sexta-feira, 1 de maio de 2015

{clube-do-e-livro} PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO - LEOPOLDO BALDUÍNO FORMATO MOBI ,TXT EPUB

PSIQUIATRIA E
MEDIUNISM O



LEOPOLDO BALDUÍNO

PSIQUIATRIA E
MEDIUNISMO



FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA
DEPARTAMENTO EDITORIAL
Rua Souza Valente, 17


20941-040 -— Rio-RJ — Brasil


2a

edição

Do 6º ao 10º milheiro

Capa de JOÃO DAVID

B.N. 89.878
05-AA; 000.5-O; 8/1995

Copyright 1993 by

FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA

(Casa-Máter do Espiritismo)

Av. L-2 Norte — Q. 603 — Conjunto F
70830-030 — Brasília-DF — Brasil

Composição, fotolitos e impressão offset das
Oficinas do Departamento Gráfico da FEB
Rua Souza Valente, 17
20941-040 — Rio, RJ — Brasil

C.G.C. n° 33.644.857/0002-84 I.E n° 81.600.503
Impresso no Brasil

PRESITA EN BRAZILO

Pedido de livros à FEB — Departamento
Editorial, via Correio ou, em grandes encomendas,
via rodoviário: por carta, telefone

(021) 589-6020 , o u FA X (021) 589-6838 .

SUMÁRI O

Introdução 13

CAP. I — POSICIONAMENTO FILOSÓFICO ... . 23

A existência, ou não, da alma como coisa. A Lógica
Formal. O Método Científico. O Princípio da Indeterminação
de Heisemberg. Os paradoxos das partículas subatômicas.
A queda do Princípio da Causalidade em Física. O
conceito da Finalidade em Psicologia. Dualismo Psico-Físico.
Epifenomenalismo. Hilemorfismo. Funcionalismo.
Conceito de Normalidade. O fenômeno paranormal. O
mediunismo. Outras dimensões. A fé raciocinada.

CAP. II — A NATUREZA DA MENTE

50

O psiquismo na escala animal. Memória extracerebral.
O ego. As funções somáticas. As funções psíquicas.
O Sistema Nervoso Central. Sinais e sintomas de lesões
do SNC e Personalidade Pré-mórbida. A Teoria Materialista
das localizações cerebrais. O funcionamento eletrobioquímico
do SNC. A ressonância magnética. Mesmerismo.
Hipnotismo. Antimatéria. Bases extrafísicas da mente.
As diversas escolas. Teorias da Personalidade. Vias
sensoriais normais e paranormais. Sensações. Percepções.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 5


Representações. Distúrbios senso-perceptivos. Conceitos.
Juízos. Raciocínio. Conteúdos do pensamento. Emoção.
Sentimentos. Comportamentos aparente e velado.
Memória. Atenção.

CAP. Ill — O PROCESSO DA INTUIÇÃO 106

Normalidade e patologia. As funções paranormais.
Não há função sem órgão. Teoria Quântica. Teoria da
Relatividade. A derrocada da Física newtoniana, e da
Geometria euclidiana. A queda do determinismo e da
oposição cartesiana entre o eu e o Universo. Conceito
einsteiniano de campo. Síntese fectível entre Ciência, Filosofia
e Religião. A natureza dual da matéria. A natureza
dual da psique. Paradoxos da realidade subatômica. A
queda do conceito de "matéria". O fluido cósmico da Posição
Espírita. Pensamento sensório-motor. Pensamento
pré-mágico. Pensamento mágico. Pensamento egocêntrico.
Pensamento lógico. Pensamento intuitivo. A criação
artística.

CAP. IV — AS FUNÇÕES PARANORMAIS

131

Carl Gustav Jung e os primórdios do Espiritismo.
Ocorrência de fenômenos parapsicológicos na relação
médico-paciente. Caso clínico. A reação de Freud. O fracasso
da Metapsíquica nos meios acadêmicos. O período
mítico. A escola fluidista de Mesmer. O hipnotismo de
Braid. Charcot e a Histeria. Os fenômenos de Hydesville.
Allan Kardec. Rhine e a Parapsicologia. A percepção extra-
sensorial. A psicocinesia. A metodologia estatística.
Átomos mentais de André Luiz. A quarta dimensão. Analogias
entre a psique e as partículas subatômicas. A unidade
fundamental do Universo e a existência da alma
como coisa. Implicações das doenças psicossomáticas e

6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


das síndromes psico-orgânicas. O centrencéfalo como
substrato anátomo-funcional da interação mente-corpo. O
transe, sua psicofisiologia e implicações no diagnóstico e
na terapéutica.

CAP. V — AS FUNÇÕES MEDIÚNICAS

146

A refutação séria de Von Hartmann ao Espiritismo.
Escolhos ao estudo do mediunismo. O lado fraco do Espiritismo
segundo Aksakof. Todos os fenômenos mediúnicos
podem ser produzidos pelo inconsciente. Novos limites
do inconsciente. A classificação de Aksakof. Personismo.
Animismo. Espiritismo. Efeitos psíquicos, físicos e
plásticos. Desdobramento da consciência. A repressão.
Auto-sugestão. Hetero-sugestão telepática. Inibição cortical
e liberação das estruturas subcorticais. Alterações
motoras. Alterações senso-perceptivas. Alterações neurovegetativas.
Alterações de personalidade. Efeito dos
neurolépticos nos mecanismos da mediunidade. Os psico-
receptores subcorticais propostos por Cervino. Matéria
mental de André Luiz. Fluido Cósmico versus conceito
einsteniano de campo. As Leis da matéria mental. Cérebro
físico e matéria mental. As mitocondrias. Os cromossomos.
O centríolo. A substância de Nissl. O papel da
respiração. Despolarização, repolarização neuronal e mediunidade.
O mediunismo via inconsciente. Mediunismo
normal e patológico. Delírio espírita episódico. Monomanía
espírita. Valor psicoterápico do mediunismo.

CAP. VI — MEDIUNISMO E PSICOPATOLOGIA . . 177

A vida psíquica não esgota a magnitude do próprio
ser psíquico. A hipótese empirista-sensualista. O inconsciente
coletivo e as funções paranormais. A ambigüidade
da psique. A ambigüidade das partículas subatômicas.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 7


Psicofisiologia da percepção extra-sensorial. Feição simbólica
da percepção mediúnica e paranormal. A percepção
mediúnica como fruto de projeção alucinatória. Estímulos
de natureza extrafísica. Parentesco entre o material
mediúnico, os sonhos, os mitos e os sintomas patológicos.
Interferência do inconsciente na percepção mediúnica.
O transe mediúnico e a dissociação da consciência.
Mecanismo de defesa do eu. Aspectos sociológicos, antropológicos
e culturais do mediunismo. O papel das
crenças, valores e aspirações. Traços temperamentais e
de caráter. Sensações. Percepções. Representações.
Gnosias. Fantasia. Onirismo. Pareidolias. Eidetismo. Ilusão.
Alucinação. A crítica redutiva dos médicos materialistas.
Caso Schreber. Mediunismo na obra de Santa Teresa
de Jesus. Simbolismo sexual em determinados fenômenos.
Sexo e desenvolvimento espiritual. Sublimação.
Ampliação do conceito de psicose.

CAP. VII — O TRANSE FARMACÓGENO 216

Substâncias psico-ativas indutoras do transe. Psicodislépticos.
Possibilidade de fenomenologia mediúnica ou
paranormal. Banisteria quitensis. Anhalonium cewinii.
Lophophora williamsii. Cannabis indica. Escopolamina.
Cloral. Hofmann e a Claviceps purpurea. Amanita muscaria.
Riscos. Aldous Huxley. Álcool. Cafeína. Barbitúricos.
Éter. Rhine. Pavlov. Inibição do córtex com liberação das
estruturas subcorticais. Hormônios. Catecolaminas. Endotoxinas.
Exotoxinas. Anóxia. Técnicas respiratórias da
Yoga. Hipercapnia. Acidóse. Considerações psicofisiológicas
sobre a Yoga. Pontos coincidentes com a posição
Espírita. Anoxibiose. Influência da P0 2 e da PC0 2 no
psiquismo. Hipoglicemia. "Stress". Bromo. Disendocrinias.
Papel da Substância Reticulada Ascendente. Isola


8 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mento perceptivo. Estados carenciais. Adição. Neurolépticos.
Psicologia Transpessoal e coincidências com a posição
Espírita.

CAP. VIII — DOENÇA MENTAL E MEDIUNISMO . 236

Philippe de Pinel e os doentes mentais. Interpretação
naturalista das doenças mentais. Instituições assistenciais.
Reações à Psiquiatria Mecanicista. Conceito de
saúde da Organização Mundial de Saúde é ampliado
pela Posição Espírita. Reducionismo etiopatogênico. Entidades
nosológicas versus tipos sindrômicos. Filosofia intuitiva:
Kant, Scheling, Schopenhauer etc. Concepções
psicogenéticas. Biopsicologia. O inconsciente. Fenomenologia.
Funcionamento neuro-endocrínico. A posição
Espírita amplia a etiopatogenia das doenças mentais. Aspectos
teleológicos dos distúrbios mentais. A perspectiva
genética. Críticas de diversas escolas à Semiologia psiquiátrica.
Incognoscibilidade do núcleo da personalidade.
Contribuições da Posição Espírita à psicologia médica. A
vertente moral da vida de relação. A culpa como fator
morbígeno. Psicoses no Plano Espiritual. Casos clínicos
de C. G. Jung e André Luiz.

CAP. IX — DOENÇA MENTAL DE FUNDO

ESPIRITUAL

257

Concordância fundamental entre as ciências naturais
e a Posição Espírita. Intolerância religiosa versus intolerância
científica. A natureza espiritual do núcleo da
personalidade. Desenvolvimento mental e patologias de
fundo espiritual. A "matéria" espiritual. Estruturas eletromagnética
do corpo espiritual. O corpo mental. Estrutura
mental das células. Recursos de intervenção no corpo
espiritual. Etiopatogenia das doenças mentais de fundo

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 9


espiritual. Anatomofisiologia da alma. Temperamento e
caráter após a morte do corpo físico. Finalidade da reencarnação.
Histogênese do corpo espiritual. Os ovóides.
Causalidade psicológica no plano espiritual. Papel do inconsciente
na evolução espiritual. Lei de Causa e Efeito e
condicionamento operante e respondente. Psicologia do
destino de Szondi, e concordâncias fundamentais com a
Posição Espírita. Destino e mediunismo. Os genes e o
meio ambiente. Profilaxia dos defeitos hereditários. Fatores
intrínsecos e fatores extrínsecos das doenças mentais
de fundo espiritual. Neurose obsessivo-compulsiva
versus obsessão espiritual. Fascinação e possessão espirituais
segundo Allan Kardec. Simpatinas e aglutininas
mentais de André Luiz.

CAP. X — MEDIUNISMO NA INFÂNCIA

288

O papel da mãe nas sociedades industriais. A criança
rejeitada. Material psíquico preexistente na mente da
criança versus a hipótese da "tabula rasa". Hereditariedade.
Ambiente. Papel do SNC e endocrínico no comportamento
e na inteligência. Formação do ego. Aprendizagem.
Ondas mento-magnéticas das figuras parentais. A
socialização. Vida intra-uterina. Mediunismo na fase intra-uterina.
A ontogênese recapitula a filogênese. Piaget. Espiral
de desenvolvimento. "Impritting", estimulação tátil-cinética
e posterior capacidade de dar e receber afeto. Conforto
de contato à luz do Espiritismo. O magnetismo animal.
A hipótese do "vampirinho fluídico-fisiológico". Alimento
psíquico. Halo protetor. As descobertas de Spitz: Marasmo
e Depressão Anaclítica. Ribble. Rejeição. Superproteção.
Ambivalência. Reforços positivos versus estímulos
de aversão. Personalidades de vidas passadas e traços
de temperamento. Gênios precoces. Egos secundários

10 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


relacionados a personalidades de vidas passadas. Caso
clínico. Diagnóstico diferencial com a dissociação e o
"splitting". O papel da educação no desencadeamento,
ou não, de doença mental. Perturbações nervosas na infância
e atmosfera psíquica dos pais.

Concordância entre conceitos espíritas, psicologia
profunda e filosofias orientais.

Apêndice

311

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


INTRODUÇÃ O

Não se trata, no presente estudo, de uma obra filosófica
no sentido estrito da definição clássica do termo.
Não é, também, uma nova versão das variadas escolas
da Psiquiatria ou uma inédita Teoria da Personalidade,
campo vasto da Psicologia, filha caçula da Filosofia, que
realiza hercúleo esforço para se inserir no âmbito das
ciências exatas. Por outro lado, não pode ser enquadrado
na categoria de ficção científica, literatura ou obra de feição
religiosa.

Trata-se, simplesmente, de um pequeno e sumário
relatório das experiências vivenciadas ao longo de
vinte anos de prática como clínico psiquiatra, quase um
decênio como professor adjunto em Faculdade de Psicologia
e mais de trinta anos de lides espiritistas. Os
resultados de todos esses anos de esforços aleatórios
proporcionaram ao autor um sentimento de vislumbre
de uma mínima parcela da realidade psíquica do indivíduo,
e isso, talvez, seja suficiente para comunicar a outros
estudiosos os resultados alcançados.

Parece, à primeira vista, uma temeridade a tentativa
de se lançar um elo de ligação entre a Psiquiatria,
a Psicologia, a Fisiologia, a Física etc. por um lado, e

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


os fenômenos ditos mediúnicos, metapsíquicos, parapsicológicos
ou meros produtos de superstições, charlatanismo
ou excrescências psicopatológicas de personalidades
enfermas, por outro. É possível que o autor seja rotulado
como pretensioso em demasia, detentor de desmedida
ambição intelectual ou, simplesmente, portador de
algum distúrbio psicopatológico.

Contudo, as impressionantes ocorrências observadas
ao longo desses anos permitem supor que esse
testemunh o seja de real valor a tantos outros que lidam
com essa classe de fenômenos, ou tenham algum interesse
cientifico pelos mesmos, seja pela labuta diária
com doentes mentais, profissão de fé ou necessidade
interior de busca de novos parâmetros que os norteiem
em suas vidas pessoais.

Outra justificativa para escrever este ensaio é a
confusão generalizada que reina nesse campo do conhecimento
humano. Se, por um lado, a ciência acadêmica
abomina essa classe de fenômenos, por considerá-
los como meros produtos de psicopatia, quando não
de fraude ou trapaça, de outro não é incomum a observação
de pessoas adotando princípios tão obscuros e
bizarros que não raro se colocam em desacordo com a
própria corrente religiosa a que se filiam. Em "As Variedades
da Experiência Religiosa", o grande psicólogo
anglo-saxônico William James observa que "uma autêntica
experiência religiosa de primeira mão, como
esta, se destina a ser uma heterodoxia para as pessoas
que a presenciarem, aparecendo o profeta como
simples louco solitário. Se a sua doutrina for tão contagiosa
que se estenda a outros, passará a ser uma heresia
definida e rotulada. Mas se ela, ainda assim, continuar
suficientemente contagiosa para triunfar da per


1 4 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


seguição, converte-se-á em ortodoxia; e quando uma religião
se converte em ortodoxia, o seu dia de interiorização
já se foi: a fonte secou; os fiéis vivem exclusivamente de
uma fé de segunda mão (...)" Esse notável psicólogo observou
a quase universalidade do ódio inato ao estranho
e aos homens excêntricos e não-conformistas, e a paixão
por impor a lei na forma de um sistema teórico absolutamente
fechado. Esses aspectos idiossincrásicos da natureza
humana tendem a ser em parte dissolvidos pelas experiências
autênticas.

Outro obstáculo é o fato de pessoas portadoras
de graves distúrbios psicológicos terem uma tendência
atávica pelas correntes que lidam com fenômenos ditos
paranormais. É comum, em Psicopatologia, a observação
de portadores de idéias delirantes de feição mística,
com ou sem distúrbios senso-perceptivos. Aqui,
Mira Y Lopez diz que a "distância entre o sublime e o
ridículo não vai além de um passo". Talvez esse seja o
motivo para a alegoria de ser a senda difícil e estreita
como o fio de uma navalha.

Além disso, o sofrimento de milhões de pessoas a
necessitarem de cuidados psicoterápicos, nos serviços
de pronto-atendimento ou ambulatoria!, especializados
ou gerais, ou em grupos de ajuda de feição mediúnica,
cabines de passes, curadores psíquicos etc., por si só
justifica plenamente um estudo dessa natureza.

É, no Brasil, muito grande o número de boas clínicas
médicas ou psiquiátricas de orientação espírita.
Cresce, a cada ano, o número de médicos, psicólogos,
sociólogos, antropólogos, assistentes sociais etc. adeptos
do Espiritismo ou de outras correntes de feição espiritualista.
Existem mais de cem Hospitais Espíritas de
Psiquiatria no país. Fortaleza, Palmeio, Morrinhos,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Goiânia, Anápolis, Jataí, Brasília, Rondonópolis, Paranaíba,
Campo Grande, Campos, Rio de Janeiro, Belo Horizonte,
Uberaba, Curitiba, Campina Grande, Porto Alegre,
São Paulo, Franca, Araraquara, Barretos etc, são exemplos
de cidades que possuem instituições dessa espécie.
No Estado de São Paulo, esse movimento é tão amplo,
que existe uma "Federação dos Hospitais Psiquiátricos
Espíritas do Estado de São Paulo". Todas essas instituições
funcionam a contento, com profissionais idealistas e
competentes, devidamente fiscalizadas pelos Conselhos
Regionais de Medicina tanto em seus fundamentos técnico-
científicos como ético-profissionais, punindo até mesmo
profissionais que não seguem esses preceitos, conforme
fatos de ampla repercussão nacional através da
imprensa.

As dificuldades, tanto teóricas quanto práticas,
são imensas para quem quer que se proponha a lidar
nessa área. Exemplificando, tem-se o quadro das neuroses
histéricas, com crises dissociativas da consciência.
Não é fácil o diagnóstico diferencial entre uma dissociação
de fundo neurótico e um possível transe mediúnico
autêntico, onde também ocorre uma dissociação
fisiológica, não necessariamente patológica. Uma
conduta simplista poderá não impedir, nessas personalidades,
a eclosão de quadros psicopatológicos mais
graves, tanto de fundo organopsicogenético quanto de

natureza espiritual. Essas possibilidades serão discutidas
mais pormenorizadamente nos capítulos subseqüentes.


Não é raro a ocorrência de personalidades finas,
sensíveis, portadoras de dons mediúnicos serem interpretadas,
por terapeutas de mentalidade organicista,
como portadoras de confusão mental, incapacidade de

1 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


distinguir a realidade da fantasia, distúrbios senso-perceptivos
ou mesmo distúrbios de pensamento etc. Após
uma avaliação mais complexa, com a aplicação de testes
psicométricos, exames especializados, tais como tomografia
computadorizada etc, um diagnóstico presuntivo é
firmado, com o que advém o uso de medicação tranqüilizante,
antidepressiva ou mesmo neuroléptica. Em resumo,
uma personalidade fina, sensível e complexa é rotulada
como portadora de algum tipo de doença mental e
tratada como tal.

O inverso também costuma acontecer. Uma pessoa
portadora de grave disfunção mental ou orgânica
procura um grupo de cura psíquica pouco esclarecido,
que prescreve tratamento de natureza exclusivamente
espiritual, recomendando a suspensão de necessários
procedimentos de ordem médica. O autor ouviu o relato
de um conhecido médium, que foi procurado por paciente
portador de Epilepsia Criptogenética, e com crises
somente controláveis com elevadas dosagens de
anticomiciais. Orientado pelo guia espiritual, de origem
alemã (?), o médium suspendeu a medicação neurológica,
sob o inquestionável argumento de que se tratava
de um caso conhecido como obsessão espiritual. Com
a suspensão abrupta da medicação, o cliente entrou
em quadro de status epiléptico, com crises subentrantes,
vindo a falecer, provavelmente por edema cerebral.

Apesar das dificuldades serem tremendas e, aparentemente,
insuperáveis, isso não invalida o pressuposto
socrático do "conhece-te a ti mesmo". Essas dificuldades
aparentemente insuperáveis somente poderão
ser superadas a partir de uma atitude interior de
isenção e humildade. A atitude do Cristo, diante da leviana
pergunta de Pilatos a respeito do que seria a ver-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


dade, não poderia ser mais eloqüente: o silêncio. Certamente
que a penetração psicológica do condenado captou
muito bem que o interrogante não possuía olhos de
ver nem ouvidos de ouvir, conforme expressão do próprio
Evangelho.

Diante do exposto, o direcionamento do presente
trabalho seguirá uma linha eminentemente empírica,
tendo como roteiro o bom senso aliado às experiências
pessoais do autor. Outros poderão discordar, de um
lado e de outro. Por isso, as idéias aqui expostas devem
ser tomadas como mero ensaio, sem qualquer

pretensão além de comunicar uma experiência pessoal,
de natureza profissional.
Segundo o psicanalista junguiano Progroff, inúme


ras questões devem ser discutidas ao se tentar uma
abordagem do tema aqui proposto, embora a Psicologia
Complexa de Jung não tenha admitido oficialmente

o mediunismo, mas não pode evitar o confronto com fenômenos
estranhos, a que denominou Sincronicidade.
Quais são os tipos de fenômenos mediúnicos? De
que forma aparecem? Quais são as suas características
particulares? Que fatores os introduzem ou lhes
dão sua forma cristalizada? Existem características especiais
que permitam reconhecer eventos mediúnicos
no instante em que estão prestes a ocorrer? Quais são
os processos por meio dos quais os eventos mediúnicos
acontecem? É correto falar em processo na medida
em que o princípio em questão é um princípio não-material,
pelo menos no sentido comum do termo? Há necessidade
de novos termos para a compreensão do fenômeno?
Existe a possibilidade de que as pessoas desenvolvam
uma habilidade maior de fazer com que
ocorram eventos mediúnicos? E qual é a vantagem em

1 8 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


fazê-lo? Quais os riscos que essa prática implica? Será
possível desenvolver uma sensibilidade maior ao funcionamento
do processo mediúnico? Podem-se desenvolver
meios de entrar em relação mais estreita com ele? Convém
dizer que o conceito junguiano de sincronicidade difere
do conceito espírita de mediunismo, embora, no julgamento
do autor, alguns fenômenos sincronísticos possam
ser classificados como mediúnicos.

Em relação aos postulados teóricos em que se
baseiam as observações que aqui serão feitas, existe,
por um lado, a Psiquiatria Clínica, inserida no campo
mais vasto das Ciências Médicas, embasada na Fenomenologia,
Anatomia, Fisiologia, Endocrinologia, Genética,
Farmacologia etc. Contudo, a maioria dos psiquiatras
concordam que a Psiquiatria, enquanto um ramo
da Medicina, não atende às necessidades de uma mais
profunda e abrangente compreensão do indivíduo. Destarte,
serão também levados em conta os avanços das
correntes psicológicas das profundezas, isto é, que admitem
que a personalidade humana é um conjunto muito
maior do que o faz supor a mera descrição fenomenológica
da vida de relação ou de suas bases anatômicas,
funcionais e sociais.

Dessas correntes, que admitem a existência de
instâncias inconscientes, o autor mais proeminente é o
grande psiquiatra suíço Carl Gustav Jung que, segundo
a opinião abalizada de Hall e Lindzay, "(...) é o psicólogo
mais em evidência, depois de Freud, e a sua influência
nos meios acadêmicos tem crescido de modo
impressionante depois de sua morte nos anos sessenta"
("Teorias da Personalidade").

Do outro lado serão básicos os postulados do Espiritismo
científico, tal como o sistematizaram A. Kardec,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 1 9


A. Aksakof e outros, dando-se especial destaque à impressionante
coletânea do autor espiritual André Luiz.
Isso porque, no entendimento do autor, é a Posição Espírita
a mais simples, concisa, eficiente e de maior poder
heurístico entre as diversas escolas espiritualistas,
além, como já foi dito, do seu extraordinário desenvolvimento
no país.
Progroff assinala que os eventos sincronísticos,
em linguagem junguiana, são muito mais comuns do
que se supõe, ocorrendo de maneira trivial e sem que
sejam percebidos ao longo de toda a vida pessoal. Eles
afetam de maneira decisiva o destino pessoal de várias
formas, não necessariamente reconhecíveis, porque
não são, geralmente, estudados à luz da sincronicidade,
ou do mediunismo, ou outra terminologia específica.
O fato ou o motivo de passarem em geral tão despercebidos
é o de não se saber o que realmente se
procura ver, ou compreender, ou descobrir. Para tal é
preciso "listenning with the third ear" como dizem os
ingleses.

Quem desconhece uma história semelhante à da
pessoa que está tentando se tornar um artista e que,
por isso, reúne suas escassas economias e vai morar
num quarto, esperando poder vender um quadro antes
que o dinheiro acabe? Ela, porém, não consegue vender
nenhum quadro, e o seu dinheiro se esgota. Mas
no momento em que está desistindo de sua arte, já em
desespero, chega um telegrama avisando que um parente
distante faleceu deixando-lhe uma pequena herança?
(Progroff).

Esse exemplo demonstra o quanto ocorrências triviais
e aparentemente fortuitas podem estar carregadas
de significado, o que leva à hipótese de não serem

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


meras coincidências. Esse modo de interpretar não tem
nada a ver, do ponto de vista psicopatológico, com as
"percepções delirantes", tão bem analisadas pela Fenomenologia.
Coincidências estatisticamente significativas,
portanto passíveis de ser submetidas à análise matemática,
foram bem demonstradas por J. B. Rhine, da Duke
University, e reconhecidas pela Associação Americana
de Psicologia como cientificamente válidas.

Saindo do campo da normalidade e adentrando
no baldio terreno do patológico, Jung afirmava em 1959
que "(...) sabemos muito pouco sobre os conteúdos e a
importância dos produtos mentais patológicos e, contra

o pouco que sabemos, temos ainda certos preconceitos
teóricos". Essa impressionante afirmativa foi feita
após cinqüenta anos da mais profícua labuta psiquiátrica
de que se tem registro.
O presente ensaio é baseado na vivência e da
prática diária, ao longo de duas décadas, no campo na
clínica psiquiátrica. Todavia, mais que as experiências
e pressupostos teóricos, o pensamento do autor é direcionado
peias vivências pessoais, de caráter subjetivo,
difíceis, portanto, de ser transmitidas em níveis meramente
cognitivos. Contudo a Moderna Física já demonstrou
que a dicotomia cartesiana entre o ego do
experimentador e o seu experimento não tem o menor
embasamento nos fatos, pois no Universo somente
existe uma realidade da qual faz parte a mente e a subjetividade
do observador. Essa descoberta fundamental
da Física das partículas confirma os pressupostos da
Posição Espírita, como será visto mais adiante.

Solicita-se ao leitor relevar a feição sumária e esquemática
do presente trabalho, que não pretende esgotar
o assunto, em si mesmo inesgotável. Simples-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 2 1


mente sugere, à luz da experiência do autor, na apaixonante
labuta com a alma enferma, um posicionamento
holístico. Assim, o escopo deste ensaio é contribuir com
idéias e sugestões para futuros especialistas, terapeutas
ou não, no sentido de alargar os horizontes ainda demasiado
estreitos das ciências médicas em relação à alma
de seus clientes.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


I
POSICIONAMENTO FILOSÓFICO


A abordagem do tema proposto implica grandes dificuldades,
tanto teóricas quanto práticas, devido ao fato
de se ter que partir de aspectos objetivos, tais como o
corpo, com sua anátomo-fisiologia bem definida, ou o
comportamento aparente do indivíduo para, em seguida,
adentrar as variáveis subjetivas, englobando, finalmente,
aquelas funções conhecidas como mediúnicas, paranormais,
sincronísticas ou simples coincidências ou erros de
julgamento, como querem crer os céticos.

É conveniente, portanto, a fim de se evitar cair num
emaranhado de conceitos obscuros ou mal definidos, o
delineamento do posicionamento filosófico que irá nortear
as interpretações dos fenômenos que serão aqui analisados.
É conveniente frisar que a exposição dos temas
abordados evitará, na medida do possível, especulações
e sutilezas teóricas, atendo-se o mais possível à análise
objetiva e pragmática dos fenômenos. Isso sem se cair
na atitude simplista de cunho emocional como a do próprio
Freud, quando repreendeu o seu discípulo favorito
Jung, alegando que tudo não passava de "bobagens"

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


("Memórias, Sonhos e Reflexões", Jung). Não é possível,
ao abordar um tema tão singular, passar vista larga a
uma postura filosófica a nortear a interpretação científica
desses fatos.

Do ponto de vista da Filosofia, é de grande importância,
para a compreensão do comportamento humano,
a questão de ter o homem alma ou não, e, se a tem, em
que sentido. Essa questão é certamente das mais difíceis
de ser abordadas em face dos inumeráveis preconceitos
e prejuízos intelectuais que elicia, e uma definição bem
clara do posicionamento filosófico subjacente contribuirá
muito, tanto na aquisição de uma compreensão mais acurada
do tema como de uma maior tolerância para com
aqueles que pensam e julgam de um modo diverso, com
igual razão, dentro de seus parâmetros.

Essa postura, aliás, é imprescindível aos procedimentos
de mútua ajuda, aparando arestas e pontos de
atrito; nos processos psicoterapêuticos não apenas dirigidos
às pessoas que sofrem de problemas mentais, como
também àquelas em estágios dolorosos de amadurecimento
ou reajustamento pessoal, social e espiritual.

No presente capítulo pretende-se demonstrar que
uma sólida convicção acerca das realidades espirituais,
ou mesmo as diversas atitudes de fé, e uma conseqüente
postura religiosa perante o destino pessoal e coletivo não
são, de modo algum, uma irracionalidade absurda como
quer crer a maioria das pessoas de mentalidade científica
ou simplesmente materialista. Julgar que a crença na sobrevivência
da alma seja um contra-senso não passa de
um preconceito, fruto de uma postura intolerante e parcial.
Do ponto de vista estrito da Lógica Formal, tanto é
correto supor verdadeira a hipótese da sobrevivência da
alma como não. A correção lógica de uma dedução racio


2 4 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cinada não implica a veracidade da mesma. Apenas a
evidência dos fatos poderá confirmar, ou infirmar, a correção
dessa hipótese, e contra fatos não podem existir argumentos.


Esse, aliás, é um dos critérios fundamentais para o
diagnóstico do pensamento delirante, em Psicopatologia.
Exemplificando, tanto a teoria de Darwin, como a de La-
mark, a respeito da evolução das espécies, são corretas
do ponto de vista lógico. Mas, somente a primeira é aceita
como verdadeira, pelos naturalistas, à luz dos fatos e
dos dados coletados ao longo dos anos em todas as latitudes.


É axiomático que contra fatos não podem existir argumentos,
e se alguns fatos são incomuns, impossíveis
de ser repetidos em condições controláveis, ou mesmo
em contradição com as teorias vigentes, isso não implica,
em absoluto, que sejam falsos. Ao ser indagado sobre as
provas da sua notável Teoria da Relatividade, Albert
Einstein declarou que ainda não possuía nenhuma, mas
apenas evidências matemáticas, e que ela seria considerada
válida somente enquanto pudesse explicar os fenômenos
observados, e que, se apenas um fenômeno contrariasse
os seus postulados básicos, toda ela deveria ser
posta de lado como falsa. Com isso ele tipificou a mais
importante atitude científica: humildade. Essa pureza
científica é muito rara de ser encontrada, mesmo nos
meios acadêmicos.

Ao ingressar, o autor, na Faculdade de Medicina, a
primeira aula programada seria uma introdução à Histologia
animal. Qual não foi a surpresa, quando o eminente
catedrático passou a "demonstrar" que Deus não existe,
e que o Método Científico é incompatível com o obscurantismo
das superstições religiosas. Com notável prele-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ção conseguiu enorme "sucesso", diante de uma platéia
com escassa formação científica. É interessante notar
que o referido professor é detentor de impressionante bagagem
técnico-científica, e, contudo, poderia ser descrito
como um iconoclasta inveterado. Para ele, os compêndios
de Histologia, internacionais, eram todos cheios de
erros, imprecisões e incongruências, desaconselhando
os alunos a adquirirem tais compêndios. Estranhamente,
porém, o notável professor não escrevera uma obra sequer,
para suprir tão lastimável lacuna.

Esse exemplo é típico da mentalidade dominante
nos meios acadêmicos, onde o correto é a atitude cética
e a denegação de tudo o que não seja passível de ser
submetido aos rigores espasmódicos do Método Científico.
Qualquer fenômeno que não se enquadre nesses parâmetros
é encarado com raivosa suspeita e quem se
atreve a estudá-los tem a reputação comprometida. O curioso
é que a rainha das ciências exatas, a Física das
partículas, adentrando a tessitura íntima da matéria, deparou-
se com um paradoxo composto dos fenômenos
mais estranhos e ilógicos, como se estivesse diante de
uma fenomenologia de natureza "parafísica", como será
visto com maiores detalhes mais adiante. Todavia esse
negativismo sistemático das mentalidades científicas
mais proeminentes não tem a menor justificativa, do ponto
de vista da própria metodologia científica. É o que será
demonstrado nos próximos parágrafos.

Na primeira metade do século XX, o notável físico-
químico Heisemberg descobriu o desconcertante
"Princípio da Indeterminação", que levou o seu nome. Estabeleceu
que não se pode, com exatidão, determinar o
momento e a posição de um electrón em torno do núcleo
atômico, em determinado instante. Somente é possível

2 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


determinar meras probabilidades estatísticas, e o conceito
de orbitais atômicos cedeu lugar ao moderno conceito
de nuvens eletrônicas. Essa descoberta provocou enormes
conseqüências, tanto do ponto de vista teórico quanto
prático.

O antigo Princípio da Causalidade, pedra angular da
metologia científica newtoniana ruiu, cedendo lugar ao
Princípio da Indeterminação. Em outras palavras, a Lei
de Causa e Efeito perdeu seu primado no campo das
ciências exatas e, conseqüentemente, em termos científicos,
não se pode propor nenhum enunciado, em termos
absolutos. A certeza perdeu seu assento no bojo do edifício
do conhecimento humano. Permaneceu apenas a
probabilidade de aproximações tangenciais das realidades
últimas do Universo porque, matematicamente, sempre
haverá a possibilidade de um determinado fenômeno,
observado milhares de vezes, apresentar um comportamento
outro que não o verificado anteriormente.

Exemplificando, a maçã madura, observada por
Newton, que se desprende do seu talo, tem apenas uma
probabilidade de cair de encontro ao solo, que se aproxima
da unidade, sem nunca atingir essa unidade anteriormente
inquestionável. À luz do Princípio da Indeterminação,
permanecerá sempre a probabilidade estatística
dela se comportar de um modo completamente estranho,
como ir parar dentro de um recipiente hermeticamente fechado,
por exemplo. Esse comportamento aparentemente
absurdo é observado, diariamente, pela Física Moderna,
em relação às partículas subatômicas, por meio dos
gigantescos aceleradores de partículas, as quais se comportam
de uma maneira totalmente absurda à luz da Lógica
Formal.

Uma tentativa séria de se levar essas extraordiná-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


rias descobertas ao campo da Psicologia foi realizada por

C. G. Jung, ao admitir um funcionamento psíquico de natureza
teleológica e, claro, o quase impenetrável conceito
de sincronicidade. Esse caminho foi preparado filosoficamente
há mais de três séculos por David Hume, ao demonstrar
que causalidade não é "alguma coisa que vemos
realmente, mas apenas uma dedução da nossa
mente". Exemplificando, tudo o que de fato se percebe é
que uma bola de bilhar toca outra com uma certa força e,
em seguida, essa se afasta. Na realidade não se vê a
causalidade, mas apenas se deduz (Progroff). Destarte, a
causalidade pode ser apenas um "hábito social de pensamento",
o que não deixa também de ser um paradoxo.
Convencido de que a causalidade não mais poderia
ser aceita como uma realidade absoluta em si mesma,
Jung voltou sua atenção para métodos culturais que encaram
a vida em termos não causais. Contudo, até mesmo
o estudo deles, por razões válidas, do ponto de vista
científico, é considerado suspeito e, em razão disso, Jung
foi alvo de muita zombaria. Para os meios acadêmicos,
ainda são considerados superstições conceitos como
acaso, coincidência, realização de desejos, cognição
através dos sonhos, preces e atendimento delas, curas
através da fé, precognição, fenômenos mediúnicos e outros.
Malgrado esse ceticismo, essas experiências perfazem
uma grande porcentagem dos eventos cotidianos
que ocorrem não só nas assim chamadas sociedades primitivas,
mas também na moderna civilização ocidental
(Progroff).

Quando acadêmico de Medicina, o autor foi criticado,
com sarcasmo, por um professor do Departamento de
Psiquiatria, por ter ajudado a um colega por meio de passes.
Certa vez, muitos anos depois de graduado, foi pro-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


curado por um colega, bastante probo e competente,
aliás, um protótipo de "bom médico samaritano", que
combatia os conceitos junguianos. Ao ser indagado sobre
qual a obra de Jung que havia lido e que mais o havia impressionado
negativamente, respondeu, para perplexidade,
que nenhuma. Em relação à literatura espiritista, então,
a ignorância é desalentadora nos meios acadêmicos.
Aliás, o hábito da leitura e da meditação tem-se tornado
tão raro, mesmo nos meios universitários, que o prêmio
Nobel de Literatura, Herman Hesse, em sua notável obra
"O Jogo das Contas de Vidro", previu que a humanidade
poderia entrar em uma nova idade média cultural, em
face da incompetência e da irresponsabilidade das futuras
gerações.

Indo além da causalidade, Jung desenvolveu um
ponto de vista teleológico para a interpretação do inconsciente,
e dos problemas que a Psicologia sugeria, mas
não tinha condições de responder, perante a comunidade
científica, e ele foi levado ao conceito de sincronicidade.
Contudo, essa hipótese é apresentada de modo ambíguo,
contraditório, com avanços e recuos teóricos, apenas
sugerindo que existe "algo" mais. O obscurantismo
do pensamento junguiano foi a única maneira encontrada
para a introdução dessas realidades no pensamento
científico dominante. É interessante recordar o furor desencadeado,
na comunidade, pelas desconcertantes descobertas
da Física Moderna, ao derrubar os edifícios
newtoniano e euclidiano até então considerados como
inamovíveis.

Essa tática evitou, certamente, que os escritos de
Jung tivessem o mesmo destino da Metapsíquica de Charles
Richet, William Crookes e outros eminentes sábios dessa
época. Assim, apesar de transformar o reducionis-

PSIOUIATRIA E MEDIUNISMO


mo causal da Teoria Psicanalítica de Sigmund Freud em
uma interpetação teleológica do psiquismo e do destino
do homem, passando pela audácia de incluir os princípios
ainda imponderáveis, que agrupou no conceito de
sincronicidade, Carl Jung, no julgamento autorizado de
Hall & Lindzay "é o psicólogo mais em evidência, depois
de Freud, na comunidade científica internacional" ("Teorias
da Personalidade"). Esse fato é deveras surpreendente
e — por que não dizer? — paradoxal.

Não se pode passar por alto o fato de que Jung
pesquisou o mediunismo, tendo até mesmo publicado
uma monografia sobre o assunto, e encontrou no I Ching
uma das bases experimentais da sua hipótese da sincronicidade.
Como se pode muito bem observar em sua autobiografia,
Jung era, ele mesmo, portador de impressionantes
dons mediúnicos, mas é provável que a comunidade
científica não estivesse preparada para revelações
de natureza tão transcendentais, daí a sua proposital ambigüidade.


O fato é que o I Ching ainda é muito pouco conhecido
nos meios ocidentais. Trata-se de uma metodologia
ou técnica similar ao fenômeno das mesas girantes, responsável
pela difusão do Espiritismo na Europa. O método
do I Ching possui a vantagem de ser mais facilmente
submetido à análise quantitativa, tal como as cartas Zener,
da Parapsicologia, e de não ter caído em desuso,
como as mesas girantes. De maneira geral, os fenômenos
ditos de efeitos físicos, pela Posição Espírita, tornaram-
se bastante raros, nos dias atuais, além de dificilmente
poderem ser submetidos à quantificação matemática.


Voltando ao Princípio da Indeterminação de Heisenberg,
se se tentasse estabelecer, com exatidão, a

3 0 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


probabilidade da sobrevivência da alma, após a morte,
seria necessário resolver uma equação matemática que
suplanta as possibilidades atuais da mente humana. Isso
não implica, em absoluto, sua impossibilidade. Nem mesmo
as equações de onda das nuvens eletrônicas das
mais simples moléculas foram ainda matematicamente
solucionadas. Conseguiu-se algum progresso no que
toca às nuvens eletrônicas de alguns átomos mais simples.


Essas questões levantam problemas teóricos que
somente as gerações futuras poderão resolver. Contudo,
pode-se afirmar, sem medo de errar, que, no estágio
atual do conhecimento científico, tanto é incorreto o fanatismo
de alguns crentes, como o negativismo inveterado
de alguns céticos, que refutam mesmo a probabilidade de
os fenômenos existirem. Ambas as atitudes não são cientificamente
corretas, mas podem ser classificadas como
erros de julgamento. Quase sempre essas idiossincrasias
são determinadas por emoções e conflitos inconscientes.

É provável que uma atitude mais acertada e equilibrada
seja uma interpretação equidistante dos fatos, embora,
parodiando Shakespeare, o coração tem razões de
que a razão nada sabe. E ficam desautorizados, pois, os
cientistas materialistas mecanicistas, pelo próprio Método
Científico, de prejulgarem teorias, hipóteses ou convicções
contrárias às suas. E sob pena de incorrerem em grave
erro de julgamento, a menos que sejam tão radicalmente
unilaterais como Lavoisier, ao afirmar que, se visse um
cadáver ressuscitado, morreria mas não acreditaria, porque
"sabia" que tal era "impossível".

A Física Moderna levou o conhecimento humano a
níveis tão profundos, em relação às partículas subatômicas,
que se tem um "feeling" de que se está, do ponto de

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


vista da ciência oficial, no limiar de novos planos de existência,
perante o Universo, tais como outras dimensões,

o contínuo espaço-tempo, o hiperespaço, a antimatéria, a
matéria irradiante etc. E por que seria "impossível" a existência
de processos mentais nessas realidades apenas
vislumbradas pela Física Moderna?
À atitude de ceticismo exacerbado, aliado a uma
obstinada recusa em aceitar fatos ou evidências que impliquem
a confirmação da hipótese da sobrevivência da
alma como sendo possível, ainda que de modo remoto, o
autor denominou "Complexo de Lavoisier". Em termos
psicodinâmicos, esse ceticismo possui a mesma natureza
do fanatismo religioso, intolerante, em sua pugna secreta
contra as dúvidas que corroem os sentimentos. Ambos
encerram, em sua estrutura psíquica, mecanismos psicológicos
de defesa do eu, destinados à denegação da realidade,
para defesa do instável e falso equilíbrio interno.
Aliás, as bruscas conversões, tanto aos sistemas religiosos
quanto aos materialistas, tendem a confirmar essa
suposição.

Do ponto de vista da Filosofia, todas as maneiras de
se pensar a respeito desses complexos problemas podem
ser reduzidas a cerca de cinco correntes filosóficas
gerais: o Dualismo Psicofísico, que se subdivide em Interacionismo
e Paralelismo, o Epifenomenalismo, o Hilomorfismo
e o Funcionalismo (Malpass "O Comportamento
Humano").

O Dualismo Psicofísico, que também pode ser denominado
como a filosofia do senso comum ("Common
sense"), consiste na proposição de que o homem é composto
de duas substâncias distintas: mente e corpo. Ele
admite a existência da alma como coisa. A dificuldade do
Dualismo Psicofísico consiste em explicar como se rela


3 2 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cionam essas substâncias entre si, e os seus adeptos seguem
duas soluções distintas: o Interacionismo de Descartes
e o Paralelismo de Geaulinex. Essas noções de Filosofia
são básicas para uma melhor compreensão do
mediunismo, à luz da Posição Espírita, conforme será
visto com maiores detalhes mais adiante.

O Epifenomenalismo interpreta a mente como um
mero epifenómeno do cérebro físico, isto é, um subproduto
do funcionamento do sistema nervoso central. A Posição
Espírita considera o cérebro apenas como instrumento
da mente no plano físico e admite também a existência
de um cérebro no corpo espiritual, ou psicossoma, ou perispírito.


O gigante espiritual da antiguidade grega Aristóteles,
discípulo de Platão, propôs explicar a mente como
um atributo da forma do corpo humano: Hilomorfismo.
Exemplificando, o cão e o gato possuiriam mentes diferentes
devido às diferenças morfológicas de seus organismos.
Do mesmo modo, uma mesa difere de uma cadeira
exclusivamente devido às diferenças formais existentes
entre as suas partes constituintes. Assim, para o filósofo
grego, a alma é um subproduto da anatomia do
corpo físico.

O notável psicólogo John Dewey propôs uma interpretação
materialista extremada, o Funcionalismo, alegando
que não há necessidade da suposição de ter o homem
uma mente, como coisa, mas simplesmente funções
mentais, para a interpretação correta do comportamento
humano. Desse posicionamento surgiu a importante e
mais científica corrente psicológica, o Behaviorismo. Para
Dewey, basta o estudo de aspectos, tais como pulsões
biogênicas, memória, atenção, reflexos etc , não existindo
a necessidade da suposição de ter o homem coisas

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


tais como mente, alma etc. O importante aqui é o estudo
do comportamento aparente, através dos estímulos, das
respostas condicionadas, incondicionadas, do condicionamento
respondente, operante etc. Juntamente com a
corrente reflexológica pavloviana, entre outras, intentaram
esses cientistas do comportamento a criação de uma
psicologia sem alma. É interessante notar que os mecanismos
por meio dos quais atua a denominada Lei de
Causa e Efeito parece seguir as linhas mestras de algumas
das descobertas fundamentais do Behaviorismo.

As três últimas correntes filosóficas são adeptas do
materialismo científico e têm na matéria seu princípio fundamental,
refutando a existência da mente no sentido de
substância separada do corpo material. Convém lembrar
que, para a Posição Espírita, o corpo espiritual também é
material, se bem que num sentido diferente, conforme
será analisado nos próximos capítulos. O campo das
ciências que estuda a alma (psyché) é a Psicologia, filha
da Filosofia, e é natural que os especialistas sejam influenciados
pelos diferentes posicionamentos filosóficos
subjacentes, pois é sabido que o pensamento filosófico
sempre precede a experimentação científica.

Assim fica claro porque, modos diversos de pensar,
levam necessariamente a diferentes interpretações de
um mesmo fenômeno. Além disso, hábitos de pensamento,
condicionamentos culturais, necessidades afetivas,
distorções perceptivas e meio ambiente também influem
decisivamente nas conclusões individuais. Um exemplo
concreto pode ser a marcação de um pênalti duvidoso,
ou não, numa partida decisiva de um campeonato de futebol.


A Teoria Psicanalítica de Sigmund Freud tem uma
postura paradoxal Materialista por definição do seu pró


3 4 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


prio criador, adota conceitos nitidamente dualistas tais

como conversão, projeção, transferência, deslocamento

etc. Talvez por esse motivo alguns de seus oponentes,

tais como Van den Berg, digam que o inconsciente do pa


ciente é o consciente do psicanalista. Como se pode ob


servar, as conseqüências heurísticas dessas proposições

são imensas, mas foge ao propósito do tema um maior

detalhamento dessas conseqüências.

Os espiritualistas, de um modo geral, são adeptos

do Dualismo Psicofísico. embora um número considerá


vel aceite uma proposição unicista, também denominada

Monismo. tal como Pietro Ubaldi, os dualistas psicofísicos

dizem que o homem se locomove com o corpo físico,

mas pensa com a mente, ou alma etc. Assim, tudo no

Universo cai numa dessas duas categorias, ou seja, a

dualidade espirito-matéria e a sua correspondente dicoto


mia mente-corpo. Os antigos gregos já se aprofundavam

nessas discussões e criaram conceitos, tais como

"psykhé" e "physis"

Todavia, do ponto de vista da Lógica Formal, o fato

de duas partes ou aspectos de uma mesma coisa serem

distintas não prova que sejam separáveis. Assim, o fato

de a alma ser distinta do corpo não implica necessaria


mente que ela seja separável do mesmo Exemplificando,

esta página e as letras que a compõem são duas coisas

distintas, mas, ao se destruir a página de papel, as letras

necessariamente desaparecerão. Ficariam as idéias, e

Platão já dizia que. com a morte, há uma separação entre

o corpo, putrescível, e a alma. eterna matriz das idéias.
Assim, pelo caminho estrito da Lógica, a resposta à
questão da sobrevivência da alma, ou não, depende exclusivamente
do uso que cada um faça de suas percepções,
sensações, representações, juízos e raciocínios

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Os maiores pensadores de todos os tempos chegaram a
conclusões bem diversas: Platão com o Dualismo Psicofísico
e Aristóteles com o Hilomorfismo.

À primeira vista, tais questões parecem áridas e insossas,
tais como as discussões escolásticas medievais.
A prática clínica, contudo, ao lidar com os horrores do sofrimento
produzido pela patologia mental, demonstrou, a
muitos, que elas possuem importância fundamental, para

o alívio do sofrimento, na medida em que auxilia ou determina
qual o sentido e o propósito do destino individual.
Jung descobriu que, a partir da segunda metade da vida,
o sentido e o propósito existenciais, de maneira geral, e
uma orientação de certa maneira religiosa perante a vida
são poderosos fatores na profilaxia dos distúrbios psíquicos.
Mesmo que se considere a religião como mero fruto
de sugestão, os grandes neurologistas, tais como Char-
cot, Janet, Bernhein e Freud já demonstraram o seu valor
terapêutico. Marx também considerou a religião como um
anestésico para o sofrimento das classes proletárias;
mas "Sedare dolorem opus divinus est".
Em última análise, contudo, não se pode afirmar
que a Posição Espírita seja uma proposição dualista, no
sentido estrito do termo. Segundo ela, o princípio material
e o espiritual estão interligados por uma relação unívoca.
Não se opõem entre si, mas se complementam. A diferença
de nível cria como que um "declive", que permite a
manifestação e o movimento dos Espíritos, também no
plano material. Certamente, esta, é a maior vantagem do
Espiritismo sobre a maioria dos sistemas tanto religiosos
quanto filosóficos. Ele vai além, ao afirmar que o alto e o
baixo estão associados às noções de valor moral, de caráter
tanto relativo quanto universal, o que conduz à diferença
entre o superior e o inferior, ou, como queira, entre

3 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


o bem e o mal. Quanto mais elevados os planos, mais dinâmicos
os processos e fluxos de energia. Essa progressiva
gradação de complexidade pode ser exemplificada,
concretamente, pela música, que, iniciando nos níveis inferiores
dos ritmos simples dos batuques, progride até as
culminâncias das grandes cerebrações filarmônicas, a se
expressarem por meio de extraordinárias combinações
melódicas, indescritíveis padrões de harmonia, a compor
o ritmo que expressa a introdução de uma ordem cósmica
no caos dos sons e ruídos desagregados. Essa concepção
é semelhante à do milenar receptáculo da sabedoria
chinesa, o "I Ching", tão bem traduzido, para o alemão,
por Richard Wilhelm.
Conforme salientou Progroff, os terapeutas perspicazes,
que têm olhos de ver e ouvidos de ouvir, costumam
observar, mais freqüentemente do que se supõe, fenômenos
que não se enquadram nas categorias comuns
de tempo, espaço e causalidade. Esses fenômenos, por
serem incomuns, extrapolam o conceito estatístico de
normalidade, expresso em termos estritamente matemáticos,
mas não são necessariamente patológicos. Outros
conceitos de normalidade existem, que não o estatístico,
como o de ideal desejável, ou então o de ausência de sofrimento.


Na obra "Psicogênese das Doenças Mentais", Jung
cita o caso de um rapaz, portador de Dementia Praecox,
que, não suportando mais os horrores e os tormentos, impossíveis
de serem captados por mentes saudáveis, resolvera
suicidar-se. Para tal, subira no alto de um edifício
e se preparava para se jogar pelos ares quando ouviu
uma voz, imperativa, conclamando-o a desistir de seus
propósitos.

Concomitantemente sentiu um violento empurrão,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 3 7


transmitido por um tapa na região torácica O paciente
caiu de costas e desistiu, de pronto, de realizar seu propósito,
fruto de compreensível desespero.

Para o paciente, tratava-se de um fenômeno de realidade
indiscutível. Acontece que, para espanto do médico,
o tórax deixava transparecer as marcas das mãos
que aplicaram violento tapa. Jung interpreta o fato como
uma vivência alucinatória, provocada por um fragmento
da personalidade, razoavelmente saudável, que não encontrara
outro meio de impedir a consumação do ato tresloucado,
fruto dos aspectos mais doentios do paciente.
Destarte houve um caso bastante raro, em Psicopatologia,
de concomitância de alucinações auditivas (psicosensoriais
de Baillarger, com estesia etc.) e alucinações
táteis (a sensação do tapa no tórax).

Contudo, uma análise mais aprofundada do fenômeno
constatou as marcas, na epiderme, deixadas pela
presumida alucinação tátil. Jung, prudentemente, parou
por aí, na descrição do fato. Certamente, por saber muito
bem que estava lidando com um fenômeno tabu. Aliás, a
própria doença mental é considerada tabu na maioria das
culturas. Contudo, a coragem de Jung, ao relatar tão desconcertante
fenômeno, foi enorme. Cerviño relata que Pierre
Janet fez experiências de sugestão hipnótica a distância
e encontrou a confirmação irrefutável do fenômeno, mas
se absteve de publicar os resultados, temendo prejuízos
para a sua reputação.

O autor foi médico de vôo em uma base aeronáutica
onde operavam aviões de caça supersônicos, que desenvolviam
velocidades de quase três vezes a velocidade do
som. Pôde constatar que inúmeros objetos voadores não
identificados eram eventualmente detectados pelos pilotos,
atravé s dos radares de suas aeronaves que. após a

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


caça. nada encontravam. O interessante é que tais pilotos,
oficiais graduados, abstinham-se de transcrever tais
ocorrências em seus relatórios de vôo, temendo conseqüências
negativas para o futuro de suas carreiras.

Os temas tabus, estranhas ocorrências não usuais,
como demonstrou Timberg, em suas experiências naturalistas,
tendem a despertar sentimentos de medo, curiosidade
e hostilidade nos membros de uma comunidade.
Contudo, essas experiências foram realizadas em animais,
e recebem a válida crítica aos raciocínios por analogia.
Submetendo o caso relatado por Jung, que não é
tão incomum como se supõe, a uma análise psicopatológica,
fica algo que não pode ser completamente explicado
pelas Ciências Médicas. Ora, sabe-se que as alucinações
nada mais são do que falsas percepções. Segundo
Baillarger, são fruto de uma sensação de origem interna,
de mecanismo cerebral e não periférico, produzida de
dentro para fora, embora seja vivenciada pelo eu, de
modo errôneo e, conseqüentemente, patológico, como
proveniente do mundo objetivo, sendo, portanto, secundariamente
projetada no mundo exterior.

O caso relatado por Jung possui as três características
básicas das alucinações psicossensoriais descritas
por Baillarger, ou seja, estesia (caracteres sensoriais),
espacialidade (distância, orientação, perspectiva etc) e
erro de julgamento (tomadas pelo eu como fenômenos
objetivos e não subjetivos).

Contudo existe aqui um outro elemento, estranho,
que não costuma ocorrer nos processos alucinatórios, estando,
pois, fora do conceito de alucinação: as marcas no
tórax, que poderiam ser tomadas como indício presuntivo
da existência real de um tapa. Aqui, a penetrante análise
psicopatológica não explica a contento. Jung, prudente-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 3 9


mente omitiu a interpretação do estranho fenômeno. A
não ser que se interprete a existência das marcas como
conseqüência de uma reação fisiológica, urticariforme,
da epiderme, diante de uma violenta emoção ou necessidade
interior: a autoconservação. Ou então, alguém, ou o
próprio paciente tenha desferido o tapa. Entretanto, a
anamnese cuidadosa pareceu excluir a última hipótese.

Contrariamente a Tertuliano, que afirmava crer porque
sabia que era impossível, certamente sem algum traço
de Complexo de Lavoisier, não é de modo algum anticientífico,
nem supersticioso, admitir-se HIPÓTESE da intervenção
de forças inteligentes, e de natureza moral,
oriundas de um outro plano dimensional do Universo. O
princípio da Indeterminação de Heisemberg permite atravessar
o Rubicão, sem se deixar de lado o Método Científico.


Fatos como esse não são incomuns. Pela Posição
Espírita, o fenômeno relatado por Jung extrapola o campo
estrito da psicopatologia e adentra a categoria dos assim
chamados fenômenos mediúnicos. Esses fenômenos
não ocorrem com regularidade, são difíceis de ser quantificados,
a menos que espetaculares, e em geral não são
susceptíveis de ser repetidos pela experimentação em
condições controladas. São como o vento, inesperados e
imprevisíveis.

Não é, todavia, científico negar-lhes simplesmente a
existência devido a essas caraterísticas desconcertantes.
O seu estudo, do ponto de vista da metodologia científica,
apresenta dificuldades, por enquanto, quase insuperáveis.
Isso não implica que devam ser negligenciados,
especialmente por aqueles que lidam com o doente psiquiátrico.


Entre as conseqüências dessas influências, em Psi


4 0 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


copatologia, tem-se a forma de "inexplicáveis" impulsos
para agir, inibições, idéias obsessivas, alucinações, fala
ou escrita automática e mesmo fenômenos psicossomáticos.
Myers denominou-os de automatismos sensorial,
motor, emocional ou intelectual. Contudo, todos eles podem
ter origem na vida marginal da consciência ordinária,
mais conhecida como zona do inconsciente, descoberta
através dos estudos em pacientes histéricos, por Char-
cot, Binet, Janet, Breuer, Freud, Mason, Prince, Jung e
outros. Para esses autores, tais fenômenos seriam conseqüentes
à sugestão, pronunciada sensibilidade emocional
ou tendência a automatismos. Segundo Freud, o
mecanismo básico seria a repressão, do ponto de vista
psicodinâmico.

Segundo William James, se houver poderes superiores
aptos a impressionar-nos, eles só poderão obter
acesso a nós pela porta subliminal (op. cit.). Esse notável
psicólogo diz que "A mim me parece que os limites mais
distantes do nosso ser mergulham numa dimensão inteiramente
outra de existência do mundo sensível e meramente
compreensível. Chamem-lhe região mística, ou região
sobrenatural, como quiserem. Na medida em que os
nossos impulsos ideais se originam dessa região (e a
maioria deles se originam dela, pois vemos que eles nos
possuem de um modo que não podemos explicar articuladamente),
nós pertencemos a ela num sentido mais íntimo
do que aquele em que pertencemos ao mundo visível,
pois, estamos ligados, no sentido mais íntimo, ao que
quer que pertençam os nossos ideais. Não obstante, a
região em apreço, invisível, não é meramente ideal, pois
produz efeitos neste mundo."

Mais adiante, "O voltar-se para um plano mais alto é
um ato distinto de consciência. Não é uma experiência

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


vaga, crepuscular, semiconsciente. Não é um êxtase; não
é um transe. Não é uma superconsciência no sentido vedântico.
Não se deve ao auto-hipnotismo. É uma transferência
da consciência, perfeitamente calma, sadia, racional,
sensata, dos fenômenos de percepção dos sentidos
para os fenômenos de vidência, do pensamento do eu
para uma esfera evidentemente mais alta... Tomo a dizer,
não é hipnotismo" (op. cit. págs. 318, 319.) "Essa visão
inteiramente pragmática da religião, entretanto... toda vez
que faço isso, ouço o monitor murmurando., a palavra
"bobagem" (idem).

Contudo, além do adjetivo "bobagem", costumam
receber, os fenômenos estranhos que serão estudados
mais adiante, por parte dos alienistas, o rótulo tranqüilizador
de "pathos". Aliás, talvez seja de interesse transcrever
a antipatia mórbida de Nietzsche pelas pessoas diferentes.


"Os doentes são o maior perigo para os sãos. Os
mais fracos, e não os mais fortes, são a ruína dos fortes...
os mórbidos são o maior perigo; não os homens
maus, não os seres predatórios (...)"

William James considera os fenômenos mediúnicos,
tais como a escrita profética, a escrita automática ou o
transe etc , como parte de uma categoria mais vasta a
que denominou de estados místicos de consciência, caracterizados
por inefabilidade, qualidade noética, transitoriedade
e passividade (op. cit. págs. 237, 238).

As tradições antigas, desde os tempos imemoriais,
tinham pleno conhecimento de que a categoria dos fenômenos
ditos sobrenaturais encerra riscos pessoais, ao
serem pesquisados. O principal deles é justamente o

pathos", dos alienistas. O mito de Teseu, adentrando o
labirinto do Minotauro, coadjuvado pelo fio de Ariadne

4 2 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


bem poderia simbolizar o eu percorrendo os meandros
obscuros do seu próprio inconsciente, defrontando-se
com as tendências regressivas, indutoras de psicose, ou
as forças destrutivas de regiões além dos limites da própria
personalidade individual, que os espiritistas denominam
Umbral.

Aqueles habituados nas lides dos serviços psiquiátricos
poderão compreender melhor o significado dessas
advertências Aqui também entra um outro problema de
capital importância em psicopatologia, geralmente desconsiderado
pela maioria dos especialistas: a questão do
bem e do mal. A saúde ou a doença da vida de relação
passa necessariamente por essas questões, por uma escala
de valores inerente à natureza individual, e não apenas
introjetada a partir dos valores culturais, como quis
crer Freud, com a sua noção de superego.

Personalidades imaturas, com um ego frágil, ou
com defeitos de natureza estrutural, geneticamente determinados,
não devem ser incentivados às práticas psíquicas,
segundo Allan Kardec.

Existe um tipo raro de personalidade que, apesar de
incomum, não é necessariamente patológico: são os denominados
sensitivos, paranormais, médiuns ou "sujets".
A esses está indicado o difícil caminho da confrontação
com as forças ocultas, tanto de natureza inconsciente,
quanto espiritual.

A alegoria de Teseu no labirinto descreve o ego em
um processo de expansão através da assimilação do
conteúdo do inconsciente, a que Jung denominou de Processo
de Individuação, e geralmente ocorre a partir da
segunda metade da existência, ou seja, após a maturidade
biológica. Esse processo pode não dar certo, levando
a uma regressão patológica, com possibilidade de disso-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 4 3


lução psicótica da função da realidade simbolizada pelo
fio de Ariadne. Se, ao contrário, as forças saudáveis, de
crescimento, são vitoriosas, o ego incorpora a tremenda
carga da energia inconsciente, transformando-se num ser
excepcionalmente forte e produtivo. Em geral, as religiões
denominam esse processo como iluminação espiritual.

Continuando a tentativa de construção de uma ponte
ou elo de ligação entre as ciências naturais, por um
lado, e a Posição Espírita, por outro, além da fenomenologia
mediúnica ou dos estados alterados de consciência,
existe um outro fator de inestimável valor. Trata-se do fenômeno
psicológico da fé. É uma vivência psíquica complexa,
oriunda das camadas profundas do inconsciente,
geralmente de feição constitucional, inata, por se tratar
mais de um traço de temperamento do que do caráter do
indivíduo. No dizer de J. J. Benitez, as pessoas que têm
fé fazem parte do pelotão de choque, a vanguarda dos
movimentos espiritualistas. Nas fases iniciais ela é de um
valor inestimável, mas à medida que a personalidade
atinge estados mais diferenciados de consciência, pode
ser dispensável, pois a pessoa não apenas crê, mas
sabe.

Segundo William James, a reação produzida por
coisa do pensamento é, notoriamente, em muitos casos,
tão forte quanto a produzida por presenças sensíveis.
Pode ser até que seja mais forte: "A lembrança de um insulto
talvez nos deixe mais zangados do que nos deixou

o próprio insulto quando o recebemos" (op. cit). É como
se uma barra de ferro, sem tato nem vista, sem nenhuma
faculdade representativa, pudesse, apesar disso, ser vigorosamente
dotada da capacidade de perceber a energia
eletromagnética de um imã nas suas proximidades. O
mesmo se dá com as personalidades mediúnicas.
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Do ponto de vista psicológico, a vivência da fé pode
ser considerada mista, pois engloba tanto aspectos cognitivos
quanto afetivos. Faz parte mais do temperamento
do que do caráter do indivíduo. Por isso é impossível de
ser transmitida por meios intelectuais, tal como a persuasão
raciocinada. Pode ser induzida pela sugestão, apelo
emocional ou experiências excepcionais, bem como pela
interação com pessoas individuadas. O fenômeno da
conversão foi muito bem descrito em capítulo especial na
obra citada de William James. Como foi dito, o Cristo demonstrou
profunda penetração psicológica ao responder
à leviana indagação de Pilatos sobre o que era a verdade
com um eloqüente silêncio.

Felizmente, para os céticos, as ciências matemáticas
e naturais estão adentrando o campo dos eventos incomuns,
mágicos, sincronísticos, mediúnicos, paranormais
etc. Isso se deve aos experimentos clássicos de J.

B. Rhine, na Duke University. Suas descobertas são cientificamente
irrefutáveis, e como tal foram reconhecidas
como válidas pela Associação Americana de Psicologia.
Apesar de tudo, as pesquisas parapsicológicas são
dispendiosas e ainda enfrentam forte preconceito entre
grande número de pessoas de mentalidade científica, e
não é raro a Parapsicologia ser utilizada não como uma
pesquisa científica pura, mas como um instrumento de se
provar ou refutar correntes religiosas ou não. Existe uma
tentativa conhecida de se tentar refutar o Espiritismo por
meio dessas extraordinárias descobertas. A falta de isenção
e os prejuízos intelectuais são incompatíveis com a
metodologia científica.

Infelizmente as pesquisas parapsicológicas despertaram
o interesse da comunidade de informação internacional,
especialmente das superpotências, que tentam a

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 4 5


sua utilização com finalidades políticas, e é possível que
a utilização desses conhecimentos, com finalidades destrutivas,
represente, para o futuro da humanidade, um perigo
tão grande quanto o do domínio da energia nuclear

Um outro caminho para a constatação das realidades
espirituais é o da experimentação espírita Já houve
uma séria tentativa nesse sentido, com a Metapsíquica
dos grandes sábios do século passado, tais como C. Richet.
C. Lombroso, W Crookes. entre outros. Por utilizar
fenomenologia excepcional, obtida com o concurso dos
grandes médiuns da época, não passível de repetição
sob condições controladas, não foi aceita pela comunidade
científica Connan Doyle faz um brilhante relato dessa
época em sua notável obra "História do Espiritismo", que
merece ser estudada em profundidade.

Contudo, especialmente nos países latinos, o Espiritismo
experimentou extraordinária difusão, após a sistematização
iniciada por Allan Kardec. seguido por Leon
Denis, Alexandre Aksakof e outros. A prática mediúnica é
provavelmente o método mais simples de se pesquisar
as funções espirituais da mente humana No Brasil a prática
do mediunismo é extraordinariamente difundida, e
deve ser levada em conta pela comunidade cientifica
pelo menos como fenômeno cultural de elevada complexidade.
Por que um número tão grande de pessoas são
adeptas do mediunismo? Qual a sua dinâmica psicológica,
que o torna tão contagioso? Quais os seus efeitos na
vida diária de seus adeptos? Tem ele algum valor psicoterápico?
As vivências mediúnicas possuem significado
psicopatológico. e qual o seu significado? O que dizer
dos sinais e sintomas mentais comprovadamente patológicos
e de patoplastia espírita? Tem o mediunismo algum
valor na profilaxia dos distúrbios mentais? Qual a sua im-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


portância em Saúde Pública? As curas comprovadas são
meramente efeito da sugestão? E assim por diante.

Uma outra possibilidade prática, também muito em
voga no ocidente são as práticas das diversas modalidades
da Yoga. Tais disciplinas incluem métodos de treinamento
psicofisiológico, que são comprovadamente indutores
de estados alterados de consciência, os quais
transcendem as noções de tempo, espaço, causalidade
etc , oferecendo condições empíricas também susceptíveis
de comprovar a dualidade psicofísica do homem
Contudo, também aqui. as dificuldades metodológicas
são enormes. Mira Y Lopez diz que a distância entre o
sublime e o ridículo não vai além de um passo. Quais os
critérios cientificamente válidos para o diagnóstico diferencial
entre um iluminado, um tolo que pensa que é iluminado
e um psicótico, com ideação delirante paranóide
de feição mística?

A grande pesquisadora francesa Alexandra David-Néel
escreveu, em co-autoria com o Lama Yongden, um interessante
estudo antropológico, romanceado, sobre usos
e costumes do Tibet. Descreve um monge recluso em
uma gompa, sempre a usar um zen esfarrapado, habitando
um quarto miserável, e considerado pela comunidade
monástica como — "Um louco, um verdadeiro louco, diziam
os trapas com comiseração vagamente desprezível
(...)" Mais adiante. "Mipam falava-lhe. mas ele parecia
não ouvi-lo e o jovem devia deixá-lo. sem ter obtido uma
palavra ou um olhar, sem que parecesse sequer perceber
sua presença Outras vezes, ao contrário, o velho dava-lhe
conselhos ou ensinamentos que ele desejava, antes
mesmo que se tivesse manifestado a esse respeito. Mas.
falando ou calado, uma força pacífica emanava dele. Mipam
sentia a dirigindo seus pensamentos, iluminando os

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 4 7


problemas escuros que resistiram às suas investigações
e levantando véus atrás dos quais entrevia imagens imprecisas
de uma vida diferente daquela que estava levando"
("O Lama das Cinco Sabedorias"). O autor conheceu,
no Brasil, uma personalidade com algumas dessas caraterísticas,
indefiníveis, por serem inefáveis, mas inconfundíveis.
Trata-se do conhecido médium de Pedro Leopoldo,
Francisco Cândido Xavier.

Contudo, mesmo os fenômenos mediúnicos mais
espetaculares não são, em absoluto, insentos de dúvidas
e suspeitas as mais variadas. Em sua notável obra autobiográfica
"No país das Sombras", E. d'Espérance revela
suas dúvidas atrozes, as quais a acometeram após uma
profícua vida dedicada ao mediunismo, com as mais extraordinárias
materializações de que se tem notícia. Após
longo e insidioso tormento, provocado por dúvidas atrozes,
experimentou um estado alterado de consciência, de
tipo extático, muito bem descrito pela autora em sua autobiografia,
após o qual conseguiu superar as suspeitas
de auto-ilusão e entrar em fase de grande bem-estar. A
crise existencial de feição depressiva, descrita pelo médium,
ilustra um dos escolhos da mediunidade.

Outras pessoas atingem a fé por meios tortuosos,
com o uso de substâncias neurodislépticas, ditas psicodélicas,
eidéticas, psicotomiméticas etc. Essas substâncias
são conhecidas desde tempos imemoriais e fazem
parte do patrimônio cultural de diversos povos primitivos.
Michael Harner, Carlos Castañeda, Aldous Huxley, entre
outros, realizaram estudos aprofundados nesse campo.
Existe um ramo importante da Psicologia, denominada
Transpessoal, que também trata do assunto, destacando-se,
entre outros, Stanislav Grof.

O fenômeno da Adição e do Alcoolismo ilustra os

4 8 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


riscos inerentes a essas substâncias psicoativas, cujo
uso foi criminalizado pelas legislações vigentes na maioria
dos países. Convém ressaltar que a Posição Espírita
tem dado importante contribuição tanto ao diagnóstico
como à terapêutica das farmacodependências.

Finalmente, o escopo do presente capítulo é o de
desarmar as mentes, tentando clarificar o fato de que o
verdadeiro pensamento científico deve primar pela clareza,
precisão, eficiência, simplicidade, logicidade, e ser,
acima de tudo, isento e imparcial, livre de prejuízo, preconceito
ou prevenção de qualquer espécie.

Mais adiante serão dados novos argumentos, a partir
dos modernos avanços das Ciências Naturais, em favor
de uma maior abertura das mentes para a categoria
dos fenômenos incomuns, cujas caraterísticas fogem aos
rigores da metodologia estatística, sem que isso implique,
de modo algum, a sua infirmação. A nova argumentação
científica tende a corroborar os pontos de vista aqui expressos,
a partir da Filosofia.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 4 9


II
A NATUREZA DA MENTE


No capítulo precedente foi visto como as diferentes
interpretações da mente dependem, em última instância,
do posicionamento filosófico subjacente a cada uma das
diferentes teorias científicas que tentam explicar o homem
e sua vida de relação. Para alguns teóricos, a mente
e uma forma organizacional da matéria orgância; para
outros, um mero epifenõmeno do funcionamento do aparelho
neuroencefálico. ou então um simples conjunto fechado,
porém não isolado, de funções mentais. Para os
autores materialistas, simplesmente não há necessidade
alguma da suposição da existência da mente como substância,
para que se possa explicar o comportamento humano.


Foi dito. no capítulo precedente, que o ponto de vista
filosófico admitido no presente estudo é aquele que
considera a mente como coisa, isto é. algo que tem exis
tência "per se". Contudo, a simples adjetivação de um
evento não implica a elucidação dos enigmas que ele encerra
Haverá alguma coisa, no mundo fenomênico. mais
enigmático do que a mente 7

5 0 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Se a mente existe como coisa, qual é a sua natureza?
Ocupa ela um lugar no espaço7 Ou seria ela imponderável,
como querem crer alguns? Quais seriam os mecanismos
do seu funcionamento? De que espécie de
substância ela se compõe? Que tipo de energia a impulsiona?
Estaria limitada às dimensões do mundo material
contidas no "continuum" espaço-tempo einsteiniano?
Como se vê, um sem-número de questões podem ser levantadas,
e, com certeza, explicar como a mente funciona
é bem mais difícil que explicar a eletricidade.

Os cientistas aprenderam como dominar os rios.
construir gigantescas usinas hidroelétricas com o intuito
de transformar a energia hidráulica em eletricidade, e,
com ela, dinamizar as economias dos povos e promover

o progresso; mas em que a eletricidade consiste, ainda
está em descoberto. Pelo menos ninguém nunca a viu.
Náo se pretende aqui elucidar esse complicado mistério,
mas o contato diário com pessoas que sofrem os
tormentos de sintomas, tais como ansiedade, depressão,
fobias, obsessões, ideações delirante-alucinatórias etc ,
obriga a uma tentativa de melhor entendimento do que se
supõe ser a mente, para que melhor se possa compreender
e auxiliar Com notável capacidade de penetração, o
psiquiatra holandês Van den Berg afirma que. em geral,
os terapeutas não entendem nada daquilo que se passa
na mente de seus clientes Essa válida crítica pode ser
estendida não somente a todos aqueles que lidam com
portadores de distúrbios mentais, mas à comunicação de
um modo geral, entre pessoas dentro dos parâmetros da
normalidade. Talvez possam ser excluídos desse conjun
to de cegos psíquicos alguns poetas e escritores geniais,
que decifram a alma humana Exemplificando, um excelente
tratado de Psicopatológia, de feição literária, pode

PSIQUIATRIA E MLDIUNISMO


ser encontrado na obra de Dostoiewsky, intitulada "Crime
e Castigo". Aqui, mais do que nunca, a atitude de humilde
aceitação da própria ignorância individual, socrática,
deve ser a norma.

Visando a uma maior objetividade, será tentado o
método da aproximação tangencial do problema, partindo
do estudo dos componentes aparentes do comportamento
humano, procurando, a seguir, um aprofundamento até
a natureza intrínseca da mente, embora se possa adiantar
que não existem elementos suficientes, tanto teóricos
quanto práticos, para a elucidação desse grande mistério.
Em seguida à apresentação de conceitos de natureza
psicológica, será tentada uma ponte que permita uma
síntese com os aspectos espirituais da personalidade humana.


Onde começa o psiquismo na escala animal? Num
ser, quais são os fenômenos psíquicos? A consciência, a
adaptação comportamental, a memória, a vontade, os impulsos,
a inteligência, a atenção, os juízos, as emoções,
os sentimentos etc. fazem todos parte do psiquismo.
Contudo, se esses atos ou qualidades são de natureza
psíquica, não definem o que seja a psique em si. Pode-se
dizer, numa linguagem técnica, que os fenômenos psíquicos
seriam a resultante da organização pessoal, a qual
incorpora a experiência à anatomia e à homeostasia internas
("Encyclopédie Médico-Chirurgicale"/"Psychiatrie").

Contudo, essa definição da Psiquiatria francesa
peca pela simplicidade, uma vez que a criança, ao nascer,
não é uma simples tabula rasa, como querem crer,
mas já traz em si esfuziante vida psíquica, se bem que de
natureza reflexa. Um dos mais ilustres opositores dessa
idéia redutiva da vida psíquica infantil, oriunda da Psiquiatria
Mecanicista, é certamente C. G. Jung, com a sua

5 2 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Teoria dos Arquétipos. A Posição Espírita vai além com a
hipótese da reencarnação, trazendo, o nascituro, nos porões
da memória pregressa, todo o repositório das experiências
pretéritas, tanto de passadas reencarnações,
como da vida em erraticidade, no plano espiritual.

Na obra "Autobiografia de um Yogue", Paramahansa
Yogananda, grande mestre hindu, relata que "como se
enganam os adultos ao avaliarem o alcance de um cérebro
infantil, julgando que ele se limita apenas aos brinquedos.
A fermentação psicológica, não encontrando
possibilidade de se expressar através de meu corpo imaturo,
dava origem a muitas e obstinadas crises de choro.
Recordo-me da desorientação e do assombro que meu
desespero provocava em toda a família" (...) "Minhas recordações
mais antigas abrangem traços anacrônicos de
uma encarnação anterior. Lembro-me claramente de uma
existência longínqua — a de um iogue entre as neves do
Himalaia."

O grande alcance de memória de Yogananda não é,
em absoluto, um caso único. Existe um relato impressionante
do maior psiquiatra de todos os tempos, C. G.
Jung, em sua autobiografia "Memórias, Sonhos e reflexões."
Alucinações mnêmicas? Fabulações? Fenômeno do
"déjà vu?" Ilusões mnêmicas? Paramnésia? É mais fácil,
para os especialistas, cair na tentação de rotular o incomum,
mas um rótulo, por mais pomposo que seja, não
explica a natureza intrínseca do fenômeno.

Jung não aceitava a hipótese de que o recém-nascido
seja uma tabula rasa. Afirmava que todos trazem consigo,
do berço, as funções arquetípicas, como infra-estrutura
do futuro arcabouço da personalidade do indivíduo.
Segundo ele, no processo de formação do ego, tomam
parte não somente a estimulação sensorial oriunda do

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 5 3


meio ambiente, mas também as funções inatas da psique.
A teoria dos Arquétipos não entra em colisão com a
Posição Espírita, mas ambas se complementam, na visão
do autor. Posteriormente será visto que, segundo o Espiritismo,
esse substrato original de natureza psíquica jaz
no cérebro do corpo espiritual do nascituro.

Destarte, a diversidade de corpos é ínfima, se comparada
com a diversidade de psiquismos, devido à plasticidade,
ao dinamismo e à história pregressa dos mesmos.
Contudo, não será lícito discordar de H. Ey, que diz
que a condição fundamental da organização psíquica é o
sistema nervoso, sede da vida de relação. É claro que,
sem órgão, impossível se torna a função.

As funções somáticas e psíquicas formam uma continuidade
com grandezas mais ou menos intercambiáveis
entre si, em ambos os sentidos. Como a mente determina
às funções somáticas, ou é, por sua vez, por elas condicionada,
é óbvio que ela não seja uma substância imponderável,
nem imaterial, como querem crer alguns. Claro
que o termo matéria aqui deve ter um significado mais
amplo que o convencional, de forma que se possa explicar
a transcendência da psique a certas contingências,
tais como espaço, tempo, causalidade, energia etc. Não
se pode mais ignorar os resultados das pesquisas parapsicológicas,
realizadas em condições controladas,
dentro dos mais rigorosos parâmetros do método científico.
Apontam também na mesma direção ocorrências de
natureza mediúnica, sincronísticas, etc.

As funções instrumentais da vida de relação, isto é,
as denominadas funções mentais, encontram o seu órgão
de expressão no sistema nervoso central. Assim sendo,
alterações neurológicas podem produzir alterações
mentais as mais variadas. Afecções, tais como infecções

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


(meningites, encefalites), toxinas endógenas ou exógenas,
traumatismos cránio-encefálicos, acidentes vasculares
cerebrais etc. podem ocasionar um comprometimento
do córtex cerebra\, que por sua vez poderá desencadear
sinais e sintomas mentais ou reações psicológicas aos
fatores de incapacidade neurológica.

Contudo, os neuropatologistas e psicopatologistas
constataram, com certa perplexidade, que uma mesma
lesão cerebral pode provocar um certo padrão psicopatológico
num determinado paciente, quadros completamente
diversos noutros pacientes, ou ainda alterações mínimas
ou nulas em outros. Essa desconcertante constatação
foi explicada como sendo devida ao padrão básico
da personalidade pré-mórbida de cada paciente. Certamente
que essa dedução é correta, mas, se a personalidade
se assentasse exclusivamente no aparato neurológico,
ela seria insuficiente, mesmo considerando o moderno
conceito do funcionamento unitário e global do sistema
nervoso central.

Se for considerada a hipótese de que a mente se
assenta, em última instância, em um aparato pluridimensional,
tal como o cérebro perispiritual, proposto pela Posição
Espírita, essa e outras tantas questões se clarifi
carn. Todavia, fica de pé a questão de qual a natureza
desse "cérebro" extrafísico e de como ele interage com o
sistema nervoso central. Essa intrigante questão será vista
mais adiante, quando se poderá constatar o imenso
potencial heurístico da Posição Espírita.

Concordando com os modernos avanços da Neurofisiologia
e da Psicofarmacologia, o Espiritismo concorda
com o pressuposto de que as funções psíquicas estão
assentadas sobre bases, em última instância, de natureza
bioquímica Essas bases se localizam não somente no

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


citoplasma dos neurônios, mas também nas sinapses,
com o papel fundamental desempenhado pelas aminas
neurotransmissoras, e formadoras de circuitos funcionais
a representar a vida de relação, tanto na saúde como na
doença. A Psicofarmacologia revolucionou a terapêutica
dos distúrbios mentais, nas últimas décadas.

Também é bastante conhecido o fato de que, em diversas
culturas, drogas de natureza psicodislépticas são
utilizadas com finalidades místicas. A obra psicografada
por Wera Krijanowski, "La reine Hatasou", descreve as
impressionantes peripécias de Horemseb, ao utilizar uma
planta com substância psicoativa, orientado pelo feiticeiro
hiteno Tadar.

Assim, o substrato das funções psíquicas compreende
as atividades químicas e elétricas do cérebro humano.
Contudo, não foi ainda possível identificar a maioria
dos mecanismos neurofisiológicos responsáveis pelas
ditas funções mentais, tendo a Psiquiatria francesa classificado
o cérebro como sendo uma "boite noire cybernetique".
Com bilhões de neurônios, cada um com dezenas
de milhares de ligações sinápticas, o sistema nervoso
central está além das possibilidades atuais de análise
científica, pelo menos em relação aos aspectos superiores
do seu funcionamento. Exemplificando, segundo
Schreibel, na substância reticulada ascendente, para
cada neurônio existem cerca de 27.500 conexões sinápticas.
Como o total de neurônios do SNC é avaliado em 14
bilhões, pode-se apenas imaginar o grau de complexidade
das bases anatomofuncionais da psique humana.
Acoplando-se os aspectos extrafísicos, essa complexidade
ultrapassa os limites do concebível.

Diante do exposto, qualquer postura de certeza e

5 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


autosuficiencia no campo do estudo do comportamento
humano deve ser encarada com reservas.

Bergouignan e Picard afirmam que, em se satisfazendo
às necessidades metodológicas requeridas, é inútil
querer reduzir os fenômenos psicológicos às condições
anatomofisiológicas que lhes dão origem, do mesmo
modo que é erróneo querer refutar, "a priori", toda correlação
entre essas duas ordens de fenômenos: psíquicos
e fisiológicos. Como exemplo desse raciocínio, pode ser
citado o fato de uma mesma lesão neurológica, em indivíduos
diversos, manifestar-se por meio de sintomatologia
singular, em cada um deles.

A mesma meningo-encefalite sifilítica difusa poderá
se traduzir por sintomas assaz diversos, como uma euforia
expansiva ou uma depressão estuporosa ou pela simples
deterioração psíquica, sem qualquer consideração
anatomo-patológica (Peters).

Em relação aos tumores cerebrais, análises estatísticas
mostram que, sobre esse fundo comum, as manifestações
psíquicas dependem grandemente da personalidade
pré-mórbida do indivíduo canceroso. Já foi dito que,
à luz das realidade extrafísicas, esse quadro aumenta em
complexidade, em proporções geométricas, tanto no
campo da Semiologia como em relação ao prognóstico,
terapêutica etc.

Segundo Guiraud, deve-se, portanto, resguardar de
uma "dicotomia tentadora, mas pueril", que destituiria as
doenças psiquiátricas do substrato anatomopatológico,
mesmo que em grande número esse substrato seja impossível
de ser diagnosticado. Essa postura em nada se
choca com a Posição Espírita, paradoxalmente, pois, de
acordo com ela, é possível a existência de alterações
anatomopatológicas, induzidas por energias ou fluidos

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 5 7


de natureza espiritual. Esse tema será abordado mais
adiante.

Da perspectiva da ciência oficial, contudo, não é
possível colocar, de um lado, as doenças mentais lesionais
exógenas e organogênicas, em oposição às doenças
mentais endógenas ou psicogenéticas (EMC). Exemplificando,
epilepsia endógena idiopática e epilepsia exógena
sintomática (idem). Essa oposição não tem base
científica. Como foi visto, no capítulo precedente, essa
base científica, avocada pela Psiquiatria, tem na atualidade
um valor relativo, probabilístico, apenas. Não se deve,
entretanto, excluir os aspectos etiológicos que traduzem
a mobilização intracelular de certos mediadores químicos,
tais como as catecolaminas, elementos capitais no
funcionamento do cérebro, e, portanto, psíquicos. Mais
adiante será visto que os psicofármacos devem o seu poder
de indução de alterações do estado psíquico graças a
propriedades de ressonância biomagnética no plano espiritual,
se é que se possa falar nessa terminologia tão incomum,
ou neologística.

Deixando para trás a perspectiva da ciência oficial,
e adentrando o domínio do Espiritismo propriamente dito,

A. Luiz afirma que o ponto de intersecção entre o cérebro
físico e o espiritual são os corpúsculos intracelulares, localizados
no protoplasma, citando principalmente a substância
de Nissl, entre outras. Esse tema será visto nos
próximos capítulos.
Os dados anatomopatológicos que serviram de suporte
para os formuladores da Psiquiatria Clássica, materialista
e mecanicista, tais como Bayle, Baillarger, Griessinger
e outros sáo hoje considerados caducos pela própria
ciência oficial. Se a anatomia patológica permitiu decifrar
o domínio das psicoses sintomáticas, as psicoses

5 8 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


funcionais não mostraram seus segredos nem mesmo à
microscopia eletrônica. Os dados levantados pelas pesquisas
médicas tem infirmado a teoria materialista das localizações
cerebrais. Para os alienistas mecanicistas, o
protótipo da Paralisia Geral Progressiva não pode ser generalizado,
como queriam eles.

Outra linha de pesquisa científica que também produziu
resultados pouco alentadores, do ponto de vista
dos mecanicistas, foram os estudos radiológicos, em que
pese aos enormes avanços das técnicas e da metodologia
alcançados por essa especialidade. Os resultados
dos diversos autores, do mesmo modo que os estudos
histopatológicos clássicos, são altamente contraditórios.
Todavia, alguns achados anatomopatológicos, ainda que
raros, demonstraram a íntima relação entre o arcabouço
somático e as funções psíquicas. Mais adiante será visto
como isso se dá, da perspectiva espírita.

Exemplificando, a dilatação do terceiro ventrículo,
na encefalopatia gasosa, produz um quadro de esquizofrenia
dito deficitário. Também lesões da Pia-máter, com
espessamento da meninge e aderência ao tecido nervoso,
produz alterações psíquicas variadas. Tumores do
terceiro ventrículo e lesões do hipotálamo posterior foram
achados em casos de mutismo e acinesia, com perda total
da atividade motora.

Certas leucodistrofias (atrofia da substância branca)
também pode levar a síndromes esquizofreniformes. Nos
casos das intoxicações exógenas tem-se a necrose bilateral
dos núcleos pálidos pelo monóxido de carbono, bastante
comum nas tentativas de suicídio, bem como lesões
bilaterais das regiões anteriores do Cíngulo. Também essas
lesões podem provocar quadros clínicos esquizofreniformes.
Quanto às terapias biológicas, podem produzir,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


raramente, lesões no Sistema Nervoso Central, embora
sejam tidas comumente como produtoras apenas de modificações
estruturais inteiramente reversíveis.

Como a pesquisa anatomopatológica tradicional em
Psiquiatria apenas deu resultados e informações imprecisas,
quando não contraditórias e pouco convincentes, as
pesquisas dirigem-se, na atualidade, mais para o campo
da Biologia molecular. Como será visto mais adiante, da
perspectiva espirita, esse direcionamento é o mais promissor,
pois é aí que se dá a interação espírito-matéria.

Todavia, até o momento atual, as dificuldades continuam
enormes e as ambições da Citologia ultra-estrutural,
armada da microscopia eletrônica, são bem mais limitadas
que as de seus predecessores. Procura não os traços
figurados dos processos mentais, mas as alterações
morfológicas interneuronais provocadas pelas drogas psicotrópicas
(op. cit.)

O funcionamento do sistema nervoso é também de
natureza elétrica, e como se sabe, cargas elétricas produzem
campos magnéticos e vice-versa. Durante os impulsos
elétricos, nas sinapses axo-somáticas, as vesículas
esvaziam-se, liberando catecolaminas. As membranas
sinápticas também se alteram. No núcleo dos neurônios,
ocorre um acréscimo da permeabilidade da membrana
que, através dos seus poros, deixa passar para o
citoplasma quantidades consideráveis de ácido ribonucleico
(ARN mensageiro). Aqui adentra a pesquisa científica
o complexo campo da anatomia bioquímica do sistema
nervoso.

É justamente nas alterações bioquímicas do sistema
nervoso, com o metabolismo das monoaminas cerebrais,
tais como a reserpina, IMAO, serotonina, adrenalina
etc. e sua conseqüente atividade bioelétrica, que entra

6 0 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


em campo a Posição Espírita, cujos conceitos mais aprofundados
foram introduzidos por A. Luiz.

A ciência oficial já está incorporando, na prática, as
possibilidades inesgotáveis que esse campo oferece, ou
seja, o eletromagnetismo dos processos orgânicos. Atualmente,
o resultado prático mais conspícuo é, provavelmente,
o da utilização da ressonância magnética, para
fins diagnósticos. Trata-se de um aparelho, segundo Secaf,
formado por um campo magnético, que faz os átomos
de hidrogênio e oxigênio girarem como piões. Um
emissor de radiofreqüência injeta mais energia nesses
piões e seu eixo de giro então se inclina mais. Assim que

o campo magnético é desligado, essa energia adicional é
devolvida pelos átomos e pode ser detectado o local de
onde ela foi emitida. Um computador que funciona acoplado
ao aparelho capta essa energia e identifica sua
procedência na forma de uma imagem. Secaf explica que
a ressonância magnética de alta intensidade é capaz de
dar até a concentração de substâncias como fósforo, carbono
e lítio no organismo, daí sua utilidade diagnostica.
Outro importante método diagnóstico que se utiliza
das propriedades bioeletromagnéticas do cérebro é o da
Eletroencefalografia. Em relação à terapêutica, de uma
maneira completamente empírica, os italianos Cerletti e
Bini introduziram o método da estimulação elétrica cerebral
como recurso para levar a termo acessos convulsivos,
terapêuticos, nas enfermidades mentais. Os romanos
já aplicavam as descargas do peixe-elétrico no tratamento
dos nervosos (J. O Magdalena).

Segundo a Posição Espírita, o eletromagnetismo é

o campo do funcionamento psíquico tanto no que se refere
ao corpo físico como em relação ao corpo espiritual.
Acrescenta os conceitos de magnetismo animal e magne-
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


tismo espiritual. Em relação ao magnetismo animal, Anton
Mesmer, médico vienense do século passado, já o
utilizava em sua prática diária. Banido da Áustria, acusado
de charlatanismo, obteve grande sucesso em Paris,
ao conseguir curar a cefaléia da rainha Maria Antonieta.
Suas idéias foram rejeitadas pela ciência oficial, que aderiu
à hipótese de Braid, a qual atribuiu os efeitos mesméricos
à sugestão hipnótica. Contudo, os modernos experimentos
parapsicológicos tendem a ressuscitar a hipótese
do magnetismo animal, confirmando um dos pressupostos
fundamentais do Espiritismo. Atribuir todos os fenômenos
parapsicológicos e mediúnicos aos efeitos da sugestão
seria uma "tour de force".

O grande sucesso que a Doutrina Espírita tem obtido
nos dias atuais deve-se principalmente aos processos
terapêuticos por meio dos denominados passes magnéticos,
preces e irradiações Advoga também a existência
de afecções tanto psíquicas como somáticas, de natureza
mediúnica, denominadas fascinações, obsessões,
possessões etc. É comum encontrar-se, nos meios acadêmicos,
a crítica de que tal postura significa um retrocesso
à demonologia supersticiosa da Idade Média Essa
atitude parece ter suas raízes mais em preconceitos ou
atitudes de feitio emocional arcaico do que em pressupostos
de natureza científica. Haja vista o repúdio de
Freud ás idéias de Jung, que ocasionou o rompimento
definitivo entre ambos, classificando-o de "bruxo" ("Memórias,
Sonhos e Reflexões", C. G. Jung).

Infelizmente, a comunidade científica não vê com
bons olhos essa "contaminação mística da ciência", mas
é cada vez maior, no mundo inteiro, o prestígio de Jung.
ou a procura por métodos alternativos, por parte de terapeutas
de diversas especialidades Como exemplo, tem

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


-se Acupuntura, método tradicional chinês que foge. em
absoluto, aos cânones científicos ocidentais. E o seu funcionamento
já foi atestado por eminentes autoridades
médicas ocidentais. Isso indica que o método científico,
tão arduamente construído pela ciência ocidental, não é a
única maneira de se aproximar da realidade dos fatos.
Mais adiante serão vistos, mais detalhadamente, como
os extraordinários avanços da Física Moderna também
apontam nessa direção.

Em que pese à frustração de não ter podido reduzir
a mente ao simples funcionamento do cérebro, a neuroanatomia
obteve progressos notáveis, ainda que bastante
limitados, em termos de entendimento do psiquismo humano
e animal. Já se conseguiu demonstrar, com mais
ou menos precisão, as bases anatomofuncionais dos
componentes instintivo-afetivos. da vigilância, da atenção,
do sono, da integração sensorial, da memória, do
condicionamento, das gnosias. da linguagem, das praxias.
sendo as três últimas componentes do processo de
simbolização. Contudo, a simples aplicação ao homem
de dados neurofisiológicos, obtidos com o estudo de animais,
sofre a válida crítica a todas as formas de raciocínios
procedidos por analogia.

As pesquisas deverão necessariamente levar em
consideração as etapas da evolução ontofilogenética da
espécie humana. Também nesse campo a Posição Espírita
apresenta diversos esclarecimentos, ainda que genéricos,
mas que lançam nova luz em tão intricado problema.
(Vide em A. Luiz, "Evolução em dois Mundos") Ainda
não foi possível especificar, sobre a cartografia nervosa,
a sede dos fenômenos psíquicos, tal como se fez
para a visão, a motricidade, a fala etc. Segundo a Posição
Espírita, a sede dos fenômenos psíquicos superiores.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


tais como a abstração, os estados elevados de consciência,
sentimentos quintessenciados etc, estaria localizada
em formas de matéria que pertencem a outras categorias
vibracionais e a outros parâmetros dimensionais de tempo,
espaço, causalidade etc. As grandes descobertas da
Física Moderna, tais como a antimatéria, a matéria irradiante
etc, permitem colocar os pressupostos espiritistas
no campo das possibilidades matemáticas de difícil mas
não impossível confirmação.

Continuando esse resumo esquemático das bases
fisiológicas do psiquismo humano, já foram demonstradas
as funções neurotransmissoras de hormônios e vitaminas.
São bem conhecidas as relações entre deficiências
vitamínicas e os distúrbios mentais. Os diversos hormônios
têm papel decisivo nas emoções e na vida psíquica
como um todo, mas os conhecimentos dessas correlações
são ainda limitados.

Como exemplo, tem-se o papel das glândulas supra-
renais no "stress", os hormônios tireoideanos estimulantes
associados à ansiedade, bem como os efeitos psicofisiológicos
da supressão das gônadas nos eunucos.

As pessoas com problemas de alcoolismo podem
desenvolver deficiência de Tiamina (Vit. B1) que, por sua
vez, pode levar à Encefalopatia de Wernicke, com nistagmo,
ataxia, oftalmoplegia, problemas de consciência, perda
de memória recente, tabulações, desorientação auto e
alopsíquica, alucinações e mesmo coma. Essa síndrome
foi descrita inicialmente por Korsakoff.

Carência de Nicotinamida pode levar a estados psicológicos,
bem como a de Vit. B6 e B12. Alguns metais
possuem ação tóxica no cérebro e mesmo a poluição atmosférica
pode produzir alterações. Mal de Addison,
doença de Cushing, também levam a alterações mentais.

6 4 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


As síndromes depressivas estão relacionadas com uma
carência cerebral em aminas biogênicas. Também as Esquizofrenias
podem apresentar distúrbios bioquímicos, e
a base etiopatogênica mais provável seria o hipotálamo,
estrutura intimamente relacionada com a hipófise, no comando
do sistema endócrino.

Os autores mecanicistas querem crer que esses
achados provam que a mente seja um mero subproduto
do cérebro ou do funcionamento cerebral (epifenomenalistas,
funcionalistas, reflexologistas etc). Todavia, essa
conclusão pode ser tendenciosa, pois tanto as alterações
mentais podem ser produto das patologias citadas como
essas alterações anatomofuncionais podem ser secundárias
a estados emocionais particularmente intensos e prolongados,
como a situações traumáticas ou até mesmo
poderiam ser secundárias a alterações do próprio corpo
espiritual. Da perspectiva espírita, todas essas hipóteses
são factíveis. O Princípio da Indeterminação de Heisemberg
permite a inclusão de todas essas possibilidades estatísticas
no bojo do método científico.

A hipótese das bases extrafísicas da mente eleva o
problema a níveis de complexidade inconcebíveis ao estádio
atual do conhecimento científico oficial.

O autor espiritual A. Luiz confirma essa continuidade
de corpo-mente em níveis bioquímicos ao afirmar que
"nos traumas cerebrais da cólera, do colapso nervoso, da
epilepsia e da esquizofrenia, como tantas outras condições
anômalas da personalidade, vamos encontrar essas mesmas
fermentações no campo das células, mas em caráter
de energias degeneradas, que correspondem às turvações
mentais que as provocam" (op. cit.).

Aqui poderia estar a causa primária de grande número
de alterações psíquicas, inclusive das obscuras psi-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


coses endógenas, até hoje impenetráveis à análise fenomenológica.
Esse critério de incompreensibilidade foi magistralmente
descrito por Kurt Schneider, ao introduzir os
conceitos de desenvolvimento e processo, na corrente fenomenológica
de Karl Jaspers.

A impossibilidade atual de uma perfeita compreensão
desses obscuros escaninhos psicopatológicos resulta
na contradição fundamental observada nos diversos livros
da especialidade, como observa I. Paim: "a leitura
de manuais como os de Karl Jaspers, Honório Delgado,
Werner Wolff, Gabriel Deshies, Carlos Pereira e Célia Sodré,
nos deixa a impressão de que tratam de ciências inteiramente
diversas".

Numa tentativa de superar essas dificuldades da
Psicopatologia, Jaspers passou a estudar a vida psíquica
anormal independentemente dos problemas clínicos, e o
fez com genial capacidade descritiva. Essa postura fenomenológica,
contudo, apenas posterga o problema, levando
a uma dissociação ou mesmo a um impasse, que
justificam a crítica de Van den Berg de que, em geral, os
psiquiatras não entendem nada do que se passa na mente
de seus pacientes. A análise fenomenológica apenas
descreve os aspectos superficiais observáveis da vida de
relação.

Do lado dos autores espíritas, como será visto detalhadamente
mais adiante, a mente continua envolta em
denso mistério: "(...) através de processos ainda inacessíveis
à nossa observação (...)" (A. Luiz, "Mecanismos da
Mediunidade").

Os modernos avanços da Bioquímica cerebral levaram
à tentativa de obtenção dos chamados "soros da verdade".
Todavia, eles não são verdadeiros e vão contra os

6 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


direitos de reserva e de autodeterminação do indivíduo
(EMC).

Uma escola que deu extraordinária contribuição ao
estudo da Psicologia normal e anormal foi a Fenomenologia.
É uma abordagem filosófica, desenvolvida por Jaspers,
Binsvanger, Strauss e outros. Procura analisar todos
os planos da experiência psíquica, mas o seu método
é tão complexo que se corre o perigo de entrar num
labirinto e perder o fio da causalidade da cadeia dos fenômenos
psíquicos. Essa corrente se ocupa apenas com
os aspectos da consciência e refuta a hipótese da existência
de forças psicodinâmicas inconscientes.

Outro campo não menos importante é o conjunto
vasto das Teorias da Personalidade. Esse grupo possui
uma impressionante diversidade de pontos de vista. Segundo
Hall & Lindzay, as Teorias da Personalidade constituem,
em conjunto, um "tumulto de informações conflitivas
e expressões individualistas". Também impressiona,
segundo esses autores, a repetição de pontos de vista de
outros autores sem a devida citação da fonte. Talvez devido
a essa grande contradição e imprecisão, os teóricos
da personalidade representem uma dissidência no campo
da Psicologia (idem).

De uma maneira geral, as Teorias da Personalidade
descrevem o homem como um ser que se esforça, que
busca alvos e com um propósito. Exemplificando, na Psicologia
Complexa junguiana, o significado e o propósito
do destino individual representam um papel fundamental
para a saúde ou para a doença psíquica individual, ao
contrário da posição reducionista da Teoria Psicanalítica
de Sigmund Freud. Mc Dougall, Watsom e Tolman também
se preocuparam com o fato de o homem ter ou não
um propósito a influenciar o seu desenvolvimento psíqui-

PSIQUiATRIA E MEDIUNISMO


co. Miller, Dollard, Sheldon, Eysenck e Lewin não parecem
considerar o propósito como questão importante na
compreensão do comportamento. Existem também questões
mais definidas como o papel da recompensa, a importância
do Self e os aspectos inconscientes da motivação
a divergir os teóricos (idem).

Com a Lei de Causa e Efeito, a Posição Espírita
aceita, implicitamente, no entendimento do autor, os postulados
básicos do Behaviorismo como componentes importantes
da dinâmica do desenvolvimento espiritual,
acrescentando, é claro, um número enorme de outras variáveis
desconhecidas por aquela importante corrente da
Psicologia. Padrões de comportamento classificados,
numa hipotética escala de valores universal, como sendo
bons, seriam positivamente reforçados, nessa, noutra
existência futura, ou mesmo na vida após a morte do corpo
físico. Contrariamente, padrões de comportamento ditos
maus, nessa escala de valores, seriam negativamente
reforçados. Diversos teóricos admitiram a importância
dos valores morais na determinação da saúde ou da
doença mental.

É claro que a Antropologia Cultural e a Sociologia já
demonstraram, à exaustão, a relatividade das escalas de
valores entre as diversas culturas. Também é ponto pacífico
o respeito que se deve ter para com usos e costumes
diferentes de culturas diversas da ocidental. Também é
fato notório que essas escalas de valores variam com a
evolução cultural dos grupos étnicos e sociais.

Entre outros, Heinroth, Stalhl etc. consideraram a
doença mental como expressão de um mal moral, ou
efeito da culpa, do pecado, do erro, e dos tormentos que
a consciência infeliz impinge a si mesma. É claro que se
deve, por todos os meios, evitar uma postura unilateral,

6 8 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cujo protótipo foi a demonologia da Inquisição da Idade
Média, cujo aspecto mais radical, e porque não dizer,
pervertido e patológico, foi o terrível "Malleus Maleficiarum",
editado em 1488, cujas conseqüências práticas foram
a tortura e a morte, pelo fogo, de milhares de doentes
mentais.

Jung considerou que a função de valores, na personalidade,
é dada pela função sentimento, embora concorde
que essa terminologia seja passível de ser criticada:
"Precisamos designar essa função particular como existindo
separada das outras (...) se vocês disserem "Preferimos
usar outra palavra", cabe-lhes então a escolha de
outro termo... " ("Fundamentos de Psicologia Analítica").
Esse autor cita, com minúcias, a partir da pág. 77, um
exemplo clínico de uma paciente cujo diagnóstico era esquizofrenia
de caráter depressivo. Jung achava a mulher
estranha e "não podia aceitar o diagnóstico como última
palavra". Submeteu-a ao Teste de Associação de Palavras,
de sua autoria, que por sinal é a base de todos os
testes detectores de mentira, e pôde comprovar a psicogênese
da doença, na idéia auto-acusatória, "Você matou
sua filha" (op. cit.). Esse exemplo será apresentado mais
adiante.

Inúmeros casos semelhantes, quer neuróticos quer
psicóticos, podem ser vistos, tanto na literatura psicanalítica
como na prática diária. É claro que nem todos são
capazes de adoecer por motivos morais. Existem os casos
de Personalidades Psicopáticas do tipo anti-social
que são completamente insensíveis, capazes de "marchar
sobre cadáveres". Lamentavelmente o oposto também
é verdadeiro, e personalidades excessivamente
auto-repressoras, puritanas, moralistas, com mania de ordem,
limpeza etc. tendem a desenvolver sintomas psíqui-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 6 9


cos os mais variados, destacando-se os quadros neuróticos
de natureza obsessivo-compulsiva.

Um elemento-chave na diferenciação entre as várias
Teorias da Personalidade consiste na ênfase dada
aos determinismos inconscientes do comportamento aparente,
em oposição à importância das determinantes
conscientes.

Entre as Teorias que advogam a causa dos fatores
inconscientes, destaca-se a Psicologia Analítica de Jung,
com a hipótese do Insconsciente Coletivo e seus Arquétipos,
A Posição Espírita vai além, ao advogar também a
existência de elementos inconscientes localizados no corpo
espiritual, com todo o repositório das experiências e
vivências das encarnações pretéritas, além, é claro, das
vividas no plano espiritual. De acordo com ela, as forças
dinâmicas oriundas do inconsciente espiritual tanto podem
ser de natureza positiva, saudável, tais como tendências,
idéias ou habilidades inatas, como de natureza
morbígena. Os gênios precoces, como Wolfgang A. Mozart,
seriam um exemplo de vidas pregressas altamente
evoluídas. Crianças portadoras de distúrbios, tais como
autismo infantil, psicoses infantis etc, podem representar

o segundo grupo.
Em geral, a associação e o enlace espacial e temporal
dos eventos e das experiências são menos consideradas
pela maioria dos teóricos da personalidade do
que o fenômeno da recompensa. Existem também consideráveis
diferenças quanto às interpretações do modo
como se dá o processo de aprendizagem. Um dos aspectos
mais destacados das Teorias da Personalidade são
os numerosos esquemas propostos para representar a
estrutura da personalidade.
Entre os mais detalhados no assunto estão Allport,

7 0 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Cattel, Eysenck, Freud, Jung, Murray e Sheldon. Entre os
autores que enfatizam o papel da hereditariedade no
comportamento humano destacam-se Eysenck, Cattel,
Jung, Freud e Murphy. Mais adiante será apresentado
material coletado na bibliografia espírita também enfatizando
a importância dos fatores hereditários.

Já os autores Eric Fromm, Karen Horney. Lewin,
Rogers, Sullivan e outros dáo mais ênfase às determinantes
de natureza cultural (Culturalistas). Outros autores
enfatizam os fatores atuais, em oposição à importância
das ocorrências das fases primitivas do desenvolvimento
infantil.

Ainda segundo Hall & Lindzay, outro aspecto que
distingue as Teorias da Personalidade de outras variedades
de Teoria Psicológica é a ênfase dada ao holismo.
Ao adotar uma posição holística, a teoria da Personalidade
pode estar sugerindo que uma boa teoria deve ser
completa, complexa, multivariável, e que ela deva incluir
referências às situações dentro das quais ocorre o comportamento
humano.

As Teorias da Personalidade empregam o conceito
de "Self" em sentidos diversos. Da perspectiva espirita,
esse é o mais importante dos conceitos psicológicos, pois
se trata da própria alma.

Segundo Sears, "uma teoria é válida na medida em
que prova sua utilidade quanto à predição e provisão de
controle do comportamento; e isso é matéria apenas de
conveniência, não de veracidade dos fatos. Como nenhuma
teoria provou sua eficácia na ordenação de dados do
comportamento, não surpreende que muitos psicólogos
se sintam estimulados a envidar novos esforços no sentido
de construir um conjunto sistemático de variáveis da
personalidade". Talvez seja conveniente relembrar aqui

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


que a Posição Espírita é muito mais ampla que uma Teoria
da Personalidade, sendo mais uma Cosmogonia, tal a
abrangência dos temas que aborda, daí a impossibilidade
de se abarcar todas as suas conseqüências.

Assim, impossível e sem interesse a recapitulação
de uma grande amostragem de teorias que tentam explicar
o psiquismo humano. A adoção, por parte do estudioso,
dessa ou daquela teoria, não é fortuita, casual nem
aleatória, mas depende do posicionamento filosófico adotado.
Esse, por sua vez, obedece às necessidades subjetivas
de feição mais afetiva que intelectual, geralmente de
natureza inconsciente, onde o amadurecimento da personalidade
é fator determinante. Também as experiências
prévias são de capital importância, e é onde leva grande
vantagem a Posição Espírita, com a palingenesia e pela
possibilidade de ocorrência de efeitos físicos ou psíquicos
de natureza paranormal ou mediúnica, embora raros
e de difícil apreensão. Como foi demonstrado por Ira Progroff,
tais fenômenos, em geral, passam despercebidos,
a menos que sejam espetaculares. O fenômeno das mesas
girantes, por exemplo, perdeu há muito o caráter quotidiano
que tinha à época do advento do Espiritismo.

Segundo William James (op. cit), "as tendências religiosas
do homem hão de ser, pelo menos, tão interessantes
quanto quaisquer outros fatores pertencentes à
sua constituição mental". Esse autor critica o "materialismo
médico (que) dá cabo de São Paulo explicando sua
visão na estrada de Damasco como uma descarga violenta
do córtex occipital, visto ter sido ele epiléptico. Tacha
Santa Teresa de histérica, São Francisco de Assis de
vítima de degenerescência hereditária". Esse gênio psicológico
anglo-saxônio pergunta: "pode um relato existencial
de fatos da história mental decidir de um modo ou

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


de outro acerca da sua significação espiritual?". Mais
adiante: "Há momentos de experiência sentimental e mística
(...) que trazem consigo, ao chegar, enorme sentido
de autoridade e iluminação interiores. Mas chegam raramente,
e não chegam para todos; e o resto da vida ou
não faz conexão com elas ou tende menos a confirmá-las
do que a contradizê-las" (op. cit., pág. 23).

Essas observações ilustram bem o fato de ser o caminho
proposto árduo e cheio de percalços. Mas, para
uma maior simplificação didática, será feita uma sinopse
descritiva das funções mentais, antes de se tentar uma
aproximação, ainda que tangencial dos seus aspectos
espirituais.

A mente não é, de modo algum, um sistema unívoco.
Possui funções as mais variadas, que atuam de modo
orgânico, mas com relativa independência entre si, podendo,
nos casos patológicos, desenvolver sinais e sintomas
agrupados em síndromes ou entidades nosológicas
pela semiologia psiquiátrica. Se a patologia e a anatomia
falharam na tentativa de delimitar as sedes das funções
mentais no cérebro humano, com raras exceções, isso
não implica, todavia, que a mente seja um sistema homogênio
e uniforme.

Como foi dito, a Psicologia concentra seus esforços
no estudo da experiência vivida pelo indivíduo, porém, a
falta de um método apropriado para a investigação "in
anima nobile", faz com que ela se ressinta da unidade e
da generalidade que caracterizam as disciplinas científicas
em geral. Ora, a alma, se não fosse uma coisa, não
poderia funcionar, muito menos adoecer. Na concepção
de Kroenfeld, isso seria uma "metáfora inaudita".

Apesar dos esforços da Psicologia, da Psiquiatria,
da Psicopatologia, da Antropologia Cultural, da Sociolo-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


gia etc , as dificuldades nesse campo do conhecimento
continuam ainda intransponíveis. Segundo I. Paim, fazer
uma idéia do que se passa na mente de uma pessoa
com, por exemplo, ideação delirante-alucinatória, é algo
que foge à experimentação e à introspecção.

Blondel considerava que, quando se define a alucinação
como "uma percepção sem objeto", ou quando se
diz que o "delírio é um juízo falso ao qual se aferra o enfermo
apesar de todas as provas em contrário", recorre-se
a fórmulas verbais que, sem serem tecnicamente falsas,
não levam à compreensão do que significam, de fato,
para o paciente, a experiência alucinatória ou delirante,
nem o que realmente experimenta no curso de tais experiências.


Se as dificuldades são tremendas, no campo da
ciência oficial, elas se multiplicam, no campo espírita.
Isso devido, segundo ela, à plasticidade e interdependência
entre a substância astral e as mentes dos Espíritos
que a habitam. Há inúmeras descrições de que os planos
ditos do umbral, as demonotropias, licantropias etc, e
mesmo os planos superiores, seriam criações formais secundárias
aos padrões de pensamento dos grupos especiais
de Espíritos que os habitam. Um exemplo de licantropia
plástica, se é que se pode assim denominar tal fenômeno,
pode ser visto na interessante obra "Libertação",
de A. Luiz.

Segundo a Posição Espírita, no plano astral, os
pensamentos são projetados no exterior, sob a forma de
energia mental, a plasmar, nos átomos astrais, as denominadas
formas-pensamento, que correspondem às
idéias e imagens plasmadas na mente dos Espíritos,
como será visto mais adiante.

Em que pese à genialidade de autores, tais como

7 4 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Jaspers, Ninkowski, Schneider, Binswanger e outros, a
Psicopatologia não passou além dos fenômenos observados
de fora. Para Jaspers, por exemplo, as vias de acesso
ao fato psicológico são a compreensão e a explicação,
sendo a primeira um ato subjetivo, ao passo que a segunda,
objetivo. Seria algo semelhante ao princípio da
complementaridade em Física.

A compreensão consiste num esforço de penetração
e de intuição do fenômeno, e a explicação é uma
ação intelectual que completa a compreensão. Esse autor
centraliza sua atenção no fenômeno psíquico fundamental:
"a vivência" e criou um método de aproximação
que denominou "penetração empática". Para tal se faz
mister observar os gestos, a mímica facial, o comportamento,
as confidências, autodescrições etc , passando
em seguida à classificação dos fenômenos como normais,
acentuações dos normais e os incompreensíveis, a
que deu o nome de vivências primárias, as quais seriam
patognomônicas de psicose. Contudo, Jung, com maior
poder de penetração, constatou que, por trás da impassibilidade
e da morte psíquica aparente de alguns catatônicos,
existem vivências riquíssimas e plenas de significado,
geralmente simbólicas. Na experiência do autor, fenômenos
mediúnicos também podem ocorrer, mimetizando
alterações psicopatológicas típicas.

Em Medicina existe um postulado que diz: não existe
função sem órgão. Ora, como existem inúmeras funções
mentais, mensuráveis algumas, por meio de testes psicométricos,
é lógico supor que deve haver algum lócus responsável
pelas mesmas.

Já foi dito que as pesquisas psicofisiológicas não foram
capazes de delimitar, no cérebro humano, as respectivas
cartografias das funções mentais. Para a Posição

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 7 5


Espírita isso é compreensível, pois, segundo a mesma, o
cérebro físico não é a matriz da mente, mas apenas o
conjunto mais baixo das funções instrumentais da vida de
relação. A mente tem sua localização na alma do indivíduo,
distinta mas atuante no corpo material, e antes de
se adentrar os mecanismos dessa interação será feita
uma breve esquematização das funções mentais, tais
como observadas de fora.

A mais elementar das funções mentais, do ponto de
vista psicofisiológico, é a sensação. Ela pode ser definida
como o fenômeno psíquico elementar que resulta da
ação dos estímulos sobre os órgãos dos sentidos. Segundo
Adrian, a projeção mental dos estímulos vindos
tanto do meio externo quanto interno é uma cópia aproximada
dos acontecimentos físicos que os originaram.
Contudo, a tendência atual é mais no sentido de infirmar
essa interpretação, uma vez que o universo demonstrado
pela moderna Física Nuclear difere frontalmente da idéia
que dele fazemos. Essa postura foi antecipada pela corrente
filosófica existencialista. Em "A Convidada", Simone
de Beauvoir ilustra essa contradição entre as imagens
e a realidade objetiva, de forma poética, mas brilhante.

As imagens que se produzem no campo mental seriam
um tipo de reflexo condicionado representativo de
uma parcela ínfima da realidade exterior. Os objetos percebidos
como densos e sólidos, por exemplo, são compostos
de átomos em vertiginosos movimentos e a consideráveis
distâncias relativas entre si. Há milhares de
anos, os hindus intuíram esse fenômeno fundamental e
criaram o termo Maya, para designar a forma ilusória com
que se apresenta a realidade exterior à subjetividade do
indivíduo.

As sensações podem ser de origem tanto externa

7 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


quanto interna, e para que se procedam são necessários

o receptor periférico, as vias nervosas aferentes sensitivas
e os centros corticais decodificadores. Penfield realizou
impressionantes experiências com a estimulação elétrica
do córtex sensorial de pacientes submetidos a intervenções
neurocirúrgicas sob anestesia local. Conseguiu
provocar vivências alucinatórias complexas de feição
mnésica.
Rhine conseguiu demonstrar a existência de sensações
que procedem por vias outras que não as descritas
pela neurofisiologia. É o grupo das sensações e percepções
extra-sensoriais, que, segundo William James, Jay-
me Cerviño e outros, têm uma feição alucinatória e provêm
de vias desconhecidas nas regiões do inconsciente.
Nos próximos capítulos, será visto como se processam
do ponto de vista espírita e quais os critérios para o diagnóstico
diferencial das alucinações e pseudo-alucinações
de caráter patológico. As funções paranormais, ou Psi,
segundo a Parapsicologia, existem latentes em todos os
indivíduos, com o que concorda o Espiritismo. Segundo o
grande sábio russo espírita Alexandre Aksakof, as faculdades
paranormais, mediúnicas e psicológicas são afins,
mas distintas em sua origem, como será visto com mais
detalhes adiante.

Entre as sensações externas estão a visão, a audição,
o tato, a gustação, a olfação, a sensação térmica
etc. As internas são as sensações motoras, de equilíbrio,
proprioceptivas, cenestésicas, além de sede, fadiga e
mal-estar.

As sensações são a base do processo do conhecimento,
e segundo Lersch, "se os órgãos dos sentidos
não proporcionassem à nossa consciência a matéria-prima
das sensações, não teríamos consciência alguma do

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mundo". Já foi feita a crítica e a argumentação, do ponto
de vista espírita, contra os autores que consideram as
sensações como única via do processo do conhecimento.
De modo algum o nascituro é uma "tábula rasa". Mais
adiante, no capítulo referente à infância, esse tema será
exposto com maiores detalhes.

O próximo passo no processo do conhecimento é
representado pelas percepções. Segundo Lopes Ibor,
são "a apreensão de uma situação objetiva baseada em
sensações, acompanhadas de representações e freqüentemente
de juízos, num ato único, o qual somente pode
ser decomposto por meio da análise". Segundo a Psicologia
da Forma, a Gestalt, o ato perceptivo se caracteriza
por uma apreensão da totalidade É possível que esse
efeito conjunto ou "Gestaltqualitãten", seja. do ponto de
vista subjetivo, o mecanismo plasmador dos ambientes
astrais, conforme são descritos nos compêndios da literatura
espírita. Essa observação deve ser considerada apenas
uma sugestão do autor.

Stern assevera que "não há forma sem aquele que
forma". Essa observação é estranhamente coincidente
com o conceito oriental de Maya e com as revolucionárias
descobertas da Física das partículas subatômicas.
Paim complementa afirmando que "a consciência não é
passiva, um espelho indiferente que reflete a realidade
circundante. Ao contrário, toda consciência perceptiva é,
no ato, doadora de significações". No processo perceptivo
são agregados dados da memória, do raciocínio, da
afetividade, além de receber influência decisiva da atenção
e da atitude pensante do indivíduo.

Em relação aos fenômenos mediúnicos, místicos,
etc, William James diz que "para a mente médica esses
êxtases nada significam senão estados hipnóides sugeri

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


dos e imitados, numa base intelectual de superstição, e
numa base física de degeneração e histeria. Não há dúvida
alguma de que essas condições patológicas existiram
em muitos casos e talvez até em todos eles, mas esse
fato nada nos diz sobre o seu valor para o conhecimento
da consciência que eles induzem. Se quisermos fazer um
julgamento espiritual desses estados, não devemos contentar-
nos com o linguajar médico superficial, mas indagar-
lhes dos frutos para a vida" (op. cit, pág. 257). Conscientizada
essa válida advertência do autor do Pragmatismo,
serão vistas algumas alterações de natureza psicopatológica.


No campo psicopatológico, as funções estudadas
acima podem apresentar alterações, tais como hiperestesia,
hipoestesia, anestesia, analgesia, agnosias, ilusões
sensoriais etc. Podem ocorrer tanto nos transes mediúnicos,
não necessariamente patológicos, como em diversas
síndromes neurológicas, psiquiátricas, e sob efeito de
substâncias psicodislépticas. Aldous Huxley cita vivências
sob o efeito da mescalina: "livros vermelhos, como
rubis, livros de esmeraldas, livros encadernados em jade
branco (...) que pareciam estar prestes a sair das estantes
e arremessarem-se mais insistentemente de encontro
à minha atenção."

Ao ato de conhecimento que consiste na reativação
de uma lembrança ou imagem mnésica, sem a presença
real do objeto correspondente, dá-se o nome de representação
(Paim). Em geral não constitui uma reprodução
rigorosa do objeto representado. É um processo dinâmico
e não estático. Pintores e escritores podem utilizar voluntariamente
as representações durante o processo criativo


As representações podem variar em relação ao tipo

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 7 9


de imagem que provocam na mente do sujeito. Podem
ser perceptivas, representativas, oníricas, fantasias, pareidolias,
imagens eidéticas, ilusões, pseudo-alucinações
e alucinações verdadeiras, além das oriundas das percepções
mediúnicas e extra-sensoriais.

De um modo geral, existe, entre os psicoterapeutas,
a tendência de rotular como sendo de natureza patológica
um grande número de vivências que poderiam muito
bem ser consideradas como funcionais ou fisiológicas.

Entre as grandes personalidades artísticas, é comum
a ocorrência de diversos tipos de imagens acima
mencionadas. Segundo seus biógrafos, Beethoven teria
"ouvido", acabado, o tema do quarto movimento da sinfonia
"Coral". Da sacada de seu quarto em frente a uma
praça de Amsterdam, Rembrandt teria "visto" a magnífica
cena retratada em seu quadro da "Última Ceia". Em relação
a Haendel, ao compor o oratório "O Messias", teria
também tido uma "visão" do Cristo. É bem conhecido o
fato de que o físico-químico Kekulé encontrou a fórmula
estrutural do núcleo benzeno, de forma simbólica, durante
o sono. Assim também teria sido descoberta a fórmula
da insulina. Albert Einstein fez revelação de vivência semelhante,
perante o Parlamento Britânico, a respeito do
modo como visualizava o Universo, com a solução matemática
que culminou com o advento da Teoria da Relatividade.
Em sua autobiografia, Jung relata o fato de que,
nos intervalos de sua labuta psicanalítica, "conversava"
com uma imagem a que denominava Filemon. Consta
que também Sócrates tinha o seu "daimon" particular.
Segundo Von Franz, Jung cita Skakespeare e Bach como
exemplos de artistas que criavam sem a participação do
ego.

Como foi salientado por Progroff, essas vivências

8 0 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


não são raras. Qual a justificativa científica para o psicopatologista
rotular essas vivências como sendo de feição
patológica?

Mesmo que não se admita a hipótese de uma realidade
espiritual, não existem justificativas de ordem técnica
para rotular todas essas vivências como sendo patológicas.
Aliás, faz parte do desenvolvimento psíquico infantil
a criação de amiguinhos imaginários, de natureza provavelmente
eidética, que não são patológicos.

Alguns autores utilizam até mesmo essas imagens
com finalidades terapêuticas. É bastante conhecida a técnica
do "Sonho Acordado" de R. Desoile, bem como a
técnica da "Imaginação Ativa" de Jung. Ocorre que essas
imagens são, até certo ponto, autônomas, desenvolvendo
pontos de vista opostos ao do eu consciente. Daí o seu
imenso potencial terapêutico na resolução de conflitos intrapsíquicos.
O mesmo pode ser dito em relação ao mediunismo.


A própria Psicopatologia considera as alucinações
hipnagógicas e hipnopômpicas como sendo normais. Em
relação às imagens oníricas, a simples explicação de que
são restos diurnos, satisfação velada de desejos reprimidos,
ou mero produto do funcionamento do córtex cerebral,
liberada da ativação da substância reticulada ascendente,
não abarca fatos verídicos de que alguns sonhos
são dramatizações mais ou menos veladas de ocorrências
futuras (premonições). A Posição Espírita explica esses
sonhos premonitórios (que seguem o denominado
processo secundário freudiano), como sendo fruto da atividade
da alma no plano espiritual. Por mais inverossímel
que seja essa hipótese, do ponto de vista da lógica formal,
é plenamente coerente com determinados fatos, ainda
que raros.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 8 1


É interessante frisar que a maioria dos fenômenos
mediúnicos e parapsicológicos costumam ocorrer durante
um certo "abaissement du niveau mental" (P. Janet).
Nesses períodos ocorre um declínio da atividade cortical,
com predomínio das ondas alfa, e conseqüente liberação
dos núcleos diencefálicos, que, como será visto mais
adiante, seria o lócus da interação mente-corpo.

Segundo Mira Y Lopes, alucinação seria "uma imagem
representativa que adquire critérios de sensorialidade
necessários para ser aceita pelo juízo da realidade
como proveniente de um objeto exterior". Em geral é considerada
como sendo patológica. Contudo, será visto
mais adiante que determinadas alucinações podem ser
fruto de estimulação das estruturas diencefálicas por estímulos
de natureza extrafísica, e secundariamente atingirem
o córtex cerebral, quando então são "percebidas"
pelo eu.

Assim, fica demonstrada, pelo menos presuntivamente,
a necessidade de um cuidadoso estudo dessas
vivências para que se possa realizar o diagnóstico correto.
São de capital importância o conteúdo dessas vivências
e suas relações com o conjunto global da personalidade
do indivíduo, além, é claro, de uma possível análise
comparativa com a realidade a que a vivência se propõe
comunicar Segundo William James, vivências religiosas
autênticas formam um "continuum" com a vida psíquica
normal e patológica. Mas, quem pode ser considerado
absolutamente saudável tanto física como mentalmente?

Uma análise cuidadosa demonstra que muitas alucinações
não passam de ilusões ou de interpretações falsas
de fatos comuns. Os doentes podem dizer: "são
umas vozes", ou "é como se fosse um telefone", ou "é
uma espécie de", ou "são vozes caindo do céu como go


8 2 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


tas dágua" (Paim). Segundo Baillarger, as alucinações
podem ser psíquicas ou psicossensoriais. Existem as
pseudo-alucinações de Kandinski etc.

Para os teóricos, a alucinação estaria para os centros
sensitivo-sensoriais como a epilepsia estaria para os
centros motores e pode ser provocada pela estimulação
elétrica do lobo temporal. Penfield conseguiu reproduzir
fenômenos alucinatórios, como já foi dito, além de ilusões
e sonhos complexos, dessa maneira. Um paciente estimulado
por Penfield relatou: "ouço minha mãe e meu irmão
conversando", e, apesar disso, tinha certeza de que
estava na sala de operações (idem). Contudo, não existe,
entre os diversos autores, concordância em relação aos
mecanismos fisiopatológicos das alucinações. A escola
pavloviana, por exemplo, diverge da opinião de teóricos
ocidentais.

Segundo Noyes, as alucinações seriam fruto da projeção,
para a realidade objetiva, de necessidades psicológicas,
tais como realizações de desejos, exaltação da
própria personalidade, crítica, censura, culpa, autopunição,
desejo de uma realidade mais satisfatória etc. O valor
semiológico das alucinações é relativo, pois podem
apresentar-se em quase todas as doenças mentais, tais
como esquizofrenias, psicose maníaco-depressiva, epilepsia,
delírios febris, psicoses exotóxicas, alucinoses alcoólicas,
transtornos provocados pelas drogas alucinógenas
e nos transes de variada espécie. As hipóteses desenvolvidas
pela Posição Espírita ampliam enormemente

o campo semiológico das senso-percepções.
Outra importante função mental é o conjunto das
atividades cognitivas, as quais também tomam parte na
misteriosa cadeia de eventos que forma o processo do

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


conhecimento. Trata-se dos conceitos, dos juízos e do raciocínio.


Os conceitos constituem a unidade estrutural do
pensamento. Segundo a Lógica Formal, o conceito é uma
forma de pensamento mediante a qual se exprimem as
qualidades essenciais de um objeto. Pela sua própria natureza,
o conceito é universal, mas alberga também as
características particulares e as singularidades dos objetos.
Os conceitos se originam a partir das imagens representativas,
através dos processos de abstração e de generalização.
Exemplificando, ao se afirmar que Sócrates
é um homem, o conceito homem perde as caraterísticas
singulares que identificam o indivíduo Sócrates, e passa
a simbolizar todos os indivíduos da espécie humana.
Houve aqui a abstração dos carateres singulares e a generalização,
tornando a idéia universal.

Pela abstração perdem os conceitos as características
elementares de sensorialidade. Segundo Spearman,
"os conceitos vão desde idéias sobre coisas muito simples
até as abstrações de alto nível, bastante distanciadas
do nível do objeto". Russel afirma que "os conceitos
do adulto determinam razoavelmente o que ele sabe, o
que ele crê e assim, em grande parte, o que ele faz". É
claro que se devem também levar em conta os outros
componentes da personalidade, tais como as emoções,
sentimentos, ideais, objetivos e propósitos existenciais.

Outra discriminação importante foi feita por Pfander,
ao afirmar que não se deve confundir o conceito com a
palavra, nem com o objeto. Deve-se discriminar também
signo de símbolo. Jung tem importante obra a esse respeito,
"O Homem e seus Símbolos". Ao processo de formação
das idéias e dos conceitos a Psicologia emprega

o termo ideação, parte do processo do conhecimento.
8 4 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Um elemento bastante abstrato, mas fundamental
na cadeia do pensamento são as chamadas relações
conceptuais, estudadas pela Lógica Dialética e de enorme
importância no diagnóstico de determinadas doenças
mentais que levam à chamada desagregação do pensamento
ou ao pensamento paralógico. São pesquisados
mais detalhadamente pelo teste de analogias, e, segundo
Prado Júnior, são preexistentes na mente humana normal.
A riqueza e a qualidade das relações conceptuais
são fatores determinantes do nível de inteligência do indivíduo.
Também a precisão dos mesmos é fator importante.
É interessante observar como as parábolas de Jesus
são representações, em nível alegórico e concreto, de
elevadas abstrações, impossíveis de ser captadas pela
mente das pessoas comuns.

Nas doenças mentais, os conceitos e as relações
conceptuais se alteram de uma maneira mais ou menos
profunda. Pode haver desintegração, condensação, formação
de neologismos, alteração ou perda das relações
conceptuais.

Paim cita o exemplo do paciente para quem a palavra
ateu não quer dizer aquele que não crê em Deus,
mas, sim, "a teu comando, isto é, a serviço de Deus".
Jung descobriu, pela primeira vez, que às vezes uma expressão
com significado concreto é tomada subitamente
em sentido simbólico, geralmente bizarro. Segundo Bumke
não é nada fácil descrever o significado da desagregação
do pensamento, nem o conhecimento de suas verdadeiras
causas. O que pode parecer, à primeira vista, um
despropósito, ou um absurdo, pode encerrar uma profunda
mensagem, apenas encoberta por um simbolismo que
é dito impenetrável. Contudo, essa impenetrabilidade
deve-se mais à ignorância do pensamento lógico em

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


apreender o significado do pensamento mágico do inconsciente,
segundo Jung, que era o perito dos peritos
em decifrar o pensamento mágico de povos primitivos, a
linguagem simbólica dos sonhos ou pensamento paralógico
dos psicóticos. As idéias de Jung a respeito desse
assunto foram dos principais motivos da sua dissidência
em relação à Teoria Psicanalítica de Freud.

A análise do pensamento deve também incluir as
regras de sintaxe, de semântica, bem como as diferentes
formas de estilo, maneirismos, regionalismos etc.

Uma outra função mental que também faz parte do
processo do conhecimento são os juízos. A Lógica estuda
os juízos em seu aspecto normativo, de acordo com
as leis formais do pensamento, sem levar em conta o seu
conteúdo, mais do interesse da Psicologia e da Psicopatologia.
Do ponto de vista da Lógica Formal, os juízos
consistem na afirmação ou negação de uma relação entre
dois conceitos. Os juízos se expressam na linguagem,
segundo I. Paim, sob a forma de proposições, e podem
expressar a verdade ou o erro, conforme suas afirmações
correspondam, ou não, aos fatos da realidade objetiva.
Segundo Jung, mesmo os juízos patológicos podem ser
considerados como uma realidade na medida em que expressam
"verdades" subjetivas do sujeito doente.

Aos distúrbios do pensamento oriundos do ato de
formação dos juízos dá-se o nome de delírios. O delírio
de perseguição, por exemplo, pode existir como um fato
real: político, policial etc. Contudo, num esquizofrênico, a
vivência persecutória surge na mente do doente sem elementos
da realidade que justifiquem a mesma. Os serviços
de espionagem desenvolveram técnicas psicológicas,
de uso coordenado, capazes de criar em suas vítimas
configurações pseudodelirantes, em nada distinguíveis

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


dos delírios patológicos. O autor observou um quadro rotulado
como esquizofrênico, em uma médica perseguida
por motivos de natureza política. São métodos de tortura
cruéis; sendo que na antiga URSS a dissidência política
era considerada sintoma de psicose, podendo levar suas
vítimas à reclusão (vide as "escolas de vingadores", em
"Ação e Reação" , A. Luiz, pág. 110).

Segundo Bleuler, as "idéias delirantes são representações
inexatas que se formaram não por uma causai
insuficiência da lógica, mas sim por uma necessidade interior
de natureza afetiva". Segundo Jaspers, os delírios
podem ser primários ou secundários, e geralmente se caracterizam
por uma convicção extraordinária, pela impermeabilidade
à experiência e às refutações lógicas e pela
inverossimilhança de conteúdo.

De acordo com Kurt Schneider, a percepção delirante
ou delírio primário é a atribuição de um significado
anormal a uma percepção normal, geralmente no sentido
auto-referente, sem que, para isso, existam motivos compreensíveis
não só do ponto de vista da razão como dos
sentimentos. Geralmente possui, para o doente, um significado
transcendental, numinoso. A principal característica
do delírio primário é a incompreensibilidade. Todavia,
esse critério de incompreensibilidade varia enormemente
de terapeuta para terapeuta.

É interessante adiantar neste capítulo que, pelas
descrições da literatura espírita, existem, no plano espiritual,
entidades em franco processo ideativo delirante-alucinatório.
Esses quadros também podem ser observados
em inúmeros transes mediúnicos, embora se deva ter
sempre em mente a possibilidade de que tais produções
sejam oriundas do inconsciente da própria personalidade
do médium, conforme será visto mais detalhadamente

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


nos próximos capítulos, especialmente nos casos de psicose
latente.

Como, de acordo com a Posição Espírita, tais quadros
ideativos delirante-alucinatórios podem ser encontrados
também em personalidades espirituais, desprovidas
de corpo físico, deduz-se que alguns quadros de natureza
psicopatológica têm o seu lócus no cérebro perispiritual.
Provavelmente esse seria o caso das graves psicoses
endógenas, as quais não demonstraram seus segredos
às pesquisas anatomopatológicas, como já foi explicitado.


Alguns fenomenologistas interpretam esse transtorno
no ato de integração significativa como secundário a
um grave transtorno do eu. Com isso concordam os autores
psicanalistas, quando afirmam que a "fonction du
reel" é um atributo do ego. Contudo, de acordo com Jung,

o ego não seria mais que um complexo psicológico que,
através do processo de individuação, pode ser dispensado,
transferindo o foco da consciência para níveis mais
interiores. Com essa hipótese concorda William James,
bem como diversas correntes espiritualistas, inclusive Aksakof.
Contudo também é possível a existência de subpersonalidades
inconscientes, fruto do processo de dissociação
da consciência, ou ainda resquícios de vidas
passadas.
Será estudado, em capítulo à parte, o processo de
formação do ego infantil. Serão analisados as revolucionárias
descobertas dos psicanalistas infantis Spitz e M.
Ribble, a respeito da necessidade de estimulação tátil cinética,
e acrescidas das luzes da Posição Espírita, a respeito
do suporte biomagnético fornecido pelas figuras parentais.


Como se pode deduzir, os aspectos espirituais au


8 8 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mentam, em proporção geométrica, as enormes complexidades
da mente humana. Assim, quando se diz que o
significado de um delírio primário é não só estranho como
impenetrável, deve-se tomar essa afirmativa como relativa
à história pregressa da atual existência. Essa impenetrabilidade
pode ser desfeita ao se considerar a possibilidade
de eventos desencadeantes oriundos do plano espiritual
ou do inconsciente espiritual, onde ficam armazenadas,
segundo a Posição Espírita, todas as experiências
da série insondável das anteriores encarnações. Além do
mais, existe o estranho fenômeno das personalidades intrusas,
ocasionando as denominadas obsessões espirituais,
que serão estudadas mais adiante.

Quanto às feições formais dos conteúdos da ideação
delirante, elas podem ser classificadas como de
grandeza, de relação, de sedução, de perseguição, de
ciúmes etc. Podem ocorrer nas alterações cerebrais, nas
esquizofrenias, nas intoxicações endógenas, exógenas,
nas demências, nas psicoses sintomáticas, na psicose
maníaco-depressiva etc.

Outra função mental intimamente relacionada com a
cadeia de eventos descrita anteriormente é o pensamento.
Em Lógica, o raciocínio é definido como a operação
intelectual que consiste em selecionar e orientar os dados
do conhecimento, tendo como objetivo alcançar uma
integração significativa que possibilite uma atitude racional
ante as necessidades do momento (I. Paim). Essa
operação complexa estabelece uma relação, de certa forma,
causal entre juízos, conceitos, representações e
idéias. Em seu sentido lógico, o raciocínio não é verdadeiro
nem falso, mas simplesmente correto ou incorreto,
conforme obedeça, ou não, às leis que regem o pensamento.


PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 8 9


Segundo Dewey, as idéias não vão e vêm aleatoriamente,
pois cada passo do raciocínio é um passo dado
de certo ponto em direção a outro. Para esse autor materialista,
o pensamento, "por mais sobrenatural que pareça,
é o produto de um órgão material, corpóreo, o cérebro".
Segundo a Posição Espírita, o cérebro é apenas o
instrumento final de uma cadeia de eventos que se inicia
na esfera extrafísica, como será visto com maiores detalhes
mais adiante. O Espiritismo também não concorda,
como foi dito, com o pressuposto da ciência clássica mecanicista
de que a fonte de todo o processo do pensamento
é a experiência sensorial. Essa postura tende a
ser reforçada pelas descobertas mais fundamentais do
século XX: a Teoria Quântica e a Teoria da Relatividade.
Isso porque esses avanços conduziram o conhecimento
a um impasse que somente poderá ser resolvido pelas
realidades que estão, por enquanto, muito além do alcance
dessas teorias revolucionárias.

A Escola Associacionista tentou explicar o processo
do pensamento através das Leis da "associação de
idéias", mas sofre a crítica de não levar em consideração

o fato de que no pensamento intervêm inúmeras operações
de abstração e de generalização.
Na obra clássica "O Pensamento", Mira Y Lopez faz
um brilhante resumo das diversas teorias do pensamento,
levantando questões fundamentais, tais como: Em
que consiste o pensar? Que são os pensamentos? Como
surgem, se entrelaçam e desaparecem? Quais são as
leis a que obedece o processo do pensamento? A que se
deve o fato de que, ante uma mesma situação, várias
pessoas normais, de semelhante cultura e boa-fé, cheguem,
não obstante, a conclusões completamente diversas?
Em que consiste a essência do pensar? No próximo

9 0 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


capítulo será feito um estudo mais detalhado de uma peculiaríssima
forma de pensar: o pensamento intuitivo.

As dificuldades teóricas e práticas da Filosofia, Psicologia,
Psiquiatria, Psicopatologia, Neurofisiologia etc.
são tremendas, na tentativa de elucidar esse problema.
Aqui também a Posição Espírita lança novas luzes no
problema, como será visto mais adiante.

Nos tratados de Psiquiatria, sob a denominação de
perturbações da ideação, estudam-se os distúrbios do
conhecimento intelectual, constituídos pela formação dos
conceitos, a formação dos juízos e a elaboração do raciocínio.


As alterações do pensamento são geralmente examinadas
em seus aspectos formais e em seus conteúdos.
Intimamente relacionada com o processo do pensamento
está a fala ou linguagem. Aqui são analisadas a
sintaxe, a semântica e o estilo. Lesões de ordem neurológica,
especialmente localizadas na área de Broca, produzem
alterações bem conhecidas da fala.

Quanto às principais alterações do pensamento,
destacam-se o bradipsiquismo, o taquipsiquismo, a fuga
de idéias, a perseveração, a prolixidade, a desagregação,
a incoerência, o bloqueio ou interceptação do pensamento,
a compulsão a pensar, as obsessões, o pensamento
paralógico, o pensamento dereísta e o autismo. De particular
interesse para a Posição Espírita é o grupo das obsessões,
que podem ser de etiologia neurótica, até mesmo
psicótica, ou efeito de influenciações de feição espiritual:
obsessões simples, fascinações e subjugações, segundo
A. Kardec. O pensamento também pode apresentar
variações de natureza qualitativa, que vão desde a
pobreza conceptual e do concretismo das oligofrenias até
as elevadas abstrações das mentes geniais. A forma

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mais diferenciada de pensar é o pensamento intuitivo, ou
modalidade de pensamento inconsciente ou subcortical
como querem alguns, ou formas as mais variadas de percepção
extra-sensorial como querem outros. Ambas as
hipóteses são verdadeiras, sendo que a segunda será
estudada no capítulo referente às funções mediúnicas.

Provavelmente a função mental mais abrangente e
importante para a vida psíquica seja a afetividade. É a faculdade
de se experimentar emoções e sentimentos. Segundo
Delay, "na esfera tímica, que engloba todos os
afetos, o humor representa um papel similar ao que a
consciência tem na esfera noética, que engloba todas as
representações". Essa afirmação peca por uma excessiva
redução do significado do conceito de consciência,
que de modo algum exclui os afetos. Com essa assertiva
concorda Bleuler ao dizer que "o humor ou afetividade
consiste na soma total dos sentimentos presentes na
consciência em dado momento". O termo consciência
aqui difere do conceito de censura moral geralmente empregado
na terminologia de diversos credos religiosos.

Segundo o Espiritismo, os estados de consciência,
que estão impregnados pela tonalidade afetiva fundamental
da alma, representam, na vida espiritual, os graus
de evolução espiritual da personalidade e são prontamente
reconhecíveis na tonalidade da aura bem como na
densidade do corpo espiritual. Isso se deve ao fato de o
corpo espiritual ser muito mais psíquico que somático, se
é que se possa usar esse termo por analogia.

Um exemplo mais primitivo e instintivo de afetos são
os eliciados diante de agressões ambientais e expressos
pela conhecida reação psicofisiológica de "fight or flight"
(luta ou fuga). As emoções e sentimentos mais complexos
e diferenciados e, portanto, mais evolvidos, são os

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


representados pelos indescritíveis estados de euforia dos
estados de êxtase, denominados por Freud como sensação
oceânica, e explicados como uma forma de regressão
ao útero materno. Na opinião pessoal do autor não
ocorreria uma regressão, mas um alargamento dos limites
do complexo do eu, ou até mesmo a perda dos seus
limites, num processo algo semelhante à dissolução psicótica
da personalidade, mas sem a perda do contato
com a realidade, e assimilação de vastas regiões do inconsciente
dessa e de outras encarnações e, também,
com assimilação de energias oriundas de planos mais
elevados do mundo espiritual.

Freud declarou nunca ter experimentado uma sensação
oceânica, mas conhecia relatos de inúmeras pessoas
idôneas que diziam tê-la experimentado, as quais
não eram portadoras de nenhum distúrbio psicopatológico.


Proust descreve uma experiência semelhante, provocada
pelo retorno à consciência de lembranças previamente
esquecidas: "(...) Invadira-me um prazer delicioso,
isolado, sem noção da sua causa. Esse prazer logo me
tornara indiferente às vicissitudes da vida, inofensivos os
seus desastres, ilusória a sua brevidade, tal como o faz o
amor, enchendo-me de uma preciosa essência; ou antes,
essa essência não estava em mim, era eu mesmo. Cessava
de sentir-me medíocre, contigente, mortal. De onde
me teria vindo aquela poderosa alegria? (...) De onde vinha?
Que significava? Onde aprendê-la? E recomeço a
me perguntar qual poderia ser esse estado desconhecido
que não trazia nenhuma prova lógica, mas a evidência da
sua felicidade, da sua realidade ante a qual as outras se
desvaneciam. Quero tentar fazê-lo reaparacer" (...). ("La
Recherche du Temps Perdu"). A literatura está repleta de

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 9 3


descrições de experiências especiais, em personalidades
especiais, existindo um novo ramo da Psicologia que estuda
aprofundadamente o assunto, a Psicologia Transpessoal.


Segundo Stõrring, a distimia pode ser considerada
anômala quando não se encontra nenhum motivo que
possa explicá-la ou o motivo é insuficiente. Kurt Schneider
considera os sentimentos como "estados do eu".
Essa definição peca por ser redutiva e mutiladora da vida
psíquica. Jung declara que o eu está para o resto da psique
como a ilha está para o oceano. Stõrring afirma que
a atitude afetiva de uma pessoa deriva do núcleo da personalidade,
e cita a beatitude, o desespero, o remorso, a
paz, a serenidade espiritual etc , como exemplos dessa
suprema região da vida emocional. Segundo a Posição
Espírita, o núcleo da mente está localizado na alma, onde
habita uma centelha da divindade. Segundo o método
científico, a existência de Deus pode ser aceita, senão
como convicção pessoal, como uma probabilidade matemática.
E se a probabilidade matemática da existência da
divindade for igual à unidade?

William James (op. cit.) declara que "creio que terei
êxito, pelo menos, em convencê-los da realidade dos estados
em apreço, e da importância soberana da sua função".
Considera-os portadores de quatro características
genéricas: inefabilidade, qualidade noética, transitoriedade
e passividade (págs. 237, 238). Nessa quarta categoria
inclui o discurso profético, a escrita automática e o
transe mediúnico. Mais adiante será dada a divisão de
Alexandre Aksakof com relação a essas vivências.

Até onde pôde pesquisar o autor, o Espiritismo deixa
em aberto as questões, tais como o centro da alma.
sua origem etc , como se pode depreender da resposta a

9 4 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pergunta n9 78 de "O Livro dos Espíritos": "Quanto, porém,
ao modo por que (Deus) nos criou e em que momento
o fez, nada sabemos. (...) aí é que está o mistério."
Na questão n9 11, lê-se "será dado um dia ao homem:
compreender o mistério da Divindade? — (...) Quando,
pela sua perfeição, se houver aproximado de Deus, ele o
verá e o compreenderá" Essa evolução, claro está, é de
natureza psicológica.

Entre as alterações da afetividade, destacam-se a
hipertimia, a hipotimia, a ansiedade ou angústia, a depressão,
a ambivalência, as fobias, o embotamento etc.

Uma outra função mental é a denominada atividade
voluntária. É também chamada de função conativa, onde
intervêm uma série de fenômenos psíquicos, tais como
percepção, representação, conceitos, afetos etc. Segundo
Paim, existem em torno de três fases no ato voluntário:
deliberação, resolução e execução. O substrato desse
complicado processo são as funções instrumentais da
vida de relação. Em sua obra revolucionária "Psicopatologia
da Vida Quotidiana", Sigmund Freud demonstra, através
de extensa casuística, a que denominou de atos falhos,
lapsos de linguagem falada e escrita etc , a existência
de determinantes inconscientes na atividade voluntária.
O "Teste de Associação de Palavras", de Carl Jung,
base dos modernos testes detectores de mentira, confirma
essa hipótese da atividade subliminar ou subconsciente.


Segundo a corrente behaviorista, a origem da energia
gasta no comportamento seriam as pulsões biogênicas,
a busca de redução de tensão e o valor simbólico É
enorme o conjunto de informações acumuladas pela Psicologia
experimental sobre o comportamento humano e
animal Os psicólogos tendem a evitar o termo vontade.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 9 5


devido às conotações teológicas a ele associadas. No
outro extremo do conhecimento, as filosofias budista e
hinduísta enfatizam que a superação dos desejos sensoriais
ou biogênicos e mesmos os simbólicos, tais como dinheiro,
poder e "status", é a via régia da iluminação espiritual.
Em "Sidharta", Herman Hesse traça, de forma literária,
os riscos de atitudes unilaterais nesse processo de
superação dos desejos através dos personagens Sidharta,
bem-sucedido, e Govinda, neurotizado.

A maioria dos atos executados na atividade voluntária
é relativamente automática, reflexa e instintiva. A natureza
e a direção do ato volitivo dependem do conteúdo
cognitivo, mas a intensidade da ação é mais influenciada
pela afetividade.

Freud captou muito bem o grau de complexidade da
vida de relação, bem como dos produtos mentais subjetivos,
mas não cansou de misturar e complicar sua teoria
da alma humana. No final chegou, apesar de ser um materialista
convicto (?), à proposição dos confusos e metafísicos
conceitos de Eros e Thanatos, ou seja, o instinto
de vida e o instinto de morte. Esse posicionamento se parece
muito com os conceitos místicos do Bem e do Mal.
Esse tema foi desenvolvido por esse genial autor em sua
obra "Moisés e o Monoteísmo", onde, entre outras idéias,
propõe que Jeová não era Deus, mas um Demônio ciumento
e vingativo. Os Cátaros foram perseguidos pelo
Santo Ofício por advogar essa mesma idéia, entre outras
seitas heréticas da Idade Média.

Carl Rogers, um dos expoentes da importante escola
da Psicologia do Eu, propõe que o comportamento visa
à redução de tensão provocada pelos impulsos biogênicos,
a tornar o indivíduo mais independente do ambiente,
a usar ao máximo suas habilidades, ser criativo e a che


9 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


gar a níveis mais altos de eficiência. Essa postura é nitidamente
teleológica e até certo ponto junguiana e espiritualista.


Entre as patologias da atividade, tem-se a agitação
psicomotora, a hipobulia, a abulia, o estupor, o negativismo,
os cacoetes, as estereotipias, a flexibilidade cérea,
os tiques nervosos, as compulsões etc.

Outra função mental bem estudada, mas ainda bastante
desconhecida, é a memória. Segundo a Psicofisiologia,
a memória constitui a base de toda a atividade psíquica.
O seu material é constituído pelas impressões que
chegam à consciência por intermédio das sensações e
são denominadas marcas mnêmicas ou engramas. Essa
fixação dos engramas é grandemente influenciada pela
atenção, pelo interesse, pela repetição e pela familiaridade
com o material psíquico preexistente. Em seu sentido
estrito, a memória é a soma de todos as lembranças existentes
e as aptidões que determinam a extensão e a precisão
dessas lembranças. Também tomam parte a capacidade
de fixação e de evocação.

Em Neurofisiologia já foram determinados dois tipos
distintos de memória, localizados em regiões distintas do
cérebro: a memória recente e a memória pregressa. O
suporte fisiológico da memorização ainda é obscuro, mas
pode envolver tanto a criação de novos circuitos funcionais
entre os neurônios cerebrais como a síntese de proteínas
no citoplasma das células nervosas. De particular
importância no processo mnemónico são os núcleos da
base, especificamente o hipocampo, as amígdalas e os
corpos mamilares.

A memória tem fundamental importância tanto para

o diagnóstico como para a terapêutica em Psiquiatria. A
antiga hipótese freudiana do trauma infantil ilustra a im-
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 9 7


portância dos engramas na etiologia de distúrbios psíquicos.


Aqui também a Posição Espírita alarga "ad infinitum"
o campo da Psicologia. Já foi apresentado um
exemplo autobiográfico de memória de reencarnações
passadas. A rememoração de traumas e conflitos de vidas
passadas é muito utilizada nos processos de ajuda
psicoterápica de caráter mediúnico. Existe também a técnica
da terapia de vidas passadas, embora o conhecido
médium espírita Chico Xavier tenha recebido mensagem
desaconselhando esse tipo de atividade. O autor concorda
inteiramente com essa postura e essa terapia deve receber
a mesma crítica às condutas psicoterápicas de natureza
hipnótica, já consideradas por Freud como inócuas,
quando não prejudiciais, ainda no tempo do grande
neurologista francês Charcot, ao lidar com a Histeria.

Existem algumas publicações, da própria FEB, onde
há referência a uma espécie de registro impessoal denominado,
pelas correntes filosóficas orientais, como Registro
Akáshico. Contudo, esse tema é muito complexo e
foge à finalidade deste ensaio. As lembranças de possíveis
reminiscências das vidas pretéritas são citadas, embora
não com essa explicação espírita, por Jung em sua
autobiografia, quando fala de uma personalidade de um
século passado, e vivenciada como sendo ele próprio.
Jung fez um brilhante diagnóstico diferencial dessa vivência
com o fenômeno patológico da dupla personalidade,
fruto de maciços processos dissociativos da consciência.

Um fenômeno bastante interessante é o citado por
diversos autores a respeito da rememoração cinematográfica
da vida pessoal em situações em que há iminente
risco de vida: "no momento em que a asfixia começava
parecia estar a ver toda a vida passada, nos seus mais

9 8 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pequenos incidentes (...) desenrolando-se em sucessão
retrógrada, não como simples esboços, mas com pormenores
muito precisos, como fornecendo um panorama de
toda a existência, em que cada ato era acompanhado de
um sentimento de prazer ou desprazer" (Paim). Jaspers
também descreveu essas situações limites perante o infortúnio,
o sofrimento e a morte iminente. O Espiritismo
fornece inúmeros exemplos, principalmente nas obras de
Yvonne Pereira e Chico Xavier.

Entre as alterações da memória, tem-se a hipermnésia,
a hipomnésia, a amnésia, encontradas em
psicóticos, nas demencias em pacientes neuróticos ou
epilépticos. A psicose, de Korsakof, produz uma amnésia
anterógrada típica, também observada em lesões cerebrais
tanto de origem mecânica quanto tóxica, como o
envenamento pelo monóxido de carbono etc. As amnésias
das demencias é de natureza retrógrada. As amnésias
psicogenéticas foram bem estudadas por Freud, a
partir de seus estudos em pacientes histéricos e explicadas
como sendo secundárias ao mecanismo psicodinâmico
de defesa, denominado repressão.

Os esquizofrênicos costumam apresentar paramnesias,
ilusões mnêmicas e alucinações mnêmicas. Muitos fenômenos
impenetráveis pela análise psicopatológica tornam-
se claros à luz da Posição Espírita, como ficará claro
mais adiante, ao serem analisados os fenômenos mediúnicos.
Os falseamentos da memória também podem
produzir o intrigante fenômeno da criptomnésia, que tantas
querelas judiciais tem provocado entre inventores, devendo
ser feito o diagnóstico diferencial do plágio, que é
plenamente consciente.

De fundamental importância para a aquisição dos
estados mais elevados de consciência, bem como para

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 9 9


as altas produções artísticas, intelectuais ou mesmo para
os fenômenos mediúnicos é a atenção. Através dela a
mente concentra a sua atividade psíquica sobre o objeto
que a solicita, seja esse uma sensação, uma percepção,
uma representação, um afeto, um desejo etc. Muitos autores
não a consideram uma atividade psíquica autônoma,
sendo determinada pelo interesse, pela motivação ou
pela deliberação consciente. Segundo Paim, a atenção, a
concentração, a consciência, a distração e a subconsciencia
estão estreitamente relacionadas. Sem a atenção,
a atividade psíquica se processaria como num sonho
vago e difuso, como no delírio oniróide ou nos estados
crepusculares da consciência.

A atenção seria um dos fatores delimitadores do
que Freud denominou processo primário e processo secundário.
Contudo, é bom recordar que mesmo nos sonhos
a atenção pode operar, e difíceis problemas podem
ser resolvidos durante a atividade onírica, tais como as
clássicas descobertas do núcleo benzeno, da insulina
etc. Nesse campo a Posição Espírita lança intensas claridades
ao ensinar que alguns sonhos são frutos da atividade
do espírito emancipado da carne, atuando no plano
espiritual.

William James compara a estrutura da consciência
a um alvo de tiro. O centro desse alvo corresponde ao
grau máximo de consciência, onde a atenção está mais
concentrada, e é denominado foco da consciência. Os
círculos concêntricos mais próximos simbolizam os processos
subconscientes, enquanto que os círculos mais
afastados simbolizam o inconsciente. Não existe entre
essas regiões mentais uma delimitação nítida.

Conforme será visto mais adiante, os processos
mediúnicos costumam ocorrer na franja da consciência

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


do médium e isso talvez explique o porquê da banalidade,
segundo Aksakof, da maioria das comunicações mediúnicas,
bem como a confusão com processos inconscientes
a que esse autor russo chamou personismo.

Jung considera a focalização da atenção como o
elemento essencial da consciência, como se um jato de
luz focalizasse certo número de objetos. Em geral, considera-
se o número de objetos passíveis de ser focalizados
pelo foco da consciência como sendo igual a quatro.
Bleuler, por exemplo, considera a atenção como uma das
manifestações da afetividade.

Diz Alonso Fernandez: "a faculdade da atenção
vem a ser uma espécie de raio luminoso constitutivo da
consciência". De acordo com a Posição Espírita, o maior
desenvolvimento espiritual é expresso, no mundo espiritual,
em irradiação de luz. Os Espíritos superiores são
também denominados Espíritos de luz. No nível mental, a
luz simboliza a intensidade da atenção, a maior clareza
dos processos intelectuais e o maior refinamento dos
sentimentos. Aliás, a qualidade predominante da atmosfera
psíquica, no plano espiritual, é expressa pela cor da
denominada aura espiritual, e exprime com exatidão o
grau de evolução espiritual da personalidade. Esse tema
poderia ser mais bem pesquisado pelos estudiosos do
psiquismo, e ilustra o quanto as disciplinas psicológicas e
espíritas são coincidentes e complementares, parecendo
encaixar-se como as peças de um imenso e pluridimensional
quebra-cabeças.

Aliás, já foi dito que Jung afirmara que "ninguém se
torna iluminado imaginando figuras de luz, mas sim tornando
a escuridão consciente". Tornar a escuridão consciente
significa uma tomada de consciência das possibilidades
evolutivas armazenadas nos porões do incons-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ciente da alma. Segundo a Posição Espírita, Deus habita

o núcleo do espírito. Assim, o caminho para a perfeição
espiritual passa necessariamente pela análise psicológica,
desenovelando o emaranhado de idéias, sentimentos,
impulsos, valores e ideais, além da dissolução das dívidas
morais dessa e de outras existências, visando a uma
síntese final, que resulta em plena claridade mental, isenta
de qualquer jaça.
A maturação da personalidade se expressa principalmente
por estados cada vez mais diferenciados de
consciência. Em "As Variedades da Experiência Religiosa",
William James apresenta extensa casuística de estados
avançados de experiência e de consciência, com
enorme erudição.

Atualmente está surgindo um sério movimento no
campo da Psicologia, de caráter internacional, no sentido
de melhor estudar as possibilidades últimas do funcionamento
mental, dentro do campo científico. Anthony Sutich
afirma que essa modalidade da Psicologia, a Psicologia
Transpessoal está "identificada com uma ampla concepção
do método científico (...) Empenhada fundamentalmente
na Psicologia como uma ciência (...) Interessada
em tópicos que ocupam pouco espaço nos sistemas existentes,
tais como amor, criatividade, espontaneidade,
jogo, calor humano, transcendência do ego, autonomia,
responsabilidade, autenticidade, significado, experiência
transcendental, coragem". ("Pequeno Tratado de Psicologia
Transpessoal" — Vol. 5/11.)

Esses especialistas estão pesquisando outras dimensões,
arrebatamento, beleza, transcendência de espaço/
tempo, conhecimento transpessoal etc. Infelizmente,
até onde o autor pôde pesquisar, não se preocupam
diretamente com o tema mediunismo, mas suas conclu-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


sões fundamentais tendem a confirmar os pressupostos
básicos espíritas.

Segundo esses estudos, nos estados mais elevados
de consciência, ocorrem percepções da realidade universal,
de modo independente das vias sensoriais comuns.
Aqui entram os fenômenos mediúnicos. Contudo há fortes
evidências de que nem todas as percepções ocorridas
durante esses raptos são puramente mediúnicas.
Fritjof Capra, renomado físico moderno, escreveu uma
obra extraordinária — "O Tao da Física " — após vivenciar
um estado elevado de consciência: "Há cinco anos
experimentei algo de muito belo, que me levou a percorrer
o caminho que acabaria por resultar neste livro. Eu
estava sentado na praia, ao cair de uma tarde de verão, e
observava o movimento das ondas, sentindo ao mesmo
tempo o ritmo de minha própria respiração. Nesse momento,
subitamente, apercebi-me intensamente do ambiente
que me cercava: este se me afigurava como se
participasse de uma gigantesca dança cósmica. Como físico,
eu sabia que a areia, as rochas, a água e o ar a
meu redor eram feitos de moléculas e átomos em vibrações,
e que tais moléculas e átomos, por seu turno, consistiam
em partículas que interagiam entre si através da
criação e da destruição de outras partículas. Sabia, igualmente,
que a atmosfera da Terra era permanentemente
bombardeada por chuvas de raios cósmicos, partículas
de alta energia e que sofriam múltiplas colisões à medida
que penetravam na atmosfera. Tudo isso me era familiar
em razão de minha pesquisa em Física de alta energia:
até aquele momento, porém, tudo isso me chegara apenas
através de gráficos, diagramas e teorias matemáticas.
Sentado na praia senti que minhas experiências anteriores
adquiriam vida. Assim "vi" cascatas de energia

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cósmica, provenientes do espaço exterior, cascatas nas
quais, em pulsações rítmicas, partículas eram criadas e
destruídas. "Vi os átomos dos elementos — bem como
aqueles pertencentes a meu próprio corpo — participarem
desta dança cósmica de energia. Senti o seu ritmo e
'ouvi' o seu som. (...)"

Provavelmente esse autor praticava alguma técnica
de Yoga, pois dizia: "sentindo ao mesmo tempo o ritmo
de minha própria respiração". Essas técnicas são indutoras
de um estado eletroencefalográfico onde predominam
as ondas alfas, e são indutoras do transe, por liberar as
estruturas subcorticais. Como é sabido, o córtex cerebral
é inibidor das estruturas subcorticais. Mais adiante será
visto que a Doutrina Espírita faz inúmeras referências ao
lócus dos processos mediúnicos como situados nas estruturas
subcorticais.

Bleuler destaca duas qualidades da atenção: a tenacidade
e a vigilância. As técnicas orientais em geral
procuram desenvolver justamente essas qualidades,
como método de desenvolvimento espiritual. Na Doutrina
Espírita, tem-se prática mais ou menos similar, através
do chamado desenvolvimento mediúnico. Pesquisas mais
aprofundadas certamente confirmarão a importância da
prática da meditação para o desenvolvimento das faculdades
mediúnicas, onde a concentração desempenha
papel fundamental.

Entre as patologias da atenção, destacam-se a distratibilidade,
a hiperprosexia, a aprosexia e a hipoprosexia.
Em relação à consciência, tem-se a obnubilação, o
delírio oniróide, a amência ou confusão mental, os estados
crepusculares das mais variadas etiologias.

Para finalizar o presente resumo, será dito que a divisão
da atividade psíquica tem mais uma finalidade didá-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


tica que uma base natural. Em verdade, a atividade mental
deve ser analisada "in totum", encontrando-se as diversas
funções vinculadas e entrelaçadas, estabelecendo-
se entre elas uma relação de causalidade, sem, contudo,
abandonar a perspectiva relativística demonstrada
no capítulo precedente.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Ill

O PROCESSO DA INTUIÇÃO

Embora se tenha dito, no capítulo precedente, que a
mente deva ser compreendida como um todo orgânico e
indivisível, o seu funcionamento não se apresenta, contudo,
homogênio nem uniforme. Embora não se concorde
aqui com o unilateralismo de John Dewey, o criador do
Funcionalismo, que abole a noção de mente como substantiva,
a análise demonstra que a mente possui inúmeras
funções perfeitamente delimitáveis. A própria neurofisiologia
tem confirmado, pelo menos em parte, essa conclusão.


No capítulo anterior foram estudadas, resumidamente,
as funções mentais normais, em termos estatísticos.
O conceito de normalidade em Estatística é definido
segundo critérios puramente matemáticos, e por isso não
deve ser o único a ser considerado, especialmente pelas
disciplinas que lidam com o psiquismo humano. No
presente capítulo serão estudadas as funções mentais
ditas paranormais, o que não implica, de maneira alguma,
patologia mental. Essas funções mentais apresentam
evidências claras de transcender os limites im-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


postos pela fisiologia da percepção, bem como as contingências
de espaço, tempo, causalidade etc. Em Parapsicologia
são conhecidas como funções Psi.

Raciocinando de um modo analógico, as funções
mentais devem ser entendidas como as diferentes partes
do organismo, que, embora distintas, tanto em termos
anatômicos como funcionais, compõem um todo harmonioso.
Apesar de não ser como um veículo automotivo,
formado de peças inteiramente independentes entre si, o
corpo humano possui os mais diferenciados órgãos, com
as mais variadas funções. É composto de cabeça, tronco
e membros, distintos entre si tanto anatômica quanto fisiologicamente.
Assim, seria inconcebível o funcionamento
de um organismo onde os membros superiores fossem
implantados de modo inverso aos membros inferiores.

Exemplificando, os movimentos de pinça e apreensão
executados pelos quirodáctilos seriam impossíveis
de ser realizados sem a especificidade funcional e anatômica
das mãos. A cabeça, para funcionar como tal, necessita
da estreita adequação dos diversos órgãos às
respectivas regiões anatômicas: frontal, orbitaria, nasal,
malar, masseteriana, geniana, auricular, bucinadora, labial,
mentoniana etc.

Para a captação dos raios luminosos e subseqüente
emissão dos impulsos nervosos aferentes, que demandam
o encéfalo, tem a retina organização extremamente
especializada. O mesmo se pode dizer em relação à audição,
olfação, tato, gustação etc. Não seria correto afirmar,
por exemplo, que a divisão entre os sistemas endócrino,
cardiovascular e digestivo seja apenas em função
de maior simplificação didática.

O mesmo ocorre com o cérebro. O sistema nervoso
é composto de bilhões de neurônios das mais diversas

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


especialidades, interligados entre si por trilhões de conexões
sinápticas. Embora o seu funcionamento seja harmonioso
e orgânico, seria incorreto aparar as diferenças
tanto anatômicas quanto funcionais entre as estruturas
diencefálicas e corticais.

Ora, o mesmo deve ocorrer com a mente. Não existe
função sem um órgão que lhe corresponda. Fica então
levantada a questão: onde está localizada a estrutura, ou
estruturas, responsáveis pelas funções ditas paranormais?
A Parapsicologia já demonstrou a existência de
funções mentais que transcendem as contingências anteriormente
mencionadas. Suas pesquisas já foram reconhecidas
pela Associação Americana de Psicologia. Ao
contrário da Metapsíquica, das diversas correntes filosóficas
e religiosas, seus métodos se enquadram perfeitamente
dentro dos rígidos preceitos estipulados pelo Método
Científico. Portanto, não são mais meras suposições
ou atos de fé.

Do ponto de vista da Lógica Formal, sendo o organismo
humano constituído de matéria densa, ocupando
um lugar no espaço, e limitado às contingências de tempo,
causalidade etc, não poderia, de modo algum, transcender
esses limites. Ora, a lógica impõe a dedução de
que, para tanto, deve possuir, o ser humano, algo que
transcenda tais limites e contingências. Esse algo mais é

o que a Posição Espírita, em particular, e as religiões, em
geral, denominam como sendo a alma ou espírito. Essa
hipótese tem um embasamento filosófico, que já foi visto,
e começa a adquirir foros de conceitos que não mais podem
ser refutados pela ciência, de acordo com os modernos
avanços da Física Moderna, que serão apresentados
resumidamente mais adiante.
O que é matéria? O que é a alma ou o espírito?

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Como essas categorias se relacionam entre si? A mera
adoção de um raciocínio filosófico, como o do dualismo
psico-físico, não resolve essas questões. A solução está
sendo lentamente desenvolvida, por mais paradoxal que
seja, pela moderna Física.

O ponto de partida foi a descoberta, pelos físicos
nucleares, de que, na estrutura íntima do átomo, o ideal
clássico de objetividade científica não mais pode ser sustentado.
Um segundo fator passou a ser considerado
como um elo fundamental da experimentação científica: a
mente analítica do experimentador (Fritjof Capra, op. cit.).
A Teoria Quântica aboliu a noção de objetos fundamentalmente
separados, introduzindo o conceito de participante,
em substituição ao antigo conceito de observador
independente e imparcial, e pode vir a considerar necessário
incluir a consciência humana em sua descrição do
Universo.

A Teoria Quântica foi levada a ver o Universo como
uma teia interligada de relações físicas e mentais, cujas
partes só podem ser definidas através de suas vinculações
com o todo. A Doutrina Espírita endossa essa extraordinária
postura dos físicos modernos, indo além, ao introduzir,
com A. Luiz, o conceito de átomo mental, que será
apresentado nos próximos capítulos.

Segundo Kapra, "na Física Atômica, o cientista não
pode desempenhar o papel de um observador objetivo
distanciado, torna-se, isto sim, envolvido no mundo que
observa na medida em que influencia as propriedades
dos objetos observados". John Wheeler vê esse envolvimento
do observador como a característica mais importante
da Teoria Quântica. Segundo ele, "num estranho
sentido, o Universo é um Universo participante".

É bastante estranho, para não dizer paradoxal, que

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


justamente no campo mais exato das ciências a mente
passasse a desempenhar um papel preponderante. Assim,
os limites entre o mundo fenoménico objetivo e a
subjetividade do observador deixam de existir. Esse fato
já havia sido pressentido por diversos filósofos, destacando-
se o Existencialismo de Kierkgaard e de J. P. Sartre.
Em seu texto literário "A Convidada", Simone de Beauvoir
descreve essa participação de modo assaz penetrante.
Mais adiante serão dados exemplos da literatura espírita,
mais especificamente A. Luiz, onde esses modernos
conceitos retratam, com exatidão, a existência nos planos
espirituais.

Contudo, o mérito da descoberta das estreitas relações
entre a Teoria Quântica — e suas implicações filosóficas
— e a Psicologia deve ser creditada a Jung, especialmente
no que tange ao problema dos arquétipos,
que tanto influenciaram o pensamento de W. Pauli, em
cuja parceria Jung publicou importante ensaio científico-filosófico,
além de Werner Heisemberg e outros (M. Schenberg).


A Física subatômica subverteu completamente o
conceito de matéria da Física clássica, assim como os
conceitos de espaço, tempo, causa, efeito etc. Kapra assinala
que essa disciplina conduziu a Humanidade a uma
visão onde a Ciência, a Filosofia e a Religião não se encontram
mais separadas. Ora, há mais de um século era
exatamente essa a visão da Doutrina Espírita, sistematizada
por A. Kardec.

Esse posicionamento também foi alcançado pela Filosofia
grega do século VI a.C , especialmente entre os
sábios da escola de Mileto. Essa visão organística do
Universo também foi atingida pelos grandes místicos do
Oriente, conforme demonstra F. Kapra em sua obra já ci-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


tada. Para esse autor, a linguagem do Budismo, do
Taoísmo e do Hinduísmo tende a se confundir com a linguagem
da Teoria Quântica.

Einstein experimentou um choque ao entrar, pela
primeira vez, em contato com a nova realidade da matéria,
conforme escreveu em sua biografia: "(...) todas as
minhas tentativas de adaptar o fundamento teórico da Física
a esse novo tipo de conhecimento falharam completamente.
Era como se o solo tivesse sido retirado de sob
nossos pés, sem que se conseguisse vislumbrar qualquer
base sólida sobre a qual pudéssemos erguer alguma coisa".


Contudo, o materialismo dialético reagiu com violência
diante do óbvio, e foi criticado por Heisemberg nos
seguintes termos: "(...) a reação violenta em torno do desenvolvimento
recente da Física Moderna só pode ser
entendida à medida que compreendermos que os alicerces
da Física começaram a se deslocar e que esse movimento
gerou o sentimento de que a ciência perderia terreno".
Corrigindo esse eminente cientista, a ciência jamais
perderá terreno, mas unicamente a mentalidade retrataria
de alguns cientistas, limitados em suas possibilidades
pessoais.

Esse deslocamento é da mais extraordinária importância
e está apenas nos seus primórdios, e a própria Física
se debate, confusa, diante de abismos, insondáveis
por ora. Segundo Kapra, "(...) para um entendimento integral
do mundo nuclear é necessário uma teoria que incorpore
tanto a Teoria Quântica quanto a Teoria da Relatividade.
Uma teoria desse porte ainda não foi encontrada
(...) a fusão das Teorias Quântica e da Relatividade numa
teoria completa do mundo das partículas ainda constitui o

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


problema central e o grande desafio da Física Moderna"
(op. cit).

O palco do universo newtoniano, no qual se desdobravam
todos os fenômenos físicos, era o espaço tridimensional
da Geometria euclidiana clássica. Havia também
uma dimensão separada chamada tempo.

Os elementos do mundo newtoniano que se moviam
nesse espaço e tempo absolutos eram partículas
materiais, "pontos dotados de massa", e Newton as concebia
como objetos pequenos, sólidos, indestrutíveis, a
partir dos quais toda a matéria era elaborada. A visão da
natureza achava-se, dessa forma, intimamente vinculada
a um determinismo rigoroso, cuja base filosófica era a noção
de Descartes da divisão fundamental entre o eu e o
mundo.

Contudo, Faraday e Maxwell, investigando os fenômenos
elétricos e magnéticos, descobriram que envolviam
um novo tipo de força, que não poderia ser descrita
pelo modelo mecanicista de Newton, até então encarado
como a teoria última dos fenômenos naturais. Esses autores
substituíram o conceito de força pelo de campo de
força: ao fazê-lo, foram os primeiros a ultrapassar os limites
da Física newtoniana. Descobriram que cada carga
gera uma perturbação no espaço, que apresenta o potencial
de gerar uma força e é denominada de campo. É
exatamente a partir do conceito de campo, que o autor A.
Luiz introduz as interações entre o espírito e a matéria;
segundo esse autor, o conceito de campo ainda não é a
última descoberta em Física, porquanto "(...) a matéria de
base para o campo continua desafiando o raciocínio, motivo
pelo qual, escrevendo da esfera extrafísica, na tentativa
de analisar, mais acuradamente, o fenômeno da
transmissão mediúnica, definiremos o meio sutil em que

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


o Universo se equilibra como sendo o Fluido Cósmico ou
Hálito Divino, a força para nós inabordável que sustenta a
Criação". ("Mecanismos da Mediunidade", FEB, 1959,
págs. 10/41).
Ao descobrir o conceito de campo, a Física praticamente
extrapolou a matéria, pois o campo possui a sua
própria realidade, podendo ser estudado sem qualquer
referência a corpos materiais. O campo possui peculiaridades
estranhíssimas, completamente absurdas, parecendo
ser a porta de entrada para as outras dimensões
do Universo. Mais adiante isso será confirmado, com a
Posição Espírita, conforme já adiantou A. Luiz, citado acima.


A partir do conceito de campo, os físicos galgaram a
eletrodinâmica, que considera a luz como um campo eletromagnético.
Essa teoria foi complementada por Einstein,
meio século mais tarde, ao declarar que os campos
eletromagnéticos são entidades capazes de percorrer o
espaço e que não podem ser explicados mecanicamente.

Einstein era um cientista que acreditava decididamente
em Deus e na harmonia inerente da Natureza, e
sua preocupação mais profunda era encontrar um fundamento
unificado para a Física. Descobriu que o espaço
não é tridimensional e que o tempo não constitui uma entidade
isolada. Descobriu que o espaço é curvo e que o
conceito de vazio não tem significado, formando o espaço
e o tempo um "continuum" espaço-tempo. Foi além,
ao descobrir sua genial fórmula E=mc2.

Com Rutherford, ao bombardear os átomos com
partículas alfa, a Física descobriu que a matéria é bastante
estranha, apresentando um aspecto dual, comportando-
se ora como partícula ora como onda. Descobriu-se
também a unidade entre a matéria e a energia, que

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


também é descontínua, existindo sob a forma de quanta
ou "pacotes de energia". Segundo Kapra, essa contradição
fundamental da matéria deixou os físicos perplexos,
sendo obrigados a formular verdadeiros paradoxos, semelhantes
aos Koans do Budismo Zen. Ruíram as bases
falsas do materialismo dialético, embora não se possa
afirmar ainda que a Física tenha descoberto o Espírito.
Essa possibilidade é ainda bastante remota, mas já existe
cientificamente, o que já é um passo enorme.

Através de gigantescos aceleradores de partículas,
puderam os físicos nucleares estudar o comportamento
de inúmeras partículas, em determinado campo. Ocorre
que, para a mais absoluta perplexidade, foi constatado
que partículas surgem do "nada", descrevem trajetórias
compatíveis com as respectivas massas, para depois
adentrarem o "nada". Algumas percorrem a dimensão
tempo progressivamente, em direção ao futuro, outras o
percorrem regressivamente, em direção ao passado.
Nada consegue explicar esses paradoxais comportamentos
das partículas subatômicas. Contudo, com a proposição
do autor espírita anteriormente transcrita, parece que
tudo adquire uma nova e maravilhosa luz, causando não
perplexidade, mas deslumbramento, arrebatamento, até!

Os físicos nucleares descobriram que a realidade
atômica e subatômica transcende os limites da Lógica
clássica e que a linguagem comum afigura-se inteiramente
inadequada para a descrição dessas realidades. Estranhamente,
essa dualidade, esses paradoxos e essa impossibilidade
de representação pela linguagem convencional
ocorrem de maneira idêntica em relação aos fenômenos
mentais, como assevera Jung. Segundo esse
grande psiquiatra suíço, não existe um único material psíquico
unívoco, nos porões do inconsciente.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Nem a imaginação, nem a linguagem estão normalmente
preparadas para lidar com esse tipo de coisa.
Essa limitação imposta à mente pela Lógica Formal é o
mais poderoso obstáculo à compreensão não só da realidade
da matéria como também da realidade da mente
como coisa (alma).

Essa impossibilidade de penetração é bem conhecida
da maioria dos psicoterapeutas, que procuram suprir
essa lacuna fundamental através de uma espécie de penetração
empática, baseada principalmente em elementos
afetivos e intuitivos. Alguns se utilizam de métodos
não diretivos, permitindo a seus clientes uma maior liberdade
de ação, liberando seus processos mentais para a
aquisição dos "insights" fundamentais ao processo terapêutico.


Os psicoterapeutas ainda não chegaram a um consenso
sobre o que realmente se passa na relação terapeuta-
cliente. Segundo Mallpass, os pressupostos teóricos
têm pouca serventia aqui, onde o fundamental é a
própria personalidade do terapeuta. Segundo a Doutrina
Espírita, o que realmente ocorre durante o processo psicoterápico
é uma troca de energia mental, como será visto
mais adiante. É fato geralmente aceito, por grande número
de terapeutas, o fenômeno da comunicação inconsciente,
que alguns teóricos denominam de relação transferencial.
Essa relação se dá tanto no nível puramente
psicológico como também no energético. Muitos consideram
essa proposição espirítica um retrocesso a uma espécie
de mesmerismo ultrapassado, ou até mesmo a
uma demonologia medieval obscurantista. Contudo, a Física
das partículas tem contribuído para abrir novos horizontes
no campo do psiquismo humano, que tendem a
apontar na mesma direção da hipótese espirítica.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


As descobertas que revolucionaram o pensamento
científico se deram principalmente na década de 20, por
um grupo de físicos, internacional, entre os quais se destacaram
Niels Bohr, da Dinamarca, Louis de Broglie, da
França, Erwin Schrõdinger e Wolfgang Pauli, da Áustria,
Werner Heisemberg, da Alemanha, e Paul Dirac, da Inglaterra.
Eles descobriram que a estrutura intrínseca da
matéria subatômica é feita de paradoxos desconcertantes.


Demonstraram que as unidades subatômicas da
matéria são entidades extremamente abstratas, dotadas
de uma natureza dual, tal como os processos psíquicos,
e que não podem ser dissociadas dos processos mentais
do experimentador, agora dito participante.

Dirac, ao descobrir a simetria fundamental entre a
matéria e a antimatéria, empurrou a Física Moderna para
um campo que poderia ser dito, sem exagero, Parafísico.
A simetria entre a matéria e a antimatéria implica o fato
de que para cada partícula existe urna antipartícula, portadora
de igual massa, mas de carga oposta. Pares de
partículas e antipartículas podem ser criados, se se dispuser
de suficiente energia, e podem ser transformados
em energia pura no processo de aniquilação. Esse processo
conduz ao paradoxo de que as partículas subatômicas
são destrutíveis e indestrutíveis ao mesmo tempo.
Nesse mundo, conceitos clássicos como "partículas elementares",
"substância material" ou "objeto isolado" perderam
qualquer significado, e a partícula não mais pode
ser compreendida como uma entidade isolada, mas sim
como parte integrante de um todo. O mesmo se pode afirmar
em relação aos processos psíquicos.

Talvez seja de interesse encerrar este resumo ultra-esquemático
das novas descobertas sobre a realidade últi


11 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ma da "matéria" com o aforismo de Albert Einstein: "Até
onde as leis da Matemática se refiram à realidade, elas
estão longe de constituir algo certo; e, na medida em que
constituem algo certo, não se referem à realidade."

Com a derrocada da Lógica Formal, como instrumento
de pesquisa das realidades da "matéria" e da
mente, ficam outros meios de abordagem das realidades
últimas do Universo. Esses meios, ou funções instrumentais
da busca de conhecimento são as denominadas funções
transcendentes. Essas funções compreendem o
pensamento intuitivo, por um lado, e as ditas funções paranormais
por outro. As funções mediúnicas seriam uma
terceira categoria, conforme sistematização de Alexandre
Aksakof, e serão estudadas em capítulo à parte. Contudo,
segundo o mestre russo, um mesmo fenômeno pode
ser explicado pelas três hipóteses, como será visto mais
adiante.

Não existe consenso, entre os diversos autores, e
correntes filosóficas, quanto às origens, aos mecanismos
e mesmo à terminologia aplicada a esses ditos fenômenos.
Contudo, a falta de concordância não implica, em
absoluto, a infirmação da hipótese de sua existência.

O estudo dessas funções mentais aqui proposto
será centralizado sempre no indivíduo, participante do fenômeno,
e, por isso mesmo, será dada ênfase especial
aos aspectos psicológicos. A esse respeito, F. Kapra afirma
que uma experiência mística não se afigura menos
sofisticada que um moderno experimento da Física, embora
essa sofisticação seja de um tipo inteiramente diverso.
Esse mesmo raciocínio comparativo pode ser aplicado
entre a resolução cirúrgica de uma hidrocefalia, por
exemplo, e a resolução psicoterápica de uma neurose fóbica.


PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Schopenhauer afirmou, com pessimismo, que o "homem
é um animal que tem a funesta mania de pensar".
Isso em se tratando do pensamento lógico, que conduziu

o homem à lua, mas também conseguiu a bomba atômica.
Mas, em que consiste a essência do pensar?
Segundo Aristóteles, o pensamento formal era regido
por quatro leis fundamentais: a) Lei da associação por
simultaneidade ou continuidade temporal; b) Lei da associação
por contiguidade espacial; c) Lei da associação
por semelhanças de forma ou de contraste; d) Lei da associação
por semelhanças ou contrastes de significado.
Contudo, essas leis não explicam o âmago da questão,
ou seja, o ato de pensar, ou o conteúdo desse ato ou o
efeito obtido com ele.

De acordo com Mira Y Lopez, o pensamento permanece
intimamente ligado aos sentimentos e à ação. Assim,
o pensamento não surge bruscamente na evolução
filogenética, mas foi evoluindo com os centros nervosos
que lhe servem de substrato. Essa evolução biológica do
pensamento, em particular, e do espírito, em geral, se
processou paralelamente no binômio matéria física e espiritual,
de acordo com a Doutrina Espírita, segundo A.
Luiz ("Evolução em dois Mundos", FEB, 1958). Segundo
esse autor, esse paralelismo se processa entre "o corpo
espiritual (...) que não é reflexo do corpo físico, porque,
na realidade, é o corpo físico que o reflete, tanto quanto
ele próprio, o corpo espiritual, retrata em si o corpo mental
que lhe preside a formação" (pág. 25).

Mira Y Lopes refere que inicialmente surgiu o pensamento
primitivo, também chamado de instintivo, automático
ou sensorimotor. Esse pensamento não tem formulação
verbal e somente opera com dados sensoriais e
motores.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Depois surgiu o pensamento arcaico ou pré-mágico.
Ocorre nos primatas mais evoluídos e nas crianças de 2
a 3 anos de idade. Possui tonalidade alucinatória por ser
a projeção imaginativa dos impulsos internos, determinados
pela tonalidade emocional imperante. É encontrado
também nalguns sonhos ou sob o efeito de algumas drogas
psicodélicas, que, por isso mesmo, também são denominadas
eidéticas. O indivíduo é autista, o pensamento
é dereísta, e não existem limites entre o ser pensante e o
pensado. Ainda não está presente a "fonction du réel", ou
juízo de realidade.

A etapa evolutiva seguinte é o denominado pensamento
mágico. Milhões de pessoas, de baixo nível cultural,
vivem submetidas a essa modalidade de pensamento.
Contudo, o seu período natural de ocorrência no desenvolvimento
psíquico da criança ocorre entre o 3º e o
6º ano de vida. É a base de um sem número de crenças,
lendas e tradições. Não capta a essência, mas unicamente
as aparências dos objetos. Por não conhecer os princípios
da razão, deixa-se guiar apenas pelas temporárias e
fortuitas conexões associativas de proximidade, contiguidade
e similitude. Quando o feiticeiro apanha o fio de cabelo
de sua suposta vítima para executar seus atos maléficos
ou benéficos, na verdade está sendo regido por
essa forma mágica de pensamento.

A etapa seguinte da evolução do ato de pensar é a
do assim chamado pensamento egocêntrico. Segundo a
escola franco-suíça de Piaget, essa modalidade de pensamento
é própria da primeira e da segunda infância.
Sua característica fundamental é estar centralizado ao redor
da própria pessoa pensante, que é incapaz de ver a
realidade objetivamente. Tudo deve passar pelo crivo do
"para que me serve?" A pessoa vítima de uma forte

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


emoção, como a raiva, o medo ou até mesmo do amor
romântico, ou em um campo de batalha com risco real de
morte iminente, também se torna incapaz de pensar objetivamente.


A etapa seguinte do processo evolutivo do pensamento
é a do pensamento lógico, própria dos adultos humanos,
civilizados e cultos. Essa forma de pensar serviu
ao homem para alcançar todas as suas conquistas científicas
e tecnológicas, e se caracteriza por clareza e distinção.
A base do pensamento lógico é o princípio da contradição,
que introduz as noções de substância, essência
e categoria. Segundo alguns autores, essa forma de pensar
foi conquistada pelo povo grego poucos séculos antes
de Jesus. Contudo, essa afirmativa é altamente questionável,
pois reduz todas as culturas mais antigas a níveis
arcaicos e mágicos, o que é difícil de ser comprovado.
O pensamento lógico é especialmente estudado pela
Filosofia, no capítulo da Lógica Formal, e já foi feito um
breve resumo do seu funcionamento normal e patológico
no capítulo precedente.

Finalmente é atingida a forma mais complexa, elaborada,
superior e por isso mesmo menos compreendida,
que é a do pensamento intuitivo. Alguns psicólogos, com
pequena capacidade de penetração, nem chegam a admitir
a sua existência.

De acordo com Mira Y Lopez ("O Pensamento"),
essa modalidade de pensamento se apresenta como
conseqüência de um trabalho mental inconsciente, cujo
resultado final emerge bruscamente, em forma de palpite
ou de inspiração, ante a consciência do sujeito. A pessoa
afirma: "eu sei que isto é assim", mas não sabe explicar
porque o sabe nem em que se baseia a sua certeza.

O pensamento intuitivo ocorre especialmente nas

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pessoas dotadas de grande riqueza imaginativa e grande
sensibilidade afetiva, ou seja, nas pessoas em que domina
o sentimento sobre a razão. Ora, essas características
são encontradas especialmente nas pessoas com dotes
artísticos, como também nas personalidades com faculdades
mediúnicas mais ou menos desenvolvidas. O processo
da criação artística se dá em sua maior parte por
vias inconscientes, recebendo o eu, às vezes, o produto
acabado, como se pode concluir do relato pessoal de inúmeros
grandes artistas. Consta que Beethoven recebeu o
tema do quarto movimento da sua famosa sinfonia "Coral"
praticamente pronto. Robert Schuman entrava em desespero,
nos primórdios de sua doença mental, por não
conseguir transcrever as maravilhosas melodias que percebia
por meio da intuição. Uma prova da atuação dos
processos inconscientes na criação, artística ou não, são
os testes projetivos, destacando-se o Teste de Rorschach.
Existe no Brasil o maior museu de produção artística
de pacientes psicóticos em todo o mundo, o Museu
de Imagens do Inconsciente, criado pela dama da Psiquiatria
brasileira, Nise da Silveira, e tombado pela Unesco,
localizado no Hospital D. Pedro II, do Rio de Janeiro.

Ao subtrair o juízo reflexivo-crítico da consciência, o
pensamento intuitivo pode igualmente conduzir o sujeito
ao acerto ou ao erro. É muito difícil o diagnóstico diferencial
entre a intuição genial, a intuição delirante e a intuição
de origem mediúnica. Mais adiante será estudado o
mecanismo psicofisiológico da intuição mediúnica. A diferenciação
tem mais importância no campo da Psicopatologia
propriamente dita.

As pessoas nas quais se dão tais manifestações terão
que submetê-las imediatamente à análise do seu
pensamento lógico, para saber a origem de suas intuições.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Aqueles processos que parecem corresponder a princípios
desconhecidos foram agrupados por Rhine no grupo
do ESP ("extra sensorial perception") ("The Reach of the
Mind"). Não será demais repetir que a Associação Americana
de Psicologia reconheceu os experimentos de Rhine
como cientificamente válidos. Seus resultados têm
sido utilizados até mesmo por serviços de inteligência de
alguns países mais avançados, infelizmente.

Ainda existe, na comunidade científica, arraigado
preconceito em relação a esse campo de pesquisa científica.
Todavia, essa atitude não tem qualquer embasamento
teórico e se assenta nos processos arcaicos e inconscientes
desses opositores. Ela é também fruto da ignorância
em relação a essas modernas pesquisas.

Ao longo da história, tem-se reconhecido que a
mente humana é capaz de duas espécies de conhecimento,
ou de duas modalidades de consciência, denominadas
racional e intuitiva, e tradicionalmente associadas
à ciência e à religião, respectivamente.

Há séculos que a filosofia chinesa enfatizava a complementaridade
do conhecimento intuitivo e racional, representando-
os pelos arquétipos yin e yang. O conhecimento
racional é um conjunto de símbolos, conceitos abstratos,
caracterizados pela estrutura seqüencial e linear, explicitado
através do uso da linguagem (Kapra). Contudo,
a ciência já demonstrou que o pensamento conceituai
mostra-se incapaz de descrever ou sequer apreender integralmente
a realidade objetiva. Em relação à realidade
subjetiva essa dificuldade aumenta em proporções geométricas,
já tendo sido dito, por exemplo, que em geral os
psiquiatras não apreendem quase nada daquilo que se
passa na mente de seus clientes.

Segundo Werner Heisemberg cada palavra ou con-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ceito, por mais nítidos que pareçam, só possuem uma faixa
limitada de aplicabilidade. Contudo, há uma tendência
generalizada de confundir o sistema de conceitos com a
própria realidade. Isso tem gerado uma tremenda confusão,
sendo bem maior em relação ao campo das ciências
que estudam o comportamento humano, tanto aparente
como velado ou inconsciente. Quando um psicoterapeuta
se depara com alguma vivência incompreensível, tende a
rotulá-la com um nome pomposo que escotomiza a sua
ignorância e alivia a ansiedade provocada pelo desconhecido.


Segundo Kapra, o pensamento intuitivo, desenvolvido
em alto grau pelos místicos orientais, busca justamente
superar essa confusão através de uma experiência direta
da realidade que transcenda não apenas o pensamento
intelectual, mas também a percepção sensorial,
através dos órgãos dos sentidos.

Em sua "Autobiografia de um Yogue", Paramahansa
Yogananda descreve a seguinte e rara experiência intuitiva:


"Meu corpo tornou-se imóvel como se tivesse raízes;
o alento saiu de meus pulmões como se um ímã
enorme o extraísse. Instantaneamente o espírito e a mente
romperam com sua escravidão ao físico e jorraram de
cada um de meus poros como luz perfurante e fluida. A
carne parecia morta e, contudo, em minha intensa lucidez,
eu percebia que nunca antes estivera tão plenamente
vivo. Meu senso de identidade já não se achava confinado
à estreiteza de meu corpo, mas abarcava os átomos
circundantes. Pessoas em ruas distantes pareciam
mover-se suavemente em minha própria e remota periferia.
Raízes de plantas e árvores eram percebidas através

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


de uma tênue transparência do solo; e eu distinguia a interna
circulação da seiva.

A vizinhança inteira surgia desnuda diante de mim.
Minha visão frontal comum havia-se transformado em
vasto olhar esférico que percebia tudo simultaneamente.
Através de minha nuca, vi homens caminhando além da
distante viela de Rai Ghat e também notei uma vaca
branca aproximando-se preguiçosamente. Quando ela
chegou à porta do áshram, observei-a como se o fizesse
com meus dois olhos físicos. Depois que passou para
trás do muro de tijolos do pátio, continuei a vê-la, claramente.


Todos os objetos dentro de meu olhar panorâmico
tremiam e vibravam como rápidos filmes cinematográficos.
Meu corpo, o corpo de meu Mestre, o pátio com
suas colunas, a mobília, o assoalho, as árvores e a luz do
Sol, tornavam-se, de vez em quando, violentamente agitados
até que tudo se fundia num mar luminescente, assim
como os cristais de açúcar, mergulhados num copo
dágua, diluem\se depois de serem sacudidos. A luz unificadora
alternava-se com materializações de formas e as
metamorfoses revelavam a lei de causa e efeito da criação.


Uma alegria oceânica rebentava nas praias serenamente
intermináveis de minha alma. Atingi a realização
de que o Espírito de Deus é Beatitude inesgotável; Seu
corpo compreende incontáveis tecidos de luz. Um sentimento
de glória crescente dentro de mim começou a envolver
cidades, continentes, o planeta, os sistemas solares
e as constelações, as tênues nebulosas e os universos
flutuantes. O cosmo inteiro, suavemente luminoso,
semelhante a uma cidade vista de alguma distância à
noite, cintilava dentro da infinidade de meu ser. Para

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


além de seus contornos definidos, a luz ofuscante empalidecia
ligeiramente nos confins mais longínquos; ali eu
via uma radiação branda, nunca diminuída. Era indescritivelmente
sutil; as figuras dos planetas constituíam-se de
uma luz mais densa.

Os raios luminosos dispersavam-se oriundos de
uma Fonte perpétua, resplandecendo em galáxias, transfiguradas
com auras inefáveis. Vi, repetidas vezes, os fachos
criadores condensarem-se em constelações e depois
dissolverem-se em lençóis de transparente chama.
Por reversão rítmica, sextilhões de mundos transformavam-
se em brilho diáfano e, em seguida, o fogo se convertia
em firmamento.

Conheci o centro do empíreo como um ponto de
percepção intuitiva em meu coração. Esplendor irradiante
partia de meu núcleo para cada parte da estrutura universal.
O beatífico Amri, néctar da imortalidade, corria através
de mim, com fluidez de mercúrio. Ouvi ressoar a voz
criadora de Deus, Aum, a vibração do Motor Cósmico.

De súbito, a respiração voltou aos meus pulmões.
Com desapontamento quase insuportável, constatei que
havia perdido minha infinita vastidão. Mais uma vez me limitava
à jaula humilhante do corpo, tão desconfortável
para o Espírito." (Op. cit. págs. 144/145.)

Vivências de feição mística soem ocorrer em pacientes
psicóticos com ideação delirante-alucinatória. Haverá
alguma diferença fundamental entre essas produções
patológicas e aquelas dos místicos de todas as épocas e
latitudes?

O autor tratou de um jovem psicótico, com cerca de
19 anos de idade, ao sofrer o primeiro surto psicótico,
após uma infância de abandono e orfandade. Trata-se de
um jovem com dotes artísticos e com incomum capa-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 125


cidade de verbalização de suas vivências pessoais. Certa
feita, acordou pela manhã com a convicção delirante de
que era um grande profeta com a missão de pregar uma
nova religião. Levantou-se da cama e, imediatamente, se
pôs a caminhar "na direção dos raios luminosos", isto é,
em direção à própria sombra. Atravessou terrenos baldios,
estradas, matas, rios e pântanos, quando foi socorrido
em uma herdade rural. No trajeto teve uma visão do
Espírito Santo, que lhe apareceu sob a forma de um
bebê. Diante de uma vivência dessa natureza, o chão parece
desaparecer por sob os pés do interlocutor. Rótulos
pomposos, tais como delírio primário, delírio secundário,
onirismo, alucinações psicossensoriais de Baillarger, psicose
paranóide etc, embora aliviadores da tensão provocada
no terapeuta, não lançam nenhuma luz sobre o fenômeno.
O mistério permanece.

Segundo Van den Berg, esses estados provocam,
de uma certa forma, reações similares nos terapeutas,
que ficam, eles mesmos, em certo sentido, um pouco psicóticos.
Jung cita, em sua obra "Psicologia da Transferência",
casos de psiquiatras com surtos paranóides por
contágio psíquico. Ora, o mesmo se dá em relação aos
fenômenos místicos, cujos protagonistas costumam arrebanhar
uma legião de seguidores mais ou menos fanáticos.


Diante do ilógico, teorias lógicas não levam a nenhum
porto seguro. Diante das vivências relatadas pelo
paciente, pôde o autor captar, sob a forma de visão, o
significado psicológico das mesmas, de forma absurda,
do ponto de vista da Lógica Formal. Viu, o autor, um sol
eclipsado, e pôde compreender que o material, de pelo
menos algumas psicoses, é idêntico ao dos estados místicos,
só que eclipsados pelas densas névoas do ego

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


imaturo, e se apresentam de modo fragmentário, de
modo impossível de ser integrado pelo ego, que, fragmentado,
perdeu a "fonction du réel".

Ora, a menos que Yogananda seja um mitômano,
charlatão, embusteiro ou psicótico, a sua vivência é a visão
de um sol em pleno meio-dia, enquanto que a vivência
do paciente, embora proveniente das mesmas regiões
recônditas da alma, são como uma visão da lua nova,
isto é, a verdade da experiência foi eclipsada pela densidade
material de um ego e de um sistema psicológico patológico.
É interessante notar que o autor presenciou, por
meio desse mesmo paciente, vários anos mais tarde, a
ocorrência dos "raps", de forma indiscutível, bem conhecidos
e descritos pela Posição Espírita. Essas experiências
são menos raras do que se supõe, em Psiquiatria.

Essa modalidade intuitiva de conhecimento independe
de discriminações, abstrações e classificações típicas
do processo do conhecimento cognitivo. Segundo
William James, "Nossa consciência normal do estado de
vigília — a consciência racional, como a denominamos

— constitui apenas um tipo especial de consciência, ao
passo que, ao seu redor, e dela afastada por uma película
extremamente tênue, encontram-se formas potenciais
de consciência inteiramente diversas" (op. cit.).
Aliás, o próprio Freud, com sua mentalidade mecanicista,
admitiu a existência desses estados especiais de
consciência, a que denominou sensação oceânica, que,
na sua ansiedade interpretativa, considerou, erradamente,
acredita-se, como sendo uma forma de regressão aos
estágios de vida intra-uterina, embora tenha afirmado que
ele mesmo jamais havia passado por experiências dessa
natureza. Infelizmente tais estados não são passí-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


veis de ser transmitidos de modo completo por meio da
linguagem verbal.

Segundo Kapra, o "conhecimento racional e as atividades
racionais constituem, por certo, a parcela mais significativa
da pesquisa científica; contudo, não a esgotam
A parte racional da pesquisa seria inútil se não fosse
complementada pela intuição, que fornece aos cientistas
novos 'insights' e os torna mais criativos. Esses 'insights'
tendem a surgir repentinamente, de forma característica,
em momentos de relaxamento, no banho, durante um
passeio pelo bosque ou na praia etc. — e não quando o
pesquisador está sentado à mesa de trabalho, lidando
com suas equações" (...) "a experiência mística da realidade
é, de fato, uma experiência essencialmente não
sensorial".

Segundo esse autor, embora as experiências místicas
profundas não ocorram, via de regra, sem uma longa
preparação prévia, os "insights" ou intuições majs diretos
são experimentados por todos, na vida quotidiana

A preparação da mente para essa consciência imediata
e não conceituai da realidade é o propósito básico
das escolas de misticismo oriental, e é também largamente
desenvolvida entre os adeptos do Espiritismo,
através das técnicas do desenvolvimento das faculdades
mediúnicas O objetivo básico dessas técnicas parece ser

o silenciar da mente pensante, por meio da concentração
e da abstração das distrações, e na transferência do foco
da consciência, ou da energia psíquica, do ego racional,
analítico e cortical, para o inconsciente subcortical e intuitivo.
Como será visto mais adiante, o transe mediúnico é
uma forma típica de estado intuitivo.
Quando a mente racional é silenciada pelas diversas
técnicas de meditação, o padrão eletroencefalográfi-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


co do cérebro muda para o predomínio das ondas alfa.
Como o córtex cerebral exerce um papel inibitório sobre
as estruturas subcorticais, essas estruturas são liberadas.
Estando mais livres, é facilitada a liberação das instâncias
do inconsciente, uma região da personalidade
que poderá entrar em contato com realidades outras do
Universo, segundo a Posição Espírita, ocorrendo assim a
ativação das faculdades mediúnicas, através da intuição
ou de outras modalidades de intercâmbio. Em termos psicológicos,
ocorre um desvanecimento do complexo do
eu, e o centro da consciência se desloca para níveis mais
profundos da personalidade, ou é simplesmente abolido.

Segundo Jung, esse é o mecanismo do denominado
Processo de Individuação, embora esse autor não pareça
ter tentado explicá-lo em termos neurofisiológicos.
Mas é na direção do centro da alma que se processa
esse movimento, em direção ao "Selbest" junguiano, à
Sétima Morada de Santa Teresa, à Imago Dei. Ao assimilar
essa região da alma, de forma natural e sadia, vivência
o indivíduo experiências similares à descrita por Yogananda,
que conheceu o "o centro do empíreo como um
ponto de percepção intuitiva em meu coração".

Yogananda vai além ao ensinar que a aceleração
da evolução humana é proporcionada pelo desenvolvimento
da intuição por meio da concentração da atenção.
Diz que a intuição nascida da concentração percebe a
verdade por meios internos, intrapsíquicos; e que o método
usual de aprendizagem depende do senso de realidade
e da experiência, além da capacidade de inferência, o
qual pode apenas explicar a "aparência" das coisas.
Também ensina que por meio da intuição é possível a
realização de qualquer processo de conhecimento correta
e diretamente, sem a intermediação dos sentidos.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Como já foi dito, a Física Moderna tende a confirmar essa
linha de pensamento oriental, e aponta na mesma direção
da hipótese espirítica, conforme será demonstrada
mais adiante — talvez não seja indiscrição comunicar o
fato de o médium Chico Xavier haver relatado ao autor,
pessoalmente, vivência semelhante à descrita por Yogananda,
mas comparada, pelo médium, a uma descrição
de Vivekananda. Esse diálogo foi feito em particular,
quando o autor deste ensaio consultava-o a respeito de
uma vivência intuitiva experimentada vinte anos atrás. A
esse respeito, convém o leitor estudar aprofundadamente
a obra erudita, já citada, de William James, que trata dos
aspectos psicológicos e psicopatológicos das modalidades
da experiência intuitiva.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


IV
AS FUNÇÕES PARANORMAIS


Jung declara que seus estudos das ciências naturais
lhe haviam ensinado que veiculavam uma quantidade
imensa de conhecimentos especializados, mas sem
grande profundidade. Seus estudos filosóficos lhe ensinaram
que sem alma não havia saber nem conhecimento
profundo. No entanto, nunca se falava da alma. ("Memórias,
Sonhos e Reflexões" — obra póstuma.)

Leu um livrinho sobre os primórdios do Espiritismo:
"o material era indubitavelmente autêntico". Constatou
que em todas as épocas, nos mais diversos lugares da
Terra, as mesmas histórias eram contadas. Leu praticamente
todos os livros dessa época sobre o Espiritismo.
Contudo, "comentei o assunto com meus colegas, e com
grande espanto constatei que reagiam não acreditando,
por brincadeira, ou então por uma recusa ansiosa diante
de tais fenômenos. Eu me espantava com a segurança
de suas afirmações sobre a impossibilidade dos fantasmas,
das mesas girantes e com a certeza que tinham de
que tudo isso era um embuste". Contudo, Jung declara
que se tornou temeroso de permanecer afastado do mun-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


do e de adquirir a fama duvidosa de um personagem excêntrico,
se continuasse a relatar seus estudos sobre o
Espiritismo.

Certamente, por isso, seus escritos primam pela
ambigüidade, o que o salvou do destino dos pesquisadores
abertamente psiquistas. Somente autorizou a publicação
de sua autobiografia após a sua morte. Contudo,
mesmo em vida estudou o Espiritismo e publicou uma
tese sobre o assunto ("Sobre a Psicologia e a Patologia
dos Assim Chamados Fenômenos Ocultos", 1902).

Jung constatou que a relação médico-doente, principalmente
quando intervém uma transferência do doente
ou uma identificação mais ou menos inconsciente entre
médico e doente, pode ocasionalmente conduzir a fenômenos
de natureza parapsicológica (op. cit., pág. 125).

Cita o caso de um doente que curara de uma depressão
psicógena. O paciente casou-se em seguida,
mas a sua esposa era uma das "mulheres que não amam
verdadeiramente os maridos, sentem ciúmes e destroem
as amizades deles". Após um ano, Jung fazia uma conferência,
e voltou ao hotel; quase à meia-noite, deitou-se.
Por volta das duas horas acordou espantado, persuadido
de que alguém entrara em seu quarto: 'linha a impressão
de que a porta se abrira precipitadamente. Acendi a luz,
mas não vi coisa alguma. Pensei que alguém se enganara
de porta; olhei no corredor, silêncio de morte. 'Estranho',
pensei, 'alguém entrou no meu quarto'. Procurei avivar
minhas lembranças e percebi que acordara com a
sensação de uma dor surda, como se algo tivesse ricocheteado
em minha fronte e em seguida tivesse batido na
parte posterior de meu crânio. No dia seguinte, recebi um
telegrama me avisando que aquele doente se suicidara.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Dera um tiro na cabeça. Soube mais tarde que a bala se
detivera na parte posterior do crânio" (op. cit., pág. 126).

Exemplos como esse não são raros, mesmo na vida
pessoal do autor, mas o exemplo de Jung é suficiente
diante de sua autoridade e do seu renome mundiais.

Mas Jung foi admoestado por Freud, que muito ansioso
lhe disse: "Meu caro Jung, prometa-me nunca
abandonar a teoria sexual. É o que importa, essencialmente.
Olhe, devemos fazer dela um dogma, um baluarte
inabalável (...) contra a onda de lodo negro (...) do ocultismo"
(op. cit., pág. 136).

Ernest Jones, em sua monumental biografia de
Freud, relata que o mesmo sofrera diversos desmaios durante
discussões de ordem teórica com seu discípulo
mais importante, na época, Carl Jung. Tece algumas críticas
a Jung, mas acaba por reconhecer o seu valor e a
sua extraordinária produtividade intelectual.

Os fenômenos denominados por Freud de ocultos
existem ao longo da História e não constituem nenhuma
novidade. Magos, feiticeiros, derviches, profetas, pitonisas,
médiuns ou simplesmente "sujets" são elementos indefectíveis
na cultura de todos os povos.

Charles Richet, o criador da Metapsíquica, dividiu
em quatro períodos e evolução histórica dos chamados
fenômenos ocultos.

Período mítico, que se estende desde a Pré-História
até o médico vienense Anton Mesmer e sua teoria sobre

o Magnetismo Animal, em 1778.
Período magnético, interregno para o advento do
Espiritismo. Introduz a noção de fluido, e sua escola também
é denominada de Fluidista. Mesmer possuía notáveis
dotes magnéticos, e obteve retumbante sucesso clínico,
mas sofreu violenta perseguição por parte da socie-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


dade médica vienense, tendo sido forçado a mudar-se
para Paris. Lá obteve o beneplácito da rainha Maria Antonieta,
após curá-la de seus acessos de enxaqueca. A rainha
forçou a sua aceitação por parte da comunidade
científica parisiense. Segundo sua escola, as neuroses
dependeriam do Sistema Nervoso Autônomo, e as modificações
se dão pela transmissão dos fluidos. Contudo,
houve oposição por parte da comunidade científica, que
considerou os efeitos mesméricos como de caráter psicológico
e fruto da sugestão. Bertrand foi o primeiro a explicar
o magnetismo pelo Hipnotismo artificial e a praticá-lo,
mas foi J. Braid quem recebeu o mérito da descoberta do
Hipnotismo. De acordo com a Posição Espírita, existem
tanto os fenômenos de transmissão do fluido magnético,
para o bem como para o mal, como os efeitos da sugestão,
que são irrefutáveis, mas que de modo algum explicam
todos os fenômenos observados. O Espiritismo desenvolveu
extensa gama de conhecimentos, de ordem terapêutica
através dos passes magnéticos.

Nos primórdios, a Teoria Animista de Braid recebeu
a adesão de Tuke, Forel e outros, que criaram a escola
de Nancy, permanecendo a escola Fluidista na Salpetrière.
Contudo, a partir dos estudos de Charcot sobre a Histeria,
o pensamento médico foi-se deslocando até culminar
na Teoria Psicanalítica de Sigmund Freud, passando
antes pelos estudos de Bernhein, Janet, Breuer e outros.

A vertente fluidista sofreu continuidade através do
Espiritismo, principalmente depois dos fenômenos de Hydesville,
protagonizados pelas irmãs Kate e Margaret
Fox. Na Europa ocorreu a epidemia das mesas girantes,
que culminou com a Sistematização feita por Allan Kardec,
em 1857, com a edição de "Le Livre des Sprits"

— "Ècrit sous la dictée et publié par Tordre d'es-
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


prits supérieurs". Todavia, o Espiritismo teve pouca repercussão
científica, evoluindo para o campo predominantemente
religioso e filosófico. Esse movimento tão
amplo e vasto foi registrado por Sir Arthur Connan Doyle,

o genial criador do personagem Sherlock Holmes, em
sua magistral obra "História do Espiritismo". Ao publicar
"O Livro dos Espíritos", Allan Kardec julgou a ciência (...)
"incompetente para se pronunciar na questão do Espiritismo"
(...) ("Livro dos Espíritos", FEB, págs. 28, 29). Mas
concluiu que os sábios acabariam por se render à evidência
dos fatos (idem).
O período científico começou com os trabalhos de
Sir William Crookes, ao estudar os médiuns excepcionais
Daniel Home e Florence Cook. Esse período pode ser
subdividido em duas etapas: o período da Metapsíquica
de Charles Richet e o período parapsicológico, com as rigorosas
experiências de J. B. Rhine, da Duke University.

Em "The Reach of the Mind", Rhine descreve a Parapsicologia
como sendo "uma ciência que se ocupa de
fenômenos mentais e da conduta, que parecem responder
a princípios não conhecidos". R. Amadou define
como sendo "a evidenciação e o estudo experimental das
funções psíquicas que ainda não estão incorporadas ao
sistema da Psicologia científica, com a finalidade de incorporá-
las ao dito sistema então ampliado e complementado".


A grande contribuição da Parapsicologia foi, através
de métodos matemáticos, e portanto dentro das restrições
impostas pelo Método Científico, a de demonstrar a existência
das funções paranormais, que englobam a percepção
extra-sensorial (ESP) e a psicocinésia, ou ação direta
da mente sobre a matéria (PK), as quais independem das
restrições impostas pela dimensão espaço-tempo e pela

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


causalidade. Essas descobertas foram grandemente reforçadas
pelos modernos avanços das Teorias Quântica
e da Relatividade, como foi visto no capítulo precedente.

Em "The Reach of the Mind", Rhine indaga: "Existe
algo extrafísico ou espiritual na personalidade humana?
A resposta experimental é afirmativa." Não será demais
repetir que suas experiências foram reconhecidas como
cientificamente válidas pela Associação Americana de
Psicologia.

O que caracteriza a Parapsicologia é justamente o
método quantitativo, estatístico, que consiste em aplicar,
em larga escala, e em qualquer indivíduo, testes específicos
que podem comprovar a existência das funções paranormais
ou Psi. Trata-se de verificar se os resultados traduzem
um desvio estatisticamente significativo, inexplicável
pela simples probabilidade matemática. Vale repetir
que a realidade da Parapsicologia apresenta estreita afinidade
com os avanços da Física nuclear e, em especial,
com o Princípio da Indeterminação de Heisemberg.

Segundo Cerviño, os trabalhos de Aksakof, Bozzano,
Myers e outros teóricos do Espiritismo científico permaneceram
incólumes, não sofrendo o menor abalo por
parte da Parapsicologia. Rhine indica alguns caminhos
para testar a sobrevivência da alma. Alguns avanços parapsicológicos
nesse sentido foram feitos na antiga União
Soviética.

Pode parecer, à primeira vista, um contra-senso, o
fato de que a mente possa transcender as limitações impostas
pelo "continuum" espaço-tempo e a causalidade.
Contudo, essas faculdades aparentamente absurdas foram
confirmadas matematicamente pela Parapsicologia,
e se enquadram perfeitamente dentro do novo edifício
que a Física atômica vem erguendo nas últimas décadas.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Por meio dos gigantescos aceleradores de partículas,
puderam os físicos nucleares demonstrar que a matéria
é quadridimensional. Demonstraram também que,
em um sentido estrito, os átomos não são compostos de
matéria em si, como queria crer a Física clássica, mas
são formados por partículas subatômicas que não são
nada mais que pacotes de energia, possuindo uma estranha
configuração dual, sendo, ao mesmo tempo, ondas e
partículas.

Através do bombardeamento dos átomos, descobriram,
os físicos, que as partículas subatômicas podem se
desmaterializar, sumindo completamente no que Einstein
denominou campo, podendo outras partículas surgir do
"nada", sob a roupagem de novas partículas (são conhecidas
já cerca de duzentas), descrevendo uma trajetória
em direção ao futuro ou ao passado.

Perplexos, os físicos descobriram a unidade fundamental
do Universo, incluindo aí a mente do observador,
que deixou de ser pesquisador independente para ser
participante. O autor admite a possibilidade teórica de, no
futuro, ser detectado o que A. Luiz denomina átomos
mentais, o que viria a lançar uma nova luz sobre a dinâmica
do funcionamento das funções parapsicológicas e
mediúnicas. Essa síntese entre Ciência, Filosofia e Religião
é um dos pressupostos básicos do Espiritismo.

Seguindo o modelo do raciocínio lógico, se o encéfalo
é puramente material, conforme o têm demonstrado
as análises anatomopatológicas, bem como as modernas
técnicas da microscopia, da bioquímica e da radiologia, é
lícito supor que as estruturas responsáveis pelas funções
transcendentes estejam localizadas em algum tipo de órgão
que não esteja limitado às condições impostas pelo
"continuum" espaço-tempo, bem como pela causalidade.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


A quem possa parecer absurda essa hipótese, deve ser
recordado que não existe nada mais absurdo, no campo
das chamadas ciências naturais, do que a própria tessitura
íntima da matéria, em seus níveis atômicos e subatômicos.


Ora, segundo a Posição Espírita, o lócus dessas
funções transcendentes é a própria mente, aqui entendida
como coisa, com existência própria e com independência
em relação à matéria, pelo menos no sentido
próprio da Física. Essa mente é a própria alma, enquanto
encarnada, ou o espírito, após a morte do corpo físico,
para utilizar a terminologia revelada pelos Espíritos.

Atravessado o Rubicão, surgem novas e complexas
questões: Qual a natureza da alma? Que tipo especial de
matéria ou de energia a compõe? Qual a sua forma organizacional?
Que tipo de anatomia ela possui? Que mecanismos
funcionais ou fisiológicos são responsáveis pelo
seu funcionamento? Como ela interage com o corpo físico,
em particular, e com o mundo material em geral? Em
que sentido ela está dependente do mundo quadridimensional?
Ou que outras dimensões a circunscrevem? De
onde veio, como surgiu e para onde vai? Em que sentido
ela é eterna? O que é ser eterno? E assim, sucessivamente,
o raciocínio vai deixando o plano da Lógica Formal
para adentrar o denominado processo da intuição.

Diante do imponderável, e do aparentemente impenetrável,
o dualista psicofísico Geaulinex propôs a Teoria
do Paralelismo, com a qual não concorda o Espiritismo,
que é fundamentalmente Interacionista. Até certo ponto,
poder-se-ia afirmar que a Posição Espírita é uma espécie
de Monismo, como foi dito nos capítulos precedentes.
Contudo, foge ao conhecimento do autor um posicionamento
claro a esse respeito, na literatura espírita. Mas o

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


presente ensaio é apenas um resumo esquemático, mais
preocupado com assuntos práticos, tais como psícodiagnóstico,
psicoterapia, ainda que empíricos, com o ensejo
de ajudar a aliviar o sofrimento humano.

Ora, um dos mais importantes campos da Medicina
é o estudo das doenças psicossomáticas. Essas afecções
comprovam o grau de interação existente entre os processos
físicos e psíquicos. Além dos distúrbios puramente
psicológicos, de fundo psicogenético, que seguem um
modelo mais ou menos semelhante ao das neuroses funcionais,
descobertas pela escola pavloviana, com os estudos
experimentais em cães, por exemplo, ou das neuroses
humanas mais complexas, propostas pelos modelos
psicanalíticos de diversas escolas, o Espiritismo
acrescenta o modelo de doenças físicas cuja matriz jaz
em disfunções no perispírito ou psicossoma, conforme
será visto nos próximos capítulos.

Cães, ratos etc foram submetidos a experimentos
laboratoriais, onde neuroses experimentais desencadearam
úlceras pépticas etc. São bem conhecidos dos clínicos
gerais as doenças de etiologia psíquica, tais como
dermatites, neurodermites, urticária, psoríase, gastrite, úlcera
péptica, dispepsias, colites, gastroenterites, hipertensão
arterial essencial, palpitações, extra-sístoles, dispnéias,
asma brônquica, disfunções menstruais, distúrbios
sexuais, desvios do impulso sexual etc. Já foi demonstrada
relação entre tuberculose cavernosa e impulsos
homossexuais latentes. No campo da ortopedia e
reumatologia, tem-se o exemplo clássico da artrite reumatóide.


Os médicos peritos — e o autor têm longos anos de
experiência em perícia médica — conhecem bem a que
ponto podem chegar os clientes com Neurose de Renda.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


No campo criminalístico, a Síndrome de Ganser, ou psicose
carcerária, é típica. No capítulo das síndromes conversivas,
a Neurose Histérica ocupa destaque especial.

Em sentido inverso, isto é, alterações somáticas determinando
disfunções mentais, tem-se a reação exógena
de Bonhoeffer, a encefalopatia de Wernicke, a síndrome
de Korsakof, as doenças de Pick, de Alzheimer etc.
Seria fastidioso o prolongamento dessa lista de afecções
que comprovam as interações mente-corpo.

Segundo A. Luiz, e as funções paranormais e mediúnicas
o confirmam, a mente, tal como as partículas subatômicas,
também tem uma natureza dual: matéria e espírito.
No próximo capítulo será feito um resumo dos processos
por meios dos quais se dá a interação corpo físico- corpo
espiritual, segundo a Posição Espírita. Será adiantado
aqui que, do mesmo modo que no processo da intuição,
esses mecanismos ocorrem nas instâncias inconscientes,
cujo substrato anatomofuncional é o citoplasma dos neurônios,
especialmente dos localizados nos núcleos da
base.

Segundo Amadou, a condição necessária, mas não
suficiente, para que ocorram os fenômenos paranormais
é o transe. É claro que aqui também, como em todas as
regras, existem certas exceções. Isso porque o transe
abre as comportas do inconsciente, onde estão localizadas
as funções paranormais e mediúnicas.

Segundo P. Janet, o transe se relaciona com uma
baixa tensão dos processos psíquicos, um "abaissement
du nuveau mental". Em outros termos, pode haver um estreitamento
do campo da consciência, com dissociação
dos processos psíquicos; daí a possibilidade de surgimento
de material histeriforme, como personalidades
subconscientes, muito comuns, e observadas tanto em

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


centros espíritas como em seitas pentecostais ou nos
serviços de pronto-socorro psiquiátricos.

Pode haver também uma obnubilação da consciência,
fenômeno mais generalizado do que o anterior. A escola
pavloviana explica-o por meio de um processo de
inibição generalizada do córtex cerebral. É claro que aqui
estão excluídas as patalogias graves que provocam obnubilação,
tais como encefalites, traumatismos crânio-encefálicos,
intoxicações exógenas etc.

É conveniente recordar que os processos inconscientes
implicam, além de mecanismos psicológicos, aspectos
neurofisológicos, endocrínicos, por um lado, e processos
de ordem espiritual, segundo a Posição Espírita,
quando o transe for de natureza mediúnica. Mas nem todos
os transes possuem elementos mediúnicos, que são,
na opinião do autor, uma minoria.

Jayme Cerviño ("Além do Inconsciente", FEB, 1968)
afirma que existem sujeitos dotados, denominados metagnomos,
que atuam, pelo menos aparentemente, sem
sinal algum que denote a existência de transe.

Uma característica fundamental desse estado, além
das citadas alterações da consciência, é a passividade.
Em termos psicológicos, representa o abandono, por parte
do eu, do controle do material psíquico, bem como da
atividade crítica e discriminativa, dos juízos etc. Em termos
neurofisiológicos, tem sido constatado um predomínio
das ondas eletroencefalográficas do tipo alfa. Entre
os hindus esse estado é alcançado, nas práticas especiais
de Raja Yoga, a Pratiahara, ou abstração, com o esvaziamento,
do foco da consciência, de todo o material
psíquico. Segundo Yogananda, nesse momento ocorrem
alucinações, que não devem ser levadas em consideração,
para que se possa atingir estados mais avançados

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


de consciência, onde ocorre a percepção intuitiva, ou
Dhiana e, em seguida, o Samadi. Mas esses aspectos fogem
ao tema proposto neste capítulo. Segundo Cervino,
"a interiorização da consciência é o aspecto básico do
transe".

Se uma das caraterísticas básicas do transe é o
afrouxamento do controle do ego sobre os processos inconscientes,
fica claro que pessoas com psicose latente,
com psicoses pregressas ou surtos psicóticos recidivantes
não se devem submeter a esse tipo de experiência.
Igualmente, como o transe desencadeia reações neurovegetativas,
como será visto mais adiante, pessoas com
afecções cardiovasculares, neuronais, infecciosas etc,
também devem-se abster dessas práticas, pelo menos
em tese. Aliás, o próprio Freud abandonou a prática da
Hipnose, como método terapêutico, ao constatar as inúmeras
inconveniências que apresenta.

Segundo Cerviño, a dissociação pode ser explicada,
em termos neurofisiológicos, por áreas de inibição mais
ou menos extensas do córtex cerebral, que podem ser
desvinculadas da consciência normal. Na dependência
da região do encéfalo que adquire autonomia funcional,
pode haver a escrita automática, a palavra automática,
gestos ou automatismos psicomotores, quando a região
for motora, ou alucinações, quando a região for do córtex
sensorial. Quando o automatismo é mais extenso, pode-se
observar o aparecimento de uma nova personalidade.
Em geral ocorre amnésia lacunar acompanhando o processo
(op. cit.).

Durante o transe podem ocorrer fenômenos puramente
psicológicos, oriundos do vasto repertório de material
inconsciente, mas também costumam aparecer,
mais raramente, processos paranormais e/ou mediúni-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cos. No próximo capítulo, será apresentada a classificação
dessas ocorrências, pelo Espiritismo, utilizando-se da
argumentação de Alexandre Aksakof.

O diagnóstico diferencial não é simples, sendo bastante
difícil, levando-se em conta simplesmente os aspectos
cognitivos. É necessário alto grau de captação intuitiva,
penetração empática, além de muita prática, para não
se errar em excesso, em relação ao diagnóstico diferencial.
Isenção, imparcialidade, ausência de preconceitos e
prejuízos intelectuais de qualquer espécie são fundamentais
para não se cair em credulidade fácil, tanto de um
lado quanto de outro.

Penfield realizou estudos eletroencefalográficos que
assinalaram diferenças entre a atividade elétrica do cérebro
no transe hipnótico e no sono.

O transe pode ser superficial, quando o sujeito pode
recordar-se de tudo e até duvidar do fato de ter permanecido
em transe, ou profundo, com inconsciência completa
e amnésia posterior. Quanto à duração, pode ser fugaz
ou prolongado. Segundo Jung, o paciente esquizofrênico
está num estado patológico semelhante ao sono, do qual
não consegue acordar. É errôneo considerar que o catatônico
ou o autista não apresenta riqueza de vida psíquica,
embora voltada exclusivamente para dentro de si
mesmo.

Von Hartman já levantara a hipótese de que, no
transe, os processos psíquicos estejam vinculados à região
centrencefálica, em face da onda inibidora que varre

o córtex cerebral. Cerviño afirma que "o transe pode colocar
o indivíduo em contato mais íntimo com a própria
alma, com a personalidade integral, de que a consciência
é pálido revérbero" (op. cit.). Jung pensa de modo semelhante.
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


O transe pode ser patológico, como nos estados
crepusculares da epilepsia, especialmente do lobo temporal,
e da neurose histérica. Também no pré-coma, no
delirio febril, no período pré-agônico e nas diversas afecções
neurológicas, infecciosas etc., podem surgir estados
similares ao transe. Segundo Geley, Osty etc., podem
surgir transes espontâneos nos individuos hereditariamente
predispostos, e não necessariamente patológicos,
os quais denominam médiuns, sujeitos dotados, metapsíquicos,
sensitivos, metagnomos etc.

Formas de transe também são utilizadas como terapias,
tais como a técnica do sonho acordado de Robert
Desoile, a imaginação ativa de Jung, regressão de memória
e a própria prática mediúnica.

De acordo com Cerviño, os transes provocados podem
ser hipnóticos, mediúnicos e farmacógenos. Berheim,
entre outros, explicou o transe pelo processo da
sugestão. Mac Dougal ensina que é fruto de um processo
de comunicação que resulta na aceitação convicta de
idéias, crenças ou impulsos, sem a necessidade de fundamentação
lógica. Pode também haver auto-sugestão.
Já o pesquisador russo Pavlov apresenta uma explicação
reflexológica.

De alguma forma, as experiências de Rhine reabilitam,
em certa medida, a corrente fluidista de Mesmer, e
tendem a confirmar as revelações dos espíritos, pois a
percepção extra-sensorial e a psicocinesia implicam a
existência de uma energia "psíquica". Cervino informa
que Janet realizou experiências com sugestão a distância,
e "em 25 experiências obteve 18 êxitos completos e
4 parciais", mas não publicou esses resultados, evitando
comprometer-se. Rhine explica que isso não pode ser su-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


gestão, pois não havia nenhuma relação sensorial entre o
experimentador e o "sujet".

Volgyesi, da corrente reflexológica, considera a Hipnose
como sendo uma descerebração fisiológica reversível
e enfatiza o papel do subcortex como "o substrato
anatômico dos reflexos provocados por sugestão".

Certamente é dispensável uma descrição pormenorizada
das funções paranormais, uma vez que existe vasta
literatura acessível ao leitor. Contudo, é conveniente
reforçar que as funções parapsicológicas indicam que a
personalidade possui estruturas que não estão submetidas
às limitações de tempo, espaço, causalidade etc ,
lim a vez que não existe função sem órgão.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


V
AS FUNÇÕES MEDIÚNICAS


No prefácio da edição alemã da sua monumental
obra "Animismo e Espiritismo", Alexandre Aksakof declara:
"o objetivo geral do meu trabalho não foi provar e defender
a todo custo a realidade dos fatos mediúnicos,
mas aduzir à sua explicação um método crítico, conforme
as regras indicadas pelo Sr. Hartmann" (op. cit., FEB,
1978). O grande filósofo alemão Von Hartmann admitia a
realidade psíquica dos fenômenos mediúnicos, mas os
considerava como meros produtos de vivências alucinatórias.


Para a aceitação da sua realidade objetiva, Von
Hartmann exigia certas condições experimentais. Essas
condições foram introduzidas pela Metapsíquica de Charles
Richet, especialmente com notáveis experiências
como as do Sir William Crookes, mas as condições estudadas
eram tão excepcionais que não foram aceitas pela
ciência oficial. Ora, essas condições, impostas pelo Método
Científico, foram em parte supridas pela Parapsicologia
de J. B. Rhine.

Conforme foi dito, sumariamente, nos capítulos pre-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cedentes, os modernos avanços das Teorias Quântica e
da Relatividade abrandaram os rigores da metodologia
científica, apesar das enormes resistências afetivas e intelectuais
da comunidade científica.

A admissão da realidade subjetiva desses fenômenos
é o suficiente, do ponto de vista da Psiquiatria. Foge
às finalidades deste trabalho a apresentação de argumentação
e de fatos comprobatórios da realidade objetiva
dos mesmos. Isso também se torna redundante em
face da vasta literatura do Espiritismo, da Metapsíquica,
da Parapsicologia, da Teosofia, da Yoga e autores de
grande conceito na comunidade científica, já citados.

R. A. Johnson revela que "A psicologia de Jung nos
leva de volta à alma como uma realidade concreta, passível
de ser conhecida, descrita e vivenciada. Aqui está o
ponto de interseção entre a vida interior encontrada nas
religiões antigas e a vida interior da psicologia dos arquétipos;
ambas comprovam a realidade da alma, e ambas
sabem que é apenas através da alma que encontramos o
inconsciente, a vida interior, o lado que está além do ego
e fora do âmbito estreito de sua visão superficial" ("We",
1983).
Seria interessante frisar que, atualmente, cerca da
metade dos títulos publicados no Brasil versam sobre
esse tema.

Em relação ao campo prático, existem milhares de
grupos mediúnicos, ou afins, instituições espíritas de caráter
religioso, além de grande número de hospitais espíritas,
como já foram anteriormente especificados alguns
exemplos, dentro dos limites éticos e científicos, e fiscalizados
pelos próprios CRMs. A grande deficiência se verifica
em relação à pesquisa científica em laboratórios,
sendo esse campo mais desenvolvido nas superpotên-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cias. Parece, ao autor, que um novo arquétipo já foi ativado,
no inconsciente coletivo do povo brasileiro: "Brasil,
Coração do Mundo, Pátria do Evangelho".

O estudo das funções mediúnicas da personalidade
apresenta duas dificuldades quase insuperáveis: em primeiro
lugar, trata-se de uma classe de fenômenos um
tanto quanto raros, pelo menos os que poderiam ser considerados
como autênticos, do ponto de vista objetivo,
além de serem de difícil repetição. Em segundo lugar, de
acordo com Jayme Cerviño, "o grande escolho nas pesquisas
que visam a demonstrar essa transcendental possibilidade
é, paradoxalmente, o próprio médium" (op. cit.,
FEB, 1968). Contudo, apesar desses escolhos, Aksakof
viu na realidade desses fatos a base de uma "convicção
profunda de que eles nos ofereciam (...) uma base verdadeiramente
sólida, um terreno firme, para a fundação de
uma ciência nova que seria talvez capaz, em futuro remoto,
de fornecer ao homem a solução do problema de sua
existência". Essa suposição permanece de pé mais de
um século após a sua formulação.

Todavia, o grande mestre russo enfatiza alguns percalços:
"o automatismo evidente das comunicações espiríticas
e a falsidade arrogante, e do mesmo modo evidente,
do seu conteúdo; os nomes ilustres, com que elas são
freqüentemente assinadas, constituem a melhor prova de
que essas comunicações não são o que pretendem"
("Animismo e Espiritismo", Vol. I, pág. 20, FEB). Aduz
que "nada, à primeira vista, justifica a suposição de uma
intervenção dos 'Espíritos'. Só mais tarde, quando certos
fenômenos de ordem intelectual nos obrigam a reconhecer
uma força inteligente extramediúnica, é que esquecemos
as primeiras impressões e encaramos com mais indulgência
a teoria espirítica em geral" (idem).

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


De acordo com Aksakof, com o prosseguimento da
experiência prática, "os lados fracos do Espiritismo tornavam-
se cada vez mais visíveis: a banalidade das comunicações,
a pobreza do seu conteúdo intelectual, ainda
quando elas não são banais, o caráter mistificador e falso
da maioria das manifestações, a inconstância dos fenômenos
físicos (...) a credulidade, a preocupação, o entusiasmo
irrefletido dos espíritas e dos espiritualistas, finalmente
a fraude (...)", e ainda "uma multidão de dúvidas,
objeções, contradições e perplexidades de toda a espécie
(...)".

Em sua busca, Aksakof declara que chegou a duvidar
do Espiritismo, e crer que não passava de mais uma
ilusão da Humanidade, tal como a Teoria Geocêntrica de
Claudio Ptolomeu etc. Paradoxalmente, o pensamento de
Aksakof foi impulsionado em favor da Teoria Espírita justamente
pela crítica objetiva de Von Hartmann. A partir
daí começou seu trabalho importantíssimo de sistematização
da fenomenologia espírita, a qual veio ao encontro
de suas suspeitas e solidificou seus conceitos, em favor
da sobrevivência da alma.

Descobriu Aksakof que a principal dificuldade do
Espiritismo é a tendência, entre seus seguidores, de atribuir
tudo à intervenção dos Espíritos. O oposto ocorre
com os cépticos ao negarem 'tudo": "aqui, como sempre,
a verdade se encontra entre os dois" (op. cit).

Outro paradoxo no desenvolvimento do pensamento
de Aksakof foi que a luz só começou a despontar no dia
em que foi obrigado a admitir, pelos fatos, "que TODOS
os fenômenos mediúnicos, quanto ao seu tipo, podem ser
produzidos por uma ação inconsciente do homem vivo"
(destaque do autor), e que "a atividade psíquica inconsciente
de nosso ser é limitada à periferia do corpo e não

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


apresenta um caráter exclusivamente psíquico... produzindo
efeitos físicos e mesmo plásticos" (idem).

A essa atividade extracorpórea do inconsciente do
indivíduo pertencem os fenômenos antes ditos sobrenaturais,
a que deu o nome de animismo. Dessa maneira,
Alexandre Aksakof chegou não a uma, mas a três hipóteses,
suscetíveis de fornecer a explicação dos fenômenos
oriundos do inconsciente:

1
1
9) Personismo — Fenômenos psíquicos inconscientes
e produzindo-se nos limites da esfera corpórea,
conseqüente ao fenômeno fundamental do desdobramento
da consciência, ou transe, ou dissociação. Aqui entra a
Psicopatologia isenta de prejuízos intelectuais, no diagnóstico
diferencial entre mediunismo, neuroses e psicoses.


Para o autor russo, o personismo pode ser normal,
anormal e fictício e demonstra a não identidade entre o
"eu" individual, interior, inconsciente e o "eu" pessoal,
consciente, exterior. O conceito de Aksakof do "eu" interior
se aproxima muito do conceito junguiano de "Selbst".
William James prefere utilizar o conceito de foco de energia
na personalidade, que pode ser deslocado pelas experiências
de caráter religioso (op. cit). Essa descoberta
de Aksakof é importantíssima para a Psicologia.

2°) Animismo — Fenômenos psíquicos inconscientes,
quando produzidos fora dos limites da esfera corpórea,
tais como a telepatia, a telecinesia, as materializações
etc. De acordo com Aksakof, haveria aqui uma exteriorização
de elementos da própria personalidade do sensitivo,
provocando efeitos psíquicos, físicos ou plásticos.
Aqui o pensamento Aksakofiano se aproxima muito da
Escola Fluidista de Mesmer. Segundo ele, o fenômeno da
bicorporeidade atribuída a Santo Antônio seria um exem-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pio extremo de animismo. Aksakof usa o termo animismo
por ser derivado de "anima" ou alma, que não seria o eu
individual, que pertence ao espírito, porém apenas o envoltório
ou corpo fluídico desse "eu" espiritual. Allan Kardec
usa aqui o termo perispírito. A. Luiz usa psicossoma,
e Hellenbach denomina-o metaorganismo. A anima é um
conceito fundamental da Psicologia Complexa de CG .
Jung, só que num sentido diverso.

3º) Espiritismo — Fenômenos com a mesma aparência
de personismo e de animismo, porém, provocados
por uma causa extramediúnica, supraterrestre, isto é, fora
da esfera da existência do indivíduo. Segundo Aksakof, o
conteúdo intelectual que trai uma personalidade diversa
determinaria o diagnóstico diferencial. Essa postura Aksakofiana
é a que melhor síntese produz entre a Teoria
Espírita e as ciências médicas na visão do autor.

Contudo, muitas vezes, as três hipóteses podem
servir como fundamento para a explicação de um só fenômeno:
"O problema é pois decidir a qual dessas hipóteses
é preciso atender (...), a crítica proíbe ir além da que
basta para a explicação do caso submetido à análise."
(Idem.) Aksakof introduziu na Rússia o termo mediunismo
para explicar os fenômenos da terceira categoria.

Destarte, a Posição Espírita, secundada pelas correntes
afins, destacando-se a Metapsíquica e a Parapsicologia
por um lado, e as diversas correntes da ciência
oficial, por outro, provocou uma mudança revolucionária
no conceito de personalidade, evoluindo para a conclusão
de Du Prel: "As forças psíquicas constituem uma
substância real. A alma humana é um organismo composto
dessas substâncias psíquicas, tão eternas e indestrutíveis
quanto qualquer substância de ordem mais material."


PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Do mesmo modo que o fez em relação aos fenômenos
parapsicológicos, o presente trabalho deixará de lado
a imensa casuística mediúnica, bem descrita na vastíssima
bibliografia espírita, passando diretamente ao estudo
dos aspectos psicofisiológicos do mediunismo. O ponto
de partida será o estudo do fenômeno básico do mediunismo,
segundo Aksakof e outros autores: o desdobramento
da consciência.

O fenômeno do desdobramento da consciência é
muito estudado em Psiquiatria, geralmente sob a denominação
de dissociação. Os fenômenos dissociativos vão
desde os casos fisiológicos, normais, até os processos
francamente patológicos, tanto de natureza neurótica
quanto psicótica. As interpretações desse fenômeno fundamental
costumam variar conforme a corrente teórica
dos autores. Na Doutrina Espírita é mais difundido o termo
Transe Mediúnico.

Algumas correntes psiquiátricas fazem a distinção
entre a dissociação neurótica e a desagregação ou mesmo
dissolução psicótica. A fenomenologia, por exemplo,
introduziu, com Karl Jaspers e outros, os conceitos de
"desenvolvimento" e "processo", muito especializados
para serem discutidos neste ensaio. Por outro lado, Jung,

o psiquiatra que mais compreendeu o material que existe
na mente do doente psiquiátrico, já era menos radical,
considerando, por exemplo, que a diferença entre os sintomas
histéricos e os esquizofrênicos é mais de natureza
quantitativa que qualitativa. É provável que ambas as maneiras
de interpretar os sintomas estejam corretas, considerando
que Bleuler não descreveu a esquizofrenia como
uma entidade nosológica pura, mas sim o "Grupo das Esquizofrenias"
. Há ainda muito mistério, e a Posição Espí-
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


rita poderá lançar novas luzes sobre esse intrigante problema.


É interessante observar que, na literatura espírita,
são comuns decrições detalhadas, de modo mais ou menos
literário, de casos de psicoses delirante-alucinatórias
encontradas no próprio plano espiritual, especialmente na
obra de André Luiz. Isso aponta para a conclusão de que
algumas psicoses não são, em absoluto, mero epifenómeno
patológico de disfunções cerebrais.

Uma importante contribuição à compreensão das
reações dissociativas foi dada pela Teoria Psicanalítica
de Sigmund Freud. Esse genial neurologista considerou
as dissociações como sendo fruto do fenômeno fundamental
da vida mental, a "repressão", que é uma espécie
de esquecimento seletivo. O indivíduo pode esquecer
segmentos amplos de seu comportamento e tornar-se
dissociado da realidade. Existem três tipos principais de
reações dissociativas: amnésia (perda da memória), personalidade
dupla ou múltipla (o indivíduo adota em seu
comportamento duas ou mais personalidades diferentes)
e sonambulismo (caminhar dormindo). Segundo Rosensweig,
as ações que são positivamente reforçadas estão
menos sujeitas à repressão do que as que têm efeito punitivo.
Aqui pode estar um dos mecanismos de atuação
da Lei de Causa e Efeito admitida pelo Espiritismo como
fundamental no processo de desenvolvimento espiritual,
ou na aquisição de estados cada vez mais diferenciados
de consciência. Vide exemplos em "Psicopatologia da
Vida Quotidiana" de Freud.

Em geral, considera-se o transe mediúnico, auto-sugerido,
uma forma de auto-sugestão ou auto-hipnose. Segundo
Osty, os médiuns teriam uma tendência hereditária
para o transe. Diversos autores espíritas apontam nessa

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mesma direção, acrescentando, a Doutrina Espírita, a
ação héterossugestiva de feição telepática, oriunda de
uma personalidade espiritual de um sistema dimensional
ainda insuspeitado pela Física das partículas.

Para Geley, "o médium é um ser cujos elementos
constitutivos, mentais, dinâmicos e materiais são susceptíveis
de descentralização momentânea" (ou dissociação).


Contudo, para a Posição Espírita, o conceito de dissociação
adquire extensão jamais prevista pela Psiquiatria,
e pressupõe a exteriorização ou a introjeção de uma
forma singularíssima de energia, capaz de produzir fenômenos
de ordem física, psíquica ou plástica. Essa energia,
ou energias, para ser mais preciso, parece ser diferente
das energias nuclear, eletromagnética e gravitacional,
o tripé da Física Moderna. Uma das modalidades
dessas energias que atuam no processo mediúnico são
os denominados "átomos mentais", de A. Luiz, que serão
estudados mais adiante.

Para os que não contêm um sorriso diante dessas
possibilidades, é bom lembrar que as Teorias Quântica e
da Relatividade levaram os físicos à beira de um abismo
insondável, absurdo e completamente ilógico, denominado
de "campo", que é e não é ao mesmo tempo, não é
nada e ao mesmo tempo é a fonte de todas as partículas
da matéria subatômica. Os físicos ainda estão longe de
ter desvendado a "matéria", e para o maior deles, Einstein,
Deus existe e é matemático.

Voltando ao tema, durante o transe, podem ocorrer
fenômenos puramente psicológicos ou, então, parapsicológicos,
mas é também possível a ocorrência de material
que extrapole o material psíquico do médium, através da
identificação de uma personalidade metanóica ou de uma

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


percepção extra-sensorial. Assim, fica a possibilidade da
emersão, do psiquismo do médium, de material psíquico
aparentemente oriundo de outros planos de existência do
Universo, e as personalidades desses planos, segundo
Allan Kardec, se autodenominaram "Espíritos".

Do ponto de vista da Neurofisiologia, durante o transe
ocorre inibição do córtex cerebral, com a liberação das
estruturas subcorticais que passam a reger a atividade
nervosa superior (Cerviño, W. James). A baixa tensão
psíquica e o estreitamento do campo da consciência (Janet:
"abaissement du nuveau mental") significam, em linguagem
neurofisiológica, inibição cortical. O transe se
distingue do sono devido à preservação de pontos de vigilância
no córtex cerebral. Aqui deve ser lembrada a distinção
fundamental entre a vigilância neurofisiológica e a
consciência psicológica. São conceitos correlatos, mas
bastante diversos.

Do ponto de vista psicológico, algumas formas de
transe são associadas a uma alteração quantitativa da
consciência, como o rebaixamento ou a obnubilação.
Noutras ocorre apenas uma alteração qualitativa, com estreitamento
do campo da consciência, tal como se dá nas
crises epilépticas temporais. Outras formas, descritas por
William James em "As Variedades da Experiência Religiosa",
costumam apresentar um extraordinário alargamento
do campo da consciência, tal como o exemplo citado
de Yogananda em capítulo precedente.

Seria um grave lapso deixar de lado as importantes
contribuições da Psicologia Transpessoal, de um lado, e
a Antropologia Cultural, de outro, destacando-se os trabalhos
profundos de Michael Harner e Carlos Castañeda,
entre outros.

Exemplificando, a escrita automática tanto pode ser

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mero produto de material inconsciente, reprimido ou simplesmente
esquecido, como ser oriunda de personalidade
dita metanóica.

É interessante frisar que, para o ego psicótico, todo

o material psíquico oriundo dos fragmentos autônomos
da personalidade são vivenciados como sendo oriundos
do mundo "objetivo", tanto de natureza "material" como
"espiritual". Daí o caráter irredutível de suas experiencias
delirante-alucinatórias.
A extensão maior ou menor do transe condiciona a
dissociação de um segmento maior ou menor da consciência.
Cerviño sugere que o transe mediúnico, embora
intimamente ligado ao hipnótico, tem fisiologia própria, e
merece estudo à parte. Para esse autor, o transe mediúnico
receberia, através das faculdades paranormais da
subconsciência (Funções Psi), estímulos "não-físicos",
oriundos de uma realidade ultrafísica: "poder-se-ia mesmo
admitir que o médium, ao reviver uma personalidade
postuma, está em "rapport" com essa personalidade, e
mais, que graças ao "processus" sugestivo-telepático,
sua conduta dissociada realiza nestas condições um verdadeiro
psicomimetismo ("faculdade mimética" do subli-
minal-Myers)" (op. cit.).

Os fatores químicos, endógenos ou exógenos, que
diminuem a eficiência biológica dos neurônios corticais, libertam
o subcórtex, e assim, induzem ao transe. Quem
trabalha em serviços de pronto-socorro psiquiátrico conhece
bem essa liberação provocada, por exemplo, pelos
efeitos da ingestão alcoólica. Teoricamente pode dizer-se
que a excitação de setores subcorticais produza efeito
idêntico. Esse aspecto será estudado mais pormenorizadamente
no próximo capítulo.

De uma maneira geral, o transe pode provocar alte-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


rações de ordem motora, tais como paralisias funcionais,
contraturas musculares, abalos musculares, contrações
epileptiformes, catalepsia, estereotípias e flexibilidade cérea.


Entre as alterações das senso-percepções, destacam-
se as alucinações, anestesias, analgesias, hiperestesiais,
parestesias etc. Maiorov cita um paciente para
quem "o suave ruído do metrônomo parecia um disparo
de arma de fogo".

Alterações da personalidade, tais como regressão
da memória, regressão a níveis de comportamento menos
maturo, criptomnésia, hipermnésia, amnésia lacunar
etc. Surgimento de personalidades duplas, múltiplas ou
mesmo surgimento de complexos ou arquétipos mais ou
menos autônomos em relação ao eu, além, claro, de personalidades
metanóicas ou espirituais.

Também ocorrem alterações das funções neurovegetativas,
por ativação do simpático e do parassimpático,
tais como somatizações, conversões, embora estas, por
definição, ocorram na musculatura estriada e não lisa, alterações
da pressão arterial, da freqüência cardíaca, respiratória,
alterações metabólicas, descontrole esfincteriano
etc.

Entre os fatores que parecem induzir o transe, tem-se
a diminuição dos estímulos exteroceptivos, tais como o
silêncio, a meia-luz etc , com conseqüente rebaixamento
do tônus cortical; também a prece à meia-voz atua como
indutor da inibição do córtex cerebral (indução negativa
de Pavlov, segundo Cerviño).

Finalmente a concentração com o conseqüente estreitamento
do campo da consciência.
A inibição da atividade dos neurônios corticais também
pode resultar de um déficit no funcionamento da

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


substância reticulada ascendente, responsável pelo mecanismo
da vigília.

Segundo Chusid ("Neuroanatomia"), a porção central
do tronco cerebral cefálico e áreas adjacentes, formadas
pela formação reticular, subtálamo, hipotálamo e tálamo
medial, é essencial para a iniciação e manutenção
de um estado de vigília alerta.

O sistema reticular ativador pode ser considerado
essencial para o despertar do sono, a vigília, o estado de
alerta, a focalização da atenção, a associação perceptual
e a introspecção dirigida. Os distúrbios de sua função podem
estar associados com anestesia e estados comatosos.


É interessante frisar que, segundo o grande Yogue
Yogananda, o bulbo raquidiano é considerado pelos
orientais como sendo "The mouth of God", especialmente
na altura do quarto ventrículo, e seria a principal porta de
entrada da energia espiritual, essencial à manutenção da
atividade orgânica, e denominada Prana. Qualquer lesão
dessa região produz morte instantânea, segundo os neuropatologistas.


Esse sistema citado por Chusid pode ser estimulado
globalmente pela estimulação de todos os sentidos periféricos.
O grande psicólogo William James cita exemplos
de transe onde ocorre o bloqueio de toda estimulação
sensorial exterior. Os grandes yogues citam estados semelhantes,
e, entre os grandes místicos espanhóis, Santa
Tereza denomina esse estado como "oração de quietude".


A Psicofarmacologia tem demonstrado que as drogas
neurolépticas, como a cloropromazima, a levomepromazina
etc. bloqueiam seletivamente a transmissão dos
impulsos aferentes ao sistema reticular ativador. Essa

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ação é aproveitada pela farmacoterapia como indutora indireta
do sono, mas o seu efeito mais importante é o antipsicótico.


Essa ação dos neurolépticos bem que poderia explicar
a ruptura das simbioses observadas nos casos obsessivos,
de natureza mediúnica, impedindo que o espírito
obsessor continue atuando, de modo deletério, sobre o
sistema nervoso da vitima encarnada.

Não possui, o autor, dados experimentais comprobatórios
dessa hipótese, mas, já pode colher observações
de médiuns videntes de que tais substâncias, ao modificarem
o tônus do SNC, impediriam a atuação das entidades
obsessoras. Ademais, a própria Psiquiatria desconhece
o modo intrínseco de atuação dessas drogas nas
mentes de seus pacientes. A. Luiz ensina que os psicotrópicos
possuem essa ação graças à ressonância magnética
especial com a matéria do plano astral, como será
visto mais adiante. Isso não implica a dedução de que todas
as doenças mentais sejam de fundo espiritual, e também
aqui a postura equilibrada de Aksakof é a mais prudente.


Segundo Volgyesi, o transe mediúnico implica um
mecanismo de descerebração reversível, e o córtex frontal,
sede das funções superiores, seria a primeira etapa
desse processo.

A participação dos centros subcorticais, segundo
Cervino, é evidenciada pelas alterações neurovegetativas,
tais como congestão ou palidez facial, taquicardia,
sudorese etc. Aqui o pólo subcortical do psiquismo ativaria
os "psicorreceptores" (Cerviño, op. cit.) que ficariam
aptos à detecção de influxos psicocinéticos, que de ordinário
não lhes atingiriam o limiar. Através da percepção
extra-sensorial entra a psique em relação com a realida-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


de não-física, de onde lhes chegam estímulos evidentemente
não-físicos (idem). Nessas zonas ocorre a transformação
dos influxos psicocinéticos oriundos do plano
espiritual em "processus" biológico. Como isso se dá? A
resposta é dada por André Luiz.

Na obra "Mecanismos da Mediunidade" (FEB.,
1959), esse autor espiritual discorre sobre o papel e a natureza
do pensamento no reino do Espírito (Cap. I).

Por meio de um raciocínio analógico, citando a Teoria
Eletromagnética de Maxwell, aportando na Teoria
Quântica de Max Planck, esse autor traça a "analogia do
que se passa no mundo íntimo das forças corpusculares
que entretecem a matéria física e aquelas que estruturam
a matéria mental" (formadora do Plano Espiritual). (Cap.
II.)

Em seguida, cita a proposição de Einstein quando
aboliu o conceito de "éter", substituindo-o pelo moderno
conceito de campo. Já foi dito nos capítulos precedentes
que a Física Moderna se estancou diante do abismo existente
além das Teorias da Relatividade e Quântica. Esse
abismo é justamente o conceito de campo, onde o "nada"
ou o "vazio" é ao mesmo tempo "pleno", com um contínuo
e infinito processo de destruição e criação das partículas
subatômicas.

Convém repisar aqui as impressionantes descobertas
da Física Nuclear que levaram os cientistas mais
proeminentes a um estado extremo de perplexidade.

Descobriram, os físicos, que as partículas subatômicas
apresentam uma seqüência de eventos, que Kenneth
Ford adjetivou como sendo "horrenda" ("The World of
Elementary Particles). Descobriram partículas desprovidas
de massa, os gravitons, que, no entanto, são responsáveis
pelas tremendas forças gravitacionais que dirigem

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


os movimentos dos gigantes do espaço cósmico. A Física
ainda não observou o graviton, "embora não haja uma razão
ponderável que nos leve a duvidar da sua existência"
(Kapra). O mesmo pode ser dito em relação aos átomos
mentais descritos por André Luiz.

O paradoxo atingiu o extremo com as descobertas
da natureza do campo: "O campo existe sempre e por
toda parte; jamais pode ser removido. É portador de todos
os fenômenos materiais. É o 'vácuo' a partir do qual

o próton cria os mésons pi. A existência e o desaparecimento
das partículas são formas de movimento do campo"
(W. Thirring).
Destarte, tornou-se evidente que as partículas virtuais
podem passar a existir espontaneamente a partir do
"vácuo" e a desaparecer novamente neste último (Kapra).
Ora, esse aparecimento e desaparecimento de partículas
de onde a Física constata não existir "nada" é um
contra-senso, um completo absurdo, um verdadeiro "tour
de force".

Aqui é que André Luiz desvenda o mistério e resolve
o enigma, com a Posição Espírita (op. cit.) ao dizer
que onde a Física encontra o vácuo estão os átomos
mentais: "A proposição de Einstein, no entanto, não resolve
o problema, porque a indagação quanto à MATÉRIA
DE BASE para o campo continua desafiando o raciocínio,
motivo pelo qual, escrevendo da esfera extrafísica,
na tentativa de analisar, mais acuradamente, o fenômeno
da transmissão mediúnica, definiremos o meio sutil em
que o Universo se equilibra como sendo o Fluido Cósmico
ou Hálito Divino, a força para nós inabordável que sustenta
a Criação" ("Mecanismo da Mediunidade", págs. 40,
41).

A Física das partículas ainda não detectou esses re-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 16 1


feridos átomos mentais, mas sua existência preenche o
abismo em que se debruça a Física e soluciona os paradoxos
"horrendos", para utilizar terminologia dos próprios
físicos. Isso porque, segundo a Teoria Quântica dos campos,
todas as interações se dão através da troca de partículas,
e aqui está, provavelmente, a base dos processos
mediúnicos, ou seja, a interação entre o mundo físico e o
espiritual ou hiperfísico. Contudo, apesar do avanço proporcionado
pela Posição Espírita, o próprio André Luiz
declara essas bases por ora inabordáveis, como foi transcrito.


Assim, no fundo do abismo insondável da Física, a
Doutrina Espírita situa a própria divindade. Talvez intuído

o alcance de suas descobertas, Einstein declara de público
acreditar na existência de Deus, que, para ele, é um
Deus matemático. Aliás, Einstein relatou diversas experiências
paranormais da mais profunda religiosidade, sem
por isso deixar de ser o maior cientista moderno.
André Luiz interpreta o "Universo como um todo de
forças dinâmicas, expressando o Pensamento do Criador.
E superpondo-se-lhe à grandeza indevassável, encontraremos
a matéria mental (...)" (pág. 43). Segundo
ele, "o pensamento, ou fluxo energético de campo espiritual"
se expressa "nos mais diversos tipos de onda, desde
os raios super-ultra-curtos, em que se se exprimem as
legiões angélicas (...) passando pelas oscilações curtas,
médias e longas em que se exterioriza a mente humana,
até as ondas fragmentárias dos animais..." (op. cit., pág.
44).

Para a Posição Espírita, entretanto, o pensamento
"ainda é matéria — a matéria mental —, em que as leis
de formação das cargas magnéticas ou dos sistemas atômicos
prevalecem sob novo sentido (...) considerando os

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


átomos, tanto no plano físico quanto no plano mental,
como associações de cargas positivas e negativas": "núcleons,
prótons, nêutrons, posítrons, elétrons, ou fótons
mentais" "em vista da ausência de terminologia analógica
para estruturação mais segura de nossos apontamentos".
As energias mentais obedecem a lei das "quanta de
energia" e aos princípios da mecânica ondulatória (...)"
(idem, pág. 45).

Quem não estiver familiarizado com as sutilezas e
profundidades espíritas poderá estar considerando tudo
isso mera fantasia. Contudo, já viu alguém um elétron?
Ou um méson etc? Certamente que não. Mas ninguém
duvida que a energia elétrica que impulsiona a indústria
de São Paulo, por exemplo, provenha das imensas turbinas
da hidrelétrica de Itaipu. Do mesmo modo, os fenômenos
mediúnicos, para quem tenha olhos de ver e ouvidos
de ouvir, aí estão a confirmar os postulados espíritas.

André Luiz ensina que uma "corrente de partículas
mentais exterioriza-se de cada Espírito com qualidades
de indução mental (...) e que (...) a corrente mental é susceptível
de reproduzir as suas próprias particularidades
em outra corrente mental que se lhe sintonize". Aqui está
a base dos mecanismos do fluidismo de Mesmer.

Destarte, prazer ou desgosto, alegria ou dor, otimismo
ou desespero etc. "não se reduzem efetivamente a
abstrações, por representarem turbilhões de forças em
que a alma cria os seus próprios estados de mentação indutiva"
(idem).

Essa postulação espiritista explica muito bem o que

B. Schneider denomina de identificação recíproca, na relação
médico-paciente, que para ele seria a origem da fadiga
médica (identificação com muitos pacientes, a frustração
médica e as interações inconscientes). Aqui tam-
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


bém entra o misterioso fenômeno da transferência e da
contratransferência. Aliás, Jung já dizia que os estados
mentais são altamente contagiosos. Exemplificando, o
pânico de uma multidão em um estádio de futebol, ocasionando
trágicos acontecimentos. De acordo com a Posição
Espírita, a sugestão longe está de esgotar esse intrigante
fenômeno. A relação médico-paciente, se bem
compreendida e manipulada, é em si mesma uma relação
terapêutica (Schneider). Mesmo involuntariamente
ocorrem aqui intensas trocas de correntes mentais, daí a
importância fundamental do padrão de personalidade do
terapeuta no processo de tratamento. Esse fenômeno explica
também, em parte, o sucesso ou o fracasso de muitos
procedimentos terapêuticos, que seguem um modelo
básico tipo autoridade-confiança.

Segundo o autor acima citado, o processo terapêutico
depende muito da auto-imagem do médico, bem como
das fantasias do paciente em relação ao mesmo: é
mago? santo? curas milagrosas? Os doentes sempre estão
regredidos aos níveis mais primitivos e arcaicos de
pensamento, diante do ignoto representado pela doença.

Os fenômenos descritos por Aksakof, como personismo,
animismo e espiritismo, também possuem aqui os
seus mecanismos de funcionamento.

Segundo André Luiz, existe no "cérebro um gerador
auto-excitado, acrescido em sua contextura íntima de
avançados implementos para a geração, excitação, transformação,
indução, condução, exteriorização, captação,
assimilação e desassimilação da energia mental" (op.
cit).

Mas como se processa a interação mente-corpo? O
autor espiritual André Luiz assevera que a mente controla

o corpo, em que se exprime, administrando "as ocorrên-
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cias do metabolismo (...) sobre os elementos albuminóides
do citoplasma, em que as forças físicas e espirituais
se jungem (...)" ("Evolução em dois Mundos", FEB, 1958,
pág. 62), e "por intermédio dos mitocôndrios, que podem
ser considerados acumulações de energia espiritual, em
forma de grânulos (...)" (idem, pág. 63). Aos que sorrirem
diante dessa afirmação, convém relembrar que a Física
já demonstrou que matéria e energia são dois aspectos
de uma mesma grandeza, e que além dos aspectos líquido,
sólido e gasoso, a matéria apresenta outras maneiras
de ocorrência.

A Doutrina Espírita representa a mais avançada
combinação entre ciência, religião e filosofia da história
da Humanidade. Explica os fenômenos espirituais por
meio de processos naturais, palpáveis, ao contrário das
religiões tradicionais que, de um modo geral, recorrem ao
dogma, aos milagres e aos mistérios da fé. Ela dispensa
atitudes extremadas como a de Tertuliano que afirmava
crer porque sabia que era impossível. Dispensa também
raciocínios impossíveis de ser verificados como o Paralelismo
de Geaulinex, estudado no primeiro capítulo. Através
da prática mediúnica, oferece os instrumentos necessários
à experimentação individual, mediante as potencialidades
inerentes a cada um.

André Luiz explica que "a inteligência influencia o citoplasma,
que é, no fundo, o elemento intersticial de vinculação
das forças fisiopsicossomáticas (...) e obriga as
células ao trabalho automático". "O controle mental é
quem dirige (inconscientemente) o ordenamento e as funções
das células, dos tecidos, dos órgãos, via citoplasma"
por meio de "ordens magnéticas de origem mental
que saturam as células, provocando alterações bioquímicas
específicas. Esse processo magnético também expli-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ca a exteriorização de fluidos de impulsão e explica os fenômenos
de efeitos físicos" (op. cit.).

Dentro das células, os corpúsculos de concentração
especial de natureza fluídico-magnética são os próprios
cromossomos, considerados a matriz da vida. Esse mistério
para os biólogos, a vida, tem suas bases estruturais
nos cromossomos, "(...) estruturados em grânulos infinitesimais
de natureza fisiopsicossomática, partilham do corpo
físico (...) e do corpo espiritual (...)" (op. cit., pág. 50).

Continuando o seu resumo, André Luiz cita o centríolo
como outro importante ponto de convergência das
forças físicas e espirituais e que "sob as ordens dos automatismos
da mente se processa o controle do metabolismo
através os hormônios, para-hormônios, vitaminas,
enzimas, co-enzimas, neurotransmissores etc , e o princípio
inteligente haure elementos quimiotácticos electromagnéticos
no laboratório das forças universais através
da respiração" (idem). Aqui existe um importante ponto
de convergência entre a Posição Espírita e a Yoga, que
ensina a assimilação do prana também através da respiração.


Esse princípio é largamente utilizado pela Yoga, no
Oriente, desde tempos imemoriais, que por meio de técnicas
respiratórias especializadas induz ao transe, com o
alcance de elevados estados de consciência, como o de
Yogananda, descrito anteriormente. Entre essas técnicas,
destaca-se a Krya Yoga, reintroduzida na índia moderna
pelo Mahavatar Babaji, e difundida no Ocidente por Paramahansa
Yogananda. Tais técnicas podem ser solicitadas
por carta à "Self Realization Fellowship", cujo endereço
se encontra na obra autobiográfica de Yogananda,
em português, já citada.

André Luiz cita também as mitocôndrias "como acu-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


muladores de energia espiritual, em forma de grãos, assegurando
a atividade celular". Cita ainda "um pigmento
estreitamente relacionado com o corpo espiritual, de função
muito importante na vida do pensamento, a espalhar-se
no citoplasma e nos dendritos, que se expressa nos corpúsculos
de Nissl e representa o elemento psíquico, haurido
pelo corpo espiritual no laboratório da vida cósmica,
através da respiração (...), essa substância é conhecida
no Mundo Espiritual como fator de fixação, como que a
encerrar a mente em si mesma" (idem, pág. 68).

Segundo De Robertis ("Biologia Celular"), a substância
de Nissl encontra-se em quantidades consideráveis
nas fibras nervosas, sendo composta por ribossomas
e retículo endoplasmático. Está relacionada principalmente
com as propriedades biossintéticas dos neurônios,
células adaptadas à condução rápida de impulsos
nervosos, sem perdas, através de largas distâncias.

Quando uma fibra nervosa se estimula, produz-se
uma profunda mudança nas propriedades elétricas da
membrana celular e no potencial de repouso. A resistência
elétrica cai de 100 a 25 ohms por cm2, o que indica
um aumento da permeabilidade aos íons, e uma subseqüente
despolarização. Esses processos elétricos se dão
por conta de trocas entre os íons de sódio e potássio.
Ora, é fato elementar da Física que cargas elétricas geram
cargas magnéticas. O inverso é verdadeiro e aí estaria
outro canal de atuação dos fenômenos mediúnicos.
Contudo, Bois Reymond descobriu que a transmissão
também pode ser de natureza química, por meio das catecolaminas,
mas uma descrição minuciosa da extensa
atividade bioelétrica do sistema nervoso foge às finalidades
do presente trabalho.

Entretanto, com a finalidade de demonstrar a impor-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


tância dos aspectos magnéticos nas funções instrumentais
da vida de relação, será citado um uso prático moderno:
trata-se do método de diagnóstico por Ressonância
Magnética, muito mais preciso que a Tomografia
Computadorizada, já descrito anteriormente (Secaf).

Para a Posição Espírita, segundo André Luiz, os
Neurônios "são vias eletromagnéticas de comunicação
entre o governo espiritual e as províncias orgânicas (...)
No diencéfalo, o centro coronário, por fulcro luminoso,
entrosa-se com o centro cerebral, a exprimir-se no córtex
e em todos os mecanismos do mundo cerebral, e, dessa
junção de forças, o Espírito encontra no cérebro o gabinete
de comando das energias que o servem como aparelho
de expressão" (op. cit.).

A mente se relaciona com outras estruturas além do
encéfalo, como ensina André Luiz: "Desde o grupo tectobulbar
das fibras pré-ganglionares, saindo com os pares
cranianos, tecidas com neurônios do mesencéfalo, protuberância,
bulbo e incluindo os núcleos supra-ópticos, paraventriculares
e a parede anterior do infundíbulo, até o
grupo sacro, com neurônios localizados na medula sacra,
nervos especiais funcionam como estações emissoras e
receptoras, manipulando a energia mental, projetada ou
colhida pela mente (...)" ("Evolução em dois Mundos ",
pág. 71).

É interessante anotar aqui o fato de que os Yogues
hindus chegaram a conclusões bastantes semelhantes,
tendo Yogananda denominado o bulbo raquidiano ou medula
oblongata como sendo 'lhe mouth of God", como foi
dito e localiza nessa estrutura anatômica a principal via
de entrada das energias espirituais, necessárias à manutenção
da vida nas células materiais, bem como à indu-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ção de estados diferenciados de consciência, tais como
os descritos por William James (op. cit.).

Os iniciados em Krya Yoga, ou Kundalini Yoga, utilizam-
se de uma técnica psicofisológica que consiste em
ativar o fluxo da energia mental desde o cóccix até o córtex
frontal, onde estaria localizado o centro frontal correspondente
ao corpo espiritual. É deveras surpreendente o
grau de concordância entre os modernos avanços da Física,
da Neuroanatomia, da Neurofisiologia, da Yoga, da
Psicologia e do Espiritismo. André Luiz afirma que a Fisiologia
e a Psicologia são indissociáveis (op. cit.). Essa
indissociabilidade pode ser parcialmente superada, segundo
esse autor, durante o mecanismo de alguns tipos
de sono, quando a alma consegue "desprender-se do
corpo denso de carne, desligando as células do seu corpo
espiritual das células comuns" (op. cit.).

As qualidades heurísticas da Doutrina Espírita são
inesgotáveis e não contradizem os modernos avanços
das Teorias Psicanalíticas ou dos estudos psicofisiológicos
do sono, com as Fases I, II, III, Paradoxal ou REM
etc.

Sonhos simples, restos diurnos, sonhos alegóricos,
simbólicos, premonitórios, revelações de cunho filosófico,
científico, artístico etc , comunicações telepáticas entre
vivos, eventos mediúnicos, sincronísticos ou paranormais
são plenamente explicados pela Teoria Espírita. Exemplificando,
sonhos notáveis como o de Kekulé, ao descobrir
a fórmula do núcleo de benzeno, são prova da existência
de atividade intuitiva e lógica durante o sono.

Essas complexas modalidades de interação mente-corpo
não devem causar incredulidade, uma vez que o plano
espiritual é também natural, não tendo nada de sobrenatural,
mítico, mágico, imaterial, fantástico etc : "na esfera

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


nova de ação, a que se vê arrebatado pela morte, encontra
a matéria conhecida no mundo, em nova escala vibratória.
Elementos atômicos mais complicados e sutis,
aquém do hidrogênio e além do urânio, em forma diversa
daquela em que se caracterizam na gleba planetária, engrandecem-
lhe a série estequiogenética" (A. Luiz, op. cit.,
pág. 96).

Aliás, o próprio Codificador admitiu a indissociabilidade
entre a Ciência e o Espiritismo: "O Espiritismo e a
Ciência se completam reciprocamente; a Ciência, sem o
Espiritismo, se acha na impossibilidade de explicar certos
fenômenos só pelas leis da matéria; ao Espiritismo, sem
a Ciência, faltariam apoio e comprovação" (Allan Kardec,
"A Gênese", FEB, pág. 21).

O pensamento possui "massa e trajeto, impacto e
estrutura" (A. Luiz, op. cit.). As conseqüências, tanto teóricas
quanto práticas dessa afirmação, para a Psicologia,
a Psicoterapia e a Psicopatologia são imensuráveis, no
estágio atual do conhecimento da mente humana.

Em sua obra "Mecanismo da Mediunidade", A. Luiz
compara o intercâmbio mediúnico a uma corrente elétrica,
com um pólo positivo, o Espírito comunicante, e um
pólo negativo, a mente do médium, gerando entre os dois
uma "diferença de potencial", no caso, de natureza "mento-
eletromagnética": "Estabelecendo um fio condutor de
um para o outro, que (...) representa o pensamento de
aceitação ou adesão do médium, a corrente mental desse
ou daquele teor se improvisa (...)." O pensamento de
"aceitação ou adesão da personalidade mediúnica" atua
como um gerador de força.

De acordo com o exposto acima, os aspectos conscientes
são fundamentais para o intercâmbio mediúnico.
Como se explicam, entretanto, os fenômenos de domina


PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ção da mente do médium por personalidades espirituais
ditas obsessoras?

A Psicologia profunda explica. Segundo Jung, a parte
consciente da personalidade está para a parte inconsciente
como uma pequena ilha está para o vasto oceano.
Podem ocorrer idéias, anseios, impulsos, motivações,
pulsões, desejos e valores inconscientes completamente
em desacordo com os padrões da parte consciente da
personalidade. Podem ocorrer ambivalências as mais variadas,
no pensar, no sentir e no agir. Assim, mesmo que

o ego rejeite certas influências, podem existir afinidades
no dinamismo inconsciente muitíssimo mais poderosas, e
é elementar que, entre forças opostas, sempre uma sai
vitoriosa, resultando, no caso, a saúde ou a doença de
fundo espiritual.
Esse fator explica os fracassos tanto das terapias
de ordem psicológica ou psiquiátrica, que não levam em
consideração a dinâmica do inconsciente, como também

o fracasso das terapias alternativas de feição espiritual
puramente "desobsessivas". Aqui, as raízes dos problemas
jazem nas profundezas da alma, e somente aí podem
ser encontradas as possíveis soluções para os mesmos.
O bom senso indica que são fundamentais o tempo,
a esperança, o esforço pessoal e o trabalho tanto interno
quanto externo. É interessante notar que no Evangelho, o
Cristo, quando fazia curas, não dizia que ele havia curado
os doentes, tal como no exemplo de Mateus (Cap.
9:20 a 22): "E eis que uma mulher que havia já doze anos
padecia de um fluxo de sangue, chegando por detrás
dele, tocou a orla do seu vestido; porque dizia consigo:
se eu tão-somente tocar o seu vestido, ficarei sã. E Jesus,
voltando-se, e vendo-a, disse: Tem ânimo, filha, a
tua fé te salvou. E imediatamente a mulher ficou sã."
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Essas citações costumam causar hilaridade nos
meios acadêmicos. Contudo, à luz do Princípio da Indeterminação
de Heisemberg, essa atitude cética não é de
modo algum científica.

Segundo André Luiz, a prática do mediunismo implica
sérios riscos, quando feita de maneira intempestiva,
podendo ocorrer a "formação de extracorrentes magnéticas,
capazes de operar desajustes e perturbações físicas,
perispiríticas e emocionais, de resultados imprevisíveis
para o médium, quanta para a entidade em processo
de comunicação (op. cit., pág. 58).

Esse mesmo autor considera a mediunidade como
sendo uma anomalia do campo magnético do médium,
sempre mais "pronunciada naquelas criaturas que estejam
temporariamente em regime de 'descompensação vibratória',
seja de teor purgativo ou de elevada situação
(...)" (pág. 72). Esse autor, contudo, desconhece a origem
da corrente mental: "Nasce das profundezas da mente,
em circunstâncias por agora inacessíveis ao nosso conhecimento,
porque, em verdade, a criatura, pensando,
cria, sobre a Criação ou Pensamento Concreto do Criador"
(op. cit., pág. 82). Os orientais denominam esse
Pensamento Concreto de Deus como sendo "OM", ou o
Poder Vibratório Cósmico, que, segundo eles, pode ser
percebido em estados extáticos denominados Samadi.

Para as filosofias orientais, tais como o Taoísmo, o
Budismo e o Hinduísmo, a realidade intrínseca da alma é
incognoscível, isto é, não pode ser apreendida pelo pensamento
lógico formal. Essa noção de incognoscibilidade
é expressa no Zen por meio de afirmações completamente
absurdas, denominadas Koans, sobre as quais os discípulos
são induzidos a meditar. Também já foi dito que o
pensamento lógico formal e matemático não pode pene-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


trar na estrutura última da matéria, em níveis subatômicos,
onde conceitos de tempo, espaço, causalidade, contradição
etc. deixam de existir, de acordo com os grandes
físicos modernos, já citados.

Convém relembrar que, do ponto de vista da Psicopatologia,
é fundamental o diagnóstico diferencial entre
os diversos tipos de transe. É claro que, para a corrente
materialista, esse problema deixa de existir, uma vez que
ela não admite a existência do transe de natureza parapsicológica
nem do mediúnico. Mas, para os que admitem
a hipótese da sobrevivência da alma e da mediunidade,
permanece pertinente a advertência de Allan Kardec: (...)
"Se assim é dir-se-á, nada prova que seja de preferência

o Espírito estranho que escreve ao invés do Espírito do
médium. A distinção, com efeito, algumas vezes, é bastante
difícil de se fazer" (...) ("O Livro dos Médiuns", Item
186).
Segundo Cerviño, o contato imaginário com mundos
invisíveis tem sido, para muitos, a compensação de uma
vida íntima cinzenta, desprovida de brilho e de afetos. O
transe,, como o sonho, é também a estrada real da satisfação
de desejos, ou a válvula de escape de personalidades
secundárias, que podem emergir, quando se apagam
as luzes do córtex cerebral (op. cit). Aqui, sem dúvida, se
adentra o campo doloroso da Psicopatologia.

A esse respeito, o psiquiatra Henrique Roxo salienta
que os histéricos, os débeis mentais, os psicopatas, em
geral, devem ser afastados das práticas mediúnicas, pois
a freqüência às sessões mediúnicas pode desencadear o
que ele denominou "Delírio Espírita Episódico", caracterizado
principalmente pela ocorrência de alucinações auditivas
e cenestésicas, medo e excitação psicomotora. O
paciente ouve vozes de pessoas falecidas, julga-se atua-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


do por Espíritos, permanece insone, em estado de pânico.


Segundo esse autor, essa síndrome ocorre nas pessoas
predispostas à atividade delirante, cujos sintomas
poderiam ser eliciados por outros fatores desencadeantes
ou eventos estressantes. Outros psiquiatras também
recomendam o afastamento de pessoas "bordeline" das
práticas mediúnicas. ("Manual de Psiquiatria", Henrique
Roxo.)

Contudo, é de suma importância frisar que prática
mediúnica não é sinônimo de prática religiosa, que tem
efeito salutar para aqueles que têm o dom da fé, coadjuvada
pela praxiterapia, ludoterapia e terapia ocupacional,
entre outras.

Jayme Cerviño descreve uma forma de mediunopatia,
uma forma mórbida de mediunismo, geralmente incipiente,
que tende a normalizar-se pelo exercício ponderado
e autocontrolado da própria faculdade. Esse autor propõe,
para o diagnóstico diferencial, além da verificação
do possível conteúdo parapsíquico das alucinações, a
prova terapêutica: a mediunidade normal, se é que se
pode usar aqui esse conceito estatístico, que não implica
patologia, bem como a mediunidade patológica não se
dissipam com as terapias físicas ou farmacológicas (op.
cit., pág. 110). Entretanto, a prática do autor tem indicado
que os neurolépticos suprimem, pelo menos temporariamente,
tanto os sintomas delirante-alucinatórios dos pacientes
psicóticos quanto aqueles parapsicológicos ou
mediúnicos, independentemente de possuírem patoplastia
espírita ou não.

Em "O Livro dos Médiuns", Allan Kardec adverte:
"há pessoas relativamente às quais se devem evitar as
causas de sobreexcitação e o exercício da mediunidade

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


é uma delas", e que "o bom-senso está a dizer que se
deve usar de cautela", ou ainda "do seu exercício cumpre
afastar, por todos os meios possíveis, as pessoas que
apresentam sintomas ainda que mínimos de excentricidade
nas idéias ou de enfraquecimento nas faculdades
mentais" etc. Na "Revue Spirite" de dezembro do 1858,
Allan Kardec usou o termo "monomanía espírita". Naquela
época, a Psiquiatria francesa usava o termo monomanía,
atualmente em desuso, como indicativo de psicose.
Sob a denominação de monomanía, o grande alienista
Esquirol agrupava as neuroses obsessivas, a paranóia
etc.

Com muita argúcia, Cervino assevera que "à medida
que diminui a incidência de 'demonopatas', aumenta
necessariamente o número de 'espirito-maníacos'".

O papel desempenhado pelo Espiritismo tem sido o
inverso daquele assumido pela Igreja Católica, durante a
Idade Média, com os exageros da possessão demoníaca.
A atitude inquisitorial de alguns membros da Igreja, certamente
verdadeiros psicopatas, chegou ao extremo de
editar o terrível "Malleus Malleficiarum", um "vade-mécum"
de tortura e execução de doentes mentais supostamente
"demonopatas". Apesar desses pecados, coube à
Igreja a edificação dos primeiros monastérios-hospitais,
precursores dos hoje tão criticados quanto combatidos
hospitais psiquiátricos.

O Espiritismo, bem dosado e com aplicação judiciosa
e equilibrada, é poderosa forma de psicoterapia holístíca,
possuindo valiosos recursos nos tratamentos por
meio dos passes mento-magnéticos, da prece, da leitura
edificante e da ressocialização, praticada em milhares de
Centros Espíritas ou em Clínicas Psiquiátricas de natureza
espírita, já enumeradas e comentadas. Seus benefí-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cios são imensuráveis e merecem todo o apoio da Ciência
Médica oficial, uma vez que cresce, a cada dia, o número
de facultativos espíritas. Claro que os contra-sensos
devem ser combatidos pelos riscos que oferecem à
população em geral.

Como se vê, o mediunismo é um tema vasto, profundo
e quase inesgotável. Muito provavelmente a maior
autoridade mundial psiquiátrica sobre o mesmo tenha
sido Carl Jung, mas esse autor não só não conseguiu introduzir
o tema na comunidade acadêmica como foi obrigado
a escamotear suas idéias por meio de alguns verdadeiros
logogrifos. Sua autobiografia "Memórias, Sonhos
e Reflexões" prova que Jung era, ele mesmo, um
poderoso médium, mas somente permitiu a sua publicação
após sua morte ocorrida em 1961. Paradoxalmente o
seu prestígio científico não cessa de aumentar, ao longo
dos anos.

Em "As Variedades da Experiência Religiosa", o notável
psicólogo William James fez talvez a mais profunda
análise da fenomenologia mediúnica, embora não tenha
vinculado essas descrições ao Espiritismo. É uma obra
imprescindível a quem queira se aprofundar sobre o
tema. Quanto à literatura espírita, é vastíssima e facilmente
acessível.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


VI
MEDIUNISMO E PSICOPATOLOGIA

No capítulo precedente já foi dito alguma coisa sobre
os percalços da mediunidade. No presente capítulo
será realizado um ensaio a respeito do mediunismo, agora
do ponto de vista e da perspectiva da Psicologia e da
Psicopatologia.

A prudência recomenda balizar as idéias aqui expostas
no pensamento daquele que é considerado o
maior psiquiatra de todos os tempos, e ele próprio um poderoso
médium, Carl Gustav Jung.

Quando ainda jovem médico militante no Burgholzly,
o famoso hospital psiquiátrico de Zurique, Jung chegou
a descobertas semelhantes às de seu colega vienense
Sigmund Freud, a respeito das instâncias inconscientes
da personalidade humana. Devido ao seu poderoso
intelecto, Jung se tornou o principal discípulo de Freud,
chegando a provocar crises de ciúmes entre aqueles do
círculo íntimo de Viena (Ernst Jones). Contudo, com o
avanço de seus estudos e experiência clínica, Jung pôde
constatar que a vida psíquica individual não esgota a
magnitude do próprio ser psíquico. Isto quer dizer que o

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


indivíduo representa muito mais do que o somatório de
suas vivências pretéritas, colhidas através da anamnese.

Jung descartou então a hipótese empirista-sensualista,
segundo a qual nada existe na mente do indivíduo
que não tenha antes passado pelo crivo da percepção
sensorial. Descobriu que a hipótese de que a mente do
recém-nato é uma tábula rasa é uma falácia. Esses avanços
possuem um incalculável poder heurístico e, embora
Jung não tenha admitido abertamente a hipótese da reencarnação,
suas descobertas fundamentais apontam nesse
sentido. Jung verificou que existe na mente uma instância
inconsciente que 'teria vivido incontáveis vezes a
existência do indivíduo, da família, das tribos e dos povos,
e seria dono do ritmo do porvir" ("Realidade da
Alma"). Esse oceano psíquico foi denominado por ele Inconsciente
Coletivo, e o seu conteúdo, os Arquétipos.
Convém enfatizar que essa hipótese não é excludente
com a hipótese da reencarnação espírita, mas são plenamente
complementares entre si.

Contudo, Jung, num gesto de audácia, foi além e
admitiu a existência das funções Psi, ou parapsicológicas,
e afirmou que os fenômenos Psi escapam à lei da
causalidade, pois, segundo ele, não se poderia conceber

o determinismo fora da continuidade espaço-tempo. Baseado
nessa suposição criou o confuso conceito de Sincronicidade,
cujo desenvolvimento é uma progressão de
avanços e recuos. Essa tática de escotomizar e de prestidigitar
salvou seus escritos de terem o mesmo destino da
Metapsíquica e do próprio Espiritismo nos meios acadêmicos
eivados de preconceitos materialistas. Existem psicoterapeutas
junguianos materialistas e espiritualistas na
dependência da interpretação individual dos conceitos
junguianos, baseada nas próprias vivências pessoais.
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Em que pese à genialidade desse grandioso médico,
a sua inigualável capacidade de penetração empática
da alma de seus pacientes, os seus escritos são criticados
por excesso de obscurantismo. Jung, contudo, se defende
dizendo que a ambigüidade de seus conceitos é
fruto da própria ambigüidade da psique, que, segundo
ele, não possui uma única grandeza unívoca, e que seus
padrões fogem aos sistemas lógicos formais, tais como a
natureza das partículas subatômicas. Jung chegou a publicar
um importante artigo em parceria com o gigante da
Física Nuclear, W. Pauli, a respeito do impressionante
paralelismo entre os fenômenos psíquicos e o comportamento
das partículas subatômicas.

Voltando à mediunidade, Cerviño ensina que, a partir
dos psicorreceptores subcorticais ("Além do Inconsciente",
FEB 1968), originam-se influxos nervosos que
atingem o córtex e seguem a via motora, produzindo
automatismos vários: psicofonia, psicografia etc; ou a via
sensorial, produzindo automatismos sensoriais: visões,
vozes etc; ou imagens na consciência sob a forma de intuições.


Freqüentemente essas percepções extra-sensoriais
possuem um caráter, além de alucinatório, simbólico, tal
como ocorre nas ideações delirante-alucinatórias dos
doentes mentais, nos sonhos das pessoas normais etc.
Exemplificando, com Cerviño, o médium vê um féretro ou
uma coroa de flores: é a imagem alucinatória que o centro
cortical da visão projeta para o exterior, excitado pela
premonição da morte próxima. André Luiz confirma essa
feição simbólica da mediunidade. O autor observou um
caso em que o médium teve diversas visões similares, de
caixões do próprio vidente, um Espírito apontando-lhe
uma arma de fogo, que precederam um processo de per-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


seguição de origem política, que culminou com o fim de
uma brilhante carreira profissional. O mesmo indivíduo
apresentou uma série de sonhos com queda de avião.
Jung cita o caso de um professor universitário que teve
sua carreira interrompida, por motivo de doença mental,
precedida de sonhos de desastres de trem. Segundo
esse autor, o trem descarrilhando-se simbolizava o processo
de desagregação do ego do sonhante.

Essa hipótese da percepção mediúnica como sendo
fruto de uma projeção alucinatória, simbólica e a partir de
uma percepção extra-sensorial, via inconsciente, parece
ser aceita pela Posição Espírita, uma vez que a obra citada
de Cerviño foi editada pela própria FEB. É possível
que existam outros mecanismos, mas essa hipótese se
encaixa perfeitamente bem ao quadro de conhecimentos
psicofisiológicos da Psicologia e Neurofisiologia, de um
lado, e aos ensinamentos de André Luiz, de outro, como
foi visto no capítulo precedente. Além do mais, é uma hipótese
de enorme potencial heurístico.

É fato comprovado que ninguém vê, ouve, percebe
odores etc , com o córtex cerebral. O que ocorre no córtex
é a elaboração superior dos impulsos nervosos aferentes,
oriundos das células dos órgãos dos sentidos.
Ora, esses impulsos nervosos passam preliminarmente
pelos centros subcorticais, onde são codificados. Ao atingir
o córtex são transformados, inicialmente, em sensações
simples que são, em seguida, submetidas aos complexos
mecanismos de formação das percepções. Aí entram em
ação a memória, os afetos, os juízos, as representações
etc. num processo inteiramente automático. Assim, a percepção
mediúnica seguiria basicamente o mesmo padrão,
com a diferença de que os estímulos seriam de natureza
extrafísica e incidiriam diretamente nas estruturas

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


subcorticais, dispensando os órgãos dos sentidos, sendo
por esse motivo também chamada de percepção extra-sensorial.


Ora, se as percepções extra-sensoriais e mediúnicas
se processam pelas vias do inconsciente, é perfeitamente
natural o seu caráter simbólico ou mesmo metafórico.
Podem ocorrer também verdadeiras dramatizações,
no sentido descrito por Freud ao analisar determinados
sonhos. Assim, existe um estreito parentesco entre o mediunismo,
os sonhos, as alucinações patológicas, bem
como com todo o material mitológico, objeto de estudo da
Antropologia Cultural. Isso explicaria o fato de médiuns
diversos observarem quadros diversos numa mesma
sessão mediúnica, sem se esquecer, é claro, dos fenômenos
puramente imaginativos, ou eidéticos, também denominados
de personismo por Alexandre Aksakof.

Cerviño observa que, durante a comunicação mediúnica,
a qualquer momento uma emoção reprimida ou
um impulso instintivo, oriundos das profundezas do subcórtex,
podem desinibir uma área cortical, imiscuir-se
num lídimo fenômeno de percepção extra-sensorial, dramatizá-
lo, modificar-lhe a forma e/ou o conteúdo.

Segundo Osty, dois fatores identificam a vera mediunidade:
a dissociação funcional da atividade mental e

o sentido paranormal. Descartando a paranormalidade, a
Psicologia tende a estudar somente os efeitos dissociativos.
Psicologicamente falando, as reações dissociativas
são fruto de um mecanismo psicodinâmico, descoberto
por Freud, denominado repressão. A repressão pode ser
normal ou patológica. As formas patológicas de repressão
se caracterizam pela grande extensão do material reprimido,
geralmente se manifestando sob três formas clí-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


nicas: Amnésia, Personalidade dupla ou múltipla e o Sonambulismo
(caminhar dormindo, soníloquos etc).

Segundo Freud, a repressão é o mecanismo psicodinâmico
de defesa do ego mais importante, e destina-se
a distorcer a realidade para a manutenção da auto-imagem.
É um processo inconsciente e automático. Se o indivíduo
evita deliberadamente a lembrança de vivências,

o que ocorre é a supressão, que é deliberada e consciente.
De um modo geral, a supressão é normal e é utilizada
nas técnicas de meditação que se utilizam da abstração,
sem a qual o transe é quase impossível.
Segundo Malpass, os mecanismos de defesa ocorrem
quando o eu sente uma premência em negar ou falsear
a realidade devido a ameaças do mundo exterior,
pressões internas do id, autocondenações do superego
etc. Em sua obra "Psicopatologia da Vida Quotidiana",
Freud oferece uma profusão de casos ilustrativos.

O conhecimento desses mecanismos de defesa do
eu é imprescindível ao estudo do mediunismo, uma vez
que os impulsos, as idéias, as emoções e os desejos ou
motivações inconscientes podem interferir no processo
de comunicação, produzindo os fenômenos denominados
de personismo por Aksakof. Além da repressão, podem
interferir a racionalização, a projeção, a identificação, o
deslocamento, a generalização, a formação reativa, a intelectualização,
a regressão, a fuga da realidade etc.

O comportamento defensivo tem suas raízes nos
sentimentos de inadequação. Sempre que uma pessoa
se sente inadequada, torna-se ansiosa, supersensível a
críticas, com tendência ao retraimento, muito sensível ao
elogio e com tendência para depreciar os outros (Malpass).


Se uma pessoa imatura e emocionalmente instável

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


tenta obter uma comunicação mediúnica, concentra-se
nesse objetivo. Se a comunicação não vem, a imaginação
dessa privação tende a aumentar a ansiedade até
um nível insuportável pelo ego imaturo e narcisista, atingindo
então níveis de frustração dolorosos. Aí entram em
ação os mecanismos de defesa, orientados para o alívio
da tensão, de modo inconsciente: a pessoa perde momentaneamente
os limites da realidade e passa a alucinar
ou até mesmo a delirar, tomando a fantasia pela realidade
"transcendental", na qual suas demandas são satisfeitas
(modificado de McClelland). Esse é um dos possíveis
mecanismos de produção do personismo de Aksakof.
O mecanismo neurofisiológico proposto por Cervino
já foi citado logo acima.

Um estudo aprofundado do mediunismo seria mutilado
se se deixasse de lado o enfoque das ciências sociais
como a Sociologia e a Antropologia Cultural. Aliás, o
Espiritismo anglo-saxônico difere do latino em alguns
pontos, tal como, por exemplo, a reencarnação, segundo
Connan Doyle. Essa faceta será analisada mais adiante.

O comportamento interno ou velado, parente próximo
do mediunismo, como foi dito, tanto inconsciente
como consciente, é determinado pelas crenças, escala
de valores, expectativa e aspirações. Embora não se
possa medir esse comportamento diretamente, ele pode
ser inferido pelas reações exteriores, do mesmo modo
que o físico nuclear observa os efeitos de um eléctron
sem jamais tê-lo visto. Assim não é difícil obter uma impressão
diagnostica tanto da personalidade do médium
em transe como da possível entidade comunicante. De
acordo com o Espiritismo, a natureza corpórea dos Espíritos
depende de duas variáveis psicológicas: o temperamento
e o caráter. Os aspectos morais da personalidade,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


o padrão intelectual, sua escala de valores, seus afetos
predominantes e a conduta são aspectos capitais, não só
para o Espiritismo mas também para todas as religiões.
Maior desenvolvimento e amadurecimento da personalidade
implica, no plano psicológico, maior clareza
da consciência e, no plano espiritual, maior iluminação da
alma. Daí a expressão espírito de luz, em oposição a espírito
das trevas.

Como foi salientado, desde os primórdios do Espiritismo,
o íntimo parentesco entre a percepção mediúnica
e as alucinações, é de interesse a apresentação de um
resumo esquemático dos tipos de imagens mentais que
se podem apresentar à mente do médium, durante o transe.
Aliás, Cerviño ressaltou o caráter alucinatório das percepções
mediúnicas (op. cit.).

Quando ocorre um ato perceptivo normal, a imagem
do objeto se impõe por sua presença e pelo seu caráter
de objetividade. Nas imagens representativas, em geral,
o objeto não se acha presente, sendo a imagem projetada
no espaço subjetivo do indivíduo.

De acordo com Caio Prado Jr., as imagens representativas
"não constituem reproduções rigorosas, e são
mesmo, em regra, bastante afastadas do modelo sensível
que as produziu. Todavia, elas possuem certa independência
dos elementos sensoriais, conservando os
elementos mais importantes, do ponto de vista das necessidades
afetivas do indivíduo, abandonando as características
secundárias".

Para Pavlov, as sensações, as percepções e as
representações constituem o primeiro sistema de sinalização
da realidade objetiva. As representações, porém,
se formam em nível mais elevado da atividade nervosa
superior. Toda imagem perceptiva é basicamente uma

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


gnosia, embora existam dados individuais que implicam a
modificação dessas gnosias. Assim, a atitude perceptiva
(vigília, orientação, atenção, afetividade etc) , os esquemas
perceptivos de referência, as motivações (conscientes
ou não), os hábitos perceptivos (fatores sociais, culturais
etc), a significação do objeto para o individuo (cognitivo,
afetivo, simbólico etc), as possíveis defesas perceptivas
(supressão, escotomização etc.) e finalmente uma
possível rigidez perceptual (atitudes convencionais, preconceitos
etc.) interferem no processo perceptivo.

A Psicologia da Forma, ou Gestalt, ensina que existe
um isomorfismo entre os processos nervosos e os fatos
percebidos. Já para a Psicanálise, existe sempre, no
ato perceptivo, um investimento libidinal, mais ou menos
inconsciente. Problemas de personalidade conduzem a
deformações na elaboração sensorial, intelectual, imaginativa
ou afetiva dos dados. Essas distorções podem ser
diagnosticadas pelos testes projetivos, entre os quais se
destaca o "Teste de Rorschach", do qual Jung foi precursor.


A Psicopatologia se interessa particularmente pelos
seguintes tipos de imagem:

Imagem perceptiva, que é o resultado mental da estimulação
de um órgão sensorial pela presença de seu
excitante específico, passando os impulsos nervosos pelas
fibras aferentes e centros corticais correspondentes
(Mira Y Lopes). Tem as seguintes características: nitidez
sensorial, corporeidade, estabilidade, projeção para o exterior,
ininfluenciabilidade pela vontade; possui uma irresistível
força de convicção de realidade objetiva (idem).

Imagem representativa, evocada a partir dos engramas
mnêmicos arquivados no cérebro. É imprecisa, incorpórea,
instável, projetada no espaço subjetivo e habi-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


tualmente sofre influência da vontade. Pode ser do tipo
visual, auditivo, gustativo, olfativo, tátil, cinético e cenestésico.


Imagem fantástica ou fantasia, resulta da atividade
imaginativa, representando algo novo, não correspondendo
à experiência sensorial concreta. Esse tipo é parente
próximo das imagens mediúnicas e pode ser utilizado terapéuticamente
pelas escolas junguiana (Técnica da Imaginação
Ativa) e R. Desoile (Sonho acordado), entre outras.
A escola junguiana faz descrições tão impressionantes
dessas imagens, as quais conseguem autonomia em
relação ao eu do indivíduo, que é bastante provável que
algumas delas sejam fruto de percepções mediúnicas
das realidades do mundo espiritual, embora Jung tenha
utilizado termos como inconsciente coletivo, arquétipos
etc. para justificá-las. Jung conversava com uma imagem
dessas a que denominou Filemon. Sócrates também dialogava
com o seu Daimon particular.

Imagem onírica, própria do sono, constituiu-se à
base de representações e imagens fantásticas. Dotadas
de grande plasticidade, instabilidade e projeção no espaço
subjetivo, geralmente ilógicas e sem relação temporal
e espacial. Segundo Freud são submetidas a mecanismos
destinados a camuflar seu real significado, tais como
condensação, deslocamento, dramatização e simbolização.
Jung discorda dessa interpretação "pejorativa" de
Freud. A Teoria Espírita ensina que existem alguns sonhos
que são frutos da atividade da alma, semiliberta da
matéria, no plano espiritual. Tais sonhos em geral são
plenos de conhecimento e, às vezes, premonitórios, ou
clarividentes.

Pareidolias são imagens tomadas de empréstimo da
realidade objetiva, mas com uma atribuição imaginativa

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO

18 6


adicional, sem implicar alteração do juízo crítico da realidade.
São comuns nos delírios febris, sendo aqui, consideradas
patológicas.

Imagens eídéticas, ou intuitivas, também são, tais
como a imaginação, parentes bastante próximas da percepção
mediúnica, podendo confundir-se. O eidetismo é
bastante comum na primeira infância, quando a criança
possui amiguinhos ou brinquedos imaginários que, para
elas, são reais. Geralmente desaparecem com a idade,
mas por motivos os mais diversos, até mesmo hereditários,
podem permanecer ativas nas personalidades adultas,
mais sensíveis, com dotes artísticos ou mediúnicos.
Um exemplo notável é o de Jung. Entre os artistas, Beethoven,
Schumann, Rembrandt, entre outros, possuíam
faculdade eidética plenamente desenvolvida.

Ilusão é uma percepção deformada de um objeto
real e presente. Em determinadas situações, como nos
estados emocionais intensos, na desatenção etc., é comum
a ocorrência de ilusões sensoriais. Diz o ditado popular
que não há lobos pequenos, pois o medo intervém
na apreciação das dimensões do animal perigoso. Alguns
doentes mentais vêem nas lâmpadas do teto olhos ou
aparelhos que emitem raios elétricos etc. (Paim). Outro
paciente, ouve, nos ruídos dos vizinhos, injúrias e ameaças
dirigidas à sua pessoa. Deve-se fazer o diagnóstico
diferencial com as percepções delirantes de alguns esquizofrênicos
paranóides.

Alucinações são distúrbios senso-perceptivos quase
sempre de natureza patológica, com raras exceções, tais
como as alucinações hipnagógicas e hipnopômpicas, relacionadas
ao adormecimento e ao acordar. Se os fenômenos
mediúnicos fossem considerados de natureza patológica,
o número de doentes mentais seria incrementa-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


do em progressão geométrica. Daí a importância do bom
senso na delimitação entre o normal e o patológico.

As alucinações já eram conhecidas desde a Antiguidade,
e Asclepíades afirmava que elas eram reais para
os pacientes. O termo provém do latim "aluo" que significa
ter o espírito extraviado. Entre os povos primitivos, dizer
que se perdeu a alma é sinônimo de doença mental.
Esquirol definiu, erradamente, as alucinações como sendo
uma "percepção sem objeto". Os fenômenos alucinatórios
não são fruto de percepções e, para os pacientes,
representam um objeto real. A Posição Espírita acrescenta
aqui a hipótese das percepções extra-sensoriais, como
já foi dito, para explicar uma minoria de casos.

Baillarger definiu as alucinações como sendo fruto
de uma estimulação interna, de mecanismo cerebral, e
não periférico, produzidas de dentro para fora. Secundariamente
são projetadas no mundo objetivo e adquirem
critérios de sensorialidade suficientes para serem aceitas
pelo juízo da realidade como provenientes de um objeto
real. Quando fruto de desordens mentais, são em geral
sinais sugestivos de quadros de natureza psicótica.

Segundo Cerviño (op. cit.) e André Luiz (idem), a
percepção mediúnica é também de natureza intracerebral,
mais especificamente subcortical, onde existiriam os
denominados "psicorreceptores", que captariam os estímulos
de natureza extrafísica e, posteriormente, transmitidos
ao córtex cerebral, onde seriam percebidos de uma
forma alucinatória. André Luiz ensina que, para que se
processe o mecanismo mediúnico, é necessária uma certa
dissociação entre o corpo físico e o psicossoma ou perispírito,
ou corpo espiritual. A Psiquiatria mecanicista
tende a classificar toda percepção extra-sensorial como
sendo patológica. Contudo, somente uma avaliação gio-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


bal das condições psíquicas da personalidade individual
poderá confirmar, ou infirmar, a suposição de patologia
de qualquer espécie, subjacente a essa classe de fenômenos.
Mais adiante será visto que o critério de patologia
mental está longe de ser consistente e que existem divergências
fundamentais entre as diferentes correntes, mesmo
dentro da ciência oficial. Devem ser levados em consideração
critérios biológicos, psicológicos, antropológicos,
sociológicos, culturais e até mesmo políticos. Existem
países em que dissidência política é considerada sintoma
de patologia mental. Esses critérios variam no tempo
e no espaço, sendo, em geral, pouco objetivos.

Cerviño pergunta: "— Até que ponto as alucinações
dos santos, profetas ou médiuns coincidem com uma realidade
extra-sensível?" "Que crédito podemos dar à interpretação
figurativa que os visionários de todos os tempos
nos dão de um mundo que escapa das limitações sensoriais?"
"Até onde a percepção da realidade física tem um
caráter alucinatório?" (op. cit.). Já se comprovou que, se
a organização do sistema nervoso fosse outra, outro seria
o aspecto do universo percebido.

Segundo Pavlov, os cães vêem o mundo em nuanças
de preto e branco. Em relação a eles, somos todos
alucinados, vivendo num estranho sonho colorido. Cervino
afirma que o mecanismo da projeção, que intervém
igualmente nas alucinações patológicas e nas imagens
mediúnicas, integra, igualmente, a percepção normal.

Penfield, estimulando eletricamente o córtex de pacientes
prestes a se submeterem a intervenções neurocirúrgicas,
produziu vivências alucinatórias clássicas, no
sentido de Baillarger, do tipo psicossensoriais. Existem
também as alucinações induzidas pelas substâncias psicodislépticas,
que serão discutidas mais adiante.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Assim, a existência de um componente alucinatório
na percepção real concede, à "experiência visionária',
certa hierarquia como fonte de conhecimento (Cerviño).
Segundo o Espiritismo, existem, sem dúvida alguma,
imagens que correspondem a uma realidade não-física.
Claro está que essa hipótese não exclui a existência de
casos mórbidos, cuja característica principal é a deformação
da realidade objetiva, quer natural quer sobrenatural,
sob uma roupagem simbólica, segundo o dinamismo próprio
da personalidade do doente. Daí o termo usual de
alienação mental, ou ruptura, ou clivagem ("splitting").
Dostoievski captou essa característica fundamental da
patologia mental, de modo tão genial, que o nome do
protagonista da sua obra "Crime e Castigo" é Raskolnikof,
que, em russo, significa fendido.

Em Psicopatologia existem grandes obstáculos em
se rotular todas as alucinações como sendo de fundo
mórbido. O maior deles, segundo Henri Ey, é a existência
de fenômenos alucinatórios nos indivíduos aparentemente
sãos, psiquicamente falando. Outra dificuldade reside
na impossibilidade de se fazer uma abstração do contexto
psíquico da pessoa que alucina, a não ser pela artificial
distinção entre as alucinações psicossensoriais e as psíquicas.
Isso porque já foi demonstrado que elas não têm
estrutura independente da personalidade do indivíduo
que alucina (idem).

Bozzano cita o caso de que "certa mãe vê voar, em
deserta planura, um passarinho, do qual caem as asas,
e, súbito, pouco depois lhe morre o filho". Lombroso cita

o caso de uma "pessoa que vê um esquife na casa de um
parente, e este, também, pouco depois falece". As mentalidades
positivistas não vêem nesses exemplos nada
mais que pura casualidade, mas estudos estatísticos con-
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


seguiram demonstrar um desvio estatístico significativo, o
que descarta a possibilidade de se desconsiderar a hipótese
de uma relação desconhecida, pelo menos matematicamente
falando. A dificuldade é a mesma dos físicos
em determinar quais as possibilidades da localização de
um eléctron num determinado ponto, num dado instante.
Daí o famoso Princípio da Indeterminação de Heisemberg.


De um modo geral, o médium entra em contato com
uma realidade extra-sensível e a descreve em linguagem
alucinatória, mais ou menos exuberante, mais ou menos
simbólica, conforme a intensidade e a natureza de seu
temperamento artístico (Cerviño). A casuística é vastíssima,
e existe uma literatura extensa sobre o tema.

Bozzano cita "comovente episódio de uma menina
que, nos seus três últimos dias de vida, vê um irmãozinho
defunto e outras entidades espirituais, e com eles conversa
ao mesmo tempo que se lhe apresentam passageiras
visões do Além".

Richet cita o caso de "Ray, com idade de 2 anos e 7
meses, vê seu irmãozinho que acabara de morrer e que o
chamava. — Mamãe, disse ele, o irmãozinho sorriu para
mim, ele quer levar-me; o pequeno Ray morreu dois meses
depois".

Tais exemplos são aparentemente banais, e o psicólogo
irá supor, certamente, na ocorrência de puro eidetismo,
mas existe aqui um aspecto premonitório que suscita
sempre a hipótese da ocorrência de mediunismo, associado
ao eidetismo nas crianças citadas. As relações
entre eidetismo, mediunismo e arte constituem belo tema
para um estudo aprofundado (Cerviño).

É de interesse enviar o leitor aos grandes clássicos
da literatura universal, tanto espiritualistas como não, tais

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


como Platão, São Paulo, Santa Teresa de Ávila, São

João da Cruz, São Tomás de Aquino, Santo Inácio de

Loyola, São Francisco de Assis, Anie Besant, M. Blavats


ky, Proust, Goethe, Dante, Beethoven, além da literatura

Metapsíquica, Espírita, Parapsicológica etc.

0 grande sábio e psícólogo norte-americano William
James revela que "não pode haver dúvida de que, na verdade,
uma vida religiosa, levada de modo que exclua
tudo o mais, tende a tornar a pessoa excepcional e excêntrica",
e que os "gênios na esfera religiosa (...) têm
mostrado, não raro, sintomas de instabilidade nervosa
(...) exaltada instabilidade emocional (...) e sofrido de melancolia
(...) sujeitos como estavam a obsessões e idéias
fixas, transes, vozes, visões e toda sorte de peculiaridades
classificadas, de ordinário, como patológicas" (op.
cit.).

O autor citado observou que as pessoas comuns
tendem a anular o valor espiritual das vivências de caráter
religioso, fazendo racionalizações, tais como: "Alfredo
acredita na imortalidade porque seu temperamento é muito
emocional"; "A melancolia de Guilherme a respeito do
Universo é fruto da má digestão"; "O prazer que Elisa encontra
na igreja é um sintoma de sua constituição histérica".
Outros dizem: "as macerações dos santos e a devoção
dos missionários são apenas manifestações de uma
perversão do instinto paterno de auto-sacrifício" ou "para
a monja histérica, Cristo é apenas o substituto imaginário
de um objeto mais terreno de afeição" etc. (idem).

O materialismo médico dá cabo de São Paulo, explicando
sua visão na estrada de Damasco como uma descarga
violenta do córtex occipital, visto ter sido ele epiléptico.
Tacha Santa Teresa de histérica, São Francisco de
Assis vítima de uma degenerescência hereditária etc. À

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


luz da Fenomenologia, por exemplo, Cristo seria um caso
provável de Esquizofrenia paranóide, com delírio de grandeza
mística.

William James declara que argumentar com a causação
orgânica de um estado de espírito religioso para
refutar-lhe a pretensão de ter um valor espiritual superior
é totalmente ilógico e arbitrário. Essas críticas empedernidas
não serão mais consideradas neste trabalho, uma
vez que o método científico foi liberado de suas amarras
mais cruentas graças aos avanços da Física das partículas
subatômicas.

As explicações pretensiosas de feição psicopatológica,
psicanalítica, neurológica etc. não têm aqui grande
serventia, uma vez que nomear ou rotular um sintoma
não implica a elucidação do seu mecanismo psicofisiológico.
É fato notório, como já foi citado, que, de maneira
geral, os psiquiatras não entendem nada do que se passa
na mente do seus clientes. Em se tratando de vivências
de feição religiosa ou paranormal, o grau de conhecimento
tende a zero, a menos que tenham eles próprios
vivências que possam servir como termo de comparação.
Caso contrário, em que se apoiar? Tudo acaba sendo incluído
na vala comum do bizarro, quando não patológico.
Para tal não falta terminologia bombástica e bastante
pomposa, quase impenetrável por facultativos de outras
especialidades. Claro está que passa longe a idéia de rejeitar
aqui o enorme conjunto de conhecimentos adquirido
pelas ciências do comportamento. A crítica é dirigida apenas
às interpretações unilaterais, com prejuízos intelectuais
e afetivos. O autor já pôde observar a raiva que certos
especialistas experimentam diante da mera suposição
de fenomenologia parapsicológica por parte de algum colega.


PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


William James assinala que, para a avaliação dessa
categoria de fenômenos, a luminosidade imediata, a razoabilidade
filosófica e o valor moral são os critérios mais
legítimos. A Posição Espírita vai além, ao propor métodos
experimentais que possibilitem a constatação empírica
dessa classe de fenômenos.

William James possui o mérito da introdução do método
pragmático no estudo dos fenômenos mentais: "Pelos
frutos os conhecereis, não pelas raízes (...) nas ciências
naturais e nas artes industriais jamais ocorre a alguém
tentar refutar opiniões pondo a nu a constituição
neurótica do autor. As opiniões aqui, são invariavelmente
testadas pela lógica e pela experiência, seja qual for o
tipo neurológico de quem as esposa. Não deveria ser diferente,
em se tratando de opiniões religiosas." E acrescenta:
"os materialistas médicos, portanto, são apenas
outros tantos dogmatistas retardatários, que torcem os argumentos
dos predecessores utilizando o critério da origem
de modo destrutivo, em vez de fazê-lo de modo
construtivo".

Quem se der ao trabalho de estudar minuciosamente
a extensa obra de Santa Teresa de Ávila, verá que
suas vivências diferem em gênero, número e grau daquelas
descritas pelos pacientes com ideação delirante-alucinatória.
Eis um exemplo, citado por William James:

"Como o sono imperfeito que, em vez de dar mais
força à cabeça, a deixa ainda mais exausta, o resultado
de meras operações da imaginação é o enfraquecimento
da alma. Em lugar de nutrição e energia, ela colhe tão-só
lassidão e repugnância; ao passo que uma visão celeste
autêntica lhe proporciona uma messe de inefáveis riquezas
espirituais e uma admirável renovação das forças do
corpo. Opus essas razões aos que tão freqüentemente

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


acusaram minhas visões de serem obra do inimigo do gênero
humano ou desporto da minha imaginação"... "Mostrei-
lhes as jóias que a mão divina deixara comigo: minhas
verdadeiras disposições. Todos quantos me conheceram
perceberam que eu estava mudada; meu confessor
foi testemunha disso; a melhoria, palpável em todos
os sentidos, longe de estar oculta, era bem brilhantemente
evidente para todos os homens (...)."

Uma análise dos escritos da Santa revela um estilo
do mais alto valor literário. Tanto a sintaxe quanto a semântica
são perfeitas. Os conceitos são precisos, o discurso
coerente, o raciocínio lógico, as relações conceptuais
estão preservadas, e parece haver uma boa modulação
afetiva. O critério mais importante, em saúde mental,
o pragmatismo útil, não está comprometido; pelo contrário,
a Santa comprovou, com a reforma da ordem dos
Carmelitas, criando os Descalços, fundando dezenas de
mosteiros e conventos, sua extraordinária vitalidade e
sentido de responsabilidade social.

Todo psicoterapeuta sabe bem acerca das dificuldades
em reinserir seus clientes no mercado de trabalho. É
notória a abulia, a lassidão, a ociosidade e a desmotivação,
além do estreitamento do horizonte existencial tanto
dos pacientes internos quanto ambulatoriais.

Em sua autobiografia, Annie Besant diz o seguinte:
"muitas pessoas nutrem bons sentimentos para com qualquer
boa causa, mas poucas se esforçam por ajudá-la, e
muito poucas arriscarão alguma coisa para apoiá-la"
Quem se der ao trabalho de ler atentamente "O Livro da
Vida" de Santa Teresa poderá tirar suas próprias conclusões.


Será apresentado a seguir um caso clínico, igualmente
famoso, para uma análise comparativa entre per-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


sonalidade mediúnica e patológica. Trata-se do famoso
caso Schreber — estudado por Freud —, o qual era presidente
da Corte Superior Regional de Dresden. Era advogado
dotado de inteligência, habilidade e posição social
superiores, quando se tornou vítima de uma doença
mental: concebeu a idéia de que, através da intermediação
de potentes raios vindos de Deus, estava se transformando
numa mulher e, assim, iria dar nascimento a uma
forma de vida mais gloriosa do que a que povoava a Alemanha
(John Nemiah). Schreber achava que o seu antigo
neurologista Flechsig, juntamente com outros demônios
do mal, tentava apossar-se dele, a fim de forçá-lo a transformar-
se numa prostituta, para satisfazer a luxúria de
uma legião de espíritos infernais. Com isso escreveu sua
autobiografia "Memoirs of my Nervous lllness", porque
pensava que a profissão médica estava interessada no
curioso fenômeno biológico de um homem que se transformava
numa mulher:

"Durante os meus primeiros meses aqui os milagres
nos meus olhos realizavam-se por 'pequenos homens',
bastante iguais aos que mencionei quando descrevi o milagre
dirigido contra minha coluna dorsal. Esses 'homenzinhos'
eram um dos mais notáveis e, mesmo para mim,
um dos mais misteriosos fenômenos; mas não tenho a
menor dúvida quanto à realidade objetiva desses acontecimentos,
porquanto vi esses 'homenzinhos' inúmeras vezes
com os meus próprios olhos e ouvi suas vozes. O extraordinário
sobre o caso era que os espíritos ou os nervos
isolados podiam, sob certas condições, tendo em vista
objetivos particulares, tomar a forma de minúsculas figuras
humanas, como mencionado anteriormente, de uns
poucos milímetros apenas e, como tais, fomentavam discórdias
em todas as partes do meu corpo, tanto interna-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mente quanto na superfície. Os que se ocupavam com o
abrir e fechar dos olhos permaneciam acima dos olhos,
nas sobrancelhas e, daí, puxavam os cílios para cima e
para baixo, a seu bel-prazer, com filamentos finos como
teias de aranha. Aqui, também, os encarregados eram
habitualmente um 'Flechsig pequenino' e um 'pequeno V.
W.' e algumas vezes, ainda mais um 'homenzinho' que
saíra da alma de Daniel Futchtegott Flechsig que, por
esse tempo, ainda existia. Toda vez que eu mostrava sinais
de que me achava indisposto a permitir que as minhas
pálpebras fossem puxadas para baixo e efetivamente
me opunha a isto, o 'homenzinho' mostrava-se agastado
e expressava este desgosto chamando-me de 'miserável';
se eu os afastava dos meus olhos com uma esponja,
o ato era considerado pelos raios como uma espécie
de crime contra a dádiva dos milagres de Deus. Incidentalmente,
o ato de afastá-los tinha sempre apenas um
efeito temporário, porquanto os 'homenzinhos' reuniam-se
quase que continuamente na minha cabeça, em grande
número. Eram chamados 'diabinhos'. Literalmente davam
voltas na minha cabeça, fuçando com curiosidade, a fim
de se cientificarem se novas destruições haviam ocorrido
na minha cabeça pelos milagres. De uma certa maneira,
chegavam até a compartilhar das minhas refeições, servindo-
se a si mesmos de um bocado, embora naturalmente
de um pequeno bocado, do alimento que eu comia;
isso fazia com que parecessem temporariamente inchados,
mas também menos ativos e menos destrutivos
nas suas intenções. Alguns dos 'diabinhos' participavam
de um milagre que se realizava freqüentemente contra a
minha cabeça e do qual agora direi um pouco mais. Esse
talvez fosse o mais abominável de todos os milagres —
depois do milagre da compressão do peito — a expres-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


são usada para mencioná-lo, se me recordo bem, era
'máquina-de-compressão-da-cabeça'. Em virtude de muitas
incidências de raios etc , aparecera na minha caixa
craniana uma profunda fissura ou rasgão, mais ou menos
na área mediana, que provavelmente não era visível da
parte externa, mas visível da parte interna. Os 'diabinhos'
postavam-se em cada um dos lados dessa fissura e comprimiam
minha cabeça como se fosse um torno, fazendo
girar uma espécie de parafuso, fazendo com que minha
cabeça, temporariamente, assumisse uma forma alongada,
quase que de uma pêra. Produzia um efeito extremamente
ameaçador, particularmente porque era acompanhada
de uma dor intensa."

Não é preciso ser especialista para perceber que
Schreber apresentava grave distúrbio mental, de natureza
psicótica. Sua ideação é francamente delirante, com
pensamento paralógico, eivado de neologismos, idéias
de auto-referência, alucinações visuais, auditivas, cenestésicas,
com perda do juízo crítico da realidade e do estado
mórbido. O humor básico pode ser classificado como
sendo delirante. O quadro é francamente paranóide.

Freud interpretou a forma de delírio desenvolvida
por Schreber como psicogênico, sendo pois uma forma
de delírio secundário. É possível que outros especialistas
não concordem com essa interpretação de Freud, que
não era psiquiatra e tinha pouca experiência com psicóticos.
Além do mais, ele não examinou Schreber pessoalmente.
Para Freud o delírio em questão é uma forma extrema
de defesa contra a emergência de impulsos homossexuais,
que são projetados no exterior, sendo transformados
no sentimento oposto, isto é, ódio, daí a feição
persecutória. O objeto principal do amor homossexual de
Schreber era provavelmente o neurologista Flechsig, pois

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ocupava o centro do quadro persecutório. A partir desse
caso, Freud concluiu que todos os casos paranóides, Paranóia,
Esquizofrenia Paranóide, Parafrenia etc. seriam
fruto de impulsos homossexuais latentes. Essa tendência
de generalizar, a partir de casos isolados, era talvez a
maior deficiência do pensamento de Freud, em que pese
à sua inegável genialidade.

Em Psicopatologia, os delírios são descritos como
sendo uma alteração dos juízos. Do ponto de vista da lógica
formal, a peculiaridade dos juízos é ser uma forma
de pensamento enunciativo, asseverativo. É a firmação
ou a negação de uma relação entre dois conceitos, entre
um sujeito e um predicado, entre uma percepção e um
conceito etc.

O juízo pode expressar a verdade ou o erro, conforme
sua afirmação corresponda, ou não, à realidade. Por
essa razão, o único critério de veracidade dos juízos é a
sua consonância com a realidade objetiva. De uma maneira
geral, alguns especialistas tendem, erradamente, a
classificar, como sendo patológicos, alguns juízos que
estejam em desacordo com suas crenças, materialistas,
por exemplo. Essa atitude desequilibrada, inconsciente,
de se julgar um paradigma da normalidade, foi denominada
por Jung como inflação (do ego).

Uma outra fonte de erro diagnóstico, por parte dos
psicopatologistas, é a tendência a dar por encerrado o
caso, assim que se consegue rotular os fenômenos com
um nome técnico, apesar de não se ter a menor idéia daquilo
que realmente se passa na mente do paciente.

Para Kraepelin, as idéias delirantes são "morbidamente
falseadas e não são acessíveis à correção por
meio de argumentos". Bumke as define como sendo fruto
de "um erro morbidamente originado e incorrigível". Ge-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ralmente possuem uma convicção extraordinária, uma
certeza notável, são impermeáveis à refutação lógica e à
experiência objetiva (teste da realidade). Possuem também
uma conspícua inverossimilhança de conteúdo, são
bizarras, extravagantes e ilógicas. Geralmente produzem,
no observador, uma impressão de estranheza.

O contrário pode ser dito a respeito das experiências
transcendentais. Possuem um caráter numinoso, sagrado,
contagioso, dando um sentimento de alegria, felicidade,
paz, harmonia com a vida e com as pessoas, mesmo
as supostamente inimigas, leveza e claridade interior.
Mais do que a análise cognitiva do conteúdo do pensamento
enunciado é a penetração empática que dá as bases
do diagnóstico diferencial.

À guisa de comparação com o estado mental de
Schreber, será apresentado, a seguir, uma descrição da
perita das peritas na descrição dos estados elevados de
consciência, Santa Teresa de Ávila, agraciada pelo Papa
Paulo VI com o título inédito de "Doutora Universal da
Igreja".

O elemento mais importante no diagnóstico é o humor.
O humor delirante é angustioso, opressivo, rancoroso,
vingativo, suspicaz, susceptível e altamente distorcido
da realidade, pelo mecanismo da projeção. A atmosfera
psíquica é de alienação mental. O humor do extático, ao
vivenciar as realidades dos elevados estados da alma e,
por extensão, dos elevados planos espirituais é o oposto:
alegria, amor universal, encantamento, desprendimento,
abnegação, esperança, beatitude, grande claridade dos
processos mentais etc.

Outro elemento importante é o comprometimento
com as atividades produtivas e com a realidade. Enquanto
que a personalidade delirante é dereísta, ensimesma-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


da, abúlica e apragmática, a personalidade individuada,
para se utilizar um termo junguiano, é extraordinariamente
produtiva, pragmática, desprendida, caridosa, com extremado
espírito de renuncia e auto-sacrificio.

Outra distinção fundamental é a relação entre o eu
e os processos inconscientes. Nas pessoas normais e
saudáveis, as portas do inconsciente estão mais ou menos
fechadas, e apenas indiretamente o material inconsciente
irrompe na consciência, através dos sonhos, dos
atos falhos, das produções artísticas etc.

Nas personalidades psicóticas, ao contrário, o material
inconsciente irrompe na consciência com violência e
com uma irresistível compulsão no sentir, no pensar e no
agir, subjugando completamente o eu, que atribui o material,
erradamente, como proveniente da realidade exterior.
O complexo do ego se fragmenta e o contato com a realidade
fica gravemente comprometido, quando não impossibilitado.
Dissolvem-se os limites entre as próprias fantasias,
impulsos, desejos e os objetos exteriores. Devido a
essa ruptura fundamental, Bleuler propôs o termo esquizofrenia,
de "schizo" = fendido e "phrenos" = espírito.

O oposto pode ser observado nas personalidades
mediúnicas equilibradas, extáticas ou paranormais, com
elevado grau de amadurecimento ou em avançado estágio
de individualização, ou com grande evolução espiritual,
conforme terminologia espírita. Possuem uma maior
ou menor abertura das instâncias do inconsciente, mas o
ego é suficientemente forte para integrar e assimilar o
material, solucionar os conflitos, traumas, controlar os impulsos
menos construtivos etc. Esse processo é simbolizado
pelo mito de Teseu no labirinto a enfrentar o Minotauro,
com o auxílio do fio de Ariadne, vencendo-o e assimilando
a energia psíquica das profundezas.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


A luta aqui não é de caráter destrutivo, e as tendências
regressivas, simbolizadas pelo Minotauro não devem
ser alijadas, nem reprimidas, nem rechaçadas, mas dissolvidas
e assimiladas como energia psíquica adicional
ao ego, pelo mecanismo da sublimação.

Ao contrário de Freud, que apresentou uma visão
pejorativa do inconsciente, Jung descreve a ocorrência
de inesgotável fonte de sabedoria, amor e iluminação, no
centro da alma. Com isso concorda a Posição Espírita,
ao ensinar que a alma é de natureza divina.

Quer do inconsciente do indivíduo, quer dos planos
superiores da espiritualidade, esse material numinoso encontra
passagem via subcórtex e daí, atingindo o eu, é
elaborado em produções artísticas, mediúnicas, científicas
ou laborativas. Eis alguns exemplos descritos por
Santa Teresa:

"Estando, pois, uma vez sozinha, sem ter pessoa
em quem descansar, não podia rezar, nem ler, estava
como uma pessoa espantada de tanta tribulação e temor
de que o demônio [ou Espíritos maus, em terminologia
espírita] me podia enganar, toda alvorotada e aflita sem
saber que fazer de mim. Nesta aflição me vi algumas e
até muitas vezes, embora não me pareça que nenhuma
em tanto extremo como esta. Estive assim quatro ou cinco
horas, em que não houve para mim consolação alguma
nem do Céu nem da Terra, senão me deixou o Senhor
padecer temendo mil perigos (...)

Estando eu, pois, nesta grande aflição ainda não
tendo então começado a ter nenhuma visão — só estas
palavras bastaram para ma tirar e aquietar-me de todo:
'Não tenhas medo, filha, sou Eu e não te desampararei,
não temas' (...)

E eis-me aqui, só com estas palavras, sossegada,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


com fortaleza, com ânimo, com segurança, com uma
quietude e luz que, num momento vi minha alma feita outra
e parece-me que sustentaria contra todo o mundo que
aquela fala era de Deus. Oh, que bom Deus" ("Obras
Completas", Ed. Carmelo, 1970, págs. 207-208).

Mais adiante, "estando um dia do glorioso São Pedro
em oração, vi ao pé de mim ou senti, para melhor dizer,
pois nem com os olhos do corpo nem com os da
alma não vi nada, mas parecia-me que Cristo estava ali
mesmo junto ao pé de mim e via ser Ele que me falava,
segundo me parece. Eu, como estava ignorantíssima que
pudesse haver semelhante visão, deu-me um grande temor
a princípio (...) Parecia-me andar sempre a meu lado
Jesus-Cristo e, como não era visão imaginária, não via
sob que forma, mas sentia muito claramente estar Ele
sempre a meu lado direito e que era testemunha de tudo
quanto eu fazia" (idem, pág. 217).

"(...) estando um dia em oração, quis o Senhor mostrar-
me só as mãos com tão grandíssima formosura que
não o poderia eu encarecer" (pág. 228) (...) "Poucos dias
depois vi também aquele divino rosto que de todo, me
parece, me deixou absorta (...) Não podia entender porque
era que o Senhor se mostrava assim pouco a pouco
(...) Depois compreendi que o Senhor me ia levando conforme
a minha fraqueza natural" (idem).

"Um dia de São Paulo, estando à Missa, se me representou
toda esta Humanidade sacratíssima, como se pinta
ressuscitado, com tanta formosura e majestade (...)
Esta visão, embora seja imaginária, nunca a vi com os
olhos corporais, nem a nenhuma, senão com os olhos da
alma. Dizem, os que sabem melhor do que eu, ser mais
perfeita a visão passada do que esta, e esta muito mais
do que as que se vêem com os olhos corporais. Estas, di-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


zem, que são as mais baixas e onde o demônio mais ilusões
pode fazer (...) E também me acontecia, depois de
passada a visão — isto era logo em seguida —, pensar
eu também que seria ilusão minha e afligia-me de tê-lo
dito ao confessor, julgando que o teria enganado" (idem).

Como conseqüência das suas vivências, a Santa
experimentou: "Fartas afrontas e trabalhos passei em
dizê-lo e fartos temores e fartas perseguições. Tão certo
lhes parecia que eu tinha demônio que algumas pessoas
me queriam exorcizar" (idem, pág. 240).

A Santa teve então uma prova material das suas visões:


"Uma vez, tendo eu a cruz na mão, que a trazia
num rosário, pegou nela o Senhor com a Sua e quando
ma tornou a dar tinha quatro pedras grandes, muito mais
preciosas que diamantes e isto sem comparação. É que
nem quase mesmo as pode haver como as que se vê de
sobrenatural, pois o diamante parecia coisa contrafeita e
imperfeita à vista das pedras preciosas que lá se vêem.
Disse-me o Senhor que assim a veria de aí em diante, e
assim foi que não via a madeira de que era feita, senão
estas pedras, mas isto a ninguém acontecia senão a
mim" (idem, pág. 243).

Descreve na página 246 a visão mais famosa, que
mereceu uma estátua, em mármore, exposta na galeria
do Vaticano:

"Via um anjo ao pé de mim, para o lado esquerdo,
em forma corporal, o que não costumo ver senão em maravilha.
Ainda que por muitas vezes se me representam
anjos, é sem os ver, senão como na visão passada, que
disse primeiro. Nesta visão quis o Senhor que o visse assim:
não era grande, mas pequeno, formoso em extremo,

o rosto tão incendido que parecia dos mais sublimes que
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


parecem todos se abrasam. Devem ser os que chamam
Querubins, que os nomes não mos dizem, mas bem vejo
que no Céu há tanta diferença duns anjos a outros e destes
a outros que o não saberia dizer. Via-lhe nas mãos
um dardo de oiro comprido e no fim da ponta de ferro me
parecia que tinha um pouco de fogo. Parecia-me meter-me
este pelo coração algumas vezes e que me chegava às
entranhas. Ao tirá-lo dir-se-ia que as levava consigo, e
me deixava toda abrasada em grande amor de Deus." E
assim, sucessivamente, suas confissões perfazem 1.407
páginas do mais puro estilo literário.

Convém discutir aqui o evidente simbolismo sexual
da última visão descrita. O autor não engrossa a fileira
dos iconoclastas, mas as experiências religiosas são tão
naturais como os fenômenos psicológicos corriqueiros,
segundo o Espiritismo.

Da perspectiva da Psiquiatria mecanicista, as vivências
acima descritas bem que poderiam cair na vala comum
daquelas descritas anteriormente, isto é, os delírios
patológicos do infeliz Schreber. Quando muito, poderia
ser encarada como raptos de natureza histérica, com patoplastia
católica. Um dado favorável a essa interpretação
poderia ser o modo de vida antinatural das monjas enclausuradas,
o sistema mais radical de repressão dos impulsos
biológicos que se conhece. Parece ser superado
apenas pelos monges emparedados do Oriente. Outro
ponto também suspeito, além das alucinações, é claro,
seria o intenso colorido emocional da Santa, embora a
excitabilidade histérica seja mais do tipo fogo-de-palha, o
que não é o caso presente, já que a Santa passava dias
"abrasada".

Está claro que a ninguém é lícito emitir qualquer juízo
sobre o material descrito sem levar em consideração o

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


contexto global da personalidade da Santa, sua história
pregressa, suas crenças, seus valores, seus ideais, seu
temperamento, seu estado físico, seu caráter, sua educação,
a cultura medieval católica onde estava inserida, seu
padrão genético, sua história familiar etc.

As personalidades histéricas são caracterizadas
pela evidente imaturidade psicossexual e emocional, infantilidade,
instabilidade, mudanças abruptas do estado
de ânimo, manipulação do ambiente, teatralidade, podendo
mesmo desenvolver traços mitômanos e chantagistas.
Como tal são, via de regra, dependentes, pouco produtivas,
hipobúlicas, incapazes de persistir na liderança de
causas coletivas.

Não parece serem essas as características da personalidade
da Santa, que foi uma das personalidades
mais criativas e reformadoras de toda a história do catolicismo.
Sua vida foi, em todos os sentidos, do tipo heróico.


Sua personalidade, através dos séculos, agiganta-se
a partir das brumas da Idade Média, tanto do ponto de
vista filosófico como psicológico, religioso e social. Inteligência
genial, grande escritora, perita das peritas, segundo
William James (op. cit.), consumada psicóloga, mística
grandiosa. A Igreja lhe fez justiça, quatro séculos após a
sua morte, conferindo-lhe o título de Doutora Universal, a
primeira a receber essa honraria em dois mil anos de catolicismo.


Santa Teresa foi, certamente, uma extraordinária
personalidade mediúnica, protagonista dos mais extraordinários
fenômenos paranormais. A personalidade de
Schreber contrasta com a dela de forma iniludível. A forma
e o conteúdo do seu pensamento, seus conceitos,
neologismos, seu humor angustioso, delirante, o quadro

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mental assombroso e bizarro, revelam as diferenças fundamentais
entre a psicose e a iluminação espiritual.

Claro está que as personalidades mediúnicas não
estão isentas de alterações posicopatológicas. Nem mesmo
a Santa. A própria Posição Espírita reconhece a anormalidade
da mediunidade, conforme já foi transcrito de
André Luiz. Mas a anormalidade mediúnica é mais um
desvio estatístico da média do que doença, embora essa
possa também existir. Mas já foi citado William James,
para quem a anormalidade não implica infirmação das
experiências religiosas.

Está além do alcance das possibilidades do autor a
análise do simbolismo da visão de Santa Teresa e o anjo
em forma "corporal". Contudo, algumas considerações
poderiam ser aqui aventadas, com muita cautela, apenas
como suposições.

O místico hindu Paramahansa Yogananda assevera
que a união entre os amantes implica intercâmbio de
energias espirituais semelhantes às do êxtase, onde a
alma estabelece contato com a própria divindade. Esse
aspecto foi analisado por Jung, em seus aspectos psicológicos
na sua difícil obra "Psicologia da Transferência".
Quem se der ao trabalho de estudar atentamente São
João da Cruz verá a quantidade enorme de simbolismo
sexual em suas poesias.

O autor espiritual Emmanuel afirma que "missionários
do devotamento vibram em faixas de amor sublime,
quase sempre inacessíveis à compreensão" (...) ("Vida e
Sexo", FEB, 1970, pág. 107).

Revela, anteriormente, que "as Leis do Universo
não destroem o instinto, mas transformam-no em razão e
angelitude, na passagem dos evos, pelos mecanismos da
sublimação". Mais adiante, "estímulos genésicos (...) são

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ingredientes da vida e da evolução, criados pela mesma

Providência Divina para a sustentação e elevação" (...)

(idem, pág. 106).

Esse autor, e por extensão, a Posição Espírita,
apresenta uma visão natural a respeito do sexo, portanto
não indutora de desequilíbrio psíquico, quer pela repressão
pura, quer pela promiscuidade, também indutora de
distúrbios mentais: "Diante do sexo, não nos achamos,
de modo nenhum, à frente de um despenhadeiro para as
trevas, mas perante a fonte viva das energias em que a
Sabedoria do Universo situou o laboratório das formas físicas
e a usina dos estímulos espirituais" (Idem, pág.
104.)

Emmanuel aprofunda o estudo da sexualidade humana
até os abismos da evolução filogenética: "Toda
criatura traz consigo, devidamente estratificada, a herança
incomensurável das experiências sexuais vividas nos
reinos inferiores da natureza" (...) (idem, pág. 102), e que
"o instinto sexual, exprimindo amor em expansão incessante,
nas profundezas da vida, orientando os processos
da evolução".

Esse autor espiritual enfatiza a importância "da
energia sexual que, na essência, verte da Criação Divina
para a constituição e sustentação de todas as criaturas.
Com ela e por ela é que todas as civilizações da Terra se
levantaram, legando ao homem preciosa herança na viagem
para a sublimação definitiva, entendendo-se, porém,
que criatura alguma, no plano da razão, se utilizará dela,
nas relações com outra criatura, sem conseqüências felizes
ou infelizes, construtivas ou destrutivas, conforme a
orientação que se lhe dê" (idem pág. 27).

Em relação às demais religiões, com respeito às
disfunções sexuais, é a Doutrina Espírita que adota uma

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


das posturas mais humanística, não repressiva nem acusatória
e, portanto, mais terapêutica: "Companheiros da
Terra, à frente de todas as complicações e problemas do
sexo, abstende-vos de censura e condenação" (idem,
pág. 109). Essa atitude liberal parece ser a que mais se
aproxima do liberalismo responsável do Cristo, ao conviver
com prostitutas, cobradores de impostos, enfim, as
classes rejeitadas e oprimidas pelo eclesiarquismo da
época. Essa atitude compassiva e de aceitação é condição
"sine qua non" para o êxito terapêutico nos consultórios
analíticos, psicológicos e psiquiátricos. Provavelmente
não foi mera casualidade o fato de Maria de Magdala,
a prostituta convertida, cujos pecados foram perdoados
porque muito havia amado, ter sido a primeira pessoa a
receber a boa nova da ressurreição do Cristo, privilégio
não concedido à "virgem concebida sem pecado". Esses
temas são explosivos, mas casos como o de Schreber
obrigam o terapeuta a meditar mais profundamente sobre
os mesmos.

Esse tema é de importância capital em Psicopatologia
e em Psicoterapia, e o exemplo de Schreber ilustra,
segundo Freud, o grau de devastação mental a que podem
levar conflitos não resolvidos de natureza sexual.
Destarte, o posicionamento não radical da Teoria Espírita
tem importância fundamental na profilaxia de distúrbios
psiquiátricos. Considerando novamente o Evangelho, eis
a atitude do Cristo diante do pecado: "Mulher, onde estão
aqueles teus acusadores? Ninguém te condenou? Nem
eu também te condeno: vai-te, e não peques mais" (João,
8:10,11). Convém repisar que a promiscuidade é tão perniciosa
quanto a repressão pura, sendo também causa
de distúrbios mentais. A perda da capacidade de estabe-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


lecer relações autênticas, com comportamento sexual
promíscuo, é um dos sinais da esquizofrenia.

Em geral, os grandes romancistas captam as realidades
da alma de um modo muito mais completo do que
os próprios psicoterapeutas. É o caso do Prêmio Nobel
de Literatura Herman Hesse, com o impressionante romance
alegórico "Sidartha". A iluminação do herói Sidartha,
e a neurose e o desespero de Govinda trazem em si um
profundo conhecimento das realidades dos mecanismos
psicodinâmicos da alma, embora a maioria dos homens
esteja despreparada para vôos como o empreendido pelo
primeiro.

O caminho do amadurecimento da personalidade,
ou do desenvolvimento espiritual é estreito como o fio de
uma navalha. Aqueles que se transviam na luxúria, na licenciosidade,
na libertinagem e na promiscuidade perdem
uma das mais importantes qualidades do gênero humano:
a capacidade de estabelecer relações profundas,
autênticas, duradouras e profícuas. Caem num vazio existencial
de dolorosas conseqüências.

No processo de iluminação interior que, segundo
Jung, não se trata de ficar imaginando figuras de luz, mas
sim em tornar a escuridão consciente, isto é, em ampliar
as fronteiras do eu, em abarcar cada vez mais os tesouros
e eliminar as escórias do inconsciente, existem grandes
riscos, perigosos acontecimentos tanto internos
como externos. O caminho do equilíbrio é representado
pela senda estreita de um mecanismo psicodinâmico denominado
sublimação. É um processo extremamente difícil,
pois implica processos dolorosos de renúncia, de repressão
equilibrada e de investimento da energia libidinal
em objetivos mais elevados.

Sublimação difere em gênero, número e grau de re-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pressão, racionalização, intelectualização, identificação,
deslocamento, projeção, formação reativa, isolamento
etc. Pessoas puritanas, rígidas, formalísticas tendem a
ser intolerantes, susceptíveis, rancorosas, ciumentas e
invejosas, enfim, neuróticas, bloqueando o próprio desenvolvimento
espiritual.

Em "Psicologia da Transferência", Jung indica que o
êxito ou o fracasso do tratamento psicoterápico tem, no
fundo, muito a ver com o problema da transferência, que
é um processo ligado à sublimação. Diz que para uns,
pode ser remédio, para outros veneno (pág. 35). Em
"We", o psicanalista R. A. Johnson faz interessantíssimo
estudo psicológico do amor romântico.

As dificuldades desse tema são tremendas, e não
caberia, num trabalho tão superficial como este, o aprofundamento
do mesmo, nem possui o autor capacitação
para tal tarefa. Roga-se ao leitor o estudo de conceitos
junguianos, tais como "Mysterium Coniunctionis", "donum
Dei et secretum altissimi" etc. Aqui o campo da Psicologia
adentra os mistérios últimos da alma, e o próprio Jung
reconheceu sua incapacidade em ir adiante. A esse respeito,
Von Rosenroth declarou: "Procuro, não afirmo,
nada determino aqui nem dito, conjeturo, esforço-me,
comparo, tento, interrogo (...)."

Além do caso Schreber, serão citados alguns exemplos
ilustrativos de distúrbios mentais. Weitbrecht apresenta
o seguinte: "Quando percebi que chamavam três
vezes às 12 horas em ponto no andar inferior e que um
Volkswagen vermelho passava rápido pela rua, senti um
medo terrível e compreendi que se havia decidido o destino
da Europa."

Esse é um exemplo de percepção delirante, que segundo
Kurt Schneider é sinal de psicose esquizofrênica.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Essa vivência deve ser diferenciada da percepção extra-sensorial,
pois é vivenciada pelo ego como algo imposto a
partir de uma outra realidade. Contudo é de natureza patológica,
por atribuir a uma percepção um significado
anômalo, no sentido auto-referente. Esse significado é
estranho, bizarro, inverossímel e vivenciado como se fosse
uma "revelação", com uma aura luminosa.

Tem alguma semelhança formal com o que Jung
denominou sincronicidade, mas os mecanismos psicológicos
intrínsecos são completamente diferentes.

Em sua autobiografia, Jung cita um impressionante
fenômeno de sincronicidade, presenciado por Freud, que
se repetiu, e a partir do mesmo houve a ruptura definitiva
entre o mestre de Viena e seu discípulo dileto. Os livros
de Ocultismo estão repletos de ocorrências similares e
que podem ter um mecanismo de ação mediúnica. Em "O
Lama das Quatro Sabedorias" (op. cit.), o personagem
principal, Mipan, viu, num bando de aves no céu voando
em direção ao norte, um "aviso" que, após difíceis tentativas
de verificação, se confirmou como sendo verdadeiro.

A diferença fundamental entre o médium, o sensitivo
e o doente mental é que nas personalidades mediúnicas
o juízo crítico da realidade e do estado mórbido não
estão comprometidos, o que permite ao sensitivo questionar
o sinal, ou procurar verificar a sua possível veracidade
ou mera casualidade. O doente mental é incapaz de
testar a realidade.

Às vezes o doente pensa que é rei, Cristo, Napoleão
etc., com ideação delirante de feição grandiosa.
Esse delírio não deve ser confundido com as crendices
de espiritistas de que são a reencarnação de personalidades
proeminentes do passado. É mais provável que
aqui haja simplesmente uma satisfação de desejos, uma

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


compensação a uma vida de frustrações e desprovida de
brilho e satisfação pessoal. As idéias delirantes são inconfundíveis,
embora alguns delírios possam ser dissimulados
pelos pacientes. "Não sou filho de meu pai, sou
rei, baixei expressamente de cima, de ser em ser, até a
minha situação atual de rei, e sou rei porque os astros virão
buscar-me" (Wassily).

O paciente delirante desenvolve o humor delirante:
é desconfiado, acusa os outros de hipocrisia e hostilidade,
ou de dissimulados e reticentes, altera-se a consciência
do eu, os objetos e os acontecimentos adquirem uma
significação especial, particular, e a personalidade apresenta
traços negativos, desagradáveis, podendo cometer
escândalo público, agressões ou mesmo homicídio ou
suicídio.

Por outro lado, William James (op. cit.) descreve as
experiências religiosas e mediúnicas, de modo geral,
como tendo inefalibilidade (quem o experimenta diz que
desafia a expressão, que não se pode fazer com palavras
nenhum relato adequado do seu conteúdo, não podendo
ser comunicado nem transmitido aos outros). Possuem
também qualidade noética (são para os que as experimentam
estados de conhecimento, estados de visão interior
dirigidas a profundas verdades, não sondadas pelo
intelecto discursivo). Transitoriedade (esses estados não
podem ser sustentados por muito tempo, a não ser em
casos raros (vide Yogananda, op. cit.). Passividade (tem
a impressão de que sua própria vontade está adormecida,
podendo, no entanto, não haver nenhuma recordação
posterior do fenômeno ("As Variedades da Experiência
Religiosa").

Todas essas características podem ser encontradas
na seguinte experiência de Santa Teresa, relatada em "O

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Livro da Vida": "um dia, estando em oração, foi-me concedido
perceber, num instante, como todas as coisas são
vistas e contidas em Deus. Eu não as percebia em sua
forma apropriada e, apesar disso, a visão que eu tinha
delas era de uma clareza soberana, e permanecem vividamente
impressas em minha alma. Foi uma das poucas
mais extraordinárias que o Senhor me conferiu (...) A visão
era tão delicada e sutil que o entendimento não pôde
captá-la".

Ao Codificador da Teoria Espírita não passaram
despercebidas as possíveis imbricações entre doença
mental e mediunismo. Allan Kardec formula a seguinte
questão, há mais de um século, no auge da psiquiatria
mecanicista:

"Poderia a mediunidade produzir a loucura?"

R. "Não mais do que qualquer outra coisa, desde
que não haja predisposição para isso, em virtude de fraqueza
cerebral. A mediunidade não produzirá a loucura,
quando esta já não exista em gérmen; porém, existindo
este, o bom senso está a dizer que se deve usar de cautelas,
sob todos os pontos de vista, porquanto qualquer
abalo pode ser prejudicial." ("O Livro dos Médiuns", 59â
ed. FEB, pág. 265.)
No capítulo XXIII de "O Livro dos Médiuns", classifica
as obsessões de origem espiritual nas seguintes modalidades:
obsessão simples, fascinação e subjugação.
Substitui o termo possessão por subjugação para evitar
as conotações demonológicas da Idade Média. Convém
observar que já foi demonstrada a existência desses
mesmos sintomas de natureza puramente neurótica, fruto
da repressão, ocorrendo principalmente na Neurose Obsessivo-
compulsiva, o que obriga a um diagnóstico diferencial.
(Vide Aksakof.)

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


No texto do "O Livro dos Médiuns", Cap. XXIII, da
59â edição da FEB, pág. 323, entre tantos temas importantes,
destacam-se os seguintes:

"A subjugação corporal, levada a certo grau, poderá
ter como conseqüência a loucura?"

"Pode, a uma espécie de loucura cuja causa o mundo
desconhece, mas que não tem relação alguma com a
loucura ordinária. Entre os que são tidos por loucos, muitos
há que apenas são subjugados; precisariam de um
tratamento moral, enquanto que com os tratamentos corporais
os tornamos verdadeiros loucos. Quando os médicos
conhecerem bem o Espiritismo, saberão fazer essa
distinção e curarão mais doentes do que com as duchas."
(nº 254; pergunta 6a .)

O bom senso Kardequiano ensina que "(...) em todos
os casos, se deve proceder com grande circunspeção,
não convindo nem excitá-las, nem animá-las nas
pessoas débeis. Do seu exercício cumpre afastar, por
todo os meios possíveis, as que apresentam sintomas,
ainda que mínimos, de excentricidade nas idéias, ou de
enfraquecimento das faculdades mentais, porquanto,
nessas pessoas, há predisposição evidente para a loucura,
que se pode manifestar por efeito de qualquer sobreexcitação...
O que de melhor se tem a fazer com todo indivíduo
que mostre tendência à idéia fixa é dar outra diretriz
às suas preocupações, a fim de lhe proporcionar repouso
aos órgãos enfraquecidos". (Cap. XVIII, n° 222, final.)


PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


VII

TRANSE FARMACÓGENO

Ao atrelar a alma, e os mecanismos da mente, ao
cérebro físico, mais especificamente ao diencéfalo e às
estruturas íntimas do protoplasma celular, tais como o
centríolo, as mitocôndrias, a substância de Nissl etc , a
Posição Espírita dá as mãos aos modernos avanços da
Psiquiatria, cada vez mais direcionada à Psicofisiologia, à
Psicofarmacologia e à Farmacoterapia de um lado, e ao
inconsciente e às psicoterapias de outro.

Esse fato não é nada surpreendente, visto possuir o
Espiritismo, além do aspecto religioso e filosófico, uma
faceta eminentemente científica e positivista. O próprio
Allan Kardec declarou que esses três aspectos são indissociáveis
na Doutrina Espírita.

Esse tríplice aspecto do Espiritismo não deve causar
espanto, pois ao reconhecer o papel fundamental do
cérebro físico na vida de relação, a alma deixa o plano
sobrenatural e mágico, entrando no rol dos fenômenos
naturais do Universo, se bem que em dimensões que superam
o "continuum" espaço-tempo e a causalidade. Ora,
os fatos confirmam plenamente esse posicionamento,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


uma vez que alterações mínimas no funcionamento cerebral
provocam as mais variadas repercussões no mundo
mental do indivíduo. Exemplificando, um traumatismo
crânio-encefálico, com concussão cerebral, poderá provocar
alterações da consciência, tais como obnubilação,
torpor, confusão mental ou mesmo estados comatosos,
com abolição até mesmo dos reflexos neurológicos. Fica
assim demonstrado, acima de qualquer dúvida, que a
vida psíquica depende da integridade das funções instrumentais
da vida de relação.

Todavia, o Espiritismo torna a vida de relação infinitamente
mais complexa ao agregar, ao cérebro físico, um
cérebro espiritual que, segundo revelação dos Espíritos,
via mediúnica, e ocorrências sincronísticas ou parapsicológicas,
não é imaterial, mas formado por um tipo especial
de matéria, ainda não inteiramente detectada pela Física,
mas cuja existência já é suspeitada por diversos
cientistas em face dos "horrendos" paradoxos apresentados
pelo comportamento das partículas subatômicas e
pela energia, dando-se destaque ao conceito einsteiniano
de campo.

Uma outra via de acesso às realidades da alma é
aquela constituída pelo transe farmacógeno. Data de
tempos imemoriais o conhecimento de substâncias psicoativas,
indutoras de um tipo especial, ou melhor, de tipos
especiais de transe. É fato notório que durante tais
estados podem ocorrer fenômenos mediúnicos ou paranormais,
associados a estados alterados de consciência.

As substâncias capazes de induzir tais estados alterados
de consciência possuem uma certa similaridade
estrutural com as monoaminas cerebrais ou seus derivados
catabólicos, e são denominadas drogas eidéticas,
psicodélicas, psicotomiméticas, psicolíticas, psicotrópicas

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


etc, ou pelo termo mais técnico e específico de psicodislépticas.
A característica fundamental dos psicotrópicos é
a afinidade especial com o Sistema Nervoso Central. Essas
drogas provocaram uma verdadeira revolução na Psiquiatria,
com o advento dos tranquilizantes, dos neurolépticos,
neuroanalépticos, anticomiciais etc.

Cerviño (op. cit.) assevera que "filtros místicos integram
quase sempre os ritos religiosos das comunidades
primitivas. O álcool é elemento indispensável em certos
cultos africanistas difundidos entre nós".

Os hindus usavam uma bebida inebriante extraída
de uma asclepiadácea. Os incas usavam a Banisteria
quitensis. Os índios mexicanos, a cactácea Anhalonium
cewinii. Também a Lophophora willi amsii, bem descrito
na obra de Carlos Castañeda.

Oschangessy observou, casualmente, (idem) um legítimo
transe farmacógeno, produzido pela Cannabis indica:
"Às duas horas da tarde, deu-se a um paciente reumático
um grão de resina de uma espécie de Cannabis.
Às 4 horas ele estava excessivamente tagarela: cantou,
pediu em voz muito alta mais comida e declarou achar-se
em perfeita saúde. Às 6 horas estava dormindo. Às 8 encontraram-
no insensível, mas respirando com perfeita regularidade,
pulso e pele em estado normal e as pupilas
levemente contraindo-se à aproximação da luz. Tendo,
por acaso, levantado seu braço — facilmente se imaginará
o meu espanto quando vi que ele ficava na posição em
que eu o colocava. O paciente tinha ficado cataléptico.
Nós o sentamos e pusemos seus braços e suas pernas
em todas as posições imagináveis. Um figura de cera não
seria mais plástica. Ele continuou assim até a 1 hora da
madrugada, quando a consciência e o movimento voluntário
voltaram prontamente." É interessante frisar a simi-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


laridade entre esse caso induzido farmacologicamente e
alguns casos de flexibilidade cérea da catatonía.

O conhecido médium Francisco Cândido Xavier fez
um relato de uma experiência vivida após a ingestão de
mínima dose de ácido lisérgico. Concluiu que o material
liberado não se constituía em nada de novo, mas simples
liberação e exaltação de estados de ânimo preexistentes.
Com isso concordam os compêndios de Psiquiatria.

Sudre ("Traité de Parapsychologie") comunica que
a associação de escopolamina e cloral seria a droga de
eleição para a indução do "estado parapsicológico", com
transe, seguido de amnésia ao despertar.

Hofmann, descobridor do LSD, viveu uma experiência
espantosa, muito conhecida nos anais da Psiquiatria.
Sob a ação da droga, viu seu corpo inerte, deitado sobre

o sofá, enquanto "ele próprio andava pelo laboratório". A
dietilamida do ácido lisérgico resulta da hidrólise alcalina
dos alcalóides do esporão do centeio Claviceps purpurea,
e amplia as percepções e produz pseudopercepções, estimula
a introspecção, libera material inconsciente tanto
esquecido como suprimido ou reprimido, ocasiona a hipermnésia,
além de liberação de emoções e sentimentos
localizados abaixo do limiar dos processos conscientes.
Cerviño refere que existem várias observações sobre
plantas que favorecem o transe ou mesmo o exercício
das funções paranormais ou mediúnicas. Pucharichi
assinalou as virtudes parapsíquicas da Amanita muscaria.


As substâncias psicodislépticas provocam alterações
impressionantes da atividade mental do indivíduo, mas
de uma maneira que depende tanto da susceptibilidade
individual como do padrão básico da personalidade pré-mórbida,
podendo desencadear um distúrbio deliróide dos

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


juízos, uma distorção da apreensão da realidade, modifi


cações da escala de valores, ilusões sensoriais, alucina


ções as mais variadas, aberrações perceptivas, alterações

da síntese perceptiva tais como desrealização, desperso


nalização, estados confusionais, onirismo etc.

Podem provocar também ab-reações emotivas intensas,
culpa, súbitas modificações do humor, além de
"insights" os mais profundos. Apesar dos riscos notáveis
que o seu uso experimental implica, alguns especialistas
utilizam-nos com finalidades terapêuticas, como foi exemplificado
anteriormente. Em meio a essa profusão de sinais
e sintomas mentais, podem ocorrer autênticos fenômenos
de natureza paranormal ou mediúnico.

Existe uma estreita correlação, bem definida, entre
a personalidade básica preexistente e os efeitos dessas
drogas. Aldous Huxley chamou a atenção para o fato singular
de que a mescalina não produz alteração na identidade
dos objetos e sim no conteúdo das percepções. O
distúrbio consiste na maneira como os objetos familiares
são percebidos. Ao ingerir a droga, olhou para os livros
da estante e percebeu "livros vermelhos como rubis, livros
de esmeralda, livros encadernados em jade branco,
livros de ágata, de água-marinha, de topázio amarelo; livros
de lápis-lazúli de cor tão intensa, tão intrinsicamente
característica que pareciam estar prestes a sair das estantes
e arremessar-se mais intensamente de encontro à
minha atenção". Esse fenômeno difere das ilusões, das
pareidolias e das alucinações e também pode ocorrer nas
psicoses esquizofrênicas: "certo paciente, ao ser visitado
por pessoa, no hospital, e dar-lhe notícias dos filhos, interrompeu
o visitante: 'como poderia ele perder tempo
com um casal de crianças ausentes quando tudo o que
verdadeiramente importava, ali e naquele instante, era a

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


indizível beleza dos desenhos que ele criava, em seu casaco
marrom de xadrez, a cada movimento de braços'" (I.
Paim).

Esses desenhos e cores de excepcional beleza
também costumam ocorrer nas videncias mediúnicas,
bem como no êxtase religioso. Cerviño aduz que, como a
própria percepção extra-sensorial pode revelar-se sob
forma alucinatória e simbólica, geralmente torna-se extremamente
difícil estabelecer limites precisos entre alucinações
patológicas, aberrações perceptivas e as percepções
extra-sensoriais, que, como foi dito, também possuem
natureza alucinatória. É interessante frisar que os pacientes
psicóticos, neuróticos etc. costumam apresentar, não
raro, verdadeiros fenômenos mediúnicos, fáceis de ser
averiguados, bastando, para tanto, ausência de preconceito
e a capacidade de ver e de ouvir.

Segundo esse autor, o transe, como o sono, é também
a estrada real da satisfação dos desejos frustrados,
a válvula de escape de personalidades secundárias que
podem emergir, em aparição meteórica, quando se apagam
as luzes do córtex cerebral. Aqui, o personismo cultivado
e exclusivo entra, sem dúvida, no campo francamente
patológico, relacionando-se com as neuroses e as
psicoses em geral.

J. Garcia ("Compêndio de Psiquiatria") aduz que "o
erótico terá alucinações correspondentes (de mulheres
nuas, de cenas eróticas, afrodisíacas etc.); o tímido e o
inseguro terão visões terroríficas; as pessoas de ânimo
alegre verão panoramas e cenas risonhas". Existem casos
relatados de homicídios, crimes sexuais e mesmo
suicídio após a ingestão dessas substâncias, sendo o alcoolismo
a principal causa de acidentes automobilísticos.
Contudo, as drogas que induzem ao transe nã o são

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


necessariamente depressoras corticais, como o álcool.
Rhine verificou a ação favorável à produção de fenômenos
paranormais da cafeína, que é um excitante do córtex,
e do amital que, em pequenas doses, deprime o hipotálamo.
É notório que os barbitúricos são drogas depressoras
do SNC.

É preciso ter em mente que a ação das drogas depende
também da dose, da sensibilidade individual, além
de possíveis idiossincrasias. Outro dado fundamental, segundo
Pavlov, é a capacidade auto-regulável do cérebro:
a excitação suscita, em determinadas condições, a inibição
e vice-versa.

O éter, por exemplo, numa fase inicial, excita o córtex,
mas, a reação inibitória por fim predomina (Bleger).
Devido à extraordinária correlação entre as diversas estruturas
encefálicas, é praticamente impossível interferir
numa parte sem interferir no todo. Segundo a reflexologia
de Pavlov, os barbitúricos atuam primariamente inibindo

o córtex cerebral, tal como o álcool. Como o córtex atua
como repressor das estruturas subcorticais, entendeu-se
a liberação inicial das tendências inconscientes ou reprimidas.
Os estados de embriaguez patológica, com exaltação
psicomotora e condutopatia de caráter destrutivo
são a causa maior das internações nos serviços de pronto-
socorro psiquiátricos, segundo a experiência do autor.
Cerviño aduz que é justamente a liberação das estruturas
subcorticais que, de algum modo desconhecido,
se relaciona com as funções paranormais ou mediúnicas,
por meio dos hipotéticos receptores Psi (op. cit).

O metabolismo dos neurônios é basicamente composto
de oxigênio e glicose, e, secundariamente, entram
os aminoácidos e os lipídios. Entre as vitaminas destaca-se

o papel da Tiamina (B1) cuja carência pode provocar
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


distúrbios mentais e pelagra. As vitaminas atuam como
enzimas biocatalizadoras.

O equilíbrio ácido-básico e eletrolítico representa
outro fator fundamental na fisiologia cerebral. Assim sendo,
quaisquer substâncias que modifiquem a homeostasia
do SNC (hormônios, catabolitos, toxinas tanto endógenas
como exógenas etc.) podem, de algum modo, interferir
nas funções nervosas e, conseqüentemente, psicológicas
e parapsicológicas.

Entre as condições que, intervindo nesses complexos
mecanismos nervosos, propiciam o transe, destacam-
se:

Anóxia cerebral, talvez a indutora das visões luminosas
dos pacientes ressuscitados pelas modernas técnicas
da medicina. O excesso de oxigênio também. Essa
reação já era conhecida pelos yogues hindus desde tempos
imemoriais, anteriores a Patânjali, que criaram as
técnicas respiratórias denominadas pranayama, indutoras
do transe. Destacam-se as formas de Kundalini yoga e
Krya yoga, reintroduzidas nos tempos modernos, principalmente
por Babaji.

Hipercapnia ou excesso de gás carbônico é outra
condição que favorece o transe. Pode ocorrer durante a
apnéia voluntária dos yogues, como na técnica de Hong
Sau, ou nas preces intermináveis ou cânticos religiosos,
que aumentam o teor do gás carbônico no interior dos alvéolos.


Modificações do equilíbrio ácido-básico, tal como a
acidóse provocada pela hipercapnia, com a queda correspondente
do pH sangüíneo, pode facilitar ou induzir o
transe, como ocorre no jejum etc.

Seria de interesse tecer algumas considerações psicofisiológicas
sobre a Yoga, pois esse conjunto de técni-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cas orientais tem muito em comum com as práticas mediúnicas.


Segundo Wilhelm Hass ("Die Psychist Dingwelt" —
Bonn 1921), a Yoga não pretende atribuir as formações
sutis aos órgãos anatômicos. O mesmo se pode dizer em
relação ao Espiritismo cujo conceito de perispírito ou psicossoma,
tem íntima relação com as estruturas do protoplasma
celular, como já foi citado, com André Luiz.

A ascensão da Kundalini é digna de interesse especial,
pois produz a rigidez cadavérica ou morte aparente
dos que se deixam enterrar vivos (R. Schmidt, "Fakire
und Fakistemm in alten und modernem Indien". Berlim,
1908). Foi constatado que tais indivíduos conservam calor
no alto da cabeça, região que se relaciona com o centro
coronário. Contudo, permanece inexplicada a capacidade
funcional das células a despeito de tão notável carência
de oxigênio, embora se deva reconhecer, em princípio,
que todas as células animais sejam capazes de
anoxibiose.

Jung fez interessante estudo psicológico em "Kundalini
Yoga". Segundo o brilhante psicanalista junguiano
Robert A. Johnson, em "We", a ascensão de Kundalini
para centros de níveis mais elevados simboliza a elevação
do estado de consciência: "Sempre que você é chamado
pelo destino, sempre que você é levado em direção
do próximo chakra (nível de consciência), você experimenta
a sensação de ficar de 'cabeça para baixo', uma
sensação de que o seu mundo foi revirado, e descobre
que todos os valores e lealdades do mundo que você conhecia
estão em conflito terrível com o novo mundo que o
chama" (pág. 99).

Segundo Donders, a contração dos músculos do
pescoço, inervados pelo acessório, pode paralisar o cora-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ção, e esse fato poderia explicar o retardo voluntário das
contrações cardíacas.

Para F. A. Weiss (1936), Samadhi representa, do
ponto de vista fisiológico, uma "forma rígida de catalepsia
com redução de todos os processos motores e sensitivos,
bem como dos vegetativos, tais como respiração,
pulso, até um mínimo apenas suficiente para a manutenção
da vida".

O Instituto de Fisiologia da Universidade de Yale
constatou que o consumo de oxigênio durante os exercícios
respiratórios é 20 % maior, apesar da menor freqüência
respiratória, cerca de 1 irpm, o que conduziria a mudanças
no metabolismo gasoso.

A Academia de Yoga de Lonavla, entre Bombaim e
Poona, fundada em 1924, estuda de modo científico os
fenômenos físicos e psíquicos condicionados pelos exercícios
de Yoga, tendo constatado bons resultados clínicos
nos distúrbios funcionais, mesmo sem a "iniciação
teórico-mística" dos adeptos. Demonstrou que tanto a
P0 2 como a PC02 levam a alterações psíquicas.

Foi também constatado que as posturas, ou ásanas,
produzem alterações circulatórias que, aliadas à fixidez
do olhar, conduziriam a um estado de transe hipnótico.
As técnicas de Meditação difundida por Paramahansa
Yogananda dão ênfase especial à fixidez do olhar, dirigido
ao ponto entre as sobrancelhas, associada à supressão
e de toda atividade cortical, ou estado alfa. Procedeu-
se também a estudos comparativos entre os estados
psíquicos dos Yogues, e as alterações da consciência
dos esquizofrênicos. Em relação a esse aspecto fundamental,
a experiência pessoal do autor constatou a perda
dos limites do ego, sendo que nos transes, o foco da energia
psíquica se dirige a regiões mais profundas, em direção

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ao inconsciente, subcortical, mas sem a perda do "fio de
Ariadne", isto é, do contacto com a realidade e do juízo
crítico do estado mórbido. Costumam ocorrer estados de
euforia intensa, sensação de luminosidade interna, além
de indescritível "transparência" dos processos psíquicos.
Parece que os esquizofrênicos não possuem a habilidade
de manter o foco da consciência em regiões alheias ao
eu superficial, fruto dos engramas mnemónicos e das experiências
pretéritas, sem perder o controle da atividade
psíquica.

J. H. Schultz enfatizou a importância do estudo da
natureza real da Yoga, do mesmo modo das pesquisas
da Hipnologia. Segundo se observou, a prática da Kundalini
Yoga levaria o indivíduo a dirigir a atenção para os
centros sutis, além dos limites do ego. O processo de
auto-realização pela Yoga consistiria basicamente num
processo funcional de dissolução do complexo do ego, fisiológico,
sem ocorrer a alienação mental própria dos estados
psicóticos. Na Psicologia ocidental, o processo de
individuação de Jung descreve o mesmo fenômeno.
Segundo a Yoga, o homem, subjugado pela ilusão
do processo do conhecimento (Maya), chega ao conhecimento
mais real da realidade divina apoiado precisamente
nesse mundo ilusório, criado pelos órgãos dos sentidos,
daí a necessidade da reencarnação, como forma de
amadurecimento espiritual e libertação do complexo do
ego. Esse pressuposto parece ser também compartilhado
pelo Espiritismo.

Segundo a Japa Yoga, ao permanecer concentrado
em Deus, o indivíduo dissolve os conflitos neuróticos e
restaura a sensação de bem-estar e a harmonia do funcionamento
dos processos mentais.

Cerviño refere que qualquer fator que diminua a gli-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


cernia, tais como o jejum, a inanição, disendocrinias, distúrbios
hepáticos etc , ou interfira na utilização da glicose
pelas células cerebrais (mescalina, por exemplo), predispõe
ao transe. É interessante recordar a ênfase que a religião
tradicional dá ao jejum e à frugalidade.

O "stress", com a mobilização da histamina, da
adrenalina, pela supra-renal, pode originar catabolitos
alucinogênicos, tais como o adenocromo. Assim, a autoflagelação
e as práticas antigas de mortificações religiosas
estabeleceriam condições favoráveis ao transe.

As insuficiências hipofisária, supra-renal, tireoideana
também podem produzir queda da glicemia e assim
alterar o funcionamento das células nervosas do cérebro.

Pelas experiências de Zondek e Bier, é possível que

o bromo, existente no organismo, tenha alguma importância
na indução do transe, condição diferente do sono,
mas que resulta igualmente dos processos cerebrais de
inibição.
Em relação aos mecanismos cerebrais de inibição
como condições indutoras do transe, outra linha de experimentação
parece também apontar nessa mesma direção.
Trata-se das experiências de privação sensorial.

Existem algumas formas especiais de transe, particularmente
profundas, em que o indivíduo relata a parada
completa do processo perceptivo. Santa Teresa denomina
esse transe com o sugestivo nome de "oração de
quietude". São João da Cruz faz também descrições bastante
minuciosas. Paramahansa Yogananda descreve estados
similares.

Ora, é sabido o papel importante que a substância
reticulada ascendente possui na integração dos estímulos
sensoriais e posterior ativação do córtex cerebral,
sendo a base do processo neurofisiológico de vigilância.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 22 7


Conhecendo bem esse papel, os psiquiatras usam substâncias,
tais como a Levomepromazina, como indutoras
secundárias do sono, em pacientes psicóticos, pois essas
substâncias interferem na recepção e integração dos impulsos
nervosos aferentes, provenientes dos órgãos sensoriais,
ao nível da SRA.

Experimentos "in anima nobile" demonstraram que
a deprivação sensorial, obtida artificialmente, induz a formas
especiais de transe, com distúrbios senso-perceptivos
e até mesmo delirium.

Segundo Mayer-Gross, Hebb e Heron, 1961, fizeram
pesquisas sobre "isolamento perceptivo", quando
constataram a ocorrência de alucinações e debilitação da
função cognitiva. Hebb afirmou que as alucinações assemelhavam-
se às produzidas pela nectalina e pela exposição
a luzes intermitentes. Alguns elementos eram oniróides,
muitos eram vívidos como se estivessem diante dos
olhos. Os indivíduos duvidavam se estavam sonhando
acordados ou dormindo e sonhando. Mayer-Gross aduz
que inúmeras pesquisas subseqüentes não conseguiram
explicar os fenômenos de forma adequada ("Psiquiatria
Clínica", Mayer-Gross, Slater e Roth, pág. 395).

Ziskind também estudou esses fenômenos e concluiu
que tais vivências não se tratavam de alucinações,
pois não apresentavam falta de "insight". Esses autores
sugerem que as experiências alucinatórias e pseudo-alucinatórias,
relatadas no curso de experiências de isolamento
perceptivo, devem-se a redução intermitente no nível
de consciência e estão amparadas pela observação
de alteração no EEG. Ora, é bastante conhecida a hipótese
levantada por inúmeros autores sobre a importância
do "estado alfa" como indutor de formas de transe. Essesfenômenos
podem ocorrer também na privação do sono,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


em prisioneiros trancafiados em celas solitárias e em
pessoas privadas de convívio social, tais como migrantes
privados do contato social pelas barreiras lingüísticas e
pela falta de familiaridade com o ambiente. Para o presente
estudo, pode-se acrescentar a situação vivida pelos
eremitas medievais ou pelos yogues indianos nos altiplanos
dos Himalaias.

Os estados carenciais, com hipovitaminoses também
diminuem a eficiência biológica do córtex e facilitam

o transe. Um dos principais fatores eliciadores do Delirium
tremens é a carência de vitamina B1 . O D.T. pode
ser considerado uma forma mórbida de transe, com êxito
letal em cerca de 5% dos casos.
Deve-se alertar aqui que a indução do transe, através
de drogas psicodélicas, é bastante arriscada, para dizer
o menos. Cerviño observa que seria profundamente
lamentável que a "visão sacramental da realidade" conduzisse
alguém ao descalabro da adição ou dependência.
Convém alertar que os casos de toxicomania ocorrem
em personalidades imaturas, dependentes, frustradas
e com tendências, ou sintomas francos de neurose
ou psicose, quando não sociopáticas.

Michael Harner usou drogas conhecidas dos povos
indígenas da Amazônia e criou um método de mútua ajuda
na América do Norte. Carlos Castañeda fez experiências
similares, tendo desenvolvido um episódio, classificado
pelo seu mestre Don Juan como "perda da alma",
termo indígena para surto psicótico. Caso bastante conhecido
é dos auto-experimentos de Aldous Huxley. Existem
hipóteses relacionando a psicose desenvolvida pelo
pintor Van Gogh com o seu hábito de mascar grãos de
centeio, enquanto pintava.

Segundo Fontana, a atuação das substâncias aluci-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


nógenas seria de modo indireto, via catabolitos do grupo
derivado das aminas biogênicas, que à maneira dos neuro-
hormônios, interfeririam no funcionamento do sistema
nervoso e, seguramente, das atividades psíquicas. A possível
ação direta dos psicodislépticos foi comprovada em
culturas de Oligodendroglia. Foi demonstrado que a Oligodendroglia
tem papel importante como ponte metabólica
entre o neurônio e o meio circundante, aumentando funcionalmente
o fluxo sangüíneo cerebral. Assim, os alucinógenos
produziriam uma ativação do córtex através da
excitação das estruturas subcorticais. Atuando por via da
formação reticular, interfeririam nos mecanismos integradores
do hipocampo e do sistema límbico, relacionados
com a conduta instintiva, com as emoções, com a memória,
com a aprendizagem e com as funções paranormais,
segundo Cerviño, como já foi dito (FEB, 1968). Sua expressão
eletroencefalográfica são as ondas Teta, medidas
por meio de eletrodos localizados nessas regiões
profundas, e seu efeito mais característico é o da alucinação.


Entre os antagonistas dos psicotomiméticos se destacam
o haloperidol, a cloropromazina e a tioridazina. A
experiência pessoal do autor indica que o uso dos neurolépticos
inibe não apenas os sintomas produtivos psicóticos
propriamente ditos, como os fenômenos mediúnicos,
tanto de feição paranormal como os francamente mórbidos,
classificados por Allan Kardec como obsessão simples,
fascinação e subjugação. Em Psicopatologia não é
possível a distinção nítida desses fenômenos, que quase
sempre ocorrem misturados entre si. Aliás, essa dificuldade
também foi crucial no desenvolvimento da Psiquiatria,
que abandonou o conceito clássico das entidades nosológicas
para se utilizar do conceito mais correto de síndro-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mes psicopatológicas, conforme foi dito anteriormente. A
Psicofarmacologia ainda não decifrou os mecanismos de
ação da maioria dessas drogas, que são eminentemente
empíricas, cuja descoberta se deu casualmente, tal como
a cloropromazina.

Diversos autores enfatizam a possibilidade da eclosão
de um surto psicótico, abrupto ou não, associado ao
uso dos psicodislépticos. O seu uso, mesmo experimental,
é contra-indicado em pessoas com alguma enfermidade
somática crônica, pacientes "borderline", pré-psicóticos,
psicóticos, personalidades psicopáticas ou com um
ego fraco ou mal estruturado, nos histéricos, nas infecções
agudas ou crônicas, na gravidez, em depressões graves,
em pessoas delinqüentes, isoladas, com conflitos matrimoniais
ou existenciais graves etc.

Um dos campos da ciência que mais profundamente
tem estudado os efeitos dos psicodislépticos é o da
Psicologia Transpessoal, com eminentes autores, destacando-
se Stanislav Grof.

Esse autor critica a tendência, dentro da ciência
contemporânea, de rotular tais experiências como sendo
psicóticas ou a considerá-las como sintomas manifestos
de doenças mentais, talvez devido ao fato de que experiências
semelhantes possam ser observadas em pacientes
esquizofrênicos.

Grof considera a aceitação não tendenciosa desses
fenômenos como fundamentais para a compreensão
mais aprofundada da personalidade humana. Exemplificando
essa atitude tendenciosa, Freud equacionou a religião
com rituais simbólicos e tentou explicá-la em termos
de conflitos não resolvidos da psique infantil e em termos
da sexualidade infantil. Já foi dito como Jung esclareceu
essa tentativa de Freud de mascarar os fenômenos ditos

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 23 1


ocultos com o manto prestidigitador da Teoria do Determinismo
do Desenvolvimento Psicossexual. A maioria
dos estudos da Psicologia experimental, bem como dados
antropológicos, tendem a infirmar essa suposição de
Freud, embora a existência dos fenômenos paranormais
ainda esteja longe dum consenso entre os cientistas.

William James (1902), M. Laski (1962), Assaglioli
(1965) e Maslow (1969), construíram os alicerces de uma
nova concepção da Psicologia, baseada nas observações
de experiências culminantes de ocorrência espontânea.
Criaram-se técnicas de laboratório, tais como a privação
ou sobrecarga sensorial, o emprego de "feed back", de
ondas alfa e teta para o controle voluntário de estados internos,
o uso de vários aparelhos sinestésicos, novas
modificações da hipnose etc. Lamentavelmente o Espiritismo
foi pouco estudado pela maioria dos autores científicos
dos círculos acadêmicos, provavelmente devido à
sua pequena difusão nos países anglo-saxônicos, muito
mais avançados no campo da pesquisa científica em praticamente
todos os setores.

Grof é criticado justamente pelo fato de se utilizar
do LSD como meio sistemático de definir e descrever as
experiências transpessoais. O mediunismo é um método
muito mais seguro, uma vez que não artificial, mais natural,
profícuo e socialmente aceitável que os métodos químicos.
Na experiência do autor, as vivências psicodélicas,
embora algumas mais ou menos autênticas, seriam
meras caricaturas das vivências mediúnicas ou produzidas
peia Yoga, por exemplo, mais naturais e mais facilmente
integradas pelo eu.

As vivências mediúnicas promovem um desenvolvimento
natural da personalidade, quando bem dosadas,
com menos riscos individuais, especialmente quando de-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


senvolvidas em grupos sérios e voltados para os valores
positivos da Filosofia e da Religião.

Basicamente os psicólogos transpessoais buscam
estudar vivências ditas transpessoais, definidas como
uma experiência que envolve uma expansão ou extensão
da consciência para além dos limites usuais do ego, bem
como dos limites impostos pelo denominado "continuum"
espaço-tempo. Essas peculiaridades são também características
do transe mediúnico, conforme já foi estudado.

Um dos maiores inconvenientes das sessões psicodélicas,
segundo seus adeptos, são as experiências ditas
"sem saída" ou infernais. São geralmente caracterizadas
por um escurecimento admirável do campo visual e por cores
bastante sinistras e ominosas. Os sujeitos sentem-se enjaulados
e presos numa situação claustrofóbica sem saída,
e experimentam incríveis torturas psicológicas e até mesmo
físicas, numa situação totalmente insuportável, vivenciada
como sem fim e sem esperança, sem nenhuma possibilidade
de escapar nem no tempo nem no espaço, nem mesmo
pelo suicídio (Grof). Geralmente são acompanhadas por
sentimentos de culpa, inferioridade, agonia, solidão metafísica,
alienação, desamparo, e desespero, podendo contatar
figuras semelhantes a Sísijo, Tântalo, Íxion, Prometeu etc.
(idem). Também podem ocorrer excitação de natureza sexual
intensa, mesclada com agressão excessiva, orgias de
feição sado-masoquista, com visões de assassinatos sangüinários,
torturas, crueldades de todos os tipos. Grof denomina
essa experiência de "êxtase vulcânico" e cita a seguinte
experiência:

"Uma paciente tratada pela terapia psicolítica, por
causa de sua cancerofobia intensa e de sua sintomatologia
de psicose fronteiriça, teve, num estágio avançado de tratamento
com quatro sessões consecutivas de LSD, vi-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


vencias que consistiram quase exclusivamente de cenas
e seqüências que se deram em Praga, no século XVII.
Esta época foi um período bastante crucial na história
tcheca; após a perda da Batalha da Montanha Branca,
em 1621, que assinalou o início da Guerra dos Trinta
Anos, na Europa, o país deixou de existir como um reino
independente e ficou sob a dinastia dos Habsburgos.
Num esforço para destruir os sentimentos de orgulho nacional
e para anular as forças de resistência, os Habsburgos
enviaram mercenários para capturar os nobres mais
proeminentes do país. Vinte e sete membros destacados
da nobreza foram então decapitados pelos Habsburgos.
Numa seqüência bastante dramática, a paciente finalmente
reviveu, com fortes emoções e com bastante detalhes
os eventos reais de execução, incluindo a angústia
terminal e a experiência de agonia."

É interessante notar que posteriormente Grof descobriu
que a árvore genealógica da família da paciente
indicava serem eles descendentes de um dos nobres que
foram executados após a Batalha da Montanha Branca.
Grof considera essa observação clínica "um problema de
difícil interpretação dentro da estrutura de paradigmas
tradicionalmente aceitos". Ora, dentro dos paradigmas
espíritas, a interpretação das possíveis interações fica
bem mais acessível.

Alguns raros pacientes apresentaram experiências
intimamente relacionadas às sessões espíritas: o sujeito
exibe sinais de transe mediúnico, sua expressão facial é
transformada surpreendentemente, seu semblante e seus
gestos parecem estranhos e sua voz é dramaticamente
modificada. Ele pode falar numa língua estrangeira, escrever
textos automaticamente e produzir desenhos hieroglíficos
obscuros, ou desenhar quadros estranhos e

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ininteligíveis. Ou encontrar-se com corpos astrais ou entidades
espirituais de pessoas já falecidas, ou então uma
comunicação extra-sensorial com elas (Grof). Esse autor
cita um exemplo clínico:

"Após termos cruzado o limiar entre a vida e a morte,
eu me encontrei num mundo misterioso e ameaçador.
Todo ele estava cheio de éter fluorescente, de uma natureza
estranhamente macabra. Um número infindável de
almas de seres humanos falecidos estava suspenso no
éter fluorescente; em atmosfera de estranha angústia e
de excitamento inquietantes eles estavam me enviando
mensagens não-verbais, através de alguns canais extra-sensoriais
inindentificáveis. Eles pareciam extremamente necessitados,
e era como se quisessem algo de mim. Em
geral, a atmosfera me fez recordar as descrições do submundo
que li na literatura grega (...) meu pai estava presente
nesse mundo com um corpo astral; seu corpo astral
estava como que superposto ao meu (...) Foi a experiência
mais ameaçadora de minha vida." (Idem.)

Como se vê, as sessões experimentais da Psicologia
Transpessoal tendem, também, a confirmar a Doutrina
Espírita.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


VIII
DOENÇ A MENTA L E MEDIUNISM O


O conceito de doença mental foi introduzido no
campo das ciências médicas, contra muitas resistências,
a partir do gesto de Philippe de Pinel, rompendo as cadeias
dos alienados da Bicêtre, e de outros médicos que

o acompanharam (Ey).
Esses pioneiros humanitários libertaram os doentes
mentais de seus entraves mais terríveis. Pode-se dizer
que a Psiquiatria, como um ramo da Medicina, nasceu
das exigências éticas, filosóficas e sociais, que elaboraram
o conceito de Doença Mental como um fator imprescindível
no campo das ciências médicas (idem).

Posteriormente, os avanços dos conhecimentos fisiopatológicos
das ditas funções instrumentais da vida de
relação, isto é, do sistema nervoso, consolidaram esse
conceito. Assim, o conceito evoluiu das superstições demonológicas
da Idade Média para os rigores do cientificismo
atuais, se é licito expressar-se dessa maneira. Todavia,
essa evolução das doenças mentais para o campo
das ciências naturais teve o seu ponto de partida com o
grande médico da antiguidade grega, Hipócrates, que in-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


troduziu as primeiras interpretações naturalistas. O termo
histeria, por exemplo, foi criado pelo denominado Pai da
Medicina.

Houve um retrocesso, durante a Idade Média, com
os exageros da possessão demoníaca, mas esse rigor
teológico teve pelo menos um aspecto positivo: contribuiu
para clarear os limites da vida psíquica normal e patológica.


Retrocedendo no tempo, mais uma vez, veio o Cristianismo
com o estabelecimento do valor intrínseco do
homem. Na Antiguidade, esse valor não existia, em absoluto.
Os reis eram divinizados e adorados como tais, ao
passo que os escravos eram despojados de qualquer dignidade
humana, enquanto que os homens livres não tinham
individualidade própria. O único critério de valoração
do indivíduo era a origem, por nascimento, real, nobre,
plebéia ou escrava.

Outro importante avanço na compreensão do homem,
segundo H. Ey, veio com a Reforma, apregoando o
livre exame da consciência religiosa, libertando o componente
psicológico da personalidade humana. Todavia, a
libertação da tirania intelectual, exercida durante séculos
pelo pensamento católico romano dominante, conduziu o
pensamento ocidental a um outro exagero: o materialismo
científico, que despojou o homem de qualquer componente
de feição espiritual, produzindo uma atitude desequilibrada,
denominada pelo autor como Complexo de
Lavoisier, já descrito nos capítulos precedentes.

Foi esse desequilíbrio materialista que gerou a Psiquiatria
mecanicista do século XIX. Paralelamente a esse
desenvolvimento teórico, as instituições assistenciais
evoluíram, a partir dos numerosos monastérios hospitais
medievais, para os hospícios, sanatórios, casas de re-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pouso, hospitais psiquiátricos, enfermarias psiquiátricas
em hospitais gerais, culminando com as técnicas de A.
Meyer de "open doors", "no restraint" etc. dando ênfase
especial à ressocialização e terapia ocupacional ("Christian
Science" de Meyer). Assim, houve uma evolução
no conceito de doença mental, apesar de alguns retrocessos,
desde os excessos da possessão demoníaca até
a influência materialista na Psiquiatria mecanicista do século
passado. Com o Espiritismo abriram-se novos caminhos
à compreensão do ser humano integral.

Contudo, essa evolução não foi pacífica nem livre de
percalços, e se existe um ramo da Medicina onde reina
confusão e contradição é justamente o campo que lida
com as doenças mentais, não existindo consenso nem mesmo
sobre a delimitação entre a saúde e a doença (Ey).

Segundo a organização Mundial de Saúde, o conceito
de saúde deve incluir um completo bem-estar físico,
mental e social. Com tal abrangência fica difícil a delimitação
dos conceitos de saúde e doença. Convém antecipar
aqui que, com o Espiritismo, tal conceito ganha uma
nova dimensão, que se vem agregar às anteriormente citadas,
ou seja, a dimensão espiritual, o que aumenta
enormemente a complexidade do tema. É conveniente
repisar aqui o caráter científico da Doutrina Espírita, que
de modo algum abdica dos modernos avanços da Anatomia,
da Fisiologia, da Bioquímica, da Patologia Geral e
da Psicopatologia em particular, passando, pois, necessariamente
pelos campos da Psiquiatria, da Psicologia,
da Antropologia, da Psicofarmacologia etc. etc , como se
tem tentado demonstrar ao longo do presente trabalho.

Para a Psiquiatria mecanicista do século passado,
as doenças mentais seriam simples agregados de sintomas
específicos de lesões cerebrais. Assim, a doença

23 8 PSIQUIATRI A E MEDIUNISM O


mental foi despojada do elemento psíquico, ainda que
isso seja um verdadeiro paradoxo. Essa escola tomou
como protótipo das doenças mentais a paralisia geral
(neuro-sífilis), doença provocada pela infecção do sistema
nervoso central pela bactéria Treponema pallidum.

Assim, em lugar de uma Psicopatologia, foi criada
uma anatomia patológica dos sinais e sintomas das
doenças mentais. Foi a época dos grandes médicos alienistas
sistematizadores como Esquirol, Morel, Kraepelin
(certamente o maior deles), Falret, Hecker, Kahlbaum,
Magnan, Wernicke, Kleist etc.

A Psiquiatria Clássica se assentava em três teses
fundamentais:
1º) Redução do quadro clínico a um sintoma basal,
ou a uma coleção deles.
2°) Interpretação desse sintoma por uma patogenia
mecânica das localizações cerebrais.

3º) Exclusão de todo fator psíquico da etiologia e da
estrutura das doenças mentais. Exemplificando, os sintomas
foram reduzidos a mecanismos simples, tais como
problemas associativos, problemas de memória, hipertimia,
alucinação, obsessão, sugestão, esquema corporal
etc.

Como já foi dito, apesar do furor das sessões de
anatomia patológica, essa corrente mecanicista não resistiu
à realidade dos fatos. O sistema nervoso central
tem mecanismos de funcionamento que vão muitíssimo
além de sistemas tais como cardiovascular, hematopoético,
digestivo etc. Destarte, o mito das "entidades nosológicas"
dos alienistas clássicos, conduziu aos "tipos sindrômicos"
que são ainda a base da Psiquiatria clínica.

A monomania de Esquirol cedeu lugar às neuroses
obsessivas, à paranóia etc. A "folie circulaire" de Falret

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


evoluiu para a psicose maníaco-depressiva de Kraepelin.
A hebefrenia de Hecker e a catatonía de Kahlbaum foram
agrupadas por Kraepelin no grupo da "dementia praecox",
que depois cedeu lugar para o mais moderno conceito
de GRUPO das esquizofrenias de Bleuler (1911).
As síndromes tóxico-infecciosas de Régis foram agrupadas
na reação exógena de Bonhoeffer, e assim sucessivamente.


Surgiu um novo movimento de tendência psiquista,
que deu notáveis contribuições para a compreensão das
doenças mentais, seguindo a cadeia dos grandes médicos
clínicos pensadores.

Por um lado, a filosofia dominante passou a ser a
do problema da vida interior do homem e das forças subjetivas,
através dos filósofos Kant, Scheling e Schopenhauer,
filosofia essa menos racional e mais intuitiva, advogando
também a causalidade psíquica na patogenia
das doenças mentais.

No campo das ciências médicas, a corrente iniciou-se
com Anton Mesmer, criador da escola fluidista, Braid, criador
da escola psiquista, Berheim, Charcot, genial neurologista
parisiense que iniciou os estudos científicos da histeria,
Pierre Janet e finalmente Freud, com a culminância provável
em Carl Jung. Mas a evolução não parou ainda e está
bastante longe de ser concluída. Na América do Norte, a
grande reação ao mecanicismo partiu, inicialmente, de Adolf
Meyer, que introduziu o conceito de multiplicidade das causas
da reação psicológica, criando a Teoria Biopsicológica,
acabando com a nosología clássica.

A nova Semiologia procurou um sentido que uniformizasse
e harmonizasse a heterogeneidade aparente da
sintomatologia das doenças mentais. Modificou-se o conceito
de localização cerebral, por falta de bases anato-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mofisiológicas, levando ao novo modelo de organização
de funções, destacando a doença mental como liberação
das instâncias inconscientes do ser, ou seja, as funções
mentais como produto do funcionamento "in totum" do
sistema neuro-endocrínico (Ey).

Com os estudos fornecidos principalmente pelas
neuroses histéricas, as doenças mentais pouco a pouco
se desmaterializaram. Isso se deu graças às concepções
psicogenéticas, em oposição às concepções mecanicistas
que se mostraram inviáveis na maioria dos casos.

.Segundo essas concepções, a doença mental é o
efeito de causas psíquicas, é de natureza psíquica e tem
uma motivação psíquica. São secundárias a situações vivenciais
insatisfatórias ou a tendências inconscientes. A
partir da primeira hipótese, surgiu a Fenomenologia, e da
segunda, a Psicanálise. Segundo a primeira hipótese, as
causas das doenças mentais são de origem socio-psicogenéticas,
sendo produto da situação patogênica ou da
acumulação de dificuldades vitais. Contudo, contra essa
teoria, nem todos os indivíduos têm as mesmas reações
nas mesmas situações existenciais. Já com a segunda
hipótese, a psicodinâmica, o doente não exprime as dificuldades
vitais da situação externa, presente, mas sim,
simbolicamente, situações internas profundas e arcaicas,
inconscientes.

Não parece muito difícil demonstrar que ambas as
hipóteses podem ser verdadeiras, dependendo do caso,
e esse foi o pensamento de Jung. Também está claro
que a hipótese mecanicista é a correta em outros casos,
como, por exemplo, os tumores cerebrais e suas complicações
psiquiátricas. A todas elas, a Doutrina Espírita
abarca e acrescenta uma outra hipótese, ainda mais ampla
e vasta, ou seja, a atuação, em determinados casos,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


de entidades espirituais, como será visto mais pormenorizadamente
adiante, ou ainda a eclosão de sinais e sintomas
mentais cujas bases se assentam em desajustes
cármicos do perispírito.

À medida em que ia aumentando o número das
análises patológicas dos cérebros de doentes mentais falecidos,
e que iam se aperfeiçoando as técnicas de análises
histológicas microscópicas e bioquímicas, ficou demonstrada
a insuficiência da postura radical da Teoria
das Localizações Cerebrais. Permaneceram de pé somente
aquelas doenças enquadradas pela "Classificação
Internacional de Doenças" com os números 290 (Quadros
psicóticos orgânicos senis e pré-senis), 291 (Psicoses
alcoólicas), 292 (Psicoses por drogas), 293 (Quadros
psicóticos orgânicos transitórios) e 294 (Outros quadros
psicóticos orgânicos crônicos) (Nona revisão).

Na vertente psicodinâmica, Sigmund Freud devassou
os escaninhos da mente, como nunca se tinha feito
anteriormente, e introduziu o extraordinário conceito de
Inconsciente. Contudo, ao se aprofundar, estacou diante
do que denominou de "onda negra do ocultismo" (Jung) e
refugiou-se na Teoria da Sexualidade. Atualmente, a
maioria das idéias de Freud têm sido informadas pelas
modernas pesquisas psicológicas e antropológicas.

Carl Jung, o psicólogo mais em evidência depois de
Freud, segundo Hall e Lindzay, aprofundou-se na pesquisa
do inconsciente e abriu à Medicina as perspectivas
dos fenômenos sincronísticos e parapsicológicos. Estabeleceu
a existência da alma como coisa, embora muitos
possam discordar dessa interpretação do pensamento
junguiano. Infelizmente, a Metapsíquica de Charles Richet,
bem como o Espiritismo, codificado por Allan Kardec,
não tiveram penetração nos meios acadêmicos.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


De um modo geral, porém, parece haver certa concordância
com o fato de ser a doença mental o fruto da
dissolução ou da imaturação, disgenesia ou desestruturação
da totalidade do organismo, levando a um modo de
vida regressivo. Assim, a patologia mental constitui uma
tentativa de reorganização, por parte do indivíduo, a partir
da massa de existência humana subsistente. A Doutrina
Espírita vai além, ao estabelecer um componente teleológico
para a doença mental, como um mal necessário, imposto
por contingências cármicas, como será explicitado
mais adiante. Contudo, não se deve cair no exagero de
crer que tudo seja cármico. Além das vivências expiatórias,
existem as provações e as missões.

Assim, sobre os sintomas deficitários, ou primários,
se agregam os sintomas secundários ou positivos, que
derivam da vida psíquica engajada no problema, qualquer
que seja a sua etiologia. Contudo, convém repisar o
fato fundamental de que a patologia mental não pode dispensar
também uma perspectiva genética. Além disso,
de acordo com grande número de autores, o fenômeno
sonho-sono é de grande importância para a compreensão
dos estados psicopatológicos.

Entretanto, as tentativas de criar-se uma semiologia
psiquiátrica têm recebido críticas as mais variadas, de
autores de diferentes escolas.

G. Lanteri-Laura refere que, nas obras de Psiquiatria
Clássica, a semiologia figura como o aspecto mais falho,
mais redundante e mais disparatado da obra. Devido
a isso, foi rebaixada a certo grau de descrédito. Segundo
esse psiquiatra da escola francesa, as oposições mais
acusativas dos modernos psiquiatras contra a semiologia
seguem três temas principais:
Em primeiro lugar, os sinais não seriam mais que

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


projeções do clínico e lhe permitiriam defender-se do paciente,
comprimindo-o e alienando-o no "status" de doente
mental.

Em segundo lugar, a pesquisa dos sinais serviria
para bloquear a atitude terapêutica, perdendo tempo com
a anamnese, em vez de dispensar cuidados mais urgentes.


Finalmente, segundo esses autores, a patologia
mental seria enganadora e não se justificaria a procura
dos sinais, pois somente existiria a unicidade da patologia
mental, arrastando a obscuridade da semiologia psiquiátrica.


No pensamento do autor, essa confusão e essa
contradição apresentam duas conseqüências, uma de ordem
teórica e outra de ordem prática.

Do ponto de vista teórico, a situação reflete o dito
popular que diz "na casa onde não há pão, todo mundo
chora e ninguém tem razão". Isso implica o fato de que
certamente tanto as teorias mecanicistas quanto as teorias
psicogenéticas não esgotam, em absoluto, o assunto.
Isso porque o homem é um organismo material, não
existe a menor dúvida, mas é também possuidor de uma
alma, que tem existência "per se" e um dinamismo característico
próprio. E um dos desenvolvimentos teóricos que
complementam a Psiquiatria de modo mais perfeito é justamente
a Doutrina Espírita, em suas três vertentes: científica,
filosófica e religiosa. Ao soma ela acrescenta o psicossoma
ou corpo espiritual, funcionando ambos de
modo integrado e sinergístico tanto na saúde como na
doença.

Assim, longe de contradizer a Medicina, em geral, e
a Psicologia, a Psiquiatria e a Psicopatologia, em particular,
ela complementa e esclarece, ao agregar um mundo

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


novo e insuspeitado, definido no plano espiritual. Isso
porque ela é basicamente uma teoria dualista psicofísica
interacionista.

Alguns grandes psiquiatras já vislumbraram esse
novo mundo espiritual, refletindo nas profundezas da
mente de seus clientes, e por que não dizer também de si
próprios? Richard Evans, entrevistando Jung, transcreveu
o seguinte: "O eu é meramente um termo que designa
a personalidade. A personalidade do homem, como
um todo, é indescritível. A sua consciência pode ser descrita;
o seu inconsciente não pode ser descrito porque
(...) repito uma vez mais (...) é sempre inconsciente. E
como é realmente inconsciente, o homem não o conhece.
E, assim, desconhecemos nossa personalidade inconsciente.
Ninguém pode dizer onde termina o homem. É aí
que está a beleza da coisa. Todo o seu grande interesse.
O inconsciente humano oculta sabe Deus que segredos.
Temos ainda grandes descobertas a fazer."

É interessante notar que, no próprio plano espiritual,
essas profundezas permanecem incognoscíveis para a
maioria absoluta dos Espíritos, a deduzir-se da seguinte
passagem de André Luiz, ao discorrer sobre a corrente
mental: "Nasce das profundezas da mente, em circunstâncias
por agora inacessíveis ao nosso conhecimento,
porque, em verdade, a criatura, pensando, cria sobre a
Criação ou pensamento concreto do Criador" ("Mecanismo
da Mediunidade" pág. 82). Esse autor espiritual se refere
também ao pensamento "(...) em que se exprimem
as legiões angélicas, através de processos ainda inacessíveis
à nossa observação (...)" (idem, pág. 44). Contudo,
é bom repisar que, segundo a Doutrina Espírita, a mente
ainda é matéria: "Como alicerce vivo de todas as realizações
nos planos físico e extrafísico, encontramos o pen-

PSiQUIATRIA E MEDIUNISMO


samento por agente essencial. Entretanto, ele ainda é
matéria — a matéria mental, em que as leis de formação
das cargas magnéticas ou dos sistemas atômicos prevalecem
sob novo sentido (...)" (idem, pág. 45).

Quanto às conseqüências práticas, resultantes da
grande contradição existente entre os teóricos a respeito
do conceito de doença mental, elas são de menos importância
para a terapêutica por um motivo fundamental: no
processo terapêutico, o fator determinante não são os conhecimentos
teóricos do psicoterapeuta, mas o padrão
básico da sua personalidade como um todo (Malpass).
Além dos aspectos científicos, tomam parte os aspectos
emocionais, a empatia, a capacidade inerente de compreender
e ajudar. Aqui entra em campo a Psicologia Médica,
que estuda a relação médico-paciente. Aos avanços
da Psicologia Médica, bem como aos aspectos transferenciais,
o Espiritismo acrescenta a troca fluídica entre o
terapeuta e seu cliente (aspectos biomagnéticos e mentomagnéticos).


É fato conhecido, mas não explicado, pelos médicos,
a capacidade de determinados terapeutas em realizar
diagnósticos de modo correto e a capacidade quase
mágica de realizar curas. A essa faculdade os médicos
costumam dar o nome "olho clínico", sem saber bem o
que seja. Aqui, também, a Doutrina Espírita explica, plenamente,
sendo que existe uma modalidade especial de
mediunidade denominada mediunidade de cura, na qual

o indivíduo libera uma incomum quantidade de elementos
biomagnéticos de feição curadora. Essa faculdade não é
fantasiosa, e já era conhecida nos tempos do advento do
Cristianismo: "E uma mulher, que tinha um fluxo de sangue,
havia doze anos, e gastara com os médicos todos
os seus haveres, e por nenhum pudera ser curado. Che-
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


gando por detrás dele, tocou na orla do seu vestido, e
logo estancou o fluxo do seu sangue. E disse Jesus:
quem é que me tocou? E negando todos, disse Pedro e
os que estavam com ele: Mestre, a multidão te aperta e
te oprime e dizes: Quem é que me tocou? E disse Jesus:
Alguém me tocou, porque bem conheci que de mim saiu
virtude. Então, vendo a mulher que não podia ocultar-se,
aproximou-se tremendo, e, prostrando ante ele, declarou-lhe
diante de todo o povo a causa por que lhe havia tocado,
e como logo sarara. E ele lhe disse: Tem bom ânimo filha,
a tua fé te salvou; vai em paz" (Lucas, Cap. 8, vv 43
a 48).

Esse fenômeno não tem nada de milagroso, perante
a Doutrina Espírita, e demonstra muito bem a que profundezas
pode chegar a relação médico-paciente. Ao explicar
o fenômeno, sem ab-rogar as leis naturais, o Espiritismo
não diminui, em absoluto, a grandeza inerente à personalidade
de Jesus. Aliás, não são incomuns, nos hospitais,
casos de pacientes se recuperarem de um modo
que contraria todas as expectativas dos melhores especialistas.
A recíproca também pode ocorrer. A Psicologia
Médica, disciplina que estuda a relação médico-paciente,
ainda tem um longo percurso à sua frente, e sem sair dos
limites das ciências naturais.

Além desses aspectos teóricos e práticos já citados,
a respeito das doenças mentais, existe um terceiro aspecto
importantíssimo, mas sistematicamente ignorado
ou suprimido pela quase totalidade dos teóricos. Trata-se
da vertente moral da vida psíquica, tanto na saúde como
na doença. Essa escotomização talvez seja uma defesa
contra o passado demonológico a que esteve ligado o
conceito de doença mental.

Esse tema é cheio de preconceitos, prejuízos, tabus

24 7

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


e obstáculos de toda espécie. Isso porque é praticamente
impossível evitar o efeito, por vezes devastador, de juízos
de valor, até certo ponto distorcidos por problemas de ordem
pessoal, cultural ou até mesmo religiosa. Talvez seja
mais prudente e seguro evitar tal assunto, mas o objetivo
do presente estudo, sendo eminentemente de natureza
prática, obriga enfrentar um tema tão espinhoso.

Os psiquiatras alemães Stahl e Heinroth tentaram
explicar a etiologia das doenças mentais como sendo
fruto ou expressão de um mal moral, efeito da culpa, do
pecado, do erro e dos tormentos que a consciência culposa
impinge a si mesma. Esse posicionamento seria
evidentemente incorreto, se generalizado, mas em alguns
casos, segundo Jung, a culpa bem que pode explicar a
etiopatogenia de determinados distúrbios psíquicos, com

o que concorda o Espiritismo.
Em geral, os grandes escritores penetram na alma
das pessoas de um modo muito mais completo do que a
grande maioria dos terapeutas. A vertente moral de um
caso específico de doença mental foi descrita com genial
penetração pelo grande escritor russo Dostoievski na
obra "Crime e Castigo", que de modo algum está desprovida
de valor clínico. Esse autor foi tão perspicaz na descrição
e compreensão da doença do seu personagem
que, muitos anos antes de Bleuler, já o denominou Raskolnikof,
que em russo significa fendido, termo muito semelhante
a esquizofrênico. A culpa foi o "leitmotif" da
doença de Raskolnikof.
Que a culpa também possa levar à doença mental
foi uma percepção de Spinosa, aqui citado por William
James: "Pode-se talvez esperar que as torturas da consciência
e o arrependimento ajudem a trazê-los para o
bom caminho, e pode-se, em vista disso, concluir (como

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


todo mundo conclui) que essas afeições são coisas
boas. Entretanto, se examinarmos a questão mais de
perto, descobriremos que elas não são boas, senão,
pelo contrário, paixões más e deletérias. Pois é manifesto
que podemos sempre tirar maior proveito da razão
e do amor da verdade do que da perturbação da
consciência e do remorso. Nocivos e maus são estes
últimos, na medida em que formam uma espécie particular
de tristeza" (op. cit.).

Com esta postura concorda, certamente, a Doutrina
Espírita, pois, na obra do autor espiritual Emmanuel
"Pensamento e Vida", encontra-se a descrição do que ele
denominou "abscessos mentais" (FEB, 1958). No capítulo
22, tem-se que "Quando fugimos ao dever, precipitamo-
nos no sentimento de culpa, do qual se origina o remorso,
com múltiplas manifestações, impondo-nos brechas
de sombra aos tecidos sutis da alma". E que "É nesse
estado negativo que, martelados pelas vibrações de
sentimentos e pensamentos doentios, atingimos o desequilíbrio
parcial ou total da harmonia orgânica, enredando
corpo e alma nas teias da enfermidade, com a mais complicada
diagnose da patologia clássica". Como se vê, as
semiologías psiquiátrica e espiritual, se é que se possa
fazer tal dicotomia, estão intimamente relacionadas.

Esse autor espiritual envereda também nos meandros
da terapêutica: "Cair em culpa demanda, por isso mesmo,
humildade viva para o reajustamento tão imediato quanto
possível de nosso equilíbrio vibratório, se não desejamos o
ingresso inquietante na escola das longas reparações."

Desta maneira, o Espiritismo, além de corroborar a
Psicopatologia, amplia os seus horizontes, ao revelar que
algumas doenças mentais se prolongam após a morte do
corpo físico, e que a etiologia de outras tantas está asso-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ciada a processos de influenciação por parte de entidades
espirituais, tais como obsessão simples, a fascinação
e a subjugação.

De acordo com André Luiz ("Evolução em dois Mundos"),
"(...) o corpo espiritual preside no campo físico a
todas as atividades nervosas, resultantes da entrosagem
de sinergias funcionais diversas (pág. 124). E que os fenômenos
patológicos susceptíveis de ocorrer (...) em alguns
dos setores corticais do corpo físico podem surgir
igualmente no corpo espiritual, quando a turvação da
mente é capaz de obstruir temporariamente esse ou
aquele fulcro energético da região diencefálica, no centro
coronário da entidade desencarnada" (pág. 126).

Em seguida descreve um dos possíveis mecanismos
de psicose espiritual "(...) pode sofrer disfunção específica
pela qual um Espírito desencarnado contemplará
tão-somente, por tempo equivalente à conturbação em
que se encontre, os quadros terríveis que lhe digam respeito
às culpas contraídas, sem capacidade para observar
paisagens de outra espécie; (...) com absoluto olvido
de fatos (...) o pensamento contínuo que lhes flui da mente,
em círculo vicioso sobre si mesmo, age coagulando
ou materializando pesadelos fantásticos, em conexão
com as lembranças que albergam" (pág. 127). Essa descrição
pode bem representar um tipo especial de autismo,
no plano espiritual, com alucinações correspondentes,
semelhando as monomanias da corrente alienista
francesa (psicoses).

Esse autor vai mais fundo na sua análise, ao declarar
que "(...) esses pesadelos não são realmente meras
criações abstratas (...) (mas são) formadas pelas partículas
vivas de matéria mental, e se articulam em quadros
que obedecem também à vitalidade mais ou menos longa

25 0 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


do pensamento, (...) que, congregando criações do mesmo
teor, de outros Espíritos afins, estabelecem, por associações
espontâneas, os painéis apavorantes em que a
consciência culpada expia (...)" (idem). Nessa mesma direção,
existe o pensamento de diversos psiquiatras convencionais,
entre os quais Jung, que admitem o caráter
até certo ponto contagioso de certos distúrbios mentais.

Continuando, nas págs. 213/214, tem-se que "a
etiologia das moléstias perduráveis, que afligem o corpo
físico e o dilaceram, guardam no corpo espiritual as suas
causas profundas (...) nódulo de forças mentais desequilibradas
(...) expressando as chamadas dívidas cármicas".
E que 'todo remédio da farmacopéia humana, até certo
ponto, é projeção de elementos quimioelétricos sobre as
agregações celulares, estimulando-lhes as funções ou
corrigindo-as (...). Na Espiritualidade, os servidores da
Medicina penetram, com mais segurança, na história do
enfermo, para estudar, com o êxito possível, os mecanismos
da doença (...)" "(...) na Espiritualidade Superior, o
médico não se ergue apenas com o pedestal da cultura
acadêmica (...) visto que a psicoterapia e o magnetismo,
largamente usados no plano extrafísico, exigem dele
grandeza de caráter e pureza de coração" (pág. 216).

Como se vê, a Doutrina Espírita amplia consideravelmente
o campo tanto da Psicologia normal como anormal.
Assim fica demonstrado, supõe-se, que tanto a unilateralidade
da Psiquiatria mecanicista, de um lado, quanto
a de alguns psiquistas, de outro, estão incorretas.
Aliás, já foi dito, com Aksakof, sobre a tendência dos espíritas
de atribuírem todos os sinais e sintomas à atuação
dos Espíritos. Aqui, como sempre, o bom senso deve
prevalecer, acima de condicionamentos unilaterais, tanto
de ordem teórica como prática.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Ao enfatizar os fatores genéticos, constitucionais,
culturais, além das existências passadas do indivíduo, a
Teoria Espírita ajuda na compreensão da etiopatogenia
e da terapêutica dos demais distúrbios mentais, tais
como as psicoses endógenas (CID 295, 296 e 297), as
psicoses outras (CID 298), as psicoses infantis (299).
Também o mesmo se dá em relação aos transtornos neuróticos
(300), de personalidade (301), sexuais (302), dependências
do álccol e outras drogas (303, 304 e 305),
os distúrbios psicossomáticos (306), o porquê de determinadas
reações ao "stress" (308), outras síndromes, tais
como as oligofrenias etc. etc. Contudo, não se deve cair
na interpretação simplória de que o Espiritismo tenha soluções
para tais distúrbios, mesmo porque explica que a
grande maioria tem causas cármicas. Mas "sedare dob rem
opus divinus est". Mesmo o Cristo realizou poucas
curas, a deduzir das descrições dos quatro evangelistas,
e sempre atribuía essas curas à fé dos enfermos.

Com o fito de demonstrar que a retomada da culpa,
como possível fator etiológico de certos distúrbios mentais,
não é mera superstição, mas uma postura científica,
será apresentado um caso descrito por Jung ("Fundamentos
de Psicologia Analítica", Zurich, 1935):

"A figura 6 é o caso de uma mulher de aproximadamente
trinta anos de idade.

Ela estava na Clínica e o diagnóstico era esquizofrenia
de caráter depressivo. A prognose era igualmente
negativa. A paciente estava sob minha responsabilidade
e eu tinha por ela um sentimento diferente. Era impossível
concordar com a prognose, pois a esquizofrenia já começava
a ser uma idéia relativa para mim. Eu acreditava
que somos todos um pouco loucos, mas essa mulher era
estranha e eu não podia aceitar o diagnóstico como últi-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ma palavra. Infelizmente, naquele tempo conhecíamos
muito pouco. É óbvio que fiz a anamnese, mas nada do
que foi descoberto esclareceu o caso. Foi quando a submeti
ao teste de associações, fazendo finalmente uma
descoberta estarrecedora."

Em seguida, Jung descreve o tortuoso caminho percorrido
para a descoberta das motivações subjacentes
aos sintomas esquizofreniformes. Trata-se do famoso
Teste de Associação de Palavras, importantíssimo instrumento
de investigação psicológica, e que veio a se tornar

o ponto de partida de praticamente todos os testes detectores
de mentira. Por ser uma investigação especializada,
serão suprimidos os passos dados, podendo ser pesquisados
na obra citada, pág. 77 (Editora Vozes, 1968). Relata
Jung: "E consegui fazê-la contar a história inteira."
"Na pequena cidade em que nascera havia um jovem
muito rico. Ela provinha de uma família financeiramente
estável, mas sem grande fortuna. O rapaz era da
aristocracia, possuía muito dinheiro; todas as garotas sonhavam
com ele, sendo pois o herói da cidadezinha.
Nossa paciente era bonita, e pensou que teria algumas
possibilidades em relação ao rapaz. Mais tarde descobriu
estar enganada e a família disse: 'A troco de que pensar
nele? É um homem rico e nem nota a sua existência.
Veja fulano de tal, um homem de bem. Por que não se
casa com ele?' E assim ela o fez, e os dois viveram perfeitamente
bem, até que um velho amigo da cidadezinha
natal foi visitá-la. Quando o marido saiu da sala, o cavalheiro
disse: 'Você fez certo cavalheiro sofrer muito' (referindo-
se ao antigo herói) — O quê? Eu o fiz sofrer? —
'Você por acaso não sabia que ele a amava, e teve um
choque quando soube do seu casamento?' Isso fez a
casa vir abaixo, mas a paciente conseguiu reprimir a

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


emoção. Quinze dias depois ela estava dando banho nas
crianças, um menino de dois anos e uma menina de quatro.
A água da cidade não era recomendável — não era
na Suíça que o caso se passava. Estava na verdade infectada
com febre tifóide. A mulher viu que a menininha
estava chupando uma esponja de banho. E não interferiu.
Quando o menino pediu água para beber ela lhe deu da
água possivelmente contaminada. A menina contraiu tifo,
morrendo logo depois. Mas o garoto conseguiu salvar-se.
Assim ela teve o que queria — ou o diabo queria dentro
dela: a recusa do casamento para poder casar-se com
outro homem. Considerando-se as coisas sob tal ângulo,
ela simplesmente cometera um assassínio. A paciente
não o sabia; apenas contou-me os fatos sem tirar a conclusão
de que era responsável pela morte da criança,
desde que sabia que a água estava infectada e que havia
perigo. Deparei-me com a questão de dizer-lhe, ou não,
que havia cometido um crime (era apenas a questão de
dizer-lhe, não havia a menor ameaça de processo criminal).
Se eu lhe dissesse a verdade, sua condição poderia
piorar muito, mas, de qualquer forma, já havia uma péssima
prognose; mas se ela pudesse tomar a consciência
profunda de seu ato, haveria chances de que sua doença
encontrasse cura. Afinal, tomei a decisão de dizer-lhe
simplesmente: 'Você matou sua filha.' Um forte estado
emocional a afogou, mas depois a paciente conseguiu
chegar à realidade dos fatos. Em três meses pudemos
dar-lhe alta e ela nunca mais voltou. Examinei-a durante
quinze anos e não houve recaída. A depressão anterior
adaptou-se ao seu caso: a paciente era uma criminosa
que em outras circunstâncias mereceria a pena máxima.
Praticamente salvei-a da loucura, colocando-lhe um enorme
fardo sobre a consciência. Quem aceita o seu pecado

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pode viver com ele. Se não aceitar tem de suportar as
inevitáveis conseqüências."

Lendo atentamente o livro, que descreve as conferências
realizadas em Tavstok, é espantoso constatar o
fato de as discussões passarem ao largo das implicações
morais do caso apresentado. Mais adiante, Jung critica a
audiência dizendo: "meus métodos não descobrem teorias,
mas sim fatos (...) Creio que os senhores confundem
muito teoria com fato" (op. cit, pág. 87).

Na obra "Ação e Reação", A. Luiz cita um caso de
psicose provocada por culpa, no plano espiritual: "(...) no
entanto, vergastado pelos remorsos, Ernesto entrou em
comunhão com impassíveis agentes das sombras, que o
fizeram presa de inomináveis torturas, por se recusar a
segui-los nas práticas infernais. Conservando no imo da
alma a lembrança da vítima, através da percussão mental
do arrependimento sobre os centros perispiríticos, enlouqueceu
de dor, vagueando por vários lustros, em tenebrosas
paisagens, até que, recolhido à nossa instituição, foi
convenientemente tratado para o reajuste preciso. Não
obstante, recuperado, porém, as reminiscências do crime
absorviam-lhe o espírito de tal sorte que, para o retorno à
marcha evolutiva normal, implorou o regresso à carne, a
fim de experimentar a mesma vergonha, a mesma penúria,
e as mesmas provas por ele infligidas ao irmão indefeso,
pacificando, desse modo, a consciência intranqüila.
(...) tornou ao campo físico, carreando na própria alma os
desequilíbrios que assimilou além do sepulcro, com os
quais renasceu alienado mental (...)" (pág. 237).

Na obra, já citada, "As Variedades da Experiência
Religiosa" (Ed. Cultrix) o eminente psicólogo norte-americano
William James trata do mesmo tema, especialmente
nos capítulos VI e VII, sob o título "A Alma Enferma".

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Para esse autor, existem pessoas para quem o mal
significa apenas um desajustamento com coisas, uma
correspondência errada entre a vida da pessoa e o ambiente.
Um mal dessa ordem, segundo o mesmo, é curável,
pelo menos em princípio, no plano natural, pois bastará
modificar o eu ou as coisas, ou ambos ao mesmo
tempo. Para outros, porém, o mal não é apenas uma relação
entre o sujeito e determinadas coisas externas, senão
algo mais radical e geral, um erro ou vício em sua
natureza essencial.

Esse autor eminente adverte, entretanto, que o conflito,
a culpa e a melancolia podem-se constituir num momento
essencial em toda evolução religiosa completa.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


IX
DOENÇA MENTAL DE FUNDO ESPIRITUAL

O presente capítulo é um aprofundamento e um desenvolvimento
do tema discutido no capítulo precedente.
O tema proposto é muito obscuro e de difícil apreensão,
e bem pode ser obstaculizado por uma série interminável
de escolhos. A história que se segue ilustra bem um dos
obstáculos a ser enfrentados, geralmente quase nunca
superados.

Quando acadêmico de Medicina, pôde o autor presenciar,
numa unidade de pronto-atendimento de um
grande Hospital Geral, o diálogo entre um velho sacerdote
católico, que prestava assistência espiritual aos doentes
internados, e um grupo de internistas, médicos residentes
e "staff". O religioso tentava explicar, com grande
entusiasmo, as diferenças existentes entre as doenças
do corpo, objeto das Ciências Naturais, segundo suas
crenças, e as doenças da alma, de natureza sobrenatural.
Qual não foi a surpresa ao observar que a audiência
caíra numa jocosa hilaridade, expondo o velho sacerdote
a uma situação constrangedora, grotesca e ridícula. Era
absolutamente impossível estabelecer um canal de co-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


municação entre a Medicina e a Teologia. O presente estudo
tenta demonstrar que a síntese é factível, entre a
Doutrina Espírita e as Ciências Naturais.

Felizmente, os rigores do Santo Ofício tornaram-se
impraticáveis, nos tempos modernos. O mesmo não se
pode dizer em relação ao pretérito. No dia 17 de fevereiro
de 1992, fez 392 anos que, em Roma, por decisão insistente
do Colégio dos Cardeais, na Praça das Flores,
acendeu-se a fogueira que consumiu um dos grandes
monumentos humanos — Giordano Bruno, que, como
outros, defendeu a liberdade de pensamento, o direito à
opinião e, mesmo sem ferir a intangibilidade dos dogmas
aceitos na época, morreu como herege. Não tem conta,
no hagiológio da Igreja Católica, as centenas de milhares
que caíram apodrecidas nas prisões ou torrados pelo
fogo da Santa Inquisição. Grandes figuras pagaram com
a vida as alucinações de Torquemada, entre outros (Austregésimo
de Athayde). Segundo Voltaire, a intolerância é
intolerável, porque afunda as suas raízes nos instintos
bárbaros do homem das cavernas, e os trogloditas não
acabaram, sobrevivendo com outras denominações, caldeados
na injustiça e na violência, quer física quer moral.

Realmente pode parecer, à primeira vista, hilariante
a simples referência às doenças mentais de fundo espiritual.
Contudo, os fatos coletados e estudados pela literatura
espírita demonstram a realidade dessa hipótese, que
não tem nada de milagrosa, mágica, misteriosa ou sobrenatural.
Isso porque os fatos estudados são naturais, embora
difíceis de ser submetidos aos rigores do Método
Científico, o que não implica, em absoluto, a sua infirmação.
Por mais paradoxais que sejam, não o são mais que
os problemas suscitados pelas partículas subatômicas,
conforme foi dito em capítulos precedentes.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Até hoje nenhum físico nuclear conseguiu isolar um
electrón, um méson etc., mas suas realidades são plenamente
confirmadas pelos estudos dos seus efeitos. O
mesmo se pode dizer em relação à mente a suas funções
transcendentes.

As doenças mentais de fundo espiritual podem
ocorrer pelo simples fato de não ser a mente um epifenómeno
do cérebro, ou um mero agregado de funções neuronais,
mas assenta suas bases funcionais nas profundezas
do próprio núcleo da personalidade que, como já foi
dito, é de natureza espiritual.

De acordo com o Espiritismo, e já foram dados
exemplos, existem patologias mentais as mais variadas
no próprio Plano Espiritual. A mente enferma, psicótica
ou não, carrega no cérebro perispiritual os mesmos sintomas
que a acometiam no plano físico, dependendo do
caso. O nível de desenvolvimento mental é fator importante,
no mundo espiritual, na determinação da saúde ou
da doença. Em outros termos, o grau de desenvolvimento
moral e espiritual é fator determinante de sanidade ou insanidade.
Mesmo patologias de fundo organo-cerebral
podem deixar suas marcas no funcionamento do cérebro
espiritual, com, um corolário de sinais e sintomas próprios,
após a morte do corpo físico, durante um período
de tempo mais ou menos longo, conforme as características
da personalidade desencarnada. A Doutrina Espírita
apresenta uma vasta casuística, relatada em sua extensa
literatura.

Não se pretende aqui afirmar que todos esses impressionantes
relatos sejam exatamente verídicos, em
face dos escolhos próprios do processo da percepção
mediúnica, que tem parentesco com os processos aluci-

PSIQUiATRIA E MEDIUNISMO


natórios, mas esse pormenor não implica a invalidação
da totalidade desses impressionantes relatos.

Como se explica o intrigante fenômeno das patologias
mentais de fundo espiritual? Em primeiro lugar, a
alma ainda é coisa, matéria, se bem que num modo diverso
de existência. Se a alma fosse imaterial, certamente
seria o nada, e o nada não existe, como já o demonstrou
a Física Moderna, com o complexo conceito einsteiniano
de campo.

Conforme já foi dito nos capítulos precedentes, o
comportamento do campo e das partículas subatômicas
levou a Física Moderna aos limites do mundo material,
defrontando-se com um abismo ainda inexplorado. Foi
dito também que esse abismo que está cerceando a moderna
Física é o limiar do vasto, ou infinito Plano Espiritual,
que também ainda contém matéria, conforme André
Luiz.

No Cap. II de "Evolução em dois Mundos" (FEB,
1958), esse autor espiritual aduz que o corpo espiritual
"não é reflexo do corpo físico, porque, na realidade, é o
corpo físico que o reflete, tanto quanto ele próprio, o corpo
espiritual, retrata em si o corpo mental, que lhe preside
a formação". Mais além, diz que "após a morte, é o
corpo espiritual o veículo físico por excelência, com sua
estrutura eletromagnética (...)".

Cumpre enfatizar que a Doutrina Espírita endossa,
com A. Luiz, a existência também de um corpo mental:
"assinalado experimentalmente por diversos estudiosos,
(o qual) é o envoltório sutil da mente, e que, por agora,
não podemos definir com mais amplitude de conceituação
(...) por falta de terminologia adequada no dicionário
terrestre" (op. cit, pág. 25).

Mais adiante, esse autor espiritual faz referência à

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


"estrutura mental das células", além da possibilidade de
renovação e transformação no comportamento celular,
mediante intervenções no corpo espiritual, recursos esses
que se popularizarão na Medicina terrestre do grande
futuro. Aqui está um dos possíveis mecanismos etiopatogênicos
das doenças mentais de natureza espiritual.

Quanto à anatomofisiologia da alma, esse autor
identifica a sede da mente no centro coronário, instalado
na região central do cérebro, que orienta a morfologia, a
fisiologia, a homeostasia, o metabolismo e a vida consciencial
da alma encarnada ou desencarnada (op. cit.,
pág. 26).

Outro postulado básico do Espiritismo é o fato de a
personalidade prosseguir no seu padrão básico de funcionamento,
mesmo após a morte do corpo físico, nos
planos espirituais. Continua com os mesmos anseios, impulsos,
idéias, conhecimentos, crendices, superstições,
traços temperamentais e caracterológicos, com os mesmos
propósitos e padrões de comportamento: revolta,
vindita, vingança, amor, conhecimento, cultura, sensualidade
etc.

Somente com o passar do tempo, e condicionadas
pelas novas experiências vividas no plano extrafísico, tais
características podem ser acentuadas ou atenuadas de
maneira parcial. A mudança radical do padrão básico da
personalidade somente será factível por meio de novos
procedimentos reencarnatórios, no plano da matéria densa.


Assim, o conceito de finalidade ou teleologia associado
à reencarnação é básico na Doutrina Espírita. Até
mesmo as doenças mentais possuem uma finalidade e
um propósito, embora quase impossíveis de serem encontrados.
Isso devido ao fato de, na maioria das vezes,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


se constituírem em remédios amargos, que a Lei de Causa
e Efeito impõe às personalidades recalcitrantes, cujo
comportamento extrapole os direitos e deveres ontológicos.


O Espiritismo tem um posicionamento diferente do
Budismo, por exemplo, para o qual, com a morte do corpo
material ocorre uma dissolução da personalidade
atual. Contudo, admite que a alma não está isenta de
processos ainda pouco esclarecidos de metamorfose
após a desencarnação. Esses mecanismos são revelados
pelo autor espiritual A. Luiz: "(...) o momento em que
se imobiliza na cadaverização, mumificando-se à feição
de crisálida (...) sob o governo dinâmico de seu corpo espiritual,
padece de extremas alterações que, na essência,
correspondem à histólise das células físicas, ao mesmo
tempo que elabora órgãos novos pelo fenômeno que podemos
nomear (...) como sendo histogênese espiritual
(...). Pela histogênese espiritual, os tecidos citoplasmáticos
se desvencilham em definitivo de alguns dos característicos
que lhes são próprios, voltando temporariamente,
qual se atendessem a processo involutivo, à condição de
células embrionárias multiformes que se dividem, através
da cariocinese, plasmando, em novas condições, a forma
do corpo espiritual, segundo o tipo imposto pela mente"
(op. cit., págs. 84 e 85).

Segundo esse autor, o desencarnado primitivo, ou o
doente mental, que não possui um fluxo de pensamento
adequado, "perde" o seu corpo espiritual, transubstanciando-
se num corpo ovóide" (op. cit., pág. 91 ; também
no livro "Libertação", FEB, págs. 84 e seguintes).

Aplicando uma análise psicopatológíca a essas personalidades
descritas por diversos autores espirituais,
poder-se-ia dizer que se trata de personalidades franca-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


mente psicóticas, com pensamento dereísta ou autista.
Psicologicamente falando, trata-se, de um processo extremo
de regressão, com dissolução das funções psíquicas
e perda do contato com a realidade. Quando tais personalidades
se reencarnam, os ovóides, provavelmente
seriam portadores de, ou tenderiam a desenvolver algum
quadro de psicose infantil, autismo infantil, oligofrenia ou
até mesmo disgenesias as mais variadas, podendo chegar
ao aborto, anencefalia, hidroencefalia etc. Esse pensamento
é uma suposição pessoal do autor.

Segundo a Doutrina Espírita, o que determina o estado
da personalidade além da morte do corpo físico é o
seu maior ou menor desenvolvimento moral. Esse desenvolvimento,
no entanto, deve ser natural, autêntico e total,
não significando uma simples introjeção de uma rígida
escala de valores, baseada em pura repressão. A Psicologia
já demonstrou que os aspectos mais importantes da
personalidade são inconscientes. Assim, uma personalidade
cujo Ego seja uma instância rígida, formalista, perfeccionista,
cujas virtudes foram auto-impostas à custa de
muita repressão, formação reativa, projeção, etc., de
modo algum seria considerada como sendo evoluída, no
plano espiritual. Tragicamente, personalidades muito reprimidas,
quando hiperbúlicas, tendem a se tornar projetivas,
quando não paranóides, e tendem a engrossar as fileiras
de líderes tenebrosos e fanáticos de diversas religiões,
como o exemplo citado de Torquemada. Os fariseus
foram descritos por Jesus como túmulos caiados
por fora e cheios de podridão por dentro.

O Prêmio Nobel de Literatura Herman Hesse captou
profundamente esses meandros da vida espiritual, bem
descritos na sua obra "Sidharta", onde apresenta uma
profunda análise psicológica, romanceada, entre o de-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


senvolvimento espiritual dos jovens Sidharta e Govinda.
Contudo, não se deve pensar que aquele autor prega alguma
modalidade de libertinagem como forma de desenvolvimento
pessoal e espiritual. Isso vem reforçar a idéia
de que o caminho é estreito, difícil, cheio de percalços,
como um "Fio da Navalha", outro romance com significado
espiritual. A obra do autor A. Luiz, "Ação e Reação"
(FEB, 1956), é toda ela versada sobre a causalidade psicológica
no plano espiritual, com suas implicações cármicas,
e merece ser profundamente analisada.

O que determina, pois, o estado psicológico da personalidade
depois da morte do corpo físico são as disposições
reais e não as imaginárias, é o seu centro real de
interesse espontâneo, o desenvolvimento total de sua
consciência, seus abandonos, seus desvalimentos, sua
maior ou menor integração. Recapitulando, o fator determinante
é a conduta, vista não da perspectiva do ego
consciente, mas também do ponto de vista das pulsões e
dos conflitos soterrados nos porões do inconsciente. Em
sua obra "Psicopatologia da Vida Quotidiana", Freud
apresenta uma assombrosa coletânea de atos falhos,
lapsos de linguagem e de escrita, que provam que os
motivos da conduta pessoal estão longe de ser simples e
conscientes.

Segundo William James, o importante é a consciência
total do indivíduo, expressa na sua atitude pessoal
(op. cit.). Para ele, a atitude pessoal "se revela mais fundamental
que a teologia ou o eclesiasticismo". Relata que
essa atitude pode variar de grau, indo desde uma autêntica
e não forçada piedade interior até os níveis mais primitivos
de fetichismo ou de magia.

Assim, a Lei de Causa e Efeito fornece uma ajuda
considerável à elucidação da etiopatogenia das diversas

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


categorias de doença mental. Contudo, o Carma não tem
nada de mágico ou milagroso, nem existem deidades nos
confins do Universo com a tarefa de punir os maus e premiar
os bons. Ela funciona de um modo bastante semelhante
aos condicionamentos operante e respondente,
bem estudados pelo Behaviorismo. Dessa forma, naturalmente,
induz as personalidades a níveis cada vez mais
elevados de maturidade, autoconsciência e desenvolvimento.


A personalidade orientada e impulsionada pela violência,
automaticamente entrará em sintonia com forças
espirituais do mesmo teor. Isso ocorre também no plano
material graças a uma lei geral das afinidades, que se expressa
até mesmo nas interações entre os átomos de
uma molécula, podendo formar tanto substâncias curadoras,
como a penicilina, a insulina, a cloropromazina etc ,
como substâncias tóxicas como a estricnina. Essas suposições
não têm a pretensão de ser verdadeiras, mas pretendem,
pelo menos, estimular pesquisas futuras no complexo
campo da interação entre a Psicologia e a Lei de
Causa e Efeito.

Segundo o Espiritismo, as relações entre a Lei de
Causa e Efeito e o destino individual ou coletivo não são
simples nem rígidas, podendo ser grandemente influenciadas
pelas circunstâncias e pelo livre-arbítrio. Existe
aqui outra linha de pesquisa onde se podem estabelecer
importantes pontos de ligação entre a Psicologia e a Doutrina
Espírita. É o que será visto a seguir.

Algumas idéias bastante interessantes, bem como
descobertas assaz impressionantes, que tendem a confirmar
alguns postulados espíritas, foram desenvolvidas
pelo grande psicólogo suíço L. Szondi: "Introdução à Psicologia
do Destino" (Ed. Manole). Esse autor descobriu,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


no campo da Psicologia, que o ser humano tem pressões
que o governam, mas ele as pode escolher, murtas vezes,
relegando as desagradáveis a um plano não evidenciado
no destino triplo: somático, social e emocional.

Muller explica esse fato com o exemplo dos cachorros:
todos são cachorros, mas há Dobermans e há Pequineses.
Os primeiros são sádicos, e terão atividades e
tendências nesse círculo. Os segundos são sensíveis e
temos, e terão comportamentos próprios do vetor ternura.

O comportamento e as afinidades serão dadas, então,
pelos ascendentes tribais. Raciocinando paralelamente,
pela Lei de Causa e Efeito, esses antecedentes
jazem no inconsciente da alma, em se tratando de individuos
humanos, cujas sementes (ativações biomagnéticas?)
foram implantadas pela conduta nas vidas passadas.
Não se pode eliminar o componente hereditário,
como já foi explanado em capítulos precedentes, mas
mesmo o componente hereditário está longe de ser casual
ou aleatorio, havendo por trás das leis genéticas um
determinismo mais profundo que influencia na seleção
dos gametas com um código genético mais apropriado ao
ser encarnante. Foi citado, a propósito, o autor espiritual
André Luiz, a respeito do tema. O impressionante, e genial,
é que Szondi conseguiu um método, o Teste de
Szondi, ou teste das escolhas, que pode prever parcialmente
essas tendências de comportamento. Daí o nome
Psicologia do Destino, dado a essa escola.

Em "A Análise do Destino", Szondi ensina que "ser
mau significa não ter encontrado ainda a apropriada, a
adequada saída de emergência para os impulsos negativos.
Disse: ainda não. Portanto, acredito que amanhã ou
depois poderá ser diferente". Assim, a postura szondiana
apresenta evidente contradição com a Teoria de Sigmund

26 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Freud, para quem o homem não passa de um animal sexual
agressivo.

É interessante frisar que, através da análise profunda
de casos clínicos, de personalidades patológicas ou
mesmo criminosas, ou não, Szondi chegou a descobertas,
no campo da Psicologia Experimental, que se aproximam
muito do conceito do Carma. Também outros importantes
autores realizaram pesquisas nesse novo campo
experimental: "Crime como Destino" (Lange, 1929), "Destino
e Neurose" (Schultz, 1931), "A Hereditariedade como
Destino" (Pfaler, 1932), "Destinos da Vida de Gêmeos
Criminosos" (Krapps, 1936), "Caráter e Destino" (Rudert,
1944) etc.

Alguns achados de pesquisas de gêmeos criminosos,
criados separadamente, são realmente espantosos,
tais como coincidência (ou não?) entre o tipo de crime,
bem como a época de ocorrência dos mesmos. A Síndrome
de Turner é um dos exemplos, especialmente relacionada
com as condutopatias sexuais: com porte físico
avantajado, aumento da libido sexual e diminuição da potência
sexual.

Jores observou que "todo médico atento, ao estabelecer
um levantamento cuidadoso dos antecedentes familiares
e pessoais de seus pacientes, supreende-se cada
vez mais com as conexões entre doença, destino vital e
destino social. Os três fatores se entrelaçam intimamente".


Na Clínica Médica, von Weizsandzer foi o precursor
dessas idéias. Convém relembrar que aqui a palavra destino
não tem o mesmo significado atribuído pelos adivinhos,
pelas cartomantes etc. São tendências e possibilidades
estatísticas, não sendo, de modo algum, fatalidades
impostas por alguma deidade vingativa.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


C. G. Jung também adentrou nesse campo e considerou
de fundamental importância o denominado complexo
paterno: "A força do Complexo Paterno, capaz de determinar
o destino provém do arquétipo." O conceito junguiano
de arquétipo é o que mais se aproxima, do lado
das ciências médicas, dos conceitos de Carma e reencarnação,
mas não se confundem, como já foi dito. Contudo,
Jung foi além, ao introduzir o conceito de sincronicidade,
a atuar no destino tanto individual como coletivo, pela
"continuidade relativa entre a psique e a matéria, a qual
pode determinar não apenas o destino como experiências
parapsicológicas". Do lado espírita, entra a mediunidade,
com a intervenção dos Espíritos nos momentos
culminantes da vida pessoal. Raros são os que nunca sofreram
tal intervenção, e a maioria simplesmente não percebe
a intervenção, que raramente é espetacular.
Outra interessante possibilidade de pesquisa experimental
dessas inter-relações entre psique, matéria, destino
etc. é oferecida pelo mais antigo livro da sabedoria
oriental, o "I Ching". Seus resultados podem ser comparados
aos das mesas girantes dos primordios do Espiritismo.
A mais confiável versão do "I Ching" é a tradução de
Richard Wilhelm, prefaciada pelo próprio Jung. Aliás,
esse destemor de Jung lhe valeu grandes ataques por
parte da comunidade científica de sua época.

Emerson ensina que "na alma do homem há uma
justiça, cujas retribuições são instantâneas e inteiras.
Aquele que pratica uma boa ação é instantaneamente
enobrecido. Aquele que pratica um ato vil é diminuído
pelo próprio ato (...) Se um homem dissimula e engana,
engana-se a si próprio e perde o conhecimento do próprio
ser .

Retomando Szondi, "só hoje a genética coloca a

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


questão do destino no centro das suas pesquisas. Ela estuda
especialmente a relação concordância-discordância
na vida de gêmeos uni e bivitelíneos, e a função da herança
e do mundo circundante, mediante métodos estatísticos
heredológicos" (op. cit.).

Esses meandros profundos da moderna Psicologia
confirmam, ou pelo menos apontam na mesma direção,
os postulados espíritas, os quais podem ser estudados
no Cap. X, da Parte Terceira de "O Livro dos Espíritos",
de Allan Kardec, que trata de questões, tais como destino,
fatalidade e livre-arbítrio.

Essas idéias, apresentadas de modo filosófico, pelos
autores mais antigos, são desenvolvidas em terminologia
bastante atual e acessível por André Luiz, na obra
"Evolução em dois Mundos" (FEB, 1958), especialmente
no Cap. VII, que trata do tema evolução e hereditariedade:
"Lentamente, os cromossomas adquirem a sua apresentação
peculiar, em forma de ponto-alça-bastonete-bengala,
e a evolução que lhes diz respeito na cariocinese,
desde a prófase à telófase, merece a melhor atenção dos
Construtores Divinos, que através do centro celular mantêm
a junção das forças físicas e espirituais, ponto esse
em que se verifica o impulso mental, de natureza eletromagnética,
pelo qual se opera o movimento dos cromossomas,
na direção do equador para os pólos da célula,
cunhando as leis da hereditariedade e da afinidade que
se vão exercer (...)."

Segundo a Doutrina Espírita, o momento crucial do
destino do homem, no que diz respeito aos aspectos hereditários,
é justamente o momento da fecundação do
óvulo pelo espermatozóide. Nesse ponto atuam as diretrizes
Cármicas inerentes ao Espírito reeencarnante, as
quais determinam, entre milhões de gametas masculinos,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


aquele que melhor se ajuste às futuras necessidades de
temperamento e de caráter da nova personalidade e,
conseqüentemente, das tendências, das possibilidades,
inibições e restrições do seu destino.' Além disso, "(...) o
Espírito, entregue ao comando da própria vontade, determina
com a simples presença ou influência, no campo
materno, os mais complexos fenômenos endomitóticos
no interior do ovo, edificando as bases de seu próprio
destino (...)" (idem, pág. 57), e que "a criatura submete-se à
lei da hereditariedade, com o direito de alterar-lhe as disposições
fundamentais até o ponto não distante do limite
justo (...)" (idem, pág. 58).

Como se depreende, diante do exposto, as ciências
médica e espírita se complementam e se justificam mutuamente,
ultrapassando o abismo existente entre a ciência
e as antigas concepções teológicas, deixando de lado
as correntes de pensamento tendenciosas, fanáticas ou
ignorantes. Mas essa complementaridade vai a níveis
muito mais profundos, como se verá nos parágrafos seguintes.


Szondi pergunta se o homem "pode também livrar-se
de um destino coercitivo, até então aceito, trocando-o por
outro, livremente escolhido?" "Seu destino não oferece
várias alternativas?" "Se, de fato, existem muitas possibilidades
desde o início da vida, como poderia o indivíduo
tomar consciência delas?" etc.

A Análise do Destino de Szondi, e dos autores citados,
entre outros, é, pois, uma tendência da Psicologia
profunda que procura, antes de tudo, tornar conscientes
os apelos ancestrais inconscientes. Por ela, o indivíduo é
levado a confrontar-se com as possibilidades que seu
destino lhe oferece, das quais ainda não tinha consciência
e posto diante da alternativa de escolha de uma vida

27 0 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pessoal mais adequada. Segundo André Luiz, tal análise
também ocorre no plano espiritual, onde o Espírito reencarnante
é orientado por técnicos, se é que se possa utilizar
tal termo, lotados no denominado "Planejamento de
Reencarnações", mediante estudo aprofundado da ficha
cármica individual, do grau de evolução da personalidade,
além das aspirações e motivações atuais (vide a obra
"Missionários da Luz", pág. 158).

Os fatores condicionantes do destino, segundo a
perspectiva szondiana, são: funções hereditárias, funções
pulsionais ou afetivas, funções sociais, o ambiente em
que o indivíduo nasceu, por força do destino, funções do
Ego e funções da mente. Segundo o Espiritismo, além
dessas variáveis, existe a Lei de Causa e Efeito subjacente,
sendo que todo acontecimento determinante na
vida do indivíduo não tem nada de aleatório ou casual.

Szondi descobriu que os setores mais influenciados
pelo destino são a escolha no amor, na amizade, na profissão,
na doença e no tipo de morte.

Convém enfatizar o fato de que essas hipóteses foram
confirmadas estatisticamente, em relação à escolha
dos parceiros, à esquizofrenia, ao alcoolismo e a dificuldades
conjugais.

O exemplo szondiano clássico é a semelhança das
árvores genealógicas de psiquiatras, psicanalistas e psicólogos
com as de seus pacientes (Schicksayse). Também
foi constatado que, nas árvores genealógicas de
bombeiros, foram encontrados piromaníacos; na de juristas,
paranóicos com compulsão de querela e assim por
diante. Também no tipo de suicida, estreitas ligações entre
epilepsia latente e suicídio, entre homossexualidade,
esquizofrenia paranóide, mania e suicídio etc.

É interessante notar que a literatura espírita lança

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


também luzes nesse campo de pesquisa: a repetição das
circunstâncias nas quais o Espírito falhou em vidas passadas,
ligações cármicas dentro ou fora do núcleo familiar,
débitos e créditos de feição moral, o imperativo do
resgate de dívidas do pretérito etc.

Szondi afirma que o Ego deve tomar posição quanto
às possibilidades do destino herdadas: afirmá-las, incorporá-
las, negá-las e, em casos extremos, até mesmo
destruí-las. Para tal, deve usar a transcendência, através
da ligação com uma idéia superior, tal como ideal, finalidade
ou propósito da existência tanto individual quanto
coletiva, como arte, ciência, religião, humanidade etc;
para tal o Ego deve unir-se, de maneira duradoura, com
essa idéia. Do ponto de vista espírita, aquelas almas que
conseguem realizar essa transcendência, de forma mais
ou menos completa, são denominadas, por André Luiz,
de completistas.

É interessante recordar que o próprio Freud reconheceu
a existência de uma instância moral na personalidade
humana, à qual deu o nome sugestivo de Superego.
Contudo, as raízes desse mecanismo auto-regulador
de justiça e moralidade são bem mais profundas do que o
imaginou o próprio Freud, com sua teoria reducionista,
segundo a qual o Superego seria uma simples introjeção
do código de ética social a partir dos pais, educadores e
da opinião pública, nada mais que isso. Seria um simples
verniz superficial, fruto exclusivo do processo de socialização
e de educação. Contudo, é bem provável que
Freud tenha percebido a insuficiência desse conceito, e
de outros, ao reformular, mais tarde, sua teoria, introduzindo
os confusos conceitos, até certo ponto metafísicos,
de Eros e Thanatos, ou seja, instinto de vida e instinto de
morte.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Pelo exposto, parece ter ficado demonstrada a importância
dos aspectos hereditários, tanto do ponto de
vista da ciência médica como da ciência espírita. Essa
importância é também confirmada em relação às doenças
mentais.

Dongier afirma que o papel dos fatores genéticos no
determinismo do comportamento é importante quer no
homem quer no animal. Desde o nascimento, manifestam-
se os traços de temperamento, tais como placidez,
exigência, agitação etc.

Foi demonstrado que os genes entram em ação sob
a influência do meio ambiente. Assim, um gene dominante
poderá permanecer latente durante décadas e depois
atuar, como ocorre na Coréia de Huntington, ou na Doença
de Pick. Contudo, uma predisposição poderá permanecer
inaparente durante toda a existência, tanto sob a
coação de um meio favorável como de outros genes.

Em diferentes idades, entram em jogo constelações
diferentes de genes, e assim sua influência muda de
acordo com a idade do indivíduo. Não existem, portanto,
taras hereditárias, mas apenas genes predisponentes de
ação intermitente. Destarte, na patogenia da doença
mental, bem como do crime, por exemplo, existe um movimento
dialético entre a endogeneidade e a influência
do meio ambiente. A essa dialética acrescenta o Espiritismo
a noção de livre-arbítrio, com a qual muitos cientistas
materialistas não concordam, por considerarem o
comportamento humano mera resultante de forças mecânicas,
desprovidas de qualquer finalidade, sentido ou
propósito.

Assim, uma neurose ou até mesmo uma psicose
poderão permanecer latentes a vida inteira, se o destino
pessoal fornecer condições existenciais favoráveis. Na li-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


teratura espírita, são inúmeros os exemplos de almas de
elevada evolução que adentram a vida material em condições
bastante adversas, com o objetivo único de auxiliar
entes queridos na luta contra os percalços de destinos
trágicos, com enormes riscos de novas quedas morais.

Uma carga genética perturbada não poderá, todavia,
manifestar seus efeitos senão através de uma hipersensibilidade
às alterações ambientais. A Medicina demonstrou
que todas as doenças hereditárias são erros
congênitos do metabolismo. Cada gene corresponde a
uma enzima, e a doença deve-se, em última análise, a
um distúrbio da síntese proteica (O DNA produzindo o
RNA mensageiro no metabolismo celular).

A transmissão genética pode ser de feição dominante,
recessiva ou ligada ao sexo. Segundo a Genética,
esse processo se dá de maneira casual ou aleatória. Segundo
o Espiritismo, por trás dessa aparente casualidade
existe uma causalidade espiritual.

Em Medicina, a Genética ganhou enorme impulso
através do estudo de gêmeos uni e bivitelíneos, e foram
descobertas semelhanças sobretudo nos casos de "Folie
à Deux", mas os resultados desses estudos são contraditórios.


Mas, a Medicina já descobriu que, no caso das oligofrenias,
de fundo genético, o tratamento precoce, com
dosagens de metabólitos sangüíneos e urinários anormais,
permite prevenir a doença, que, doutro modo, prosseguiria
seu curso inexorável. Esse exemplo tipifica o
grau em que a ciência, ou os cuidados, podem modificar

o destino de um indivíduo.
Em relação aos casos de trissomias, Klinefelter
apresenta 20 % de retardo mental, enquanto que a Síndrome
de Turner leva a problemas médico-legais, com

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


baixo quociente intelectual e anormal taxa de criminalidade:
imaturidade, insegurança, impulsividade, forte libido
sexual associada a baixa potência sexual, com indução
de delitos sexuais, além de problemas de caráter, de alcoolismo
etc. Todavia, alguns desses indivíduos conseguem
ter uma vida normal.

A esquizofrenia, a psicose maníaco-depressiva, o
nível de inteligência, as personalidades sociopáticas etc.
têm um componente hereditário mais ou menos pronunciado.
Contudo, os conhecimentos atuais do modo de
transmissão das doenças mentais permanecem no terreno
das probabilidades, como já foi dito.

A Doutrina Espírita explica determinados casos de
doenças mentais como sendo condicionados por fatores
extrafísicos, ou espirituais. Tais doenças possuem uma
etiopatogenia de fundo espiritual, básico, e apenas secundariamente
a personalidade e o corpo físico são atingidos.
Os fatores espirituais desencadeadores podem ser
divididos em duas categorias distintas: intrínsecos e extrínsecos.


Os fatores intrínsecos são aqueles inerentes à própria
personalidade, quer encarnada quer desencarnada.
A sua fisiopatologia não seria primariamente orgânica,
pois estaria na dependência do mau funcionamento do
corpo espiritual, também denominado perispírito ou psicossoma.
Essa categoria não suprime as doenças aceitas
pela Psiquiatria, tanto as organogênicas como as psicogênicas.


Segundo terminologia espírita, tais patologias de
origem espiritual são encontradas em personalidades que
habitam o Umbral, nome dado aos planos espirituais inferiores,
ligados à crosta terrestre. Essa inferioridade é tanto
de ordem física, pelo baixo teor vibratório da matéria

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


que o compõe, como psíquica, pelo baixo nível de consciência,
ou de evolução dos Espíritos que nele habitam.

Tais personalidades, quando encarnadas, apresentam
distúrbios independentes de alterações cerebrais físicas.
A análise psicológica também não consegue determinar
uma causalidade psicogenética. Não se encontra
nexo causal entre os sintomas apresentados e a vida pregressa
do indivíduo. Talvez algumas psicoses endógenas,
certos casos de neuroses, bem como distúrbios de
conduta etc. possam ser enquadrados nessa categoria. O
autor não dispõe de dados suficientes para a diferenciação
desses casos, mas a literatura espírita relata-os em
sua vasta bibliografia.

Essa dificuldade de penetração por parte da Psicanálise
ou da análise fenomenológica decorre basicamente
do fato de sua etiopatogenia provir de distúrbios localizados
no cérebro espiritual, fruto de vivências ocorridas
em vidas pretéritas.

Em face da íntima interação entre alma e corpo, tais
distúrbios acabam por provocar alterações as mais diversas
no veículo físico. Convém lembrar que cada caso
deve ser estudado como único, pois diversos mecanismos
etiopatogênicos podem intervir ao mesmo tempo. A
descrição aqui feita é incompleta e insuficiente e caberá
aos futuros especialistas a elucidação de casos tão complexos
e clarear esses meandros ainda insondáveis da
propedêutica psiquiátrica.

No livro "Evolução em dois Mundos" (FEB, 1958),

A. Luiz faz referência a "doenças secundárias, porquanto
a etiologia que lhes é própria reside na estrutura complexa
da própria alma" (pág. 208). O Espiritismo considera a
alma como coisa, que tem existência "per se", e naturalmente
ela é dotada de uma fisiologia própria e, conse-
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


qüentemente, existem possibilidades as mais variadas de
ocorrências patológicas, como assevera o próprio André
Luiz. Talvez devido a esse fato está, ainda, a Psiquiatria
perdida nos meandros da etiopatogenia.

Em Psicopatologia, aos fenômenos deficitários impenetráveis
pela lógica do analista, dá-se o nome de sintomas
primários. Sobre essa massa de material psíquico
arrasada pela doença, surgem os sintomas secundários,
frutos dos esforços da personalidade em manter um contato,
mais ou menos precário, com a realidade.

Os psiquiatras aceitam, em geral, essa postura que
diferencia, pelo menos no plano teórico, por exemplo, esquizofrenia
de processo e esquizofrenia reativa. A escola
fenomenológica faz uma aprofundada distinção entre processo
e desenvolvimento. Mas, segundo alguns críticos,
essa distinção é meramente fenomenológica, descritiva e
superficial: o que não elucida a natureza real do problema.
Sob muitos aspectos, a distinção entre processo e
reação é semelhante à distinção entre reações crônicas e
reações agudas.

Segundo Barclay Martin, os fatores biológicos hereditários
são as influências causadoras primárias nas
doenças mentais de processo, e as experiências de
aprendizagem social e as tensões sociais e situacionais
imediatas são mais importantes para determinar as doenças
mentais reativas.

Entretanto, não houve demonstração clara de fatores
causais diferentes a não ser quanto aos aspectos genéticos.
Além disso, quase todos os grandes clínicos e
pesquisadores são de opinião que a distinção entre processo
e reação não seria real, mas simplesmente representariam
os extremos de um contínuo, com muitos
doentes manifestando certo grau intermediário de ajusta-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 27 7


mento pré-psicótico (Phips, Stephens, O'Connor e Wiener).
Essas questões são de grande importância em relação
ao prognóstico das doenças mentais.

Já foi citado o caso de Jung, que não concordava
com o diagnóstico de esquizofrenia depressiva de sua
paciente. É provável que o talento de cada facultativo
seja determinante na impressão diagnóstica. Contudo,
vem a Doutrina Espírita acrescentar um complicador, ao
revelar que realmente alguns casos de doença mental
possuem sua gênese em vidas passadas e, conseqüentemente,
no mau funcionamento do corpo espiritual.

No livro citado de André Luiz, tem-se a seguinte
questão: "— Os Espíritos encarnados que sofreram desequilíbrio
mental de alta expressão voltam imediatamente
à lucidez espiritual após a desencarnação?" R —"Isso
nunca sucede, porquanto a perturbação dilatada exige a
convalescença indispensável, cuja duração naturalmente
varia com o grau de evolução do enfermo em reajuste"
(pág. 209). Aqui se vê, claramente, que, para o Espiritismo,
a doença mental tem uma finalidade de reajuste, isto
é, conduzir a alma das sombras da ignorância, do erro ou
do pecado, para a luz da sabedoria, da auto-consciência,
do amor divino. Sim, porque Deus é o princípio e a finalidade
de todo acontecimento físico ou psicológico, quer
no mundo físico quer no mundo espiritual, segundo se vê
pela revelação dos Espíritos. Assim, chega-se ao aspecto
religioso do Espiritismo.

Contudo, André Luiz tece outras considerações: "De
um modo geral, porém, a etiologia das moléstias perduráveis,
que afligem o corpo físico e o dilaceram, guardam
no corpo espiritual as suas causas profundas. (...) Os nódulos
de forças mentais desequilibradas" (idem, pág.
213). Mais adiante: "Essas enquistações de energia pro


27 8

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


funda, no imo da alma, expressando as chamadas dívidas
cármicas (...) são perfeitamente transferíveis de uma
existência para outra" (pág. 214).

André Luiz revela que "— Na Espiritualidade, os
servidores da Medicina penetram, com mais segurança,
na história do enfermo para estudar, com o êxito possível,
os mecanismos da doença que lhe são particulares.
Aí, os exames nos tecidos psicossomáticos com aparelhos
de precisão, correspondendo às inspeções instrumentais
e laboratoriais em voga na Terra, podem ser enriquecidas
com a ficha cármica do paciente, a qual determina
quanto à reversibilidade ou irreversibilidade da moléstia,
antes de nova reencarnação, motivo por que numerosos
doentes são tratáveis, mas somente curáveis
mediante longas ou curtas internações no campo físico, a
fim de que as causas profundas do mal sejam extirpadas
da mente pelo contato direto com as lutas em que se
configuram (...) porque, mesmo no mundo, todo remédio
da farmacopeia humana, até certo ponto, é projeção de
elementos quimioelétricos sobre as agregações celulares
(...) Contudo (...) na Esfera Superior (...) a psicoterapia e

o magnetismo, largamente usados no plano extrafísico,
exigem do médico grandeza de caráter e pureza de coração"
(op. cit, págs. 215 e 216). Seria impossível resumir,
neste trabalho, todos os meandros espíritas pertinentes
ao tema.
A segunda categoria de doenças mentais de fundo
espiritual é aquela condicionada por fatores extrínsecos
alheios à personalidade do doente, quer no plano físico
quer no plano espiritual. A nosologia psiquiátrica classifica
as reações exógenas, como Bohoeffer, por exemplo,
como aquelas condicionadas por fatores físicos ou químicos
alheios às funções instrumentais da vida de relação.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


O tema aqui difere, por serem os fatores exógenos de
fundo espiritual.

Trata-se do vastíssimo campo das influenciações
espirituais, descritas por Allan Kardec, como obsessão
simples, fascinação e subjugação espirituais. O termo obsessão
aqui difere daquele usado para descrever a obsessão
encontrada na neurose obsessivo-compulsiva,
que é um sintoma psicológico formado pelos mecanismos
de defesa do eu, tais como repressão, deslocamento e
isolamento, tendo como resultado final um pensamento
impositivo que provoca pugna interna. Uma neurose obsessivo-
compulsiva pode, entretanto, vir associada a influenciações
espirituais. Os mecanismos psicodinâmicos
que lhe são peculiares não devem, entretanto, ser negligenciados.
Essa neurose é uma das mais difíceis de ser
tratadas e geralmente não possui bom prognóstico. Os
pensamentos obsessivos se impõem repetidamente à
consciência e são percebidos geralmente como irracionais,
indesejáveis, e dificilmente controláveis ou elimináveis
(B. Martin, "Psicologia da Anormalidade"). Quando o
indivíduo se vê obrigado a realizar atos contra a própria
vontade, sentidos como irracionais e incontroláveis, tem-se
a compulsão. Os clínicos consideram que formas brandas
de traços obsessivo-compulsivos são passíveis de
ocorrer em indivíduos normais. Exemplificando, a canção
que não se pode tirar da cabeça, uma certa compulsão
para voltar à casa e verificar se a porta está fechada ou o
fogão desligado etc.

Quando fruto de mecanismos de defesa do eu, ou
mecanismo de ajustamento, podem ser enquadradas no
que o mestre russo Aksakof denomina Personismo ("Animismo
e Espiritismo", FEB, 1978).

Todavia, Aksakof ensina que se os "fenômenos de

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


personismo e de animismo na aparência, porém que reconhecem
uma causa extramediúnica, supraterrestre,
isto é, fora da esfera da nossa existência" são então considerados
como produto de influenciação espiritual (vol. I,
pág. 24). Quando perturbadores e causadores de distúrbios
mentais são ditas, por Allan Kardec, como obsessão
simples, fascinação ou subjugação. Tais casos não apresentam
necessariamente uma patoplastia espírita, e podem
apresentar quadros, tais como distúrbios de personalidade,
raptos de humor, diversos graus de neurose,
até quadros psicóticos francos.

Esse posicionamento dualista psicofísico aplicado à
Psiquiatria é de grande importância para o diagnóstico,
prognóstico e terapêutica dos distúrbios psíquicos e merece
ser melhor investigado pelas mentalidades científicas.


Segundo Aksakof, a grande dificuldade para o diagnóstico
diferencial é que "muitas vezes, as três hipóteses
podem servir como o mesmo fundamento para a explicação
de um só e mesmo fato. Assim, um simples fenômeno
de personismo poderia também ser um caso de animismo
ou de Espiritismo. O problema é, pois, decidir a
qual dessas hipóteses é preciso atender, pois se enganaria
quem pensasse que uma só é bastante para dominar
todos os fatos. A crítica proíbe ir além da que basta para
a explicação do caso submetido à análise" (idem, vol. I,
pág. 25). Alexandre Aksakof vai além ao dizer que... "o
grande erro dos partidários do Espiritismo é ter querido
atribuir todos os fenômenos, geralmente conhecidos sob
esse nome, aos Espíritos". A crítica inversa pode ser feita
aos psicoterapeutas de mentalidade materialista.

Em seguida, Aksakof cita Carl Du Prel, fundamentado
em Beneke, que "as forças psíquicas constituem uma

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


substância real. A alma humana é um organismo composto
destas substâncias psíquicas tão eternas e indestrutíveis
quanto qualquer substância da ordem mais material".


J. C. Nemiah (op. cit.) apresenta um exemplo bastante
ilustrativo de neurose obsessivo-compulsiva, do
sexo masculino, 41 anos de idade:
"Bem, fui operador de elevador, ascensorista, e
nunca tive qualquer acidente. Mas mesmo assim, ultimamente,
nos últimos seis meses, o elevador começou a
me amolar. Onde vivo há um elevador (...) e eu não uso;
subo as escadas (...). Quando subo de elevador, faço
questão de verificar se a porta está fechada. Engraçado,
saio de um lado e tenho de passar por ele a fim de dirigirme
para o outro lado. Assim eu me certifico de que a porta
está fechada. Sonho que estou operando um elevador
e que me despenco com ele (...). Tenho medo de doenças.
Se alguém vem me dizer que padece de doença,
que está doente, apronto-me para correr. Tenho tanto
medo que acho logo que vou pegar a doença do outro
(...). Tiro isso da cabeça por uns momentos e experimento
convencer-me. Então, tudo fica bem por uns minutos.
Então a coisa volta a mim novamente, e eu digo: 'Não', e
tento convencer-me novamente, e eis aí tudo que venho
fazendo ao longo do dia, até que não posso mais (...)."

Existe aqui uma forma obsessiva de pensar, acompanhada
de medo ou fobia, que constantemente ronda e
importuna o paciente, com pugna interna, até a extenuação.
O paciente é inteiramente consciente da irracionalidade
do seu medo, mas esse conhecimento em nível intelectual
e essa crítica ou juízo do seu estado mórbido
não demonstram nenhuma eficácia na tentativa de superação
do problema. A idéia tem vida autônoma, inde-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pendente do ego do paciente. Do ponto de vista psicanalítico,
a etiologia desses sintomas é oriunda das instâncias
inconscientes da personalidade, produto de conflitos
psicológicos e utilização de mecanismos de defesa do
eu, tais como repressão de idéias ou afetos considerados
incompatíveis, deslocamento, isolamento etc.

Contudo o paciente desenvolve outros sintomas,
agora de natureza conativa, ou volitiva: uma compulsão
de lavar as mãos de modo exagerado, ilógico. Para ele
"tudo está sujo, tudo é nocivo. Não pode livrar sua mente
das constantes preocupações com os perigos que se escondem
em cada canto (...) sua tarefa é tão hercúlea
quanto a de limpar os estábulos das cavalariças de Auges".
Esses sintomas são paralisadores, e sua vida acha-se
tão concretamente abalada como se estivesse padecendo
da mais debilitadora das doenças físicas. Para o paciente,
não é ele realmente o autor dos pensamentos,
pois eles são vivenciados como "estranhos ao ego".
Como já foi dito, o ego é uma instância mínima do conjunto
global da personalidade. Aos fatos aqui relatados, a
Doutrina Espírita acrescenta a hipótese das influenciações
oriundas de outras personalidades, ditas metanóicas,
mas o diagnóstico diferencial deve seguir a postura de
Aksakof.

Ao contrário do que se poderia inadvertidamente supor,
a síntese dos conhecimentos espiritistas e psicopatólogicos,
ao invés de simplificar, aumenta enormemente o
grau de complexidade do tema, pois multiplica o número
de mecanismos etiopatogênicos produtores de distúrbios
mentais. Segundo Aksakof, a hipótese espirítica não invalida,
de modo algum, os avanços da Medicina e ciências
afins. Allan Kardec enfatiza esse lado científico e dinâmico
do Espiritismo.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Parece que fica aberto, com a hipótese espírita, um
mundo novo ao estudo de distúrbios do pensamento, tais
como a compulsão a pensar, o pensamento paralógico, o
pensamento dereista, o bloqueio do pensamento, a prolixidade,
a perseveração, a fuga de idéias, a inibição do
pensamento etc. São sintomas com maior ou menor valor
semiológico.

O mesmo pode ser dito em relação aos distúrbios
da atividade voluntária, tais como a excitação psicomotora,
a debilidade da vontade, o estupor, o negativismo, a
sugestibilidade volitiva, as estereotipias, os atos impulsivos,
os atos automáticos, os tiques nervosos, os cacoetes,
os atos falhos etc. A brevidade deste ensaio impede
um estudo pormenorizado desses aspectos, cuja compreensão
e domínio é condição "sine qua non" para o
diagnóstico diferencial das obsessões e dos atos compulsivos.


Essa nova Psicopatologia espírita fica sugerida pelo
posicionamento equilibrado de A. Kardec e A. Aksakof e
pela nova liberdade de pensamento oferecida pelos modernos
avanços da Física Moderna, sem se abandonar,
portanto, o Método Científico e cair no obscurantismo das
superstições.

André Luiz revela que "a partícula do pensamento,
embora viva e poderosa na composição em que se derrama
do Espírito que a produz, é igualmente passiva perante
o sentimento que lhe dá a forma e a natureza para o
bem ou para o mal, convertendo-se, por acumulação, em
fluido gravitante ou libertador, ácido ou balsâmico, doce
ou amargo, alimentício ou esgotante, vivificante ou mortífero,
segundo a força do sentimento que o tipifica e configura,
nomeável, à falta de terminologia equivalente, como
'raio da emoção' ou 'raio do desejo', força essa que lhe

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


opera a diferenciação de massa e trajeto, impacto e estrutura.
Com o fluido mental carreiam-se, desse modo,
não apenas as disposições mento-sensitivas das criaturas,
em atuação recíproca, mas também as imagens que
transitam entre os cérebros que se afinam (...)" ("Evolução
em dois Mundos", FEB, 1958, pág. 100).

Isso é possível porque, recapitulando, a partícula de
pensamento possui estrutura, tal como o átomo, podendo
ser classificada em diversos tipos, conforme a qualidade,
quantidade, comportamento e trajetória dos componentes
que a integram. Destarte, a atuação dos Espíritos não
tem nada de sobrenatural, mágica ou milagrosa, nem é
também equivalente à "onda negra do misticismo", como
supôs, erradamente, Sigmund Freud.

Do mesmo modo que existe, no mundo biológico, o
processo da simbiose, como, por exemplo, entre os cogumelos
e certas algas, entre as leguminosas e determinadas
bactérias fixadoras de nitrogênio atmosférico etc ,
pode também ocorrer o denominado processo de "simbiose
das mentes": "(...) o Espírito desenfaixado da veste
física lança habitualmente, para a intimidade dos tecidos
fisiopsicossomáticos daqueles que o asilam, as emanações
do seu corpo espiritual, como radículas alongadas
ou sutis alavancas de força, subtraindo-lhes a vitalidade,
eleborada por eles nos processos de biossíntese (...)" Assim,
"a mente encarnada entrega-se, inconscientemente,
ao desencarnado que lhe controla a existência (...). Entretanto,
as simbioses dessa espécie (...) se expressam
igualmente nas moléstias nervosas complexas, como a
hístero-epilepsia (...) equivalendo a transe mediúnico autêntico,
no qual a personalidade invisível se aproveita dos
estados emotivos mais intensos para acentuar a própria
influenciação (...) subjuga-lhe o campo mental, impondo-

PSIOUIATRIA E MEDIUNISMO


-lhe ao centro coronário a substância dos próprios pensamentos
(...)" (op. cit., págs. 107 e 108).

Tais processos podem evoluir para o que esse autor
espiritual descreve como "vampirismo fluídico" (idem,
pág. 115) "que determinam o colapso cerebral com arrasadora
loucura" (pág. 116).

Revela ainda que alguns Espíritos, "quais endoparasitos
conscientes, após se inteirarem dos pontos vulneráveis
de suas vítimas, segregam sobre elas determinados
produtos, filiados ao quimismo do Espírito, e que podemos
nomear como simpatinas e aglutininas mentais,
produtos esses que, sub-repticiamente, lhes modificam a
essência dos próprios pensamentos a verterem, contínuos,
dos fulcros energéticos do tálamo, no diencéfalo
(...) comumente senhoreiam os neurônios do hipotálamo,
acentuando a própria dominação sobre o feixe mielínico
que o liga ao córtex frontal, controlando as estações sensíveis
do centro coronário que aí se fixam (...) e produzem
nas suas vítimas (...) inibições de funções viscerais
diversas, mediante influência mecânica sobre o simpático
e o parassimpático" (idem, págs. 116 e 117).

Alguns Espíritos obsessores assumem, no próprio
plano espiritual, franco quadro psicótico, conforme descrição
de André Luiz: "(...) acabam em deplorável fixação
monoideística, fora das noções de espaço e tempo, acusando,
passo a passo, enormes transformações na morfologia
do veículo espiritual, porquanto, de órgãos psicossomáticos
retraídos, por falta de função, assemelham-se
a ovóides (...) podem ser comparados ao parasita Sacculina
carcini" (...) (idem, pág. 117).

Também é impossível aqui transcrever apontamentos
mais extensos da vasta literatura espírita, ficando a
sugestão de estudos e pesquisas mais aprofundados

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


para a solução do grande enigma da mente humana, em
todas as suas dimensões, quer no terreno da normalidade
quer no patológico.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 28 7


X
MEDIUNISMO NA INFÂNCIA


O tema deste capítulo se constitui no principal motivo
que levou o autor a escrever este ensaio. Trata da importância
da Psiquiatria, da Psicologia e da Doutrina Espírita
na compreensão do crescimento e desenvolvimento
infantil, levando-se em consideração as suas vertentes física,
psíquica, social e, também, espiritual. Será feito um
resumo esquemático da alma infantil, suas necessidades,
suas crises de desenvolvimento, a formação da personalidade
à luz da vertente espiritual. Como o tema é extraordinariamente
vasto, este resumo certamente pecará
pela excessiva brevidade. Futuros desenvolvimentos poderão
ser acrescentados por especialistas em Psiquiatria
Infantil, com orientação espírita.

O objetivo aqui perseguido é prático e eminentemente
didático, sendo o problema da infância certamente

o maior desafio da sociedade moderna. Basta lembrar a
revolução por que passaram os costumes em poucas décadas,
com radical mudança do papel da mulher na sociedade,
cada dia mais empenhada nas lides fora do lar,
competindo com os homens no mercado de trabalho das
PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


sociedades industriais e, futuramente, pós-industriais. Infelizmente,
o aumento do contingente feminino no mercado
de trabalho se dá à custa dos cuidados intensivos necessários
à formação da personalidade de seus filhos.
Até mesmo os métodos de concepção "in vitro", mães de
aluguel etc. são temas ainda pouco compreendidos em
suas conseqüências últimas ao estruturamento da alma
infantil. Se se considerar o problema da criança abandonada,
sem lar, criada pelas ruas das grandes cidades, a
perplexidade toma conta de quem se debruça sobre a
maior tragédia dos tempos modernos.

A criança é o ser mais indefeso do reino animal em
face do longo período necessário ao seu desenvolvimento
e maturação e das enormes complexidades da alma
infantil, além dos elevadíssimos padrões de integração
psíquica, somática, social e espiritual necessários à maturação
da personalidade infantil.

Inicialmente serão resumidos alguns conceitos médicos
do crescimento e desenvolvimento da criança, para
depois acoplarem-se dados fornecidos pela Doutrina Espírita,
que, também aqui, longe de simplificar, aumenta
enormemente o grau de complexidade desse magno problema.


Convém relembrar que os conhecimentos se acham
longe de estar esgotados, tanto por parte das ciências
médicas como por parte do Espiritismo. Aliás, o caráter
evolutivo e não dogmático dos conceitos espíritas foi enfatizado
pelo seu principal sistematizador, Hipolite Leon
Denizard Rivail, ele próprio eminente pedagogo e discípulo
do grande mestre suíço Pestalozzi, a quem deveu
sua formação acadêmica.

Convém relembrar, desde logo, a discordância fundamental
entre a Psiquiatria e a Psicologia acadêmicas e

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


a Doutrina Espírita. Para as primeiras, a mente do nascituro
é uma "tábula rasa", não possuindo qualquer material
psíquico, sendo, pois, inteiramente virgem; somente
com o desenvolvimento psicofisiológico do cérebro e o
amadurecimento dos órgãos dos sentidos, e através do
aporte dos impulsos nervosos aferentes, eliciados pela
estimulação sensorial dos órgãos dos sentidos, começa a
estruturação do aparato mental da criança.

A Doutrina Espírita refuta tal premissa. Um grande
psiquiatra, C. G. Jung, também a refuta, ao admitir a existência
de material psíquico congênito, de natureza hereditária,
os denominados arquétipos.

Embora os postulados espíritas não invalidem a hipótese
do mestre de Zurich, eles vão muito além, ao revelar
que a personalidade da criança alberga um Espírito
reencarnante, com vastíssimo repositório de material psíquico,
formado através da evolução da alma, ao passar,
por eras incontáveis, pelos vastos reinos mineral, vegetal
e animal. Essa evolução culminou com a espécie humana,
mas não pára aí, estando destinada a atingir os níveis
denominados angélicos. Sim, o Espiritismo ensina que a
mente humana ainda está nos seus primórdios evolutivos
e alberga em si as forças teleológicas que a impulsionarão
para as culminâncias das consciências cósmicas,
após milênios de futura evolução.

Aliás, a hipótese palingenésica não tem nada de novidade,
e Platão já dizia que "aprender é recordar". Sócrates,
o gigante espiritual que o precedeu, também comungava
com essa hipótese, possuindo ele mesmo desenvolvidas
faculdades mediúnicas, conforme atestam
relatos históricos a respeito do seu "Daimon" particular.

Mas, o que já se tem de concreto a respeito do desenvolvimento
da mente encantadora da criança? A inter-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


pretação que a maioria das pessoas dá a adágios como
"de pequenas sementes crescem grandes carvalhos" ou
"tai pai, tal filho", indica que a importância da hereditariedade
é geralmente aceita. Nos capítulos precedentes já
foi feito um resumo do papel da hereditariedade e do ambiente
interagindo no comportamento. Também se costuma
dizer que "de pequenino se torce o pepino".

Segundo Leslie F. Malpass ("O Comportamento Humano"),
as diferentes posições sobre a natureza humana
tem sempre algum apoio biológico, e ainda que muitos
pensem que se possa transcender a Biologia, não se
pode evitar a natureza biológica. Aliás, essa é exatamente
a posição espírita, como já foi tentado demonstrar ao
longo dos capítulos precedentes. O corpo e a alma são
duas faces de uma mesma moeda, embora essas categorias
possam ser dissociadas entre si, conforme o demonstra
o próprio mediunismo ou a sobrevivência da
alma após a morte do corpo físico. Contudo, essa dissociabilidade
não anula a interação mente-corpo.

Carl Gustav Jung afirma que, além dos caracteres
biológicos, também determinados fatores psíquicos podem
ser transmitidos por meio dos mecanismos da hereditariedade.
Alguns estudos de Antropologia Cultural parecem
confirmar essa intrigante hipótese, embora se saiba
que, segundo o Espiritismo, muito do que se supõe
seja hereditário, na realidade, faz parte do conteúdo psíquico
oriundo de vidas passadas. Esse assunto está longe
de ser totalmente esclarecido.

A alma infantil, assenta, pois, suas bases na anatomofisiologia
do sistema nervoso e os demais sistemas
correlatos essenciais à vida de relação. Contudo, esse
aparato biológico está longe de poder explicar todas as
complexidades da alma da criança.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


É ponto pacífico que os receptores sensoriais, o sistema
nervoso e o endocrínico determinam a capacidade
e os limites do comportamento tanto infantil como adulto,
de um modo geral, e da inteligência, de um modo particular.


Exemplificando, alterações da pituitária podem levar
ao nanismo, gigantismo e acromegalia. Alterações da tireóide
podem levar ao bócio, ao cretinismo e ao mixedema.
Do córtex supre-renal, à Doença de Addison. Do
pâncreas., ao diabete. Das gônadas, à atrofia do sistema
reprodutivo, com declínio das caraterísticas sexuais secundárias
e da libido, com enormes repercussões na personalidade
total do indivíduo. Destarte, fica demonstrado
a importância dos hormônios na formação da personalidade
e nos padrões do comportamento, e é importante
recordar o sinergismo existente entre os hormônios e o
sistema nervoso central.

Aos fatores orgânicos ajunta, o Espiritismo, as interações
mento-magnéticas oriundas do corpo espiritual,
ou perispírito, ou psicossoma, com fulcros energéticos
funcionais ou patogênicos, de origem Cármica, sendo em
última instância, a causa primária da maioria, não de todas,
nas patologias intervenientes na curva do processo
vital de cada indivíduo.

Mas, no processo ultracomplexo de formação do
ego infantil, um outro elemento é de fundamental importância:
a aprendizagem, ou seja, "uma modificação mais
ou menos permanente do comportamento, resultante de
atividade, treinamento especial ou observação" (Munn,
1961).

Uma enorme quantidade de pesquisa indica que as
condições biológicas e psicológicas podem influenciar decisivamente
tanto a discriminação dos estímulos como as

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


respostas do comportamento, tanto aparente como velado.
Aos estímulos sensoriais, que bombardeiam diuturnamente
o córtex sensorial, acrescenta, o Espiritismo, as
ondas mento-magnéticas oriundas das personalidades
das figuras parentais, ou não, que compõe a "atmosfera
psíquica" do recém-nascido. Na visão do autor, os postulados
espíritas se ajustam aos modernos avanços de escolas
científicas, tais como Behaviorismo, a Reflexologia
etc. De um modo mais completo que as Teorias de Personalidade
mais em voga no mundo acadêmico. Isso não
implica a negação da maioria dos pressupostos dessas
escolas.

Além da aprendizagem e do aparato psicossomático,
também as drogas possuem capital importância sobre
a discriminação de estímulos e outros aspectos do comportamento.
Podem citar-se, entre outras, o álcool, a morfina,
a heroína, a cafeína, os tranquilizantes menores, os
antidepressivos, os anticomiciais, os neurolépticos etc.
("Drugsa and Behavior", Uhr e Miller).

Indo mais a fundo, a compreensão do processo de
formação da personalidade do nascituro não pode prescindir
dos conceitos de condicionamento operante e respondente.
Além da importância do crescimento e desenvolvimento
biológico propriamente dito, o processo de socialização
é outro aspecto "sine qua non".

Segundo a Doutrina Espírita, esse processo vem
desde o período pré-natal, entre a concepção e o nascimento,
quando, em pouco mais de nove meses, um organismo
fantasticamente complexo evolui de uma única célula,
o ovo fertilizado, através do desenvolvimento germinal,
embrionário e fetal. Tanto o processo de fecundação
como a formação do veículo físico se processam sob forças
oriundas do plano espiritual, operando em sinergia

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 293


com as do aparato orgânico, e são determinadas, em última
instância, pelos aspectos intrincados e ainda pouco
conhecidos da Lei de Causa e Efeito.

A Posição Espírita revela que, já a partir da fecundação,
se processa a acoplagem do Espirito reencarnante
à matéria orgânica, e às interações físicas e anímicas,
com o complexo corpo-espírito materno, amplamente estudados
na literatura espírita.

Existem alguns relatos de que é possível a determinados
Espíritos reencarnantes, na dependência do grau
de evolução espiritual dos mesmos, conseguirem um relativo
grau de conscientização deste estágio. Podem, entretanto,
ocorrer choques vibracionais entre o Espírito
reencarnante e o materno, provocando algumas das denominadas
"gravidez de risco", até mesmo com possibilidade
de afecções orgânicas mais ou menos graves, tais
como a hiperemese gravídica ou ainda casos de
eclâmpsia. Contudo, essa hipótese é demasiado complexa
para ser discutida neste resumo.

Um exemplo clássico de relação mãe e filho na fase
intra-uterina pode ser visto em Lucas (Cap. 1, vers. 39 e
45):

"Naqueles dias, Maria se levantou e foi às pressas
às montanhas, a uma cidade de Judá. Entrou em casa de
Zacarias e saudou Isabel. Ora, apenas Isabel ouviu a
saudação de Maria, a criança estremeceu no seu seio; e
Isabel ficou cheia do Espírito Santo. E exclamou em alta
voz: 'Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto
do teu ventre. Donde me vem a honra de vir a mim a mãe
de meu Senhor? Pois, assim que a voz de tua saudação
chegou aos meus ouvidos, a criança estremeceu de alegria
no meu seio.' Ora, com os conhecimentos espíritas

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


essas e outras passagens deixam de ser meras superstições.


Parece que, com isso, fica demonstrado o papel
fundamental dos aspectos psicológicos e espirituais durante
a gestação. Também o alcoolismo, os traumas
emocionais durante a gravidez podem produzir repercussões
tanto físicas quanto psíquicas no feto. Não se deve
desprezar o papel da figura paterna; e o complexo biopsicofluídico
dessa tríade ainda está longe de ser elucidado.
Jung tece impressionantes considerações sobre esse
tema apaixonante ("O Desenvolvimento da Personalidade",
Ed. Vozes, 1981).

A respiração já é possível no sexto mês após a concepção,
quando o feto mede aproximadamente 30 cm e
pesa cerca de 700 gramas. Ao fim do sétimo mês vários
movimentos reflexos, possivelmente relacionados a funções
de conservação, estão em pleno desenvolvimento,
tais como o reflexo de sucção e o reflexo de preensão.

O feto humano pode ser condicionado a movimentar-
se ao som de um apito. Estudos sobre respostas condicionadas
de fetos têm sido utilizados para demonstrar
que o nascituro pode aprender. Como o córtex não está
funcionalmente desenvolvido na época do nascimento,
este tipo de aprendizagem deve ser conseguido por intermédio
de estruturas subcorticais. Como já foi dito, nos
capítulos precedentes, que as funções mediúnicas e paranormais
têm suas bases assentadas no subcórtex,
pode-se inferir que já durante a gestação é possível ao
nascituro receber influências outras que não do Espírito
materno (mediúnicas).

Fowler (1962) submeteu ratas prenhes a irradiação
e pôde observar nas crias um comportamento pós-natal
estranho. Crianças nascidas de mulheres grávidas que

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


sobreviveram ao holocausto de Hiroshima tendem a mostrar
várias reações físicas e comportamentais incomuns.
Sears, Mac Coby e Lewin (1952) verificaram existir relação
entre o relato verbal de estados emocionais da mãe
e o comportamento posterior dos filhos. Ratas prenhes
submetidas a estímulos provocadores de medo pariram
ratos mais ou menos emocionais do que os ratos descendentes
do grupo de controle.

Quando a plascenta não é mais capaz de fornecer
nutrição ao feto, e o mesmo tem condições de maturidade
para sobreviver fora do útero materno, dá-se o nascimento.
Segundo Smith (1961), parece haver relação entre
o medo da mãe de sentir a dor do parto e a dor que
ela posteriormente comunica ter sentido. Os obstetras recomendam
"parto natural", pois ele dá maior satisfação à
mãe e reduz as possibilidades de prejuízo à criança.

O recém-nascido tem comportamentos reflexivos,
tais como respirar, sugar, engolir, digerir, evacuar, reflexo
plantar, agarrar e de alarme (reflexo de Moro). Stanley
Hal propôs a Teoria da Recapitulação: o aparecimento e

o desaparecimento da "cauda pré-natal, a seqüência engatinhar-
caminhar recapitulam o desenvolvimento gradual
da espécie humana, de um animal de quatro pernas
para um animal bípede. Em outras palavras, a ontogênese
recapitula a filogênese.
Em "Evolução em dois Mundos" (FEB, 1958), André
Luiz faz uma brilhante descrição desse processo tanto da
perspectiva do plano físico como espiritual. Segundo ele,
a evolução física é paralela e sinérgica à evolução do
corpo espiritual, desde o reino mineral, passando pelos
reinos vegetal e animal, até a culminância atual na espécie
humana, que, de modo algum, representa o ponto final
do processo evolutivo da alma.

29 6 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


A partir do parto, a criança inicia o processo de maturação,
ou desenvolvimento biológico, que leva a mudanças
de estrutura e de comportamento. Na maioria das
atividades de desenvolvimento durante a infância, por
exemplo, caminhar, falar, treinamento das dejeções etc ,
há pouca vantagem em proporcionar treinamento antes
da maturação das estruturas e processos biológicos relevantes.
Além dessas tendências, Piaget (1954) apontou
outra tendência de desenvolvimento de caráter social: o
eixo egocentrismo-socialização.

São etapas fundamentais a coordenação motora, a
linguagem e o reforço social. Segundo Gesell e llg, a
criança avança dois passos e retrocede um, descrevendo
uma "espiral de desenvolvimento". Hess observou em determinados
animais o interessante fenômeno ao qual denominou
"impritting", o qual pode ser observado também
nos seres humanos: as crianças podem ser "impressas"
para um "conforto de contato", ou estimulação tátil-cinética,
na idade de dez a doze meses. Ele afirma que a
criança deve receber uma apropriada estimulação tátil-cinética
para que ela possa aprender a receber e expressar
afeição, de modo apropriado, mais tarde. Como será visto
nos próximos parágrafos, isso é de fundamental importância
ao desenvolvimento afetivo da personalidade adulta,
e serão vistas as mutilações, irreversíveis, provocadas
nas crianças que passam longos períodos em orfanatos,
creches, hospitais ou mesmo em lares onde os cuidados
maternos são insuficientes.

Marlow destacou que a mãe proporciona "conforto
de contato", além de alimento e cuidados de higiene e de
saúde. Segundo Mallpass, até agora, no entanto, nenhum
cientista ou psicólogo foi capaz de precisar o que é
e como é a apropriada estimulação de "conforto de conta-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO 29 7


to" na infância. A carência desse elemento foi magistralmente
estudada pelo psicanalista nova-iorquino Spitz,
mas o que é a coisa em si permanece encoberto para a
ciência oficial.

Margaret Ribble, psiquiatra infantil, observou que as
crianças necessitam de três tipos de estimulação sensorial,
além da atividade nutritivo-oral: tátil (contato), cinestética
(movimento) e auditiva (audição). Essa autora postula
que todas as crianças precisam ser tratadas com afeto.
Quando a mãe embala seu filho está proporcionando
estimulação tátil-cinestética. Ou quando segura suavemente
a criança, ou quando "conversa", murmura ou canta,
está proporcionando estimulação auditiva. Contudo, a
Psicologia ainda não resolveu o problema de como esses
estímulos devam ser proporcionados para que haja conveniente
estimulação.

Exemplificando, uma criança de nível sócio-econômico
elevado, com babá estrangeira bem remunerada,
berço confortável e luxuoso, brinquedos musicais e pais
socialmente muito atarefados, portanto, emocionalmente
distantes, embora esteja recebendo convenientemente
cuidados de higiene, alimentação e estimulação tátil-cinética,
poderá estar carente de algum fator imponderável,
chegando mesmo a desenvolver problemas psicológicos.

Harlow demonstrou, com sua clássica experiência
com macaquinhos, que estes demonstravam afeto a
"mães" de pano felpudo, preferentemente a "mães" de
tela de arame, mesmo quando providas de apetitosas
mamadeiras.

Ora, essa descoberta fundamental da Psicologia,
esse misterioso e desconhecido "algo mais", já pressentido,
imprescindível ao desenvolvimento e crescimento
tanto físico como emocional da criança, o qual a Ciência

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ainda não conseguiu isolar, é claramente revelado e explicado
pelo Espiritismo.

Esse algo mais é descrito pela Posição Espírita
como sendo um composto altamente complexo de "magnetismo
animal", além de fluidos espirituais, tais como as
ondas do pensamento emitidas pelo amor materno, ou
pela substituta amorosa, sem cujo aporte a criança definha
e falha em seu desenvolvimento psicomotor.

Contudo, de um modo geral, falam alguns teóricos
no amor materno, mas esse termo continua sendo tão
vago e de difícil explicação como a terminologia técnica
estimulação tátil-cinética, ou conforto de contato. Mas ao
aplicar aqui a hipótese do intercâmbio mediúnico adulto-infantil,
tudo se esclarece.

Durante a primeira infância, a criança é uma espécie
de "vampirinho fisiológico". Ela não é física, psíquica,
nem fluidicamente auto-suficiente. Daí a necessidade vital
de "alimento psíquico", sob a forma de fluidos e ondas
mentais de amor, embora esse termo seja um tanto vago,
para poder sobreviver. Necessita a criança de um "halo
fluídico protetor" engendrado pelas figuras parentais ou
seus substitutos, tal como o peixinho em um aquário:
sem água no recipiente como sobreviveria?

Vários dados experimentais apontam na confirmação
dessa hipótese espírita. A Parapsicologia já demonstrou
a existência desse algo mais, como sendo uma exteriorização
da energia mental, a que denominou psicocinésia.
Demonstrou também a transmissão do pensamento
ou telepatia. Os "raps", as mesas girantes e o mediunismo
são também fatos demonstrados pelo Espiritismo e
por outras correntes filosóficas e religiosas que também
apontam no mesmo sentido. Tudo isso tende a demons-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


trar que o que existe por trás do amor materno é a doação
de energias mento-biomagnéticas.

Rene Spitz, psiquiatra infantil, observou um grupo
de crianças, criadas no hospital, com um mínimo de cuidados
humanos, com outro grupo de crianças criadas em
uma instituição correcional de mulheres, que recebiam
uma quantidade adequada de estímulos.

As crianças criadas na higiênica enfermaria demonstraram
reações comportamentais de certa gravidade.
Inicialmente apresentaram o que Spitz denominou
"Marasmo": debilitação física, ou definhamento, a despeito
de alimentação e cuidados higiênicos adequados.

Ao "Marasmo" sucede a "Depressão Anaclítica":
aguda ausência de resposta à estimulação ambiental,
apesar de não ter insuficiência orgânica. Ela não reage a
sons altos, luzes projetadas etc.

Estudos de Yale e outros indicam que o tipo e a
quantidade de estimulação tátil-cinética influenciam tanto

o comportamento infantil como comportamentos futuros,
na adolescência e na fase adulta.
Malpass ao indagar: "Quais são os componentes
básicos do amor?", responde que "até agora esta pergunta
tem sido respondida por poetas, escritores e filósofos,
mas não por cientistas". A Doutrina Espírita lança novas
claridades sobre esse assunto tão palpitante como fundamental
ao desenvolvimento da personalidade.

Harlow (1962) destaca também a importância e a
conveniência do relacionamento social, como brincar com
outras crianças e companheiros.

Outra fonte de perturbação no desenvolvimento e
crescimento infantil é a rejeição. Os pais podem demonstrar
rejeição pelos filhos de modos os mais diversos.
Abandono é talvez o modo mais comum. O castigo cor-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


poral, a ameaça verbal e por gestos são outros. Negligenciar
a criança é outro modo de demonstrar rejeição.

O oposto é outra fonte de distúrbios emocionais e
cognitivos na infância e na adolescência: são os pais que
evitam um comportamento independente normal da criança,
cercando-a de superproteção.

Certos pais superprotetores geralmente estão se
auto-enganando, através do mecanismo psicodinâmico
de defesa do eu denominado "formação reativa", e podem
estar mascarando fortes sentimentos de rejeição.
Esse processo, inconsciente, quando muito patológico,
pode levar, não raro, a quadros de neuroses obsessivo-compulsivas,
com idéias obsedantes de violência dirigida aos
filhos e contra as quais lutam desesperadamente, sem
conseguir dominá-las.

Contudo, segundo a maioria dos autores, a atitude
mais mutiladora, por parte dos pais, em relação ao seus
filhos, é a denominada ambivalência, que pode ser manifesta
no sentir, no pensar e no agir. Quando essa perturbação
é por demais intensa, torna-se avassaladora, tendo
alguns autores criado o termo de mãe esquizofrenogênica,
embora discutível sob diversos aspectos.

Bosselmann, Malpass e outros consideram que o
ideal seria os pais ensinar seus filhos a se autodirigirem
pela utilização criteriosa, tanto de reforços positivos como
de estímulos de aversão. Em outras palavras, uma educação
mais baseada no afeto e na compreensão, como
reforços positivos, do que castigos tanto físicos como psíquicos.


Do ponto de vista espírita, André Luiz refere que "a
criança se desenvolve, tomando o alimento preciso à expansão
de sua máquina orgânica, passando a realizar
por si, isto é, ao comando da mente, a renovação celular

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


dos tecidos e órgãos que lhe constituem o campo somático,
de maneira a que se lhe ajuste a forma física aos moldes
do corpo espiritual" (op. cit.).

O desenvolvimento infantil, de acordo com a Psicologia
Analítica junguiana, é básico para o desenvolvimento
ulterior da personalidade e a realização do destino do
indivíduo, pois seria inconcebível ocupar-se alguém com

o "processo de individualização" (ou a iluminação espiritual,
para se utilizar de terminologia espírita), sem considerar
devidamente o Eu, que se forma e se fortalece na
infância e na adolescência.
Da Doutrina Espírita tem-se que nos porões do inconsciente
espiritual estão alojados os diversos "Eus"
das personalidades das vidas pretéritas, formando complexos
psicológicos, ou fulcros de energia mental, de natureza
espiritual, a determinar os traços temperamentais
básicos da personalidade atual. Esse repositório jamais
se perde, e sua realidade pode ser afirmada com mais
objetividade nas crianças geniais precoces, como Mozart,
Beethoven etc.

Alexandre Aksakof cita um caso interessante, com
riqueza de detalhes (op. cit., vol. II , pág. 120): "Emília era
minha filha mais moça, de treze anos. Observei que ela
não conhecia música, e nunca tinha tocado uma ária
qualquer, pela simples razão de, na época da nossa chegada
aqui, termos encontrado o país quase desabitado;
era impossível ter um professor de música. Tudo quanto
ela sabe, aprendeu-o comigo ou com alguém da família.
Consegui, em pouco tempo, organizar um pequeno círculo
íntimo. Apresentei a Emília uma folha de papel e um lápis.
Sua mão começou a traçar linhas retas que formavam
uma série de cinco linhas. Depois ela fez as notas e
acrescentou os sinais. Feito isso, deixou cair o lápis e co


30 2 PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


meçou a bater sobre a mesa como sobre as teclas de um
piano. Lembrei-me então que devia sentá-la diante de um
piano; depois de um momento de hesitação, ela aceitou o
meu convite e sentou-se ao piano com a firmeza de um
artista consumado. Bateu resolutamente no teclado e
executou a "Grande Valsa" de Beethoven, em estilo que
teria feito honra a um bom músico. Depois tocou muitas
árias conhecidas, tais como: "Sweet Home", "Boonie
Doon", "The Last Rose of Summer", "Hais to the Chief",
"Lilly Dale" etc. Executou ainda um ária desconhecida,
cantando ao mesmo tempo as palavras improvisadas que
se lhe referiam."

Em seguida Aksakof transcreve o veredicto de von
Hartmann, proclamando que iguais fenômenos não existem.
Contudo, a mera denegação de fatos não ajuda em
nada, em elucidar a realidade dos mesmos.

Contudo, a crítica de von Hartmann ao Espiritismo
foi feita em termos tão claros e lógicos, com tal embasamento
científico e filosófico, que acabaram por ajudar
enormemente a Aksakof a escrever sua monumental
obra já citada.

Embora sem haver citado explicitamente a hipótese
reencarnacionista, Jung fornece um extraordinário depoimento
pessoal em sua obra autobiográfica "Memórias,
Sonhos e Reflexões". Cita o seu caso particular de ter
plena consciência de um outro "Eu", que no caso não era
de modo algum inconsciente. Na página 51 , relata o seguinte:


"No fundo sentia-me 'dois': o primeiro, filho de meus
pais, que freqüentava o colégio, era menos inteligente,
atento, aplicado, decente e asseado do que os demais; o
outro, pelo contrário, era um adulto, velho, céptico, desconfiado
e distante do mundo dos homens (...) O jogo al-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ternado das personalidades ne 1 e n9 2, que persistiu no
decorrer da minha vida, não tem nada em comum com a
'dissociação' no sentido habitual. Pelo contrário, tal dinâmica
se desenrola em todo o indivíduo."

O caso pessoal de Jung diferia da dissociação histérica,
fruto de repressão maciça, que costuma provocar
dupla personalidade ou personalidades múltiplas. Difere
também do "splitting", que ocorre nos esquizofrênicos,
por não apresentar a incongruência característica dos
psicóticos. Alguns detratores de Jung declararam-no esquizofrênico,
mas o fato de o principal sintoma da esquizofrenia,
que é a perda do pragmatismo útil e do contato
com a realidade, estar ausente em Jung infirma esse rótulo.
Segundo Ernest Jones, seu opositor freudiano,
Jung, pelo contrário, apresentou uma vida extraordinariamente
profícua em todos os sentidos (vide Ernest Jones:
"Freud, Vida e Obra").

Assim, esse depoimento de Jung tem extraordinário
valor, na medida em que introduz um novo conceito, cuja
etiologia não é patológica, necessariamente, diferindo
dos processos estudados pela Psicopatologia como fruto
de dissociação, repressão de material psíquico indesejável
ou incompatível com o Eu, cuja sintomatologia mais
aguda pode levar à amnésia, à dupla personalidade, ao
sonambulismo, a atos falhos, a lapsos de linguagem ou
mesmo à grave desagregação da personalidade, com clivagem
e ruptura com a realidade, à dissolução do Eu e a
posterior liberação de material inconsciente sob a forma
de alucinações, delírios, incongruência afetiva etc. etc.

Talvez devido a esses fatos, o autor espiritual Emmanuel
escreveu, com Chico Xavier, interessante artigo,
desaconselhando os procedimentos de regressão da memória,
as "terapias de vidas passadas", pois o normal,

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


segundo ele, é o esquecimento dos "Eus" das personalidades
pretéritas.

Essa Psicologia das profundezas deve ser abordada
com a máxima cautela, pois, como Jung muito bem
alertou, "é tão pouco ainda o que conhecemos da alma,
que se tornaria deveras ridículo acreditar que já estivéssemos
em condições de poder estabelecer teorias gerais".


Em "O Desenvolvimento da Personalidade", Jung
declara que, em Psicologia, é preciso que se tomem as
crianças assim como elas são de verdade, e não como
gostaríamos que fossem. Cumpre, na educação, seguir
as linhas naturais do desenvolvimento, sem ater-se a
prescrições caducas. Não é de admirar que inúmeras
teorias, que pais e educadores ajudam a formar, venham
mais tarde a constituir-se poderosos determinantes de
sintomas de neurose ou mesmo de delírios psicóticos
(idem). Jung cita um caso onde as idéias espontâneas
estavam fora do contexto cultural na qual estavam inseridas:


"Aninha: 'Vovó, por que teus olhos são tão murchos?'


Avó: 'Porque eu já sou velha'.

Aninha: 'Mas ficarás jovem de novo, não é?'

Avó: 'Não, bem sabes que vou ficar cada vez mais
velha, e depois vou morrer.'
Aninha: "Está bem, e depois?"
Avó: 'Então eu me torno, anjo...'
Aninha: 'E depois disso, vais ser de novo uma crian


cinha pequena?'"

O autor observou, certa vez, uma súbita idéia espontânea
em sua filha, Teresa, de três aninhos: "Papai,
antes de nascer, eu já vivi muitas vezes."

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Para muitos, essas idéias infantis são bobagens de
crianças. Mas, serão mesmo? Essas e outras observações,
que para tantos possam parecer desprovidas de sentido,
demonstram que a alma infantil é provavelmente um
oceano ignoto.

Comprovando a simbiose fluídica em que filhos e
pais vivem, do ponto de vista psicológico, Jung observou
que "a criança se encontra de tal modo ligada e unida à
atitude psíquica dos pais, que não é de causar espanto
que a maioria das perturbações nervosas da infância devam
sua origem a algo de perturbado na atmosfera psíquica
dos pais (...) Neste sentido o que importa não são
palavras boas e sábias, mas tão-somente o agir e a vida
real dos pais" (idem).

A faculdade eidética altamente desenvolvida na infância,
aliás, própria do desenvolvimento infantil, e a vida
simbiótica em relação às figuras parentais sugerem forte
dose de mediunismo principalmente na primeira infância.

É justamente em relação à alma infantil, como em
povos primitivos, que se observa aquela característica
que Levy Brul denominou "participation mystique". Essa
característica se deve ao fato de as mentes primitivas
não terem o ego suficientemente desenvolvido, e, como
se sabe, é característico do complexo do ego o denominado
processo secundário de Freud, ou, segundo outros
autores, o juízo crítico da realidade. Tanto a criança
como o primitivo não têm bem delimitada a diferenciação
entre o eu e o não eu. Daí a importância fundamental das
figuras parentais, em relação à criança, e dos elementos
naturais, em relação à mente primitiva. Nessa etapa há
um predomínio do modo mágico de pensar.

Contudo, o tema é muito mais complicado se se
considerar a descoberta de Jung de que as reações mais

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


fortes sobre as mentes infantis não provêm do ego dos
pais, mas do inconsciente. Assim, segundo esse autor,
de nada adianta simular, dissimular, velar, mentir, pois as
crianças percebem o fundo da vida psíquica dos pais de
maneira instintiva, com extraordinário poder de penetração.


Se se considerar a hipótese espirítica de trocas fluídicas,
o grau de complexidade das relações pai-filho atinge
níveis de complexidade inimagináveis.

Como então se poderá proteger as crianças contra
os efeitos deletérios provenientes dos pais? Neste particular,
Jung declara que a responsabilidade dos pais se
estende até onde elas têm o poder de ordenar a própria
vida de maneira que ela não represente nenhum dano
para seus filhos. Mas cita situações do destino contra as
quais de nada adianta nem a educação nem a Psicoterapia.
Tais situações inarredáveis são classificadas pela
Doutrina Espírita como de natureza Cármica, não sendo,
pois, casuais, mais causais. Diante dessas situações dolorosas,
a única solução é uma atitude religiosa perante o
destino: aceitação ativa, aliada a atitudes de devotamento,
abnegação, amor e espírito de renúncia. Aqui está o
enorme valor terapêutico da religião.

Os destinos trágicos atuam, como, por exemplo, o
bacilo da tuberculose. Todos o possuem, mas raros desenvolvem
a doença. O que determina a saúde ou a
doença é a sensibilidade individual à presença do elemento
patogênico. Já se descobriram relações entre cavernas
pulmonares provocadas pelo bacilo e homossexualidade
latente, por exemplo.

A atitude perante o destino pode também ser magistralmente
ilustrada pelo bom e pelo mau ladrão, pregados
no madeiro do calvário: "Um dos malfeitores, ali crucifica-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


dos, blasfemava contra ele: 'Se és o Cristo, salva-te a ti
mesmo e salva-nos a nós!' Mas o outro o repreendeu:
'Nem sequer temes a Deus, tu que sofres no mesmo suplício?
Para nós isto é justo: recebemos o que mereceram
os nossos crimes, mas este não fez mal algum.' E
acrescentou: 'Jesus, lembra-te de mim, quando tiveres
entrado no teu reino.' Jesus respondeu-lhe: 'Em verdade
te digo, hoje estarás comigo no paraíso'" (Mateus, Cap.
23, vers. 39 a 43).

Mesmo que todo objeto religioso não passasse de
mera superstição, a verdadeira atitude religiosa tem, do
ponto de vista psicológico, inquestionável valor terapêutico.
Ao acoplar à ciência o aspecto religioso, adquire,
pois, o Espiritismo extraordinário valor na profilaxia das
moléstias mentais.

Essa atitude religiosa foi genialmente esculpida em
mármore, por Michelângelo, no simbolismo pleno da "Pietá".
A expressão fisionômica da madona não evidencia
nenhum vestígio de desespero, ódio, revolta, mas, ao
contrário, assume uma indefinível expressão de aceitação
do destino.

Essa aceitação não é todavia passiva, perplexa
nem estuporosa. Não tem nada de superficial, afetada
nem convencional. Ela é acompanhada de uma adequação
terapêutica, com reorganização profunda dos sentimentos,
das emoções, das idéias, dos impulsos e das
motivações da personalidade como um todo. Esse processo
se dá por uma espécie de demolição dos limites do
ego, despojando a personalidade de afetos, tais como
vindita, apego, egocentrismo. O centro da personalidade
passa para um nível mais profundo, em direção às instâncias
do inconsciente. A corticalidade parece ceder lugar
à subcorticalidade, local dos efeitos medianímicos.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Jung denominou esse deslocamento do centro de gravidade
da energia psíquica como sendo o Processo de Individuação.
William James (op. cit.) descreveu esse processo
de "renascimento psicológico".

Para a Doutrina Espírita, esses fenômenos psicológicos,
em que ocorrem vivências de estados cada vez
mais diferenciados de consciência, têm uma implicação
ou correlação no corpo espiritual, com modificação da
tessitura, da densidade, acompanhado por uma espécie
de iluminação que pode ser observada na aura espiritual.

Essa mudança do centro ou foco da energia psíquica
é geralmente provocada por experiências dolorosas, e
a crucificação de Cristo é um simbolismo perfeito para a
morte do ego inferior. O autor já experimentou uma vivência
de transcendência do eu, o qual é percebido como um
simples agregado dos engramas mnésicos das experiências
pretéritas. Essa vivência pode ser experimentada, de
modo patológico, por personalidades esquizofrênicas, as
quais perdem o contato com a realidade e o controle do
material arquetípico inconsciente.

Segundo Jung, "uma meta espiritual, que aponte
para além do homem meramente natural e de sua existência
terrena, é exigência incondicional para a saúde da
alma; pois isto é como o tal ponto de apoio reclamado por
Arquimedes, absolutamente necessário para que a Terra
possa ser movida do seu lugar, e nesse caso, para que o
estado natural do homem possa ser transformado em estado
cultural".

Para terminar esse breve ensaio, serão apresentados
alguns conceitos orientais, emitidos pelo médico hindu
Swami Sivananda, em "O Poder do Pensamento pela
Yoga", que são perfeitamente coincidentes com os con-

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


ceitos espíritas, brevemente resumidos nos capítulos precedentes.


Sivananda afirma que "o homem semeia um pensamento
e colhe uma ação. Semeia um ato e colhe um hábito.
Semeia um hábito e colhe um caráter. Semeia um
caráter e colhe um destino".

Segundo ele, cada mudança de pensamento é
acompanhada pela vibração da matéria mental, necessária
para o pensamento funcionar como força. A gênese
de toda criação fenomenológica foi concebida num
pensamento que surgiu na Mente Cósmica. Assim,
todo pensamento possui peso, forma, tamanho, estrutura,
cor, qualidade e poder. O poder do pensamento é
maior que o da eletricidade. A todo pensamento corresponde
uma imagem mental. O corpo também influencia a
mente: "Mens sana in corpore sano."

A transmissão do pensamento é semelhante a um
circuito elétrico, que possui uma diferença de potencial, e
é o subconsciente que recebe as mensagens ou transmissões
e as envia ao consciente.

Assim, o médico hindu afirma que a telepatia, a leitura
dos pensamentos alheios, o hipnotismo (Braid), o
mesmerismo (Mesmer), a cura espiritual provam que a
mente existe e que uma mente forte pode influenciar uma
mente fraca. E assim, sucessivamente, essas correntes
se confirmam mutuamente.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


Apêndice

Ilustrações adicionais relativas a alguns capítulos da
obra. Textos explicativos nas gravuras.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


FIGUR A I
RESUMIDA DE CHUSID



Como querem crer os adeptos do materialismo, como o
Hilomorfismo, o Epifenomenalismo e o Funcionalismo, a
mente não tem existência como coisa, não sobrevivendo,
pois, à morte do corpo físico.

31 2

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


FIGUR A II
ADAPTADA DE TAYLOR & HAUGHTON



A face simbolizo o ego consciente: persona, máscara, personalidade,
mais cortical, representada no desenho. O lado oculto, o diencéfalo,
simbolizaria os diversos níveis do inconsciente. Uma exposição
concisa e eficiente dos aspectos neurológicos, espirituais e psicológicos
do indivíduo pode ser encontrada em "Nos Alicerces do Inconsciente",
de Jorge Andréa.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


FIGURA III
CORTE SAGITAL MEDIANO NO ENCÉFALO


RESUMIDA DE A. HAM


Segundo a Psiquiatria francesa, o Sistema Nenoso Centrai ainda é uma "Boite
noire cybernétique". Diversos autores corroboram a Doutrina Espírita no sentido
de que os mecanismos da mediunidade se processam principalmente no interior
das estruturas diencefálicas.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


FIGURA IV
SISTEMA S D O NEUROEIX O
RESUMIDO DE YAKOLEV



A mente se relaciona com outras estruturas
além do encéfalo: "desde o grupo lectobulbar
das fibras pré-ganglionares, saindo
com os pares cranianos, tecidos com neurônios
do mesencéfalo, protuberância, bulbo,
incluindo os núcleos supra-óticos, paraventriculares
e a parede anterior do infundíbulo,
até o grupo sacro, com neurônios localizados
na medula sacra, nervos especiais
funcionam como estações emissoras e receptoras,
manipulando a energia mental, projetada
ou colhida pela mente..." ("Evolução
em Dois Mundos", André Luiz).

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


FIGURA V
SISTEMA NERVOSO SIMPÁTICO E OS PLEXOS
AUTÔNOMOS MAIS IMPORTANTES
RESUMO DE MORRIS-JACKSON


Plexo carótido


Gânglio coxigeo

Vide maiores detalhes ao longo do texto.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


FIGURA VI
DIAGRAMA DE UMA CÉLULA ANIMAL


RESUMIDO DE DE ROBERTIS


Segundo André Luiz, as milocôndrias, os cromossomos, o centriolo e a substancia
de NissI são os principais pontos de intersecção entre o cérebro físico e o cerebro
espiritual (vide texto).

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO


FIGURA VII
CÓPIA MANUAL ESQUEMÁTICA
DE UM ELETRENCEFALOGRAMA ADULTO NORMAL



A maioria dos fenômenos mediúnicos e parapsicológicos costumam
ocorrer durante um certo "abaissement du niveau
mental", com declínio da atividade cortical e das ondas
Beta., liberação das regiões subcorticais e predomínio das ondas
Alfa, podendo também ocorrer ondas Teta.

PSIQUIATRIA E MEDIUNISMO





Psiquiatria e Mediunismo - Leopoldo Balduino

Livro doado e digitalizado por Fernando José dos Santos, formatado por Marina Campos e revisado por André Luiz de Menezes

Sinopse:

O autor apresenta um estudo resultante de um pequeno e sumário relatório das experiências vividas ao longo de vinte anos de prática como clínico em psiquiatria, quase um decênio como professor adjunto em Faculdade de Psicologia e mais de trinta anos de atividades espíritas.

Os resultados de todos esses anos de esforços aleatórios deram-lhe condições de ter um sentimento de vislumbre de uma mínima parcela da realidade psíquica do indivíduo.

O trabalho segue a linha eminentemente empírica, tendo como roteiro o bom senso aliado às experiências pessoais do autor. Não há pretensão em esgotar o assunto.

Sugere um posicionamento holístico no trato com almas enfermas.


Este livro representa uma contribuição do Grupo Espírita  Allan Kardec aos deficientes visuais.

https://groups.google.com/group/grupo-espirita-allan-kardec?hl=pt-br












-- 



-- 

-- 
--

Muita paz !

 Bezerra

Livros:

http://bezerralivroseoutros.blogspot.com/

 Áudios diversos:

http://bezerravideoseaudios.blogspot.com/

https://groups.google.com/group/bons_amigos?hl=pt-br

 

 

'TUDO QUE É BOM E ENGRADECE O HOMEM DEVE SER DIVULGADO!

PENSE NISSO! ASSIM CONSTRUIREMOS UM MUNDO MELHOR."

JOSÉ IDEAL

' A MAIOR CARIDADE QUE SE PODE FAZER É A DIVULGAÇÃO DA DOUTRINA ESPÍRITA" EMMANUEL

--
--
Seja bem vindo ao Clube do e-livro
 
Não esqueça de mandar seus links para lista .
Boas Leituras e obrigado por participar do nosso grupo.
==========================================================
Conheça nosso grupo Cotidiano:
http://groups.google.com.br/group/cotidiano
 
Muitos arquivos e filmes.
==========================================================
 
 
Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no Grupo "clube do e-livro" em Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para clube-do-e-livro@googlegroups.com
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para clube-do-e-livro-unsubscribe@googlegroups.com
Para ver mais opções, visite este grupo em http://groups.google.com.br/group/clube-do-e-
---
Você recebeu essa mensagem porque está inscrito no grupo "clube do e-livro" dos Grupos do Google.
Para cancelar inscrição nesse grupo e parar de receber e-mails dele, envie um e-mail para clube-do-e-livro+unsubscribe@googlegroups.com.
Para mais opções, acesse https://groups.google.com/d/optout.

Nenhum comentário:

Postar um comentário