo. Dê-me o endereço e o
telefone de onde Alberto está.
Nora obedeceu, ela agradeceu e desligou.
Depois ficou pensando no que fazer.
Talvez fosse melhor preveni-los, ligar
antes de ir até o apartamento.
Ligou e Dinda atendeu. Teresa disse logo:
_ Dinda, sou eu. Estou bem.
_ Teresa! Você nos matou de susto.
Ninguém nesta casa tem conseguido
dormir depois daquele crime horrível.
_ Eu não podia voltar. Depois eu lhe conto
tudo. Agora quero falar com Alberto.
Osmar está preso.
_ Foi ontem à noite. Hoje, o Sr.Alberto
saiu cedo com Vitório para falar com um
advogado. Depois iria para delegacia ver
se conseguiam falar com Osmar.
_ Nesse caso, não tenho alternativa, irei
agora mesmo a essa delegacia.
_ Não tem perigo aparecer lá?
_ Não. Eu não fiz nada de errado. Fiquei
escondida porque esses assassinos
queriam me pegar. Agora que foram
presos, não há perigo.
_ Não vejo à hora de tê-la de volta!
_ Eu também gostaria de estar em casa e
que nada
Disso tivesse acontecido. Mas ainda não é
hora de ficarmos em paz.
_ Você consegui, aqueles papéis que
desejava?
_ Não. Isso também está me
preocupando. Mas agora não dá para
voltar atrás. Seja o que Deus quiser.
Teresa desligou o telefone, arrumou-se o
melhor que pôde, colocou os documentos
de Renata na bolsa e foi para a delegacia.
O táxi deixou-a na porta. Ela desceu e
logo dois jornalistas a reconheceram.
Aproximaram-se tirando fotos e fazendo
perguntas.
Sem lhes dar atenção. Teresa entrou
rapidamente e foi falar com um policial:
_ Sou Teresa Borges de Azevedo. Vim
falar com o delegado.
Um burburinho correu logo pela
delegacia. Há custo os policiais
conseguiram afastar os repórteres,
prometendo-lhes conseguir o que eles
queriam mais tarde.
Doutor Júlio, o advogado, insistia para
falar com Osmar, mas Monteiro preferia
que ele esperasse um pouco, porquanto
havia três famosos criminalistas
insistindo para ver Gil Duarte, alegando
que ele era inocente; Monteiro queria
fazer um bom interrogatório antes de os
advogados conversarem com os presos.
Há custo conseguira tirar os três da sua
sala, afirmando que permitiria que eles
vissem os presos depois de tomar as
declarações de todos.
Os advogados protestavam. Queriam
assistir a esses depoimentos e se
recusaram a esperar. Os três tinham
saído para almoçar e voltaram em
seguida.
Monteiro concordou em falar com Alberto
e seu advogado. Estavam começando a
conversar quando o policial bateu na
porta da sala do delegado, que atendeu
com má vontade.
_ O que você quer? Não vê que estou
ocupado?
_ Tem uma mulher lá fora que diz se
chamar Teresa Borges de Azevedo. Não é
aquela que está desaparecida?
Antes que o delegado respondesse,
Vitório e Alberto saíram correndo à
procura de Teresa. O delegado e o
Dr.Júlio foram atrás.
Alberto ia, na frente, e a viu primeiro.
Correu para ela dizendo emocionado:
_ Teresa, você está viva!
Abraçou-a, e, Vitório, cuja emoção o
impediu de falar, juntou-se a eles no
mesmo abraço.
Os três tentaram segurar as lágrimas,
contudo não conseguiam. Abraçados, eles
não encontravam palavras para expressar
o que sentiam, recordando o que tinham
sofrido, temendo que nunca mais fossem
se encontrar.
Aquele era o momento tão desejado. Eles
sentiam a força do sentimento que os
unia.
Monteiro esperou que eles se
acalmassem. Alberto, abraçado a Teresa,
indagou preocupado:
_ Como você está?
_ Muito feliz por poder voltar para a casa,
mas ao mesmo tempo preocupada com o
Osmar e tudo quanto nos aconteceu.
Monteiro aproximou-se:
_ Sei que estão muito emocionados, mas
eu preciso conversar com a senhora. Há
muitos pontos obscuros que pretendo
esclarecer. Sei que só a senhora vai poder
fazer isso.
Teresa tentou controlar a emoção. Ela não
queria mais ficar guardando coisas do
passado que só lhe trouxeram
infelicidade. Tinha refletido muito e
chegara à conclusão de que se ela tivesse
sido sincera, contado tudo a Alberto, teria
evitado aquele crime e, pelo menos,
Renata não teria morrido daquela
maneira cruel.
Sua omissão custava uma vida e isso lhe
pesava na consciência, embora nunca
tenha imaginado esse desfecho tão triste.
_ Estou a sua disposição, doutor_
respondeu _ Vou contar-lhe tudo o que
sei. Desejo colaborar para que esses
assassinos fiquem presos durante muito
tempo. Quero ver Osmar, espero que o
senhor permita.
_ Ele juntou-se a perigosos traficantes.
_ Eu sei. E desejo que ele arque com as
conseqüências, dentro da Lei. Vai doer
muito, mas pretendo convencê-lo a deixar
esse triste caminho.
Pelos olhos de Monteiro passou um brilho
emotivo que ele procurou esconder ao
responder:
_ Estou certo de que a senhora terá força
bastante para reconduzi-lo à dignidade.
Vamos para a minha sala, tomar o seu
depoimento.
Todos acompanharam Monteiro que, na
porta de sua sala, disse:
_ A senhora pode entrar com o advogado.
Os outros ficarão esperando do lado de
fora.
Alberto protestou, mas foi forçado a
obedecer. Tanto ele quanto Vitório!
Desejavam ouvir o que Teresa tinha para
contar. Mas o delegado foi categórico:
_ Só ela e o advogado.
Eles entraram e a porta se fechou. Dois
policiais ficaram do lado de fora! Vitório
foi telefonar para a casa de Marília para
dar a boa notícia. Paulo ficou satisfeito
com a novidade e prometeu que logo mais
passaria na delegacia. Não era mais
preciso vigiar a casa. O perigo tinha
acabado.
Monteiro pediu a Teresa que se sentasse
diante dele, o escrivão estava à direita e
o Dr.Júlio à esquerda. Tudo pronto,
Monteiro começou a fazer as perguntas.
Teresa começou a falar, procurando não
se esquecer
De nenhum detalhe. Durante aqueles dias
de reflexão, ela tinha decidido que se
conseguisse voltar para casa, dali para
frente sua vida seria um livro aberto.
Não queria nenhum segredo. Ela tinha
agido errado e era justo que arcasse com
as conseqüências. Não teria moral para
exigir do filho o mesmo comportamento
se ocultasse seus erros.
Teresa desejava ser verdadeira, sentindo
que esse era o caminho para recuperar
sua dignidade. Se sua família a
condenasse ela teria de conforma-se e
seguir seu caminho. O mais importante
era sentir-se bem diante da própria
consciência.
Por esse motivo, começou seu relato
contando a paixão que tivera depois do
casamento. Não se poupou, foi o mais
verdadeira que pôde, emocionando os
presentes com sua sinceridade.
Depois, contou sobre a chantagem; a
venda das jóias; seu encontro com Elvira;
a idéia da viagem, passando antes por
São Paulo para entregar o dinheiro a
Otávio em troca dos papéis e das fotos
que a comprometia; a surpresa do
seqüestro; a descoberta de que Osmar
mantinha negócios com traficantes; a
carta que ela foi forçada a escrever para o
filho e por que Elvira foi levada com a
carta.
Falou sobre o medo de ser morta por ter
visto o rosto deles e poder identificá-los,
a vontade de fugir e como conseguiu
escapar.
Monteiro ouvia atentamente, admirando a
coragem dela, que falava com voz firme,
expondo os fatos com clareza. Teresa
prosseguiu, contando como chegou ao
centro da cidade, hospedou-se em um
hotel para pensar no que fazer. Como
ficou sabendo que lá havia uma hóspede
muito parecida com ela a ponto de as
pessoas, confundirem as duas.
A essa altura, Monteiro não se conteve:
_ A senhora nunca tinha visto essa
mulher?
_ Não, nunca. Para mim era uma
desconhecida, mas o fato chamou minha
atenção e quando fui ao refeitório
almoçar, eu a vi e me aproximei. Ela ficou
surpresa, disse-me que eu era igualzinha
sua mãe. Ficamos trocando informações
sobre nossa descendência e descobrimos
que não tínhamos nenhum laço de
parentesco. Ela pediu que eu sentasse em
sua mesa para almoçar, ficamos
conversando.
_ Quem era essa mulher?
_ Renata contou que era brasileira e foi
morar na Espanha, onde se casou. Viveu
lá durante vinte anos. Divorciou-se e
desiludida com o casamento voltou ao
Brasil. Havia chegado no dia anterior,
com pouco dinheiro e precisava trabalhar.
Teresa continuou contando que não sabia
do paradeiro de Elvira, mas supunha que
ela estivesse livre dos traficantes. Por ter
fugido dos seqüestradores estava com
medo de ir entregar o dinheiro ao
chantagista. Ofereceu dinheiro a Renata
para ir em seu lugar, certa de que não iria
desconfiar, uma vez que se pareciam!
Isto resolvido, elas iriam para a Europa e
depois que voltassem, ela conseguiria um
emprego na empresa do marido. Renata
aceitou.
A voz de Teresa só tremeu quando ela
começou a contar que ambas tomaram
um táxi, ela, envolta em um xale que
usava sempre quando saía a rua para não
ser reconhecida, Renata, segurando a
frasqueira, onde ela colocara o dinheiro.
Quando chegaram ao endereço indicado,
Renata entrou na casa e ela ficou
esperando no táxi. Pouco depois ela viu
chegar outro carro e os seus
seqüestradores desceram e também
entraram na casa. Teresa ficou com muito
medo, pediu para o táxi afastar-se e
parar na esquina. O motorista do táxi
queria ir embora, porém ela insistiu que
não podia deixar a amiga sozinha. Eles
viram quando os homens foram embora.
Ela esperou um pouco e, como Renata
não.
Voltava, caminhou até a casa ver o que
havia acontecido.
Teresa fez uma pausa. Sua voz morreu na
garganta e ela estava muito pálida. O
delegado deu-lhe um copo de água,
esperou que ela tomasse alguns goles, e
pediu:
_ Continue.
_ Bem, eu entrei e a sala estava escura.
Eu vi uma luz na outra sala e fui até lá.
Queria ver se encontrava Renata, mas o
que vi quase me fez desmaiar. Ela estava
na cama, morta, ao lado de um homem.
Minhas pernas tremeram e voltei à sala.
Apesar de muito nervosa, lembrei-me dos
papéis que me comprometiam. Tentei
encontra-los. Abri algumas gavetas, mas
não os achei. Eu estava muito nervosa. É
possível que eles estivessem lá, uma vez
que iam ser entregues após o pagamento.
Mas eu não estava em condições de ver
nada. Tremia, sentia que estava perdendo
as forças. Saí de lá correndo, deixei a
porta encostada. Cheguei no, táxi e disse
ao motorista que minha amiga já havia
ido embora. Não sei se ele acreditou.
_ Ele nos procurou e já fez seu
depoimento. Quando ele leu nos jornais a
notícia do crime, desconfiou da verdade.
_ Depois disso, tive mais medo ainda que
eles me encontrassem. Eles tinham
levado meus documentos para provar a
Osmar que eu estava em poder deles. Eu
fiquei sem documentos. Para o hotel eu
tinha usado meu passaporte. Então tive a
idéia de usar a identidade de Renata. Eu
estava sem roupa, minha bagagem e a de
Elvira tinham ficado com os traficantes.
Eu comprei dois vestidos, mas era pouco.
Eu sabia que Renata não voltaria. Assumi
a identidade dela, tentei igualar meus
cabelos com os dela e usando seus
documentos, instalei-me primeiro em
outro hotel, perto do aeroporto. Naquele
momento eu estava muito aflita sem
saber o que estava acontecendo com
minha família.
_ Porque não os procurou? Eles estavam
angustiados. Seu marido adoeceu.
_ Eu tinha medo de que se os traficantes
soubessem que tinham matado a mulher
errada, eles se voltassem contra Osmar e
o matassem. Eu queria que eles
pensassem que aquele corpo era o meu.
Teresa contou como alugara a pequena
casa e que quando lera os jornais,
relatando a prisão dos traficantes,
entendeu que era hora de voltar. E
finalizou:
_ Foi um tempo em que não vivi. Todos os
minutos eu questionei meu passado,
meus enganos, os problemas que minhas
atitudes trouxeram a mim e a minha
família. Sinto culpa pela morte de Renata.
Ao pedir-lhe que fosse em meu lugar
estava longe de imaginar que aqueles
homens iriam fazer o que fizeram. Já
refleti muito sobre isso e cheguei à
conclusão de que foi o destino quem
colocou aqueles homens perversos
naquela casa naquela hora. Penso que
eles não tinham nada a ver com meu
envolvimento com o chantagista. Nem
sabia que se conheciam. Não sei o que se
passou lá. O que sei é que Renata não
conhecia nenhum deles, nunca foi amante
do homem que morreu a seu lado. Não
consigo entender por que aqueles
homens apareceram lá exatamente
naquela hora. Se tivessem chegado
alguns minutos depois, ela teria
entregado o dinheiro, apanhado os
documentos e saído. Nada disso teria
acontecido.
Teresa se calou, tomou mais alguns goles
de água e Monteiro ficou pensativo,
alisando o queixo, tentando imaginar por
que eles teriam praticado aquele crime
tão cruel.
Depois de alguns minutos ele disse
- Eles mataram Renata acreditando que
fosse a senhora que os desfiou tendo
fugido. Eles não perdoam uma coisa
dessas. É demais para o orgulho deles.
_ Como eles poderiam saber que eu
estaria lá naquela hora?
_ Isso eles vão ter de nos dizer. O que
sei, é que Otávio, era o homem que a
chantageava era intermediário dos
negócios de droga. Ele agenciava
compradores para as partidas de droga
de Gil Duarte. Pode ser que ele tenha
aparecido naquela hora por outro motivo,
sem saber que a senhora ou sua sósia
estariam lá. Mas por alguma razão eles
estavam com muita raiva de Otávio. A
forma como o agrediram foi feroz.
O escrevente apresentou o depoimento, o
advogado leu e Teresa assinou. Depois, o
delegado disse:
_ A senhora pode ir, mas terá de depor
como testemunha contra os traficantes.
_ Pode contar comigo, doutor. Gostaria de
ver meu filho.
_ A senhora vai vê-lo, o Dr. Júlio também.
Gostaria que lhe dissessem que ele pode
melhorar suas condições diante da Justiça
se contar tudo o que sabe. Lamento dizer
que localizamos um depósito de drogas
do Dr. Osmar. Seu cúmplice, Nelsinho,
levou-nos até lá. Havia muita cocaína e
essa mercadoria foi comprada do Gil
Duarte e não está totalmente paga. Essa
foi à causa de eles irem à procura de
Otávio e terem seqüestrado a senhora.
Nos olhos de Teresa apareceu o brilho de
algumas lágrimas, mas ela controlou-se e
respondeu com uma voz que procurou
tornar firme:
_ A Justiça vai cobrar de Osmar o que ele
deve. É justo. Mas meu é inteligente.
Espero que ele reflita e perceba todo o
mal que fez a si mesmo quando escolheu
esse caminho.
Monteiro deu por terminado o
interrogatório e Teresa saiu,
acompanhada pelo advogado. Alberto e
Vitório a rodearam ansiosos.
_ E então?_ indagou Alberto
Foi o Dr. Júlio quem respondeu:
_ O depoimento de D.Teresa foi claro e
contundente.
Ela contou tudo de maneira muito
coerente. Eu não teria aconselhado
melhor senti que o delegado ficou bem
impressionado com a forma que ela se
comportou.
_ Eu disse o que sabia. – tornou Teresa,
com naturalidade, continuando: _ Nós
vamos ver Osmar agora?
_ É isso o que todos queremos. Ele deve
estar nervoso, sem saber que estamos
aqui – tornou Alberto.
_ Ele está preso desde ontem à noite –
esclareceu Dr. Júlio. _ Monteiro não tem
como nos impedir de vê-lo. Já teve tempo
de sobra para interrogá-lo sozinho. Vou
pedir que nos levem a ele agora.
O advogado afastou-se e Vitório disse,
alisando o braço da mãe:
_ Ainda bem que você voltou. Está mais
magra, deve ter sofrido muito, mas agora
estamos juntos e vamos vencer os
obstáculos.
_ O maior obstáculo será enfrentarmos
nossos medos – disse Teresa, pensativa.
_ Quem confia na vida sabe que todos os
acontecimentos, mesmo os ruins, são
para nos ensinar a achar um caminho
melhor – respondeu Vitório.
_ Tem razão, meu filho. Eu sofri, mas
amadureci. Aprendi muito durante esse
tempo.
Alberto a olhava com ternura, mas em
seus olhos havia certo receio. Percebia
que Teresa estava mudada. Estava mais
humana, perdera o ar distante dos
últimos tempos. Em que essa mudança
influenciaria suas vidas? Teria ela
refletido e chegado à conclusão de que
não valia mais a pena levar adiante um
casamento sem amor?
A esse pensamento Alberto sentia um
aperto no peito e uma vontade muito
grande de lhe perguntar, mas ao mesmo
tempo temia ouvir a resposta.
No momento, eles estavam preocupados
com Osmar, esse assunto ficaria para
mais tarde, quando pudessem pensar nos
dois, sem o peso da condenação de Osmar
que certamente viria.
Doutor Júlio voltou, acompanhado por um
policial, e informou:
_ O Dr. Monteiro pediu para irmos a uma
sala onde encontraremos o Dr. Osmar.
Com o coração aos saltos, eles
acompanharam o policial até a sala
indicada.
Teresa, emocionada, não via a hora de
abraçar o filho. Alberto procurava conter
a emoção. Ele, que sempre condenara as
manifestações emocionais, temia não
poder conter o pranto diante do filho.
Vitório era o mais sereno e lúcido. Ele
pretendia fazer o irmão sentir o carinho
que nutria por ele, apesar dos
desentendimentos que tiveram e dos
erros que ele cometera".

"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

CAPÍTULO 28
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO

"Eles entraram na sala. Osmar estava em
pé, olhando impacientemente para a
porta. Assim que os viu entrar, disse
nervoso.
_ Ainda bem que vieram. Pensei que
tivessem me esquecido. Eu quero sair
daqui o quanto antes.
Teresa aproximou-se dele dizendo:
_ Não está surpreso em me ver?
_ Não. A pouco quando me disseram que
você tinha voltado não acreditei. Estou
vendo que era verdade.
Teresa abraçou-o com carinho:
- Eu fiquei muito preocupada por você
desde que soube que tipo de negócios
você havia feito.
Osmar não correspondeu ao abraço.
Estava nervoso e impaciente demais:
_ Trouxeram um advogado para tirar-me
daqui?
_ Este é o Dr.Júlio Alcântara. Ele vai
cuidar da sua defesa – esclareceu
Alberto.
_ Ainda bem. O Dr.Nunes não fez nada. É
um incompetente. – Voltando-se para o
Dr.Júlio ele continuou: _ O senhor precisa
me tirar daqui hoje mesmo. Passei uma
noite horrível, quero voltar para casa.
Teresa deixou os braços cair e olhou para
o advogado.
Alberto e Vitório fizeram o mesmo. Eles
sabiam que seria impossível tirar Osmar
da cadeia.
Doutor Júlio olhou firmemente nos olhos
de Osmar e respondeu:
_ Antes de tudo você precisa se acalmar.
Sei como se sente. Mas acontece que você
cometeu um crime grave, inafiançável.
Não há como conseguir libertá-lo por
enquanto.
_ Não posso acreditar! Não consigo ficar
aqui. O lugar é horrível. O senhor deve
poder me tirar daqui.
_ Infelizmente, no momento não posso.
Portanto, trate de se acalmar, e aceitar
que vai precisar ficar aqui certo tempo.
Enquanto isso! Vou ver o que posso fazer.
_ Meu pai vai pagar o que for preciso. Não
acredito que vai deixar-me ficar preso no
meio de marginais.
Desta vez foi Alberto quem respondeu:
_ Foi você quem se marginalizou,
comercializando drogas. Não foi isso que
eu lhe ensinei. Você veio pra cá sozinho,
com os próprios pés.
_ Você é meu pai! Deve me ajudar a sair
daqui.
_ Você é meu filho, muito amado. Sabe o
quanto eu o estimo. Estou aqui para
ajudá-lo. Contratei um dos melhores
advogados do país. Mas somos obrigados
a obedecer às leis. E para você sair daqui
terá de prestar contas a elas.
Osmar passou a mão nos cabelos,
inconformado:
_ Não acredito que não tenha um jeito de
me libertar. Aquele delegado
incompetente está exorbitando. Trouxe-
me para cá algemado, como um
criminoso.
Doutor Júlio olhou-o sério e disse,
frisando bem as palavras:
_ Você cometeu um crime. Perante a Lei é
um criminoso. Renda-se a essa verdade.
De nada vale tentar fugir à
responsabilidade.
Osmar olhou-os resignado. Depois,
voltou-se para Alberto dizendo com raiva:
_ Trate de arranjar outro advogado que
tenha interesse em defender-me. Este
mais parece um acusador.
_ Você é que ainda não entendeu o
tamanho do problema em que se meteu.
Aconselho-o a ouvir o que o Dr.Júlio tem a
dizer e seguir sua orientação. Ele sabe o
que está dizendo e eu confio nele.
_ Osmar, pense bem. - disse Teresa -,
todos nós estamos aqui para ajudá-lo.
Mas se você não aceitar que errou vai
agravar sua situação.
_ Eu errei sim, mas o mundo está cheio de
pessoas que fazem o que eu fiz e estão
livres, usufruindo o dinheiro que
conquistaram. Eu tive a infelicidade de ter
sido descoberto. O culpado é Vitório que
arranjou aquele advogado metido a
policial para complicar tudo. Foi ele quem
mandou me seguir e descobriu tudo.
Vitório, que estivera em silêncio até
então, disse:
_ Quando contratei o Dr.Paulo nunca
imaginei que você estivesse metido com
os traficantes. Foi uma triste surpresa,
mas não me arrependo. Graças a ele
esses criminosos foram presos e
impedimos de cometer outros crimes.
_ Você deve estar feliz por eu estar aqui,
preso. Sempre me invejou e não se
conforma em saber que eu sou mais
inteligente e mais esperto do que você.
Vitório olhou firme nos olhos de Osmar e
respondeu:
_ Você está enganado. Não estou feliz por
você estar preso, gostaria que nunca
tivesse se envolvido com esses bandidos.
_ Pare com isso, Osmar. Estamos
perdendo um tempo precioso – interveio
Alberto com voz firme. _ Não vejo em que
você é mais inteligente e esperto do que
todos nós que sempre escolhemos o
caminho da honestidade. É bom que se
conscientize de uma vez por todas do que
fez, assuma sua responsabilidade e se
disponha a cooperar com a polícia para
que este caso seja definitivamente
esclarecido.
_ Seu pai tem razão – tornou Dr.Júlio. _
Você é réu primário, se cooperar com a
polícia, contar tudo o que sabe, terá
pontos a seu favor, o que abrandará sua
pena.
_ O senhor não entendeu. Eu não quero
ficar preso.
_ Essa sua atitude pode prejudicá-lo
muito. Revoltar-se só vai piorar a
situação. Se continuar assim, eu desistirei
do caso. Não posso defender um cidadão
culpado que teima em negar esse fato.
Teresa olhou-os preocupada e sugeriu:
_ Penso que Osmar precisa de mais
tempo para refletir sobre o que fez. Ainda
não percebeu o tamanho do problema em
que se meteu. Todos nós estamos
cansados, nervosos. Vamos embora,
descansar, enquanto ele reflete melhor.
Amanhã voltaremos para tentar
conversar.
_ Não podem fazer isso! Não quero passar
nem mais uma noite aqui.
_ Teresa tem razão. Vamos para casa e
amanhã voltaremos. Espero que você
esteja calmo – aduziu Alberto.
Embora Osmar protestasse, eles deixaram
à sala e foram conversar com Monteiro.
_ Não pensei que Osmar reagisse dessa
forma – queixou-se Alberto. _ Ele não
está arrependido e sequer percebe o
tamanho da bobagem que fez.
_ Assim fica difícil ajudá-lo – disse
Teresa, triste.
_ A senhora teve uma boa idéia. Até
então ele estava escorado na idéia de que
quando o pai chegasse, ele seria libertado
– declarou Dr.Júlio.
_ Nesses casos alguns dias de prisão
podem ser um bom remédio – disse
Monteiro. _ Ele ainda pensa que o
dinheiro pode tudo e que vai dar um jeito
de ludibriar a Lei. Mas houve o crime,
duas pessoas foram barbaramente
assassinadas. Embora ele não seja
diretamente culpado pelo crime, de certa
forma envolveu-se, envolvendo também a
família. Além disso, ele mantinha um
depósito com drogas que consta do
inquérito, com as devidas provas!
_ Sei que ele deve ficar preso, mas eu
gostaria que ele pudesse ficar em um
lugar melhor. Tem formação universitária
o que lhe dá esse direito – pediu Alberto.
_ Por esse motivo o colocamos em uma
cela individual. Infelizmente, nesta
delegacia não temos como fazer
diferente. Dentro de alguns dias ele será
transferido para um presídio, enquanto
aguarda julgamento, então talvez fique
um pouco melhor.
_ Não estou pedindo isso para poupá-lo.
Reconheço que ele deve responder pelo
que fez – disse Alberto, triste.
Ao que Monteiro respondeu:
_ Compreendo. Ele é um moço fino que
sempre viveu com conforto. Mas garanto
que alguns dias em uma cela vão fazê-lo
pensar melhor no que perdeu quando
escolheu esse caminho. Também fico
penalizado em ver um jovem que tem
tudo para ser livre e feliz, entrar no
mercado das drogas. Se posso ajudar de
alguma forma, aconselho-os a não
amolecer. Não voltar a vê-lo até que ele
mude de idéia e peço que vocês voltem!
Inclusive o advogado.
_ Vai ser difícil, mas penso que o senhor
está certo. Por mais que estejamos
sofrendo, a melhor forma de ajudá-lo é
fazer com que ele finalmente perceba o
alcance dos seus atos – disse Teresa.
_ Vamos para casa – decidiu Alberto.
Depois, dirigindo-se ao Dr.Júlio pediu: _
Espero que o senhor não desista de
defendê-lo.
O advogado sorriu e respondeu:
_ Não penso em fazer isso. Um pouco de
teatro às vezes ajuda a chegar onde
queremos.
Depois de se despedirem, Teresa Alberto
e Vitório deixaram à delegacia. Alberto
queria ir para casa, mas Teresa lembrou-
se de que suas coisas estavam em outra
casa.
_ Você pode fazer isso amanhã – disse
Alberto.
_ Está bem. Nós temos muito que
conversar antes de eu ir.
Alberto sentiu um aperto no peito. Teresa
teria vontade de separar-se dele? Era isso
que ela estava pensando? Que, segredo,
ela guardava que a fizera aceitar a
chantagem e quase perder a vida? Ele
sentia que o momento da verdade tinha
chegado e temia que lhe trouxesse a
separação.
Assim que entraram no apartamento,
Dinda correu para abraçar Teresa e notou
logo que ela estava diferente. Tinha
emagrecido, mas, apesar da situação
complicada, seus olhos brilhavam de
prazer por estar de volta.
Vitório sentia-se feliz. Teresa estava em
casa e para ele era o mais importante.
_ Temos de conversar – disse Teresa. _
Durante os dias em que estive
impossibilitada de voltar para casa,
pensei muito a respeito de nossas vidas.
_ Não precisa falar nada agora – interveio
Alberto. _ Estamos cansados,
preocupados com Osmar.
Ela não lhe deu atenção e continuou:
_ Nos últimos tempos nós não éramos
felizes. Você, Alberto, estava nervoso, eu,
depressiva. Vitório fechado no quarto,
Osmar entrando pelo caminho do erro
sem que cada um de nós, perdidos em
nossas divagações íntimas,
percebêssemos. Nossa família estava
dispersiva, sem rumo, cada um dentro do
próprio egoísmo. Foi preciso que a vida
nos sacudisse para que pudéssemos
perceber isso.
Eles ouviram calados, sentindo que cada
palavra dela era verdade. Teresa
continuou:
_ Vamos nos sentar e conversar agora.
Eles se acomodaram e Dinda fez menção
de retirar-se, porém Teresa pediu:
_ Fique, Dinda. Você faz parte de nossa
família.
Eles se acomodaram. Teresa no sofá
tendo de um lado o marido e do outro o
filho. Dinda sentou-se na poltrona ao
lado. Teresa começou a falar, os olhos
perdidos no tempo, relembrando seu
casamento, como apesar de não amar
ardentemente o marido ela acreditava
que com o tempo, eles se entenderiam e
poderiam ser felizes.
Alberto ouvindo-a, se sentia ansioso. Por
um lado estava curioso para saber por
que ela mentira e que segredo era esse
tão terrível que a família não podia saber,
mas por outro temia ouvir essa verdade
que talvez o separasse. Ele não queria a
separação. Aqueles dias em que ela
estivera desaparecida tinham lhe
revelado o quanto ele ainda a amava e
desejava estar com ela.
Teresa continuava:
_ Refleti muito e percebi que a felicidade
é uma conquista renovada a cada dia.
Descobri o quanto eu amava meu marido,
meus filhos, nossa casa, nossa vida e o
quanto eu havia contribuído para nossa
infelicidade. Eu era inexperiente, cheia de
ilusões. São elas que nos cegam e nos
impedem de enxergar o que realmente
tem valor nessa vida.
_ Não é verdade – disse Alberto -, você
sempre foi uma boa esposa, uma
excelente mãe. Eu é que fui cego, deixei-
me envolver pelo ciúme, pelo orgulho e
fiz o que não devia.
Teresa colocou a mão sobre o braço de
Alberto e respondeu:
_ Não é assim que eu vejo e peço-lhe que
me escute sem tentar culpar-se pelos
nossos desentendimentos.
Quando em relacionamento não vai bem,
cada um tem sua parcela de
responsabilidade.
Vitório remexeu-se no sofá e tornou:
_ Vocês estão falando de seus
sentimentos íntimos.
Talvez seja melhor eu me retirar.
Teresa segurou a mão do filho e
respondeu:
_ Quero que você fique e escute tudo.
Não haverá mais nenhum segredo entre
nós. Quero que vocês me conheçam por
dentro, como eu realmente sou. Uma
mulher comum, com muitas qualidades,
mas também muitos pontos fracos. Todos
estes anos nós representamos papéis
convencionais, sufocando os anseios de
nossa alma que, presa em ilusões
superficiais, não soube separar os
sentimentos verdadeiros dos falsos. Só
quando acreditei que tinha perdido tudo
consegui esse entendimento.
Teresa se calou por alguns instantes,
enquanto os outros três, tocados pelo seu
tom de sinceridade, permaneceram
silenciosos.
Ela respirou fundo! E continuou:
_ Peço-lhes que não me interrompam. O
que vou lhes contar não vai ser fácil para
mim. Ouçam e depois que eu terminar,
coloquem seus pensamentos.
Teresa relatou como conhecera Antero e
como se apaixonara por ele, salientando
que foi algo irresistível e como ela lutou
para não se envolver. Alberto e Vitório
ouviam de cabeça baixa e Dinda rezava,
com medo do que aquela confissão
poderia trazer. Olhava receosa para
Alberto, mas ele estava parado, pálido,
sem reagir. Dentro dele havia a
impressão de que sempre desconfiara de
algo assim.
Teresa continuava contando:
_ Ele era solteiro e queria que eu fosse
embora com ele. Apesar de tentada,
recusei. Não podia deixar meus filhos a
quem sempre amei e não queria enfrentar
a ira de meu marido nem o desprezo da
sociedade. Decidi isso e acabamos nosso
relacionamento. Ele se casou com a moça
que sua mãe queria e eu procurei me
dedicar à família.
Contudo, pressionada pela paixão,
cheguei a pensar que você, Alberto, fosse
o culpado da minha infelicidade.
Alberto levantou os olhos e fixou-a, mas
não disse nada. Teresa viu tanta dor em
seu rosto que sua voz sumiu na garganta.
Contudo, ela tinha decidido dizer a
verdade. Fez um esforço grande e
continuou:
_Só quando pensei que o tivesse perdido,
dei-me conta de que eu fui à única
culpada. Eu fiquei dividida, tive coragem
para desistir de Antero, mas não tive
coragem de jogar fora aquela ilusão,
aquele sonho de amor impossível que só
me fez sofrer. E foi isso que fez com que
eu não enxergasse suas qualidades e a
distância entre nós permanecesse.
Olhando para trás, notei que a vida nos
deu tudo para que fôssemos felizes, mas
eu não soube valorizar.
Teresa fez uma pausa, depois como todos
permanecessem silenciosos ela contou
tudo quanto tinha acontecido, a
chantagem, o encontro com Elvira, o
plano da viagem, o seqüestro, a fuga, o
encontro com Renata, e a idéia de fazê-la
entregar o dinheiro em seu lugar.
A voz de Teresa se firmara de novo e
havia um tom de tristeza que ela não
conseguia dissimular.
_Eu sabia que eu não tinha sido uma boa
esposa para você. Quando soube o que
Osmar fizera, questionei minha postura
de mãe.
_ Você sempre foi uma boa mãe!_ tornou
Vitório.
_Uma mãe só e boa quando consegue com
os filhos uma ligação de alma, uma
intimidade que fortalece os laços de
união. É esse tipo de amor que faz com
que os filhos se preservem, respeitem-se.
Para isso eu precisaria me conhecer
melhor, expressar meus verdadeiros
sentimentos, o que na época eu não sabia
fazer.
Teresa calou-se por alguns instantes.
Ninguém teve coragem de dizer nada.
Alberto estava por, demais tocado.
Descobriu que fora traído e a dor ainda
estava viva dentro dele, principalmente
por saber que Teresa sentira por outro
que ele sempre sonhara que ela sentisse
por ele. Sentia-se arrasado, sem coragem
de dizer nada.
Teresa pensou um pouco e disse:
_ Apesar de tudo, sento-me aliviada. Sei
que depois do que fiz não mereço a
consideração de vocês. Eu pensei muito
antes de decidir lhe contar. Mas estando
longe, pude avaliar tudo quanto tinha
perdido e prometi a mim mesma que se a
vida me permitisse voltar a vê-los eu
abriria meu coração para que vocês me
vissem como eu realmente sou. Só assim
terei o direito de esperar por uma vida
melhor. Antero foi meu único e terrível
pecado e reconheço que paguei muito
caro por essa fraqueza.
Teresa levantou-se e disse com voz firme:
_O que eu mais quero na vida é que vocês
me perdoem pelo que fiz e me aceitem de
volta. Sou uma mulher que sofreu, mas
que ainda acredita que podemos ser
felizes juntos. Reconheço que vocês
representam para mim tudo o que vale a
pena neste mundo. Contudo, se não
quiserem de volta, se você, Alberto, não
puder me perdoar, esquecer tudo e tentar
um recomeço a meu lado, saberei
compreender. Mas eu não podia voltar e
continuar mentindo.
Alberto, de cabeça baixa, não conseguia
articular palavra. Estava comovido,
tocado, sentia que precisava ficar só,
pensar em tudo e não tinha como
responder.
_Vou embora. Volto para a minha casa.
Lá, vou ficar esperando o que vocês
decidirem.
_Eu quero que você fique – disse Vitório!
__ Para mim você continua sendo a mais
digna das mulheres.
É preciso ter muita grandeza de alma
para fazer o que você fez. Eu continuo
amando-a, ainda mais tendo podido
contemplar a sua beleza interior.
_ Agora não, meu filho. Agradeço sua
prova de carinho. Mas hoje eu vou para a
minha casa.
_ Eu acompanho você.
_Prefiro ir só. Fique com seu pai.
Teresa foi saindo, Dinda e Vitório foram
com ela até a porta. Por mais que Vitório
insistisse, Teresa convenceu-o a ficar.
Pediu-lhe que chamasse um táxi e foi
embora.
Vitório entrou na sala e encontrou Alberto
no mesmo lugar. Aproximou-se dele,
abraçou-o e não encontrou nada para
dizer.
Permaneceram abraçados durante alguns
minutos, depois Alberto disse.
_ Estou muito cansado. Vou para o meu
quarto.
Ele foi e Vitório olhou para Dinda, que
ficara na porta da sala sem saber o que
dizer.
_ Teresa não podia ter feito isso.
Ciumento como é o Sr.Alberto nunca vai
perdoá-la.
Vitório olhou-a pensativo e disse:
_ Uma atitude verdadeira nunca dá
errado. Se meu pai não entender isso,
será inútil mamãe tentar reconstruir sua
vida ao lado dele.
Dinda ficou tentando entender onde
Vitório queria chegar. Ele foi para o
quarto. A tempestade ainda não tinha
passado. Além dos pais havia o caso de
Osmar. Ele se recolheu para meditar e
pedir ajuda aos seus amigos espirituais".
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 29
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Vitório sentou-se na cama, fechou os
olhos e agradeceu a Deus a volta de
Teresa. Quanto mais pensava no que ela
dissera, mais desejava que o pai a
perdoasse. Sentia que se ele fizesse isso,
haveria uma ótima chance para que eles
fossem felizes, dali para frente.
Com sono, ele estendeu-se na cama,
pensativo. Pouco depois adormeceu.
Sonhou que caminhava por um jardim
florido e Analú estava a seu lado.
_ Que bom estar com você neste lugar tão
lindo! – disse ele, alegre.
_ Chegou à hora de cumprir o que
prometi! Hoje você vai conhecer parte do
passado.
Vitório sentiu uma onda de prazer e
perguntou:
_ para onde estamos indo?
_ Em um lugar que você conheceu há
muitos anos.
Eles chegaram a uma praça onde havia
um prédio de três andares, rodeado por
jardins.
_ Este lugar me é muito familiar.
Analú parou diante de um banco e
convidou:
_ vamos nos sentar.
Eles se acomodaram e Analú continuou:
_ Chegou à hora de você saber a verdade.
Vitório emocionou-se. Analú segurou sua
mão delicadamente e começou:
- Vou começar falando dobre a bela casa
onde moravam Elisa, o marido e suas
filhas gêmeas. As duas irmãs eram tão
iguais que eram confundidas pelas
pessoas. Apesar da semelhança, talvez
por causa do temperamento alegre, Olga
era a preferida de todos. Vendo que a
irmã chamava atenção por onde passava,
Flora sentia muita inveja dela.
_ Espere, estou vendo essa casa. Eu
conheço as irmãs gêmeas.
_ Sim, você está se recordado.
_ Estou e sei que Olga apaixonou-se, foi
correspondida e ficou noiva, mas não se
casou com o rapaz.
_ É verdade. Ele morreu antes do
casamento, vítima de uma emboscada.
_ Agora me recordo de alguém ter falado
sobre isso. Nunca descobriram seus
assassinos?
_ Nós sabemos que foram dois. A polícia
prendeu um deles, que confessou o crime,
dizendo que Flora fora a mandante, mas a
polícia não acreditou e concluiu que ele
matou para roubar. Na verdade, Flora
pagou uma boa soma ao preso para se
retratar e não delatar o companheiro. Ela
tinha um bom motivo para isso.
_ Flora apaixonou-se pelo noivo da irmã,
assediou-o, porém ele amava Olga e
recusou seu amor. Então, quando
faltavam poucos dias para o casamento,
ela mandou mata-lo. Nesse tempo eu
ainda não tinha reencarnado, mas conheci
toda a história. A família dela não
desconfiou?
_ Flora era dissimulada. Ninguém
desconfiou, nem Olga. Mas um dos
assassinos, aquele que não foi descoberto
pela polícia, era apaixonado por Flora e
ela convenceu-o a praticar o crime. Foram
cúmplices. Mais tarde, quando ele
descobriu que ela o usara, ameaçou
contar tudo à polícia e, para impedi-lo,
ela concordou em casar-se com ele.
_Olga sofreu muito com a perda, mas o
tempo passou e ela acabou se casando
com outro.
_ Sim. Mas nunca foi feliz, sempre
chorando pelo noivo assassinado. O
marido a amava muito, mas não se
conformava com a indiferença dela. Foi
então que a história se repetiu:
_ Como assim?
_ Flora teve um filho e Olga, anos depois,
também. Os dois primos brincavam juntos
todo o tempo, mas Osvaldo filho de Flora
tinha muita inveja de Vinicius, filho de
Olga.
_ Estou sentindo que vivi essa história,
Recordo-me que meu nome era Vinicius.
_ Sim. Você foi o filho de Olga. Osvaldo
dissimulava o que sentia. Então surgiu
Ofélia, uma moça linda, que se apaixonou
por você e foi correspondida. Quando
Osvaldo o viu com ela, apaixonou-se
perdidamente e desejou tirar de você.
_ Eu notei, mas nem liguei. Subestimei o
interesse dele por ela.
_ Você não percebeu que o Osvaldo tinha
muita inveja de você. A inveja é a
admiração transformada em raiva e a
raiva, a manifestação do orgulho. Ele
desejava possuir o que você possuía, por
esse motivo fez tudo para atrapalhar o
seu namoro. Armou uma cilada para ela e
você acreditou que ela o tivesse traído.
_ Eu sei do que você está falando! Eu me
recordo de Ofélia, ela era minha
namorada e eu a amava. Sofri muito com
o que aconteceu.
_ Ela era inocente. Você foi enganado.
_ Eu me arrependi de não acreditar no
que ela me disse e tentei encontra-la. Ela,
porém, desapareceu. Nunca mais a vi. Só
a encontrei novamente depois que
retornamos à pátria espiritual.
_ Eu sei. Vocês se encontraram e
desfizeram o mal-entendido.
_ Lembro-me de tudo. Ela me perdoou e
nos unimos aqui. Vivemos juntos até eu
ter de voltar a nascer. Estou entendendo
o que nos aconteceu. Olga era Teresa e
Flora, Renata. Ela e Otávio assassinaram
o noivo de Olga. Por esse motivo,
atraíram os assassinos naquela casa.
_ É verdade. Ontem conseguimos
convence-los a aceitar um tratamento
espiritual. Estavam cansados e sofridos.
Foram encaminhados a um lugar de
refazimento.
_ Eles me pareceram muito rebeldes.
Acha que conseguirão melhorar?
_ Eles precisam aprender que maldade
atrai maldade e que, se desejarem viver
melhor, é preciso melhorar sua forma de
enxergar a vida.
_ E Elvira, por que entrou nesta história?
_ Elvira foi Elisa, mãe das gêmeas.
Quando ela veio para cá soube de tudo e,
avisada do que poderia acontecer no
futuro, quis reencarnar para poder ajudar
as filhas.
_ Vocês sabiam que esse crime iria
acontecer?
_ Claro que não. Nós sabíamos que essas
pessoas eram maldosas e iam atrair a
maldade. Mas não sabíamos de que forma
isso se daria. A vida programa as lições
de cada pessoa de acordo com o que elas
precisam aprender. É bom lembrar que
seja o que for que atraiam, elas possuem
livre-arbítrio e se mudarem sua maneira
de pensar, escolhendo ficar no melhor,
tudo vai se modificar.
_ Seria muito bom que as pessoas
soubessem disso. Mudar o padrão de
pensamento para melhor é a chave do
progresso em todas as áreas de nossa
vida. Alberto foi o marido de Olga e duas
vezes meu pai.
_É. Você agora já lembrou do passado.
_ Aqui é fácil, mas receio que quando
voltar ao corpo esqueça tudo novamente.
Analú sorriu alegre:
_ É preciso deixar o passado passar. Sua
vida anterior
Não foi do jeito que você desejava. Mas
esta será muito melhor.
_ Recordo-me que Osvaldo também não
foi muito feliz.
_ De fato. Ofélia nunca quis nada com ele.
Quando vocês se desentenderam ela foi
para longe assim como você, ele nunca
mais a viu. Ele apaixonou-se por outra,
que o rejeitou. Então ele desejou ter
dinheiro e poder. Ingressou na política,
onde conseguiu algum sucesso.
Novamente, ele se deixou arrastar pela
vaidade. Sempre quis ser maior do que
era. Não teve paciência para construir a
felicidade da maneira adequada. Depois
da morte, Osvaldo disse estar
arrependido dos seus erros e pediu nova
oportunidade. Teresa e Alberto
acreditaram em sua sinceridade.
Comovidos, concordaram em recebê-lo
como filho para que vocês dois,
convivendo como irmãos, pudessem
esquecer os desentendimentos.
_ Isso foi no astral, antes de nascermos.
Aqui, quando ele esqueceu o passado,
mostrou que ainda não gostava de mim.
Mas eu também não me mostrei amigo.
Pelo contrário. Retomei a aversão que
sentia por ele. Só quando ele foi preso e
humilhado, notei que minha aversão tinha
ido embora, eu tinha mudado. Os anos de
convivência como irmãos tinham criado
um laço positivo entre nós. Descobri que
gosto dele e fiquei muito triste por vê-lo
nessa situação.
_ Você está certo. Eu confio que com o
tempo, a amizade que nasceu em seu
coração, também tocará o dele. Um dia,
Osmar descobrirá o quanto você o estima
e isso o fará mudar.
_ É o que eu mais desejo nessa vida.
_ Nosso tempo acabou. Está na hora de
voltar.
_ Já? Ah, uma última pergunta que
preciso lhe fazer. Ofélia está encarnada?
_ Você ainda não tem a resposta?
_ Eu desconfio, mas não tenho certeza.
_ Você já sabe que sim e onde ela está
Vitório levantou-se entusiasmado:
_ É Estela?
_ Eu preciso responder? Vamos embora.
Na volta, deslizando de mãos dadas
Abalo, olhando a cidade lá embaixo,
Vitório sentia uma sensação de alegria e
prazer que ele não conseguiria descrever
com palavras.
Chegaram ao quarto dele e, antes que
Analú fosse embora, ele indagou:
_ E meus pais, ainda têm chance de
viverem bem?
_ Têm, mas tudo vai depender de como
eles vão lidar com o orgulho ferido e
conseguir se perdoar.
Ela se afastou, atirando um beijo com a
ponta dos dedos. Vitório acomodou-se no
corpo, mergulhando em um gostoso sono.
Analú não foi embora, porquanto um
jovem a chamou dizendo aflito:
_ Ajude-nos, Analú. Ele está sofrendo
muito.
Ela viu o rosto de Alberto, angustiado, e
respondeu:
_ Vamos até ele.
Quando Vitório foi descansar, Alberto
entrou no quarto e sentou-se na cama
pensativo. Teresa amava outro homem!
Esse pensamento o martirizava e ele não
conseguia pensar em outra coisa.
Sua cabeça doía e ele não conseguia
refletir com clareza. Ele fora enganado!
Como não percebera que Teresa tivera
um amante? A esse pensamento sentia
aumentar sua dor. Em sua imaginação a
via nos braços de outro homem, trocando
carícias. Essa imagem era-lhe
insuportável.
Ele nunca poderia esquecer esse fato.
Ficou ruminando esse pensamento
durante muito tempo. Atormentando-se,
criando imagens de como teriam sido os
encontros de Teresa com seu rival.
Em alguns momentos, decidia que jamais
a perdoaria.
Em outros, sentia que não podia viver
longe dela. Sem ela tudo perderia o
sentido. Não valia a pena viver.
Então, um pensamento louco surgiu em
sua mente. O melhor seria acabar com a
vida, deixar esse mundo onde não havia
lugar para ele.
Nessa hora alguns vultos escuros o
assediaram e ele começou a visualizar o
revólver que estava guardado no armário.
Seria fácil ir até lá, apanhar a arma e se
libertar.
Exatamente naquele instante, Analú,
entrou acompanhada pelo jovem que se
aproximou de Alberto e o abraçou. As
sombras escuras deixaram o quarto,
assustadas.
Analú começou a orar e de seu peito
saíram raios de luz azul, que envolveram
Alberto, enquanto o rapaz, abraçado a
ele, falava em seu ouvido:
_ Alberto, pense melhor. Não se deixe
levar pela vaidade. Não dê forças para o
seu orgulho ferido. Eu estou aqui,
torcendo por você.
Alberto não ouviu suas palavras, mas, aos
poucos, foi se acalmando. O rapaz
continuou:
_ Teresa é mulher sincera.
Desta vez ele pensou: "Apesar do que fez,
ela foi sincera. Arrependeu-se de não ter
me contado".
_ Ela fez mais, descobriu que gosta de
você e deseja faze-lo feliz. Quer
recuperar o tempo perdido.
_ Ela disse que descobriu que gosta de
mim, de nossos filhos e deseja viver o
resto da vida ao nosso lado. Mas eu terei
condições de ser feliz depois do que ela
confessou?
_ Você quer jogar fora essa chance de
felicidade que a vida está lhe oferecendo?
Não percebe que ela o traiu uma vez, mas
você a traiu várias vezes com muitas
mulheres? Por que se julga melhor do que
ela? Sua vaidade não o deixa enxergar o
quanto está sendo parcial. Se analisar
melhor, verá que ela foi mais sincera do
que você, uma vez que o perdoou e
deseja ser feliz ao seu lado. Vai perder
essa chance?
Alberto passou a mão nos cabelos,
pensativo. Ele reconhecia que nunca fora
fiel. Reconhecer isso naquela hora era
arrasador. Mas por outro lado, fazia
desaparecer de sua mente a raiva por ter
sido traído. Admitia que, a vida, tinha
sido justa. Ele fizera e recebera de acordo
com o que havia feito.
A esse pensamento, Alberto sentiu-se
aliviado. O jovem olhou para Analú, que
disse:
_ Conseguimos. Agora vamos fazê-lo
descansar. Ele precisa recuperar as
forças.
O rapaz passou as mãos em volta de
Alberto, emitindo pensamentos de calma.
Ele começou a bocejar. Um sono
invencível tomou conta dele, que se
estendeu na cama.
_ Estou muito cansado. Preciso dormir.
O jovem repetiu, alisando sua testa:
_ Sim. Você precisa descansar. E quando
acordar, vai se sentir muito melhor.
Os dois viram quando o duplo de Alberto
saiu do corpo e, vendo-os, assustou-se
com os raios de luz que ambos emitiam:
_ Vocês são anjos! – exclamou meio
inconsciente.
_ Nós somos amigos. Vamos levá-lo a um
lugar onde vai recuperar suas forças.
Os dois postaram-se um de cada lado e o
abraçaram. Depois, levaram-no volitando
e quanto mais se distanciavam, mais
Alberto se tornava lúcido. Em
determinado ponto, olhou para o jovem e
disse emocionado:
_ Ronaldo é você?
_ Sim.
_ Estou sonhando ou eu morri? Você
morreu quando eu ainda era adolescente!
_ Não, meu irmão. Eu continuo vivo. A
morte não existe. É apenas uma viagem
para o outro mundo.
_ Você está vivo! Mamãe ficou
inconformada quando você morreu!
_ Hoje ela já sabe de tudo. Estamos
juntos no mesmo plano.
_ Há anos eu não me sentia tão bem.
_ É hora de esquecer o passado e
recomeçar. Vocês ainda têm tempo para
desfrutar uma vida melhor.
_ Isto só pode ser um sonho! Não pode
ser verdade. Eu pensava em morrer e
você me chama para a vida!
_ Não existe morte, só existe vida. Só
vida, sempre vida! Respire, aproveite
estes momentos para revigorar seu
corpo. Olhe as belezas à sua volta e
agradeça ao Criador por ter nos dado esta
oportunidade.
Alberto olhou em volta, estavam em um
bosque belíssimo. Aspirou o perfume das
flores que coloriam os canteiros e se
comoveu. Ele, que há muito tinha se
esquecido de rezar, diante de tanta
beleza, orou fervorosamente, abençoando
a vida, a natureza.
Vitório acordou, já era início da noite.
Levantou-se pensando no pai. Como
estaria? Lavou o rosto, penteou os
cabelos e foi procurar o pai. Ele não
estava na sala. Dinda, vendo-o,
aproximou-se e, antes que ele falasse,
disse:
_ Estou preocupada com o Sr. Alberto. Ele
nunca dorme de dia. Deitou-se naquela
hora em que você foi para o quarto e está
dormindo até agora! São sete horas, o
jantar está pronto. Fui até o quarto
chama-lo, mas ele ainda está dormindo.
Nem me ouviu entrar. Ele tem um sono
leve, isso não é normal.
_ Vou vê-lo.
Vitório entrou no quarto e aproximou-se
da cama. Alberto dormia, mas seu rosto
estava calmo e ele respirava
normalmente.
Vitório voltou à sala.
_ E então? – indagou Dinda.
_ Ele dorme como um bebê. Mas parece
bem. A volta de mamãe sã e salva o fez
relaxar. Vamos deixá-lo descansar,
jantaremos mais tarde.
Uma hora depois, quando Alberto acordou
e apareceu na sala, Vitório tornou:
_ Finalmente você conseguiu adormecer.
Entrei em seu quarto e você estava em
um sono tão profundo que nem me ouviu
entrar.
Alberto olhou-o, calmo, e respondeu:
_ Estou me sentindo melhor. Dormi como
há muitos anos não dormia.
_ É que a tensão acabou com a volta de
mamãe.
_ Não foi apenas isso, meu filho. Hoje foi
um dia diferente. Fui para o quarto
arrasado, sentindo que precisava pensar
em tudo que sua mãe disse. Confesso que
estava inconformado, sem querer aceitar
a verdade. A traição dela doía e eu
cheguei a pensar até em acabar com a
vida.
Ele fez uma pausa e Vitório levantou-se,
abraçando-o:
_ Por que não me chamou para
conversarmos?
_ nem pensei nisso. Eu precisava me
confrontar refletir sofre os fatos, e só eu
poderia fazer isso. Mas enquanto eu
pensava em acabar com a vida, parecia
que eu ouvia uma voz que me respondia.
Quando eu pensava na traição de Teresa,
a voz me dizia que ela me traiu uma vez,
enquanto eu a traí inúmeras vezes, com
muitas mulheres. Penso que era minha
própria consciência, repreendendo-me
pelo meu orgulho de achar que eu sou
mais digno. No fim, cheguei à conclusão
de que sou mais culpado do que ela. Senti
que eu não tenho moral para exigir
contas do comportamento de ninguém.
_ O orgulho é sempre um mal conselheiro.
_ Eu mereci essa lição. Quando cheguei a
essa conclusão, senti que toda a minha
revolta tinha ido embora. Minha raiva
havia passado. Toda tensão desapareceu.
Comecei a sentir um calor agradável, um
sono invencível, deitei-me e adormeci.
Alberto respirou fundo e, vendo que o
filho o ouvia atentamente, continuou:
_ Então tive o sonho mais maravilhoso da
minha vida. Vi-me em um jardim florido
com uma mulher maravilhosa e um rapaz
jovem que falou comigo e, para meu
espanto, reconheci o Ronaldo, meu irmão
que morreu quando eu ainda era
adolescente. Você acha isso possível?
_ Claro que é possível. Eu mesmo tenho
me encontrado com pessoas que vivem
em outros mundos. Você estava
precisando de ajuda e o espírito de
Ronaldo veio ajudá-lo.
_ Nunca pensei que os mortos pudessem
voltar. Ele me disse que a morte não
existe e que só existe a vida. Tudo é vida!
Vitório abraçou o pai comovido:
_ Finalmente pai, você conseguiu
perceber a verdade. O que mais ele lhe
disse?
_ Que é hora de esquecer o passado e
desfrutar da felicidade. O que você acha?
_ Ele sabe o que está dizendo. Nós
amadurecemos e já podemos viver
melhor.
_ É isso o que mais quero. Amanhã vamos
ter com Teresa para lhe pedir que volte
para a casa.
Vitório abraçou o pai com carinho:
_ Finalmente, pai! Estou certo de que
escolheu o melhor caminho. Agora
seremos felizes.
_ Mas há o problema do Osmar...
_ É verdade. Mas vamos confiar. Uma
hora ele vai entender que está errado e
mudar. Vamos pensar que ele se
arrependeu e nunca mais vai repetir o
erro.
_ Na delegacia ele não parecia nem um
pouco arrependido.
_ Sinto que é uma questão de tempo.
Osmar sempre foi inteligente. Uma hora
vai entender que quiser viver bem terá de
mudar, e nós vamos todos os dias
mandar-lhe pensamentos de luz e de
amor para que ele se recupere logo.
_ Você me surpreende, meu filho. Ele
nunca o tratou bem. Sempre fez pouco
caso de você.
_ Eu também não o tratava como a um
irmão. Mas eu mudei. Entendi que quando
a vida nos uniu na mesma família queria
que eu aprendesse a amá-lo e esquecesse
o passado.
_ Estou orgulhoso de você. Começo a
acreditar que tudo o que você diz é
possível.
_ Claro que é.
Os espíritos de Analú e Ronaldo, que
estavam lá, sorriram satisfeitos.

***

Teresa chegou à casa triste, mas aliviada!
Não sabia como Alberto ia enfrentar a
verdade. Era possível que seu ciúme o
impedisse de perdoá-la. Mas ela estava
disposta a aceitar sua decisão com
coragem e retomar sua vida assim
mesmo. Era o preço que teria de pagar
pelo seu erro. Não se deixaria abater.
A campainha tocou e ela se surpreendeu.
Alberto já teria decidido? Com o coração
aos saltos, foi abrir: o delegado Monteiro
estava na sua frente.
_ O senhor?
_ Desculpe vir sem avisar, eu liguei para
Vitório e ele informou-me que a senhora
estava aqui.
_ Entre, por favor.
Ele entrou e sentaram-se na sala. Em
silêncio, o delegado retirou um pacote do
bolso e entregou-o a ela, que
imediatamente o abriu. Sua foto e de
Antero estava logo em cima. Ainda não
refeita da surpresa, Teresa viu que ali
estavam todos os documentos que
tentara obter.
_ Este pacote foi encontrado na casa do
crime. Guardei-os, deduzindo por que a
mulher morta tinha ido lá. Guardei sigilo
para não atrapalhar as investigações.
Ele fez ligeira pausa e, vendo que ela
ouvia atentamente, continuou:
_ Quando a senhora fez seu depoimento,
decidi não colocar essas provas no
inquérito. Admirei sua franqueza e
cheguei à conclusão de que deveria
devolvê-los.
Teresa ouvia! Olhos brilhantes de
emoção. O delegado a aconselhou:
_ Destrua-os. A senhora e sua família já
sofreram muito e merecem ficar em paz.
_ Mas há meu depoimento e quando for
depor na justiça terei de voltar ao
assunto.
_ Certo. Mas, apesar disso, esse material
não aparecerá nos jornais e pouparemos
vocês.
Monteiro levantou-se e Teresa disse:
_ Obrigada, doutor. O senhor é um
homem de bem.
Os olhos de Monteiro brilhavam emotivos
e ele respondeu:
_ A senhora é uma grande mulher.
Ele foi embora e Teresa olhou as fotos e
os bilhetes que tinha nas mãos. Foi à
cozinha, pegou uma panela colocou-os
dento, jogou álcool e pôs fogo.
Ficou olhando as chamas, lambendo as
fotos e os bilhetes que, em poucos
segundos, transformaram-se em um
punhado de cinzas.
O passado definitivamente estava morto e
ela, livre. Naquele momento teve a
certeza de que estava pronta para
recomeçar uma nova vida."
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


CAPÍTULO 30
"ONDE ESTÁ TEREZA"? – ZIBIA GASPARETTO


"Na manhã seguinte, Alberto acordou
cedo. Ele custara a dormir na noite
anterior, fazendo planos para o futuro.
Imaginando retomar seu trabalho na
empresa ao lado de Teresa e Vitório.
Levantou-se, arrumou-se e foi tomar café.
Pouco depois, Vitório chegou. Ele também
acordou cedo querendo ir logo à procura
da mãe.
Depois do café, eles informaram Dinda
que iam buscar Teresa. Vendo-os sair
apressados, ela sorriu alegre e elevou seu
pensamento a Deus, agradecendo por
tudo ter terminado bem.
Quanto ao caso de Osmar, ela acreditava
que quando ele desse-se conta do
tamanho do erro que cometera, do quanto
isso o prejudicara, arrancando-o de uma
situação privilegiada e atirando-o em uma
cela de prisão, sem saber quando ficaria
livre, pensaria melhor, e quando
ganhasse a liberdade novamente, nunca
mais teria coragem de voltar a fazer
negócios ilícitos.
Teresa também acordou cedo naquela
manhã. Refletindo sobre como seria sua
vida dali para frente. A atitude do
delegado a fizera sentir-se valorizada e
com a certeza de que agira corretamente
ao enfrentar seus medos. Apesar de
temer que Alberto não a perdoasse,
estava disposta a enfrentar os
acontecimentos como uma conseqüência
de seus erros. Sentia-se forte, apesar da
insegurança do seu futuro.
A campainha tocou e Teresa foi abrir.
Emocionada, olhou Alberto e Vitório, que
imediatamente a abraçaram.
_ Mãe, viemos buscá-la. Vamos para a
casa.
Teresa olhou para Alberto que a abraçou,
dizendo:
_ Quero que você volte para a nossa casa.
As lágrimas desciam pelo rosto de Teresa,
que os abraçou, sem encontrar palavras
para responder.
Eles entraram e ela fechou a porta.
_ Vamos arrumar suas coisas agora –
disse Vitório.
Ela fixou os olhos em Alberto e
perguntou:
_ Tem certeza de que é isso que você
quer?
Ele não desviou o olhar e disse:
_ Absoluta. Sinto que nós ainda temos
tempo de nos conhecermos melhor e
recomeçarmos nossa vida.
_ Vamos nos sentar e conversar sobre
nosso futuro – tornou Teresa,
convidando-os a. entrarem na sala.
Alberto sentiu que ela temia os arroubos
de ciúmes que ele sempre tivera e
respondeu:
_ Ontem, depois que você saiu, recolhi-
me para pensar. Sentia dor, revolta, não
entendia direito as emoções que me
atormentavam. No início pensei até em
acabar com a vida porque eu não
conseguia perdoa-la, mas sabia que não
poderia viver sem você. O amor que sinto
está mais vivo do que nunca.
Ele fez ligeira pausa, depois continuou:
_ Recordei-me dos meus erros, das
traições que cometi me relacionando com
outras mulheres e cheguei à conclusão de
que eu não tenho moral para lhe cobrar
nada. Você abriu seu coração e eu quero
fazer o mesmo. Desejo que nosso
relacionamento daqui para frente seja
Limpo, claro e verdadeiro. Devo dizer-lhe
que nunca amei outra mulher. Você me
desprezava e eu corria atrás das outras
para provar-lhe que era apreciado como
homem. Talvez esse tenha sido o maior
dos meus erros. Fazia isso por vaidade, só
alimentando meu orgulho. No fim, ficava
mais infeliz do que antes.
_ Eu sabia de tudo e imaginava que você
se comportava assim para humilhar-me
por eu não ser uma mulher carinhosa.
Os dois se calaram e Vitório interveio:
_ O orgulho continua sendo nosso maior
inimigo. Enquanto lhe dermos força, não
encontraremos a felicidade.
Teresa concordou com a cabeça e Alberto
continuou:
_ Reconheço que se eu tivesse deixado a
vaidade de lado e sido carinhoso, dando
provas do imenso amor que sentia talvez
você tivesse correspondido.
_ Penso que sim.
_ Quero que me perdoe por não ter tido
essa sensibilidade. Mas agora será
diferente. Nós mudamos, aprendemos.
Teresa sorriu e levantou-se?
_ Ajudem-me a arrumar as coisas. Vamos
para a casa.
Contentes, eles arrumaram tudo e
colocaram no carro. Ela levou as coisas de
Renata e pretendia manda-las para uma
casa de caridade.
Foi com alegria que chegaram ao
apartamento, onde Dinda, radiante,
esperava-os para o almoço. Vitório,
porém, não quis esperar. Tinha urgência
de ver os amigos.
Foi à casa de Marília, tocou a campainha,
e Estela abriu a porta. Vendo-o, sorriu
alegre:
_ Estava pensando em você!
_ Eu também.
Ele entrou e eles logo foram cercados por
Marília, Altair e Dorita. Depois dos
cumprimentos ele falou da volta de
Teresa e da alegria de tê-la em casa.
_ Ainda não vi Paulo. Pensei encontra-lo
aqui.
_ Agora ele só vem a passeio – informou
Marília.
_ Para namorar a dona da casa – brincou
Dorita.
_ Vou ligar e dizer-lhe que você está aqui.
Marília ligou e Paulo disse que iria até lá
para vê-lo.
_ Que rápido que ele resolveu me ver! –
brincou Vitório.
_ Tem mais alguém que andava chorando
pelos cantos – disse Altair.
_ Cale a boca, menino – pediu Estela.
_ Por que não diz a verdade? Estela está
morrendo de medo que você vá embora
para o Rio de Janeiro e não venha mais
aqui.
Vitório olhou-a sério e respondeu:
_ Nós nos reencontramos depois de tanto
tempo e não quero perder essa
oportunidade.
Vendo que Estela estava emocionada,
Dorita convidou-os a irem à cozinha, onde
ela havia coado um café fresquinho.
Pouco depois, Paulo chegou, abraçou
Vitório, interou-se dos últimos
acontecimentos e disse:
_ Finalmente esse drama está tendo um
final feliz!
_ Estive na delegacia e Monteiro contou-
me que depois que vocês foram embora,
Osmar não falou mais com ninguém.
Fechou-se num mutismo total, não
responde quando falam com ele e nega-se
a dormir na cama da cela. Monteiro
contou que esse fato retarda a
transferência dele para um presídio, onde
ficaria mais bem instalado. Monteiro
precisa encerrar o inquérito e deseja que
ele fale, testemunhe contra o Gil.
_ Nós pensamos em ir visitá-lo mais
tarde.
_ Apesar do comportamento dele,
Monteiro pensa que é melhor ele não ver
ninguém da família por perto. Se pensar
que está abandonado, talvez resolva se
abrir.
Vitório suspirou e respondeu triste:
_ vou me concentrar e pedir a Analú que
nos ajude.
_ É uma boa idéia.
Vitório conversou mais um pouco, depois
se despediu. Estela acompanhou-o até a
porta, enquanto os outros continuaram na
cozinha, tomando café.
Vitório segurou a mão dela, dizendo com
carinho:
_ Não tenha medo. Agora que nos
encontramos de novo, nunca mais nos
separaremos. Nós temos um caminho a
percorrer juntos.
Ela sorriu e seus olhos brilhavam alegres.
_ Eu preciso ir por causa de meu irmão,
mas logo voltarei.
Vitório voltou ao apartamento e
encontrou Alberto no telefone, falando
com o advogado.
_ E então? – perguntou Teresa, quando
ele desligou.
_ O Dr. Júlio nos aconselhou a não ir hoje
ver Osmar.
Disse-nos que será muito bom que ele
fique sozinho com seus pensamentos.
_ Não sei se ele está certo. Tenho vontade
de vê-lo – reclamou Teresa.
_ O Dr. Júlio tem muita experiência. Pode
estar certo.
Vitório interveio:
_ Quando não sabemos o que fazer
podermos recorrer aos nossos amigos
espirituais.
Eles os olharam admirados, e Vitório
prosseguiu:
_ Vamos nos sentar, elevarmos nosso
pensamento e pedirmos aos espíritos de
luz que nos ajudem a encontrar o melhor
caminho.
Os dois concordaram, acomodaram-se.
Vitório pediu:
_ Vamos fechar os olhos e nos concentrar,
imaginando que esta sala está cheia de
luz azul.
Eles obedeceram e Vitório continuou:
_ Vamos mentalizar Osmar e imaginar
que essa luz azul o que está envolvendo,
levando-lhe energias de amor e paz.
Vamos sentir todo o amor que temos por
ele no coração e o abraçarmos com
carinho.
Nesse instante, Vitório viu o espírito de
Analú e do jovem que estava ao lado dela.
Imaginou que fosse Ronaldo que tinha
auxiliado Alberto.
Ronaldo envolveu-o e Vitório começou a
falar:
_ Sou Ronaldo. Acalmem-se e entreguem
o caso de Osmar nas mãos de Deus.
Continuem envolvendo-o com amor, mas
saibam que esta é uma grande
oportunidade para que ele tenha
sucumbido às tentações do orgulho, mas
agora já está maduro para perceber seus
erros. Seu espírito já pode construir uma
vida melhor. Alegrem-se por saber que a
vida está agindo, mostrando-lhe seus
pontos fracos e quando ele os reconhecer,
aceitar que não é tão grande como
imagina nem tão pequeno como se sente,
encontrará o equilíbrio do seu nível
espiritual e desfrutará de momentos mais
felizes.
Alberto sensibilizado, disse:
_ Você é o anjo que me ajudou. Sei que
está ajudando Osmar.
_ Sou um espírito que lhes quer muito
bem e deseja que aprendam a valorizar
as conquistas que fizeram. O orgulho
excessivo de Osmar o tem infelicitado,
mas quem de nós já terá vencido esse
mal? A inveja é fruto do orgulho e da
vaidade. E só a venceremos quando
aceitarmos a nossa realidade e a vida
como ela é. Portanto, vamos assumir
nossa responsabilidade como pessoa,
cuidar bem do nosso progresso e confiar
no futuro. Nenhum de nós pode julgar
ninguém. Mas é válido esperar pelo
melhor, porquanto a vida trabalha com
segurança para nos conduzir à conquista
da felicidade.
_ Você acha que Osmar um dia vai
entender isso? – indagou Teresa,
comovida.
_ Esqueçam o erro que ele cometeu,
mentalizem as qualidades que ele tem e
tratem de trazer para fora seu lado
melhor. Se fizerem isso, o que desejam
acontecerá mais rápido do que vocês
pensam.
_ Você vai continuar nos ajudando?
- EU e Analú estaremos sempre tentando
inspirar-lhes pensamentos elevados.
Saindo daqui, iremos ter com Osmar,
onde procuraremos ajuda-lo para que
encontre o melhor caminho.
Vitório estendeu as mãos sobre os pais e
delas saíram jatos de luz que os
envolveu, fazendo-os se sentirem
confiantes e fortalecidos.
Depois, Ronaldo afastou-se de Vitório,
que, emocionado, continuava vendo-os.
Ele abraçou os pais, sentindo vibrar o
amor que tinha no peito. Nesse instante,
uma luz branca e brilhante desceu do alto
sobre a cabeça de todos.
Analú e Ronaldo, abraçados,
contemplavam a cena radiantes. Depois
tudo se apagou e Analú deu a mão a
Ronaldo dizendo:
_ Hoje conseguimos mais uma vitória.
Sinto que Osmar desta vez vai se
recuperar e esta família poderá viver em
paz. Vitório vai se casar com Estela,
Marília com Paulo e entre todos vai existir
uma grande amizade.
_ E eu, o que acontecerá comigo?
_ Você voltará nos braços de Estela e
Vitório. Desta vez para uma vida longa e
proveitosa.
A noite já havia descido sobre a terra e as
luzes da cidade brilhavam lá embaixo,
enquanto as estrelas faiscavam no céu.
De mãos dadas. Analú e Ronaldo
deslizavam no espaço, sentindo o coração
inundado de luz e muita confiança no
futuro".

FIM.

SEMPRE-LENDO O MELHOR GRUPO DE TROCA DE LIVROS DA
INTERNET


Repostando:

          




Muita paz!

 

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