terça-feira, 23 de junho de 2015

{clube-do-e-livro} A vida depois de amanhã Sônia Tozzi.txt





A vida depois de amanh�
Autor: Irm�o Ivo
M�dium: S�nia Tozzi
P�ginas: 357


A jovem C�ssia vivia um casamento igual a tantos outros com L�o: um pouco de paz, ci�mes, algumas brigas, pedidos de desculpas, frustra��es e promessas de transforma��o.
Contudo, ap�s cinco anos de turbulenta rela��o, C�ssia, apesar de amar seu marido, descobre quem ele realmente �: um homem falso, interessado apenas na fortuna do
sogro e com uma amante, a ambiciosa Selma.
Desfeita a farsa, C�ssia se separa de L�o, mas ele n�o quer a separa��o legal e, como eram casados em comunh�o de bens, exige sua parte no dinheiro do senhor Orlando,
pai de C�ssia.
No auge de sua gan�ncia e por press�o de Selma, L�o comete o maior desatino de sua vida: assassina o sogro na esperan�a de abocanhar seu quinh�o.
L�o acaba preso e a hist�ria de C�ssia muda completamente. Envolvida em trabalhos de assist�ncia social, C�ssia encontra Frank, um jovem brasileiro que foi adotado
ainda pequeno por um casal americano e que volta ao Brasil tentando resgatar suas origens e encontrar a m�e biol�gica. Essa � a hist�ria que Irm�o Ivo nos conta
em A vida depois de amanh�, romance passado nos dois planos da vida e com psicografia de S�nia Tozzi. Uma leitura emocionante e repleta de ensinamentos fundamentais
para nossa evolu��o espiritual.



Sum�rio:

1 - A desilus�o de C�ssia
2 - A visita aos pais
3 - A uni�o entre L�o e Selma
4 - Diante da verdade
5 - O apoio dos benfeitores espirituais
6 - A trai��o de Selma
7 - O envolvimento com as trevas
8 - O segredo de Sabina
9 - O despertar do amor
10 - A visita de Orlando ao lar terreno
11 - O perd�o como condi��o para o progresso
12 - A hist�ria de Frank
13 - Selma diante da verdade
14 - O perd�o
15 - O reencontro entre m�e e filho
16 - O arrependimento de L�o
17 - Limpando o passado
18 - A uni�o das almas afins

19 - A hist�ria de Eneida
20 - O sonho da gravidez
21 - O retorno de Armando
22 - A oportunidade de reajuste de L�o
23 - Um ato de amor: a ado��o
24 - O reconhecimento das almas
25 - A chegada de Bernardo ao lar
26 - A doen�a de C�ssia
Considera��o
Aos leitores



Cap�tulo 1
A desilus�o de C�ssia


C�ssia, n�o suportando mais as agress�es verbais de L�o, seu marido h� quase cinco anos, saiu impetuosamente de seu quarto e, descendo as escadas de sua casa, correu
em dire��o � estufa, onde havia tempos se entregava ao cultivo de orqu�deas e brom�lias.
Seguia apressada passando as m�os sobre o rosto, tentando aliviar as l�grimas que desciam em abund�ncia, dando testemunho da grande dor que lhe sufocava a alma.
Seus cabelos negros e longos balan�avam agitados sofrendo a a��o do vento, que os levava para l� e para c�, agindo facilmente na leveza dos fios macios e sedosos.
Cada vez mais nervosa, passava com for�a as m�os no rosto, querendo, com esse gesto, livrar-se das l�grimas teimosas.
Assim que entrou no lugar que considerava seu para�so, sentou-se no ch�o por entre os vasos das flores que tanto amava e entregou-se a choro copioso - efeito da
imensa ang�stia que dominava seu cora��o.
"Ele n�o pode fazer isso comigo", dizia a si mesma, "n�o tem esse direito; n�o � justo tratar-me dessa maneira, sem nenhum respeito, sem o m�nimo de considera��o.
Que amor � esse que ele diz sentir? Que ci�me � esse que maltrata, agride e sufoca a pessoa que � o alvo desse sentimento maluco e doentio?"
Durante longo tempo permaneceu entregue aos seus pensamentos. T�o absorta estava, n�o percebeu a presen�a de L�o, que, sem se fazer notar, observava a esposa encolhida
em um canto como um bichinho assustado.
- L�o! - exclamou C�ssia, dando � pr�pria voz um misto de surpresa e temor. - O que faz aqui? Veio acabar de derramar seu fel? - perguntou audaciosa.
Meio sem jeito, L�o abaixou-se, tentando uma melhor aproxima��o, e respondeu:
- Desculpe-me, C�ssia, n�o sei o que deu em mim para falar com voc� de uma maneira t�o grosseira.
- Grosseira � pouco, L�o, eu diria impiedosa.
- Estou lhe pedindo desculpas! N�o sei o que deu em mim, j� disse.
- Pois eu sei o que deu em voc�. � seu ci�me doentio, sua falta de controle emocional que levam voc� a essas atitudes grosseiras e injustas.
L�o, ficando novamente nervoso, respondeu com a voz alterada:
- Mais uma vez vou dizer que estou pedindo desculpas!
- Estou ouvindo seu pedido de desculpas, mas n�o tenho mais disposi��o para desculpar, porque sei que em pouco tempo tudo acontecer� novamente.
- Prometo que n�o, C�ssia. Vou me controlar; voc� sabe que n�o posso viver sem voc�. D�-me mais uma chance.
C�ssia fechou os olhos.
Na sua dor, entregou-se a Jesus e suplicou por aux�lio.
Passados poucos segundos, respondeu.
- Est� bem, L�o, vou desculp�-lo mais uma vez, na esperan�a de que voc� realmente mude e se transforme em algu�m melhor, mais sereno e mais gentil, para que nosso
casamento prossiga mais feliz.
Calou-se.
Nenhum dos dois disse mais nada.
Quando L�o fez men��o de sair, C�ssia perguntou:
- Por que voc� faz isso, L�o? Qual a raz�o de me tratar assim, se nunca lhe dei motivos para desconfian�as.
Sentindo-se realmente envergonhado, L�o respondeu:
- N�o sei C�ssia. N�o entendo esse meu comportamento. O que posso lhe dizer � que sinto uma sensa��o estranha, muito forte, uma necessidade de agredir voc�. Perco
o controle sobre mim mesmo. Quando tudo passa, arrependo-me e sei que j� � tarde, pois o mal est� feito.
Entristecida, C�ssia respondeu:
- Voc� precisa de ajuda, L�o.
- O que quer dizer?
- Quero dizer que necessita de ajuda, mas eu n�o tenho condi��es de ajud�-lo. O melhor seria procurar um profissional da �rea.
P�lido, L�o respondeu:
- Pelo amor de Deus, C�ssia, est� ficando louca? De que �rea est� falando? O que est� querendo dizer?
- Estou me referindo a um psic�logo, algu�m que tenha condi��es de faz�-lo entender a si mesmo. Voc� se desequilibra facilmente; perde o controle e me agride, machucando-me
f�sica e emocionalmente.
Irritado, L�o permaneceu em sil�ncio por um tempo e, por fim, disse � esposa:
- Vamos encerrar este assunto. J� pedi desculpas, se n�o quiser aceitar � um direito seu. Quanto a procurar ajuda de um profissional, esque�a C�ssia, n�o tenho necessidade
disso nem pretendo me envolver com pessoas que s� pensam em arrancar dinheiro dos tolos. A vida � uma s�, meu bem, e temos de aproveitar ao m�ximo, porque um belo
dia tudo se acaba. Sou assim e ningu�m pode mudar minha personalidade, mesmo porque n�o vejo motivos para mudar. O ci�me faz parte de mim e a impulsividade tamb�m.
Desesperan�ada, C�ssia respondeu:
- Voc� � quem sabe, mas procure pensar que nada acaba quando nossa vida f�sica se extingue.
- O que est� querendo dizer com isso? Semear para os outros colherem quando eu me for, � isso?
- N�o! Semear para voc� mesmo colher; se n�o aqui, na vida futura.
- C�ssia, j� lhe pedi mais de uma vez para n�o tocar nesse assunto de vida futura. N�o acredito nisso, n�o quero falar nem me envolver com essa quest�o, que considero
sem conte�do e sem nenhum embasamento cient�fico. Gostaria que n�o tocasse mais neste assunto.
- Tudo bem, L�o, voc� � quem sabe. Agora, se n�o se importar, gostaria que me deixasse sozinha. Vou ficar aqui mais um pouco, meus olhos est�o ardendo e n�o quero
que Sabina me veja assim.
Altivo como sempre, L�o se retirou, deixando m�goa no cora��o de sua esposa.
C�ssia, im�vel, permanecia no mesmo lugar, sem se dar conta das horas que passavam. A ela importava apenas sua dor, a decep��o mais uma vez presente em sua vida
e o medo de n�o conseguir levar adiante uma uni�o t�o cheia de conflitos.
"Se ao menos tiv�ssemos filhos!", pensava com ang�stia. "Mas nem filhos ele quer ter, e isso s� pode ser fruto do seu grande ego�smo."
S� conseguiu voltar � realidade quando Sabina, servi�al em sua casa e, antes de qualquer coisa, sua amiga, pois trabalhara com sua m�e desde que C�ssia era ainda
um beb�, aproximou-se e delicadamente tocou em seus cabelos.
- O que faz minha menina chorar desse jeito? Por que est� usando esses �culos? - perguntou carinhosa.
C�ssia, como costumava fazer sempre que se sentia perdida nas pr�prias emo��es, aconchegou-se nos bra�os da velha amiga que a vira crescer feliz ao lado dos pais,
e lhe disse ainda chorosa:
- Sabina, n�o sei se vou ag�entar o temperamento forte do L�o. Tenho medo, Sabina, muito medo!
- O que � isso, minha menina, medo do seu marido? Ele a ama; n�o faz por mal.
- Sei muito bem que voc� diz isso para n�o haver brigas entre n�s dois, Sabina, mas deve lembrar-se de que nunca fui agredida nem humilhada por meus pais. Entretanto,
hoje, ao lado de L�o, � raro passar uma semana sem que n�o haja algum tipo de conflito.
- Querida, voc� � filha �nica, sempre foi � alegria de seus pais e criada com muito mimo, � natural que estranhe o jeito mais rude do senhor L�o.
- N�o � s� o jeito rude, mas o ci�me desmedido, doentio, enfim, trata-me como uma propriedade sua.
Sabina sabia que C�ssia estava coberta de raz�o, mas seu jeito simples de ser e seu grande amor por aquela "menina", com pouco mais de vinte anos, de quem por diversas
vezes trocou as fraldas e que fizera dormir cantando lindas can��es de ninar, impeliam-na a pronunciar apenas palavras que acreditava aliviarem a tens�o de C�ssia.
Acariciando os fios sedosos de seus cabelos, disse docemente:
- Vamos fazer o seguinte, voc� vai entrar comigo, ir at� seu quarto e tomar uma ducha bem morninha e refrescante. Acho que se sentir� melhor. Quando descer, estarei
com um suco de manga de que tanto gosta prontinho para voc�. Que tal, vamos?
- Queria muito desabafar com voc�, Sabina. N�o gosto de levar meus problemas para meus pais, pois eles j� fizeram muito por mim. Se souberem ficar�o tristes, e n�o
quero que sofram.
- Mais tarde conversamos C�ssia.
Como uma crian�a, C�ssia levantou-se, seguindo o conselho de Sabina. Ao v�-la assim t�o d�cil, Sabina sentiu seu cora��o apertar.
"Jesus, meu Divino Amigo, proteja minha 'menina'; ela n�o tem a real no��o do quanto seu marido � rude, grosseiro e, ouso dizer, Senhor, capaz de tudo para obter
o que quer. Receio por ela, Senhor, por isso lhe pe�o aux�lio."
Ap�s terminar sua singela prece, Sabina disse a si mesma: "Se ao menos eles tivessem filhos, o cora��o do senhor L�o poderia se tornar mais sens�vel".
Com os bra�os envolvendo C�ssia, seguiu em dire��o a casa. Estava intrigada com o fato de C�ssia estar usando �culos escuros.
"Nunca a vi de �culos escuros aqui na estufa! O que ser� que aconteceu de verdade? Bem, uma hora ela vai ter de tir�-los e ficarei sabendo a verdade."
Como Sabina previra, C�ssia desceu envolvida em um confort�vel roup�o branco; os cabelos presos enrolados em uma pequena toalha acentuavam em seu rosto a palidez
que o envolvia. Estranhou que ela ainda estivesse usando os �culos escuros, o que n�o combinava com a maneira como estava vestida e muito menos com o fato de ela
estar dentro de casa.
Sem cerim�nia, perguntou:
- Qual a raz�o de estar ainda com esses �culos, C�ssia?
Tentando aparentar uma desenvoltura que estava longe de sentir, respondeu:
- Ora, Sabina, por nenhuma raz�o especial. Que mal h� em usar �culos escuros?
- Mal nenhum, desde que n�o seja com um roup�o de banho, dentro de casa e no finzinho da tarde. N�o lhe parece estranho?
N�o sabendo o que responder, C�ssia permaneceu em sil�ncio.
Sabina, certa do que supunha haver acontecido, aproximou-se mais de C�ssia e, n�o se importando com o que ela pudesse pensar ou fazer, retirou bem devagar os �culos
de seu rosto. N�o se preocupando em esconder a indigna��o, falou sem pensar o que lhe aflorou na mente:
- Eu mato esse cafajeste!
- O que � isso, Sabina, ficou louca?
- N�o, n�o fiquei, mas posso ficar por tanta indigna��o e revolta que estou sentindo contra esse monstro que teve a coragem de encostar a m�o na pr�pria mulher.
Quem ele pensa que �? O dono do mundo? O senhor da verdade? Aquele que est� acima do bem e do mal?
Assustada, C�ssia disse:
- Sabina, j� passou; n�o faz sentido agora voc� ficar desse jeito por algo que n�o se pode apagar.
- Passou, mas as marcas ficaram nesse rosto lindo. Como simplesmente apagar, esquecer, como se nada tivesse acontecido! N�o me pe�a isso.
- Sabina, essas marcas n�o s�o as piores, o tempo vai apag�-las. As piores s�o as que trago na minha alma. Essas, sim, me ferem como l�minas afiadas agridem minha
dignidade; anulam a minha autoestima, enfim, mostram-me o outro lado do homem que amo; o homem que eu escolhi para viver ao meu lado, partilhar dos meus sonhos e
ilus�es, construir uma fam�lia e uma vida de harmonia e alegria.
C�ssia deixou novamente as l�grimas descerem por seu rosto.
- Nunca percebi que ele a agredia fisicamente, C�ssia. Verbalmente, presenciei v�rias vezes, mas n�o imaginei que chegaria a esse ponto. Por que n�o se abriu comigo?
- Realmente ele nunca fez isso, Sabina, foi � primeira vez.
- E qual foi � raz�o dessa brutalidade?
- O motivo de sempre, ci�mes. Ficou nervoso, descontrolado e n�o conseguiu se dominar.
Mas que ci�me � esse, meu Deus, que machuca a pessoa que se diz amar. N�o consigo entender.
- Ele tamb�m n�o entende. O melhor mesmo � esquecer, se for poss�vel - concluiu C�ssia.
- Voc� � quem sabe, C�ssia. S� voc� pode saber o que quer para sua vida, e eu n�o tenho o direito de me intrometer. Mas n�o se esque�a de que pode contar comigo
sempre; quero-a como a uma filha; vi voc� crescer e prometi � sua m�e que estaria sempre ao seu lado, protegendo-a. Agora tome seu suco; enquanto isso, preparo uma
compressa para desinchar esses olhos.
- Obrigada, Sabina.
- Ah! Minha amiga - disse C�ssia, abra�ando-a -, o que seria de mim sem voc�. Ainda bem que minha m�e abriu m�o de sua companhia, permitindo que viesse comigo.
- Acho que dona Antonieta sabia que n�o seria bom deix�-la sozinha morando longe deles. Ela dizia que ficaria mais tranq�ila, em rela��o a voc�, comigo por perto.
Parece que acertou.
- Penso que � verdade quando dizem que m�e possui um sexto sentido! - exclamou C�ssia. - Por falar nisso, estou pensando em ir visit�-los e matar um pouco a saudade.
- Isso � bom, C�ssia, eles sofrem com sua aus�ncia.
- Pode se preparar porque, quando eu for, voc� ir� comigo.
- Est� falando s�rio? - perguntou Sabina no auge do entusiasmo.
- Claro que estou falando s�rio, por que iria brincar com um assunto desses?
- Vou esperar ansiosa por esse dia, sinto muita saudade de dona Antonieta e do senhor Orlando.
- Pois em breve vai matar essa saudade - finalizou C�ssia, levantando-se e encaminhando-se para seu quarto.
Ao entrar em seus aposentos, assustou-se com L�o sentado em confort�vel poltrona, apreciando, atrav�s da enorme janela de vidro, o gramado que se estendia � sua
frente.
Surpresa, C�ssia perguntou:
- N�o esperava encontr�-lo aqui h� essa hora; acabou de ir para a empresa. Por que voltou?
- Porque quero conversar com voc�.
- Acha que agora � um bom momento para conversarmos?
- Acho e quero que seja agora.
- Tudo bem, L�o, vamos conversar.
C�ssia sentou-se pr�ximo ao marido e disse:
- Pronto, estou � sua disposi��o. Sobre o que quer conversar comigo?
- Sobre n�s dois.
- L�o, n�o estou em condi��es de conversar sobre n�s depois de tudo o que aconteceu. Vamos deixar para outro dia.
- N�o, C�ssia, tem de ser agora.
Suspirando, C�ssia concordou.
- O que deseja, ent�o? Pode falar.
Dando a impress�o de estar medindo as palavras para n�o ofend�-la, L�o falou com calma e em voz baixa:
- C�ssia, nesses cinco anos de casamento, foi a primeira vez que aconteceu uma situa��o como a que vivemos hoje. Eu, tanto quanto voc�, estou chocado com meu procedimento.
Pensei longamente, analisei friamente a mim mesmo e cheguei a uma �nica conclus�o.
- E qual foi � conclus�o a que chegou? - indagou C�ssia, pressentindo qual seria.
Com a fisionomia impass�vel, L�o respondeu:
- � melhor nos separarmos.
C�ssia sentiu faltar-lhe o ch�o.
- Separar? - perguntou at�nita ao ouvir a confirma��o do que pressentira.
- Para o nosso bem, C�ssia. N�o consigo dominar meus instintos grosseiros. Sou impulsivo e rude. Receio o que possa vir a fazer daqui para frente.
C�ssia silenciou.
- Amava o marido e em nenhum momento considerara a hip�tese de uma separa��o.
Acreditando estar fazendo a coisa certa, disse ao marido:
- L�o, vamos colocar uma pedra em cima disso tudo. Apagar da nossa lembran�a o dia de hoje e tentar recome�ar nossa vida a partir de agora.
- Voc� pensa assim mesmo, de verdade?
- Penso. Gostaria apenas que voc� analisasse a possibilidade de uma terapia. Creio que se n�s dois procur�ssemos o apoio de um profissional com o intuito de nos
conhecer melhor, analisar nossas atitudes diante das situa��es que nos aborrecem e com as quais geralmente n�o sabemos lidar, acredito que poder�amos melhorar muito
nosso casamento.
L�o silenciou por um longo tempo, dando a impress�o, por sua fisionomia, de que sofria e tentava buscar em si mesmo uma solu��o para o problema.
Por fim, disse, infligindo � pr�pria voz um tom cansado, quase desesperado.
- C�ssia, n�o adianta tentar nada. Sei que n�o tenho condi��es de mudar minha maneira de ser. Apesar de amar voc�, acho que o melhor � realmente a separa��o.
C�ssia tentou argumentar suas conclus�es.
- L�o, como pode dizer que me ama e me pedir, ao mesmo tempo, a separa��o?
- � o melhor caminho, C�ssia.
- N�o, n�o � o melhor caminho. � o caminho que voc� quer seguir. Cansou de mim e usa esses argumentos que, come�o a acreditar, foram de caso pensado, para ter um
motivo de atingir seu objetivo. Seu arrependimento, seu pedido de desculpas, seu amor � tudo mentira, tudo falso.
Enquanto ouvia a voz da esposa, L�o pensava:
"Como vou p�r um fim a isso? Por mais que eu fale, ela sempre vai encontrar argumentos para continuar uma rela��o que n�o quero mais. Cheguei ao extremo e nem assim
C�ssia percebe que � o fim. Mas preciso me controlar, quero que continue a acreditar que a amo e que estou me sacrificando para o bem-estar dela. Prometi a Selma
que hoje poria um fim a esse casamento definitivamente, e � o que vou fazer."
C�ssia, incomodada com o sil�ncio do marido, perguntou-lhe:
- Em que pensa L�o, est� calado! Se voc� se abrir comigo sobre o que realmente o preocupa, poderemos analisar juntos toda essa situa��o e chegar a uma conclus�o
que seja boa para n�s dois. N�o precisamos nos magoar; vamos confiar um no outro, falar claramente o que pensamos e sentimos. A partir da�, decidimos que rumo deveremos
tomar para a felicidade de ambos.
Animado, L�o pensou: "E isso, sem perceber ela me deu a dica de que precisava".
Continuando a ostentar a fisionomia melanc�lica de quem toma uma decis�o apenas com o prop�sito de n�o ferir ningu�m, L�o continuou com sua apresenta��o de falsidade.
- C�ssia, nunca quis tocar nesse assunto com voc�, pois sempre soube quanto maltrata sua alma, seus sentimentos, enfim, seu sonho acalentado durante anos.
- Meu Deus, L�o, fale de uma vez. Poupe-me dessa ang�stia que me consome.
- � simples, sempre tive como voc�, o desejo de ser pai, construir uma fam�lia de verdade. Nossa uni�o vai completar cinco anos E at� agora permanecemos sem o sorriso
de uma crian�a alegrando nossa casa, e isso me faz sofrer.
Indignada, C�ssia o interrompeu.
- Por favor, L�o, pare com esse fingimento. Voc� sempre disse que n�o queria filhos, que n�o tinha a menor import�ncia o fato de eu n�o poder gerar um filho. Quantas
e quantas vezes sugeri que adot�ssemos uma crian�a e voc� sempre negou, argumentando que para voc� bastava a minha companhia e o meu amor. Agora voc� vem com esse
discurso de que sofre com o fato de n�o conseguir realizar seu sonho de ser pai? Penso que o que realmente quer � me magoar.
- Ao contr�rio, nunca falei nada para n�o mago�-la, C�ssia.
- E me magoa agora jogando em cima de mim a culpa de suas frustra��es, sua grosseria, � isso L�o? Quer me culpar pelo fim do nosso casamento? Por que nunca quis
adotar uma crian�a que poder�amos amar como a um filho?
- Porque queria e quero meu pr�prio filho, ser� que n�o entende? N�o estou preparado para amar o filho de outra pessoa.
- N�o, n�o entendo e nunca vou entender. O amor que temos para dar, se for verdadeiro, busca o alvo desse amor maternal no pr�prio �tero ou no cora��o. Mas voc�
est� muito longe de saber o que � isso porque sempre se escondeu atr�s de um pseudo-ci�me para dar vaz�o �s suas grosserias, sua viol�ncia ao me agredir com palavras
ferinas, at� chegar ao limite com a agress�o f�sica. Agora consigo compreender o porqu� de tudo isso e aonde voc� pretende chegar. Quer a separa��o, mas n�o � digno
o bastante para assumir sua vontade. Como sempre faz, esconde-se atr�s de um amor que n�o sente, deixando a responsabilidade comigo. Quer sair como v�tima, e n�o
como algoz.
L�o estava surpreso com a perspic�cia de C�ssia. N�o entendia como ela chegara � verdade, se planejara tudo com cuidado.
- C�ssia! - exclamou.
Dando vaz�o � sua dor, C�ssia continuou:
- H� quanto tempo deixou de me amar, L�o? Por que as declara��es mentirosas, as promessas v�s, os carinhos falsos? Por que me enganou por tanto tempo?
- Tamb�m n�o � assim como voc� fala C�ssia. Est� exagerando.
- Realmente n�o � assim, � bem pior. Pensa que nunca observei a maneira como trata a Sabina ou qualquer outra pessoa que julga erroneamente estar abaixo de voc�?
- C�ssia, eu s� quero ter um filho, construir uma fam�lia de verdade, e isso voc� n�o pode me dar.
- A� � que voc� se engana, L�o. Voc� n�o quer construir uma fam�lia, e sim destruir sua fam�lia em nome de um filho que tenho certeza de que voc� nunca quis ter.
N�o conseguindo mais segurar sua irrita��o, L�o deixou cair � m�scara e disse aos gritos:
- Pois muito bem, C�ssia, voc� falou tudo o que quis. Agora � minha vez e voc� vai me escutar. H� algum tempo venho dando, propositadamente, motivos para voc� tomar
a iniciativa de terminar o nosso casamento, mas voc� n�o o fez. Suportou tudo como uma m�rtir, achando que era o melhor a fazer. Pois n�o foi. Tudo para voc� se
relaciona � vida futura, uma utopia sem fundamento, crendice de quem n�o quer tomar atitude por medo ou sei l� o qu�. Eu n�o acredito em vida futura, C�ssia, e me
irrita essa sua mania de querer me mostrar uma coisa que para mim n�o existe. A vida � aqui e agora,
C�ssia. Viver � aqui, a felicidade existe aqui e � neste mundo que devemos correr em busca do prazer. Para ser sincero, C�ssia, cansei. Quero respirar sem ter de
ouvir suas crendices.
- Meu Deus, L�o, estou perplexa! Nunca ouvi tantas palavras vazias, perigosas. Responda-me, L�o, voc� n�o acredita em Deus?
- C�ssia, eu creio no que posso ver. Creio no mundo em que vivo, mundo esse que s� d� oportunidade aos mais espertos. � nessa vida que eu creio.
- Tantos anos juntos e mal o conhe�o! - exclamou C�ssia, decepcionada.
Na tentativa de se justificar, L�o voltou a dizer:
- Eu s� quero ter um filho, h� algum mal nisso?
- N�o, L�o, n�o haveria nenhum mal se fosse verdade, mas o que quer mesmo � se livrar de mim, e � bom mesmo que seja agora.
- Tem certeza?
- Por favor, me poupe do seu cinismo. Sua companhia n�o me interessa mais. Pode ir embora e fa�a como quiser no que diz respeito � nossa separa��o. S� lhe dou um
aviso: n�o tente me enganar, pois n�o sou tola nem ignorante.
Dizendo isso, afastou-se, deixando L�o sozinho. Passou por Sabina sem lhe dirigir um olhar e, como sempre fazia, foi direto ao seu ref�gio dar vaz�o � dor que lhe
consumia a alma.
Quanto tempo ficou entre suas brom�lias e orqu�deas n�o p�de precisar. S� se deu conta do tempo quando L�o se aproximou para se despedir.
- Estou indo, C�ssia.
- Eu sei - respondeu apenas.
- Qualquer coisa que precisar, entre em contato comigo. Quero ser seu amigo.
- Eu n�o quero ser sua amiga, L�o. Quero que seja feliz, se puder, e que Deus permita a realiza��o do seu sonho. Quem sabe um filho n�o o ajuda a enxergar a vida
dentro das leis divinas?
- C�ssia, eu...
- Chega L�o. Adeus.
- At� qualquer dia.
Sempre agindo de acordo com sua maneira falsa de ser, despediu-se de C�ssia dando a impress�o de que tamb�m sofria com aquela separa��o.
Assim que colocou suas malas no carro, olhou para a casa que abandonava e pensou: "Demorou, mas terminou. Valeu � pena fingir tanto tempo. Agora � ir em frente e
ser feliz nos bra�os de Selma. A vida � para ser vivida, e � isso o que vou fazer". Imprudentemente, pensou: "Vida futura! Isso � coisa de gente ignorante. Dei um
golpe de mestre. C�ssia jamais saber� que, na verdade, eu disse que n�o queria um filho porque o est�ril sou eu, e n�o ela, como sempre a fiz pensar. Dr. Jo�o foi
um grande amigo ao trocar o exame de C�ssia. Assim, sa� por cima, deixando-a se sentir culpada por acreditar que era incapaz de gerar uma crian�a e ser a causadora
da nossa separa��o. Isso, para qualquer mulher, � um sofrimento. Elas se sentem frustradas e incapazes".
Acreditando-se esperto, saiu cantando os pneus do carro e indo ao encontro de Selma, mergulhado no pr�prio ego�smo, que cobraria mais tarde o pre�o de sua leviandade.
Terminava, assim, uma uni�o, deixando l�grimas e sofrimento no cora��o de C�ssia. N�o se importava nem se dava conta das marcas que ficariam na vida daquela que
um dia jurara amar e respeitar.
S� conseguia enxergar beleza e prazer na vida que teria dali para frente, esquecendo-se de que a vida responde �s nossas agress�es. Cada um � herdeiro de si mesmo,
e a heran�a vir� sempre com a rea��o das a��es praticadas.


Aquele que vive para satisfazer seus pr�prios desejos, sem enxergar ningu�m ao seu lado, passando por cima das emo��es e sentimentos das pessoas, vive como um ego�sta,
e nenhum ego�sta conseguir� lugar feliz no reino de Deus, porque nosso Criador espera e deseja que todos os Seus filhos se entreguem ao amor universal, e n�o exclusivamente
ao amor de si pr�prio.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)




Cap�tulo 2
A visita aos pais



Se acreditamos na vida futura e conhecemos a verdade do amanh� na vida eterna, necess�rio se faz policiar nossas palavras para que jamais ofendam, machuquem ou humilhem
nossos irm�os. As palavras devem ser de alegria, aux�lio, conforto e incentivo, assim como nossas a��es, levando quem nos ouve a confiar mais em si, na pr�pria vida
e principalmente em Deus.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


Ap�s a sa�da de L�o, C�ssia, como de costume, refugiou-se no �nico lugar no qual sentia paz e tranq�ilidade, em meio �s flores que tanto amava.
Sabina sofria ao presenciar a dor de C�ssia, seus momentos de ang�stia, de incerteza e at� de medo. Ao mesmo tempo em que nutria o mais puro sentimento de afeto
por aquela menina que vira crescer, alimentava em seu cora��o um rancor por L�o.
Na verdade, nunca sentira simpatia por aquele rapaz arrogante, orgulhoso e ego�sta pelo qual C�ssia se apaixonara. Concordara em deixar a casa de dona Antonieta
para ir morar com C�ssia, porque, como ela, tamb�m acreditava que estando perto poderia ampar�-la sempre que fosse necess�rio. E n�o se enganara.
Ap�s v�rios problemas que machucaram sobremaneira o cora��o de C�ssia, L�o chegara ao �pice de sua imprud�ncia e leviandade com rela��o �quela menina que tanto amava,
instalando no cora��o de Sabina a indigna��o e a revolta.
A cada l�grima que via descer pelo lindo rosto de C�ssia, pensava: "Isso n�o pode nem vai ficar assim; n�o posso mais colocar panos quentes tentando amenizar as
atitudes levianas de L�o. Mais cedo ou mais tarde, ele vai pagar pelo que j� fez e est� fazendo. Sei que n�o vai ficar impune, porque a vida se encarregar� dele".
C�ssia, alheia aos pensamentos de Sabina, cuidava de suas orqu�deas e brom�lias, transferindo toda a sua car�ncia afetiva para aquelas flores que tanta beleza e
calma lhe proporcionavam.
"L�o por que fez isso comigo?" - pensava enquanto, com m�os delicadas, regava as flores. "Saio desse casamento absolutamente sozinha, sem voc�, sem filhos e amargando
a dor da culpa por n�o ter sido capaz de lhe dar um filho."
T�o absorta estava em seus pensamentos que se assustou ao ouvir a voz de Sabina.
- Trouxe-lhe um ch�, C�ssia - disse oferecendo a x�cara e completando -, vai lhe fazer bem.
Sem nenhuma rea��o, como uma crian�a obediente, C�ssia aceitou o oferecimento de Sabina. Sentou-se em seu lugar preferido e, quase automaticamente, sorveu a bebida
lentamente. Sabina segurou suas m�os, afagou-as com carinho e lhe disse:
- C�ssia, minha menina, n�o se entregue tanto � melancolia, n�o vale a pena sofrer desse modo por quem nunca a mereceu.
Com os olhos �midos, C�ssia respondeu:
- Quero me controlar, mas � mais forte do que eu, Sabina. Meu cora��o est� partido em mil peda�os e em cada um deles L�o est� presente. Tenho esperan�a de que ele
caia em si e volte para casa, para mim, para continuarmos nossa hist�ria.
Sabina, mais experiente e observadora, respondeu:
- C�ssia, penso que � melhor voc� n�o criar expectativa nem alimentar ilus�es para n�o sofrer ainda mais.
- Por que voc� diz isso?
Sabina pensou e respondeu:
- Voc� sabe que sempre coloquei panos quentes em suas desaven�as com o L�o, mas devo admitir que o jeito como ele conduziu essa separa��o parece mais uma coisa pensada,
estudada h� algum tempo.
- O que voc� quer dizer com isso?
- Vamos analisar bem a situa��o - disse Sabina. - Primeiro ele a agride, depois pede perd�o e, em seguida, pede a separa��o alegando o desejo de ser pai. Voc� n�o
acha estranho?
- Explique-se melhor, Sabina, est� me deixando confusa.
- Acompanhe o meu racioc�nio - completou a boa Sabina, impulsionada pela experi�ncia de seus anos de vida. - Se o pedido de perd�o dele fosse sincero, se o sentimento
de amor que dizia sentir por voc� fosse real, o fato de n�o terem filhos n�o seria de forma alguma motivo para desfazer o casamento, pois o verdadeiro amor supera
as fragilidades que aparecem em uma uni�o quando ela est� alicer�ada na verdade e na sinceridade de sentimentos. Penso que deveria ser o contr�rio, ou seja, ele
deveria apoi�-la nessa quest�o por saber que voc� n�o possui nenhuma culpa e se unir a voc� mais ainda, indo � busca do filho do cora��o.
- Como assim, Sabina?
- Existem tantas crian�as sonhando em ter pais, pessoas que as protejam, eduquem, ensinem a ser criaturas dignas, sem se importar se s�o pais biol�gicos ou n�o.
Por que os que sonham em ter filhos, e por um motivo ou outro n�o podem ger�-los, n�o as aceitam? O amor n�o � gerado no �tero, e sim no cora��o. Freq�entemente,
esse amor se torna mais forte e verdadeiro do que aquele que come�ou no �tero, mas n�o criou for�a e se deixou perder na fragilidade do sentimento. Prova disso s�o
as crian�as abandonadas entregues a si mesmas.
C�ssia surpreendia-se com a maneira l�cida pela qual Sabina expunha suas id�ias.
- Como voc� pode se explicar t�o bem, Sabina, se n�o possui estudo e nenhum conhecimento intelectual? N�o estou depreciando o que est� me dizendo, ao contr�rio,
estou surpresa ao ouvi-la se expressar t�o bem a respeito de assunto t�o importante.
Sabina, com a humildade que lhe era peculiar, respondeu:
- Tem toda a raz�o, minha menina; de fato n�o possuo cultura alguma. O que sei aprendi observando a vida, as pessoas e suas rea��es diante das situa��es que o cotidiano
lhes apresenta, e compreendi que raramente elas conseguem enxergar com clareza o que a vida est� lhes mostrando.
- Sabe o que acontece com voc�, Sabina? - disse C�ssia, abra�ando a fiel amiga. - Voc� possui sabedoria.
Espantada, Sabina respondeu:
- Sabedoria, eu? Nem sei o que significa isso, na realidade.
- Vou lhe explicar. Existe uma diferen�a entre conhecimento e sabedoria. O conhecimento � adquirido por meio da leitura, do estudo, da aten��o que se d� aos educadores,
profissionais de diversas �reas, enfim, pessoas que se prepararam para isso. Chega-se ao conhecimento de diversas formas. Mas s�bio � aquele que consegue colocar
em pr�tica o conhecimento adquirido ao longo da vida em favor de seu aprimoramento e de seu semelhante. A vida foi sua escola Sabina, e voc� chegou a todo esse conhecimento
por meio dela.
- Como voc� fala bonito, C�ssia!
- Engano seu, Sabina, bonito fala voc�. Minhas palavras saem do meu racioc�nio, e as suas nascem do seu cora��o amoroso.
Emocionada e sentindo as fortes pulsa��es de seu cora��o, Sabina, na sua simplicidade, abra�ou C�ssia e disse:
- Minha menina querida! Voc� vai, com certeza, superar essa ang�stia; seu cora��o vai se acalmar e lhe trazer novamente a alegria. Precisa confiar no tempo, pois
s� ele pode dar a dire��o certa para nossos conflitos.
- Nunca imaginei que tudo isso pudesse acontecer comigo. Confiei no amor que L�o sempre disse sentir por mim, entretanto, tudo n�o passou de uma grande farsa.
- Mas quem saiu perdendo foi ele, C�ssia, tinha ao seu lado uma mulher maravilhosa, no sentido f�sico e moral, e imprudentemente desprezou o presente que a vida
lhe deu.
C�ssia silenciou-se.
Ap�s alguns instantes, voltou a dizer:
- Sabina, tenho pensado em meus pais, preciso contar a eles o que aconteceu. Ficar�o muito tristes, mas n�o d� para esconder.
- Nisso voc� tem toda a raz�o. Eles precisam saber, e quanto antes melhor. Como pretende dar a not�cia?
- Penso em ir at� a casa deles. E longe, eu sei, mas creio ser mais conveniente conversarmos pessoalmente. O que voc� acha?
- Acho que est� certa, mesmo porque o carinho dos pais em uma hora como essa � sempre bom.
- Voc� vai comigo?
- Evidente que sim, C�ssia. Jamais deixaria voc� viajar sozinha nesse estado, e depois n�o perco a oportunidade de rever a dona Antonieta e o senhor Orlando. Tem
id�ia de quando pretende ir?
- O mais r�pido poss�vel. Talvez daqui a uns cinco ou seis dias; o tempo de ajeitarmos tudo aqui, porque, se conhe�o meus pais, v�o me segurar por l� um bom tempo.
- O que ser� �timo para voc�, C�ssia. Desfrutar da companhia de seus pais a ajudar� a superar essa dor. Pode ficar descansada, vou come�ar a providenciar tudo para
deixar as coisas em ordem, assim ficar� mais tranq�ila enquanto estivermos por l�.
- Est� bem, Sabina, ent�o est� combinado. Agora, se n�o se importa, gostaria de ficar sozinha cuidando das minhas plantas.
"E do seu cora��o", disse Sabina a si mesma, afastando-se.
C�ssia, olhando a amiga se afastar, pensou: "Que grande ser humano � Sabina! Seus ombros curvados bem demonstram sua luta e sua for�a durante todos esses anos. Nunca
se uniu a ningu�m, passando a vida inteira servindo � minha m�e. E ap�s o meu nascimento dedicou-se a me servir, cuidando de mim como uma verdadeira m�e. Sua dedica��o
fez com que conquistasse um lugar especial no seio de nossa fam�lia. Merece todo o nosso respeito e reconhecimento".
Voltou sua aten��o �s flores, tentando esquecer a dor que a consumia.
� necess�rio viver e ser! � importante tentar e recome�ar a cada dia, cultivando a esperan�a e a determina��o de lutar e vencer as barreiras do sofrimento, o que
para C�ssia se tornara um gigantesco desafio - vencer a barreira do sofrimento!
Passados sete dias de sua separa��o de L�o, C�ssia e Sabina entravam no �nibus com destino � casa de seus pais. Decidira atender as s�plicas de Sabina, ou seja,
viajar de �nibus.
- Voc� n�o est� em condi��es de dirigir tanto tempo - dissera a C�ssia. - S�o cinco horas de viagem em uma estrada movimentada. Voc� est� abatida, sob o efeito de
rem�dios. � imprud�ncia se aventurar a ir de carro. O �nibus se torna mais seguro em virtude das circunst�ncias.
Olhando a paisagem, C�ssia deixava seu pensamento divagar.
"Sabina, como sempre, tem raz�o. N�o tenho a menor condi��o de dirigir. Foi melhor assim."
Sabina observava todas as rea��es de C�ssia. Com a inten��o de descontra�-la, comentou:
- Imagino a alegria de seus pais ao v�-la chegar. N�o a esperavam t�o cedo.
- Tem raz�o. Infelizmente, vou acabar com essa alegria causando-lhes um grande sofrimento, ou melhor, relatando uma grande decep��o. Sabina, n�o consegui fazer a
felicidade de L�o e agora vou destruir a de meus pais. A �nica filha dando-lhes esse desgosto!
- O que est� dizendo, C�ssia! N�o foi voc� quem destruiu seu casamento nem vai destruir a felicidade de seus pais. N�o se coloque na posi��o de algoz, porque voc�
� a v�tima leg�tima da inconseq��ncia de um marido orgulhoso, prepotente, falso e mal-educado.
- Sabina! - C�ssia exclamou completamente surpresa. - Voc� est� sendo muito dura com o L�o. Ele n�o � tudo isso, possui muitas qualidades. Acho que voc� exagera
somente para me defender. Ali�s, quem � que vivia justificando as atitudes grosseiras do L�o quando brig�vamos? Pode me responder?
- Desculpe-me, C�ssia, mas o L�o � tudo isso e mais um pouco. Sei que justificava seus modos indelicados, mas era para amenizar sua decep��o, e n�o colocar, como
dizem os antigos, mais lenha na fogueira. Voc� sempre esteve e sempre vai estar em primeiro lugar para mim, e � por isso que nunca lhe contei a maneira como ele
me tratava quando est�vamos a s�s e as grosserias que me dizia. Digo e repito que ele � tudo isso e muito mais; por exemplo, sem car�ter.
- Sabina, estou chocada com tudo isso. Passo a imaginar que voc� deve saber de coisas que eu n�o sei, ou estou enganada?
- N�o, est� certa - admitiu Sabina. - Sei, sim, mas n�o vale � pena falar disso agora. N�o quero fomentar mais disc�rdia nem colocar mais m�goas em seu cora��o machucado.
- Mas eu gostaria de saber de tudo o que se relaciona a ele, tenho esse direito!
- C�ssia, voc� ficar� sabendo no momento oportuno. A vida se encarrega de punir os desavisados. E s� aguardar.
Cansada e com a ang�stia apertando-lhe o peito, C�ssia respondeu:
- Est� bem, Sabina, seja como voc� quer. Agora me deixe quieta, vou tentar me acalmar para estar bem quando chegarmos.
- Isso mesmo, descanse.
Enquanto olhava sua menina, que permanecia de olhos fechados amargando toda a sua desilus�o, Sabina pensava: "T�o jovem e j� enfrentando um problema desses. Que
Jesus a proteja e lhe d� for�as para superar esse momento".


As dificuldades apenas testam nossa f� em Deus e a perseveran�a no bem; venc�-las com equil�brio e sensatez � firmar no nosso cora��o a certeza de que todos t�m
possibilidades de vencer.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


Sabina, querendo despertar C�ssia, bateu levemente em seu ombro.
- Acorde, C�ssia, j� estamos entrando na rodovi�ria. Arrume-se um pouco para que seus pais a vejam linda como sempre.
Um pouco assustada, C�ssia acomodou-se na poltrona, passou as m�os pelos olhos, pelos cabelos, ajeitou a blusa e, sorrindo, perguntou:
- Pronto, Sabina, estou bem?
- Mais ou menos linda - respondeu Sabina brincando. - Poderia estar melhor, mas para seus pais estar� linda. Nunca conseguiram ver nada de errado em sua apar�ncia.
- Olhe Sabina, eles est�o ali, veja - falou C�ssia empolgada.
Assim que o �nibus estacionou, C�ssia e Sabina foram as primeiras a descer.
- Pai, m�e - gritou C�ssia, correndo para abra��-los.
- Filha! Exclamaram juntos Antonieta e Orlando, emocionados ao abra�arem a filha querida.
- Que saudade - disseram os dois ao mesmo tempo.
- Voc� continua linda como sempre! - disse dona Antonieta admirando a filha.
- O que foi que eu disse C�ssia? - falou Sabina.
S� nesse momento se deram conta da presen�a de Sabina; aproximaram-se e lhe deram um forte abra�o com muito carinho. Antonieta, mais expansiva do que o marido, disse
com alegria:
- Que bom rev�-la, minha amiga, quero muito agradecer-lhe pela aten��o com a qual tem cuidado de nossa filha. Sabia que podia confiar em voc�.
Feliz com o carinho recebido, Sabina respondeu:
- Eu tamb�m sinto muita alegria em rev�-los. Pela apar�ncia dos senhores posso acreditar que est�o muito bem, e fico feliz por isso.
- Estamos bem sim, Sabina, com sa�de, em paz e agora muito felizes em poder abra�ar voc�s. Sinta-se em casa, ali�s, casa que voc� conhece muito bem.
- Obrigada, senhor Orlando.
- Mas agora nos diga filha, por que o L�o n�o veio com voc�?
- Ora, Antonieta, que pergunta! Com certeza est� trabalhando. Pensa que todo mundo est� aposentado como eu, gozando da boa vida? - brincou Orlando.
C�ssia olhou para Sabina e, sem saber ainda como colocar seus pais cientes da verdade, respondeu:
- M�e, tanto eu quanto Sabina estamos cansadas. N�o � melhor falarmos disso depois? Quero chegar logo em casa, tomar um banho, comer seus quitutes gostosos, que
n�o como j� h� algum tempo, e por fim dormir. Muito tempo dentro de um �nibus deixou-me exausta. Al�m do mais, teremos bastante tempo para colocar as novidades em
dia.
- C�ssia tem raz�o, Antonieta, vamos para casa e deix�-las descansar. Amanh� teremos o dia inteiro e poderemos saber de todas as novidades.
- Seu pai tem raz�o, minha filha, desculpe-me por n�o conseguir segurar minha saudade e a curiosidade em saber tudo sobre voc�s.
- Vamos, ent�o - tornou Orlando a dizer.
Assim que entrou na casa dos pais, C�ssia se surpreendeu com a lauta mesa preparada por sua m�e, prova de sua enorme vontade de mimar a filha.
- M�e! - exclamou euf�rica. - O que significa isso? Pensa que sou t�o gulosa a ponto de devorar todos esses quitutes ou a cidade inteira vem lanchar conosco? J�
sei, pensou que eu estivesse magrinha e resolveu que eu deveria engordar...
Meio sem jeito, Antonieta respondeu:
- Filha, n�o sabia o que fazer para agradar a voc�, ent�o resolvi fazei tudo o que eu sei que gosta. H� tanto tempo n�o fa�o nada para voc� que...
- Que quis fazer tudo em um dia s� - completou Orlando, provocando a esposa. C�ssia abra�ou a m�e.
- M�e, estou feliz em receber todo esse carinho. Eu amo voc�s profundamente.
Ao pronunciar essas palavras, duas l�grimas desceram pelo rosto de C�ssia.
- O que significam essas l�grimas, filha? Imaginei que fosse dar gostosas risadas!
Como C�ssia ficou em sil�ncio, Sabina respondeu:
- N�o se preocupe dona Antonieta, C�ssia anda muito sens�vel esses dias, precisa mesmo do carinho de voc�s.
Sem chegar ao �mago da quest�o, Antonieta respondeu:
- Filha, fique tranq�ila, porque carinho � o que voc� mais ter� aqui na sua casa, ao lado de seus pais.
Imaginando erroneamente o motivo dessa car�ncia afetiva, Orlando disse � filha:
- Sempre ouvi dizer que as mulheres, quando est�o gr�vidas, tornam-se mais sens�veis e choronas. Chego a imaginar que voc� veio para nos dar � not�cia da chegada
de um netinho.
Ao ouvir essas palavras, C�ssia levantou-se bruscamente e correu para o seu antigo quarto, sem se preocupar em esconder as l�grimas que desciam copiosas por seu
rosto.
Sem nada entender do que estava acontecendo, Orlando, meio desconcertado, perguntou � esposa:
- Antonieta, eu disse alguma coisa que pudesse mago�-la?
Mais perspicaz que o marido, Antonieta respondeu:
- Teoricamente n�o, Orlando, mas pode apostar que a not�cia n�o � essa que imaginou.
Virou-se para Sabina, interrogando-a com o olhar. Sabina imediatamente percebeu a inten��o de dona Antonieta, mas, querendo ser discreta, respondeu:
- Dona Antonieta, C�ssia est� passando por um momento muito delicado. Deixem-na descansar que amanh�, mais calma, conversar� com a senhora e o senhor Orlando. Ela
precisa de um tempo, n�o a pressionem.
- Ela est� doente? - perguntou Orlando, preocupado.
- N�o, senhor Orlando, n�o est�. Quanto a isso, podem ficar descansados. A quest�o � outra.
- Ent�o nos diga Sabina, por favor, o que a est� deixando assim t�o sens�vel - exclamou Antonieta angustiada.
- Sinto muito, mas n�o posso. O assunto em quest�o pertence a ela, e n�o quero ser indiscreta. N�o tenho esse direito. � melhor terem paci�ncia e aguardar; precisam
respeitar seu momento.
- Tudo bem, Sabina. Leve, ent�o, alguma coisa para ela se alimentar.
- Isso eu acho bom. Se a senhora me der licen�a, vou levar um suco e algumas guloseimas de que ela tanto gosta. Deve estar com fome, pois n�o se alimentou quase
nada durante a viagem.
- Fique � vontade, Sabina, voc� sabe muito bem do que ela gosta.
Sabina preparou uma bandeja e dirigiu-se ao quarto de C�ssia.
Encontrou-a jogada sobre a cama e entregue ao pranto. Depositou a bandeja sobre a mesinha ao lado da cama e, passando as m�os sobre seus cabelos, lhe disse:
- Fique calma, minha menina, confie porque tudo dar� certo.
C�ssia, levantando-se, encostou sua cabe�a no peito de Sabina e lhe disse:
- Sei que vou mago�-los muito. Eles est�o felizes e vou estragar tudo
- C�ssia, aborte essa id�ia de que vai estragar tudo. Voc� vai apenas lhes contar o que aconteceu, a verdade, uma realidade que voc� n�o provocou e da qual � apenas
a v�tima. Ningu�m escolhe o sofrimento. Aconteceu e pronto.
- Voc� notou a esperan�a de meu pai imaginando que eu poderia estar gr�vida? Vou decepcion�-lo.
- O que ele sentiu � normal. O senhor Orlando, assim como a dona Antonieta, devem, sim, querer um neto. Eles n�o sabem que voc�s se separaram, mas a amam o suficiente
para entend�-la e ampar�-la, auxiliando-a a enfrentar esse momento delicado de sua vida. Confie neles, s�o seus pais. � �bvio que v�o sofrer, mas o sofrimento deles
est� ligado ao seu sofrimento, ao seu cora��o dolorido, e n�o � ida de L�o, que para eles n�o representa tanto quanto voc�.
Emocionada com tanto carinho, C�ssia abra�ou forte aquela amiga que, sem cultura alguma, tinha sempre s�bias palavras para dizer.
Enxugou as l�grimas e resolveu:
- Voc� como sempre tem raz�o minha amiga, ou melhor, minha segunda m�e. Estou me comportando como uma crian�a mimada. Preciso enfrentar a situa��o de frente, com
coragem e sem culpa. Al�m do mais, n�o devo decepcionar minha m�e, que se preparou tanto para me receber. Por favor, v� at� eles e diga-lhes que me esperem, pois
vou lanchar com eles.
- Assim � que se fala C�ssia, orgulho-me da minha menina! - exclamou Sabina, retirando-se do quarto e indo ao encontro de Antonieta e Orlando.
Enquanto Orlando permanecia sentado em sua poltrona preferida, Antonieta, com a fisionomia triste, retirava todos os quitutes que fizera com tanto amor para a filha.
- Por favor, dona Antonieta, deixe tudo como est�. C�ssia vir� lanchar com os senhores; aguarde s� um instante.
O rosto de Antonieta se iluminou.
- Verdade, Sabina, ela vir� mesmo? J� est� melhor?
- Ela est� melhor e apenas se recompondo.
N�o mais do que dez minutos depois C�ssia apareceu na sala esfor�ando-se para apresentar um sorriso no rosto ainda marcado pelas l�grimas.
- Filha, por que est� chorando tanto? O que est� lhe afligindo? Confie em seus pais - disse-lhe Orlando. - Desculpe-me se a magoei, n�o imaginei que voc� ficaria
t�o triste com o que eu disse.
- Sou eu quem lhe pede desculpas, pai. Confio muito no senhor, muito mesmo. Sua filha � uma tola.
- N�o diga isso, C�ssia, porque n�o � verdade, algum motivo h� de existir para ter agido assim.
- Vamos saborear o delicioso lanche que mam�e preparou, depois nos sentamos na sala e eu lhes conto tudo.
- Tudo mesmo, sem omitir nada? - perguntou Antonieta no auge de sua ansiedade.
- Tudo mesmo, m�e, sem esconder uma s� v�rgula.
- Se � assim, vamos fazer nosso lanche em paz e sem l�grimas no rosto, C�ssia.
Acomodaram-se � mesa. Sabina discretamente afastou-se, indo em dire��o � cozinha.
- O que est� fazendo, Sabina, por favor, sente-se conosco - disse-lhe C�ssia.
Sabina, indecisa, olhou para Antonieta sem saber o que fazer. Ela confirmou o convite da filha.
- C�ssia tem raz�o, Sabina, junte-se � n�s. Voc� faz parte da fam�lia
- Obrigada, dona Antonieta.
- � isso mesmo, Sabina, fazemos muito gosto de t�-la junto a n�s.
- Obrigada, senhor Orlando.
Timidamente, Sabina sentou-se ao lado de C�ssia, na mesma mesa onde, por tantos anos, servira-os com dedica��o.
A refei��o, como sugerira Antonieta, transcorreu em paz, com conversas banais, sorrisos e descontra��o, sem nenhuma men��o do problema vivido por C�ssia. Assim que
terminaram, Antonieta convidou-os para se acomodarem na sala e, assim feito, disse a C�ssia sem rodeios:
- Agora vamos aos fatos, C�ssia. O que est� atormentando voc�? Por favor, coloque-nos cientes de tudo.
Mais uma vez, Sabina fez men��o de se retirar, no que foi impedida por Antonieta.
- Fique, Sabina, quero que fa�a parte desta reuni�o. Deve saber muito bem desse assunto.
- Fale C�ssia, estamos preocupados.
Ainda meio sem jeito, C�ssia iniciou:
- Tenho uma not�cia muito desagrad�vel para lhes dar.
- Ent�o d� - disse Antonieta j� impaciente.
- Ao contr�rio do que papai pensou, o que aconteceu foi a nossa separa��o.
Tomados pela surpresa, seus pais ficaram sem saber o que dizer.
- Voc�s... O qu�? - repetiu Orlando.
- N�s nos separamos pai - C�ssia repetiu pausadamente.
- Santo Deus, por que tomaram essa decis�o com t�o pouco tempo de casamento? - perguntou Antonieta.
- � verdade, filha, pareciam t�o felizes! O que aconteceu?
- Parece, pai, que a �nica feliz era eu. Foi ele quem quis se separar de mim.
- Voc� fez alguma coisa que pudesse induzi-lo a tomar essa decis�o?
- N�o fiz nada, pai, nada mesmo. Fiquei t�o surpresa quanto voc�s est�o agora.
- Mas deve haver algum motivo, ningu�m toma uma decis�o t�o importante assim sem motivo algum, simplesmente do nada.
- O que ele alegou? - perguntou Antonieta.
- M�e, o que ele alegou foi que eu n�o posso lhe dar um filho, impedindo-o de realizar seu sonho de paternidade.
- Voc� n�o pode gerar um filho, C�ssia, que maluquice � essa? - Antonieta voltou a perguntar cada vez mais nervosa.
- N�o � maluquice alguma, m�e, simplesmente n�o posso engravidar, e ele n�o aceitou essa situa��o.
- Como tomou conhecimento disso?
- M�e, temos cinco anos de casados, nunca nos preocupamos em evitar a gravidez porque n�s dois quer�amos muito um filho. O tempo passou e a gravidez n�o veio. Fomos
ao m�dico, fizemos todos os exames necess�rios e foi constatado que eu n�o posso engravidar. O problema est� comigo, e n�o com ele.
- Voc� viu o resultado do exame, C�ssia?
- Na verdade, n�o. L�o n�o quis me mostrar, alegando que queria me poupar de maior sofrimento. Disse que era melhor darmos o caso por encerrado, e assim fizemos
at� o dia em que ele me jogou na cara que n�o posso realizar seu sonho de ser pai.
N�o se contendo, Sabina disse:
- Isso depois de aprontar muito com ela, senhor Orlando.
- Sabina! - exclamou C�ssia, nervosa.
Sem se abalar, Sabina disse:
- N�o esconda nada de seus pais. Eles t�m o direito de saber a verdade. Conte tudo o que aconteceu e acontecia h� algum tempo.
- N�o estou gostando nada disso, C�ssia, o que voc� est� escondendo de n�s? - falou Orlando com voz autorit�ria.
- � melhor falar de uma vez - insistiu Sabina.
Olhando para Sabina, C�ssia respondeu:
- Voc� come�ou, agora conte tudo, Sabina.
- Perdoe-me, C�ssia, mas vou contar tudo como aconteceu realmente. S�o seus pais e precisam saber.
Sem nada esconder, Sabina relatou aos pais de C�ssia tudo o que havia acontecido entre os dois.
- Ele a agredia fisicamente, senhor Orlando. Disso eu n�o sabia, porque se soubesse j� teria avisado o senhor.
- L�o batia nela, � isso? - perguntou Antonieta, p�lida.
- Sim, dona Antonieta. Ela mesma me contou h� pouco tempo, e eu penso que tudo o que ele fez foi de caso pensado, para justificar uma separa��o que devia querer
havia algum tempo, mas n�o sabia como fazer.
- Como p�de fazer isso com voc�, C�ssia? Como conseguiu nos enganar dessa maneira?
Mais exaltada, Antonieta falou sem conter seu nervosismo:
- Voc� errou, n�o poderia ter escondido isso de n�s, C�ssia. � muito grave. Nunca encostamos a m�o em voc�. Como L�o ousou fazer isso?
- Sua m�e tem raz�o, minha filha. Por que escondeu uma coisa t�o grave de seus pais? Apanhar do marido! Quem esse moleque pensa que �!
- Desculpe-me, eu sentia muita vergonha e, para ser sincera, ainda o amo.
- Ama um marido que a agride, dando a maior demonstra��o de total falta de respeito? O que � isso, minha filha, onde est� sua autoestima?
- A senhora n�o entende, sinto-me culpada por n�o ter podido dar a ele o filho que tanto queria - respondeu C�ssia, com l�grimas nos olhos.
- N�o importa - respondeu Antonieta. - Se ele realmente a amasse, isso n�o seria obst�culo para a felicidade de voc�s, pois existe outro meio de realizar o sonho
da paternidade.
- Foi exatamente isso que eu disse a ela, dona Antonieta.
Orlando, mais comedido, aproximou-se da filha e a abra�ou com grande carinho.
- Filha - disse-lhe -, isso agora n�o importa mais; o que passou n�o se pode mudar, mas o que se quer para o futuro pode-se construir com mais sabedoria e intelig�ncia.
Sei que � cedo ainda para lhe dizer isso, mas acabar� esquecendo toda essa situa��o se der a voc� mesma a oportunidade para que isso aconte�a.
- Diga-me como, pai.
- N�o se entregando por tempo prolongado � melancolia e � auto-piedade. O tempo agir� em seu favor, � preciso apenas continuar acreditando que um dia conseguir�
ser feliz de verdade.
Busque o incentivo dentro de voc�. N�o se esque�a quanto � importante para n�s e para Deus. As pessoas erram, L�o errou e sofrer� as conseq��ncias desse erro, porque
a vida segue seu curso e os efeitos dessa leviandade vir�o no momento adequado.
C�ssia encostou sua cabe�a no ombro de seu pai. Confortava-lhe o calor que emanava dos bra�os protetores desse homem bom e justo. Sentia-se amparada e amada, e essa
sensa��o lhe trazia confian�a no amanh�.
Antonieta, ouvindo o marido falar de uma maneira t�o sensata, Ficou mais calma e admirou ainda mais aquele homem que tinha a seu lado havia tantos anos.
- Desculpe-me, filha, mas senti revolta ao saber que nossa �nica filha, que amamos e criamos com o maior carinho e cuidado, apanhava de um marido grosseiro e sem
princ�pios. Voc� sabe que sou mais impulsiva que seu pai, e que �s vezes me perco na minha pr�pria impulsividade. N�o iremos falar mais sobre isso, a n�o ser que
voc� mesma demonstre necessidade de falar. Estamos aqui para ouvi-la e auxili�-la a encontrar o equil�brio para retomar, como seu pai falou, sua vida.
Chorosa, C�ssia manifestou sua inseguran�a diante de um fato para ela inesperado.
- Eu s� preciso de um tempo para aceitar que perdi o L�o. N�o se anula assim de uma hora para outra, um sentimento, e eu n�o quero que o amor que senti todos esses
anos e, na verdade ainda sinto, n�o vou negar, transforme-se em �dio. Por que devo odiar uma pessoa que n�o me ama mais? Por que querer algo que ele n�o me pode
dar? Ningu�m manda no cora��o, bem sei, e ele obedeceu ao dele e eu devo seguir a passos lentos respeitando o tempo do meu cora��o. Entendo tudo isso, como j� disse,
preciso apenas de tempo para esquecer, apagar da minha mente, zerar meu cora��o e recome�ar.
Sabina olhava para aquela menina com os olhos do cora��o. Admirava sua conduta digna, seus princ�pios nobres, enfim, amava-a como a uma filha leg�tima.
Antonieta e Orlando percebiam o grande afeto que Sabina tinha por C�ssia. Sabiam que podiam confiar nessa mulher humilde, que suportava nos ombros o peso de anos
vividos sem fam�lia, contando apenas com os amigos que conquistava em cada lugar pelo qual passava. Nada pedia para si mesma, mas tudo oferecia �queles que usufru�am
de sua companhia.
Sabina permanecia alheia �s palavras que soavam � sua volta, a ela s� interessavam as palavras que eram proferidas por C�ssia. Prestava aten��o em cada detalhe e
cada gesto de sua menina, como gostava de cham�-la.
"Ela sofre, meu Deus, e eu n�o sei o que fazer para aliviar sua dor."
Saiu de seus pr�prios pensamentos quando ouviu a voz de Antonieta:
- C�ssia, acho mesmo que devemos colocar uma pedra em cima disso tudo, mas voc� n�o deve se esquecer de que existem medidas importantes e legais que precisam ser
levadas em considera��o.
- Antonieta, ainda � cedo para falar nisso - repreendeu Orlando.
- N�o penso como voc�, Orlando. Eles possuem bens, e o melhor � resolver tudo de uma vez, assim nada fica se arrastando por longo tempo e dando for�a ao sofrimento
de C�ssia.
- M�e, agora n�o, por favor. Tudo � muito recente, e o melhor � esperarmos um pouco, pelo menos at� que eu me sinta mais segura para enfrentar o L�o de frente, sem
me debulhar em l�grimas.
- C�ssia tem raz�o, Antonieta, vamos esperar a poeira baixar para que se possa enxergar as coisas de uma maneira correta e justa, sem agress�es nem vingan�as.
- Voc� n�o est� alimentando esperan�as de que o L�o possa voltar, est� C�ssia?
Meio sem jeito, C�ssia respondeu a sua m�e denotando na voz sua exaust�o em falar desse assunto:
- N�o me pergunte mais nada, m�e, e n�o me pressione.
Estou ainda muito confusa e n�o sei para que lado devo ir. J� disse que preciso de um tempo, n�o sei se longo ou curto, para aceitar essa id�ia. N�o tenho condi��es
de resolver absolutamente nada.
- Filha, d�i em meu cora��o v�-la sofrer. N�o suporto ver essas l�grimas em seu rosto lindo, quase uma menina ainda e j� passando por essa ang�stia. Voc� merece
ser amada de verdade. N�o precisa mendigar amor de ningu�m, tem condi��es de despertar o interesse e o amor de um homem de verdade. N�o precisa se humilhar para
quem n�o a merece.
- Mas quem disse que vou me humilhar, m�e? A senhora est� exagerando em suas considera��es.
Irritado com o rumo da conversa, Orlando pediu � esposa:
- Antonieta, gostaria que parasse, pois n�o me agrada a maneira como est� conduzindo essa situa��o, que, ali�s, s� diz respeito a nossa filha. Voc� ainda n�o percebeu
que C�ssia n�o � uma crian�a, e sim uma mulher que est� vivendo uma separa��o? Sei que � doloroso, mas sei tamb�m que ela tem condi��o de reverter essa situa��o
de perda transformando-a no in�cio de uma nova etapa de sua vida, que ser� de alegria e novas conquistas. Acredito que daqui para frente saber� fazer escolhas melhores.
- Tudo bem - concordou Antonieta. - Mas voc� sabe filha, que poder� contar sempre conosco, seja qual for sua decis�o. Estaremos sempre aqui torcendo e rogando a
Jesus por sua felicidade.
- Obrigada, m�e, sei que posso contar sempre com voc�s e com Sabina. Sinto-me amparada, e � isso que me importa neste momento.
Quando o rel�gio anunciou o avan�ado da hora, C�ssia demonstrou o desejo de se recolher.
- Estou com sono e muito cansada, se me derem licen�a vou para o meu quarto.
- Claro, filha, deve mesmo estar muito cansada, a viagem, as emo��es, enfim, � melhor mesmo ir se deitar. Tenha uma boa noite de descanso - disse Orlando. - Amanh�
ser� outro dia, e com ele vir� mais tranq�ilidade para seu cora��o.
- Obrigada, pai!
Assim que C�ssia se ausentou, Sabina, seguindo seus passos, tamb�m se despediu e foi se recolher.
Antonieta e Orlando, vendo-se sozinhos, externaram a surpresa que os atingiu. Antonieta, sempre mais impulsiva, desabafou com o marido a sua indigna��o.
- N�o consigo me conformar, Orlando, n�o � aceit�vel a atitude de L�o, enganando nossa filha desse jeito. Culp�-la por n�o poder lhe dar um filho, como se isso fosse
uma op��o dela. N�o � justo!
Orlando, mais calmo, respondeu:
- O que me intriga Antonieta, � o fato de ele n�o ter permitido que C�ssia visse o resultado dos exames. Acho isso muito estranho.
- Concordo com voc�, realmente � muito estranho. O normal seria os dois conversarem sobre essa quest�o, e n�o um s� decidir agindo como pensa ser o melhor.
- A desculpa que ele usou n�o � v�lida, pois ele mesmo lhe disse o resultado. Que diferen�a faria C�ssia ver o que estava escrito no exame?
- Penso que Sabina tem raz�o. Existe alguma coisa nisso tudo que motivou o desejo de L�o de se separar, e esse foi o meio que ele achou para sair desse casamento
como v�tima, o coitado que sofre a desilus�o de n�o poder ser pai.
- � verdade, mas o tempo n�o para e n�o falha, e com certeza vai mostrar o verdadeiro motivo. Agora � a hora de cercarmos nossa filha de cuidados, aten��o e carinho.
D� para perceber a intensidade de seu sofrimento.
- Tem raz�o, Orlando, � isso que vamos fazer.
Dirigiram-se para o quarto e se entregaram ao sono reparador.


O tempo � cria��o sublime de Deus. Transcorre lento ou veloz, de acordo com a expectativa e os sonhos de cada um, mas como sempre agasalhando nossas d�vidas, conhecendo
nossas ang�stias e dando-nos, como de costume, no momento certo e oportuno, todas as respostas, oferecendo-nos oportunidade de novamente encontrar a paz.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)



Cap�tulo 3
A uni�o entre L�o e Selma


Assim que saiu da casa onde vivera com C�ssia por cinco anos, L�o foi ao encontro de Selma, feliz e julgando-se vitorioso por haver conseguido conduzir a situa��o
da maneira como planejara por tanto tempo.
Vangloriava-se de um ato leviano que o reduzira � condi��o de mau-car�ter e nem de longe imaginava ser apenas o in�cio de uma s�rie de enganos e inconseq��ncias.
Julgava-se esperto e inteligente.
"Por um momento cheguei a me penalizar pela fisionomia triste e decepcionada de C�ssia", dizia a si mesmo, "mas, enfim, na vida cada um precisa pensar em si mesmo,
promover sua independ�ncia financeira, buscar a realiza��o de seus desejos, mesmo que para isso seja necess�rio deixar algu�m sofrendo atr�s de si".
- � a vida! - exclamava sem nenhuma consci�ncia do erro cometido.
Nem por breves instantes passou pela cabe�a de L�o quanto magoara C�ssia. Permanecia insens�vel ao sofrimento daquela que durante tanto tempo dividira com ele seus
sonhos e seus projetos de vida. O ego�smo excessivo impedia-o de ver al�m de si mesmo - quanto C�ssia o amava e confiara nele, entregando-lhe seus mais nobres sentimentos.
"Agora � come�ar nova vida ao lado de Selma. N�o suportava mais esconder meu sentimento por ela. Acredito ser ela a mulher da minha vida, e � ao seu lado que pretendo
aproveitar o dinheiro que vou exigir da minha separa��o de C�ssia. Seus pais s�o ricos e ela � filha �nica, o que a torna a �nica herdeira de todo o patrim�nio.
Como somos casados com comunh�o universal de bens, passo a ser herdeiro tamb�m."
Com a mesquinhez de seus sentimentos, completou:
"Realmente foi um golpe de mestre! O mais bem planejado golpe do ba� que algu�m j� deu."
Acelerando ainda mais o carro, foi em dire��o ao que imaginava ser a felicidade.
Em seu apartamento, Selma, ansiosa, esperava aquele que por dois anos fora seu amante e finalmente chegara o dia de se tornar sua companheira oficial.
"Estou prestes a solidificar uma situa��o que espero por tanto tampo", pensava feliz. "Alcancei meu objetivo, tenho certeza de que tudo dar� certo. Vou precisar
apenas ficar atenta para que L�o n�o desconfie aonde quero chegar."


Devemos vigiar nossas atitudes, porque o sofrimento dura enquanto durar nossa teimosia e persist�ncia no mal. Deus n�o nos quer sofrendo, mas respeita a vontade
de Seus filhos, porque nos deu o livre-arb�trio.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


Antes de chegar ao apartamento de Selma, L�o passou em uma floricultura e comprou um lindo ramalhete de flores vermelhas.
- Estas flores s�o para dar in�cio � nossa vida de casados - disse assim que Selma abriu a porta. - Ir�o perfumar para sempre nossa rela��o, porque eu te amo - completou.
Sem responder com palavras, Selma se atirou nos bra�os do namorado, dando-lhe um abra�o seguido de ardoroso beijo.
- Eu tamb�m te amo! - exclamou. - Seremos felizes porque iremos nos esfor�ar para isso.
Iniciava-se uma rela��o cujo ingrediente principal era a dissimula��o e a inconseq��ncia.

***

Trinta dias se passaram.
C�ssia e L�o, cada um a seu modo, tentavam reconstruir a vida buscando nova dire��o. C�ssia tivera uma reca�da inexplic�vel para seus pais e Sabina, e novamente
entregara-se ao des�nimo. N�o encontrava �nimo para retornar � sua casa, que, desde a viagem, permanecia fechada. Seus pais insistiam para que fixasse resid�ncia
com eles, mas C�ssia n�o encontrava for�as para argumentar sobre qualquer decis�o.
Ela permanecia horas a fio olhando para o c�u, entregue aos pr�prios pensamentos, sem se importar com os conselhos de seus pais ou de Sabina, que n�o conseguia esconder
sua preocupa��o com a atitude e o sil�ncio de L�o.
- Dona Antonieta, acho muito estranha essa atitude de L�o; seu sil�ncio em rela��o � separa��o. Enfim, n�o entendo muito bem disso, mas imaginei que logo ele estaria
reivindicando a separa��o legal.
- Orlando e eu pensamos como voc�, Sabina. Por tudo o que ficamos sabendo dele, imaginamos que isso fosse acontecer de imediato. � mesmo de estranhar seu sil�ncio,
n�o ter ainda pedido a C�ssia a separa��o legal.
- E, conseq�entemente, a posse do que lhe compete com a divis�o dos bens. S� a casa deles vale uma pequena fortuna.
- Falou muito bem, Sabina, � de estranhar mesmo.
- Voc�s t�m raz�o - concordou Orlando, entrando na conversa. - L�o nunca foi uma pessoa paciente e muito menos prudente. O esperado era que logo em seguida quisesse
entrar com o pedido de separa��o.
- � o que est�vamos comentando, Orlando - disse Antonieta ao marido. - Devemos ficar bem atentos, pois ele n�o � uma pessoa confi�vel.
- O que me preocupa mesmo � o sofrimento que ele pode causar � nossa filha, maior ainda do que o que ela est� passando.
- Falando em sofrimento, Orlando, queria mesmo comentar com voc� sobre a enorme preocupa��o que sinto com C�ssia.
- Ela est� doente?
- Imagino que n�o, mas poder� ficar se n�o tomarmos alguma provid�ncia.
- O que est� querendo dizer, Antonieta?
- Quero dizer que est� se prolongando muito essa apatia de C�ssia. A impress�o que me d� � que perdeu o gosto pela vida, e se for isso � muito ruim e preocupante.
- Explique-se melhor.
- Orlando, no in�cio ela sentia raiva, chorava, questionava, enfim, tinha rea��es normais para quem est� vivendo a dor de uma decep��o. Mas agora ela mudou. H� mais
ou menos dez dias vive calada, absorta, sem rea��o alguma, n�o esbo�a um sorriso ou uma express�o de raiva. Vive ap�tica, como se nada nem ningu�m lhe importasse.
E � isso o que me preocupa.
Sabina, que at� ent�o ouvia em sil�ncio, disse:
- Dona Antonieta tem raz�o, senhor Orlando, eu tamb�m tenho observado e percebi seu afastamento de tudo e de todos. Nada parece lhe importar.
Assustado, Orlando exclamou:
- Mas, meu Deus, o que ser� que aconteceu para machucar ainda mais o cora��o de nossa filha? Aqui todos a querem bem, tratam-na com carinho e respeito, por que ficou
assim? Imagino que deveria ser o contr�rio. Os dias v�o passando e a ferida vai sangrando menos, por que isso n�o acontece com ela?
- N�o sei responder, Orlando, s� sei que essa ferida voltou a sangrar com for�a e n�o consigo compreender a raz�o.
- Ela falou com algu�m que pudesse causar-lhe essa rea��o?
- Que eu saiba ou visse, n�o - respondeu Sabina. - O que percebi foi que por duas vezes atendeu a um telefonema que a deixou transtornada. Perguntei a respeito,
mas ela n�o quis responder, dizendo que estava tudo bem.
- � estranho. Bem, devemos ficar mais atentos, Antonieta. Se nada descobrirmos ou se ela piorar, o prudente � lev�-la ao m�dico.
- Fique tranq�ilo, Sabina e eu vamos redobrar nossa aten��o com C�ssia.
- Quem voc�s pretendem levar ao m�dico? - perguntou C�ssia, aproximando-se.
Os tr�s olharam assustados.
- Oi, filha, n�o sab�amos que estava a�!
- N�o estava, pai, cheguei neste instante, e pelo que pude observar o centro dessa reuni�o sou eu.
Antonieta abra�ou-a.
- Filha, n�o existe reuni�o alguma, est�vamos apenas conversando, e se voc� � o centro da nossa conversa � porque a amamos e estamos muito preocupados com voc�.
- Posso saber o motivo dessa preocupa��o?
- Claro. � o seu comportamento, C�ssia. De uns dias para c�, temos notado seu sil�ncio; l�grimas que caem constantemente pelo seu rosto; isola-se de n�s, enfim,
seu comportamento mudou, e � isso o que nos preocupa.
Orlando interferiu.
- Existe um motivo para isso, C�ssia?
- Existe, sim, pai.
- Podemos tomar conhecimento e tentar ajud�-la?
C�ssia pensou por alguns instantes e respondeu:
- Claro, pai.
- Ent�o nos fale sobre isso, C�ssia - disse Antonieta nervosa.
- Desculpem-me se lhes causei preocupa��o. O que aconteceu foi o seguinte: recebi um telefonema do L�o, no qual fingia estar interessado em saber como eu estava.
Ap�s alguns minutos de conversa, ele afirmou que se sentia muito bem, que se preocupava com o meu bem-estar e que torcia para que eu conseguisse ser feliz. Como
ele estava sendo ao lado de uma pessoa maravilhosa, que o compreendia. Enfim, na realidade, o que ele queria mesmo era que eu soubesse de sua liga��o com outra pessoa.
- Por enquanto, n�o estou interessada em arrumar outra pessoa respondi.
- Pois devia C�ssia - ele respondeu. - N�o quero que alimente a ilus�o de um poss�vel retorno, pois n�o acontecer�. Estou com a pessoa que amo, e h� dois anos sonho
em estar casado com ela, o que finalmente aconteceu.
Todos ouviam boquiabertos. C�ssia continuou.
- Voc� quer dizer que me tra�a havia dois anos? - perguntei surpresa.
- C�ssia, fique calma - respondeu ironicamente. - Essas coisas acontecem com qualquer pessoa, � normal.
- Normal para quem n�o ama, n�o respeita e vive em fun��o de si mesmo. Se voc� me ligou para me dar esse recado, j� deu. Quanto a um poss�vel retorno, L�o, n�o me
passa pela cabe�a voltar a viver com um mau-car�ter como voc�.
- O que � isso, C�ssia, onde est� a tranq�ilidade com a qual sempre falava, era falsidade?
Nesse instante, Orlando, n�o conseguindo segurar, falou exasperado:
- Mas que cafajeste! Quem ele pensa que � para falar assim com voc�?
- Calma, pai, ele n�o merece que fique exaltado, que corra o risco de sua press�o subir.
- Continue - disse Antonieta. C�ssia continuou.
- Falso foi voc�, L�o, que fingiu um sentimento que nunca sentiu por mim; enganou-me, humilhou-me e at� me agrediu fisicamente. S� posso deduzir de tudo isso que
voc� deu um grande golpe do ba�.
Ap�s soltar sonora gargalhada, L�o respondeu:
- Est� ficando esperta, hein? Custou mas percebeu.
Encontrando um resto de for�a, C�ssia respondeu:
- Voc� � um canalha, L�o, mas pode acreditar que o que � seu a vida vai lhe dar, mais cedo ou mais tarde.
- Tudo bem, mas, para acabar com essa conversa, s� quero lembr�-la de que precisamos conversar e resolver a quest�o da nossa casa. Quero a minha parte, mas falaremos
sobre isso mais tarde.
- Tenha um bom dia.
Terminando a narrativa que tanto machucara seu cora��o, C�ssia abra�ou sua m�e e chorou.
A indigna��o tomou conta de seus pais e de Sabina, que durante cinco anos presenciara a irresponsabilidade de L�o e muitas vezes as l�grimas de C�ssia, que tudo
suportava sempre desculpando a impulsividade do marido.
Sentindo-se envergonhada e humilhada, C�ssia, chorosa, disse aos pais:
- Por favor, desculpem-me por lhes trazer tanto desgosto; nunca quis faz�-los sofrer.
- O que � isso, filha, voc� n�o � a causadora disso tudo, ao contr�rio, voc� � a v�tima.
- Obrigada, pai, mas, se eu tivesse tomado uma atitude assim que L�o se mostrou como � na verdade, poderia ser que n�o chegasse a esse ponto. Mas cada vez que brig�vamos,
sempre que ele gritava me ofendendo, no momento seguinte pedia desculpas, dizendo que me amava e que agia assim por causa do ci�me que sentia de mim. Eu, boba, acreditava
na sinceridade dele sem nunca desconfiar que tudo n�o passava de uma arma��o. Sim, porque agora tenho certeza de que foi uma s�rdida arma��o para se dar bem na vida
com o dinheiro de voc�s. Sinto-me envergonhada.
Antonieta n�o suportava a dor que lhe ia � alma ao presenciar o sofrimento de sua filha querida.
- C�ssia, L�o n�o merece que sofra tanto por ele, portanto, erga a cabe�a, vamos procurar um bom advogado e entrar com a separa��o judicial.
- Sua m�e tem raz�o, minha filha, quando tudo isso acabar, a vida voltar� a sorrir para voc� e a alegria estar� de novo em seus lindos olhos.
Timidamente, Sabina disse:
- Minha menina, seus pais est�o certos, termine com esse casamento desastroso, mas n�o com a vontade de viver. O sol ainda vai brilhar para voc� todos os dias do
ano; todos os anos da sua vida, porque Deus h� de proteg�-la.
Emocionada, C�ssia respondeu:
- S� posso dizer a voc�s que os amo muito.

***

L�o, entrando em casa, encontrou Selma arrumada com todo o requinte, pronta para sair.
- Posso saber aonde vai t�o linda assim? - perguntou L�o, admirado com a beleza da mulher.
Com um sorriso meio ir�nico, Selma respondeu:
- L�o, voc� j� me conhece h� bastante tempo e j� deveria saber que nunca fui mulher de dar satisfa��es; n�o gosto de ser controlada. Sempre fui assim e nada vai
mudar.
- N�o h� necessidade de ficar irritada, meu amor. Antes eu era casado e n�o podia exigir muita coisa de voc�, mas agora � diferente.
- Posso saber por que agora � diferente?
- Porque vivemos juntos, e para mim isso � motivo suficiente. Afinal, estamos casados n�o pelo papel, por enquanto, mas pelo nosso amor. Acredito que isso me d�
o direito de perguntar e obter resposta.
Selma segurou sua irrita��o.
- Vamos deixar uma coisa bem clara, L�o. Nada mudou no nosso relacionamento, a n�o ser que passamos a viver juntos, mas esse fato n�o lhe d� o direito de comandar
minha vida.
Desapontado, L�o retrucou:
- N�o estou querendo mandar em sua vida, apenas imaginei que poder�amos interagir um com o outro sem segredos, compartilhando todos os momentos alegres. Creio que
para voc� este � um momento alegre, pois est� t�o bem!
Selma percebeu que nada justificava sua rea��o. O que L�o perguntara era absolutamente normal em qualquer relacionamento entre duas pessoas.
"Preciso aprender a me dominar", pensou Selma, "n�o posso p�r tudo a perder. � muito cedo ainda, tenho de agir com calma".
Aproximou-se carinhosa de L�o.
- Desculpe-me, meu amor, n�o h� nenhum motivo para eu me irritar. � claro que pode saber aonde vou, e tenho prazer em lhe contar.
Aconchegou-se nos bra�os de L�o e, imprimindo � pr�pria voz uma meiguice que estava longe de sentir, disse-lhe:
- Querido, marquei hora com a costureira que confecciona minhas roupas, vou at� a casa dela escolher os modelos. Simples, n�o? Talvez demore um pouco, portanto,
n�o fique preocupado - e completou sorrindo -, n�o vou fugir.
Alguma coisa que n�o soube definir incomodou L�o.
- Selma, tenho notado que voc� anda gastando em excesso. N�o possuo tantas posses como voc� pensa. Semanalmente voc� diz que vai � costureira e percebo que nunca
a vi chegar com nenhum vestido - completou, ap�s pensar um pouco.
Selma, com um racioc�nio r�pido, respondeu:
- N�o percebeu porque n�o repara em mim, e isso tem me magoado muito. Procuro me arrumar, estar sempre bonita para voc� e, no final, tenho de ouvir essas palavras
que escondem uma d�vida. Saiba que isso me machuca, e muito, L�o.
Apressadamente, L�o deu-lhe um beijo.
- Desculpe-me, Selma, n�o quero mago�-la de forma alguma; � que sinto muito ci�me de voc� e tenho medo de perd�-la.
- Voc� n�o vai me perder, L�o, pelo menos por enquanto - completou com um olhar maroto.
- O que voc� est� dizendo?
- Nada de importante, seu bobo, estou apenas brincando com voc�. Pare com essas desconfian�as porque eu n�o mere�o. Quanto aos gastos excessivos, voc� tem raz�o,
vou me controlar mais, est� bem?
- Claro, meu amor; por enquanto, apenas, porque assim que me separar de C�ssia voc� ir� desfrutar de mais conforto e liberdade financeira. Ter� tudo o que deseja,
prometo.
Contente com o que acabara de ouvir, Selma afastou-se de L�o, deu lhe um beijo e saiu.
Entrando em seu carro, pensou: "Sei de tudo isso que voc� falou meu querido, e � justamente por isso que estou com voc� esse tempo todo. Assim como voc� foi com
C�ssia, tamb�m sou paciente, sei que um dia vou ser recompensada. Os velhos n�o duram para sempre!"
E saiu em alta velocidade rumo ao seu destino, que nada tinha a ver com a costureira.
Vendo-se sozinho, L�o se entregou �s suas reflex�es.
"Alguma coisa em Selma me incomoda. Sempre soube que ela n�o � mulher de vida caseira, daquelas que se preocupam com casa, marido e filhos. Preciso dar um jeito
nisso. Vou conversar com C�ssia a respeito da partilha da nossa casa, mas antes quero ouvir meu advogado. Amedronta-me saber que Selma possa se cansar e p�r fim
ao nosso relacionamento. Ela � a mulher da minha vida e n�o vou correr o risco de perd�-la. Por ela fa�o qualquer coisa, por pior que possa ser."
Enquanto isso, alheia aos conflitos de L�o, Selma chegava feliz e entusiasmada ao seu destino.
- Demorou - disse Armando assim que a viu.
- Desculpe meu amor, mas L�o teve uma de suas crises de ci�me, coisa que me irrita, voc� sabe, mas sabe tamb�m que precisamos ter paci�ncia.
- Sei, mas tudo tem um limite. Vamos ver quanto tempo ag�entamos.
Carinhosa, Selma envolveu o amante em seus bra�os e o beijou apaixonadamente.
- Voc� tem consci�ncia de quanto amo voc�, Armando, e se estou a tanto tempo nessa situa��o foi porque voc� mesmo planejou.
- Sei meu amor, tamb�m amo muito voc�.
- � s� uma quest�o de tempo - disse Selma.
- N�o vamos mais falar naquele ot�rio. Ele se julga muito esperto; deu um golpe na mulher e acabou caindo na pr�pria rede.
- Tem raz�o, vamos pensar em n�s; n�o tenho muito tempo. Ap�s o envolvimento amoroso ao qual se entregaram com paix�o, Armando perguntou:
- Quando nos veremos novamente?
- N�o sei meu amor, preciso ir com mais calma para n�o alimentar a desconfian�a de L�o. Vamos deixar passar alguns dias e depois arranjo outra desculpa, porque a
costureira n�o d� mais. Eu entro em contato com voc�.
- Mas por que j� vai t�o cedo? Fique mais um pouco.
- N�o posso, preciso passar em alguma loja e comprar um vestido; ele est� desconfiado, com certeza vai perguntar sobre a roupa.
- Ent�o est� bem, mas me d� outro beijo! - exclamou Armando.


N�o � prudente fazer da nossa vida apenas um acontecimento casual, onde mergulhamos nos prazeres da utopia desfrutando do que imprudentemente chamamos de aproveitar
a vida.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


Selma caminhava a passos lentos pelas ruas da cidade sem prestar muita aten��o no que ocorria � sua volta. Seu pensamento permanecia entregue �s horas que passara
ao lado de Armando.
"N�o sei se ag�ento por muito mais tempo essa liga��o com L�o. H� dois anos estou com ele e praticamente nada mudou. Sonhei em ficarmos juntos acreditando que em
pouco tempo se concretizaria o que Armando planejou, mas pelo visto isso vai demorar ainda. N�o sei o que L�o est� esperando para resolver a situa��o com C�ssia.
Acho que vou ter de pression�-lo quanto a isso."
Parou em frente a uma vitrine, olhando com aten��o, e deparou com um vestido que satisfez sua vaidade pelo corte e pela beleza do tecido.
- E esse - decidiu -, vou lev�-lo. L�o n�o quer comprovar minha ida � costureira? Ent�o que pague pelo vestido! N�o imaginei que fosse assim t�o caro - disse � vendedora
ao experimentar a roupa.
- Mas esse � um vestido fino, alta-costura. Veja a ca�da perfeita em seu corpo - respondeu a mo�a.
Selma pensou um pouco e decidiu.
- Voc� tem raz�o, ele � perfeito. Afinal, por que n�o? Vou lev�-lo.
Ao sair da loja carregando a sofisticada caixa com o produto de sua compra, Selma ostentava em seu rosto a satisfa��o do desejo realizado.
"Agora voc� vai acreditar em mim, L�o, principalmente quando eu apresentar a conta, que a bem da verdade � bem alta."
Entrou em seu carro e retornou para casa.
Encontrou L�o sentado na sala, com um copo de bebida na m�o. Assim que a viu entrar, perguntou:
- Por que demorou tanto, Selma?
Ignorando a pergunta, Selma aproximou-se de L�o e lhe deu um beijo, dizendo:
- Oi, meu amor, sentiu a minha falta?
- Senti - respondeu L�o secamente.
- Se sentiu, por que est� assim com essa fisionomia t�o brava? N�o seria mais coerente me dar um beijo?
- Voc� n�o respondeu � minha pergunta, Selma. Por que demorou tanto? N�o ia somente � costureira?
Selma sentou-se junto a ele e, segurando suas m�os, lhe disse:
- Voc� tem raz�o, L�o, demorei mais que o previsto, mas voc� nem imagina o que aconteceu.
- E o que foi que aconteceu? - perguntou L�o nervoso.
- Calma, L�o, nada de mais; apenas que a costureira estragou meu vestido de maneira irrepar�vel.
- Como assim?
- Estragou, simplesmente estragou.
- E o que voc� fez?
- O �bvio. Recusei o vestido, disse que n�o ia pagar e sa� sem dar satisfa��es.
- E foi isso que ocasionou sua demora?
- Claro L�o! Fui at� a cidade comprar outro vestido e, at� achar o que queria, demorei.
- Selma, e a compra desse vestido era importante? Precisava mesmo?
- Voc� est� me ofendendo com tantas perguntas. � claro que era importante. Se eu estava contando com o que mandei fazer e n�o deu certo, � evidente que fui procurar
outro, no que, ali�s, fiz muito bem, porque achei exatamente como eu queria. Vou lhe mostrar.
Dizendo isso com a finalidade de acabar com o assunto, Selma abriu a caixa e, dando �nfase � sua alegria, mostrou o produto de sua compra para o marido.
- Veja que lindo L�o! - exclamou com um insinuante sorriso nos l�bios. - Gostou?
- Aparentemente, sim - respondeu L�o com o m�nimo de entusiasmo.
Expressando surpresa, Selma retrucou:
- Como aparentemente?
- Claro que aparentemente. Assim n�o quer dizer nada, quero ver como fica nesse corpo lindo e provocante! - exclamou se aproximando de Selma e a abra�ando com paix�o.
Sentindo-se segura quanto ao sentimento que L�o nutria por ela e ao desejo que sempre conseguia despertar nele, Selma entregou-se �s caricias de L�o.
Algumas horas mais tarde, perguntou ao companheiro:
- L�o, quando pretende se encontrar com C�ssia para negociar a partilha da casa onde moravam?
- Tenho pensado nisso. Preciso me encontrar com meu advogado, doutor Pedro, e me informar sobre como devo proceder.
- Fa�a isso logo. Com tanto dinheiro para receber, n�o � justo vivermos contando os centavos, enquanto sua ex-mulher usufrui de tudo.
- Voc� tem raz�o, vou tomar provid�ncias logo.
Selma ausentou-se da sala onde estavam e dirigiu-se ao seu quarto.
"Preciso agilizar isso, mal posso esperar o momento de estar com Armando todas as horas do dia sem precisar sustentar essa vida dupla que n�o me agrada."
Entregue aos seus pensamentos, rememorava os �ltimos meses de sua vida. Conhecera L�o quando sa�a de um mercado, cheia de sacolas, e ele, atrevidamente, aproximara-se
oferecendo ajuda, o que ela aceitara de pronto. Desse encontro nasceu um relacionamento mais �ntimo.
Embora Selma n�o sentisse por ele uma paix�o avassaladora, um amor verdadeiro, prosseguiu com a uni�o mesmo sabendo ser L�o um homem casado. Sentia-se segura e amparada
financeiramente, e isso lhe bastava, pois vinha de uma fam�lia sem posses e alcan�ava seus desejos de consumo por interm�dio de L�o, que, apaixonado, n�o colocava
limites em suas pretens�es.
As coisas entre eles transcorriam tranq�ilas, de acordo com a imprud�ncia de cada um, que apenas queria satisfazer a si mesmo.
Ap�s algum tempo, Selma conheceu Armando, por quem se apaixonou perdidamente.
Homem ambicioso e sem escr�pulos, logo que tomou conhecimento da situa��o de Selma com L�o, induziu a namorada a exigir que ele se separasse da mulher e que fosse
morar com ela.
Sem entender a raz�o de tal atitude, Selma questionou:
- Por que, Armando? O certo seria me separar dele e ficarmos juntos.
- Voc� n�o entende que ele � a sua mina de ouro?
- Como assim?
- N�o � poss�vel que seja t�o ing�nua!
- Explique isso melhor, Armando, n�o consigo acompanhar seu racioc�nio.
A inten��o de Armando era conseguir, por interm�dio de Selma, uma boa quantia de dinheiro quando se resolvesse a separa��o entre L�o e C�ssia.
"Eles t�m muitos bens", pensava, "e Selma pode se beneficiar disso se for esperta, e conseq�entemente eu tamb�m ganho com isso".
- Meu amor, pense comigo. L�o e C�ssia, pelo que voc� j� me contou, possuem muitos bens. Os pais dela s�o muito ricos. Em vista disso, quando houver a partilha dos
bens, L�o ficar� melhor ainda. � a nossa chance de nos posicionar na vida. No momento certo, daremos o golpe de mestre, rechearemos nossa conta e viajaremos para
o exterior. Come�aremos bem longe daqui uma nova vida, juntos e felizes, sem o fantasma da pobreza e sem sentir a dor da necessidade. At� isso acontecer, exija cada
vez mais dele, vamos guardando para alcan�armos nossa independ�ncia financeira.
Entendeu agora?
Selma, de in�cio, relutou em aceitar o plano de Armando, mas, apaixonada, acabou concordando com o homem que amava, com receio de perd�-lo. De maneira imprudente,
entregou-se � leviandade e � falta de car�ter de Armando, e tudo corria conforme o plano estabelecido por ele.
Selma n�o sabia que tudo tem um pre�o e que a vida, de uma maneira ou de outra, cobra a inconseq��ncia cometida. E ela j� come�ava a sentir o peso de sua irresponsabilidade
pela frustra��o de viver com um homem que n�o amava.
"N�o sei o que fazer para acabar com esse vazio dentro do meu peito. Essa insatisfa��o de viver ao lado de uma pessoa que n�o amo e querendo, desesperadamente, estar
com aquele a quem entreguei meu cora��o. Vivo insatisfeita, n�o suporto mais fingir, me entregar, representar o tempo todo. Mas sei que Armando n�o vai desistir,
e eu n�o quero perd�-lo."


Devemos ter consci�ncia de que, quando os instintos nos dominam, estamos mais pr�ximos do ponto de partida do que do objetivo. O amor � a primeira palavra do alfabeto
divino, e a tarefa do amor � longa e dif�cil, mas se cumprir�, porque assim Deus o quer.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


Selma voltou � realidade ao ouvir a voz de L�o.
- Estou aqui - respondeu -, pode entrar. Assim que entrou, L�o lhe disse entusiasmado:
- Acabei de falar com o doutor Pedro, marcamos um encontro. Vamos conversar a respeito da separa��o.
- Que bom L�o! - exclamou.
- S� isso tem a dizer, n�o mere�o um beijo?
- Claro, quantos quiser - Selma respondeu sem muito entusiasmo.
Dois dias se passaram.
L�o, entregue � paix�o que sentia por Selma, n�o se lembrava de C�ssia, n�o se importava nem procurava saber como a antiga companheira vivia. Sua �nica preocupa��o
era agradar a Selma, pois tinha receio de que ela o abandonasse. Em sua cabe�a n�o passava a hip�tese de ser alvo do mesmo golpe que aplicara cruelmente na ex-esposa.
- Tenho de resolver essa quest�o da divis�o dos bens o quanto antes. Selma gosta de gastar, � uma consumidora, e n�o posso correr nenhum risco. Tenho de me preparar
financeiramente para n�o decepcion�-la.


O castigo t�o temido somos n�s mesmos que o criamos quando nutrimos sentimentos menores e praticamos atitudes levianas. Ao desprezar as leis de Deus, fatalmente
sofreremos as conseq��ncias. � necess�rio refletir e operar mudan�as para que a evolu��o se fa�a.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


Em sua mente nasceu uma pergunta.
"Por que ser� que Selma desaparece uma ou duas vezes por semana; sai sem dizer para onde vai, ou melhor, diz, mas suas explica��es parecem t�o fr�geis? Preciso conversar
com ela sobre isso, ou ent�o observar mais atentamente seu comportamento."
- Oi, L�o - escutou Selma dizer. Sorrindo, aproximou-se dele e perguntou: - N�o � hoje que vai se encontrar com seu advogado?
- Sim, Selma, � hoje.
- E a que horas pretende ir?
- Logo ap�s o almo�o - respondeu L�o.
- Ap�s o almo�o � muito vago, estou perguntando a que horas.
Ligeiramente irritado, L�o respondeu:
- Que import�ncia tem saber a hora exata, j� disse que � logo , ap�s o almo�o. - Refletiu um pouco e completou: - Por que � t�o importante saber a hora exata?
- Ora, L�o, import�ncia nenhuma, apenas para saber. Existe algum mal nisso?
- Voc� vai sair?
- N�o estou pensando em sair, a n�o ser que precise ir at� o mercado fazer compras para casa.
Irritado, L�o respondeu:
- Ent�o me espere que iremos juntos.
Selma sentiu que era melhor concordar.
- �timo, querido, vamos juntos ent�o. Ser� bem melhor do que ir sozinha. Gostaria apenas de saber a hora para estar pronta assim que voc� chegar.
- Por volta das cinco horas est� bom?
- Claro, estarei esperando.
- Bem, vou indo - disse L�o. - Vou ainda resolver algumas coisas do trabalho antes de me encontrar com o doutor Pedro.
- Tudo bem, amor, vou aproveitar e arrumar os arm�rios, que est�o muito desorganizados. Ali�s, L�o, voc� precisa ser mais cuidadoso, deixa tudo fora do lugar!
- Desculpe amor, vou tentar! - exclamou L�o. Deu um beijo em Selma e saiu.
Selma, assim que o viu entrar em seu carro e partir, correu para o quarto, trocou de roupa e, sentindo-se feliz, disse para si mesma em voz alta:
- Vou correndo me encontrar com Armando, tenho tempo suficiente antes de ele voltar.
Sem pensar nem se importar com nada, foi ao encontro do seu desejo.

***

L�o, entrando na sala do doutor Pedro, abra�ou o advogado com entusiasmo.
- Quero sair daqui com boas perspectivas - disse animado.
- Vamos ver L�o - respondeu simplesmente o advogado.
Horas mais tarde, L�o entrava em casa com a preocupa��o estampada no rosto.
Selma o esperava lendo uma revista, como se nada tivesse acontecido entre ela e Armando. Sua futilidade, seu forte desejo em agradar a si mesma a impedia de perceber
a via inconseq�ente na qual caminhava.
Assim que o viu, exclamou:
- Que bom que chegou querido. Boas not�cias?
Desanimado, L�o sentou ao seu lado, segurou suas m�os e respondeu:
- Mais ou menos.
- Como mais ou menos? Ou a not�cia � boa ou ruim.
- Preste aten��o. O doutor Pedro me explicou que, se eu entrar com a separa��o legal, a partilha ser� apenas dos bens que pertencem a mim e C�ssia, ou seja, a casa
e os dois carros.
- L�o, por que a preocupa��o? N�o � isso que queremos?
- Mas se eu fizer isso estarei exclu�do da heran�a dos pais dela, n�o terei mais direito algum sobre os bens de seus pais, que s�o in�meros, Selma. Eles s�o muito
ricos, e C�ssia � a �nica herdeira. Interessa-me muito mais a heran�a dos velhos do que apenas uma casa.
- O que o advogado aconselhou?
- Que devo tentar um acordo com C�ssia, ou seja, vender a casa e dividir o produto da venda sem entrar com a separa��o legal. Entendeu? Desse modo, permaneceria
com direito � heran�a dos velhos.
- Entendi. Voc� continuaria casado com ela e, conseq�entemente, herdeiro legal. � isso?
- � isso - respondeu L�o.
- Mas, ent�o, qual o problema? Fa�a isso, meu bem.
L�o fitou Selma admirado.
- Selma, voc� acha que C�ssia vai concordar com isso?
- Voc� acha que n�o?
- Evidente que n�o. Ela vai querer a separa��o legal e me excluir de ser beneficiado com os bens de seus pais.
- Ser�? - perguntou Selma.
- Ser� n�o. � assim, com certeza, Selma.
- Ent�o o jeito � n�o se separar.
- E fico a ver navio at� os velhos morrerem? - perguntou L�o ir�nico. - N�o dei esse golpe de mestre para continuar na pior, Selma, quero o dinheiro agora.
- Ent�o n�o fique se lamentando. V� se encontrar com C�ssia. Tudo pode acontecer. Pelo que voc� sempre falou dela, n�o me parece que seja uma pessoa vingativa.
- E n�o � mesmo, mas tamb�m n�o � tola e agora tem ao seu lado os pais e a insuport�vel Sabina para a aconselharem.
- Se isso acontecer, voc� diz que n�o quer.
- Selma, n�o seja ing�nua, ela pode pedir a separa��o litigiosa.
- Nossa, L�o, ent�o n�o sei como voc� vai resolver isso.
- Eu tamb�m n�o sei. Preciso de tempo para pensar como agir, tentar encontrar uma maneira de convenc�-la a fazer um acordo com a casa.
Voltando a ser a criatura ambiciosa que sempre fora, Selma respondeu:
- Pois ent�o pense, e � melhor que resolva logo essa quest�o, porque n�o tenho voca��o para passar minha vida inteira economizando centavos, mesmo que seja ao seu
lado.
Surpreso e decepcionado, L�o respondeu:
- Pensei que me amasse.
Para consertar o que dissera na impulsividade, respondeu, tentando ser mais carinhosa:
- Querido, eu amo voc� e voc� sabe disso; apenas n�o quero viver na mediocridade.
- Selma, n�o sou t�o pobre assim. Ganho bem, vivemos com conforto e nada nos falta. Podemos esperar.
- Esperar? At� quando?
- Eu vou me encontrar com C�ssia e tentar resolver isso da melhor maneira poss�vel. Fique tranq�ila, pois tudo vai dar certo.
- Confio em voc� e espero que d� certo mesmo. Levantando-se e puxando Selma pelas m�os, L�o disse a ela:
- Chega desse assunto. Vamos ao mercado, j� est� ficando tarde.
- N�o quero ir mais - respondeu secamente.
- Posso saber por qu�? N�o precisava fazer compras?
- Porque perdi a vontade, e as compras eu fa�o amanh� � tarde enquanto voc� est� no trabalho. Agora prefiro ficar em casa.
Estranhando o repentino mau humor de Selma, L�o respondeu incomodado:
- Vamos ficar em casa, se � isso o que voc� quer.
- � isso que eu quero - disse Selma, afastando-se de maneira grosseira.
Pensamentos contradit�rios povoaram a mente de L�o.
"Cada vez entendo menos as rea��es de Selma. N�o havia prestado aten��o em como seu g�nio � dif�cil."
Enquanto L�o come�ava a experimentar os primeiros ind�cios da dissimula��o de Selma, C�ssia, por sua vez, ia aos poucos encontrando seu equil�brio, firmando-se na
certeza de que era preciso permitir a renova��o em sua vida. Para isso, contava sempre com o aux�lio e a dedica��o de seus pais e de Sabina.
"O que seria de mim se n�o fosse o amor dessas pessoas t�o especiais que Jesus colocou em meu caminho? Percebo que minha for�a nasce na propor��o do carinho e dos
s�bios conselhos que recebo de meus pais, que, apesar do sofrimento, s�o incans�veis no luta contra o meu des�nimo e a minha melancolia. Sem falar de Sabina, que
parece t�o ignorante, mas que se torna s�bia quando a quest�o � o amor. Seu cora��o generoso se torna gigante na arte de entender o sofrimento alheio."
Nessas horas, C�ssia sentia-se confiante e certa de que tudo voltaria ao normal; que seus dias poderiam ostentar a paz e a tranq�ilidade se ela permitisse que isso
acontecesse, e estava disposta a investir na sua vida aproveitando com entusiasmo a b�n��o que Deus lhe concedia de permanecer no mundo f�sico.
Lembrava que, por v�rias vezes, Sabina lhe dissera:
- C�ssia, quando sofremos uma desilus�o, temos dois caminhos a seguir: um � se entregando ao des�nimo, � tristeza, � fraqueza de n�o lutar e �s l�grimas constantes,
caminho esse que s� nos traz mais sofrimento. O outro � perceber que a desilus�o, na realidade, � uma porta que se abre para que busquemos com mais intelig�ncia
um novo recome�o. � a oportunidade que Deus nos concede para pensarmos em uma nova maneira de agir; mais sensata, mais l�cida e mais coerente com a pr�pria realidade.
- Explique melhor - C�ssia pedia-lhe.
- Voc� se desiludiu com L�o. Se voc� permitir, isso vai lhe trazer mais aten��o em suas escolhas. L�o deu ind�cios de seu car�ter, mas voc� n�o percebeu porque estava
muito envolvida com os galanteios de um homem sedutor que agregava seus carinhos a uma conduta dissimulada. Agora � hora de acordar e direcionar seus sentimentos
futuros para algu�m que, como voc�, tem como finalidade construir um lar de verdade, uma fam�lia dentro do princ�pio do amor verdadeiro.
"Sabina � s�bia. Preciso mesmo reavaliar minha vida e dar a ela a dire��o que me far� feliz."


A vida testa cada um de n�s. � preciso persistir, n�o desanimar diante dos problemas que surgem, tentar sempre mais uma vez, continuar a investir no pr�prio aprimoramento
moral e espiritual; quem assim o faz com certeza alcan�ar� �xito.
Devemos sempre ocupar nosso tempo, nossa mente, com o trabalho edificante; nossos pensamentos com o amor e a harmonia, evitando trazer � tona fatos desagrad�veis
que poder�o nos levar ao desequil�brio.


C�ssia, totalmente envolvida, elevou seu pensamento ao Criador e orou:
"Senhor,
N�o me deixe naufragar no desespero. Salve-me!
Ajude-me a perceb�-lo e senti-lo presente em minha vida.
Que eu saiba coloc�-lo em meu cora��o,
Que eu tenha condi��es de perceber a grandiosidade do amor divino
E possa compreender que a luz que ilumina meus pensamentos,
Mostrando-me a dire��o a seguir,
Vem de Jesus...
Que � fonte inesgot�vel do amor."

Sentindo-se em paz, C�ssia levantou-se e foi ao encontro de seus pais.



Cap�tulo 4
Diante da verdade


Encontrou-os na varanda da casa conversando com Sabina. Assim que a viram Orlando disse:
- Filha, que bom que veio, chegue-se a n�s - falou ele, apoiado por Antonieta e Sabina.
- Isso mesmo, filha, sente-se aqui! - exclamou Antonieta, indicando com as m�os o lugar pr�ximo a ela.
- Atrapalho? - perguntou C�ssia.
- De forma alguma, s� nos d� alegria t�-la conosco.
- Algum problema? - perguntou Orlando, percebendo um ar de preocupa��o no rosto de C�ssia.
- Nada de grave pai, gostaria apenas de me orientar com o senhor.
- Sobre o que, filha, o que a est� preocupando?
- A respeito do que fazer com minha vida daqui para frente. N�o posso ficar nessa in�rcia para sempre. Gostaria de me direcionar, mas n�o sei ainda o que devo fazer.
- N�o acha que ainda � cedo para tomar decis�es, C�ssia? - perguntou Antonieta.
- Acredito que n�o, m�e. Quanto mais cedo, melhor. Estive pensando muito em algumas coisas que Sabina t�o sabiamente me disse dias atr�s, e acho que ela tem raz�o.
Preciso tomar uma postura, uma dire��o na vida.
- Podemos saber o que ela lhe disse que a marcou tanto assim?
- Claro! Ela me explicou sobre o que devemos fazer quando somos atingidos pela desilus�o.
- Como assim, C�ssia? - perguntou Antonieta bem interessada.
- Quem pode explicar melhor � a pr�pria Sabina. - Dirigindo-se a ela, pediu: - Por favor, Sabina, diga a eles o que voc� me falou com tanta propriedade.
Sentindo-se um pouco inibida, Sabina respondeu:
- N�o falei nada de mais, dona Antonieta, apenas mostrei-lhe o caminho mais seguro, a dire��o mais acertada para encontrar a paz, o equil�brio e voltar a ser feliz,
ou seja, n�o cair na auto-compaix�o e recome�ar a vida com mais aten��o.
C�ssia, percebendo a timidez de Sabina, completou:
- Ela me explicou m�e, que a desilus�o pode ser tamb�m uma porta que se abre para agirmos com mais intelig�ncia, que � o momento de repensar, reavaliar e agir com
mais prud�ncia.
- Muito bem, Sabina, admiro essa capacidade de entender as coisas e explicar t�o claramente e de maneira s�bia suas conclus�es acertadas - disse Orlando, realmente
impressionado com a lucidez de Sabina, uma pessoa simples e sem estudo, mas que possu�a a sabedoria dos que se entregam �s leis de Deus e as exercitam para entender
a vida.
- Orlando tem raz�o, Sabina, surpreende a mim tamb�m essa capacidade de raciocinar e tirar da dor o verdadeiro significado dela - completou Antonieta. - Voc� � realmente
uma pessoa especial.
Com a humildade que lhe era peculiar, Sabina respondeu:
- N�o sou especial, dona Antonieta, sou apenas uma pessoa que presta aten��o nos recados que Deus nos envia.
- O que voc� est� dizendo, Sabina?
- Estou dizendo, senhor Orlando, que nosso Pai que est� no c�u observa cada um de n�s. Ele sabe do que precisamos, em determinados momentos da vida, para promover
o pr�prio crescimento como criaturas de Deus, e envia as situa��es que nos ajudam a reconsiderar as posturas, os conceitos ou os comodismos. Essas situa��es abrem
novos espa�os e oportunidades para que possamos recome�ar com mais intelig�ncia, mais coragem e mais f�.
Sem conseguir se conter, Orlando disse a Sabina:
- Antonieta tem raz�o, impressiona-me sua lucidez e tamanha compreens�o da vida. De onde voc� tira todos esses ensinamentos? Sim, porque o que voc� fala s�o ensinamentos
profundos, edificantes.
Sem entender a raz�o de estar causando tanta surpresa, Sabina respondeu:
- Vou buscar minhas respostas dentro do meu cora��o, senhor Orlando, porque aprendi com os ensinamentos de Jesus que � no cora��o que encontramos as respostas de
Deus.
C�ssia, que at� ent�o apenas observava, abra�ou a querida e leal amiga e falou:
- Entenderam agora por que preciso ter coragem e recome�ar minha vida? Sabina me fez entender essa necessidade. N�o quero e n�o vou me fazer de v�tima; n�o quero
ser alvo do fracasso.
- Gostei de ouvi-la falar assim - disse sua m�e, abra�ando-a.
- Eu tamb�m, minha filha, e deixo claro que pode contar conosco para o que quiser ou precisar.
- Obrigada, voc�s s�o os melhores pais do mundo! - exclamou C�ssia.
Olhou para Sabina e completou:
- E voc� � a melhor amiga que poderia estar ao nosso lado.
- Concordamos com voc� - disse Antonieta.
- Voc� j� sabe o que pretende fazer? - perguntou Orlando.
- � sobre isso que quero me aconselhar com o senhor, n�o sei ainda por onde come�ar.
- Em primeiro lugar, � necess�rio que decida onde quer morar, se vai continuar em sua casa ou se fixar� resid�ncia aqui com seus pais.
- Gostar�amos muito que ficasse conosco - disse Antonieta, enfatizando seu desejo de t�-la junto a si.
- Disso eu tenho certeza, m�e, mas n�o acho justo voltar a morar com voc�s, trazer-lhes preocupa��es, na minha idade - disse C�ssia, meio sem jeito.
- Mas o que � isso, C�ssia? - interferiu Orlando. - Esta � a sua casa e n�s somos seus pais. Se houver outro motivo que a impe�a de morar conosco, eu respeito, mas
se for esse eu n�o aceito.
- Seu pai tem raz�o, C�ssia - falou Sabina, sentindo-se � vontade, pois sabia que sua opini�o seria respeitada. - Sua presen�a aqui s� traria alegria para eles.
Qual o verdadeiro motivo da sua indecis�o?
Diante do sil�ncio de C�ssia, Antonieta perguntou � filha:
- Ser� que alimenta ainda alguma esperan�a em rela��o ao L�o? � esse o motivo, minha filha?
- N�o sei m�e, n�o sei. Estou muito confusa - com isso, pediu licen�a e saiu dizendo que ia descansar em seu quarto.
Os tr�s se entreolharam e pensaram a mesma coisa: "Ela ainda o ama!"
Antonieta aproximou-se de Sabina e pediu-lhe:
- Por favor, v� conversar com ela, ela sempre ouviu seus conselhos, pois confia e acredita em voc�.
- Eu vou, dona Antonieta - respondeu Sabina, feliz com a incumb�ncia.
Encontrou C�ssia sentada diante da janela admirando o maravilhoso p�r do sol. T�o absorta estava que n�o se deu conta da presen�a de Sabina, s� percebendo quando
ela tocou seu ombro delicadamente e lhe disse:
- Minha menina, d� tempo ao seu cora��o, aos poucos ele perceber� que poder� bater novamente com a mesma intensidade e mudar� o alvo do seu sentimento, quando se
der conta das diferentes formas de amar.
Como uma crian�a, C�ssia perguntou:
- Voc� acha mesmo, Sabina?
- Claro! � s� voc� se permitir olhar ao seu redor, perceber as belezas que a rodeiam, quantas alternativas e dire��es existem que podem nos trazer felicidade.
- A minha for�a e a minha fraqueza se alternam Sabina. Em quest�o de segundos vou da esperan�a ao des�nimo. Acho dif�cil controlar isso.
Sabina sentia grande carinho por aquela "menina" que vira crescer e que amava como a uma filha. Ternamente lhe disse:
- C�ssia, n�s n�o podemos colocar todas as nossas expectativas de felicidade nas m�os de uma pessoa, � imprud�ncia, pois ela pode n�o corresponder, como � o seu
caso. N�o devemos querer ter ao nosso lado uma pessoa que seja a fonte da felicidade, mas entender que, como n�s, essa pessoa tamb�m est� em busca do mesmo objetivo,
ou seja, ser feliz. A felicidade, como j� lhe disse, � um estado de alma, � uma sensa��o muito mais profunda que as alegrias moment�neas que sentimos. N�s escolhemos
nossos companheiros de jornada. Nem sempre acertamos, mas de alguma forma ou por algum motivo eles deveriam estar do nosso lado naqueles momentos. Quando a corrente
se quebra, � hora de silenciar, repensar e iniciar nova caminhada, porque provavelmente, ao longo do caminho, poderemos encontrar outras pessoas que tamb�m est�o
� procura de parceiros que pensam como n�s.
- Se voc� est� se referindo a casar novamente, Sabina, saiba que jamais farei isso!
- N�o acha cedo para essa afirma��o? O tempo � nosso maior aliado para todas as nossas incertezas, C�ssia. - Mudando o rumo da conversa, Sabina disse: - Quero que
me diga agora o real motivo de n�o querer viver aqui com seus pais.
- N�o quero me desfazer de minha casa, onde passei dias de...
- Sofrimento - completou Sabina.
- Sabina, nem tudo foram sofrimentos, tive momentos de muita alegria.
- C�ssia, desculpe-me, mas estou com voc� desde o primeiro dia de seu casamento e posso afirmar que suas alegrias foram falsas. Voc� nunca quis enxergar a realidade,
enganou-se o tempo todo e permitiu que L�o, a cada dia, se mostrasse mais dissimulado e falso em seus sentimentos. Voc� se enganava tentando esconder de si mesma
a realidade.
- Voc� est� sendo cruel, Sabina, est� exagerando.
- Penso que estou sendo realista e tento faz�-la enxergar a realidade do que foi sua vida de casada desde o in�cio. Pode ser cruel, mas a minha inten��o � evitar
que voc� se afunde em �guas rasas. Agora � o momento de refletir e tomar decis�es acertadas.
Com humildade, Sabina completou:
- Perdoe-me se estou me excedendo, sei que minha condi��o aqui nesta casa n�o me d� o direito de me intrometer tanto, mas a quero como a uma filha e sofro com o
seu sofrimento. Perdoe-me repetiu.
C�ssia, sensibilizada com tanto carinho vindo de uma pessoa simples, mas ao mesmo tempo t�o s�bia e verdadeira, respondeu abra�ando-a:
- O que � isso, Sabina, voc� sabe que sua opini�o importa a todos n�s. Sua posi��o aqui nesta casa � de uma pessoa da fam�lia, estimada e respeitada. Sei que seus
conselhos s�o para o meu bem.
Meus pais tamb�m sabem disso e ficam felizes quando a v�em me orientando, porque n�o duvidam que sejam orienta��es para o fortalecimento da minha autoestima.
- Sou muito grata a voc�s todos pelo carinho com o qual sempre me trataram. Voc�s s�o minha fam�lia! - exclamou Sabina emocionada.

***

Quinze dias se passaram desde esse acontecimento.
C�ssia, aos poucos, ia recuperando seu equil�brio e encontrando a paz em seu cora��o.
Conseguia sorrir e brincar com o c�ozinho de sua m�e, que crescera correndo pelo gramado da casa de seus pais.
Nunca mais tocara no assunto do rumo que queria dar � vida, e seu pai esperava que a iniciativa partisse dela.
Todos notaram que C�ssia parecia mais segura e confiante. Trazia no rosto uma express�o de tranq�ilidade, o que deixava seus pais e Sabina mais felizes.
Certa tarde, C�ssia estava entretida com a leitura quando Sabina a chamou:
- C�ssia, telefone para voc�.
- Pode me dizer quem � Sabina?
- Conheci a voz, mas prefiro que voc� mesma confirme.
- Nossa, quanto suspense - brincou C�ssia, sem imaginar quem seria.
Depositou o livro sobre a mesinha e, curiosa, foi atender. Assim que ouviu o al� do outro lado da linha, seu cora��o sofreu um impacto, pois reconheceu de imediato
a voz de L�o. Recompondo-se, respondeu secamente.
- O que voc� quer?
- Calma, C�ssia, n�o precisa me responder com tanta agressividade.
Sem paci�ncia, C�ssia continuou:
- Fale de uma vez o que quer, n�o perco tempo com voc�.
- Voc� mudou muito, meu amor.
Irritada, C�ssia revidou:
- N�o sou seu amor e n�o lhe dou o direito de me chamar assim. Fale de uma vez o que quer, sen�o vou desligar o telefone.
- Meu Deus, como voc� mudou! Tudo bem, vou direto ao assunto.
- Fale!
- Precisamos nos encontrar para resolver o assunto da nossa casa.
- Para resolver isso n�o precisamos nos encontrar - respondeu C�ssia. - Nossos advogados tratar�o disso por meio da separa��o legal.
L�o pensou: "Preciso ir com calma".
- C�ssia, n�o estou falando de separa��o.
- Mas eu estou L�o, � a ordem natural das coisas.
- Para mim, n�o. Quero apenas vender a nossa casa e dividir com voc� o fruto dessa venda, o restante fica para depois.
Completamente nervosa C�ssia respondeu quase aos gritos:
- O que quer dizer com o restante, o que temos � somente aquela casa e os dois carros, que ficou um para voc� e o outro para mim. N�o existe restante algum.
Com sarcasmo, L�o respondeu:
- A� � que voc� se engana, C�ssia, sou herdeiro de seus pais, lembra?
- O qu�? - perguntou C�ssia perplexa.
- � isso o que voc� ouviu meu bem. Esqueceu que com o nosso casamento me tornei herdeiro de seus pais? Casamos com comunh�o universal de bens, lembra? E disso eu
n�o vou abrir m�o, � muito dinheiro para desprezar.
C�ssia mal podia acreditar no que ouvia.
- Voc� � muito canalha, L�o!
- Pode ser, mas � melhor ser um canalha rico do que pobre, concorda?
Completamente chocada, C�ssia respondeu sem conter sua indigna��o:
- � por isso que quer vender nossa casa sem entrar com a separa��o legal, n�o �, L�o?
Percebendo que n�o adiantaria esconder, L�o respondeu:
- � melhor mesmo jogar �s claras; � por causa disso, sim. N�o vou jogar fora um direito meu de receber a heran�a dos velhos.
C�ssia pensou: "N�o posso acreditar no que estou ouvindo. Ele � pior do que imaginava. Sabina tem raz�o, esse homem n�o presta, n�o tem nenhum escr�pulo".
Sentindo o sil�ncio de C�ssia, L�o voltou a dizer:
- Ficou muda, n�o vai dizer nada?
- N�o tenho nada a dizer, a n�o ser que voc� � um canalha e eu n�o posso me perdoar por ter amado voc� um dia.
- Ter amado ou ainda amar? - perguntou L�o com ironia.
- Pode ter certeza de que esse sentimento faz parte do passado. No presente, a �nica coisa que sinto por voc� � desprezo. Fique sabendo que n�o vou concordar em
vender casa nenhuma, e que tudo vai ser feito legalmente, com nossa separa��o, e o mais r�pido poss�vel.
- C�ssia, vamos conversar de maneira civilizada. Eu n�o vou aceitar a separa��o - tentou convenc�-la.
- Chega L�o, n�o quero ouvir mais nada. O que tiver de dizer fale com meu advogado, que vai procur�-lo brevemente. Por favor, n�o me procure mais porque n�o vou
atend�-lo.
L�o ainda tentou dizer alguma coisa, mais foi impedido por C�ssia, que bruscamente desligou o telefone.
Irritado, pensou: "O que vou fazer agora? Selma n�o vai me perdoar. Se C�ssia pensa que vou aceitar tudo numa boa, est� muito enganada, pois vou brigar feio por
essa heran�a".
Pensou mais um pouco e concluiu: "Essa mudan�a de C�ssia pode ser influ�ncia dos velhos e da insuport�vel Sabina, mas podem me aguardar, pois vou lhes dar muita
dor de cabe�a".
Assim que C�ssia desligou o telefone, dirigiu-se para junto de seus pais. Orlando lia o jornal enquanto Antonieta molhava suas plantas, tarefa que fazia com felicidade,
pois amava os lindos vasos que ela mesma plantara.
Percebendo a presen�a da filha, Orlando sorriu e lhe disse:
- Sente-se ao meu lado, filha - pedido que C�ssia prontamente atendeu. - Vejo um ar de preocupa��o nesses lindos olhos. Algum problema, filha?
- Sim, pai, e acredito que o senhor n�o vai gostar.
- Diga-me do que se trata e deixe que eu resolva se gosto ou n�o.
- Acabei de falar com L�o pelo telefone.
- Aquele moleque! - exclamou Orlando mostrando irrita��o. O que ele queria?
- Queria que nos encontr�ssemos para tratar da venda da nossa casa.
- Da venda da casa de voc�s? - repetiu Orlando surpreso. - Mais ele n�o comentou nada sobre o processo de separa��o?
- Pai, o senhor n�o vai acreditar na proposta que ele me fez.
- Diga-me, filha, que proposta � essa?
- Ele n�o quer a separa��o, quer apenas vender a casa e dividir o dinheiro.
- N�o compreendo porque ainda n�o deu entrada nos pap�is da separa��o.
- Pai, o senhor n�o est� entendendo. Ele n�o quer se separar �de mim porque n�o abre m�o de sua fortuna, quer continuar sendo seu herdeiro. Entendeu agora?
- Que canalha! - exclamou Orlando.
- Eu n�o sei o que fazer pai.
- Mas eu sei filha, vamos amanh� mesmo falar com o doutor Maciel. Ele � um �timo advogado, tenho certeza de que vai nos orientar sobre como agir com um canalha desses.
Antonieta, que tudo ouvia sem emitir opini�o, segurou as m�os da filha e lhe disse:
- C�ssia, desculpe-me pelo que vou lhe dizer, mas pe�o-lhe que n�o sofra mais por esse homem sem car�ter, ele n�o � digno de voc�, nunca a mereceu. E quanto a continuar
a ser nosso herdeiro, vamos deixar que a lei decida. Os ju�zes est�o a� para resolver quest�es como essa.
- Sua m�e tem raz�o, minha filha. Voc� deve pensar agora no que quer fazer, onde quer morar, enfim, dar uma dire��o � sua vida, pensar no seu futuro daqui para frente,
arrumar um emprego digno dentro da sua �rea profissional.
- Isso mesmo, C�ssia, mesmo sabendo que voc� n�o precisa, o trabalho faz bem para a mente, eleva a autoestima pela realiza��o pessoal que sentimos quando nos movimentamos,
quando contribu�mos de alguma forma para a sociedade como um todo, porque fazemos parte dessa sociedade.
- Mas o L�o...
Interrompendo a filha, Orlando disse:
- O L�o, minha filha, vai viver a vida que escolheu, e nada podemos fazer para mudar isso por uma simples raz�o: ele n�o quer. Ele tem o direito de escolher seu
caminho, fazer sua op��o mesmo que n�o seja a mais prudente. Isso se chama livre-arb�trio. Todos n�s temos o direito de fazer nossas escolhas, mas � certo que sofreremos
as conseq��ncias dos nossos enganos.
C�ssia ficou pensativa.
Percebendo a indecis�o da filha, Antonieta voltou a dizer:
- Percebo em seu rosto uma express�o melanc�lica. Sugiro que desabafe conosco tudo o que ainda a perturba, minha filha. Confie em n�s, somos seus pais e a amamos
acima de tudo.
- � verdade, C�ssia, sua m�e est� certa. � preciso colocar para fora tudo o que a angustia para ter a chance de organizar suas emo��es, compreender o porqu� das
coisas, enfim, tra�ar nova dire��o para sua vida e come�ar a escrever outra hist�ria, que poder� ser mais bonita do que aquela que ficou para tr�s.
Emocionada, C�ssia deixou que duas l�grimas descessem discretas pelo seu rosto.
Antonieta e Orlando perceberam que a filha ainda sofria muito por sua separa��o.
Criando coragem, C�ssia disse a seus pais:
- Pe�o que perdoem a minha fraqueza, mas por mais que eu diga quanto desprezo o L�o, por mais que minha consci�ncia me mostre que ele � um canalha, que nunca me
amou e s� casou comigo por causa do meu dinheiro, sofro muito com essa separa��o. N�o sei, na verdade, se � amor ou frustra��o por tudo ter dado errado, por n�o
ter conseguido fazer com que nosso casamento desse certo. Ele disse que eu era culpada por n�o ter lhe dado filhos e me magoa saber que nem m�e consegui ser e nunca
serei. Entristece-me muito n�o ter podido cumprir o juramento que fiz quando nos casamos.
Orlando e Antonieta ouviam o desabafo com o cora��o apertado. Sofriam com a dor que sentia sua �nica filha e tentavam levar esperan�a e paz para seu cora��o magoado.
Sentada em um canto, Sabina ouvia toda a conversa sem emitir nenhuma opini�o. Enquanto a conversa se desenrolava entre os tr�s, Sabina ia se lembrando dos acontecimentos
e brigas mais importantes que presenciara na casa dos dois, e percebeu que em todas as vezes que discutiam L�o jogava na cara de C�ssia o fato de n�o poder lhe dar
um herdeiro, mas jamais permitira que C�ssia visse o resultado do exame que fizera.
Ela dizia para si mesma: "Sempre achei muito estranho esse fato. A conversa de que era para proteg�-la n�o tinha nenhum sentido, pois ele mesmo fazia quest�o de
lembr�-la a todo instante".
Uma desconfian�a bateu forte em seu cora��o: "Ser� que realmente ele dizia a verdade? Meu Deus, por que n�o pensei nisso antes? Por que s� agora, ouvindo-a tocar
nesse assunto, me veio essa suspeita? Suspeita essa perfeitamente vi�vel!"
- O que voc� pensa de tudo isso, Sabina? - perguntou Antonieta.
- � mesmo, Sabina, est� t�o quieta. Imagino que deva ter muita coisa a nos dizer, pois viveu sempre ao lado dela ap�s o casamento - completou Orlando.
- Desculpem-me, enquanto conversavam, algumas coisas vieram � minha cabe�a.
- Podemos saber que coisas?
- Claro, senhor Orlando.
- Ent�o nos diga.
- � sobre a quest�o de C�ssia nunca ter engravidado.
- O que est� querendo dizer?
- Estou me lembrando de que L�o jamais permitiu que C�ssia visse o resultado do exame que fizeram; dizia que era para protegera, mas vivia lembrando-a desse fato.
Penso que deveria ser ao contr�rio; se realmente ele quisesse proteg�-la, deveria ser o primeiro a esquecer o assunto e n�o coloc�-la como a culpada do casamento
ter acabado como sempre fazia. S� agora me dei conta disso.
- Isso � verdade, C�ssia, voc� nunca viu esse exame?
Envergonhada, C�ssia respondeu:
- Ele nunca permitiu que eu visse, dizendo que era para eu n�o sofrer.
- Mas isso � uma incoer�ncia! - exclamou Orlando. - Sabina tem raz�o. A impress�o que d� � que ele escondeu a verdade.
- Mas com que inten��o, pai?
- Com a inten��o de t�-la presa a um sentimento de culpa, e pelo visto conseguiu.
- Calma, senhor Orlando, � apenas uma suspeita. N�o tenho certeza de nada, e posso estar enganada.
- Pode ser Sabina, mas o que disse faz sentido.
- S� temos uma maneira de saber - disse Antonieta.
- O que a senhora quer dizer, m�e?
- Quero dizer o �bvio, minha filha, voc� vai ao m�dico e vai fazer novo exame. Desse modo teremos conhecimento da verdade.
- Para que isso, m�e, vamos deixar tudo como est�. N�o quero sofrer mais uma desilus�o.
- N�o, C�ssia, voc� vai correr o risco. Existe uma chance de tirar de voc� essa m�goa, e voc� n�o deve descart�-la.
- E se for confirmado que realmente sou est�ril, a senhora tem no��o do tamanho do meu sofrimento?
Antonieta respondeu com outra pergunta:
- E se for confirmado que voc� n�o �, que pode, sim, gerar um filho, voc� j� pensou no tamanho da sua alegria? De qualquer maneira, voc� elimina a d�vida e passa
a viver com a verdade. Voc� � muito nova, filha, e n�o deve colocar sua esperan�a, seu sonho, na palavra de algu�m que j� sabemos n�o merecer confian�a.
- Sua m�e tem raz�o, C�ssia, � prefer�vel a verdade, por mais que doa, a viver na d�vida e perder, talvez, a oportunidade de sonhar com a maternidade.
- O que voc� acha Sabina?
- Concordo com a senhora, dona Antonieta.
- Ent�o est� combinado. Vamos marcar o m�dico e resolver essa situa��o o mais r�pido poss�vel, assim sairemos dessa incerteza. Se tudo der certo como esperamos,
voc� vai tirar da cabe�a a culpa que sente e saber� que, em vez de culpada, voc� foi a v�tima de uma pessoa sem escr�pulos, que n�o possui outro prop�sito a n�o
ser se dar bem por interm�dio dos outros.
- Est� bem, m�e, vamos fazer o que a senhora quer.
Antonieta abra�ou a filha e lhe disse amorosa:
- C�ssia, meu cora��o est� me dizendo que voc� ter� uma grande surpresa.
Sem muita convic��o, C�ssia respondeu:
- Deus a ou�a, m�e! - levantou-se e foi em dire��o ao seu quarto.
Seus pais e Sabina ficaram observando C�ssia se afastar.
- Ela ainda sofre - disse Antonieta.
- � isso que n�o entendo dona Antonieta, como pode uma pessoa sofrer tanto por algu�m que n�o a quer, que nada fez para sua felicidade, ao contr�rio, apenas contribuiu
para que seus sonhos ru�ssem?
- Sabina, voc� nunca ouviu dizer que o cora��o tem raz�es que a pr�pria raz�o desconhece? - perguntou Orlando.
- Ela vai superar - disse Antonieta. - Pode apostar que sim. � s� uma quest�o de tempo.
- Vou rezar muito para que isso aconte�a - concluiu Sabina. - N�o suporto ver minha menina sofrendo. - E, mudando completamente o rumo da conversa, Sabina perguntou:
- Os senhores querem um caf�?
- Achamos uma boa id�ia, Sabina, aceitamos sim.
- � s� um instante - disse Sabina, indo em dire��o � cozinha.
Vendo-se a s� com a esposa, Orlando lhe disse:
- Antonieta, estou preocupado com C�ssia, ela anda muito abatida, parece-me que se recusa a viver.
- Tranq�ilize-se, Orlando, hoje Sabina me deu uma nova esperan�a e vou me apegar a ela por enquanto. Se tudo acontecer como espero, nossa filha vai criar alma nova,
pode acreditar.
- Voc� cr� mesmo nisso?
- Creio Orlando, firmemente. Para uma mulher sens�vel como C�ssia, a maternidade exerce grande fasc�nio. O desejo de ser m�e � inerente a quase todas as mulheres,
e C�ssia n�o � diferente. Se o que pensamos se confirmar, ela vai preencher o vazio do seu cora��o com a esperan�a de poder construir no futuro uma fam�lia de verdade,
com crian�as correndo pela casa.
- Que a verdade venha � tona, seja ela qual for - concluiu Orlando.

***

Selma, assim que soube do resultado da conversa que L�o tivera tom C�ssia, deixou que sua ira ca�sse sobre a cabe�a do companheiro.
- Voc� est� me surpreendendo, L�o, mas de maneira negativa.
- Posso saber por qu�? - perguntou a Selma.
- J� deveria saber, mas, se n�o tem capacidade para isso, eu respondo. Em vez de voc� intimidar sua ex-mulher, permitiu que ela o intimidasse. Onde est� aquele homem
valente, impetuoso, sempre sabendo o que quer e lutando para conseguir seus objetivos, sem se importar em atropelar quem cruzasse seu caminho? Foi com esse homem
que eu resolvi viver, e n�o com o que eu vejo agora, amedrontado, deixando escapulir por entre os dedos a nossa independ�ncia financeira. Enfim, pensei que pudesse
confiar em voc�, mas vejo que me enganei.
- Calma, Selma, eu apenas conversei com C�ssia, n�o deixei nada resolvido. Ela n�o aceitou minha proposta, mas isso n�o quer dizer que eu aceitei a dela, entende?
- Entendo, e quero que entenda tamb�m que n�o vou passar o resto da minha vida contando tost�es ao seu lado.
- O que quer dizer?
- Quero dizer que � tudo ou nada, compreendeu agora?
L�o sentiu a raiva invadir-lhe a alma.
Aproximou-se de Selma e, segurando fortemente seu bra�o, lhe disse:
- Escute e preste muita aten��o no que vou lhe dizer. N�o vou admitir ser passado para tr�s, ouviu bem? Portanto, aconselho-a a ir se contentando com o que posso
lhe dar por enquanto, o que, ali�s, n�o � pouco.
Selma estremeceu com a s�bita viol�ncia de L�o e pensou: "Acho melhor me calar, posso p�r tudo a perder".
- N�o precisa se exaltar, L�o, falei por falar. Voc� sabe que gosto do conforto que o dinheiro pode dar, mas jamais vou querer magoar voc�.
Soltando o bra�o da companheira, L�o respondeu:
- Tudo bem. � melhor que seja assim.


Deve-se ter muito cuidado com as apar�ncias, pois nem sempre elas dizem o que realmente habita o cora��o do ser humano. O mel da do�ura precisa estar na alma, na
ess�ncia, e n�o na m�scara que o homem ostenta.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


Armando, indignado, assustava Selma com as palavras grosseiras que lhe dirigia assim que tomou conhecimento do teor da conversa que L�o tivera com a ex-mulher:
- Esse L�o � o qu�? - perguntava com desprezo. - Um idiota que n�o consegue se impor ou um alienado que n�o percebe que � a grande oportunidade de se dar bem na
vida? O homem precisa se posicionar, correr atr�s do que quer sem se importar com quem se coloca na sua frente, somente assim conseguir� seus objetivos. O mundo
� dos espertos, Selma, quem se retrai � passado para tr�s sem d� nem piedade.
Tentando acalmar o amante, Selma respondia:
- Calma, Armando, n�o vejo motivo para tanta raiva. Dessa maneira voc� me faz acreditar que n�o se importa nem um pouco comigo, que para voc� sou apenas a ponte
para ganhar um dinheiro ao qual, a bem da verdade, n�o temos direito algum.
Percebendo que se exaltara mais do que deveria e temendo p�r tudo a perder, Armando baixou o tom de voz, segurou as m�os de Selma e lhe disse carinhosamente:
- Desculpe meu amor, n�o queria causar essa impress�o a voc�, porque n�o � verdadeira. Apenas fiquei surpreso com a atitude de L�o. Sendo ele um homem decidido,
sempre sabendo o quer e correndo atr�s dos seus interesses, deixar se levar pelas palavras de C�ssia...
- Mas nada ficou decidido ainda. Ele vai se encontrar com ela e exigir o que lhe pertence de direito.
N�o querendo assustar a namorada, Armando encerrou o assunto.
- Tudo bem, vamos deixar que ele resolva seus problemas; para n�s s� interessa o final, o que vamos levar de tudo isso. - Puxou Selma para junto de si e lhe sussurrou
no ouvido: - Vem c�, meu amor, n�o vamos estragar este momento que � s� nosso falando dos problemas do L�o.
Beijando-a com ardor e sendo correspondido, entregaram-se aos del�rios da paix�o.
L�o olhava para o rel�gio com ansiedade.
"Onde ser� que Selma se meteu? Essas sa�das repentinas dela est�o me deixando preocupado, para n�o dizer desconfiado. S� quero ver a desculpa que dar� desta vez."
Nervoso, andava de um lado para outro tentando se acalmar, mas ficando cada vez mais agitado e ansioso. Quando percebeu o barulho indicando a chegada de Selma, sentou-se
apressadamente em uma poltrona e, pegando um jornal, fingiu que estava lendo.
- Oi, amor faz tempo que chegou? - perguntou Selma, carinhosa, tentando agradar-lhe.
- Tempo suficiente para perceber sua demora e constatar que s�o estranhas essas suas sa�das constantes e demoradas. - Com irrita��o, perguntou: - Posso saber onde
estava?
Com a dissimula��o que lhe era peculiar, Selma respondeu:
- Claro que sim, meu amor. Sa� com a inten��o de ir ao cabeleireiro...
- Pelo visto n�o foi - adiantou-se L�o impaciente.
- Calma, meu bem, me deixe terminar de falar. N�o fui por uma �nica raz�o: eu me senti mal e fui at� o posto de sa�de passar pelo m�dico, o que foi �timo.
- Por qu�?
- Olhe! - exclamou Selma esticando o bra�o e mostrando na parte interna do cotovelo uma pequena atadura.
- O que � isso, meu amor? - perguntou L�o realmente preocupado.
- O m�dico achou melhor receitar uma medica��o injet�vel, e tive, ent�o, de ficar tomando o medicamento pelo soro.
- Mas o que voc� teve foi coisa s�ria?
- N�o, meu bem, n�o foi coisa s�ria, apenas uma queda de press�o que j� foi resolvida. Esse foi o motivo da minha demora, voc� compreende?
- Mas claro que compreendo Selma, e fico preocupado com voc�. N�o seria melhor voc� descansar? Deixe que eu preparo alguma coisa para comermos.
Selma pensou: "Meu Deus, como pode ser t�o ing�nuo! Nem percebeu que fui eu mesma que coloquei essa atadura no bra�o! Melhor assim, ser� mais f�cil arrumar justificativas
quando acontecer de novo. N�o conhecia esse lado de L�o, sempre achei que fosse mais perspicaz, entretanto, n�o passa de um distra�do, para n�o dizer bobo. Era t�o
valente e autorit�rio com C�ssia, e comigo parece um cordeirinho".
- Tudo bem, amor, vou descansar. Assim que o jantar estiver pronto pode me chamar.
- Vai, meu amor, descanse e n�o se preocupe, porque sei como fazer.
Deu um beijo em Selma, que se dirigiu em seguida ao quarto, enquanto L�o foi at� a cozinha preparar alguma coisa para os dois.
Enquanto se entregava ao preparo do jantar, L�o pensava: "N�o sei o que acontece comigo quando estou perto de Selma. Aceito tudo o que ela fala mesmo desconfiando
que possa ser mentira. Ao lado de C�ssia, ficava impaciente, autorit�rio, sempre impondo minhas vontades, enquanto com Selma parece que perco minha personalidade
e submeto-me a seus caprichos, seus gastos absurdos".
Lembrou-se de como Selma era diferente no in�cio do relacionamento; carinhosa, gentil, sempre cordata, e fora isso que o levara a se apaixonar t�o intensamente.
Entretanto, agora se mostrava caprichosa, exigindo cada vez mais, parecia n�o ter limites.
Pensava consigo mesmo: "Cada vez que ela desaparece, suas explica��es s�o sempre suspeitas. E por que ser� que aceito todas elas?" Balan�ou a cabe�a tentando afastar
seus pensamentos.
Selma, por sua vez, aconchegada na maciez da sua cama, sonhava com o dia em que poderia andar livremente de m�os dadas com Armando, sem medo e sem culpa: "Ele �
e sempre ser� meu grande amor. S� aceitei esse jogo porque tenho medo de perd�-lo. Se ele n�o fizesse tanta quest�o do dinheiro, jogava tudo para o alto, corria
para seus bra�os e nem olhava para tr�s, mas, enfim, vamos aguardar para ver o que acontece". Continuou em seus devaneios at� que ouviu a voz de L�o, chamando-a
para jantar.



Cap�tulo 5
O apoio dos benfeitores espirituais


L�o, em seu escrit�rio, fazia planos para ir ao encontro de C�ssia. N�o podia negar que o pensamento de novamente estar pr�ximo daquela que por cinco anos fora sua
esposa, dividira com ele momentos de paz e de ang�stia, incutia em seu cora��o certa ansiedade.
"N�o a amo mais e, a bem da verdade, nunca a amei, mas devo reconhecer que C�ssia me proporcionou dias de muita alegria e muito conforto, mesmo sofrendo as agress�es
verbais e, algumas vezes, f�sicas que eu praticava contra ela."
Lembrava das manh�s em que C�ssia se dedicava ao tratamento de suas belas flores, passando horas a fio perdida nas suas ilus�es e sonhos.
"Devo reconhecer que C�ssia � uma bela mulher, sincera, confi�vel e de uma dignidade espantosa. Muito diferente de Selma, que me d� a impress�o de estar comigo apenas
para conseguir algum benef�cio - sendo bem realista, da mesma maneira que fiz com C�ssia. Por que ser� que o ser humano age dessa maneira, prejudica algu�m t�o especial
e se une a algu�m que declaradamente s� pretende tirar vantagem e explorar seus sentimentos?"


O orgulho � o terr�vel advers�rio da humanidade. Quando o orgulho e a ambi��o atingem o seu extremo, � ind�cio de uma pr�xima queda. Por que tendes em t�o grande
estima o que brilha e encanta os vossos olhos, em lugar do que vos toca o cora��o? As riquezas s�o por acaso eternas?
(O Evangelho segundo o espiritismo)


L�o surpreendia-se ao se entregar a essas considera��es. Perguntava-se: "O que est� acontecendo comigo? N�o sou homem de me entregar a arrependimentos. O que fiz
est� feito e n�o se pode mudar, mesmo porque n�o quero mudan�as, quero apenas o que me pertence por direito. Se for dinheiro que Selma quer, � dinheiro que ela vai
ter".
Decidido, pegou o telefone e ligou para C�ssia.
Do outro lado, ouviu a voz conhecida de sua ex-mulher.
- Al�?
- Sou eu, C�ssia, L�o.
O cora��o de C�ssia ainda sofria impacto sempre que deparava com L�o.
- O que voc� quer, L�o, n�o temos mais nada a dizer um ao outro.
- Voc� se engana, C�ssia, temos muito que nos dizer.
- O que � dessa vez?
- O mesmo assunto que conversamos na vez passada, ou seja, a venda da nossa casa.
- N�o ficou acertado que seria resolvido por meu advogado?
- N�o, nada ficou acertado. N�o quero conversar com advogado, quero conversar com voc�.
- Mas o que voc� quer de verdade? Temos pouco o que dividir, somente a casa e os m�veis. Voc� quer algum?
- N�o seja boba, C�ssia, os m�veis n�o me interessam. O que quero, na verdade, � a minha parte na venda da casa. J� lhe disse isso.
- L�o, j� estou tratando da nossa separa��o legal. N�o tenho a inten��o de prejudic�-lo, voc� n�o vai perder nada. Meu advogado vai procur�-lo.
Demonstrando grande irrita��o, L�o respondeu j� meio alterado:
- C�ssia, eu j� lhe disse que n�o vou me separar de voc� legalmente; quero apenas vender a nossa casa e dividir o fruto dessa venda com voc�, s� isso.
- N�o estou entendendo essa sua obstina��o, L�o - disse C�ssia, fingindo n�o saber qual era a verdadeira inten��o de L�o.
Querendo p�r um fim � conversa, L�o disse autorit�rio e sem esperar que C�ssia argumentasse:
- Amanh� estou indo ao seu encontro a fim de conversarmos sobre isso e acertarmos tudo. Assim que chegar � cidade, telefono para nos encontrarmos. Quero apenas dizer
que vou conversar somente com voc�, nada de levar papai, mam�e ou mesmo o advogado.
Sem se importar com a rea��o de C�ssia, L�o desligou o telefone.
E disse para si mesmo: "Amanh� vou lhe mostrar quem dita �s regras do jogo, C�ssia. N�o vou ceder. Se ela e aqueles velhos pensam que v�o me dobrar, est�o redondamente
enganados. Dessa oportunidade de ficar rico, de usufruir com Selma as del�cias que o dinheiro proporciona, n�o vou abrir m�o. N�o foi � toa que ag�entei esse casamento
por cinco anos. Se eu n�o tivesse conhecido Selma, poderia ser que durasse mais tempo, eu era dono da situa��o. Mas agora n�o vou arriscar perder o meu amor, a �nica
mulher que realmente amei, por causa de uma dignidade boba e sem sentido".
Dando por encerrado seu expediente, levantou-se e foi ao encontro de sua amada.
C�ssia, imediatamente ap�s L�o desligar o telefone, correu a contar para seu pai o que iria acontecer no dia seguinte.
- Mas esse L�o � mesmo sem car�ter - exclamou Orlando com revolta.
- Calma, Orlando, em certos momentos o mais importante � manter a calma.
- Como voc� pode me pedir calma, Antonieta, se um mau-car�ter inferniza a vida de nossa �nica filha e, como se isso n�o bastasse, ainda quer ter direito � heran�a
dela?
C�ssia apenas chorava.
- Desculpe-me, pai, se estou fazendo o senhor sofrer! - exclamou C�ssia.
Orlando e Antonieta olharam para a filha sem entender o motivo de tal coloca��o.
- Voc� n�o est� nos fazendo sofrer! - disseram seus pais, quase ao mesmo tempo. - O que voc� est� dizendo, minha filha?
- Estou dizendo, meu pai, que se eu tivesse tido um pouco mais de perspic�cia teria percebido quem � o L�o realmente. Talvez n�o tivesse casado e hoje n�o estaria
vivendo essa afli��o nem fazendo voc�s sofrer com tanta preocupa��o.
Antonieta, abra�ando-a, disse:
- Minha filha, parece-me que j� conversamos sobre isso, mas percebo que voc� ainda agasalha em seu cora��o essa sensa��o de culpa, e isso n�o � bom.
- Sua m�e tem raz�o, C�ssia, as coisas �s vezes acontecem sem que possamos fazer nada para mudar nem impedir, e isso n�o quer dizer que somos os culpados. O sentimento
de culpa ou de auto-compaix�o pode ser eliminado se analisarmos friamente a situa��o que os provocou.
Intrigada, C�ssia disse a seu pai:
- Como assim, pai, o que o senhor quer dizer?
- Pense comigo, minha filha. Quando nos sentimos culpados por ter provocado alguma situa��o que afetou seriamente nosso semelhante, o melhor a fazer � procurar o
alvo atingido e se desculpar, colocando-se � disposi��o para ajudar de alguma forma a anular a situa��o constrangedora que criamos. Isso se comprovadamente fomos
n�s que a criamos. Voc� n�o criou nenhuma situa��o em rela��o ao L�o, ao seu casamento, � separa��o de voc�s. Portanto, n�o vejo onde possa estar sua culpa. Voc�
n�o pode se culpar pelos atos levianos e imprudentes do seu marido. Entretanto, pode, a partir do entendimento da realidade, eliminar a culpa do seu cora��o.
- O senhor falou em auto-compaix�o!
- Falei sim, minha filha.
- Pode falar sobre isso?
- Posso. N�s devemos sempre optar pela felicidade. Ela � subordinada ao que fazemos dela, ou seja, se quisermos ser felizes, � preciso superar a tend�ncia humana
de se sentir v�tima dos outros e da vida. A auto-compaix�o nos machuca com uma vis�o pessimista e desajustada da exist�ncia, nos impele a cultivar a m�goa, e ningu�m
consegue ser feliz com o cora��o cheio de rancor e melancolia.
Orlando percebeu que sua filha estava fragilizada. Usando todo o seu carinho paternal, lhe disse:
- Minha filha, a nossa for�a deve ser usada no momento certo, nas horas em que tudo parece se desmoronar � nossa frente; quando n�o conseguimos enxergar alternativas
que tamb�m nos fariam felizes. E essa for�a interna que nos situa na vida e nos faz caminhar para frente. Essa for�a nasce da f� e da confian�a no Criador; na certeza
de que Ele jamais abandona seus filhos e, se sofremos, algum motivo h� de existir em algum lugar do presente ou do passado. Cabe-nos prestar aten��o na hora de fazer
nossas escolhas, sejam elas quais forem.
Antonieta olhava para o marido com admira��o. Entendia agora por que era t�o feliz em seu casamento. Tinha a seu lado um grande homem, digno, s�bio e realmente em
paz com as leis divinas.
- Obrigada, pai, o senhor tem raz�o, j� est� na hora de crescer e enfrentar a vida com a coragem que o senhor falou.
- Gosto de ouvi-la falar assim, minha filha - disse Antonieta. Amanh� seu pai vai com voc� ao encontro com L�o.
C�ssia pensou um pouco e respondeu em seguida:
- N�o quero que se ofendam, mas prefiro ir sozinha. Se quero crescer e enfrentar meus problemas; que eu comece de uma vez. N�o sou mais crian�a, e papai me fez entender
isso. Como ele mesmo disse, realmente n�o tenho culpa alguma e n�o vou me prender �s l�grimas constantes nem � auto-compaix�o. Vou enfrentar o L�o com seriedade
e transpar�ncia, e n�o vou permitir que ele me domine.
Feliz em ouvir a filha, Orlando lhe disse:
- Muito bem, minha filha, concordo com tudo o que disse. Confio em voc�, na sua capacidade de discernimento e no seu car�ter. Ou�a tudo o que ele tem a dizer, depois
consultaremos nosso advogado e resolveremos da melhor forma poss�vel. S� tome o cuidado de n�o assinar nada que ele, porventura, venha a pedir. Eu disse absolutamente
nada.
- Pode confiar em mim, pai. O senhor me acordou e, a partir de agora, quero viver acordada para o mundo, vivendo cada dia com equil�brio e sem perder a esperan�a
no amanh�.
- Nossa, filha, estou gostando de ouvi-la falar assim.
- M�e, sinto-me como se um enorme peso fosse tirado de cima da minha cabe�a. J� estava cansada, mas n�o sabia como recome�ar. Obrigada, pai.
Antonieta e Orlando trocaram olhares de alegria, querendo dizer um ao outro que a partir daquele momento tudo seria diferente.
Naquela noite, C�ssia, ap�s tomar uma x�cara de ch� trazida amorosamente por Sabina, dormiu tranq�ilamente.
Seu esp�rito, liberto parcialmente pelo sono f�sico, afastou-se de seu corpo e logo foi atra�do para o enorme gramado que circundava a casa de seus pais. Olhava
� sua volta, sem compreender muito bem o porqu� de estar ali, quando viu se aproximar uma linda figura de mulher envolta em brilhante luz.
- Aproxime-se - disse Eneida sorrindo.
Meio atordoada, C�ssia atendeu ao pedido do esp�rito e ficou mais pr�xima.
- Quem � voc�? - perguntou.
- Meu nome � Eneida, sou seu esp�rito protetor, respons�vel por sua caminhada terrena.
- Eu a conhe�o?
- Nesta encarna��o, n�o, mas no pret�rito fomos muito pr�ximas uma da outra e nasceu entre n�s um afeto s�lido e sincero. Por ocasi�o do seu retorno ao plano f�sico,
solicitamos do Mais Alto a permiss�o para que eu a acompanhasse nesta nova experi�ncia, inspirando-a sempre para que n�o se desviasse do caminho do bem e do equil�brio,
o que foi permitido por Jesus.
C�ssia experimentou uma sensa��o de muita paz em seu esp�rito. Com humildade, dirigiu-se a Eneida:
- Agrade�o ao Criador por t�-la por perto, ser alvo da sua aten��o e do seu carinho.
- Voc� � um esp�rito bom, C�ssia, e sempre foi sens�vel �s minhas inspira��es. Por essa raz�o, nunca me afastei de voc�. Cumpro minha miss�o com alegria.
- Mas por que s� agora voc� se mostrou? Tenho sofrido tanto!
- Todos n�s sabemos do seu sofrimento, C�ssia. Na verdade, voc� foi informada do que iria acontecer nesta sua encarna��o e aceitou com valentia.
- Mas por que essas coisas fazem parte da minha hist�ria? Eu n�o consigo entender. Perdi o amor de L�o e, pior, por n�o ter sido capaz de lhe dar um filho. Sofro
muito por isso.
- C�ssia, devo lembr�-la de que ningu�m sofre injustamente. A vida segue seu curso, e nele vamos colocando as marcas de nossas sucessivas encarna��es. Mas nem sempre
marcamos nossos passos com atitudes sensatas e equilibradas. Acertamos muitas vezes e erramos outras tantas. Entretanto, Deus d� a todos os seus filhos condi��es
de aprender, perceber os enganos e poder recome�ar quantas vezes forem necess�rias. Essa � a grande alegria de todos n�s: poder sempre recome�ar, at� o momento em
que realizamos nossa tarefa com maestria.
- Voc� quer me dizer, ent�o, que estou certa em me culpar por tudo o que aconteceu?
- N�o! N�o carregue culpa nem se entregue � frustra��o. Neste encontro com L�o, voc� agiu com prud�ncia nas situa��es mais conflitantes. A tarefa prevista para voc�
nesta encarna��o est� sendo cumprida com equil�brio. Por enquanto n�o contraiu mais d�bitos. Ao contr�rio de L�o, que, infelizmente, est� caindo nos mesmos enganos
de outrora.
Sem entender direito o que Eneida falava, C�ssia perguntou:
- Por que disse "meu reencontro" com L�o?
- Porque voc�s j� viveram uma hist�ria juntos em algum momento do pret�rito, e essa deveria ser a reconcilia��o. Mas L�o se perde na mesma armadilha da ambi��o.
Continuando, Eneida completou:
- C�ssia, vim para alert�-la sobre o in�cio de muito sofrimento para voc�. N�o esmore�a, n�o se afaste de Jesus, acredite no Divino Amigo. Ter� a seu lado pessoas
que a amam e, n�o importa o que vier a acontecer, lute contra a melancolia e o desespero. Mantenha a esperan�a e a certeza de que nenhum sofrimento dura para sempre.
O importante � n�o se afogar em �guas rasas.
Triste, C�ssia pediu:
- Eneida, ajude-me, d�-me for�as, n�o quero me comprometer com as leis divinas.
- Tranq�ilize-se. Estarei sempre por perto. Voc� possui amigos espirituais que a ajudar�o.
- Se meu cora��o quiser me trair, acalme-o para que ele possa suportar o que est� por vir.
Eneida, colocando suas m�os sobre a cabe�a de C�ssia, emitiu raios de energia salutar. Despediu-se dizendo:
- Agora volte para seu corpo f�sico e que Jesus a aben�oe!
- Posso fazer uma �ltima pergunta?
- Fa�a!
- Vou me lembrar de tudo o que me disse?
- N�o, C�ssia, ter� a vaga lembran�a de um sonho bom, se sentir� mais leve, fortalecida e esperan�osa. E assim que agimos com os encarnados, dando-lhes condi��es
de descobrir em seu �ntimo a coragem e a f� dos que acreditam em Deus, superando a si mesmos, vencendo seus medos e se conscientizando de que tudo acontece para
a pr�pria evolu��o do ser.
Em segundos, o esp�rito de C�ssia retomou seu corpo f�sico, dando a seu rosto a fisionomia de tranq�ilidade.
Passados mais ou menos trinta minutos, Antonieta entrou em seu quarto e, abrindo as cortinas, acordou-a dizendo:
- Acorde, C�ssia, esqueceu que combinamos de sair agora bem cedo?
Espregui�ando-se gostosamente, C�ssia abriu os olhos e disse � sua m�e:
- Que noite gostosa, m�e, nunca dormi t�o bem.
Feliz, Antonieta respondeu:
- Que bom, filha, alegra-me v�-la assim t�o disposta.
- Disposta e faminta, dona Antonieta.
- Por isso n�o - disse Sabina, entrando com uma lauta bandeja de caf�. - Aqui est� seu desjejum, com tudo o que voc� gosta.
- Meu Deus, desse jeito vou virar uma baleia.
- Tudo bem - Sabina retrucou. - Mas que seja uma baleia feliz!
Em um canto do quarto, Eneida agradecia ao Pai pela b�n��o de poder auxiliar sua amiga querida. Assim que todas sa�ram, Eneida partiu em dire��o � Col�nia em que
residia a fim de cumprir suas tarefas.
Enquanto C�ssia experimentava a sensa��o de leveza e bem-estar, na casa de L�o tudo parecia estar de pernas para o ar. O casal n�o se entendia e cada um parecia
querer falar mais alto que o outro.
- N�o adianta reclamar, Selma, n�o vou lev�-la comigo. Esse � um assunto que diz respeito a mim e a C�ssia, voc� n�o tem que se meter.
- A� � que voc� se engana - rebatia Selma, tentando fazer valer sua inten��o de acompanhar L�o em seu encontro com a ex-mulher. - Tenho que me meter, sim; agora
voc� � meu marido e tudo o que diz respeito a voc� diz respeito a mim.
Tentando acalmar os �nimos, L�o respondeu:
- Selma, n�o fica bem voc� me acompanhar, pode parecer provoca��o e eu n�o quero me indispor com C�ssia. Ao contr�rio, quero parecer seu amigo para conseguir o que,
na verdade, eu quero: a venda da nossa casa sem a separa��o legal. - E, de maneira c�nica, complementou: - Vai me dizer que n�o gosta do conforto que o dinheiro
compra?
Selma pensou um instante e disse, concordando:
- Tudo bem, vendo por esse lado voc� tem raz�o. Desisto. Mas vou lhe dizendo que seu encontro com ela deve ser apenas de neg�cios, deu para entender?
Feliz por perceber uma ponta de ci�mes em Selma, L�o respondeu:
- Querida, � claro que nosso encontro ser� apenas para resolver a pend�ncia da nossa casa, pode ficar tranq�ila. Agora, n�o posso negar que fiquei orgulhoso em sentir
que voc� tem ci�mes de mim.
Selma pensou: "Como homem pode ser t�o bobo... engana-se facilmente, acredita em tudo o que uma mulher diz com voz melosa. � melhor ele pensar que sinto ci�mes mesmo,
assim fica mais tranq�ilo e eu fico mais � vontade para me encontrar com Armando".
Mostrando interesse e ansiosa para saber se ele dormiria por l�, Selma perguntou-lhe:
- Meu bem, voc� pretende dormir l� mesmo ou volta hoje?
Indeciso, L�o respondeu:
- Ainda n�o sei querida, o que voc� acha?
- Acho o que voc� achar, meu bem, s� n�o quero que viaje cansado. Tenho medo de que por qualquer motivo fique nervoso e ponha em risco sua vida. Fa�a o que for melhor
para voc�.
Selma disse isso, mas no seu �ntimo pensava: "Tomara que voc� fique por l�, L�o, assim poderei me encontrar com Armando sem pressa, ficando o tempo que quiser sem
pensar no adiantado da hora, enfim, me sentir livre".
L�o silenciou por alguns instantes e, por fim, disse a Selma:
- Ent�o est� bem, Selma, se voc� n�o se importa realmente que eu fique por l�, acho que � o melhor a fazer. Assim, se alguma coisa n�o sair como pretendo, ainda
terei outro dia para tentar de novo.
Escondendo a alegria que sentiu, Selma respondeu:
- Fique tranq�ilo, meu amor, ficarei bem, apenas com saudade, mas tenho certeza de que quando voltar vai me recompensar.
- Pode esperar que sim - respondeu L�o feliz.
Nenhum dos dois registrava a presen�a de entidades que se compraziam e incentivavam pensamentos menores de falsidade de um para o outro. A dissimula��o e o desejo
de obter vantagens em todas as situa��es, sem se importarem com as marcas de dor que pudessem deixar atr�s de si, ainda os levariam ao sofrimento e ao comprometimento
cada vez maior com as leis divinas.


Todos temem o 'castigo' de Deus, mas se esquecem que o castigo t�o temido somos n�s mesmos que o criamos quando nutrimos sentimentos menores e praticamos atitudes
levianas. Ao desprezar as leis de Deus, fatalmente sofreremos as conseq��ncias. � necess�rio refletir e operar mudan�as para que a evolu��o se fa�a.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


Cap�tulo 6
A trai��o de Selma


Animado, L�o se despediu da mulher e pegou a estrada rumo � cidade onde C�ssia morava com os pais. Pelo caminho ia pensando e fazendo planos para comover C�ssia,
acreditando que se fizesse uma chantagem emocional com a ex-mulher seria f�cil manipul�-la e conseguir seu intento.
"C�ssia sempre foi muito ing�nua. Com sua cren�a em vida ap�s a morte, acabava fazendo papel de boba perante as pessoas. Ainda bem que nunca me envolvi com isso,
para mim o que conta � o aqui e agora, depois de amanh� � sempre uma incerteza, principalmente se for no al�m, como ela acredita. Enquanto ela deixava de fazer as
coisas mais interessantes da vida porque n�o estavam em acordo com as leis divinas, como ela sempre dizia, eu fui aproveitando tudo o que a vida me oferecia."
L�o, com seus pensamentos levianos, atra�a sem perceber companhias espirituais que se afinavam com sua maneira de ser e pensar. A sua imprud�ncia mais e mais o levava
a compactuar com os desejos nocivos de seus acompanhantes.
O carro cortava velozmente a estrada acompanhando a ansiedade de L�o em chegar o quanto antes.
"S� espero que a tola da C�ssia n�o me apare�a com os velhos. Aquele seu Orlando � muito esperto, preciso ter muito cuidado para n�o p�r tudo a perder."
Chegando � pequena cidade que ficava a cinco horas de viagem da capital, L�o, com o intuito de se acalmar, entrou no primeiro restaurante que encontrou para almo�ar.
"Bem, agora � telefonar para C�ssia e marcar o lugar para nos encontrar."
E foi o que fez.
Ouvia com ansiedade o som do toque do telefone. Sua expectativa era enorme. N�o revelava nem para si mesmo, mas ainda sentia seu cora��o bater um pouco mais forte
sempre que ouvia a voz de C�ssia. N�o que a amasse ainda, mas a lembran�a daquela mulher linda, meiga e sempre cordata com que convivera por cinco anos provocava-lhe
uma inquieta��o.
- Al�! - ouviu do outro lado.
- C�ssia?
- Sou eu, L�o.
- Pode falar, estou ouvindo.
- Como vai voc�, est� bem?
Educada, mas firme, C�ssia respondeu:
- Sem coment�rios desnecess�rios, por favor, diga logo o que quer.
- Bem, como havia combinado, estou aqui na cidade e gostaria de me encontrar com voc� para resolver nossas quest�es. J� estamos separados h� algum tempo e acho que
est� na hora de conversar.
C�ssia se limitava a responder de maneira objetiva.
- Diga onde est� e irei me encontrar com voc�.
L�o, sentindo-se aliviado e acreditando que tudo sairia conforme planejado, respondeu com uma alegria que C�ssia estava longe de sentir:
- Estou sentado na sorveteria aqui da pra�a, aquela onde tom�vamos sorvetes sempre que est�vamos aqui na casa de seus pais, lembra?
- Em quinze minutos estarei a�.
Antes de ouvir qualquer coment�rio de L�o, C�ssia desligou o telefone.
- Era o L�o? - perguntou Orlando.
- Sim, pai, vamos nos encontrar na sorveteria.
Orlando, cauteloso, segurou as m�os de sua filha e lhe disse:
- C�ssia, n�o se esque�a do que lhe falei, n�o assine absolutamente nada que porventura ele venha a lhe pedir, sob nenhum pretexto. Lembre-se do que nos orientou
o doutor Nicolas. Repito, n�o assine nada.
- Pode ficar tranq�ilo, pai. N�o sou mais aquela mo�a boba, medrosa e insegura que se escondia na culpa que julgava ter. N�o me pergunte por que, n�o saberia responder,
mas sinto em mim uma for�a que nunca julguei possuir; coragem para lutar por mim mesma, com dignidade, justi�a e dentro dos padr�es morais crist�os, sem querer passar
por cima de ningu�m, mas defendendo o que me pertence por direito. Pode ficar calmo, confie em mim porque n�o vou decepcion�-lo.
Entre feliz e surpreso com a postura de sua filha, Orlando lhe disse:
- Filha, nunca a ouvi falando desse jeito. A quem devemos agradecer por essa mudan�a?
- N�o sei pai, nem eu mesma sei. O fato � que sinto dentro de mim muita paz e esperan�a de que tudo vai dar certo.
- Que bom, minha filha - disse Antonieta, antes mesmo que Orlando respondesse. - V�-la t�o animada enche meu cora��o de felicidade.
- � mesmo, minha menina - foi � vez de Sabina se expressar. - Seus olhos se iluminaram novamente e todos n�s estamos felizes.
Orlando abra�ou a filha, dizendo:
- V� com Deus, minha filha. N�o perca essa for�a, porque � nosso Pai quem a est� aben�oando.
Ap�s beijar aquelas tr�s pessoas que tanto amava, C�ssia foi se encontrar com L�o. Levava o cora��o em paz na certeza de que n�o caminhava sozinha.


***

Assim que a viu, L�o se levantou e fez men��o de beijar-lhe o rosto. Instintivamente, C�ssia desviou, oferecendo a m�o para cumpriment�-lo.
Sem jeito, L�o a convidou para se sentar, oferecendo-lhe uma cadeira, a qual C�ssia aceitou.
- Como voc� est� bonita, C�ssia! Parece que o tempo sempre a favorece, pois cada vez sua beleza fica mais not�ria.
Delicadamente, C�ssia respondeu:
- Por favor, L�o, n�o viemos aqui para falar da minha beleza. Gostaria que fosse direto ao assunto.
- Calma, C�ssia, voc� est� muito tensa. Relaxe, afinal n�o somos inimigos.
- Mas tamb�m n�o somos amigos, L�o, e gostaria de conversar com voc� apenas o que interessa realmente.
- Aceita um sorvete?
- N�o, obrigada, parece que voc� n�o entendeu. N�o quero nada a n�o ser acabar logo com esse encontro sem prop�sito.
- Como sem prop�sito, C�ssia? Vamos tentar resolver nossa vida e voc� fala que � sem prop�sito?
- L�o, voc� sabe tanto quanto eu que poder�amos resolver tudo com nossos advogados. N�o entendi sua insist�ncia em vir at� aqui.
Imprimindo � sua fisionomia uma express�o amargurada, L�o respondeu:
- Insisti porque precisava v�-la, sei que a �nica pessoa que me compreende � voc�, C�ssia.
- Compreender o que, L�o? O que voc� fez comigo durante todos esses anos? Se for isso, n�o se preocupe, porque j� compreendi. E lhe digo mais, n�o vou ficar presa
a essas lembran�as que n�o trazem nada de bom para a minha vida, pois, a bem da verdade, ser� muito diferente daqui para frente.
Surpreso com a resposta de C�ssia, L�o argumentou:
- Voc� me surpreende C�ssia! Onde est� aquela pessoa meiga com a qual convivi por cinco anos?
- Aquela pessoa meiga, como voc� diz, deu lugar a essa pessoa l�cida, segura e certa do que quer para sua vida.
Irritado e temendo n�o conseguir o seu intento, L�o mudou a maneira de se comportar.
- Muito bem, C�ssia, vou direto ao ponto.
- � o que gostaria.
- Estou precisando muito de dinheiro. A minha vida est� complicada, tudo est� muito dif�cil, enfim...
- Enfim, o que eu tenho a ver com sua vida agora, L�o?
- Calma, C�ssia, voc� est� muito na defensiva.
- Tudo bem, desculpe-me, pode continuar.
- Como ia dizendo - retomou L�o -, estou passando por uma fase complicada e gostaria de resolver a venda da nossa casa para que eu possa endireitar minha vida.
- Sua vida ou a vida da mulher que mora com voc�?
Cada vez mais surpreso com a rea��o da ex-mulher, L�o lhe disse nervoso:
- De onde voc� tirou essa id�ia, C�ssia? Moro sozinho.
- L�o, esqueceu do que voc� mesmo me disse ao telefone, que ama outra pessoa? Eu j� lhe disse que a C�ssia que voc� conhecia n�o existe mais, pode abrir o jogo.
Estou apenas supondo porque conhe�o voc� muito bem.
- Voc� est� enganada! - exclamou.
- Tudo bem, L�o, vamos dizer que sim, mesmo porque isso n�o vem ao caso. N�o tenho nada a ver com sua vida. Vamos falar sobre o que na verdade interessa.
- O que me interessa eu j� lhe disse.
Retirou da pasta uma folha em branco, entregou � C�ssia e lhe disse:
- Quero que assine aqui, � apenas para eu poder dar in�cio � venda da casa. Como voc� mora distante, eu mesmo cuidarei de tudo. Pode ficar tranq�ila que a manterei
informada de todos os passos.
C�ssia sorriu e respondeu:
- Voc� pensa mesmo que vou assinar uma folha em branco e entregar para voc�, L�o? N�o subestime minha intelig�ncia.
- O que voc� est� pensando, C�ssia, est� duvidando de mim? Pensa que faria alguma coisa para prejudic�-la?
- N�o s� penso como tenho certeza, L�o! N�o vou assinar folha alguma, documento nenhum. S� farei isso na presen�a do meu advogado.
Pela firmeza com a qual C�ssia falou, L�o sentiu que n�o adiantaria insistir. C�ssia estava bem consciente do que expunha. E pensou: "Preciso mudar de t�tica".
- C�ssia, at� agora tentei ser gentil e conversar numa boa, mas voc� me obriga a mudar minha postura, ent�o vamos l�. Eu quero minha parte da casa e n�o me importo
com o que voc� pensa, e quero agora, para ontem, como se diz por a�. Portanto, vamos tratar disso agora, porque, caso voc� n�o saiba, tenho o mesmo direito que voc�.
C�ssia sorriu.
- Agora sim! - disse. - Agora voc� se revelou como realmente �.
- Que bom que me conhece! Sabe que n�o brinco quando quero algo. Quero e preciso de dinheiro para dar o que h� de melhor para a pessoa que amo e que vive comigo,
como voc� mesma disse.
Sem que esperasse, C�ssia sentiu um mal-estar com a confirma��o de L�o de que realmente vivia com outra pessoa.
- Voc� sempre esteve com ela, mesmo quando �ramos casados, n�o � verdade, L�o?
Sabendo que n�o havia mais nada a perder, L�o admitiu:
- Sim, C�ssia, sempre estive com ela. � a mulher que realmente amo.
- N�o vou lhe perguntar por que agiu assim comigo, L�o, a resposta est� muito clara, voc� � ambicioso e mau-car�ter. Pena que n�o percebi h� mais tempo.
- J� que n�o percebeu, agora n�o adianta lamentar. O que tem a fazer, se n�o quiser se arrepender � concordar comigo e providenciar rapidamente o que eu quero.
- L�o, meu pai j� est� bem instru�do por nosso advogado e vamos fazer a partilha da casa somente com a separa��o legal, e � o que vai acontecer, voc� querendo ou
n�o.
A face de L�o se ruborizou de raiva.
- Eu sabia que aquele velho estava por tr�s dessa sua valentia toda. Diga a ele que n�o vou assinar separa��o nenhuma, C�ssia, sou herdeiro de seus pais. Esqueceu
que casamos com comunh�o universal de bens?
- E voc� est� se esquecendo de que existe a separa��o litigiosa? Ora, L�o, voc� n�o est� tratando com pessoas ignorantes, nosso advogado � um dos melhores e meu
pai, apesar de n�o ser advogado, conhece um pouco de leis e sempre posicionou sua vida de acordo com elas.
A irrita��o de L�o chegou ao limite.
Dando � pr�pria voz um tom amea�ador, disse:
- � melhor n�o brincar comigo, C�ssia, pois n�o sou de brincadeira. Luto pelo que quero sem me importar com as conseq��ncias, sejam elas quais forem.
- E nem com as pessoas que atropela, n�o � mesmo, L�o?
- � isso mesmo, C�ssia, portanto � melhor n�o brincar comigo e aceitar minhas condi��es, porque eu piso em quem estiver na minha frente, como se fosse um inseto
no ch�o.
C�ssia sentiu uma raiva muito grande invadir seu cora��o, e, antes que reagisse � amea�a de L�o, Eneida aproximou-se e a inspirou para que se aquietasse e n�o entrasse
no jogo leviano de L�o.
- Cuidado, C�ssia, nunca tome nenhuma atitude movida pela raiva que cega e sempre impede de ver as coisas como s�o na realidade. Deixe a raiva passar para que possa
agir com prud�ncia. Confie em seu pai, que tudo far� para defend�-la com justi�a.
C�ssia silenciou e L�o, na sua prepot�ncia, interpretou seu sil�ncio como medo que sentia de enfrent�-lo. Arrogante, continuou:
- Agora que tudo ficou bem esclarecido, pegue a caneta e assine este documento, ou melhor, esta folha em branco.
Estendeu a caneta para C�ssia que, movida pelo amparo que recebia de Eneida, levantou-se.
- Onde pensa que vai? Sente-se e fa�a o que estou mandando.
C�ssia olhou-o firmemente e respondeu:
- A partir de agora s� nos falamos por interm�dio do doutor Nicolas, e tenha certeza de que n�o ser� do seu jeito, mas conforme a lei e a justi�a. - Antes que L�o
pudesse dizer qualquer coisa, completou: - Passe muito bem!
Afastando-se com passos firmes, C�ssia ainda p�de ouvir a amea�a de L�o.
- Foi voc� quem pediu, pode aguardar que o que � seu est� guardado.
- Meu Pai, proteja-me da ira do L�o. Confio em Ti e nos bons esp�ritos que, por vossa permiss�o, inspiram-me, mostrando o caminho a seguir. N�o me deixe fraquejar
nem perder a f�.
L�o, vendo-a se afastar sem olhar para tr�s, pensou: "Sua tola, n�o sabe com quem est� lidando".
Lembrou-se de Selma e pensou: "E agora, o que vou dizer para Selma? Ela n�o vai gostar nem um pouco e vai pensar que foi incompet�ncia minha. Preciso pensar com
calma no que vou fazer. A C�ssia me paga, vou passar feito um trator em cima dela e daquele velho insuport�vel".
Pediu � gar�onete um doce e, enquanto saboreava, pensava: "E melhor ficar aqui e ver o que acontece. Se C�ssia n�o mudar de opini�o, telefono para o velho e o amea�o".
Pensando ter tomado a medida certa, continuou tranq�ilamente a saborear o doce bem preparado.

***

- Ent�o, filha, como foi seu encontro? - perguntou Orlando, assim que viu a filha entrar.
N�o suportando mais a tens�o, C�ssia abra�ou o pai e chorou copiosamente.
Espantado, Orlando indagou o motivo do choro.
- � verdade, filha, o que aconteceu para ficar assim t�o nervosa? - perguntou Antonieta.
- M�e, pai, o L�o � pior do que eu podia imaginar. E mau-car�ter e perigoso. Como pude conviver cinco anos com ele e n�o o conhecer! Eu sou uma tola!
- N�o, filha, voc� era uma mulher apaixonada, e a paix�o, na maioria das vezes, nos cega a ponto de n�o conseguirmos enxergar a realidade que est� � nossa frente.
Mas conte-nos o que aconteceu que a deixou desse jeito.
- Pai, ele me apresentou uma folha em branco e queria que eu assinasse, dizendo que era para dar entrada na venda da nossa casa. Tentou me intimidar, mas eu encontrei
for�a e o enfrentei.
- Pelo amor de Deus, filha, voc� n�o assinou nada, conforme eu lhe pedi, certo?
- Calma, pai, n�o assinei nada e j� disse que o enfrentei. Ele me amea�ou dizendo que eu iria me arrepender.
- Que canalha!
- E tem ainda uma novidade.
- Qual?
- Sabina estava certa quando desconfiava de que ele tinha uma amante.
Espantada, Antonieta perguntou:
- E tem?
- N�o s� tem como mora com ela. Disse-me que j� estavam juntos desde o tempo em que �ramos casados.
- Filha, realmente esse rapaz n�o possui moral alguma! - exclamou novamente Antonieta.
- Ele nem sabe o que � moral, m�e.
- Mas, afinal, qual � a inten��o dele? - perguntou Orlando.
- Ele quer vender a nossa casa, mas n�o quer se separar para n�o perder a heran�a de voc�s, o que aconteceria se houvesse a separa��o legal.
- Mas ele � um canalha!
- N�o tenha d�vidas disso, pai, ele � um canalha - concordou C�ssia.
- Precisamos nos encontrar com o doutor Nicolas. Vou marcar um encontro para amanh�.
- Fa�a o que o senhor achar melhor.
Demonstrando cansa�o, C�ssia pediu licen�a e se retirou para seu quarto, dizendo precisar tomar um banho.
Com displic�ncia, jogou-se na cama dando vaz�o ao cansa�o emocional que sentia.
"Meu Deus, por que as pessoas s�o t�o diferentes do que aparentam? Por que n�o respeitam os sentimentos dos outros e focam suas aten��es somente em seus desejos
nem sempre louv�veis? Como pude me enganar a esse ponto com L�o? Convivemos durante cinco anos, dormimos na mesma cama, reparti com ele meus sonhos, meu desejo de
felicidade e minha ang�stia por n�o conseguir ser m�e, dar-lhe um filho para levar seu nome; entretanto, nada disso tinha a menor import�ncia para ele, que me tra�a
sem nenhum pudor. Carinhos falsos, abra�os sem nenhum afeto, beijos que satisfaziam somente desejos carnais e eu, tola, acreditava e tentava compreender seus ataques
de viol�ncia e agress�es, aos quais me submetia.


As guerras nascem nas mentes doentias, orgulhosas, ego�stas e sedentas de poder. A fome de adquirir, de conquistar a qualquer pre�o, faz o homem perder a raz�o e
o equil�brio. Deve-se propagar ao mundo que, enquanto a guerra mata, o amor transforma o homem.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


O cora��o sofrido de C�ssia permitiu que sentidas l�grimas descessem pelo seu rosto contra�do de dor - e, abatida, adormeceu.
Eneida, orando ao Pai, emitiu energia salutar acalmando aquele cora��o que ainda teria muito de sofrer.

***

Enquanto C�ssia se refazia com o sono reparador, L�o perdia-se na raiva que sentia. Seus pensamentos se confundiam em sua pr�pria insanidade.
"Tenho de usar uma estrat�gia para intimidar aquele velho idiota, pois � ele quem est� por tr�s da valentia de C�ssia. Se assim n�o fosse, ela jamais teria coragem
de me enfrentar." Dizia como se quisesse dar a si mesmo uma ordem: "N�o posso perder essa parada. Selma n�o vai entender nem aceitar, e eu n�o posso perd�-la. O
que vou fazer?"
Como acontece com todos aqueles que vivem distra�dos, entregues ao desamor, �s conquistas f�teis, sem se importar com os rastros de maldade e sofrimentos que deixam
atr�s de si, L�o atraiu companhias que, como ele, se entregava ao prazer de interferir na vida dos encarnados de maneira leviana, violenta e com requinte de crueldade.
Os pensamentos iam povoando sua mente e tomando as formas mais agressivas. O que L�o n�o sabia � que todos n�s somos herdeiros de n�s mesmos, e que um dia iremos
nos deparar com os atos insanos e inconseq�entes que realizamos nos nossos momentos de total cegueira espiritual.
Quando Jesus orientou a humanidade ao dizer "Orai e vigiai", deixou clara a import�ncia do cuidado que se deve ter com os pensamentos que povoam nossa mente: vigiar
a n�s mesmos e procurar for�a na prece sincera. Mas os homens preferem se aliar aos pr�prios desejos de consumo, ambi��o e poder e se negam a prestar aten��o nas
orienta��es claras e s�bias que Jesus, no Seu infinito amor, nos deixou... Eles est�o surdos... Est�o cegos!

***

Orlando, Antonieta e Sabina conversavam a respeito do encontro de C�ssia com L�o.
- Revolta-me tanta insensatez de L�o - dizia Orlando. - Ser� que em nenhum momento sentiu afeto por C�ssia?
- Desculpe o que vou dizer senhor Orlando - comentou Sabina -, mas sempre fiquei muito atenta �s atitudes de L�o com C�ssia. Posso lhe dizer que a �nica que n�o
percebia o extremo ego�smo desse rapaz era a pr�pria C�ssia. Por mais que tentasse, de forma sutil, abrir-lhe os olhos, ela sempre encontrava desculpas para a maneira
como ele a tratava, sempre fingindo ci�mes e demonstrando um amor que, quem estava de fora, percebia claramente ser falso.
- Ele a agredia fisicamente, Sabina? - perguntou Antonieta. A senhora j� sabe que algumas vezes, sim, mas as agress�es piores eram as verbais.
- Como assim?
- Humilhava-a por conta da sua impossibilidade de engravidar, coisa que sempre coloquei em d�vida.
Antonieta, lembrando-se do fato, disse ansiosa:
- � mesmo, precisamos marcar o exame para tirar essa hist�ria a limpo.
- Fa�a isso, Antonieta - falou Orlando. - � melhor resolver essa quest�o de uma vez por todas.

***

L�o, desistindo de se comunicar com Orlando, achou melhor retornar. Sabia que enfrentaria a ira de Selma e tentava inventar uma desculpa para nada ter dado certo
entre ele e C�ssia.
"Talvez a minha volta antecipada possa deix�-la mais calma, afinal, n�o precisar� dormir sozinha. Sei que ela nunca gostou de ficar s�. Provavelmente, irei encontr�-la
dormindo devido ao adiantado da hora, mas usarei isso a meu favor. Vou acord�-la com beijos, � disso que ela gosta."
Esses pensamentos o acalmaram e ele continuou a viagem com tranq�ilidade.


Como � poss�vel ter tranq�ilidade quando deixamos rastros de dor por onde passamos? A tranq�ilidade � uma sensa��o de dever cumprido, de amor exercitado, de consci�ncia
de que ningu�m � dono do mundo e muito menos o centro do Universo. Necess�rio se faz combater a ira, dominar os impulsos e se esfor�ar para estar acima de si mesmo,
vencer as paix�es inferiores e tentar corrigir com sabedoria e prud�ncia as imperfei��es que podem levar � perdi��o da alma.


�s 23 horas, L�o entrava em seu apartamento. Notando a escurid�o, imaginou que Selma estivesse dormindo. Tentando n�o fazer barulho, L�o caminhou lentamente at�
chegar ao seu quarto.
Querendo acord�-la com beijos, como imaginara, sentou � beira da cama e procurou o rosto de sua mulher para realizar o que planejara. N�o o encontrando, tateou toda
a cama e, sentindo-a vazia, acendeu a luz com o cora��o pulsando acelerado. Realmente n�o havia ningu�m ali. A surpresa deu lugar � desconfian�a.
Perguntava-se: "Onde ser� que Selma est�? A essa hora da noite n�o pode estar em nenhuma loja ou coisa parecida. Vou esper�-la, desta vez a explica��o ter� de ser
bem convincente".
Tomou banho e se preparou para comer alguma coisa. Ap�s o lanche, sentindo-se cansado, deitou no sof� da sala e fechou os olhos. Em poucos minutos dormia profundamente.
O primeiro raio de sol entrando pela vidra�a acordou L�o, que se levantou assustado.
"Por que ser� que Selma n�o me acordou, deixou que eu passasse a noite mal acomodado? Vou acord�-la sem me importar se � cedo ou n�o."
Levantou-se e, a passos r�pidos, foi para o quarto.
N�o conseguiu esconder o espanto e a raiva ao perceber que a cama estava arrumada, dando testemunho de que Selma n�o voltara para casa. Completamente irritado, L�o
n�o sabia que atitude deveria tomar - sair � procura dela ou esperar que chegasse e inventasse mais uma de suas mentiras?
Andando de um lado para outro, alimentava as mais diferentes hip�teses, enquanto uma raiva avassaladora tomava conta de todo o teu ser.
Mais uma vez tornava-se presa f�cil de mentes doentias e cru�is.
- Hoje eu acabo com ela - dizia sem parar.
Lembrando-se de como Selma e ele foram felizes enquanto era casado com C�ssia, comparou a antiga situa��o com a atual, na qual pressentia que Selma o estava enganando
e que, na realidade, estava a fim do dinheiro que podia receber.
"Parece que a vida est� cobrando minha conduta em rela��o � C�ssia. Hoje sofro a mesma incerteza com a mulher que amo. Mas dessa vez a explica��o ter� de ser muito
convincente para que eu a aceite."
Enquanto em sua afli��o L�o aguardava a chegada de Selma, ela e Armando, entregues � paix�o que os dominava, nem se davam conta da hora.
- Amor - disse Selma -, preciso ir. N�o sei a que horas L�o vai chegar e preciso estar em casa.
Novamente a envolvendo em seus bra�os, Armando argumentava:
- Fique mais um pouco, n�o sabemos quando poderemos ficar novamente juntos durante tanto tempo...
- Voc� tem raz�o, a viagem de L�o foi providencial. Sempre sonhei em passar uma noite inteira com voc�. Sabia que um dia isso iria acontecer, e foi mais cedo do
que eu esperava.
- Tomara que ele arranje outra viagem - falou Armando, dando risada.
-Como ser� que foi o encontro dele com C�ssia? Tomara que tudo tenha dado certo, n�o ag�ento mais essa vida dupla, dissimulada. Quero mostrar para todo mundo que
voc� � o homem que eu amo e com quem quero passar toda a minha vida.
- Calma, meu amor, isso vai acontecer mais cedo do que esperamos. Vamos ser felizes juntos e, o melhor, com dinheiro.
- � o que espero e sonho - disse Selma abra�ando-o, beijando-o com paix�o e se afastando com o intuito de ir embora.
Diante da insist�ncia de Armando para que ficasse at� a tarde, Selma argumentou:
- Voc� n�o quer p�r tudo a perder, quer? Sabe que gostaria de ficar, mas preciso ir. L�o pode chegar a qualquer momento e vai ser dif�cil explicar minha aus�ncia.
- Voc� tem raz�o - concordou Armando.
Beijaram-se novamente e Selma tomou a dire��o de sua casa. Ia feliz e realizada por haver passado a noite em companhia de seu amor.
"Vou levar algumas guloseimas para L�o, assim fa�o um agrado e demonstro ter sentido muito a sua falta." Foi o que fez.
Qual n�o foi a sua surpresa ao abrir a porta de seu apartamento e deparar com L�o sentado � sua frente.
- Querido! - exclamou correndo para abra��-lo.
Empurrando-a, L�o disse secamente:
- Posso saber onde voc� esteve?
Com todo o cinismo, Selma respondeu:
- Meu amor, n�o imaginei que fosse chegar t�o cedo! Como n�o conseguia dormir, voc� sabe que n�o gosto de dormir sozinha, levantei logo de manh� e fui comprar essas
guloseimas para voc�. Veja, trouxe tudo o que voc� gosta. Isso � para voc� ver como sinto a sua falta.
Movido pela raiva e pela desilus�o, L�o agressivamente respondeu:
- Sua mentirosa! Voc� n�o saiu hoje cedo, voc� n�o dormiu em casa.
- O que voc� est� dizendo, L�o - Selma fingiu indigna��o. - Voc� est� me ofendendo. Por que desconfia de mim?
- Porque voc� n�o dormiu em casa!
- De onde voc� tirou essa id�ia?
- N�o � uma id�ia, Selma, � uma certeza. Eu sei por que vi.
Com voz tr�mula, Selma falou:
- Voc� viu o que, L�o, pode me explicar?
- Posso sim, Selma.
- Eu n�o cheguei hoje.
- N�o?
- N�o. Cheguei ontem � noite e voc� n�o estava em casa. Esperei at� tarde e acabei pegando no sono. Hoje acordei com o primeiro raio de sol e estranhei voc� n�o
ter me acordado. Fui at� nosso quarto e a cama estava absolutamente arrumada. Isso � prova mais do que suficiente de que voc� n�o dormiu em casa.
Selma pensou r�pido e disse:
- Meu amor, calma, vou lhe explicar por que n�o dormi em casa e tenho certeza de que n�o s� ir� entender como ficar� feliz com o motivo.
L�o pensou: "Que mentira ela vai inventar desta vez..."
Virou-se para Selma e lhe disse:
- Pode explicar, estou ouvindo.
- Amor, n�o era dessa maneira que imaginei dar essa not�cia a voc�, mas vejo que n�o tenho alternativa.
Cada vez mais irritado e nervoso, L�o falou alto:
- Fale de uma vez, Selma.
- L�o, ontem, depois que voc� saiu, fui buscar o resultado de um exame que fiz e, depois de tomar conhecimento da resposta, fiquei t�o feliz que n�o consegui ficar
sozinha aqui em casa, precisava falar com algu�m, repartir minha alegria. Enfim, era muito bom para ficar s� comigo, e decidi, ent�o, ir � casa da Martinha, aquela
minha amiga que voc� conhece. Ficamos conversando at� tarde e, diante da insist�ncia dela, resolvi dormir em sua casa.
- Posso saber que not�cia � essa t�o maravilhosa que a levou a dormir fora de casa?
- Claro, meu amor.
Selma se aproximou dele, beijou-lhe a boca e disse:
- Estou gr�vida!
L�o quase caiu para tr�s ao ouvir a revela��o. Meio tonto pediu:
- Por favor, diga outra vez com todas as letras.
Satisfeita por achar que mais uma vez havia enganado o companheiro, Selma repetiu:
- Eu disse que estou gr�vida.
Sem que ela entendesse, L�o, com viol�ncia, deu um forte tapa em seu rosto. Selma se desequilibrou e caiu sentada na poltrona que estava �s suas costas. Quase sem
voz, conseguiu dizer:
- L�o, o que � isso?
Agressivo, L�o novamente esbofeteou seu rosto. Selma, com as m�os cobrindo o rosto vermelho e inchado por conta da agress�o de L�o, disse gritando:
- Pare L�o, pelo amor de Deus, voc� ficou louco?
- N�o, Selma, n�o fiquei louco, apenas estou indignado, enraivecido com sua trai��o da qual, ali�s, eu j� desconfiava.
- Que trai��o, do que voc� est� falando? Venho te dar uma not�cia maravilhosa e voc� me trata desse jeito completamente agressivo. S� posso concluir que voc� est�
louco!
Mais irritado ainda com o cinismo de Selma, L�o gritou:
- Pare com essa farsa, Selma, antes que eu mate voc�!
Selma sentiu que n�o adiantava mais negar. Ela errara em dormir com Armando e colocara tudo a perder. Tentando mais uma vez acalm�-lo, disse a L�o:
- Meu amor, desculpe-me. Eu errei em dormir na casa da Martinha, mas n�o tinha com quem falar ou dividir a alegria de estar gr�vida de voc�.
Ao ouvir novamente a palavra gr�vida, L�o n�o se conteve e mais uma vez esbofeteou o rosto de Selma.
Sem entender o porqu� de tanta agress�o pelo simples fato de estar gr�vida, ela perguntou aos prantos:
- Tudo isso � porque n�o quer um filho, L�o? Se for, eu fa�o o aborto, mas, por favor, pare de me agredir.
Um pouco mais calmo L�o respondeu:
- N�o, Selma, o que eu mais quis na vida, sempre, foi ter um filho.
- Meu Deus, por que ent�o tanta agress�o quando isso acontece?
- Porque essa not�cia � a confirma��o da sua trai��o.
- O que est� dizendo?
- Selma, eu sou irreversivelmente est�ril. N�o posso e nunca poderei engravidar uma mulher.
At�nita, Selma percebeu que foi v�tima de sua pr�pria armadilha.
- O que voc� est� me dizendo, L�o, repita, por favor.
- Repito, sim, se � o que voc� quer ouvir novamente. Eu sou est�ril e nunca vou viver a felicidade de ter um filho meu.
Com um fio de voz, Selma, acuada, disse ao marido:
- Mas voc� sempre afirmou que era C�ssia quem n�o podia engravidar, que ela jamais daria a voc� a alegria da paternidade. Por que mentiu?
- Porque a minha vaidade masculina me induziu a essa mentira. Al�m disso, se alguma mulher me tra�sse e quisesse aplicar o golpe da barriga, eu tinha como saber.
E, pelo visto, acertei. � exatamente isso o que voc� est� fazendo.
Sentindo que tudo estava perdido, Selma chorou copiosamente, tentando, com esse gesto, comover L�o. Entretanto, ele, impass�vel, ferido em seu orgulho e decepcionado
com a �nica mulher que amou de verdade, disse-lhe:
- Arrume suas coisas e deixe este apartamento hoje mesmo. N�o quero v�-la mais.
- L�o, para onde vou?
- Volte para o lugar onde morava.
- Voc� sabe que aquele apartamento n�o era meu, e n�o est� mais vago. Pe�o-lhe que me perdoe L�o.
- Pedido negado, Selma, jamais a perdoarei. Quanto ao lugar para onde vai, n�o � problema meu. V� para a casa do seu amante, ele n�o � o pai do seu filho? A n�o
ser que exista um terceiro - completou L�o, com apenas o intuito de ofend�-la.
- Voc� est� me ofendendo, L�o.
- Estou - confirmou. - A partir de agora sua vida � problema seu. - Virou as costas e, saindo, lhe disse: - Vou at� o escrit�rio e, quando voltar, n�o quero encontrar
nenhuma marca sua, nada que me lembre que um dia moramos juntos.
Batendo a porta, deixou Selma entregue a si mesma. Assim que L�o saiu, Selma, vendo que tudo estava perdido, levantou-se, lavou seu rosto e disse para si mesma:
"Foi melhor assim, n�o suportava mais essa vida dupla, agora finalmente posso viver com quem realmente amo". Pegou sua bolsa e foi procurar Armando.
- Voc� ficou louca, Selma? - disse Armando assim que soube da not�cia.
- Espera a�, Armando, a id�ia da gravidez foi sua. Disse que era o �nico jeito de ter o dinheiro do L�o para sempre. Eu n�o queria, foi voc� quem for�ou essa situa��o.
- Tudo bem, eu n�o podia imaginar que aquele calhorda era est�ril.
- E agora, o que vamos fazer? N�o tenho para onde ir.
Com o cinismo que acompanha sempre o mau-car�ter, Armando disse, sem nenhuma considera��o pelo sentimento de Selma:
- Eu n�o sei onde voc� vai ficar. Aqui pode apostar que n�o �. N�o vou assumir essa crian�a e nosso caso termina aqui e agora.
Selma n�o acreditava no que estava ouvindo. Sua cabe�a rodava e sentia faltar-lhe o ch�o.
- Armando, voc� est� se esquecendo das suas juras de amor, de tudo o que vivemos juntos, do plano que elaborou para conseguirmos o dinheiro do L�o? Plano que custei
a aceitar e s� o fiz por amor a voc�?
- Selma, juras o vento leva, elas s� valem quando v�m acompanhadas de um dote, entende?
- N�o, Armando, n�o entendo. O que sei � que fui o tempo todo sincera com voc�. Tra� o L�o, que me ama de verdade, e agora vejo que troquei uma posi��o certa por
uma aventura sem conseq��ncias, por algu�m que me usou o tempo todo, me enganou, que viu em mim uma possibilidade de se dar bem na vida.
- Selma, chega de lamenta��o e cai na real. Sim, eu usei voc�, mas voc� se deixou usar. E se deixou � porque tamb�m pensava como eu. Ningu�m usa ningu�m se esse
algu�m n�o permite, se � firme em suas convic��es. O que n�o � o seu caso.
Selma chorava sem parar. N�o acreditava no que estava acontecendo, depois de passar horas vivendo o que acreditava ser um grande amor.
Irritado, Armando lhe disse sem d�:
- Agora chega Selma, siga seu caminho, cuide bem do seu filho e nem tente me achar, porque amanh� mesmo estou indo embora sem nenhuma inten��o de voltar.


Tudo o que brilha nos atrai, e � para ele que quase sempre nos dirigimos. � preciso distinguir o brilho real do ilus�rio; as promessas eloq�entes, mas vazias, as
palavras e os sentimentos pobres de conte�do que jamais saem do cora��o, mas sim da falsidade, da gan�ncia e do ego�smo do pr�prio homem. Em todos os momentos, um
Grande Aliado nos acompanha. Muitas vezes n�o O ouvimos; nem sempre O entendemos, mas sempre O sentimos. Ele � chamado de Jesus... O Filho de Deus.


Selma n�o conseguia acreditar que estava vivendo situa��o t�o angustiante. Ainda tentou convencer Armando de que poderiam viver felizes juntos ao lado do filho,
vendo-o crescer, levando a vida longe de tudo que lembrasse os atos insanos e imprudentes que praticaram, mas Armando parecia irredut�vel.
- � poss�vel recome�ar, Armando, n�o jogue fora tudo o que vivemos de bom, nosso amor, os momentos felizes que vivemos juntos. Pare e pense um pouco, meu amor, n�o
� poss�vel que n�o sinta nada por mim.
Friamente Armando respondeu:
- Eu amo voc�, Selma, mas o meu amor est� ligado � posi��o social que poder�amos desfrutar. Ele n�o � forte o suficiente para suportar uma vida med�ocre ao seu lado.
N�o tenho maturidade para criar um filho, sou jovem ainda e preciso construir meu futuro antes de assumir essa responsabilidade.
- E voc� pensa que eu tenho for�a para criar sozinha um filho que tamb�m � seu? N�o pensa em mim, em como estou me sentindo por ter de arcar com as conseq��ncias
de atos que voc� planejou? Envolveu-me nesta situa��o usando o amor que sinto por voc� e agora que as coisas n�o sa�ram conforme o esperado se esquece das nossas
entregas apaixonadas e me lan�a na rua da amargura?
- Voc� acabar� me esquecendo, Selma, e encontrar� algu�m que a ame e assuma seu filho.
Selma olhou firmemente para Armando e n�o o reconheceu. Entre l�grimas, disse-lhe:
- Hoje voc� est� se mostrando como realmente �, frio, desumano e ego�sta. N�o vou implorar por nada, vou assumir minha vida com meu filho. Mas uma certeza voc� pode
ter - disse com voz firme e segura -, jamais permitirei que se aproxime do seu filho. Essa dor voc� viver� um dia.
Levantou-se e, sem dizer mais uma palavra, saiu para sempre da vida de Armando.
Caminhando a passos lentos pelas ruas, Selma pensava: "O que vou fazer agora? Estou sem emprego, sem ter para onde ir e sem saber o que fazer".
Um pensamento veio a galope em sua mente: "Dizem que a vida nos cobra por todos os nossos atos, e creio que deva ser verdade. O que fiz com C�ssia recebo agora.
O sofrimento e a dor que a fiz sofrer machuca agora meu cora��o t�o fortemente que posso entender o que ela sentiu quando roubei seu marido".
"Como pude acreditar t�o cegamente em Armando? Agora sei o quanto � falso e interesseiro. Por causa dele desprezei o amor de L�o, e hoje sou a desprezada. Tenho
apenas uma alternativa: voltar para minha terra natal e morar com minha m�e, que n�o visito h� seis anos. Vou at� a casa de L�o arrumar minhas coisas. Espero que
ele n�o tenha voltado do escrit�rio, assim fa�o tudo com calma e sem constrangimento."
Foi at� a rodovi�ria comprar a passagem para embarcar no mesmo dia. Segurando em suas m�os o bilhete que a levaria de volta � sua cidade natal, pensou: "Como a vida
d� voltas, retorno para a casa de minha m�e para viver a vida que desprezei anos atr�s. Como fui tola! Agora sofro as conseq��ncias por ter sido t�o inconseq�ente.
Volto humilhada, gr�vida, sem emprego e sem saber como minha m�e vai me receber".
Ao abrir a porta do apartamento, deparou com L�o sentado, tendo � sua frente copo e garrafas vazias de bebida. Pela apar�ncia desleixada, Selma logo percebeu que
ele voltara do escrit�rio assim que ela sa�ra e se entregara ao desespero. Tentou ainda, mais uma vez, uma reaproxima��o com ele.
- L�o - disse suavemente -, vamos conversar. Ainda podemos retomar nossa vida. O que aconteceu foi uma bobagem minha e estou profundamente arrependida.
- Uma bobagem que gerou um filho. Deixe de ser c�nica, Selma! - exclamou L�o.
Sentindo-se acuada, Selma respondeu:
- Voc� tem toda a raz�o de estar magoado comigo, mas eu pe�o que me perdoe. N�o sei onde estava com a cabe�a. Foi apenas um momento, nada importante, ele n�o significa
nada para mim. E de voc� que gosto, voc� sabe disso.
Irritado, L�o respondeu agressivo:
- Pare de mentir, Selma, n�o sou bobo. Eu j� estava desconfiado da sua trai��o. N�o foi somente um momento, mas uma rela��o que j� dura muito tempo.
- Perdoe-me - ainda tentou Selma.
- N�o vou perdo�-la nunca, Selma. Agora voc� vai sentir toda a dor de ser desprezada, porque tenho certeza de que seu amante n�o a quis. Tanto voc� quanto eu estamos
pagando na mesma moeda o que fizemos C�ssia sofrer. Agora desapare�a da minha vida e seja muito infeliz. E o que desejo a voc�.
- Posso pegar minhas coisas?
- Somente suas coisas pessoais, nada mais.
Selma tentou dizer a L�o para onde ia, mas ele n�o deixou que terminasse a frase, dizendo:
- Selma, poupe-me dos detalhes da sua vida daqui para frente. N�o me interessa o lugar para onde vai, com quem vai e muito menos como vai viver. A responsabilidade
de sua vida � somente sua. Quando voc� sair por aquela porta, vou consider�-la morta. Voc� escolheu seu destino. O �nico motivo de voc� ter ficado comigo foi conquistar
uma vida de riqueza. N�o a culpo, porque tamb�m sonho com isso. Mas voc� n�o quis esperar, traiu-me e isso n�o desculpo nem esquecerei. - Silenciou por uns instantes
e prosseguiu: - Foi melhor assim. Tudo o que conquistar daqui para frente ser� s� meu. Agora saia, por favor, n�o suporto olhar para voc�, meu amor se transformou
em �dio.
Selma, que at� ent�o tentara reverter � situa��o para continuar com L�o, percebeu que nada mais conseguiria com ele e deixou cair sua m�scara:
- Muito me admira voc�, L�o, estar t�o magoado. Justo voc� que fez muito pior com C�ssia, humilhou-a, agrediu-a f�sica e moralmente sem nenhum sentimento de culpa.
E o que � pior, agora eu sei, culpou-a pelo fato de n�o terem filhos. Voc� � mais cafajeste do que eu. Tra� voc�, sim, mas o fiz por amor a outro homem. N�o o agredi,
n�o o humilhei e muito menos o feri enquanto estivemos juntos.
Completamente fora de si, L�o respondeu:
- Isso n�o a faz melhor do que eu, Selma. Voc� me usou para ganhar dinheiro. Eu a desprezo e n�o quero v�-la nunca mais na minha frente. Para ser sincero, quero
que morra voc� e esse seu filho.
Selma empalideceu. Nervosa, com medo, arrumou as poucas roupas e, sem se despedir, foi embora.
Ao v�-la partir, L�o sentiu a dor de ser desprezado.
"Eu a amo, meu Deus, por que tudo isso tinha de acontecer? O que ser� da minha vida agora, s�, sem a Selma, sem a C�ssia?"
Ap�s pensar um pouco, chegou � pior das conclus�es: "Vou atormentar C�ssia e tirar dela a maior quantia poss�vel, n�o importa a que pre�o, pelo menos financeiramente
me sairei bem".
L�o n�o podia ver nem sentir as companhias espirituais que colavam nele, instigando pensamentos de viol�ncia que o levariam � decad�ncia moral.


Devemos nos esfor�ar para estar acima de n�s mesmos, vencendo nossas paix�es inferiores e corrigindo com sabedoria os defeitos que poder�o nos levar � perdi��o de
nossa alma.


Sentindo-se cansado, L�o tomou um banho e, enquanto se preparava para jantar, pensava: "Vou ligar para o pai de C�ssia e amea��-lo. Tenho certeza de que est� por
tr�s da valentia dela. Agora nada mais me importa, vou entrar nessa briga para ganhar".
Tomada a decis�o e completamente fora de si, em virtude dos �ltimos acontecimentos, L�o, de maneira imprudente, pegou o telefone e discou para a casa dos pais de
C�ssia. Ao ouvir a voz do sogro, L�o, sem se intimidar, foi logo dizendo sem sequer disfar�ar o tom agressivo de sua voz:
- Senhor Orlando, sou eu, o L�o. Preciso muito falar com o senhor.
Sem nenhum entusiasmo e muito a contragosto, Orlando respondeu:
- O que deseja? Que eu saiba n�o temos nenhum assunto a tratar.
- O senhor se engana, temos muitos assuntos a tratar. E acho bom o senhor prestar muita aten��o e n�o subestimar a minha intelig�ncia.
- O que voc� est� querendo, L�o? J� n�o basta o que fez minha filha sofrer?
- N�o vou discutir isso com o senhor, o caso � outro.
- Seja breve, por favor.
- N�o sei se C�ssia comentou que desejo vender a nossa casa, mas que n�o pretendo entrar com a separa��o legal. Quero apenas a minha parte do im�vel. Afinal, preciso
sobreviver. O senhor n�o concorda comigo?
Completamente impaciente e demonstrando nervosismo, Orlando respondeu:
- Voc� se engana, L�o. N�o concordo com voc� e n�o vou deixar C�ssia fazer o que voc� quer. Ali�s, ela vai entrar com o pedido de separa��o e, com certeza, voc�
ser� notificado. Qualquer d�vida entre em contato com nosso advogado. Pe�o-lhe que n�o incomode mais, porque n�o obter� nada al�m do que for decidido pelo juiz.
Antes que L�o pudesse dizer uma palavra sequer, Orlando Concluiu:
- Passe muito bem!
Desligou o aparelho, deixando L�o completamente sem a��o. Ele exclamou de maneira imprudente:
- Eu mato esse velho! Quem ele pensa que �? O dono do mundo s� porque tem dinheiro? Pois muito bem, vou mostrar a ele quem sou eu e garanto que vai se arrepender.
L�o absorvia os pensamentos de seus acompanhantes, que o usavam para interferir desastrosamente no caminho dos encarnados com a �nica inten��o de praticar o mal.
Perceberam nele um futuro companheiro no mundo espiritual, que os ajudaria na trajet�ria trevosa. Colaram-se mais a ele, que se entregava sem receio �s sugest�es
por eles emitidas.
"Mate-o. Somente assim conseguir� seu intento e ser� respeitado por seu dinheiro, sua posi��o no mundo, pois a� onde vive o que conta � o poder."
L�o, completamente entregue � sua irresponsabilidade espiritual e imprud�ncia, acreditou ter tido uma excelente id�ia.
"O que pensei faz sentido. Se esse velho n�o concordar com minha exig�ncia, eu o mato! � s� fazer tudo bem feito. Todos sabem que moro longe, e isso vai me fornecer
um excelente �libi. Preciso amadurecer essa id�ia."


Diz o Cristo: provavelmente nesta noite pedir�o tua alma e o que amontoaste para quem ser�?
Obsess�o � tamb�m problema de sintonia.
O ouvido que escuta reflete a boca que fala.
O olho que algo v� assemelha-se, de algum modo, � coisa vista.
N�o precisa, assim, sofrer longas hesita��es nas horas de tempestade.
Se realmente procuras caminho justo, ou�amos o Cristo, e a palavra Dele, por b�ssola infal�vel, tra�ar-nos-� o rumo certo.
(Emmanuel.)


Antonieta entrou ofegante no quarto de C�ssia.
- Filha, acorde, n�o pode perder � hora! - exclamou.
Espregui�ando-se gostosamente, C�ssia respondeu:
- M�e, � muito cedo.
- N�o, C�ssia, est� na hora. Estou ansiosa para voc� fazer esse exame, e n�o quero correr nenhum risco.
- A senhora acha mesmo necess�rio? - perguntou C�ssia pregui�osamente.
- Por favor, minha filha, j� conversamos muito sobre isso, j� ficou tudo decidido. N�o vai querer agora mudar de opini�o. Voc� sabe o quanto � importante para mim
tirar essa d�vida, e para voc� deve ser mais ainda. Portanto, levante-se e se arrume, estarei esperando na cozinha para tomarmos o caf�. - Passou a m�o nos cabelos
da filha completou: - Voc� n�o sabe o que Sabina fez para voc�!
Como uma crian�a, C�ssia respondeu:
- Biscoito de polvilho!
- Exatamente, biscoito de polvilho que voc� tanto gosta. Agora chega de conversa e se apronte, estou esperando.
Durante o caf�, que tomavam com prazer, Antonieta e Sabina tentou acalmar o cora��o de C�ssia, pois sabiam quanto ela estava ansiosa em rela��o ao resultado do exame.
Sabina, fazendo carinho naquela que considerava sua menina, disse-lhe:
- C�ssia, acalme seu cora��o. A verdade � sempre melhor que a d�vida e a mentira. Se tudo der certo, como sua m�e e eu esperamos, agrade�a a Deus. Mas, se o resultado
for o que j� sabemos, aceite sem m�goa ou revolta a vontade de nosso Pai, porque, com certeza, essa situa��o faz parte da sua evolu��o. Sempre existe um filho a
procura de uma m�e.
Sabina tem raz�o, minha filha. Nas leis de Deus sempre est�o presentes a justi�a e a oportunidade de nos renovar por meio do que julgamos ser um castigo. Deus, na
sua infinita sabedoria, n�o castiga ningu�m, mas oferece �s suas criaturas a chance de recome�ar com mais prud�ncia e sensatez.
- Eu entendo - respondeu C�ssia. - Se o que sei hoje for realmente verdade, n�o vou me desesperar, porque j� convivo com essa realidade h� muito tempo. - Com seu
belo sorriso, completou: - Mas n�o posso negar que se o resultado for outro vou experimentar uma felicidade que nem sei como descrever.
- Ent�o vamos, n�o quero que chegue atrasada.
M�e e filha sa�ram juntas, cada uma levando a esperan�a dentro do cora��o. Assim que sa�ram, Orlando entrou na cozinha:
- Sabina onde elas est�o?
- Acabaram de sair, senhor Orlando.
- Que pena - exclamou -, pensava em acompanh�-las. Como estava C�ssia, muito nervosa?
- Parece que n�o, experimentava a ansiedade natural em um caso como esse, mas nada preocupante. Dona Antonieta e eu conversamos com ela, pode ficar tranq�ilo, senhor
Orlando, ela est� bem.
Tentando desabafar um pouco com aquela em que tinha total confian�a, Orlando disse:
- Sabina, voc� sabe que tanto eu quanto Antonieta temos a mais absoluta confian�a em voc�.
- Eu agrade�o por isso e fa�o tudo para n�o decepcion�-los - respondeu Sabina.
- Ando muito preocupado com a inten��o de L�o. Temo que ele possa tentar alguma coisa contra C�ssia. Pression�-la, sei l�, alguma coisa desse tipo.
- Mas existe algum motivo real para essa preocupa��o?
- Acredito que sim. Ele quer que C�ssia concorde em vender a casa que lhes pertence, mas quer fazer isso sem entrar com o pedido de separa��o legal, para n�o perder
a condi��o de meu herdeiro.
- Perdoe o que vou dizer, mas sempre o achei uma pessoa sem car�ter, disposto a tudo para conseguir o que quer. Isso � bem pr�prio dele.
- � isso o que me preocupa, ele conseguir envolver C�ssia em sua l�bia. Voc� acha que ela ainda corre esse risco?
Sabina pensou um pouco e respondeu:
- Sinceramente, acho que n�o. C�ssia j� tomou uma postura, a mais acertada, creio eu, e est� convicta do que quer. O sofrimento a amadureceu, senhor Orlando. Hoje
ela fala com firmeza sobre o que deseja de verdade. Ali�s, n�o sei se o senhor sabe, mas ela comentou comigo que anda sonhando com a figura de uma mulher que lhe
fala coisas importantes. Ela diz que n�o se lembra de nada ao acordar, mas cada vez que isso acontece se sente mais fortalecida e corajosa.
Surpreso, Orlando respondeu:
- Ela n�o comentou nada comigo, Sabina. Voc�, que entende disso, acha que � uma coisa boa?
Tentando encontrar as palavras certas, Sabina respondeu:
- Senhor Orlando, quando somos bons, a partir do momento em que levamos nossa vida dentro das leis de Deus, conquistamos amigos espirituais que se afinam com nosso
pensamento e nossa maneira de agir. Ou seja, s�o esp�ritos bondosos que trabalham em nome de Jesus e que t�m como objetivo o bem-estar da humanidade. Inspiram sempre
o bem, o caminho seguro para promovermos nossa evolu��o.
- Como fazem isso e como sabemos que podemos confiar?
- No caso de C�ssia, o fazem pelo sono, quando o esp�rito se liberta e pode se encontrar com os amigos com os quais se afina. Sabemos que podemos confiar passando
as inspira��es que recebemos pelo crivo da verdade. O bem sempre aquieta nosso cora��o e o faz desejar praticar a fraternidade com o semelhante. As boas inspira��es
sempre nos acalmam e nos trazem paz, porque s�o sempre de amor e prud�ncia. Veja o caso de C�ssia: sua postura mudou, est� mais calma, com o sofrimento mais equilibrado
e mais confiante. Suas l�grimas diminu�ram porque entendeu que nada acontece por acaso e que nada podemos amaldi�oar, porque n�o sabemos a import�ncia das coisas
para nossa evolu��o espiritual.
Orlando ficou pensativo. Ap�s alguns instantes, disse a Sabina:
- Gostaria muito de um dia me aprofundar um pouco mais nessa sua Doutrina.
Feliz, Sabina respondeu:
- Isso s� ir� me trazer alegria, senhor Orlando. Estou a seu dispor; no dia em que sentir vontade conversaremos.
- Agora, se me der licen�a Sabina, vou at� o escrit�rio do doutor Nicolas, preciso coloc�-lo ciente das inten��es de L�o.
- Fique � vontade, senhor Orlando, vou preparar o almo�o.
Orlando saiu deixando Sabina entregue aos pr�prios pensamentos: "Meu Deus, por que as pessoas complicam tanto a pr�pria vida? Por que se esquecem que um dia fatalmente
retornaremos � nossa P�tria verdadeira e iremos deparar com nossos erros, enganos e leviandades? Tenho medo do que L�o possa fazer, ele sempre foi muito violento,
agressivo e nunca desiste do que quer".
Com pureza de alma, orou ao Senhor pedindo aux�lio para as pessoas que ela tanto amava e para o pr�prio L�o, que de maneira t�o leviana se afundava no lama�al das
trevas.

***

Antonieta e C�ssia entraram sorrindo. C�ssia correu para abra�ar Sabina, dizendo:
- Pronto, querida segunda m�e, o exame foi feito e logo saberemos o resultado. - Deu-lhe um gostoso beijo no rosto e completou: - Satisfeita?
- Muito. Primeiro pelo abra�o e beijo, segundo porque iremos dissipar as nossas d�vidas de uma vez por todas. Que seja como Deus quiser!
- Com certeza, ser� como Ele quer Sabina - disse Antonieta - E, seja o que for, aceitaremos com humildade.
- Se me derem licen�a, vou subir para tomar uma ducha e des�o em um instante para o almo�o. Espero que esteja bem gostoso, Sabina, estou morrendo de fome!
- Nossa, nunca a vi com tanta fome assim!
Dirigindo seu belo sorriso �s duas mulheres que amava, C�ssia subiu as escadas cantarolando. Tanto Antonieta quanto Sabina estranharam tanta alegria.
- Parece at� que viu um passarinho verde - disse Sabina.
- Tamb�m fiquei surpresa com a alegria de C�ssia. Quando fomos, achei-a tensa, preocupada, disse poucas palavras. De repente ficou falante, sorridente... Achei mesmo
muito esquisito.
Enquanto isso, em seu quarto, C�ssia se entregava � ora��o.
"Senhor, n�o sei explicar o que sinto. De repente, uma grande esperan�a nasceu em meu �ntimo, uma certeza de que tudo sair� a meu favor, uma sensa��o de que posso
gerar um filho. N�o sei explicar ao certo, mas � como se algu�m falasse dentro de mim. E, mesmo sem entender, eu Vos agrade�o meu Pai, porque sei que Vossa vontade
prevalecer� e, se me sinto forte, isso � reflexo da energia de amor que cobre meu cora��o e sustenta minha mente. Entretanto, se me engano e o sofrimento bater forte
em meu peito, mesmo assim, Senhor, Vos agrade�o porque sei que jamais permitiria o sofrimento se n�o houvesse causa justa, aprendizado e aprimoramento da nossa alma."
Eneida acompanhava a prece de C�ssia e se sentia feliz por ver que suas inspira��es encontravam abrigo no cora��o de sua protegida. Aproximou-se mais e lhe disse:
- Um dia voc� sentir� a alegria de ser m�e, porque o Senhor assim o quer.
C�ssia experimentou uma sensa��o de paz. Levantou-se e tomou uma ducha refrescante. Ao ouvir a voz de sua m�e chamando-a, dizendo que seu pai j� chegara, respondeu:
- J� estou indo, m�e, um minuto s�.
- Nossa, que fisionomia mais linda - disse Orlando, assim que a viu entrar.
- Estou feliz pai, muito feliz!
- Posso saber a raz�o de tanta felicidade?
- Claro, � que tenho a sensa��o de que o resultado desse exame vai me deixar muito, mais muito feliz mesmo.
- O que quer dizer, minha filha?
- Quero dizer que tenho a impress�o de que um dia poderei lhe dar netos, senhor Orlando.
Orlando, Antonieta e Sabina olharam-se espantados.
- Pode repetir o que disse? - perguntou Antonieta.
- Eu disse que tenho a impress�o de que um dia vou poder dar netos para a senhora e papai.
- O que a faz pensar assim?
- Intui��o, papai, pura intui��o.
Orlando olhou para Sabina e ela, balan�ando a cabe�a em sinal afirmativo, disse-lhe:
- Acontece, senhor Orlando. � como estava lhe dizendo, acontece!

***

Alguns dias se passaram sem que L�o colocasse a cabe�a no lugar. Por mais que tentasse, n�o conseguia esquecer tudo o que tinha acontecido em sua vida. A separa��o
de Selma; a conversa que tivera com Orlando; seu escrit�rio, que, devido �s suas constantes aus�ncias, ia de mal a pior. Enfim, tudo contribu�a para que se enchesse
de revolta. Permitia que o �dio se infiltrasse mais e mais em seu cora��o e, impulsionado pelos desejos mal�volos de seus acompanhantes espirituais, cada vez mais
se afundava no desejo de vingan�a. A imprud�ncia era sua constante aliada. Sabia que nada conseguiria com C�ssia e muito menos com Orlando, que entregara a causa
ao advogado confiando em sua compet�ncia e honestidade.
Nunca mais se falaram. No sil�ncio de seu apartamento, passava as horas arquitetando planos para concretizar com sucesso seu intento de eliminar Orlando sem deixar
pistas, acreditando, assim, que receberia sua parte da heran�a, resolvendo com isso os problemas financeiros. Enquanto ele vivia enclausurado nas pr�prias teias
de maldade, C�ssia vivia a esperan�a da t�o esperada e sonhada felicidade de ser m�e.
O resultado do exame confirmou sua fertilidade, e C�ssia, feliz, esquecera por completo as tramas de L�o. Nada mais lhe importava a n�o ser a certeza de que um dia
construiria novamente sua vida, e inseridas nela estavam �s crian�as que correriam alegres por sua casa chamando-a de m�e.
- Vou realizar meu sonho! - dizia entusiasmada para seus pais e para Sabina, que mais do que ningu�m se alegrava por ver ca�do � m�scara de L�o.
- Ningu�m consegue enganar durante muito tempo - dizia. - Um dia a verdade vem � tona, n�o importa quanto demore. Mas ela sempre aparece, porque se op�e � mentira.
Orlando, surpreso e ao mesmo tempo encantado com a intui��o de sua filha, procurou conhecer, por interm�dio de Sabina, um pouco mais sobre a Doutrina que sustentava
C�ssia, tornando-a mais equilibrada e confiante de que um dia a felicidade se instalaria em sua vida de maneira definitiva. Queria explica��o para tudo. E Sabina,
em sua simplicidade, respondia:
- Senhor Orlando, n�o sei tudo, ou melhor, sei muito pouco, quase nada. Na realidade, aprendi com a vida, observando as pessoas, pedindo aux�lio ao Senhor e prestando
aten��o nas inspira��es dos bons esp�ritos.
- Mas o que faz voc� ter tanta certeza de que tudo isso � a verdade eterna e absoluta? N�o poderia estar enganada?
Sabina calou-se por alguns instantes.
- N�o sei lhe responder, senhor Orlando, n�o tenho sabedoria para faz�-lo e n�o me atreveria a falar em nome da Doutrina sem ter condi��es para isso.
- E como fa�o para aprender mais sobre esse assunto?
- Lendo os livros que falam sobre o tema, que explicam com exatid�o e fornecem todas as respostas �s suas perguntas. Eu sou apenas uma humilde aprendiz do Evangelho
que tenta viver de acordo com as leis de Deus.
- Pode ser Sabina, mas tamb�m possui a sabedoria adquirida ao longo dos seus anos vividos, sabedoria que s� os cora��es bons possuem.


A verdade eterna, como a lei que a confirma, n�o depende da aceita��o dos homens para existir. Ela �. E governa o universo a despeito dos que fecham os olhos para
n�o v�-la.
Focaliza-se sob dois aspectos: absoluto e relativo.
A verdade absoluta - afirma Kardec - s� � do conhecimento dos esp�ritos da mais elevada categoria, e a humanidade terrena n�o pode pretend�-la, pois que n�o lhe
� dado saber tudo, e ela s� pode aspirar a uma verdade relativa, proporcional ao seu adiantamento.
(Revista Esp�rita Allan Kardec, trad. J�lio Abreu Filho, Edicel.)


C�ssia, olhando para seu pai conversando com Sabina, sentiu um misto de alegria e, sem entender a raz�o, uma ang�stia que julgou sem sentido. Seu cora��o se apertou
e, sem saber por que, correu para abra��-lo. Orlando retribuiu com enorme satisfa��o aquela demonstra��o de afeto.


Cap�tulo 7
O envolvimento com as trevas


L�o retomou suas atividades, mas em nenhum momento deixou de lado sua inten��o cruel de eliminar Orlando - o que, para ele, era a coisa mais natural do mundo. N�o
percebia o quanto era instigado pelos esp�ritos das sombras, que encontraram nele a presa f�cil para executar suas maldades entre os encarnados.
Para L�o tudo parecia normal. Recebera o convite do advogado de C�ssia para comparecer ao seu escrit�rio a fim de conversarem a respeito da separa��o. O intuito
do doutor Nicolas era entrar em um acordo para que houvesse a separa��o amig�vel, evitando, assim, um sofrimento maior. Mas L�o ignorara e, na sua inconseq��ncia,
respondera rispidamente ao convite.
- N�o existe acordo - respondera ao advogado. - N�o me importa nem um pouco se vai haver ou n�o sofrimento, porque se houver ser�, com certeza, de C�ssia. A mim
interessam apenas os bens a que tenho direito, ou seja, os do senhor Orlando, que, diga-se de passagem, n�o s�o poucos.
Essa declara��o leviana causara mais dor ao j� sofrido cora��o de C�ssia. Orlando cada vez mais se irritava com a ousadia de L�o.
- N�o � poss�vel existir algu�m t�o inescrupuloso assim - dizia � sua esposa. N�o posso entender como fomos nos enganar dessa maneira com esse rapaz a ponto de permitir
sua uni�o com nossa filha!
- N�o adianta agora questionarmos a maneira como agimos, Orlando. O que est� feito n�o se pode mudar. Ele nos enganou, e isso � um fato. S� nos resta tentar agir
da melhor forma poss�vel, evitando mais sofrimento para nossa filha.
- Desculpe-me, senhor Orlando, mas concordo com dona Antonieta. L�o sempre foi um mau-car�ter. � especialista na arte de enganar as pessoas. Ludibria quantos se
aproximem dele. Por que somente os senhores n�o se enganariam? Agora s� nos resta nos unir e proteger C�ssia dos poss�veis aborrecimentos que fatalmente vir�o.
C�ssia, que tudo ouvia, quebrou o sil�ncio e disse ao pai:
- Pai, n�o se culpe, porque ningu�m tem culpa de nada. Quem deveria ter percebido quem ele era, na verdade, era eu e ningu�m mais. Entretanto, estava t�o apaixonada
que n�o vi os sinais de ego�smo que ele deixava por todo lado, da sua falta de car�ter at� nas quest�es mais banais, sinais esses que ficavam gravados por onde passava.
J� senti muita culpa pai, mas hoje sei que n�o devo me culpar, porque n�o posso assumir a responsabilidade dos atos inconseq�entes de L�o. Ele optou por nortear
sua vida para o lado mais obscuro, mas com certeza colher� os frutos da insensatez.
Orlando e Antonieta, nessas horas, admiravam a transforma��o de sua filha. Tranq�ilizava-os saber que C�ssia se empenhava novamente na constru��o de uma nova vida.
Ostentava sempre um sorriso nos l�bios e demonstrava a paz que lhe ia � alma.
- Orlando, voc� percebeu que desde que C�ssia soube do resultado do exame que comprovou sua capacidade de engravidar vive como se houvesse retirado um grande peso
das costas?
- Percebi Antonieta. Ela devia sofrer muito com aquela situa��o. Foi muita maldade de L�o deix�-la acreditar que era ela a est�ril. Agora sabemos que era ele.
- � melhor deixarmos esse assunto de lado, Orlando. Tudo j� est� devidamente resolvido. C�ssia est� feliz e � melhor n�o comentarmos mais sobre isso.
- Voc� tem raz�o - concordou Orlando. - S�o �guas passadas. Agora � iniciar tudo de novo, com mais intelig�ncia. Tudo serve como aprendizado.

***

Irritado, L�o entrou em casa batendo a porta.
- N�o � poss�vel que esse advogado n�o desista! - exclamava. Quem ele pensa que � para querer resolver minha vida? E, de maneira imprudente, continuou: Ter a ousadia
de se intrometer no que me diz respeito; achar que sou tolo o bastante para abrir m�o de uma heran�a consider�vel! Ele n�o sabe com quem est� lidando!
Amassou a carta que tinha em m�os e jogou-a no lixo com toda a raiva que podia sentir. Mais uma vez, abriu as portas para a obsess�o, os obsessores n�o demoraram
mais que um segundo para se colarem em L�o. Em vista dessa uni�o, a ira de L�o aumentava cada vez mais, tomando uma propor��o gigantesca e levando-o a uma decis�o
dr�stica, violenta e com o �nico intuito de praticar o mal.


A obsess�o � a a��o persistente que um mau esp�rito exerce sobre o indiv�duo.
(A G�nese, XIV, 45.)


O �dio � violento e duradouro. Quando � muito intenso, leva uma pessoa a desejar a morte de outra. Algumas vezes, o �dio nasce do amor desvirtuado, sufocado nos
cora��es que n�o conhecem o Evangelho, que se perdem no brilho da mat�ria, no ego�smo de si mesmo e no orgulho de se sentirem desprezados.
Esse �dio se infiltrou no cora��o de L�o ao ser tra�do por Selma. Culpava C�ssia por ser filha de Orlando e sua herdeira; Orlando por possuir bens suficientes para
obter o que desejasse no momento que mais lhe aprouvesse; e Selma por ter-lhe tra�do de uma forma vil, sem se importar com seus sentimentos, jogando-o na desilus�o
do desprezo.
Nem por pequenos instantes lembrava-se do que fizera � C�ssia - o mesmo desprezo aliado �s agress�es morais e f�sicas. Entregava-se � auto-compaix�o e, com esse
sentimento, julgava-se no direito de se vingar a qualquer pre�o. Apenas seu sofrimento e sua dor contavam naquele momento. Julgava-se injusti�ado, pois entregara
todo o seu amor � Selma e ela o fizera sofrer.


Jesus nos deu meios de renovar e reerguer nossa pr�pria vida; n�o se deve cair na auto-piedade, ela nos leva a crer que somos os �nicos sofredores e que nada mais
importa, a n�o ser a nossa dor, e corremos, assim, o risco de querer san�-la a qualquer pre�o. As leis de Deus n�o nos enla�am com sofrimento sem causa justa.
(A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)


A id�ia de eliminar Orlando cada vez mais tomava forma na mente doentia de L�o, que sem se dar conta aliava-se sempre mais aos esp�ritos trevosos. Chegando ao �pice
da sua loucura, decidiu: "Vou matar Orlando. � isso o que tenho de fazer. Com sua morte, torno-me seu herdeiro e ningu�m vai poder questionar isso, nem C�ssia nem
a velha sua m�e. Recebo minha parte da heran�a e, com minha conta banc�ria bem cheia, posso bancar quem eu quiser e fazer a Selma se arrepender".
Como ningu�m fica sem aux�lio e completamente s�, L�o recebeu a visita de Eneida e Tom�s, que, com carinho fraternal, lhe disseram por meio da consci�ncia dele:
- L�o, pense melhor, reavalie seu posicionamento e elimine esse �dio que o atormenta. Deixe Orlando seguir sua trajet�ria aqui na Terra e evite cometer esse crime
que o lan�ar� no lama�al da dor. Nada se resolve com agress�es e muito menos com �dio. Pe�a aux�lio divino! Ainda � tempo de retroceder e retomar as r�deas de sua
vida com seguran�a. Coloque pensamentos nobres em seu cora��o e o entregue a Jesus, confiando no Divino Amigo. Retorne para a prud�ncia e a sabedoria que sustentam
aqueles que t�m f� no Criador!
Eneida sentiu que por poucos segundos L�o foi sens�vel �s suas vibra��es, mas, assim que se afastou, percebeu os trevosos se aproximarem e envolverem L�o de maneira
possessiva. E ele pensou: "Poxa vida, por uns breves instantes cheguei a pensar que seria bobagem me envolver em um crime, mas ainda bem que minha lucidez voltou.
Tenho mesmo de acabar com ele, pois, para mim, � uma quest�o de honra. Homem que � homem precisa ter coragem para tudo, principalmente para defender seus princ�pios".
Envolvido pelas sombras por completo, L�o se perdia totalmente nas trevas. N�o poderia imaginar o que come�ava a escrever no livro de sua vida. N�o poderia imaginar
o que viria ap�s um ato t�o escabroso e que pagaria caro por tamanha insensatez. Entregue � na loucura, come�ou a elaborar o plano para atingir irremediavelmente
Orlando.
Eneida disse a Tom�s:
- Que Jesus o proteja, Tom�s! A consuma��o desse plano diab�lico ser� o in�cio de terr�veis sofrimentos.
Afastaram-se, deixando L�o entregue � pr�pria estupidez.


***

Enquanto L�o era atingido pelo pr�prio veneno, na casa de C�ssia tudo voltava ao normal. Orlando e Antonieta, assim como Sabina, passavam os dias com tranq�ilidade
em raz�o da mudan�a de C�ssia. Ela procurara alguma atividade para preencher o vazio de sua vida, e a alegria parecia voltar ao seu cora��o. Identificara-se com
um projeto da prefeitura local, que consistia em agrupar os menos favorecidos em uma grande �rea na qual eram cultivadas flores e uma consider�vel horta com a inten��o
de suprir a mesa daqueles t�o sofridos irm�os com as verduras e legumes que eles mesmos plantavam. As flores fornecidas para as feiras e floriculturas retornavam
em forma de subs�dio que mantinha a continuidade do projeto e auxiliava os trabalhadores com pequena ajuda em dinheiro.
C�ssia se inscrevera como volunt�ria no cultivo das flores, coisa que sempre fizera em sua casa, e esse retorno � sua atividade trouxera-lhe paz interior e uma grande
alegria.
Tudo na resid�ncia de Orlando corria bem e tranq�ilamente at� o dia em que recebeu um telefonema de L�o. Com voz amea�adora e agressiva, ele intimou Orlando a se
encontrar com ele.
- J� se passaram muitos dias - disse - e nada aconteceu em meu favor. S� recebo cartas e mais cartas desse seu advogado, que tenta fazer acordo. Eu n�o quero acordo!
- gritou L�o. - Quero meu dinheiro, minha parte, e sei que tenho direito a isso.
Receoso, Orlando respondeu:
- L�o, tenha paci�ncia, a demora est� por sua conta, que n�o se apresenta, n�o aceita nenhuma sugest�o e n�o quer conversar com ningu�m.
Irritado e completamente fora de si, L�o respondeu:
- Vou repetir pela �ltima vez. Eu n�o quero acordo, � in�til insistir.
- Mas, L�o, voc� sabe que vai receber o que lhe cabe, s� � preciso dar continuidade � separa��o de voc�s, coisa que demora por sua pr�pria culpa. N�o queremos briga,
mas pelo visto o que voc� quer � exatamente isso.
L�o, sob o controle das sombras, respondeu:
- Tudo bem. Vamos nos encontrar e conversar a respeito.
Orlando, sem saber por que, sentiu um ligeiro mal-estar, como se temesse algo. Lembrou-se das conversas com Sabina a respeito das intui��es e pensou: "Ser� que estou
tendo uma intui��o? Que sensa��o desagrad�vel..."
Voltou a si ao ouvir novamente a voz irritada de L�o:
- Ent�o, senhor Orlando, estou esperando.
- L�o, n�o h� nenhuma necessidade de nos encontrarmos. Meu advogado est� ciente de tudo e nada vai fazer para prejudic�-lo.
Ordenou-lhe o chefe da falange. "Insista!" Obedecendo ao comando, L�o insistiu:
- Vou dizer pela �ltima vez, senhor Orlando, e espero que entenda e n�o me force a nada. Quero me encontrar com o senhor hoje. Agora, para ser mais preciso.
- Mas voc� mora longe e vai demorar a chegar.
- N�o seja idiota! Se eu estou dizendo agora, � porque j� estou na cidade. Portanto, venha se encontrar comigo agora.
Novamente, Orlando sentiu um mal-estar.
- N�o vou, L�o!
- N�o? - perguntou L�o em tom sarc�stico.
- N�o! - exclamou Orlando com voz firme.
- Tudo bem. Se n�o quer, n�o venha, mas depois n�o diga que eu n�o avisei.
- O que pretende fazer, posso saber?
- Claro! Vou procurar C�ssia e acabar com a vida dela, assim o senhor ter� muito tempo para se arrepender por ter me enfrentado e suas l�grimas n�o ter�o fim.
- Voc� n�o faria isso!
- N�o? E s� pagar para ver.
- Voc� n�o vale nada mesmo, L�o.
- S� existe um meio de eu valer alguma coisa, senhor Orlando. � colocando no bolso uma parte de sua fortuna. E � o que pretendo fazer. - Cada vez mais irritado e
sob o efeito das sombras, L�o cortou a conversa: - Chega de papo. Venha se encontrar comigo dentro de uma hora.
Sentindo-se tr�mulo, Orlando respondeu:
- Est� bem, diga-me o lugar.
L�o explicou com detalhes o lugar.
- Mas esse lugar � muito longe e ermo - considerou Orlando.
- Mas � nesse lugar que vamos nos encontrar. Pegue algum dinheiro e leve, porque estou precisando. E lembre-se de que isso � s� o come�o.
Desligou o telefone.
Antonieta, percebendo a palidez do marido, perguntou:
- O que esse mau-car�ter queria com voc�, Orlando?
Em poucas palavras, Orlando colocou a esposa ciente de tudo.
- Mas voc� corre perigo. Acho melhor avisar a pol�cia.
- N�o acha exagero?
- Concordo com dona Antonieta - disse Sabina, que ouvira a conversa. - Devemos esperar tudo desse rapaz. E melhor se prevenir.
Orlando pensou por alguns instantes e decidiu:
- Vou avisar o doutor Nicolas. Ele pode pensar em alguma coisa.
- Fa�a isso - apoiou Antonieta.
Tomando conhecimento da quest�o, o advogado disse a Orlando:
- � melhor nos prevenir. Tenho conhecimento na pol�cia. Vou at� l� explicar o que est� acontecendo, os nossos receios e pedir seguran�a. Fique calmo, meu amigo,
tudo vai dar certo.
Angustiado, Orlando perguntou ao amigo:
- Nicolas, antes de ser meu advogado, voc� sempre foi meu amigo. Confio em voc� como profissional e, principalmente, como amigo. Portanto lhe pergunto: o que devo
fazer, ir ao encontro dele ou aguardar? Ele me deu o prazo de uma hora, e receio que fa�a algum mal a C�ssia.
- Meu amigo - respondeu Nicolas -, iremos juntos � delegacia. L� � o melhor lugar para nos aconselharmos.
Foi o que fizeram. Mantinham o sil�ncio, mas Nicolas n�o podia deixar de notar a apreens�o do amigo. Achava tudo muito estranho. A atitude de L�o, sua insist�ncia
em querer a heran�a sem se preocupar em esconder sua verdadeira inten��o, agora � amea�a. Tudo lhe parecia fantasioso. Pensava consigo mesmo: 'Aprendi que n�o devemos
subestimar ningu�m. Nunca sabemos suas verdadeiras inten��es. Todo o cuidado � pouco quando tratamos com pessoas que pouco ou nada t�m para dar aos outros, a n�o
ser preocupa��es".
Ap�s explicarem tudo ao delegado, ele designou dois soldados para fazer a seguran�a de Orlando. Tudo devidamente preparado seguiram para o encontro com L�o. Orlando
levava consigo o dinheiro pedido. Tinha as m�os tr�mulas em raz�o do nervosismo que sentia. Em sua mente honesta e sincera, sentia dificuldade em entender o porqu�
de tudo aquilo estar acontecendo: "Meu Deus, as coisas podiam ser diferentes, dentro da paz. Afinal, � apenas um casamento que se desfaz como tantos outros. Por
que tudo se complicou?"
Eneida, que acompanhava Orlando junto com Tom�s, aproximou-se mais dele e lhe disse:
- As coisas na Terra se complicam Orlando, porque os homens pensam e agem em fun��o de si mesmos. Nada v�em al�m do seu desejo. Ainda n�o aprenderam que as coisas
essenciais s�o invis�veis aos olhos porque pertencem ao amor de Deus. Mas os homens, cegos que s�o s� conseguem visualizar o que lhes causa prazeres moment�neos
e n�o se d�o conta do mal que fazem a si mesmos. - Eneida continuou: - Agora, meu irm�o, acalme-se. Chegou � hora do resgate final. Mantenha seu cora��o aquecido
no amor de Deus e se entregue sem medo. Tudo ser� muito r�pido. O Irm�o possui m�ritos para que o sofrimento seja aliviado, portanto, confie no Criador.
Orlando, sem saber por que, sentiu uma estranha serenidade invadir seu peito. Lembrou-se de Antonieta e C�ssia, e p�de perceber toda a for�a do seu amor por elas.
- Tudo vai dar certo - disse a si mesmo. - Como diz Sabina, de uma maneira ou de outra tudo vai dar certo.
Quando chegaram ao local, L�o j� estava esperando. Caminhava de um lado para outro nervoso, irritado, parecendo uma fera enjaulada. Ao perceber que Orlando n�o chegara
sozinho, foi ao auge da irrita��o. Sem se controlar, avan�ou em sua dire��o gritando e dizendo improp�rios, obedecendo sem rea��o �s investidas dos trevosos.
- Eu disse que viesse s�, e voc� n�o me obedeceu. Tudo bem, o que eu ia fazer pode muito bem ser feito com plat�ia, para mim tanto faz. A �nica coisa que me interessa
e que quero seu dinheiro ouviu bem? Seu dinheiro! E vou t�-lo tost�o por tost�o. Foi ele que destruiu minha vida quando Selma me deixou, e tudo por sua causa. N�o
me ouviu, me subestimou e agora vai ter o que pediu.
Antes que Orlando ou algu�m pudesse fazer alguma coisa, sacou uma arma e disparou dois tiros em dire��o a Orlando, que, ferido, fatalmente caiu em uma po�a de sangue.
Enquanto L�o ficou parado observando a cena tr�gica que criara, os dois soldados, com agilidade, o dominaram e o colocaram dentro do carro da pol�cia.
Nicolas olhava o amigo ca�do, morto, e n�o conseguia acreditar no que presenciava.
- Meu Deus... Meu Deus! - dizia em voz alta, tentando p�r para fora a sua dor. - Somente a f� em V�s e a certeza da Vossa justi�a e sabedoria me fazem aceitar tamanha
viol�ncia contra um homem de bem. Que humanidade � essa, que transforma a vida em algo t�o insignificante? A vida � a maior b�n��o que Deus nos concede! Por que
todos n�o conseguem compreender isso?
Enquanto no plano f�sico as provid�ncias eram tomadas para a despedida de Orlando, no mundo espiritual ele era socorrido docemente pelos amigos que conquistara durante
sua estada na Terra. Sempre fora um homem de bem, temente a Deus e seguidor de Suas leis. Era justo que nesse momento dif�cil para o esp�rito, fosse amparado e recebesse
o retorno de suas a��es de amor e fraternidade.
Eneida acompanhava com aten��o a equipe socorrista, que, com habilidade, desatava os la�os que prendiam Orlando a seu corpo f�sico. Tudo acontecia no mais perfeito
equil�brio. Orlando recebia energia salutar que o mantinha adormecido. O desencarne do homem de bem � sempre tranq�ilo, e o de Orlando, apesar da morte violenta,
n�o foi diferente. Adormecido, n�o se dava conta do seu retorno � espiritualidade e permanecia protegido das l�grimas copiosas que Antonieta e C�ssia derramavam
sobre seu corpo inerte, l�grimas essas que em excesso podem perturbar ainda mais o esp�rito.
Eneida, assim como Tom�s e outros esp�ritos amigos, protegia Antonieta e C�ssia, equilibrando-as no amor de Jesus para que n�o se entregassem ao desespero m�ximo,
que se aproxima da blasf�mia.
Mais descontrolada, Antonieta dizia em voz alta:
- N�o � poss�vel que isso esteja acontecendo, meu Deus! O que foi que ele fez para ser assassinado desse modo cruel? Nunca imaginei que L�o fosse essa fera indom�vel
que mata friamente em nome do dinheiro! Que rapaz � esse, o dem�nio?
- Calma dona Antonieta, Deus sabe o porqu� de tudo isso. Deve haver uma raz�o justa, importante, para isso ter acontecido. � preciso confiar! - exclamava Sabina.
C�ssia, mais calma que Antonieta, dizia � sua m�e:
- M�e, a senhora sempre foi uma mulher de f�. Por que se deixa enfraquecer agora, justamente agora que mais precisa ter coragem? Sem d�vida, este � o in�cio de um
grande sofrimento, mas a f� e o amor em Deus nos sustentar�o.
- Eu vou me vingar de L�o - disse Antonieta desesperada.
- N�o, m�e, n�o vai e sabe por qu�? Porque a senhora � diferente dele. Nunca alimentou �dio nem sentimento de vingan�a por ningu�m, e n�o vai ser agora que vai sujar
seu cora��o com sentimento t�o mesquinho e vil. Deixe-o mergulhado no pr�prio remorso. Ele n�o precisar� de ningu�m para lhe desejar o mal, porque ele sozinho j�
o trouxe para si mesmo.
Antonieta, caindo em si, disse � filha:
- Desculpe-me, filha, foi uma loucura o que eu disse sobre vingan�a, n�o faz parte de mim. N�o se preocupe, pois n�o quero ser igual a ele. S� desejo que ele nos
deixe em paz, que n�o a procure mais.
- M�e, ele foi preso em flagrante e vai esperar pelo julgamento na cadeia. Nosso contato com ele ser� m�nimo, pois tudo ser� feito por interm�dio do doutor Nicolas.
Tente se acalmar. N�s duas juntas, ao lado de Sabina, vamos superar essa tristeza. A lembran�a dele ficar� para sempre em nosso cora��o, aquecida com nosso amor
e nossa saudade. E ele, como criatura de Deus, iniciar� sua caminhada de evolu��o at� o dia em que, se Deus o permitir, nos encontraremos novamente.
Terminando o assunto, C�ssia prop�s que fizessem uma ora��o para aquele a quem amava acima de tudo, seu pai querido, que para defend�-la se entregara ao le�o. Atendendo
ao pedido de Antonieta e C�ssia, Sabina iniciou uma sentida prece.

"Senhor, viva conosco este momento de dor, ansiedade e incerteza. Momento em que sentimos dentro de n�s o desespero dos descrentes, a revolta dos fracos, o medo
dos covardes.
Viva conosco, Senhor, para que possamos sentir Teus bra�os nos envolvendo e nos conduzindo para o descanso. Sentir t�o forte Tua presen�a em n�s, dando-nos a sensa��o
de estarmos todos deitados em Teu colo.
Viva conosco, Senhor, para que saibamos transformar o desespero em aceita��o; a revolta em f�, e o medo em coragem para enfrentar a prova da separa��o.
Receba Senhor, esse Teu filho que parte e auxilie a todos n�s que ficamos presos na saudade, que tanto um quanto os outros sejam aquecidos pelo Teu amor de paz e
de justi�a.
Assim Seja!"

Ao terminar sua ora��o, Sabina, assim como os outros, tinha os olhos marejados. A emo��o tomava conta dos presentes, e aquele que partia recebia as palavras e o
sentimento de amor dirigido a ele como gotas de orvalho a umedecer seu esp�rito. Era a despedida equilibrada e confiante no amor de Deus.

O esp�rita deve saber primeiro que a maldade n�o � o estado permanente dos homens; que ela se deve a uma imperfei��o moment�nea, e que, do mesmo modo que a crian�a
se corrige dos seus defeitos, o homem mal reconhecer� um dia seus erros e se tornar� bom.
Os inimigos do mundo invis�vel manifestam sua malevol�ncia pelas obsess�es e pelas subjuga��es, das quais tantas pessoas s�o alvo, e que s�o uma variedade das provas
da vida; essas provas, como as outras, ajudam no adiantamento e devem ser aceitas com resigna��o, e como conseq��ncia da natureza inferior do globo terrestre; se
n�o houvesse homens maus na Terra, n�o haveria Esp�ritos maus ao redor dela.
(O Evangelho segundo o Espiritismo, Cap. XII.)


Enquanto C�ssia sofria com equil�brio a separa��o de seu pai, entregando sua dor aos cuidados de Jesus, L�o, ao contr�rio de C�ssia, entregava sua ira aos seus cru�is
acompanhantes, que cada vez mais o instigavam a odiar, a maldizer, a blasfemar. Compraziam-se em v�-lo sofrer e queriam jog�-lo no lama�al que eles mesmos viviam.
- Esse, com certeza, ser� um dos nossos - dizia o que parecia o chefe.
Os gritos de L�o estavam t�o estridentes que foi advertido por dos policiais.
- Quero sair daqui! - falava alterado. - Tenho direito a um advogado e exijo os meus direitos!
Sem responder, o policial afastou-se, deixando L�o mais irritado. Os encarnados n�o podiam ver, mas uma n�voa escura pairava sobre aquele lugar onde o mal reinava
absoluto.

***

Dois meses se passaram desde esse acontecimento.
L�o n�o conseguira autoriza��o para aguardar o julgamento em liberdade, e continuava detido. Em nenhum momento se conformara em estar preso. Em sua insanidade, julgava-se
injusti�ado e acusava C�ssia por n�o ter ido visit�-lo. E sua mente doentia a culpava por toda a desgra�a que se abatera em sua vida.
Certa manh� foi encontrado morto, enforcado com o len�ol de sua cama. N�o suportando a situa��o que ele mesmo criara, ca�ra em prostra��o, ficara deprimido, e o
abatimento f�sico e mental o levou a mais uma vez cometer um desatino. Deixava o mundo f�sico em meio �s trevas, levando consigo os sofrimentos pelos quais passa
o cora��o sem Deus. Devemos amar a vida em qualquer situa��o. Enganam-se aqueles que pensam que a solu��o para os problemas est� na deser��o da vida, porque, agindo
assim, realmente nos afundamos nos problemas, que se tornam mais penosos.


Allan Kardec esclarece: "O suicida assemelha-se ao prisioneiro que escapa da pris�o antes de cumprir a sua pena e que, ao ser preso de novo, ser� tratado com mais
severidade. Assim acontece, pois, com o suicida, que pensa escapar �s mis�rias presentes e mergulha em maiores desgra�as".
(Koogan Larousse, Larousse do Brasil, 1979/1980.)



Cap�tulo 8
O segredo de Sabina


Eneida, entrando no quarto onde Orlando se encontrava em recupera��o pela viol�ncia do seu retorno, encontrou-o agitado. Aproximando-se dele, percebeu que seria
in�til perguntar-lhe qualquer coisa, pois sua condi��o era de extrema excita��o. "Melhor chamar Jacob!"
Elevou seu pensamento ao Alto e, com firmeza, pediu aux�lio ao querido mestre.
"Venha em socorro desse irm�o, Jacob, com a permiss�o de Jesus."
Em segundos, Jacob, sorridente, entrava no quarto de Orlando. - Aqui estou querida irm�, o que acontece?
Sem esperar pela resposta, Jacob elevou o pensamento a Jesus e, acompanhado de Eneida, orou ao Mestre.

Senhor da vida, imploro o Vosso aux�lio para esse irm�o que apenas inicia seus dias na espiritualidade. Que a tranq�ilidade se fa�a em seu esp�rito para que possa
entender que a vida n�o se extingue com a morte do corpo f�sico, mas sim ressurge em seu esplendor, pois o retorno nada mais � que a volta do esp�rito � sua origem.

Enquanto orava, Jacob envolvia Orlando em um fluido de paz, e ele aos poucos ia se acalmando, at� que abriu os olhos perguntou:
- Onde estou?
- Na casa do Senhor - respondeu Jacob.
- Aqui � um hospital? Estou doente?
- Sim - respondeu Jacob. - Aqui � um hospital de refazimento, mas o irm�o n�o est� doente, apenas um pouco fraco. Mas � natural, logo passar�.
Orlando olhou para os lados tentando identificar o lugar.
- Estranho n�o ver a Antonieta ou a C�ssia, elas nunca me deixariam sozinho em um hospital. Qual a raz�o de eu estar internado?
Com muito carinho, Jacob explicou:
- Voc� fez uma viagem, Orlando. Lembra das conversas que tinha com a nossa irm� Sabina sobre a vida futura?
Meio assustado, Orlando respondeu:
- Sim, lembro-me, ou melhor, lembro vagamente. - Hesitou por alguns instantes e voltou a dizer: - Mas isso quer dizer o qu�?
Antes que Jacob respondesse, Eneida carinhosamente lhe disse:
- Orlando, mantenha seu pensamento em Jesus e lembre de que somos alvo do Seu amor infinito. Se entregue ao querido Amigo com confian�a e f�, assim seu equil�brio
permanecer� e conseguir� entender mais facilmente sua nova condi��o.
Jacob lhe disse:
- Lembre-se de que todos n�s somos criaturas de Deus, e, como Suas criaturas, um dia retornamos � Sua morada. Foi o que aconteceu com voc�, meu irm�o.
- Quer dizer que eu estou morto? Sim, porque s� voltamos para o reino de Deus quando morremos.
- Seu corpo f�sico morreu Orlando, mas voc� continua vivo. Sua individualidade permanece. Voc� pensa, age e sente, e isso prova que a morte � uma ilus�o. N�s, como
criaturas de Deus, somos muito mais que um corpo de carne que pertence � mat�ria e na mat�ria permanece. A nossa ess�ncia retorna � casa de nosso Pai e Criador,
e a nossa maior alegria � saber que sempre podemos recome�ar a caminhada da nossa evolu��o e o que nosso Criador quer e espera � que todos os Seus filhos se tornem
bons. Isso s� acontece por meio do aprendizado em nossas idas e vindas. Voc� entende?
- Mais ou menos - respondeu Orlando. - Tudo est� ainda muito confuso. Sinto dificuldade em assimilar essa situa��o. Acho estranha essa situa��o de estar vivo e morto
ao mesmo tempo.
- Pacientemente, Jacob esclareceu:
Orlando, nossa ess�ncia � espiritual, portanto, n�s somos esp�ritos. Temos um corpo et�reo, flu�dico e vol�til que se denomina perisp�rito, que � a condensa��o do
fluido c�smico ao redor de um foco inteligente ou alma que somos n�s. Poucos encarnados podem nos ver, mas quando precisamos cumprir os prop�sitos divinos, terminar
tarefas, prosseguir nossa evolu��o pelo amor aprendido e exercitado no orbe terrestre, � necess�rio "vestirmos" o corpo de carne para que possamos ser vistos, para
que haja a adapta��o com a mat�ria densa. Quando nossa tarefa termina e a nossa volta e necess�ria, esse corpo morre e se acaba, mas nossa ess�ncia ressurge viva
como sempre foi. Como eu disse, quem morreu foi a sua vestimenta terrena, mas voc� possui a vida eterna e ter� a eternidade a seu favor para continuar a evolu��o
rumo � perfei��o.
Orlando prestava aten��o nas explica��es de Jacob. Mesmo ainda enfraquecido, acompanhava os esclarecimentos que lhe eram passados.
- Posso fazer-lhe uma pergunta?
- Claro, meu irm�o, estamos aqui para esclarecer. Pergunte.
- H� quanto tempo morri na Terra e cheguei aqui?
- H� dois meses.
- E por que somente agora estou me dando conta disso?
- Voc� esteve dormindo, Orlando.
- Por qu�?
- Porque achamos melhor mant�-lo adormecido. Voc� desencarnou de forma violenta e teria grandes desequil�brios em raz�o dessa agressividade. Como possu�a m�ritos
para que pud�ssemos agir assim, assim o fizemos com a permiss�o de Jesus.
Eneida, que at� ent�o permanecera silenciosa, manifestou-se:
- Orlando, a causa da morte, o choro excessivo dos familiares e, muitas vezes, a n�o aceita��o de alguns deles causam desequil�brio ao rec�m-chegado da Terra. Jesus
lhe concedeu uma grande b�n��o, isolou-o das manifesta��es dos encarnados e de sua pr�pria ansiedade e ang�stia.
- Durante seu sono, foi cuidadosamente tratado, fortalecido com a energia salutar e agora, se estiver se sentindo bem, poder� se levantar e sair do quarto por breves
momentos.
Orlando se animou.
- Posso ir aonde eu quiser?
- Por enquanto ainda n�o, mas pode ir ao jardim do hospital admirar a beleza e o perfume das flores, sentir a presen�a de Deus em todos os lugares do Universo.
- Posso ir ao meu antigo lar terreno?
- � muito cedo ainda. N�o est� em condi��es de ir a Terra nem ao seu antigo lar. Mas, em um futuro breve, poder� satisfazer essa vontade.
- Queria apenas saber de Antonieta e C�ssia.
- Elas est�o bem, n�o se preocupe. S�o duas irm�s tementes a Deus. Est�o levando a vida com coragem e muita f�.
- Receio por L�o. Temo que ele fa�a algum mal � minha filha.
- Orlando, n�o � hora de se preocupar com essa quest�o nem com esse irm�o.
- Mas por que ele fez isso comigo?
- Ainda � muito cedo para tomar conhecimento do passado. Tudo no tempo certo. Voc� ainda est� debilitado e n�o � bom se preocupar. � hora, agora, � de se aproximar
de Jesus, entregar-se ao Divino Amigo para se manter equilibrado.
Jacob, voltando-se para Eneida, pediu-lhe que lhe ministrasse passes com energia salutar e lhe servisse �gua fluidificada. Instruiu-a para que o mantivesse ainda
em repouso e que o deixasse dormir.
Para Orlando disse:
- Este � o momento do sil�ncio, portanto se entregue a Jesus e aguarde o amparo que vir�.
J� um pouco cansado, Orlando disse a Jacob:
- Come�o a sentir muita saudade, o que fa�o?
- Orlando, o amor � t�o poderoso que transp�e a barreira do tempo e da dist�ncia. Seus entes queridos est�o em pensamento junto a voc�. Se entregue ao amor de Deus
e sentir� as vibra��es de carinho que lhe enviam.
Orlando, ainda enfraquecido, adormeceu confiante no amparo divino.


A desencarna��o � uma cirurgia profunda de alta gravidade, que varia de acordo com os valores morais e espirituais de cada paciente.
(Victor Hugo - esp�rito, �rdua ascens�o, Divaldo P. Franco.)


Se para Orlando o despertar foi tranq�ilo, seguindo a trajet�ria dos homens de bem, para L�o a conseq��ncia de seus desatinos veio a galope. Dementado, experimentava
a escurid�o, o odor f�tido e a persegui��o dos trevosos. Caminhava como um ambulante sem destino, n�o se dera conta ainda do seu estado atual. Via-se sujo, trazia
seu corpo espiritual com as marcas da agressividade que cometera e n�o entendia por que n�o conseguia encontrar um lugar seguro para descansar.
L�o era alvo das rea��es de seus atos levianos e cru�is, que culminaram com o fim de sua pr�pria exist�ncia. Suas atitudes inconseq�entes e seus desatinos o colocaram
em afinidade com a mis�ria moral. L�o desobedecera �s leis divinas. Sua aten��o voltara-se para o hoje, para as conquistas sem nenhum valor. Era escravo de si mesmo,
tornara-se assassino e suicida por conta de suas ambi��es e paix�es, que o jogaram no lama�al da dor. Ignorara que existe vida depois de amanh�, e � nessa vida verdadeira
que tudo aparecer�, nossas a��es surgir�o sem nenhuma m�scara e iremos perceber que tudo aparece aos olhos de Deus exatamente como foi, ou seja, nossas inten��es,
os desejos que nos levaram a cometer os desatinos e a gravidade de cada ato. Tudo ser� proporcional � consci�ncia que se tem das faltas cometidas.
Desertar a vida nada acrescentar� de bom ao esp�rito. Muito pelo contr�rio. Ele ser� lan�ado aos tormentos relativos �s causas que o produziram e, de maneira geral,
ser� inserido com aqueles que de uma maneira ou de outra tamb�m desvalorizaram a vida ao se entregarem ao sentimento do mal, da cal�nia, do ego�smo, enfim, de todos
os sentimentos mesquinhos que invadem a alma humana quando se vive distra�do e longe das palavras de Jesus.


As conseq��ncias deste estado de coisas s�o o prolongamento da perturba��o espiritual, seguido da ilus�o que, durante um tempo mais ou menos longo, faz o esp�rito
acreditar que ainda se encontra no n�mero dos vivos.
A afinidade que persiste entre a mat�ria e o corpo produz, em alguns suicidas, uma esp�cie de repercuss�o do estado do corpo sobre o esp�rito, que assim ressente,
malgrado seu, os efeitos da decomposi��o, experimentando uma sensa��o cheia de ang�stias e horror. Esse estado pode persistir t�o longamente quanto tivesse de durar
a vida que foi interrompida. Esse efeito n�o � geral; mas em alguns casos o suicida n�o se livra das conseq��ncias da sua falta de coragem e, cedo ou tarde, expia
essa falta, de uma ou de outra maneira.
(O Livro dos Esp�ritos, Cap. I, Livro Quarto.)


Enquanto no mundo espiritual Orlando e L�o seguiam a trajet�ria tra�ada por eles mesmos quando da sua perman�ncia na terra, no mundo f�sico C�ssia tentava reconstruir
sua vida ao lado de Antonieta e Sabina. Guardara no �ntimo de seu cora��o a saudade de seu pai e esquecera de uma vez o tempo em que estivera ligada a L�o.
Dizia a si mesma:
- O passado deve ficar l� atr�s. O que importa agora � fazer tudo com mais intelig�ncia, observar mais as pessoas e ser mais prudente quanto �s decis�es importantes
da minha vida.
Alimentava o desejo de se casar novamente, ter filhos e construir uma fam�lia de verdade, mas ao mesmo tempo receava outra vez.
Antonieta, que se tornara mais silenciosa desde a separa��o de Orlando, lhe dizia:
- Filha, � sensato que seja prudente quanto a iniciar outra rela��o, mas tamb�m n�o pode se fechar tanto dessa maneira.
- O que a senhora quer dizer? - perguntava C�ssia.
- Quero dizer que quando queremos alguma coisa que seja importante para n�s devemos abrir nosso cora��o para receb�-la e reconhec�-la quando chegar. Caso contr�rio,
n�o iremos dar a n�s mesmos a chance de conquistar nosso anseio.
- Explique-se melhor, m�e.
- C�ssia, j� faz algum tempo que seu pai nos deixou. E natural que voc� aja como uma pessoa jovem que tem necessidades pr�prias da juventude. Voc� n�o sai de casa.
O �nico lugar que freq�enta � o seu trabalho na prefeitura, no projeto social, o que � muito nobre. Mas a vida pode lhe dar muito mais na sua quest�o pessoal, ou
seja, um companheiro que a fa�a feliz e a quem voc� tamb�m fa�a feliz.
- M�e, sendo sincera, devo dizer-lhe que tamb�m j� pensei sobre isso e desejo, sim, encontrar uma pessoa digna, honesta, que pense como eu e com a qual possamos
ser felizes juntos. Mas tenho medo de errar e sofrer novamente por conta desse relacionamento.
- Filha, o medo poder� tirar-lhe a oportunidade de ser feliz. Aprendemos com nossos erros. Hoje voc� est� mais madura, mais certa do que quer. Com certeza, estar�
mais atenta, observadora, e acredito que saber� captar bem o car�ter de quem se aproximar de voc�.
- Sua m�e tem raz�o, C�ssia - disse Sabina. - A vida � cheia de prop�sitos, alguns d�o certo, outros n�o. Mas o que conta � a nossa capacidade de sempre acreditar
e recome�ar. A busca pela felicidade � incessante no homem, mas essa mesma busca precisa estar alicer�ada na prud�ncia de seus atos, n�o permitindo que haja nenhuma
marca de tristeza atr�s de si.
C�ssia permaneceu pensativa, com o olhar vago fixado em algum ponto.
- O que foi minha filha, est� com um ar t�o absorto. Em que pensa?
- Decerto em algum pretendente - brincou Sabina.
C�ssia voltou-se para Sabina e disse-lhe, brincando:
- Voc� � mesmo uma bruxa!
- Eu! Por qu�?
- Porque adivinhou exatamente o que passava pela minha cabe�a.
Antonieta logo se manifestou:
- Diga logo, C�ssia, em que ou em quem pensava?
Meio sem gra�a, C�ssia respondeu:
- Tudo bem, estava mesmo pensando em uma pessoa.
- Algu�m especial?
Ainda n�o sei, mas quem sabe n�o venha a ser...
- Podemos saber de quem se trata? N�s conhecemos?
- N�o, m�e, voc�s n�o conhecem. Faz poucos dias que ele come�ou a trabalhar no projeto como volunt�rio e, n�o sei bem explicar por que, senti uma grande atra��o
por ele e acredito que ele tamb�m por mim.
- Ent�o voc�s est�o se relacionando? - perguntou Antonieta.
- N�o, m�e, n�o da maneira como est� pensando. Somos apenas amigos... Pelo menos por enquanto - completou sorrindo.
- Ficamos felizes por voc�, n�o � Sabina?
- Claro, dona Antonieta.
Em meio � alegria que reinava entre as tr�s mulheres, Antonieta sentiu a saudade de Orlando apertar seu peito. C�ssia percebeu a s�bita mudan�a de sua m�e.
- O que foi m�e? Ficou triste de repente! - exclamou.
Duas l�grimas desceram pelo rosto de Antonieta.
- Sinto muita saudade de Orlando, minha filha. Foram muitos anos juntos em uma uni�o feliz, e agora que me encontro s� sinto a saudade machucar meu cora��o de uma
forma dolorosa.
C�ssia sentiu grande ternura por aquela mulher valente que enfrentava sua dor com dignidade. Sabia quanto era dif�cil para ela a separa��o, mas jamais a viu questionar
a vontade de Deus.
- M�e querida - disse-lhe abra�ando-a -, lute contra a melancolia, n�o caia no abatimento que enfraquece a nossa vontade. Lembre-se de quanto Deus foi bom colocando
ao seu lado um homem que a amou e a respeitou durante toda uma vida. Se Deus o chamou primeiro, uma raz�o, que foge � nossa compreens�o, deve existir, mas que tem
seu lugar na grande sabedoria divina.
Sabina, aproveitando o momento, disse-lhe:
- Dona Antonieta, a separa��o � curta, se considerarmos a eternidade que temos pela frente. O senhor Orlando, creio eu, est� muito bem, seguindo os passos de sua
evolu��o, e tamb�m deve sentir saudade da senhora. Mas sabe que um dia, em algum lugar, voc�s se encontrar�o novamente, e aguarde esse dia com f� no amor de Deus.
- Voc�s t�m raz�o, desculpem-me pela minha fraqueza.
- Isso n�o � fraqueza, dona Antonieta, de forma alguma. E apenas saudade, um sentimento inerente ao ser humano. Quando ela � calma, silenciosa, fruto do sentimento
do amor, e n�o da revolta, n�o faz mal algum, porque sofrimento com Jesus � sofrimento equilibrado e nos fortalece como criaturas de Deus. Muitas vezes, esse sentimento
nos d� for�as para continuar vivendo.
C�ssia, escutando a velha amiga falar, comoveu-se.
- Sabina, ouvindo-a falar, expor suas id�ias, parece-me que guarda em seu cora��o um sentimento de tristeza ou de saudade, n�o sei ao certo, mas o seu parece-me
um cora��o ferido. � verdade ou del�rio meu?
Diante do sil�ncio de Sabina e da express�o de ang�stia de seus olhos, C�ssia deduziu que n�o era del�rio, mas a express�o da verdade.
Pensou: "Ela sofre. Guarda um segredo em seu peito durante todos esses anos. Gostaria de ajud�-la, mas n�o sei como". Insistiu.
- Sabina, sei que sofre calada todo esse tempo e gostaria de ajud�-la, se voc� permitir.
- Deixe-a em paz, C�ssia, voc� est� sendo invasiva em uma quest�o que n�o lhe diz respeito. Se isso que diz � verdade, e nesse tempo todo que Sabina est� na nossa
fam�lia nunca manifestou desejo de se abrir conosco, � porque n�o quer tocar em um assunto que a machuca, e devemos respeitar sua posi��o.
C�ssia percebeu que tinha ido longe demais.
- Desculpe-me, Sabina, de forma alguma tive a inten��o de mago�-la, apenas achei que podia ajud�-la a aliviar suas tens�es, s� isso. Aprendi que � muito bom quando
desabafamos nossas dores, nossos problemas, com pessoas que nos amam.
At� ent�o, Sabina permanecera calada. Ao ver C�ssia se desculpando, sentiu que talvez fosse � hora de tamb�m desabafar com algu�m. Estava com as pessoas que a amavam,
que sempre a respeitaram, pessoas nas quais podia confiar. Resolveu se abrir.
- N�o precisa se desculpar, C�ssia, voc� est� certa. Trago em meu cora��o uma dor que sempre me consumiu, dor essa que nunca conseguiu se acalmar e que suporto somente
porque amo Jesus e sei que sou amada por Ele. Sei tamb�m que nada acontece em nossa vida sem causa justa, e � por isso que entreguei meu sofrimento a Jesus, para
que Ele me auxiliasse e me desse suporte para continuar minha caminhada. Colocou-me em meio a pessoas que sempre me trataram com delicadeza e considera��o, e isso
foi de extrema import�ncia na minha vida. Sou grata a dona Antonieta e ao senhor Orlando, que me acolheram quando bati em sua porta, e tamb�m a voc�, C�ssia, que
se tornou uma filha para mim.
- Sabina, se n�o for de sua vontade, n�o precisa se expor. Entendemos e admiramos sua postura sempre correta em todas as situa��es. Nada muda em nossa rela��o de
amizade. Sempre ser� a melhor amiga que tivemos nesta vida.
- Obrigada, dona Antonieta, mas quero, sim, me abrir com voc�s. Acho que chegou � hora do desabafo, e ningu�m melhor que voc�s para compreender minha ang�stia de
tantos anos. Agora � o momento, e n�o vou perd�-lo.
- Voc� � quem sabe, querida amiga. Estamos aqui para ouvi-la e ajud�-la no que precisar.
- Quero falar, sim. Na realidade, sempre esperei por este momento. Sabia que um dia isso aconteceria e eu poderia aliviar um pouco o meu cora��o.
C�ssia segurou as m�os de Sabina querendo, com esse gesto, mostrar-lhe que podia confiar tanto nela quanto em sua m�e. Queria dar-lhe coragem e retribuir tudo o
que fizera por ela.
- Estamos inteiramente a seu dispor, Sabina, fique absolutamente � vontade. Iremos ouvi-la com toda a considera��o que voc� merece.
Sabina suspirou fundo e iniciou sua narrativa.
- Dona Antonieta, a senhora se lembra do dia em que bati na sua porta?
- Claro que me lembro Sabina. Era t�o nova ainda, trazia uma pequena mala nas m�os, uma carta de recomenda��o de uma amiga querida e os olhos tristes.
- C�ssia era ainda um beb�. A senhora e o senhor Orlando me acolheram sem nada perguntar ou questionar, e sempre fui agradecida por isso, tanto que dediquei toda
a minha vida a voc�s e, posteriormente, � minha menina C�ssia.
- Apenas respeitamos voc�, Sabina. Confi�vamos na nossa amiga e sab�amos que n�o nos enviaria algu�m que n�o merecesse confian�a.
- Deram-me a tarefa de cuidar da casa e olhar a pequena C�ssia.
- O que voc� fez muito bem! - exclamou Antonieta. - Tornou-se parte da nossa fam�lia.
- Mas diga-nos o que esconde esse olhar triste que somente agora pude perceber - falou C�ssia.
- Quando aqui cheguei, trouxe uma hist�ria de sofrimento muito grande. Havia terminado um relacionamento com um homem bem mais velho que eu, uni�o essa exigida pelos
meus pais a troco de dinheiro. Eles me venderam. Fui muito infeliz, sofri maus-tratos f�sicos e morais, apanhava quase que diariamente, vivia cheia de hematomas
e dores pelo corpo.
C�ssia, interrompendo o relato de Sabina, disse:
- Voc� foi vendida, Sabina, mal posso acreditar que isso existe!
- Existe mais do que voc� pensa, C�ssia, principalmente entre as pessoas de baixa renda. Meus pais n�o fugiram � regra. Naquela �poca, isso era comum na minha pequena
cidade, onde a maioria dos habitantes era miser�vel.
- Ent�o, era por isso que n�o suportava as agress�es de L�o, n�o � Sabina?
- Sim, tinha medo que chegasse ao ponto que havia chegado comigo. Conhe�o um mau-car�ter de longe, C�ssia.
- Continue - pediu Antonieta.
- Ap�s dois anos de uni�o, fiquei gr�vida e o sofrimento, em vez de diminuir, aumentou. Meu marido n�o queria filhos e n�o escondeu a sua raiva ao saber da minha
gravidez.
- E como foi essa gesta��o, Sabina, com todo esse trauma? - perguntou Antonieta.
- Desenvolveu-se, dona Antonieta, porque Deus assim o quis. Em nenhum momento fui ao m�dico, tive p�ssima alimenta��o, sem contar as agress�es, que continuaram para
ver se eu abortava como ele dizia.
- Voc� n�o serve nem para perder esse filho - dizia Ti�o, na sua loucura.
Nesse ponto, C�ssia, lembrando-se da imensa vontade de ser m�e, n�o suportou tamanha insanidade e chorou copiosas l�grimas.
- N�o posso acreditar em tamanha maldade - dizia. Antonieta, mais controlada que a filha, perguntou:
- E onde est� essa crian�a, Sabina, seu filho?
Nesse ponto foi � vez de Sabina deixar fluir sua dor nas l�grimas que derramou.
- Depois que ele nasceu, ficou ao meu lado somente por seis meses, o tempo em que tive leite para amament�-lo. No fim desse tempo, Ti�o entregou a crian�a para minha
m�e, com a finalidade de ajud�-la a conseguir um pouco de dinheiro. Tudo fiz para reaver meu filho, um menino, mas Ti�o levou-me � for�a para uma cidade vizinha
para passar uns tempos, como ele dizia. Fiquei praticamente presa em um s�tio, sem poder sair e vigiada dia e noite. Passados vinte dias, mais ou menos, levou-me
de volta � nossa casa. L� chegando, fui direto � casa de meus pais buscar meu filho, e a minha surpresa foi saber que, enquanto estive fora, minha m�e repetira o
ato insano que havia feito comigo, ou seja, vendera meu filho para um casal de estrangeiros que, em seguida, voltara a seu pa�s. Desesperada, arrumei minhas poucas
roupas e sa� de casa sem rumo, como uma dementada. Depois de dois dias, cheguei a esta cidade suja, faminta, em farrapos. Fui pedir aux�lio em um centro esp�rita,
e l� conheci dona Aur�lia, sua amiga, dona Antonieta. Ela me hospedou por alguns dias em um quartinho nos fundos do centro ate que me recuperasse e ostentasse uma
apar�ncia melhor. Enquanto l� estive, dona Aur�lia me ensinou muita coisa. Falou de Deus, das nossas provas e da vida futura. Deu-me muitos livros para ler e, por
meio desses ensinamentos, aconteceu meu encontro com Deus. Aprendi a perdoar, estudei todos os livros e soube de muita coisa, o resto, a senhora j� sabe. Sua amiga
soube que a senhora precisava de algu�m para ajud�-la e me apresentou.
Tudo deu certo. Estava feliz da maneira que conseguia estar. O tempo � senhor de tudo, alivia nossas feridas e acalma nosso cora��o. Mas nunca pude esquecer os olhinhos
de meu filho me olhando. A saudade se instalou em meu peito e me acompanha desde ent�o.
Antonieta e C�ssia n�o conseguiam segurar as l�grimas que desciam por suas faces.
- Voc� tem esperan�a de encontr�-lo, Sabina? - perguntou C�ssia.
Com tristeza nos olhos, ela respondeu:
- Sonhei com isso minha vida inteira, C�ssia, mas o tempo est� me dizendo que sonho em v�o. � praticamente imposs�vel depois de tantos anos.
- Nada � imposs�vel para o nosso Criador, Sabina, voc� mesma me ensinou isso. Quantas vezes me disse isso! Portanto, se estiver nos planos de Deus seu encontro com
seu filho, um dia isso acontecer� - disse-lhe Antonieta, enxugando as l�grimas.
- Sabina, voc� sabe que idade ele teria agora?
- Claro, C�ssia, todos os anos, no dia de seu anivers�rio, canto parab�ns para ele. Ele � um pouco mais velho que voc�. Deve estar com vinte e seis anos.
- Temos quase a mesma idade, uma diferen�a de meses - disse C�ssia.
- Sim - confirmou Sabina. - Voc�s t�m quase a mesma idade.
- � por isso que sempre me quis como a uma filha, n�o?
- Sim. Dei a voc� todo o meu carinho de m�e, carinho esse que me impediram da dar ao meu filho.
- Voc� n�o deu fisicamente, minha amiga - disse Antonieta -, mas a sua vibra��o de amor, seu carinho sincero e saudoso percorreu o espa�o e, com certeza, o alcan�aram,
n�o importa onde.
Sabina, novamente enxugando as l�grimas, disse:
- Obrigada, voc�s me fazem muito bem, aliviam minha dor sufocada por tantos anos. Agora sei que deveria ter-lhes contado ha mais tempo.
- N�o, Sabina, voc� contou no momento certo. Agora � a hora, e nossa conversa n�o foi por um simples acaso, existe a interfer�ncia de Deus.
- Mais uma vez obrigada. C�ssia. Obrigada, dona Antonieta, por tudo o que fez por mim sem nenhum interesse, a n�o ser pela generosidade. A minha gratid�o me acompanhar�
pela eternidade.
C�ssia, levantando, abra�ou Sabina com muito carinho e disse
- Agora chega de tristeza! Vamos permitir que a alegria acalme nosso cora��o. Vamos comemorar esse encontro em que nossas almas se entrela�aram e se uniram para
sempre pela compreens�o e pelo carinho que sentimos uma pela outra. A amizade sincera e sem interesse �, sem d�vida, um presente de Deus.
- Concordo com voc�, minha filha. Agora s� falta Sabina fazer aquele ch� de ma�� que s� ela sabe fazer.
- Com os biscoitinhos de coco - completou C�ssia.
Feliz, Sabina levantou-se e disse sorrindo:
- Preciso s� de cinco minutos, tudo bem?
- Tudo bem - responderam Antonieta e C�ssia ao mesmo tempo.



Cap�tulo 9
O despertar do amor


O tempo transcorria seguindo seu curso natural. Na resid�ncia de Antonieta, a rotina, aos poucos, ia se instalando, cada uma guardando em seu �ntimo sua saudade
e suas esperan�as.
Enquanto Sabina sentia-se aliviada em raz�o do seu desabafo com as pessoas que amava, Antonieta trazia o cora��o machucado pela saudade de Orlando, seu companheiro
de tantos anos. N�o raro seus olhos marejavam, deixando cair sentidas l�grimas. Tentava esconder de sua filha a ang�stia que trazia em seu peito ferido pela separa��o.
C�ssia a cada dia se dedicava mais ao seu trabalho volunt�rio no projeto da prefeitura local. Estreitara sua amizade com Frank, rapaz que h� pouco tempo chegara
� cidade e que, encantado com a obra social, filiara-se ao quadro de volunt�rios. Sentia por ele um carinho que reconhecia ser um pouco al�m de simples amizade.
Acostumaram-se a manter longas conversas sempre que deixavam a ch�cara ou mesmo entre as verduras e flores que encantavam C�ssia.
Em um desses momentos, Frank lhe disse:
- Tenho observado como voc� admira as flores, com que cuidado segura suas hastes e cheira seus perfumes. Foi sempre assim ou essa paix�o nasceu no envolvimento com
este projeto social?
Sorrindo, C�ssia respondeu:
- N�o, Frank, n�o nasceu neste projeto. Algum tempo atr�s, quando ainda morava na capital, tinha em minha casa uma grande estufa onde cultivava orqu�deas e brom�lias.
Essa estufa era o meu ref�gio, o lugar onde silenciava e ia � busca de mim mesma.
- Quer dizer que n�o morava nesta cidade? - perguntou Frank.
- Nasci aqui, fui para a capital para estudar e l� me casei.
Espantado, Frank perguntou:
- Voc� � casada?
Uma leve nuvem de tristeza passou pelos olhos de C�ssia.
Frank percebendo, completou:
- Desculpe-me se estou sendo indiscreto. Se n�o quiser, n�o responda. N�o tenho o direito de invadir sua privacidade.
- N�o est� invadindo minha vida, Frank - respondeu C�ssia docemente. - Nada tenho a esconder. Hoje j� posso falar sobre meu passado sem me deixar abater. Aprendi
que o passado faz parte de minha vida para sempre, mas n�o preciso carreg�-lo comigo com todo o seu conte�do. Trago em meu cora��o somente as boas recorda��es.
- Devo imaginar que nem tudo foram flores para voc�, acertei?
- Acertou.
- E seu marido, voc�s se separaram?
- Sim. Na realidade, nos separamos duas vezes, e as duas por vontade dele.
- Desculpe-me, mas n�o estou entendendo o que quer dizer.
- Quero dizer que ele pediu a separa��o porque n�o me amava e se envolveu com outra mulher. Algum tempo depois, n�o suportando o peso dos pr�prios erros e os desatinos
que praticou, tirou a pr�pria vida.
- Voc� gostaria de falar sobre isso?
- Outro dia sim. Hoje, se n�o se importa, n�o.
- Claro que n�o me importo C�ssia, outro dia falaremos sobre isso, se assim voc� quiser.
- Diga-me, Frank, o que o trouxe a esta cidade pequena, t�o sem possibilidades, um rapaz culto, educado e gentil como voc�? Toda a sua fam�lia veio tamb�m?
- N�o, C�ssia vim sozinho. Minha fam�lia est� toda na Am�rica.
- E qual a raz�o de deix�-los? O que veio fazer aqui neste fim de mundo, como dizem?
- Vim em busca da minha identidade, saber a minha origem, de quem � o sangue que corre nas minhas veias, enfim, saber na realidade quem eu sou.
Surpresa, C�ssia indagou:
- N�o entendo o quer dizer. Sua fam�lia n�o est� na Am�rica?
- Sim, a fam�lia que me criou, me fez homem de verdade, deu-me estudo e dignidade. A fam�lia que me amou praticamente desde o meu nascimento.
- Voc� quer dizer que n�o � filho leg�timo?
- Isso. Fui adotado quando ainda era beb�.
- S� agora soube disso?
- N�o. Meus pais nunca me esconderam a verdade nem poderiam, pois a minha est�tica � completamente diferente da de todos os membros da fam�lia, mas isso n�o os impediu
de me amar.
- Por que especialmente esta cidade?
- Porque me disseram que minha origem est� por aqui, n�o propriamente nesta cidade, mas nos arredores dela.
C�ssia notou em Frank o desejo de encerrar o assunto.
- Vamos deixar esse assunto para outro dia. Pelo que percebo, n�s dois temos motivos para nos emocionar falando do nosso passado, apesar de sua quest�o ser do presente.
- Tem raz�o. � o meu presente trazendo as rea��es do meu passado. Mas n�o estou infeliz, estou apenas ansioso, o que imagino ser natural.
Querendo trazer alegria �quele momento, C�ssia perguntou:
- Voc� n�o gostaria de ir at� minha casa conhecer minha m�e?
- Claro! Quando voc� quiser.
- Vamos marcar ent�o. Agora preciso ir, Frank, se demoro muito minha m�e fica nervosa. Ela ficou muito sens�vel desde a morte de meu pai.
- Seu pai � falecido?
- Sim.
- Sinto muito, C�ssia.
Despediram-se.

***

Chegando em casa, n�o encontrou a m�e nem Sabina.
Perguntou a si mesma: "Onde ser� que essas duas foram? Bem, enquanto aguardo, vou tomar banho e esperar o jantar".
Mais tarde, ao escutar o som de vozes na cozinha, desceu ao encontro de Antonieta e Sabina.
- Oi, filha - disse sua m�e -, n�o sabia que j� estava em casa.
- Tamb�m cheguei e n�o encontrei ningu�m em casa. Podem me dizer onde estavam? Imagino que fazendo compras.
- Engano seu, minha filha, fomos ao Centro Esp�rita.
- N�o sabia que estavam freq�entando o centro. Isso me alegra muito.
- H� algum tempo vamos �s reuni�es � tarde e vou lhe dizer filha, est� fazendo um grande bem para n�s. Todas as tardes voc� vai para o projeto. Resolvemos, ent�o,
ir pelo menos uma vez por semana.
- Voc�s fazem muito bem! - exclamou C�ssia. - Gostaria de ir um dia com voc�s.
- Quando voc� quiser.
- Conte para C�ssia, dona Antonieta, o que aconteceu hoje.
Curiosa, C�ssia perguntou � m�e:
- O que foi que aconteceu, m�e, conte-me logo!
- Filha, em uma das reuni�es, pedi ao mentor da casa que trouxesse not�cias de seu pai, e hoje fui agraciada com a resposta ao meu pedido.
- Verdade, m�e? E o que foi que ele disse?
Enxugando duas l�grimas que brotaram em seus olhos, Antonieta falou:
- Disse-nos que ele est� muito bem, adaptado � nova vida, freq�entando as palestras de madre Teresa e se preparando para iniciar um trabalho.
Emocionada, C�ssia tamb�m deixou l�grimas de saudade molhar seu rosto.
- Que bom, m�e, saber que papai est� bem e feliz. Ser� que ele pensa em n�s?
- Sim, filha. Segundo o mentor, ele ora por n�s para que tenhamos uma vida tranq�ila dentro dos padr�es divinos. Disse, ainda, que ele tamb�m sente saudade e a transforma
em vibra��es de amor e carinho.
Sabina, ap�s alguns instantes, disse:
- Se todos os homens soubessem da vida depois de amanh�, quando entregamos nosso corpo f�sico a terra, controlariam melhor seus atos em rela��o ao pr�ximo e a si
mesmo. Andariam menos distra�dos. Seriam mais sensatos e prudentes e amariam mais.
- Mas a humanidade ainda est� longe de perceber isso, Sabina - disse C�ssia. - Acham erroneamente que tudo se acaba com a morte do corpo, e que ningu�m prestar�
contas sobre o que fez com sua vida aqui na Terra. Em raz�o disso, entregam-se � gan�ncia do poder, � satisfa��o de si mesmos e excluem de sua vida aqueles que nada
podem lhes oferecer.
- C�ssia, o amanh� chega para todos, e n�o adianta negar isso. Na realidade, ningu�m sabe se amanh� acordar� aqui ou na espiritualidade.
- Essa � uma verdade que atingir� a todos - disse Antonieta - � preciso ser feliz a cada minuto com o que temos para sermos felizes. A felicidade possui muitas formas,
e uma delas � perceber que viver � a nossa grande chance. Eu aprendi isso, minha filha. Quase ca� na auto-compaix�o quando seu pai se foi. Para mim, n�o existia
mais nenhuma possibilidade de ser feliz. Freq�entando as reuni�es do centro, consegui entender que ainda posso ser feliz como fiquei hoje ao saber que seu pai est�
bem. Ensinaram-me que felicidade � uma conquista da nossa alma, � um estado que s� n�s podemos criar.
- M�e, que bom ouvi-la falar assim. Eu tamb�m acredito nisso. Sei que podemos, n�s tr�s juntas, encontrar o caminho seguro.
Querendo mudar o rumo da conversa, C�ssia disse:
- Voc�s se lembram quando falei que conheci um rapaz l� no projeto que...
- Que voc� ficou interessada? - continuou Sabina.
Rindo, C�ssia respondeu:
- Vamos dizer que sim.
- Claro que lembramos filha. O que tem ele?
- N�s estamos nos dando muito bem, existe uma amizade muito sincera entre n�s, uma grande afinidade.
- E da�?
- Da� que hoje estivemos por um longo tempo e ele me contou sobre sua vida e o porqu� de ter vindo para o Brasil, principalmente para a nossa cidade.
- E por que foi? - perguntou Antonieta, demonstrando curiosidade.
- Sua m�e adotiva lhe disse que sua origem est� nos arredores desta cidade, e ele veio em busca da verdade.
- Que interessante - disse Antonieta. - � dif�cil a m�e adotiva ajudar na busca da m�e biol�gica.
- Ele sempre soube a verdade, nunca esconderam nada dele.
- �, mas vai ser dif�cil encontrar sua m�e depois de tantos anos, principalmente por n�o ter por onde come�ar.
- Ele sabe disso, mas n�o vai desistir.
- Para Deus nada � imposs�vel!
- Por falar nisso, m�e, voc� se incomodaria se eu o trouxesse aqui em casa para conhecer as duas pessoas que mais amo nesta vida?
- Claro que n�o, C�ssia, vou adorar conhecer a pessoa que est� fazendo o cora��o de minha filha bater mais forte.
- M�e, pelo amor de Deus, n�o vai falar isso perto dele, hein!
Sabina respondeu:
- C�ssia, � claro que sua m�e n�o vai se intrometer a esse ponto, nem eu. Portanto, pode trazer seu futuro namorado para nos conhecer.
Admirada com a coloca��o de Sabina, C�ssia respondeu:
- Por que est� dizendo isso, Sabina, voc� nem o conhece, e ele n�o � meu namorado.
- Por nada, C�ssia, apenas intui��o, nada mais.
- Ent�o est� certo. Quando aparecer a oportunidade eu o trago aqui.
- Ficaremos aguardando.

***

- Fico contente ao ver C�ssia assim animada, Sabina, parece-me que j� superou toda a ang�stia vivida por conta da crueldade de L�o.
- Acredito que ela nem pense mais nele, dona Antonieta. Esta t�o animada com essa amizade nova, com seu trabalho volunt�rio! Faz plano para sua vida, e isso � um
�timo sinal.
- Gra�as a Deus tudo voltou ao normal na nossa vida. Se n�o fosse a aus�ncia de Orlando, diria que vivemos a felicidade plena.
- Vou lhe dizer uma coisa, dona Antonieta, a felicidade plena n�o existe aqui na Terra, que � um planeta de expia��es e provas. Mas existe a felicidade compat�vel
com nossa realidade como criaturas imperfeitas que somos. Necess�rio se faz saber perceb�-la.
- �, Sabina, voc� � realmente uma pessoa especial! - exclamou Antonieta.
Sabina levantou-se e, sorrindo, dirigiu-se � cozinha.



As pessoas felizes vivem no mesmo mundo de expia��es e provas. Sofrem, lutam e enfrentam problemas, dificuldades, dores e enfermidades, entretanto fazem a op��o
de serem felizes.
Mas o que � optar pela felicidade?
Em primeiro lugar, � superar a tend�ncia humana de cair na auto-compaix�o. E entender que n�o se deve cultivar a m�goa, � n�o se machucar com uma vis�o pessimista
e desajustada da vida, mas conseguir ver as marcas de Deus em todos os momentos de sua exist�ncia, em todos os cantos do Universo, porque a felicidade � subordinada
ao que fazemos dela.
Como disse Francisco de Assis, a felicidade � conquista interior; � um estado que s� n�s podemos criar, cultivando nossos valores e alegrias da nossa alma.



Cap�tulo 10
A visita de Orlando ao lar terreno


Orlando a cada dia se fortalecia mais. Freq�entava com assiduidade as palestras, conseguira pequenos trabalhos que fazia com alegria. Sentia saudade de sua esposa
e filha, que ficaram na Terra, mas nessas horas Eneida o fortalecia com energia salutar, dizendo que a separa��o de nossos entes queridos sempre vai acontecer em
algum momento, e nessas horas nos fortalecemos por peio da f� em nosso Criador, na certeza de Sua justi�a, sabedoria e bondade, que tudo promove para que a evolu��o
de suas criaturas possa seguir o processo natural.
Orlando ouvia-a com aten��o e voltava ao seu equil�brio, esperando e confiando que um dia o encontro se daria novamente.
Recebia not�cias de seus familiares e alegrava-se em saber que caminhavam com prud�ncia, sempre respeitando as leis divinas. Isso o confortava e, cada vez mais,
se entregava �s ora��es e ao trabalho.
Acostumara a se sentar todas as tardes em frente ao lago azul e entregar-se �s medita��es, orando a Jesus em agradecimento pelas b�n��os recebidas. Em uma dessas
ocasi�es, Eneida veio ao seu encontro.
- Posso lhe fazer companhia, Orlando?
Feliz, ele respondeu:
- Claro, sua presen�a traz alegria ao meu esp�rito.
- Orlando, temos observado seu equil�brio, seu esfor�o e sua dedica��o ao trabalho que lhe foi destinado. Em vista disso, Jacob conseguiu autoriza��o para lev�-lo
at� a crosta terrena.
Orlando levou um susto.
- Voc� est� querendo dizer o que eu estou pensando, Eneida?
Brincando com o amigo, Eneida respondeu:
- N�o sei em que est� pensando!
- Sabe sim, minha amiga.
- Sei sim, Orlando, apenas brinquei com voc�. � o que est� pensando.
- Nem ouso dizer, tamanha felicidade invade o meu ser!
- Voc� ir� at� a Terra acompanhando uma equipe. L� foi permitido que visite seu antigo lar terreno para ver sua esposa e filha.
- Meu Deus, como posso agradecer? - exclamou.
- Agrade�a a Jesus por essa oportunidade, Orlando. Prepare-se para n�o perder seu equil�brio, � de suma import�ncia que mantenha sua estabilidade emocional.
- Vou me esfor�ar ao m�ximo, Eneida, pois n�o quero perder essa chance de ver minha esposa e minha filha e saber exatamente como est�o. Quando iremos?
- Logo virei cham�-lo. Enquanto aguarda, se entregue � prece que acalma, renova e fortalece.
Assim que Eneida se ausentou, Orlando elevou seu pensamento a Jesus e orou ao divino Amigo.

Senhor, olhe por mim e proteja-me para que possa usufruir desse benef�cio que o Senhor me concede. Sou-Lhe agradecido, Divino Mestre, e me esfor�arei para ser merecedor
dessa b�n��o. Assim seja.

Passados alguns instantes, Eneida voltou e, tendo Orlando a seu lado, agrupou-se � equipe que, comandada por Jacob, descia a crosta terrena. Como era a primeira
vez que Orlando participava dessa viagem, para ele tudo era novidade, e se encantava com o processo de volita��o, que fazia apoiado em Eneida. Seguindo a orienta��o
de Jacob, deixava a curiosidade de lado e mantinha-se em prece.
A equipe, em segundos, estava na pra�a central da pequena cidade onde Orlando vivera. Enquanto ia em cumprimento � miss�o para qual descera � Terra, Eneida seguiu
com Orlando ao seu antigo lar. Ao se aproximar da porta de entrada de sua antiga casa, ver o jardim florido, bem cuidado, tudo como antigamente, Orlando sentiu uma
emo��o forte. Eneida, experiente, apoiou o amigo, beneficiou-o com energia salutar e, juntos, oraram a Jesus pedindo aux�lio.
- Est� bem? - perguntou ao amigo.
- Estou, Eneida, foi s� um momento de extrema emo��o.
- Isso � perfeitamente natural, Orlando, � a primeira vez que retorna ao lugar onde passou anos de sua exist�ncia terrena. � compreens�vel que aconte�a. S� n�o deve
prolongar essa emo��o, mantenha-se com o pensamento no Mais Alto e veja esta situa��o como um grande benef�cio concedido.
- Eu sei Eneida, vou ficar bem.
- Vamos entrar. Est� preparado ou prefere esperar um pouco mais.
- N�o, podemos entrar - respondeu Orlando, ainda levemente emocionado.
Entraram.
Encontraram Sabina na cozinha preparando a refei��o.
- Grande esp�rito esse - disse Eneida. - Forte, altru�sta, possui muitos amigos na espiritualidade. Cumpre sua tarefa com valentia, sem nunca perder a f�.
- Tem raz�o - concordou Orlando. - Antonieta e eu devemos muito a essa grande amiga.
Aproximou-se de Sabina e passou, com delicadeza, as m�os em seus cabelos, como sempre, presos em um coque. Sens�vel, Sabina sentiu a vibra��o dos dois esp�ritos,
elevou o pensamento em Jesus e disse: "Senhor, seja quem for que estiver aqui, que seja aben�oado por V�s".
- Veja Orlando, a tranq�ilidade com a qual esta irm� se dirige ao Senhor! Isso vem da confian�a em seu Criador, da certeza que, a um pensamento de amor que se dirige
ao Pai, o aux�lio vem a galope. N�o sente medo, entende as fraquezas do pr�ximo, seja encarnado ou desencarnado, porque sentiu na pr�pria pele o que � viver ang�stias
e pesadelos, e tem consci�ncia de que cada um reage diferente perante as diversas situa��es de sofrimento.
- Que Jesus a aben�oe - disse Orlando.
Eneida convidou-o gentilmente:
- Vamos ver Antonieta?
- Claro, � o que mais anseio - respondeu Orlando, sentindo leve ansiedade.
Eneida, percebendo, orientou-o:
- Mantenha-se em sintonia com nosso Mestre. N�o permita que a emo��o o desequilibre.
Adentraram o local onde Antonieta atentamente se entregava a confec��o de roupinhas para os enxovais que a Casa Esp�rita que freq�entava com assiduidade entregava
�s gestantes carentes.
Orlando se surpreendeu.
- H� quanto tempo ela se entrega a essa atividade? - perguntou a Eneida.
- N�o faz muito tempo, Orlando. Em suas idas �s reuni�es esp�ritas, tomou conhecimento desse trabalho que a casa oferece e se prontificou a auxiliar. Essa atividade
vai fazer muito bem ao cora��o dela, t�o sofrido pela saudade que sente de voc�. O trabalho edificante � o b�lsamo para muitas dores - completou Eneida.
Orlando se aproximou mais da esposa que deixara na Terra e, num gesto de imenso carinho, alisou seu rosto, seus cabelos e deu um beijo em sua face. Antonieta n�o
p�de sentir a presen�a de pessoa t�o querida para ela, mas veio-lhe a lembran�a de Orlando, e seu cora��o foi invadido pela saudade. Pensou: "Que interessante! De
repente me veio uma grande saudade de Orlando. Meu Deus, como ser� que ele est�? Sempre foi uma pessoa t�o boa, bom marido, bom pai, enfim, Deus deve t�-lo recebido
em seu reino".
Feliz em sentir o carinho que sua esposa ainda tinha por ele, respondeu, mesmo sabendo que Antonieta n�o o ouviria:
- Estou bem, minha querida companheira, fui recebido pelos esp�ritos amigos, auxiliado nos meus primeiros dias e sigo minha evolu��o aprendendo a ser uma criatura
melhor. Estou feliz, apesar da saudade que sinto de voc� e de C�ssia. Um dia nos encontraremos novamente, se Deus assim o permitir. Siga seu caminho sempre com Jesus
no cora��o. Cuide de nossa filha e auxilie quanto puder o seu pr�ximo. Esse � o caminho!
Antonieta n�o p�de registrar nenhuma das palavras dele, mas sentiu paz e tranq�ilidade em seu cora��o.
- Ele deve estar bem, tenho certeza de que sim.
Em um �mpeto de amor para com aquele que dividira anos de na vida ao seu lado, disse em uma prece:
- Obrigado, Orlando, por ter sido o melhor companheiro que eu podia desejar. Fui feliz com voc� e agora s� almejo a sua felicidade no reino de Deus. Se sofro, n�o
importa, s� quero que seja feliz. Que Jesus o aben�oe.
Orlando fitou Eneida visivelmente emocionado. Ela, sens�vel ao momento importante que vivia seu amigo, disse-lhe:
- Esta � a recompensa dos homens de bem, Orlando, daqueles que n�o se esquecem de que existe vida depois de amanha e que vivem como verdadeiras criaturas de Deus.
Vamos agora ver C�ssia?
- Vamos! - exclamou Orlando. - Quero muito ver como esta minha querida filha.
Seguiram.
Encontraram C�ssia no projeto conversando com Frank. Orlando estranhou e perguntou a Eneida:
- Quem � esse que conversa t�o animado com minha filha?
Eneida percebeu que o sentimento do ci�me atacou o esp�rito de Orlando.
- Orlando, o ci�me n�o cabe em um esp�rito, principalmente naquele que j� encontrou o caminho da luz, como � o seu caso.
Orlando percebeu sua imprud�ncia e sentiu-se envergonhado.
- Perdoe-me, Eneida, fui imprudente.
- N�o se culpe tanto, Orlando, isso � natural quando ainda se est� no processo de aprendizado. Voc� est� indo muito bem, meu amigo, se assim n�o fosse n�o estaria
aqui agora visitando seus familiares. Isso � um merecimento.
- Eu sei e sou muito agradecido a Jesus por poder retornar ao meu antigo lar terreno, ver minha companheira e minha filha, certificar-me de que est�o bem.
- Esta � a recompensa dos homens de bem, Orlando!


O verdadeiro homem de bem � aquele que pratica a lei de justi�a, de amor e de caridade em sua maior pureza. Se interroga a consci�ncia sobre seus pr�prios atos,
pergunta a si mesmo se n�o violou essa lei; se n�o fez o mal e se fez todo o bem que podia; se negligenciou voluntariamente uma ocasi�o de ser �til; se ningu�m tem
o que reclamar dele; enfim, se fez a outrem tudo o que quereria que se fizesse para com ele. (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XVI.)


- Agora, Orlando, vou responder � pergunta que voc� me fez - disse Eneida. Esse irm�o que conversa com C�ssia � aquele que ir� faz�-la feliz, meu caro Orlando.
- Como assim? - perguntou Orlando.
- O caminho deles est� tra�ado. S�o duas almas que se conhecem h� muito tempo, se amam e juntos cumprir�o os des�gnios do Pai.
- Mas eles mal se conhecem e j� v�o se unir?
- Orlando, tome conta de seus pensamentos, passe-os pelo crivo da raz�o e da sensatez. Eles se encontraram h� pouco tempo aqui na Terra e houve a simpatia m�tua,
mas, pela limita��o do corpo f�sico, precisar�o se descobrir de verdade nessa roupagem. A liga��o do pret�rito lhes dar� a sensa��o de que se conhecem h� muito tempo,
e isso facilitar� esse reencontro.
Diante da surpresa que Orlando demonstrou e desses esclarecimentos, Eneida lhe disse:
- Tranq�ilize-se, eles ser�o felizes. C�ssia finalmente encontrou seu verdadeiro amor. Agora se aproxime dela e lhe d� o carinho que guarda em seu esp�rito.
Orlando seguiu o conselho de sua amiga. Aproximou-se da filha e depositou um beijo em sua testa, dizendo-lhe:
- Eu amo voc�, minha filha e, se Jesus permitir, irei proteg�-la sempre para que nunca se desvie do caminho do bem. Seja uma fiel seguidora das palavras do Mestre,
sem fanatismo, mas uma tarefeira l�cida e verdadeira, que possui como objetivo a pr�tica do bem.
C�ssia, assim como acontecera com Antonieta, sentiu uma doce saudade de seu pai invadir-lhe a alma. Frank, percebendo a transforma��o que ocorrera em sua amiga,
perguntou-lhe:
- O que foi C�ssia, senti que sua fisionomia se transformou. Algum problema?
- � estranho, Frank, de repente senti uma enorme saudade de meu pai e um amor muito grande por ele. Um amor assim inteiro, forte, que n�o diminui com a dist�ncia.
Uma sensa��o gostosa, como se ele estivesse aqui ao meu lado me aconselhando. N�o acha isso uma loucura?
- N�o necessariamente, C�ssia.
Surpresa, C�ssia disse:
- N�o entendi o que quer dizer.
Muito � vontade, Frank respondeu:
- Quero dizer que pode ser que ele esteja realmente aqui.
- Voc� acha mesmo, Frank?
- Acho, e acho tamb�m que � a coisa mais natural.
- O que est� querendo me dizer, Frank?
- Quero dizer que sou esp�rita e sei que isso pode perfeitamente acontecer. Nossos entes queridos que nos antecedem no retorno podem nos visitar, C�ssia.
- Estou surpresa - exclamou C�ssia. - Quer dizer que voc� � esp�rita? De verdade?
- Sou C�ssia, fui criado na Doutrina Esp�rita, apesar de no meu pa�s ela n�o ser a doutrina predominante. Mas meus pais adotivos s�o esp�ritas e fui criado dentro
desses padr�es.
- Estou perplexa!
- Por que, n�o gostou? Isso lhe causa algum problema?
- De forma alguma, apenas estranhei o fato, s� isso. Mesmo porque eu tamb�m sou esp�rita e acredito nos conceitos que os esp�ritos nos ensinam. Admiro a luta que
esses bons amigos travam para orientar a humanidade a seguir o caminho do bem.
- Nossa! - exclamou Frank. - Temos muitas coisas em comum.
- � verdade - concordou C�ssia.
- Acho que nos daremos muito bem, C�ssia.
- Tenho tamb�m essa impress�o.
Eneida dirigiu-se a Orlando:
- Percebe Orlando, por que ser�o felizes juntos? Pensam e agem dentro dos padr�es das leis divinas; respeitam-se e cada um, a sua maneira, vive de acordo com as
palavras de Cristo. Esse � o caminho, Orlando. Voc� ainda ter� surpresas, precisa aguardar o tempo certo.
- Aprendi que a paci�ncia � essencial, n�o � mesmo, Eneida?
- Sim, Orlando, e por uma raz�o muito simples: as coisas t�m tempo certo para acontecer dentro do equil�brio. Se n�o respeitamos isso, nos atropelamos na nossa pr�pria
impulsividade e, n�o raro, colocamos tudo a perder.
- Posso me aproximar novamente de C�ssia?
- � melhor partirmos, Orlando. N�o podemos invadir a privacidade dos encarnados. Eles est�o conversando, se conhecendo e � preciso respeitar seus momentos. Al�m
do mais, o objetivo de nossa visita foi alcan�ado, e n�o � prudente avan�ar mais do que o permitido. Vamos nos encontrar com a equipe. Jacob est� nos esperando.
Orlando emitiu uma energia de amor para C�ssia e se despediu, acompanhando Eneida, que se dirigiu ao encontro de Jacob.
- Ent�o, Orlando, como foi sua visita? - perguntou Jacob.
- Foi uma imensa felicidade rever meus entes queridos, saber que todos est�o bem, minha companheira de tantos anos, minha filha querida e Sabina, que continua ao
lado delas, sempre prestativa e amiga.
- Alegro-me por voc�, Orlando.
Dirigindo-se a Eneida, disse:
- Temos uma miss�o emergencial. Precisamos receber um irm�o que deixou seu corpo f�sico de uma maneira inesperada.
- Posso acompanh�-los? - perguntou Orlando timidamente.
- Deve, sim, nos acompanhar. N�o podemos deix�-lo s�, ainda n�o est� em condi��es de enfrentar as investidas sombrias.
A equipe seguiu para a periferia rural da cidade. Em segundos, estavam diante do corpo inerte de Osmar, ca�do em frente � sua pequena casa, v�tima de um tombo do
telhado. Jacob aproximou-se dele e percebeu que, no tombo, Osmar havia quebrado o pesco�o. A equipe do desencarne, com destreza, desatava os liames que o prendiam
� mat�ria j� sem vida. Ao seu lado, entregues a copioso pranto, estavam sua mulher e seus dois filhos ainda pequenos.
Eneida, acompanhada de Orlando, tentava acalmar Jandira, ministrando-lhe energia salutar, mas tudo parecia em v�o. Jandira, mulher sem f�, sem cren�a, gritava blasf�mias
contra tudo a contra todos.
- O que fiz para merecer esse castigo? - ela dizia. - O que vou fazer agora para criar essas duas crian�as sozinha, sem ningu�m para me apoiar? Por que Deus, se
� que Ele existe, permitiu que duas crian�as inocentes ficassem sem pai t�o cedo, e eu vi�va ainda jovem?
Embora todos que ali chegaram tentassem acalm�-la com palavras de conforto, nada parecia surtir efeito no cora��o endurecido de Jandira, que prosseguia na sua conduta
de criatura sem Deus e sem o m�nimo de conte�do edificante. Respondia �s palavras de conforto com outras totalmente agressivas.
- Voc�s falam isso porque n�o aconteceu com voc�s. N�o s�o seus filhos que ficaram sem pai. Nada me importa, nem esse Deus de que tanto falam e que eu n�o acredito
que exista!
- Eneida, por que existem pessoas que na hora da separa��o de um ente querido se entregam ao desespero, renegam a exist�ncia de Deus e acham que tudo termina com
o corpo f�sico? - perguntou Orlando.
- Simples, Orlando, porque existem pessoas tolas o suficiente para renegar Aquele que as criou, que lhes deu a vida e a oportunidade de se melhorar. Julgam erroneamente
que tudo se acaba no instante em que a vida cessa na mat�ria. E o que acontece � exatamente o contr�rio. A criatura que deixa seu corpo pela desencarna��o nasce
na espiritualidade, retorna � p�tria verdadeira, volta � sua origem. Os gritos e o choro desarrazoados demonstram falta de f�. � uma revolta contra a vontade de
Deus e fazem sofrer mais aquele que parte. � preciso ter confian�a no Criador, Orlando, saber que um dia esse retorno acontecer� para todos, e ningu�m poder� evitar.
Quando nos separamos de um ente querido, pessoa que amamos acima de tudo, � necess�rio entregar nossa dor a Jesus e confiar no aux�lio do Mestre, porque sofrimento
com Jesus � sofrimento equilibrado. Em tudo existe uma raz�o de ser, um prop�sito para que a melhora aconte�a �quele que parte e �quele que fica.
- Vamos - chamou-os Jacob. - � hora de levar nosso irm�o.
- E a vi�va - perguntou Orlando -, receber� aux�lio?
- Ela est� recebendo, Orlando, mas sua revolta e seu desespero n�o a deixam sentir. Ningu�m fica desamparado, mas nem todos sentem o amparo divino. Vamos.
A equipe seguiu levando Osmar, que dormia beneficiado pela energia salutar que recebia.


Na morte natural, que se verifica pelo esgotamento da vitalidade org�nica, em conseq��ncia da idade, o homem deixa a vida sem perceber: � uma l�mpada que se apaga
por falta de energia.
A perturba��o que se segue � morte nada tem de penosa para o homem de bem: � calma e em tudo semelhante � que acompanha um despertar tranq�ilo. Para aquele "cuja
consci�ncia n�o est� pura, � cheia de ansiedade e ang�stias".
(O Livro dos Esp�ritos, Cap. V.)


Cap�tulo 11
O perd�o como condi��o para o progresso


Enquanto para Orlando o curso de sua evolu��o seguia com tranq�ilidade e equil�brio, proporcionando-lhe paz e felicidade, o mesmo n�o acontecia com L�o. N�o que
ele fosse desprezado pelo Criador, mas tudo na espiritualidade segue a lei da afinidade. Cada um � herdeiro de si mesmo e recebe a rea��o de suas a��es no pret�rito.
Ningu�m � lan�ado ao sofrimento sem causa justa. S�o as pr�prias atitudes levianas, inconseq�entes e cru�is que os atraem para o lama�al da dor. L�o n�o fugiu �
lei de causa e efeito, e a vida que julgou n�o existir cobrava-lhe seus desvarios.
Tornara-se prisioneiro dos trevosos, os mesmos que o incentivaram a cometer seus desatinos. N�o tivera for�a quando encarnado para se livrar das tenta��es e agora,
sem o corpo f�sico, sofria igualmente a influ�ncia das sombras.
Parecia um farrapo caminhando sem rumo, quase dementado, sendo usado para os mais s�rdidos prop�sitos.


O assass�nio � um grande crime aos olhos de Deus, pois aquele que tira a vida de um semelhante interrompe uma vida de expia��o ou de miss�o, e nisso est� o mal.
(O Livro dos Esp�ritos.)


O homem n�o tem o direito de dispor de sua pr�pria vida; somente Deus tem esse direito. O suic�dio volunt�rio � uma transgress�o dessa lei.
(O Livro dos Esp�ritos.)


Escutava os lamentos de tantos que, como ele, desprezou as leis divinas, vivendo para satisfazer seus impulsos e desejos nem sempre louv�veis. Nem o conforto de
uma prece recebia, fora esquecido por todos os que conheceram na Terra. O tempo passava e a situa��o de L�o permanecia sem mudan�as.
Os encarnados brincam com a pr�pria vida na Terra, s�o distra�dos o bastante para n�o perceberem que cavam o pr�prio sofrimento. Sua aten��o direciona-se para o
brilho que atrai, mas que n�o se sustenta por falta de conte�do. Muitos levam a vida no recreio indefinido, esquecem-se de aprender a li��o que poder� salv�-los
da dor futura.
A humanidade permanece cega para as coisas que realmente t�m valor, surda para as palavras de esperan�a e de f�, muda quando o momento � prop�cio para falar de amor,
mas completamente desperta para ambicionar o que lhe d� uma posi��o de destaque no mundo dos homens.
Os homens se enganam! Quando a dor chega, colocam-se como v�timas do destino cruel. Essa � a realidade atual que o mundo est� vivendo.
O homem se esquece de tudo o que julga n�o ser importante. Para muitos, a vida do pr�ximo n�o lhes diz nada e n�o merece o menor respeito. N�o deveria ser assim.
Quem promove a felicidade alheia abre espa�o para a pr�pria felicidade.
N�o se pode rotular as pessoas sem conhec�-las. Quando se age assim, geralmente s�o cometidas injusti�as. Nem todos recebem as mesmas oportunidades de trabalho;
a fome, a necessidade e a mis�ria levam muitos a grandes sofrimentos.
� dever do crist�o minimizar a dor alheia.
A humanidade ainda n�o conseguiu aprender que amar verdadeiramente � humildade e fraternidade, porque esse � o ensinamento de Jesus; � o que vem da espiritualidade
e se torna f�sico para a busca da paz entre os homens. Mas isso s� vai acontecer quando os homens se libertarem das argolas que os prendem ao ego�smo de se acharem
o centro do Universo.
Nesse dia, quando os sentimentos mesquinhos n�o entrarem mais no cora��o do homem, quando eles perceberem que todos t�m direito � grande casa de Deus e se unirem
para levantar a bandeira do bem t�o alto que nenhum mal possa alcan��-la, quando suas m�os se entrela�arem fortalecendo um ao outro e seus cora��es se abrirem para
abrigar o sofredor, o necessitado, aquele que amarga a fome e o frio, ou mesmo o que n�o conseguiu visualizar a luz divina, nesse dia o sofrimento perder� espa�o
e a felicidade se far� aqui e na vida futura.


Orlando tinha presen�a ass�dua nas palestras ministradas no Educand�rio. Bebia cada palavra com o objetivo de se preparar para o trabalho de resgate, trabalho esse
que havia solicitado ao Mais Alto.
- � preciso se preparar, Orlando -, dissera-lhe Eneida. - Nada pode ser feito sem preparo. No momento certo, quando os irm�os respons�veis acharem por bem inclu�-lo
na equipe socorrista, ser� chamado. � preciso ter paci�ncia, esqueceu?
- N�o, minha amiga, n�o esqueci. � preciso ter paci�ncia repetiu Orlando.
- Orlando - disse-lhe Eneida -, o trabalho solicitado por voc� requer muito equil�brio, fraternidade e, principalmente, n�o guardar nenhuma m�goa em seu esp�rito,
porque � poss�vel encontrar desafetos, seres que nos magoaram profundamente e que cabe a n�s resgatar. Portanto, o perd�o � essencial para os esp�ritos que se prop�em
a auxiliar os que se encontram na dor.
- Perd�o? - perguntou Orlando. - O que voc� est� querendo me dizer, Eneida?
- Estou querendo saber como est� � quest�o do perd�o em seu cora��o, Orlando. - Orlando calou-se. Eneida insistiu: - Gostaria de falar sobre isso?
- Gostaria. Este � o momento?
- N�o sei meu amigo, s� quem pode dizer � voc�. Ap�s alguns instantes, Orlando decidiu:
- Acho que � o momento. Que Jesus me auxilie e me proteja! � uma quest�o que precisa ser resolvida, e acredito que n�o deva mais ser adiada.
- Antes de iniciar, vamos fazer uma prece a Jesus, solicitando do Divino Amigo a b�n��o necess�ria para que tudo saia dentro do equil�brio.
Assim fizeram.
Ao terminar a prece, Eneida disse a Orlando:
- Sinta-se livre, estou aqui em nome de Jesus para auxili�-lo no que precisar.
De modo t�mido, Orlando iniciou:
- Eneida, tenho pensado muito no modo como retornei � espiritualidade e, conseq�entemente, naquele que foi o causador do meu retorno, n�o sei se precoce ou se realmente
era a minha hora.
- E o que esse pensamento causa em voc�?
- No in�cio, causava-me muita ang�stia, ansiedade e confesso que comprometia meu equil�brio.
- E agora?
- Recentemente, ap�s freq�entar as palestras, estudar, ouvir os bons amigos e orar ao Senhor, sinto-me mais aliviado. N�o sinto m�goa nem desejo o mal para esse
irm�o. Vejo-o como um ser que causou o pr�prio sofrimento. Na sua escurid�o, na sua total ignor�ncia sobre as leis divinas, mergulhou no abismo da afli��o, e hoje
amarga sua inconseq��ncia.
- Voc� o perdoou? - perguntou Eneida.
- Acredito que sim, mas n�o me sinto preparado para encontr�-lo.
- Na realidade, voc� ainda n�o o perdoou de verdade.
- Por qu�?
- Porque o perd�o puro e sincero exige o esquecimento completo das faltas que foram cometidas contra n�s. O perd�o precisa sair de dentro do nosso ser de uma maneira
delicada, generosa, sincera e, antes de tudo, caridosa para com quem nos tenha ofendido. O perd�o deve trazer para n�s o esquecimento real da ofensa recebida, seja
ela qual for, muito grave ou menos grave, n�o importa. Porque, quando perdoamos de verdade, esquecemos o que passou e provamos isso pela nossa capacidade de nos
reconciliar com nossos ofensores. N�o se pode esquecer que Jesus nos deu o maior exemplo de perd�o, quando crucificado na cruz, sofrendo dores cruciantes por causa
da injusti�a e da maldade dos homens Ele disse: "Pai, perdoai-lhes porque n�o sabem o que fazem".
Orlando estava encantado com os esclarecimentos de Eneida. Percebeu que realmente o seu perd�o n�o era ainda o definitivo, puro, aquele que Jesus exemplificou, pois
sentia que n�o tinha ainda preparo para encarar seu algoz do passado.
Eneida, percebendo o que se passava no �ntimo de seu amigo, disse-lhe amorosa:
- N�o se martirize Orlando, voc� est� no caminho certo. Est� se preparando para um trabalho que deseja fazer. Tarefa essa dif�cil e que requer muito amor, e isso
� bom. Quando estiver apto, � sinal que seu esp�rito chegou ao ponto em que o perd�o brilha pleno em seu cora��o. � s� uma quest�o de tempo, meu amigo.
- Obrigado, minha amiga, sou-lhe muito grato pelo bem que me faz.


Perdoando o nosso pr�ximo, estamos angariando m�ritos para n�s mesmos, perd�o para nossos pr�prios erros, indulg�ncia para nossas faltas. Que nossos l�bios possam
sempre se abrir para oferecer a todos os que se aproximarem de n�s o sorriso da amizade e a palavra de carinho e conforto que ajudar� nosso irm�o a compreender os
ensinamentos de Cristo, ajudando-os a prosseguir no caminho da espiritualidade.


Orlando, ap�s os esclarecimentos de Eneida sobre o perd�o, sentiu-se melhor e mais confiante. N�o perdia as palestras de madre Teresa e acreditava que em pouco tempo
se sentiria apto a ingressar na equipe socorrista, que era o sonho que alimentava. E pensava: "Quero ser �til ao meu semelhante, auxiliar aqueles que sofrem e que,
tocados pelo amor de Deus, se arrependem e aspiram ao resgate".
Em seus momentos de lazer, entregava-se � leitura edificante; estudava o Evangelho de Jesus e, a cada m�xima do Mestre, entendia o significado do amor.
Lembrava-se de sua fam�lia, mas sentia que, conforme o tempo passava, proporcionava-lhe um sentimento mais harmonioso e equilibrado. Amava-a e esperava o reencontro,
mas come�ara a aprender o significado do amor universal; o sentimento que une as pessoas, proporcionando-lhes a consci�ncia de que todos somos criaturas de Deus
e, em raz�o disso, nos tornamos irm�os.
Pensava: "Se o homem pudesse entender isso, construiria para si mesmo uma edifica��o de paz e felicidade. Mas a maioria se esquece de que a maior prova de amor nos
� mostrada por Deus, dando-nos a vida, a oportunidade que precisamos para nos redimir e nos elevar at� o Criador como suas reais criaturas".
Estava t�o absorto em suas medita��es que n�o sentiu a aproxima��o de Tom�s.
- Como est�, Orlando, atrapalho suas reflex�es?
Orlando olhou em sua dire��o e demonstrou surpresa em seu semblante.
- Tom�s, que alegria!
- Sabia que o encontraria aqui, e venho a pedido de Jacob para fazer-lhe um convite.
- Um convite? - Orlando estranhou.
- Sim, um convite, e acredito que ir� gostar muito.
- Ent�o, por favor, diga-me do que se trata.
- Iremos descer at� a crosta e assistir a uma reuni�o em um Centro Esp�rita onde o Evangelho de Jesus � estudado e exercitado. Iremos levar dois irm�os rec�m-chegados
da Terra que necessitam dessa experi�ncia para entender melhor o que se passa com eles. Gostaria de nos acompanhar?
Orlando se animou.
- Claro que sim, Tom�s, gostaria muito.
- Ent�o me acompanhe, vamos nos unir � equipe.
Animado e feliz em poder participar dessa miss�o, Orlando acompanhou Tom�s. Desceram at� a crosta e dirigiram-se � Casa Esp�rita.
O local era de uma singeleza cativante. Tudo condizia com a simplicidade e autenticidade que devem caracterizar uma Casa Esp�rita. Tudo muito limpo, sem objetos
desnecess�rios, mas impregnado de energia salutar, verdadeira e cristalina. Nas paredes brancas via-se um quadro com o rosto de Jesus e pequenas li��es tiradas do
Evangelho. No centro da mesa havia um jarro com lindas flores brancas e perfumadas. Era, na verdade, uma casa de Deus que retratava o sentimento puro e pleno de
seu orientador.
- � a primeira vez que venho a uma Casa Esp�rita ap�s meu retorno - disse Orlando.
Jacob respondeu:
- Esta, Orlando, � uma das mais dignas. Aqui ningu�m vem com o �nico intuito de falar com esp�ritos procurando respostas para suas perguntas. Ao contr�rio, o objetivo
dos freq�entadores � aprender o Evangelho, saber mais sobre a Doutrina que abra�am e auxiliar os irm�os em sofrimento por meio de vibra��es de amor, do real desejo
de serem �teis � espiritualidade da maneira que podem ser. Ou seja, entregando seus cora��es fraternos e seus sentimentos caridosos que se mostram nas preces sinceras.
- Vejam, eles est�o chegando - disse Eneida. - Repare na postura dos membros que se sentam � mesa. Em sil�ncio, respeitando o ambiente, porque sabem que, al�m deles,
a casa recebe os esp�ritos em desequil�brio que s�o trazidos pelos tarefeiros de Jesus.
- Esse irm�o - completou Jacob - que dirige esta reuni�o � um grande amigo da espiritualidade. Trabalhador consciente, vive em acordo com o que prega. Esquece seus
problemas porque sabe que existem outros muito mais complicados que os seus. � na verdade, um tarefeiro de Jesus. Tem consci�ncia de que conhecimento e f� fortalecem
o esp�rito.
Eneida, pedindo licen�a a Jacob, continuou:
- A Casa Esp�rita, Orlando, quando tem por finalidade o estudo do Evangelho de Jesus e a pr�tica da caridade plena, enfeita suas paredes com a energia de suas obras
de fraternidade. N�o procura o brilho entre os homens, porque sabe ser ef�mero, mas procura ser digna das b�n��os do Senhor.
- � dif�cil ser esp�rita, n�o � mesmo, Eneida?
- Se considerarmos que os homens relutam em compartilhar suas aquisi��es; entregam-se ao amor carnal como se fosse o �nico a existir, enfim, lutam por si mesmos,
por seus desejos, achando natural que seja assim; considerando essas cren�as err�neas, realmente � dif�cil ser esp�rita, porque o esp�rita verdadeiro j� se conscientizou
da import�ncia da uni�o entre os povos e n�o se coloca na posi��o privilegiada no mundo dos homens, porque j� entendeu a ess�ncia da vida.
- Eneida tem raz�o, Orlando; colocou muito bem essa quest�o e me fez lembrar que Vicente de Paulo, com toda a sua bondade, humildade e sabedoria, certa feita disse:
"Homens de bem, de boa e forte vontade, uni-vos para continuar amplamente a obra de propaga��o da caridade; encontrareis a recompensa dessa virtude no seu pr�prio
exerc�cio; n�o h� alegria espiritual que ela n�o d� desde a vida presente. Sede unidos; amai-vos uns aos outros segundo os preceitos de Cristo. Assim seja!"


De maneira t�mida, Orlando comentou:
- Chego a ficar emocionado e agradecido a Jesus, Jacob, por permitir que eu, ainda cheio de imperfei��es, possa estar usufruindo dessa aula de amor. Estar aqui nesse
lugar de paz alivia minhas tens�es, ang�stias e medos, e me faz querer cada vez com mais for�a estar junto dos que sofrem e ir at� o lugar onde jazem em sofrimento,
trazendo-os para o descanso.
- Fico feliz por pensar assim, Orlando. Seu desejo ser� realizado em pouco tempo e ser� o meio de voc� testar o seu perd�o.
A reuni�o, como sempre acontecia, transcorreu em paz e equil�brio. Os esp�ritos foram atendidos e fortalecidos para entenderem sua real posi��o, o que aconteceu
gra�as a Jesus. Ao final, o orientador fez a vibra��o para os enfermos do corpo e da alma e encerrou com uma singela prece.


"Senhor, agradecemos a oportunidade de mais uma vez permitir nosso encontro nesta humilde casa para praticarmos a caridade moral. Ampare-nos, senhor, em nossa caminhada
de evolu��o para que possamos compreender nosso pr�ximo sem julgar nem condenar. Que os espinhos que encontrarmos no caminho nossos p�s suportem pisar; temos consci�ncia
de que encontraremos obst�culos durante nosso percurso na Terra; nessas horas, em que o des�nimo e a vontade de recuar tomarem conta do nosso esp�rito, que saibamos
elevar nosso pensamento at� o Pai amant�ssimo e pedir, com sinceridade e humildade, Sua prote��o e a for�a para prosseguir. Sabemos que o Senhor nos espera e deseja
nossa salva��o, portanto, vos suplicamos aux�lio para que saibamos promover nosso encontro convosco. Assim seja!"


Terminada a prece, o orientador deu por encerrada a reuni�o. As luzes se apagaram e os freq�entadores, em sil�ncio, deixaram o recinto. No plano f�sico a reuni�o
terminara, mas no plano espiritual os esp�ritos permaneciam em atividade, auxiliando os irm�os que vieram em busca do b�lsamo para suas dores.
Mais tarde, no sil�ncio da madrugada, os tarefeiros de Cristo levaram os convalescentes para o plano espiritual para que recebessem no hospital Maria de Nazar� o
atendimento condizente a situa��o de cada um. Mais uma vez o amor de Deus se fez presente, mostrando que ningu�m, seja no plano f�sico ou na espiritualidade, fica
esquecido e desamparado das b�n��os de Deus, entregue � pr�pria sorte, mas o aux�lio s� vir� quando o arrependimento for sincero por parte daquele que almeja a paz.
No auge do sofrimento, da dor que dilacera cada fibra do nosso ser, sempre haver� no �ntimo da nossa ess�ncia as �ltimas palavras que podemos pronunciar clamando
a salva��o: Meu Deus!



Cap�tulo 12
A hist�ria de Frank


C�ssia e Frank a cada dia estreitavam mais a amizade que os unia. Entretinham-se em longas conversas nas quais cada um abria seu cora��o para o outro, contando suas
ang�stias do passado, seus objetivos para o futuro, enfim, tornavam-se mais �ntimos. Ainda n�o se davam conta, mas um sentimento novo e maior ia, aos poucos, tomando
for�a em seus cora��es.
C�ssia nada lhe escondeu, relatou emocionada a quest�o da impossibilidade de ser m�e e a alegria de, tempos depois, descobrir que podia gerar um filho.
- Como algu�m p�de mago�-la tanto assim, C�ssia, sem nenhum motivo para tanto? - exclamava Frank, sempre que o assunto era a uni�o de C�ssia e L�o.
Nesses momentos, C�ssia se fragilizava e, n�o raro, permitia que pequenas l�grimas rolassem por sua face.
- N�o sei Frank. Para ser sincera, hoje n�o fa�o a menor quest�o de saber o motivo de tanta agressividade. Meses atr�s, quando tudo estava ainda recente, questionava
muito, queria muito compreender, mas hoje n�o.
- Desculpe-me voltar ao assunto, mas � incompreens�vel que o pr�prio marido jogue a culpa na esposa de uma situa��o em que ele mesmo � o personagem principal.
- Voc� est� falando do fato de n�o poder ter filhos?
- Sim, C�ssia; considero um ato desumano jogar a culpa em voc�, sendo ele o est�ril.
- O L�o era mesmo imprevis�vel. Suas atitudes sempre foram impulsivas e muitas vezes inconseq�entes. N�o media as conseq��ncias de seus atos nem se preocupava se
feria as pessoas que conviviam com ele.
Ap�s pensar por um instante, Frank tamb�m desabafou:
- Eu tamb�m sofri muito, minha amiga.
Surpresa, C�ssia perguntou:
- Mas voc� me disse que sempre foi muito feliz com seus pais adotivos. Qual a causa do sofrimento?
- Durante toda a minha inf�ncia fui realmente muito feliz. Meus pais me amam muito e tudo fizeram para que eu tivesse uma boa educa��o e firmeza de car�ter. Com
o passar do tempo, as perguntas sobre minha origem surgiram naturalmente e comecei a questionar minha m�e, querendo saber o que, na verdade, havia acontecido que
resultou na minha ado��o. Tanto minha m�e quanto meu pai desconversava quando eu tocava no assunto, at� que um dia, devido � minha insist�ncia, resolveram me contar.
- E como foi, Frank?
- Um desastre! Jamais poderia imaginar que tivesse sido vendido como um objeto qualquer.
Espantada diante daquela revela��o, C�ssia repetiu:
- Voc� quer dizer que foi vendido?
- Sim, minha amiga, negociado como qualquer objeto. Tive a sorte de ter sido comprado por um casal digno, humano. Como j� lhe disse, eles s�o esp�ritas. Eles me
criaram como um filho verdadeiro, caso contr�rio, poderia estar perambulando pelas ruas.
- E sua m�e biol�gica, foi ela quem o vendeu ou permitiu que isso acontecesse?
- Nem uma coisa nem outra. Tudo isso me causou muito sofrimento, e o fato de saber que minha m�e n�o teve culpa, que tamb�m foi uma v�tima, aumentou meu desejo de
conhec�-la.
- E seus pais concordaram com sua vontade?
- Meus pais s�o pessoas especiais C�ssia, n�o colocaram nenhum obst�culo. Ao contr�rio, deram-me for�a e coragem para viajar ao Brasil e tentar achar minha m�e biol�gica.
Informaram-me de como tudo aconteceu e aqui estou tentando realizar meu sonho.
- J� encontrou alguma pista que poderia lev�-lo � sua m�e?
- Infelizmente ainda n�o, mas n�o vou desistir. Acredito que Jesus ir� colocar a pessoa certa no meu caminho, aquela que vai me ajudar de verdade, C�ssia, e sei
que vou encontrar minha m�e biol�gica. Se ela ainda estiver viva, vou encontr�-la, pode apostar.
- Tamb�m acredito nisso, Frank, mas s� uma coisa me preocupa.
- O qu�?
- O seu nome.
- O que tem o meu nome?
- Com certeza seu nome verdadeiro deve ser outro. Voc� acha que neste fim de mundo, h� tanto tempo atr�s, algu�m iria se chamar Frank?
- Isso n�o � problema, C�ssia.
- N�o?
- N�o. Eu sei que fui registrado com outro nome e sei qual � esse nome.
C�ssia se entusiasmou.
- Verdade? Por que n�o me disse antes, agora fica muito mais f�cil. Algu�m deve se lembrar desse caso.
- Essa � a minha esperan�a.
- Voc� se importa de me dizer qual �?
Frank sorriu e brincou com a querida amiga:
- Puxa, como voc� � curiosa!
- Pe�o desculpas, Frank, mas � curiosidade mesmo.
- Sabia! - exclamou Frank, passando delicadamente a m�o no rosto de C�ssia. - O nome com o qual fui registrado aqui no Brasil � Joaquim.
- Joaquim! - exclamou C�ssia. - Que lindo nome! Gosto muito.
- Bem, agora vamos deixar de falar de mim.
- Tudo bem. Vamos falar sobre o qu�?
- Que tal falarmos sobre n�s?
- Sobre n�s? - repetiu C�ssia. - O que vamos falar sobre n�s?
- Que tal eu come�ar dizendo que estou me apaixonando por voc�.
Ao ouvir essa declara��o, C�ssia sentiu um frio subir-lhe pelo corpo todo. Seu cora��o disparou e suas m�os tremeram. Frank, percebendo a rea��o da amiga, disse-lhe:
- N�o imaginei que fosse lhe causar essa rea��o; pensei que tamb�m sentisse alguma coisa a mais por mim, mais que uma simples amizade...
C�ssia n�o ouvia o que ele falava, apenas lhe pediu:
- Por favor, repita o que acabou de dizer.
- Disse que estou me apaixonando por voc�. Se a ofendi, desculpe-me, porque a minha inten��o n�o � essa. Vamos fazer de conta que eu n�o disse nada e continuamos
amigos.
- Eu n�o quero ser sua amiga, Frank.
- Nossa, C�ssia, n�o imaginei que teria essa rea��o, para mim, inesperada.
- Seu bobo, eu n�o quero ser sua amiga porque tamb�m estou me apaixonando por voc�.
- Agora sou quem lhe pede: repita o que disse!
- Eu estou me apaixonando por voc�!
Feliz, Frank se aproximou mais de C�ssia e lhe deu o primeiro beijo de amor, beijo esse que marcava o in�cio de uma linda historia de amor.
- Quero faz�-la feliz, C�ssia. Quero que a meu lado se esque�a de tudo o que passou. Se nos dermos � chance, podemos construir uma nova vida para n�s dois, com felicidade
e muito amor.
C�ssia n�o podia acreditar que tudo aquilo estava acontecendo com ela. Depois dos tristes acontecimentos, imaginava que jamais iria amar novamente. Entretanto, ao
conhecer Frank, sentiu uma atra��o forte, para ela inexplic�vel.
- Em que est� pensando, meu bem?
- Penso que a vida est� sorrindo novamente para mim. Se Deus est� permitindo essa nova chance para eu ser feliz, vou empregar todos os meus esfor�os para que realmente
isso aconte�a, mas uma coisa me preocupa, Frank.
- Diga-me o que �.
- Quando chegar o dia de voc� ir embora para o seu pa�s, voltar para o seu mundo, como vou ficar?
- Querida, s� posso lhe dizer que jamais vou deix�-la. Aqui ou do outro lado do oceano estaremos juntos, pode confiar em mim.
- Eu confio, Frank. � incr�vel, mas eu confio.
- Por que incr�vel?
- Porque nos conhecemos h� pouco tempo e sabemos pouco um do outro. Entretanto, sinto-me ligada a voc�.
- Eu tamb�m, C�ssia, sinto-me ligado a voc�, como se tivesse esperado por isso toda a minha vida.
- Voc� n�o acha estranho?
- Nem tanto, C�ssia, isso acontece muitas vezes. Voc� j� ouviu falar de esp�ritos afins?
- J�, s�o esp�ritos simp�ticos que se reencontram e se sentem felizes em prosseguir juntos em sua evolu��o aqui na Terra. N�o � isso, seu sabich�o?
C�ssia falou brincando e demonstrando toda a sua felicidade.
Em resposta, Frank abra�ou-a com ternura.
- Agora s� falta voc� ir � minha casa para conhecer minha m�e.
- O dia que voc� quiser. Quero dizer � sua m�e que amo a filha dela.
- Eu j� havia falado com minha m�e que iria convid�-lo para um jantar, e ela aceitou de bom grado. Agora, ao saber que n�o levo o amigo, mas o namorado, acredito
que ficar� mais feliz ainda. Amanh� est� bom para voc�?
- Claro, amanh� �s 20 horas estarei l�.
- Agora preciso ir. Amanh� nos encontraremos.
- N�o quer que eu a acompanhe?
- N�o � necess�rio, Frank, prefiro ir s�, colocando minhas id�ias em ordem e vivendo este momento feliz.
Despediram-se com um beijo e se separaram.
C�ssia andava lentamente, dando a si mesma tempo para assimilar a emo��o que sentia e a alegria que inundava seu cora��o, antes t�o sofrido.
- Se meu pai estivesse aqui, tenho certeza de que iria gostar de Frank, aprovaria nosso namoro.
Com a lembran�a do pai, C�ssia se emocionou at� as l�grimas.
"Por que o L�o fez isso com o senhor, pai? Qual a raz�o de tanta viol�ncia, tanta destrui��o? Tirar-lhe a vida, fazer sofrer as pessoas que o amam e que sentem falta
da sua presen�a? E, o que � pior, comprometer a si mesmo na lei de a��o e rea��o! Sinto que o senhor est� bem, mas imagino que ele est� em sofrimento. Rogo a Jesus
que tenha piedade dele e de sua ignor�ncia espiritual."
Com seus pensamentos, C�ssia atraiu Eneida, que veio em seu aux�lio.
- C�ssia, n�o turve a sua felicidade presente com pensamentos negativos. Acaba de ser agraciada com a b�n��o divina, que colocou em seu caminho aquele que a far�
feliz e realizada como m�e. Viva este momento e seja grata ao Senhor. Seu pai est� muito bem, feliz por voc� e Antonieta estarem bem. Quanto ao L�o, n�o esta abandonado
pelo Senhor; no dia em que se arrepender de verdade e clamar por miseric�rdia ser� resgatado. At� isso acontecer, aprender� por meio do sofrimento a respeitar o
pr�ximo, a vida e Deus.
C�ssia registrou a presen�a de Eneida pela inspira��o que esse esp�rito amigo lhe passava. Sentiu uma paz invadir-lhe a alma e pensou: "Preciso viver este momento,
usufruir da oportunidade recebida, preparar-me para construir um lar de verdade. Ao meu pai s� posso enviar meu amor e minha saudade. Quanto ao L�o, desejo que ele
possa ser tocado pelo amor de Deus e se arrepender sinceramente dos desatinos cometidos. Esse deve ser o come�o".
Apressou o passo e, em pouco tempo, entrava feliz em casa.
- Oi, m�e, oi, Sabina, onde voc�s est�o?
Antonieta, entrando na sala onde C�ssia estava, disse-lhe:
- Oi, filha, que alegria � essa que invade o ambiente? Viu um passarinho verde? - brincou.
- � verdade - apoiou Sabina, que tamb�m viera ao encontra, de C�ssia. - Se n�o foi o passarinho que viu, com certeza ganhou algum pr�mio.
C�ssia abra�ou as duas ao mesmo tempo, dizendo:
- N�o vi nenhum passarinho verde, mas Sabina tem um pouco de raz�o, pois ganhei o melhor pr�mio que eu podia querer.
- Nossa, filha, diga-nos o que ganhou.
- Ganhei o amor m�e, ouviu bem? O amor!
- N�o estou entendendo nada, C�ssia, pode explicar de uma vez?
- Posso, dona Antonieta. Estou apaixonada e sou amplamente correspondida.
- Filha, que not�cia boa! Quem � o felizardo que conquistou o cora��o da minha filha querida?
Antes que C�ssia respondesse, Sabina se adiantou:
- S� pode ser o amigo dela. Aquele dona Antonieta, que ela dizia ser somente seu amigo.
- Acertou Sabina. Eu e Frank descobrimos que estamos apaixonados um pelo outro. N�o � maravilhoso, m�e?
- Claro, filha, � maravilhoso! N�o quero jogar �gua fria no seu entusiasmo, mas voc� o conhece o suficiente a ponto de se sentir apaixonada?
- M�e! - exclamou C�ssia. - Por que diz isso?
- Porque tenho medo de que sofra novamente. Apesar de querer muito que encontre algu�m que a mere�a de verdade e a fa�a feliz, tenho receio de que volte a sofrer.
- Desculpe-me, dona Antonieta, mas n�o podemos achar que todas as pessoas se comportam da mesma maneira. Creio que, desta vez, C�ssia agir� com mais prud�ncia, analisando
e prestando aten��o na pessoa que escolheu, no seu car�ter, no conte�do das coisas que fala, enfim, hoje C�ssia est� mais madura e, creio eu, agir� com mais intelig�ncia
na escolha de um namorado.
- Sabina tem raz�o, m�e, afinal n�o disse que vou me casar, disse apenas que estou apaixonada. Vou proporcionar a mim mesma essa nova oportunidade de ser feliz e
deixar o tempo passar, o que tiver de acontecer... Acontecer�.
- Tudo bem, filha, voc� sabe o que faz. Se estiver bem para voc�, estar� para mim. - Abra�ou sua �nica filha e lhe disse: - Jesus vai proteger voc� e permitir que
seja feliz.
- Obrigada, m�e.
- Bem, agora precisamos conhecer esse rapaz. Traga-o aqui para jantar conosco.
- Marquei com ele para amanh�. Quero muito que voc�s o conhe�am. Est� bem assim?
- Claro!
- Farei um jantar especial - disse Sabina. - Quando voc� falou da sua amizade com esse rapaz, C�ssia, achei estranho, mas senti que ele ser� uma pessoa muito importante
na sua vida.
- J� �, Sabina, j� � muito importante para mim.
C�ssia deixava-se envolver novamente pelo divino sentimento do amor em uma de suas formas. N�o cultivara a auto-compaix�o, libertara-se da m�goa, da melancolia e
do �dio que poderia alimentar contra L�o. Limpara seu cora��o desses miasmas que maculam nossa alma. Acreditava, mais uma vez, na vida e em tudo o que poderia conquistar
se desse a si mesma nova chance para ser feliz. Conseguira sair da escurid�o e enxergar a luz da esperan�a. Agira como uma criatura que confia no Criador e sabe
que todos os sofrimentos um dia terminam e a paz volta a reinar se dermos chance para isso.
Voltara a ser feliz!


Viver... � perceber a exist�ncia do ser. � sentir a grandiosidade do existir atrav�s do amor e do bem querer.
Viver... � estar atento �s tempestades do percurso
E conseguir acostumar os olhos � escurid�o para, apesar dela, enxergar a luz.
Viver... � ter consci�ncia da volta, e por isso valorizar a vida.
Enfim, viver...
� emanar amor pela eternidade.



Cap�tulo 13
Selma diante da verdade


Selma passava por uma crise emocional muito grande. Desde o nascimento de seu filho, ca�ra em profunda melancolia. Sabia que sua m�e apenas a suportava e tinha consci�ncia
da raz�o que a levava a agir assim. Nunca se comportara como uma filha zelosa, abandonara-a para ir em busca de sonhos e de fortuna, e retornara com os sonhos desfeitos,
a fortuna perdida e a dor do fracasso machucando seu cora��o.
Dona Clotilde, sua m�e, apenas suportava aquela situa��o pelo amor que sentia pelo netinho, que amava e que sabia n�o ter culpa de nada.
- Voc� nunca conseguiu ser uma boa filha - dizia sempre Clotilde. - Tente, pelo menos, ser uma boa m�e. � o m�nimo que pode fazer por essa crian�a que voc� colocou
no mundo com a �nica finalidade de ajud�-la a dar um golpe. V� procurar o pai desta crian�a, ela tem o direito de conhec�-lo e conviver com ele.
Nessas horas, Selma sentia o arrependimento bater forte em seu peito. Pensava: "Procurar o pai para que, se ele renegou, desde o in�cio, esse filho? Fui uma tola
inconseq�ente. Joguei por terra o meu destino, desprezei o amor de L�o para acreditar nas palavras v�s de Armando".
Conclu�a: "Errei ao contar a verdade para a minha m�e. Ela nunca vai me perdoar e nossa vida ser� sempre esse inferno. Preciso tomar uma decis�o para mudar essa
situa��o insuport�vel".
Pensou por alguns instantes e achou que havia encontrado o melhor jeito de terminar com o problema.
"Isso mesmo. Vou embora daqui e deixo Felipe com minha m�e. Tenho certeza de que ela o criar� bem. Ela o ama e tudo far� por ele."
Tomada a decis�o, iniciou a elabora��o desse projeto. Passados cinco dias, Selma disse a Clotilde, caindo novamente na mentira:
- M�e, recebi um telefonema de uma amiga que mora na capital e ela me disse que abriu um pequeno neg�cio de cosm�ticos e convidou-me para trabalhar com ela.
- E voc� j� aceitou? - perguntou Clotilde, adivinhando o que vinha pela frente.
- Claro, m�e, � a minha oportunidade de dar um salto na minha vida. N�o posso ficar encostada na senhora para sempre. Tenho um filho para criar e preciso pensar
no futuro dele.
Clotilde, sempre esperta e conhecendo a filha que tinha, disse:
- Selma, j� � hora de entender que n�o adianta mentir para mim, pois a conhe�o muito bem.
- O que a senhora quer dizer?
- Quero dizer que sei muito bem qual � a sua verdadeira inten��o.
- Como assim?
- Estou dizendo que isso � uma desculpa para ir embora e abandonar seu filho; � bem pr�pria de voc� essa leviandade.
Selma empalideceu. Tentou provar o engano de sua m�e.
- A senhora n�o tem o direito de me julgar dessa maneira. O que a faz pensar que est� certa?
- O fato de conhecer voc� desde que nasceu Selma, e saber que sempre a sua prioridade foi voc� mesma. Sua ambi��o, seu orgulho e sua vaidade excessiva... Nem seu
filho conseguiu mudar esse triste comportamento. Seu interesse est� onde est� a opul�ncia.
- A senhora faz muito mau ju�zo de mim, sua pr�pria filha. Alias, sempre foi assim. Nunca me compreendeu e jamais se esfor�ou para compreender.
- Esforcei-me sim, minha filha, mas suas atitudes me mostraram ser imposs�vel modific�-la, porque � da sua natureza ser como �, infelizmente para voc�.
Irritada, Selma completou:
- Tudo bem, dona Clotilde, vamos acabar com essa conversa que n�o vai nos levar a lugar algum. Quero apenas saber se posso contar com a senhora quanto ao Felipe.
- O que quer Selma?
- Quero saber se pode tomar conta dele por uns tempos at� eu me firmar no emprego e vir busc�-lo.
Clotilde sentiu o que realmente Selma queria e pensou: "Ela vai abandonar o filho como fez comigo a vida inteira".
Triste por reconhecer mais uma vez que a filha n�o sentia amor por ningu�m, a n�o ser por ela mesma, respondeu:
- Selma, sei que voc� nunca vir� buscar seu filho, mas n�o me importa, ficarei com ele porque � meu neto, � uma crian�a indefesa e n�o merece ser criado por uma
m�e como voc�. Eu o amo e darei a ele tudo o que merece e tem direito, ou seja, uma vida digna e amor.
- N�o fa�a drama, m�e, logo virei busc�-lo.
- Isso � o que n�s vamos ver - disse Clotilde, triste por ver mais uma vez a filha ir embora.
Tudo aconteceu como Selma planejara.
Quinze dias depois, deu um beijo em seu filho, despediu-se de sua m�e e mais uma vez partiu para a capital com a determina��o de encontrar Armando e tentar ser feliz
com ele.
- Se n�o encontr�-lo, vou procurar L�o. O tempo passou e provavelmente ser� mais f�cil convenc�-lo de que n�o consegui esquec�-lo.
Cheia de ilus�es e enganos, Selma partiu. N�o sabia ainda como come�ar nem onde ficar: "N�o tenho muito dinheiro. O melhor � procurar uma pens�o modesta at� conseguir
encontrar um ou outro".
Assim foi feito. Durante v�rios dias Selma tentou encontrar Armando, mas suas tentativas foram em v�o. Lembrou-se do que ele lhe dissera.
"Nem tente me encontrar, porque n�o vai conseguir. Vou embora desta cidade para nunca mais voltar."
E pensou: "Ele cumpriu o que prometeu. N�o tenho outra sa�da a n�o ser procurar o L�o. Tenho certeza de que ele vai me aceitar e ajudar. Vou me apegar aos momentos
felizes que vivemos e creio que ser� o bastante para faz�-lo esquecer e me querer novamente Ele sempre me amou, n�o vai ser agora que vai me repudiar".
Voltando para a pens�o onde estava hospedada, Selma direcionou seu pensamento aos dias de felicidade ao lado de L�o, quando ainda n�o conhecia Armando. Suas lembran�as
vinham com facilidade, trazendo-lhe cada vez mais forte a certeza de que ainda poderia se entender com L�o.
Procurava-o nos lugares que costumavam freq�entar e estranhava o fato de ningu�m se lembrar dele.
- N�o � poss�vel que ningu�m se lembre de nada, afinal n�o faz tanto tempo assim!
Enquanto aguardava o desfecho do que pretendia, Selma arrumou um emprego para conseguir se manter. Conseguiu ser contratada em um escrit�rio de contabilidade como
auxiliar e assim que iniciou seu trabalho fez amizade com Neide. A afinidade entre as duas logo se estabeleceu. Perceberam de imediato que havia entre elas muitas
coisas em comum, principalmente no que dizia respeito � ambi��o de conquistar posi��o a qualquer pre�o.
Entre uma e outra confid�ncia, Selma lhe contou toda a sua vida, tudo o que lhe acontecera at� o momento presente, em que deixara seu filho com sua m�e para ir atr�s
do pai dele.
- Voc� n�o conseguiu encontr�-lo, Selma?
- Infelizmente, n�o. Lembrei-me de que me dissera que seria imposs�vel encontr�-lo e acabei desistindo.
- Acho que deveria continuar tentando - disse-lhe Neide. - Uma hora ele aparece.
- Agora desisti. Prefiro ir atr�s do �nico homem que me amou de verdade, mas que perdi por confiar em Armando. Tenho f� de que vou encontr�-lo. Acredito na for�a
do pensamento. Todas as noites o chamo, vibro intensamente para que ele pense em mim e queira me encontrar.
- Como � mesmo o nome dele?
- L�o.
- L�o � muito vago, quero saber o sobrenome.
- L�o de Almeida Silva.
Neide levou um susto. Espantada, perguntou:
- Por acaso ele era casado com uma mo�a chamada C�ssia?
Surpresa, Selma respondeu:
- Sim, ficamos juntos logo depois que eles se separaram.
- Eu sabia que conhecia voc� de algum lugar. Eu conhe�o sua hist�ria. Trabalhei um tempo na empresa dele.
- Voc�!
Selma estava boquiaberta.
- Que mundo pequeno, n�o Neide? Quem diria que nos encontrar�amos um dia nesta situa��o.
Pensou um pouco e depois, cheia de esperan�a, perguntou � amiga:
- Voc� deve saber onde posso encontr�-lo. Se souber, por favor, me diga.
- Realmente sei Selma, mas acredito que n�o ficar� nem um pouco feliz em saber.
- Por qu�?
- Porque L�o morreu faz algum tempo.
Selma precisou se segurar para n�o cair por causa do susto que levou.
- Voc� disse morreu?
- Sim, minha amiga, morreu, ou melhor, suicidou-se.
- Pelo amor de Deus, conte-me essa hist�ria direito. Por que ele fez isso, acabar com a pr�pria vida?
- � uma hist�ria triste, mas se quiser posso lhe contar como tudo aconteceu.
- Quero, quero muito que me conte, preciso saber por que ele cometeu esse desatino. Ser� que foi por minha causa?
- N�o, Selma, n�o foi.
- Ent�o me conte.
- Neide colocou Selma ciente de tudo o que acontecera com L�o at� o final dr�stico de seu suic�dio.
- Meu Deus do c�u! Mal posso acreditar em tamanho disparate Por que ele fez isso? Extorquir, matar e se suicidar, n�o � poss�vel, ele s� podia estar louco!
- �, minha amiga, agora a dire��o da sua vida � com voc�, n�o tem mais em quem se encostar.
- Voc� tem raz�o, mas preciso arrumar um emprego melhor. Tenho um filho para sustentar e voc� sabe que n�o � f�cil criar um filho sozinha.
- Selma, deixe de drama. Se for dif�cil para voc�, para sua m�e tamb�m deve estar sendo dif�cil, ali�s, muito mais do que para voc�.
- Por qu�?
- Ora, Selma, pense em sua idade e na de sua m�e! Ser� que ela tem sa�de para ag�entar o peso que � educar uma crian�a?
Selma ficou calada por algum tempo. Sentia-se envergonhada. Pela primeira vez, teve consci�ncia dos seus atos levianos, frutos de imaturidade moral e espiritual.
Nunca fora uma boa filha, isolara-se de sua m�e por longo tempo; metera-se com atitudes irrespons�veis. Sua inconst�ncia amorosa a levara a cometer enganos e falsidade,
e agora recebia a heran�a que ela deixara para si mesma.
Sabia que tinha alguma culpa pelas atitudes de L�o. Se n�o tivesse exigido tantos bens materiais, se n�o tivesse incentivado seu comportamento em rela��o � C�ssia
ou aos pais dela, talvez nada disso tivesse acontecido. L�o era uma pessoa fraca, influenci�vel e era apaixonado por ela. A decep��o que sentiu ao saber da sua trai��o
podia ter abalado sua mente a ponto de cometer tantos desatinos.
- Em que est� pensando, Selma, n�o gostou de saber do fim de L�o, � isso?
- N�o, Neide, na realidade me dei conta de que tenho uma grande parcela de culpa nisso tudo. Pode ser que nada tivesse acontecido se eu n�o tivesse me envolvido
com Armando a ponto de aceitar seu plano, que na �poca me pareceu genial. Deveria ter sido sincera, ter dito ao L�o que n�o o amava mais, que me apaixonara por outro.
Deveria ter dito a verdade, e n�o ter elaborado um plano para machuc�-lo ainda mais.
- �, mas agora n�o adianta lamentar, um est� morto e o outro desaparecido, e n�o quer ser encontrado para n�o ter de arcar com a responsabilidade de ser pai. Voc�
vai ter de se virar sozinha, minha amiga.
- � bem verdade que dizem que o arrependimento chega tarde... Vou falar com o chefe para me dispensar mais cedo, n�o estou me sentindo bem.
- Fale com ele, com certeza ir� dispensar.
Com a aquiesc�ncia do chefe, Selma retornou � pens�o.
Sentia tontura, mal-estar e uma forte dor de cabe�a, sintomas que persistiram durante toda a semana, for�ando-a a faltar ao servi�o. Assim que Neide soube que a
amiga n�o passava bem, levou-a ao m�dico, que disse tratar-se de uma gripe. Medicou-a, recomendou repouso e disse que tudo ficaria bem dentro de quatro ou cinco
dias, o que n�o aconteceu.
Selma sentia-se fraca, deprimida e sem for�as para levantar. Estava ap�tica e n�o conseguia reagir.
- Voc� precisa reagir - dissera-lhe Neide. - N�o pode ficar assim na cama todo esse tempo.
- N�o tenho vontade de nada - respondia Selma. - Tenho orado muito para o L�o, pedindo-lhe que me perdoe e que venha me ajudar.
- Entretanto, voc� piora a cada dia, Selma, fica mais fraca, sem vontade, precisamos ver isso direito. Acho que o m�dico n�o acertou com voc�. N�o seria o caso de
irmos a outro profissional? O que voc� acha?
- N�o consigo achar nada, Neide, fa�a o que voc� quiser.
No dia seguinte, quando Neide ia saindo, dona Flora, propriet�ria da pens�o, pedindo licen�a, abordou-a:
- Desculpe me intrometer na vida de voc�s - disse-lhe -, mas, estou assistindo a todo o sofrimento dessa mo�a sem ver nenhuma melhora.
- N�o sabemos mais o que fazer dona Flora.
- Se voc� me permite, gostaria de lhe dizer que essa mo�a est� sofrendo uma influ�ncia espiritual, e o meu conselho � que procurem uma Casa Esp�rita s�ria que possa
ajud�-la.
- Como assim, dona Flora, n�o entendo dessas coisas. O que a senhora quer dizer?
- Quero dizer, Neide, que muitas vezes somos influenciados pelos esp�ritos mais do que podemos supor; do mesmo modo que existem os bons esp�ritos que querem o nosso
bem, existem tamb�m os que se comprazem com nosso sofrimento.
- A senhora acha que Selma est� sob a influ�ncia nociva de algum mau esp�rito?
- Neide, n�o posso dizer com certeza, seria leviandade de minha parte afirmar tal coisa, mas seria prudente que fossem a uma Casa Esp�rita. Somente l�, com as orienta��es
dos mentores, poder�o saber o que de verdade est� acontecendo com sua amiga, essa resist�ncia em reagir, a apatia que toma conta dela e n�o a deixa lutar para vencer
essa depress�o, essa melancolia. E s� o que posso lhe dizer.
- A senhora poderia indicar uma casa de credibilidade para que eu a levasse?
- Eu costumo freq�entar um centro modesto, mas de grande valor espiritual devido ao conhecimento do seu orientador, do amor que exercita por meio da caridade e da
generosidade com a qual direciona sua vida. Os esp�ritos comunicantes s�o verdadeiros tarefeiros de Cristo, pregando o Evangelho e aconselhando os freq�entadores
a seguir com coragem e f� o caminho do bem, porque, como dizem, o amor � o �nico sentimento que transforma o homem.
- Poder�amos ir com a senhora?
- Claro, o dia da reuni�o � amanh�, �s 20 horas.
- Combinado ent�o, iremos com a senhora.
Neide, em um impulso de agradecimento, deu um abra�o em Flora.
- Obrigada, dona Flora, eu j� n�o sabia mais o que fazer com Selma. A senhora abriu uma porta de esperan�a.
- Nada acontece por acaso, talvez este seja o momento.
Despediram-se.


Desde que Selma se acamara, ela ficava ao seu lado, pois sabia que sua amiga n�o tinha ningu�m para ajud�-la.
Pode-se neutralizar a influ�ncia dos maus esp�ritos fazendo o bem e colocando toda a vossa confian�a em Deus, repelis a influ�ncia dos esp�ritos inferiores e destru�s
o imp�rio que desejam ter sobre v�s. Guardai-vos de escutar as sugest�es dos esp�ritos que suscitam em v�s os maus pensamentos, que insuflam a disc�rdia e excitam
em v�s todas as m�s paix�es. Desconfiai, sobretudo, dos que exaltam o vosso orgulho, porque eles atacam na vossa fraqueza. Eis por que Jesus vos faz dizer na ora��o
dominical: "Senhor, n�o nos deixeis cair em tenta��o, mas livrai-nos no mal!"
(O Livro dos Esp�ritos.)


No dia seguinte, na hora combinada, Selma seguia em companhia de Neide e Flora para a reuni�o espiritual. L� chegando, foram recebidas por Jo�o, orientador da casa,
que com toda a aten��o ouviu o caso de Selma, em sil�ncio, sem emitir nenhuma opini�o precipitada. Ao t�rmino da explana��o de Selma, disse:
- Minha filha, o que posso adiantar � que direcione seu pensamento a Jesus e entregue ao Divino Amigo suas ang�stias e seus medos, confiando que o aux�lio vir� de
acordo com o planejamento espiritual para os seus prop�sitos. Permane�a em vibra��o de amor e vamos aguardar as orienta��es dos bons esp�ritos.
Acomodaram-se na pequena sala, onde a vibra��o de amor se fazia presente. Selma, enfraquecida que estava n�o conseguia permanecer com seu pensamento firme. Mas tanto
Neide quanto Flora vibrava por ela, clamando a Jesus o aux�lio.
As luzes se apagaram, e somente uma t�nue luz azul permaneceu acesa, dando ao ambiente a sensa��o de paz e mansuetude. Ap�s a prece feita por Jo�o, com simplicidade
e f�, Tiago, um ass�duo trabalhador da casa, leu um trecho do Evangelho, e com propriedade fez o coment�rio.
Em poucos instantes, o mentor espiritual se fez presente por interm�dio da mediunidade de Jo�o.
- Meus irm�os, o cora��o do homem � sua b�ssola, ele o leva para o bem ou para o mal, depende do amor que balsamiza a alma. N�o se consegue felicidade sem cora��o
limpo; n�o se constr�i um mundo melhor sem aprender a amar com a dignidade e a transpar�ncia que o verdadeiro amor possui. Para que tudo aconte�a na paz almejada,
� fundamental aprender a exercitar o respeito, a compreens�o e o amor fraternal, e n�o querer o que pertence a outrem, n�o dificultar o caminho do semelhante e n�o
ludibriar os cora��es simples para conquistar riqueza.
As palavras do mentor batiam fundo no cora��o de Neide, que se via protagonista daquelas situa��es. Deixou que o filme de sua vida passasse rapidamente diante de
seus olhos e concluiu que se enquadrava naqueles ensinamentos do esp�rito amigo.
"Meu Deus, nunca parei para pensar nas leviandades que cometi com o �nico objetivo de conseguir posi��o social, poder aquisitivo. Sempre quis ser reconhecida pelo
que possu�a, e n�o pelo que sou na verdade. N�o constru� nada de �til. Vivo no engano esse tempo todo, cega de mim mesma. Entretanto, agora, ouvindo essas palavras
de um esp�rito, em uma casa que mal conhe�o, percebo quem sou, na verdade: uma inconseq�ente, leviana o suficiente para n�o me dar conta dos meus enganos."
Enquanto Neide se entregava � an�lise de si mesma, Selma permanecia completamente ap�tica, sem nenhuma rea��o e sem se dar conta do que acontecia naquele ambiente,
tanto do lado f�sico quanto, principalmente, do espiritual. Sentia como se estivesse anestesiada, sem poder agir ou pensar por si mesma.
O mentor da casa continuava.
- Meus queridos irm�os, como nos ensinou o Mestre, � preciso orar e vigiar, prestar aten��o nos nossos pensamentos, n�o chamar incessantemente aqueles que partiram
e que, em v�rias situa��es, n�o podem atender a nosso chamado por estarem ainda presos na escurid�o de si mesmos. O mais prudente � enviar preces de amor fraternal,
preces que aliviam os que sofrem e que alegra os que caminham na luz divina.
"E preciso ter cuidado com a insistente influ�ncia que um mau esp�rito exerce sobre o indiv�duo; � necess�rio controlar os pensamentos, as a��es, ter o cora��o voltado
para o bem e a caridade, essa � a maior prote��o contra a obsess�o. Evangelizar o pr�prio lar, permitir a entrada de Jesus, o Divino Amigo.
"A obsess�o sempre � uma enfermidade mental e exige tratamento de longa dura��o. A sua cura s� � poss�vel por meio da moraliza��o do esp�rito obsessor e do obsesso,
e, para afastar seu efeito nefasto, necess�rio se faz existir o amor universal no cora��o daquele que fala em nome de Jesus; n�o bastam f�rmulas doutrin�rias, o
que � preciso � existir dedica��o e fraternidade sincera, pura e plena."


Enquanto o esp�rito amigo esclarecia para os presentes a import�ncia de se promover a reforma �ntima cultivando os valores da alma, na espiritualidade os tarefeiros
ocupavam-se do dif�cil trabalho de mostrar ao esp�rito que prejudicava Selma a inutilidade de sua atitude.
- Qual o seu nome, meu irm�o?
- Meu nome � L�o! - exclamou o esp�rito.
- E qual a raz�o de prejudicar essa irm� dessa maneira, sugando seu fluido vital a ponto de deix�-la assim, sem defesa? Por que veio?
- Porque ela me chamou, implorou por minha ajuda; eu vim ajud�-la.
- Percebe que, em vez de ajud�-la, est� prejudicando sobrei maneira essa irm�?
- � isso mesmo que eu quero, prejudic�-la!
- Pode nos dizer por qu�?
- Porque ela me enganou; traiu-me de maneira s�rdida e por causa dela me joguei na lama. Vou faz�-la sofrer tudo ou mais do que sofro.
- Voc� n�o acha melhor, mais caridoso, perdoar?
- Eu, perdoar? Jamais! Ela tem de provar do pr�prio veneno.
- Do mesmo veneno que voc�, meu irm�o, est� provando?
- O que est� dizendo?
- Estou dizendo que todos n�s, algum dia, j� ferimos algu�m. Isso quer dizer que n�o podemos atirar a primeira pedra, como disse nosso Mestre. Se voc�, meu irm�o,
tivesse em algum momento ferido algu�m, gostaria de ser perdoado?
Em segundos, L�o viu na sua frente � figura de Orlando caindo ensang�entado, v�tima de seu �dio e de sua viol�ncia. Apavorou-se e, temendo que os bons o descobrissem
como um assassino e suicida, quis sair em disparada, mas foi contido pelos esp�ritos presentes que faziam parte da corrente socorrista. Nesse momento, Selma lembrou-se
do que havia feito a L�o, sentiu um tremor, encostou sua cabe�a no ombro da amiga e, chorando, disse:
- L�o, perdoe-me, sei que mere�o o seu �dio, mas imploro que me perdoe!
L�o percebeu, ent�o, a monstruosidade do que havia feito a Orlando. Sentiu fundo em sua alma o pedido de perd�o de Selma. Em um gesto de submiss�o e arrependimento,
levantou as m�os para o alto e gritou:
- Senhor, estou cansado de sofrer, perdoe-me e leve-me para o Seu caminho.
Enquanto na espiritualidade os tarefeiros de Jesus atendiam esse irm�o em desequil�brio, na Terra o atendimento era similar.
Um dos trabalhadores da casa, a convite do senhor Jo�o, aproximou-se de Selma e ministrou-lhe um passe magn�tico, restaurando suas for�as e seu equil�brio. Jo�o,
percebendo sua melhora, disse-lhe:
- Minha irm�, tenha f�, tudo vai acabar bem, mas � preciso que compare�a mais vezes �s reuni�es para que possamos ajud�-la. N�o se esque�a de ajudar a si mesma por
meio das ora��es e da postura digna de uma criatura de Deus. Aque�a seu cora��o com a humildade e o amor ao seu semelhante. Nossa maior defesa � a nossa dignidade
crist�. S�o os bons pensamentos e a aceita��o das coisas que n�o podemos mudar, para que nunca ambicionemos o que n�o nos pertence. Quando necessitar de aux�lio,
pe�a-o a Jesus, e n�o �quele que j� partiu, pois n�o se sabe em que condi��es se encontram. Nosso Mestre jamais ir� desamparar uma s� criatura quando existe sinceridade
em seu clamor.
Afastou-se de Selma e, ap�s fazer uma sentida prece de agradecimento, deu por encerrada a reuni�o.
Todos se retiraram, as luzes se apagaram. No plano terreno a reuni�o encerrava-se, mas no plano espiritual os trabalhadores eram incans�veis no atendimento aos esp�ritos
que ainda se viam perdidos e que necessitavam de atendimento.
Neide saiu impressionada com o que presenciara. Nunca antes havia estado em uma reuni�o esp�rita, e a impress�o que sempre tivera dessas sess�es n�o era a mais agrad�vel.
- Nunca senti tanta paz - dizia a Flora. - E o que mais me impressionou foi � explana��o do esp�rito. Tocou fundo em meu cora��o e me fez ver como realmente sou
ego�sta e manipuladora, sempre procurando vantagens para conquistar riquezas.
- A gente sempre se v� em algum ponto das palestras que este esp�rito ministra.
- Parece que ele se dirige a cada um em particular - disse Neide. - Estou muito impressionada.
- Sabe por que, Neide? Porque suas palavras trazem at� n�s as a��es cotidianas que o homem vive, sem se dar conta dos enganos aos quais se entrega. Quando v�m �
tona, percebemos que n�o fomos t�o leais assim �s leis divinas, e, ao nos vermos agindo de maneira contradit�ria ao que nos ensina nosso Mestre, nos envergonhamos.
As duas ainda n�o haviam percebido o sil�ncio de Selma. Quando se deram conta, olharam para a amiga, que caminhava acompanhando-as, mas com o pensamento muito distante.
- Selma - disse Neide -, como voc� est� se sentindo? Parece t�o longe, alheia a tudo o que conversamos.
- N�o est� se sentindo melhor? - perguntou Flora.
Com voz baixa, Selma respondeu:
- Desculpem-me, mas estou pensando nas palavras do mentor espiritual. Eu agi de uma maneira completamente errada, segundo o que ele disse.
- E o que foi que ele disse?
- Voc�s devem saber melhor do que eu, pois me sentia anestesiada.
- N�s queremos saber em que ponto voc� agiu errado.
- Neide, desde que soube da morte do L�o, venho rezando para ele e pedindo que venha me ajudar, para que eu possa dar um rumo � minha vida. Entretanto, o esp�rito
explicou que n�o devemos pedir aux�lio a algu�m que j� partiu sem saber como se encontra.
- � verdade, Selma - disse Flora. - Mas, agora que sabe, n�o o chame mais, deixe-o seguir seu caminho. Eles n�o disseram, mas para mim ficou claro que voc� estava
sob a influ�ncia dele. Os esp�ritos preparados para auxiliar os encarnados sabem como faz�-lo, Selma, pois seguem as orienta��es do Mais Alto e n�o v�o al�m do permitido.
Ao contr�rio dos que agem sem permiss�o, que interferem e podem fazer sofrer muito por meio de uma obsess�o. Mas n�o vamos falar nisso agora, o importante � que
voc� foi orientada, e se seguir essas orienta��es encontrar� equil�brio e tranq�ilidade para prosseguir seu caminho.
- Voc� acha que ela deve voltar �s reuni�es, Flora? - perguntou Neide.

- Claro que sim, hoje ela tomou a primeira dose do rem�dio, mas n�o � o suficiente. Precisa voltar, sim, mas � n�o s� isso. � necess�rio, principalmente, modificar
suas atitudes e se tornar uma pessoa de bem.



Nenhum de n�s se beatifica simplesmente porque deixou o envolt�rio carnal. No caminho da evolu��o n�o existem atalhos, todos temos de lutar pela perfei��o. Devemos
nos unir no amor de Cristo para, juntos, prosseguirmos a jornada em dire��o ao progresso espiritual. Nas nossas afli��es e ang�stias, no momento de dor e sofrimento,
� justo que busquemos o aux�lio e o amparo do Pai. Podemos pedir miseric�rdia, mas n�o se pode esquecer que tudo segue o curso natural da evolu��o e o al�vio vir�
se Deus achar justo o nosso pedido.



Cap�tulo 14
O perd�o



Orlando atendendo ao chamado de Jacob, rapidamente foi ao seu encontro.
- Estou �s suas ordens, irm�o - disse ao querido superior.
- Orlando, � hora de voc� testar seu perd�o est� pr�xima.
- N�o compreendo. O que quer dizer, Jacob?
- Voc� j� foi esclarecido a respeito desse sentimento. Falo do verdadeiro perd�o, n�o o de palavras, mas o de a��o, e acreditamos que est� pronto para uma tarefa
que requer muita compreens�o, respeito pela fraqueza do pr�ximo e, principalmente, o amor pleno pelo semelhante. Ser� necess�rio esquecer-se de si mesmo e pensar
na recupera��o de uma criatura de Deus que se perdeu em meio aos enganos nos quais se envolveu em sua perman�ncia na Terra.
Orlando, aos poucos, foi compreendendo o que estava para acontecer.
Jacob continuou:
- Durante todo esse tempo, sofreu a conseq��ncia de seus desatinos, tomou do pr�prio fel, mas a hora do seu resgate est� chegando.
- Como assim, Jacob, ele clamou por socorro?
- Ou�a bem, Orlando, por imprevid�ncia, uma irm� ainda encarnada, que manteve uma rela��o leviana e enganosa com ele, chamou-o com insist�ncia para junto de si,
acreditando que poderia ajud�-la. E a influ�ncia nociva aconteceu.
- Como assim?
- Esse irm�o colou-se nessa irm� e a sua influ�ncia levou-a a debilidade f�sica e emocional. Enfraqueceu-a, levando-a a apatia e � depress�o.
- Por que isso foi permitido?
- Orlando, esse irm�o vive nas zonas de sofrimento, sob as ordens de esp�ritos trevosos, afinidade essa que ele mesmo construiu para si. S�o esp�ritos que se comprazem
em ver os encarnados infelizes, assim como eles mesmos s�o. N�o se importam com as conseq��ncias, contanto que seus desejos impuros sejam satisfeitos. Por essa raz�o,
n�o se pode se esquecer das palavras que Jesus deixou para a humanidade: "Orai e vigiai". Nosso Criador n�o interfere no livre-arb�trio de Suas criaturas. Ele sabe
que um dia, cansados, perceber�o a inutilidade do mal e clamar�o por clem�ncia. Nesse dia ser�o resgatados e iniciar�o a caminhada no bem.
- Esse irm�o ser� resgatado. E a v�tima de sua influ�ncia vai se recuperar?
- Ele foi atra�do para uma Casa Esp�rita que trabalha de acordo com o Evangelho, e cujo �nico desejo � servir ao pr�ximo. Os dois envolvidos receberam orienta��es
sobre a necessidade de se renovar, construir sua reforma interior, pensar e desejar somente o bem, e tanto um quanto o outro foram sens�veis aos esclarecimentos
dos orientadores.
- Mas a influ�ncia nociva do esp�rito pode acabar assim, de repente, t�o r�pida?
- Orlando, o socorro veio r�pido gra�as ao conhecimento de Flora, mas o que na verdade contribuiu foi a vontade dos envolvidos: o cansa�o do irm�o desencarnado,
seu desejo sincero de sair do sofrimento, seu arrependimento pelos desatinos cometidos na sua exist�ncia na Terra, o desconhecimento do mal que fazia � irm� encarnada,
colando-se nela e pensando que a ajudava, como ela pedira. Enfim, a aceita��o das orienta��es recebidas na Casa Esp�rita abriu-lhe as portas para que recebessem
o aux�lio divino.
- E quanto � irm� encarnada?
- Ela o libertou quando entendeu que havia se enganado, pediu perd�o e iniciou sua reflex�o quanto �s suas atitudes. Mas os dois ainda t�m um longo caminho a percorrer,
cada qual compat�vel com as suas a��es, mas isso tudo foi o come�o.
- Eu pensei que esse processo fosse um trabalho mais demorado e dif�cil - disse Orlando.
- Orlando, � preciso saber diferenciar as situa��es que se apresentam. Essa n�o foi uma obsess�o que realmente � um trabalho mais complicado, demorado e exige do
obsesso uma completa mudan�a de postura perante a vida, a si mesmo e a Deus. Isso foi um equ�voco de uma irm� que desconhecia o que propunha para si mesma; que quis
um suporte para suas dores e d�vidas e procurou, de maneira equivocada, o outro. Em princ�pio, ele queria vingan�a, mas, gra�as � interven��o dos bons esp�ritos,
caiu na realidade do sofrimento que havia se imposto e percebeu o mal que fazia a si mesmo. A obsess�o � algo muito mais s�rio, porque nela est� presente a vingan�a,
o �dio, o desejo do mal e o objetivo de jogar na lama o alvo desses sentimentos mesquinhos. Nesse caso n�o houve obsess�o, porque n�o se caracterizou a crueldade.
- Mas ele tinha motivos para odi�-la.
- Realmente tinha e tentou, mas tomou a �nica decis�o s�bia, entre tantas equivocadas, ou seja, deix�-la ir e retornar ao lugar onde vive.
- Mas por que ele n�o foi levado ao hospital, Jacob?
- Porque falta para ele resolver uma quest�o que o aflige.
Orlando ainda n�o tinha percebido em que lugar ele se encaixava.
- Posso saber qual?
- Claro. Voc� � a pe�a que falta para fechar um ciclo de sofrimento.
- Eu?
- Sim, Orlando, se voc� ainda n�o percebeu, vou lhe dizer. Esse irm�o � aquele que lhe tirou a vida terrena.
Orlando levou um susto.
- Voc� est� dizendo que � o L�o?
- Estou. Precisamos que voc� venha conosco at� as zonas de sofrimento resgatar esse irm�o.
- Por qu�?
- Porque ele precisa do seu perd�o, isso se voc� realmente j� o perdoou.
- Sim, Jacob, j� o perdoei e estou pronto para dizer isso a ele. Quando iremos?
- Se voc� estiver pronto, iremos agora - respondeu Jacob, prestando muita aten��o na rea��o de Orlando.
Com tranq�ilidade, Orlando respondeu:
- Estou pronto, Jacob, e ansioso para dizer isso a ele. Sei que nenhum sofrimento � eterno e, se est� na hora do resgate, � porque L�o j� cumpriu o que lhe cabia
pelo mal praticado na Terra. Conquistou esse direito pelo arrependimento sincero, e fico feliz em contribuir para o in�cio do seu caminho no bem.
Jacob ficou satisfeito com o que ouviu de Orlando.
- Ele entendeu os esclarecimentos que recebeu na Casa Esp�rita, mas sente-se envergonhado com o ato violento que praticou contra voc� e acha que n�o merece perd�o.
Pensando assim, voltou para a zona de sofrimento, mas Jesus permitiu que fosse resgatado, e � o que pretendemos fazer.
- Estou pronto - reafirmou Orlando.


A conseq��ncia da vida futura decorre da responsabilidade dos nossos atos. A raz�o e a justi�a nos dizem que, na distribui��o da felicidade a que todos os homens
aspiram, os bons e os maus n�o poderiam ser confundidos. Deus n�o pode querer que uns gozem dos bens sem trabalho e outros s� o alcancem com esfor�o e perseveran�a.
A id�ia que Deus nos d� de sua justi�a e de sua bondade, pela sabedoria de suas leis, n�o nos permite crer que o justo e o mal estejam aos seus olhos no mesmo plano,
nem duvidar de que n�o recebam algum dia, um a recompensa e outro o castigo pelo bem e pelo mal que tiverem feito. � por isso que o sentimento inato da justi�a nos
d� a intui��o das penas e das recompensas futuras.
(O Livro dos Esp�ritos.)


A equipe de resgate desceu at� a zona de sofrimento.
- Orlando n�o se distraia com a curiosidade, que n�o cabe nesse trabalho de fraternidade para com os nossos irm�ozinhos em sofrimento, nem se deixe enganar com os
pedidos de socorro ou as m�os estendidas.
- Por que, Jacob, eles tamb�m n�o merecem o socorro?
- Orlando, o socorro vem para aqueles que realmente o querem pelo sentimento sincero, do arrependimento real. Os que pedem clem�ncia a Jesus n�o com simples palavras,
mas com a pureza de sentimento.
- Isso quer dizer que os irm�os que aqui habitam podem nos enganar?
- Sim, Orlando, podem nos enganar. Assim que s�o resgatados, fogem e voltam, n�o raro, para a Terra, com a finalidade de continuar seu caminho desastroso, interferindo
na vida dos encarnados, subjugando-os � sua vontade. Incentivando, nos mais distra�dos e levianos que se afinam com seus pensamentos, a viol�ncia e a disc�rdia.
- Por que isso acontece, Jacob?
- Volto a dizer Orlando, porque os encarnados vivem para a satisfa��o e a realiza��o dos seus desejos e ambi��es, e com isso atraem os maus esp�ritos que pensam
como eles e se comprazem com o sofrimento das pessoas. Repito que n�o se pode esquecer o que disse Jesus: "Orai e vigiai; a� est� a prote��o contra as investidas
do mal". - Jacob continuou e disse a Orlando: - Agora, o momento � de equil�brio e muito amor para com o semelhante. Mantenha seu pensamento voltado a Jesus. Vamos
� busca de L�o para acolh�-lo com respeito e fraternidade.
Seguiram em frente.
Quanto mais desciam e se aproximavam do local onde L�o estava, sentiam o ar pesado, quase sufocante. Os lamentos e os improp�rios que escutavam mexiam com o equil�brio
de Orlando, que, seguindo a orienta��o de Jacob, procurava permanecer com seu pensamento voltado para Jesus, n�o permitindo que nenhum pensamento menor interferisse
em seu equil�brio. Queria realmente auxiliar aquele que, em um momento de del�rio, tirara-lhe a vida.
"Isso n�o me importa mais. Hoje quero apenas ser �til e ajud�-lo a se reerguer sob o amor de Deus."
Lembrava-se das palavras de Jacob, seu querido instrutor: "Orlando, nenhum ser vai ficar mau pela eternidade, um dia se cansar� e se tornar� bom, porque Deus assim
o quer".
Elevou seu pensamento ao Senhor e orou: "Senhor, Criador de todo o universo e de todas as formas de vida, sou grato por poder, de alguma forma, contribuir para o
al�vio de um irm�o. Que ele possa Senhor, evoluir e seguir o caminho da luz e do amor no vosso reino, aproveitando essa oportunidade de renascimento".
Jacob observava todas as rea��es de Orlando e se sentia satisfeito com o que via: "Ele realmente traz o esp�rito limpo de m�goa ou revolta. Seu perd�o � pleno. Com
a permiss�o de Jesus, tudo dar� certo".
Ap�s caminharem por lugares sombrios e esfuma�ados, onde toda sorte de dor se fazia presente por conta das mentes doentias que, desprezando a realidade da vida futura,
se entregaram � pr�tica do mal violentando seu semelhante f�sica ou moralmente, chegaram a um lugar onde os esp�ritos se atolavam no lama�al de si mesmos sem condi��es
de perceber nada al�m de escurid�o e intermin�veis gemidos.
Orlando, sem compreender a raz�o de tamanho sofrimento, olhou para Jacob, que imediatamente entendeu o que se passava com aquele esp�rito ainda inexperiente. Receando
um poss�vel desequil�brio, disse-lhe:
- Orlando, n�o desvie sua aten��o, mantenha-se com o pensamento em Jesus e tudo sair� a contento.
Orlando acatou a orienta��o de Jacob, e seguiram.
Algum tempo depois, chegaram a uma clareira onde existiam tocas habitadas por esp�ritos. Jacob disse aos seus acompanhantes:
- Chegamos. � aqui que est� nosso irm�o.
Orlando sentiu leve desconforto, mas, seguindo a orienta��o de Jacob, orou a Jesus clamando por aux�lio e for�a para n�o fraquejar, a fim de cumprir sua miss�o.
- Vamos entrar - disse Jacob, no que foi seguido pelos companheiros.
Orlando, n�o acostumado �s cenas chocante presentes nas zonas mais infelizes, novamente levou um choque, sendo prontamente sustentado por Jacob. Este, reconhecendo
L�o encolhido em um canto com as fei��es torcidas pelo sofrimento, com as vestes rasgadas e sujas, aproximou-se e lhe disse:
- Jesus atendeu a seu clamor, meu irm�o, estamos aqui para resgat�-los e lev�-lo ao hospital de refazimento.
L�o olhou-o com desconfian�a. N�o o conhecia, e o pavor de ser novamente pego pelos trevosos o apavorava. Jacob, percebendo a rea��o daquele irm�o em sofrimento,
disse-lhe:
- Nada tema meu irm�o, viemos em nome de Jesus para busc�-lo.
- N�o posso ir - L�o disse, por fim, sentindo mais confian�a.
- Por que n�o pode? - insistiu Jacob.
- Porque o que fiz n�o tem perd�o. Assassinei friamente um homem sem culpa nenhuma, acabei com a minha vida e, ao tentar obsediar uma irm� que ainda est� na Terra,
fui orientado sobre o mal que fazia a ela e a mim mesmo. Sei que sou um verme, mas n�o suporto mais esse sofrimento. Estou arrependido, mas sei que mere�o sofrer
tudo o que estou sofrendo.
- Quando o arrependimento � sincero, um dia os sofrimentos terminam meu irm�o, e o aux�lio divino chega com permiss�o de Jesus, que ama e quer a felicidade de todas
as criaturas. Voc� se arrependeu com sinceridade e foi alvo da bondade de Deus, em vista disso estamos aqui.
O pranto tomava conta de L�o, que quase n�o possu�a mais for�as.
- Preciso resolver uma quest�o que me atormenta.
- Diga.
- Preciso do perd�o de quem tanto prejudiquei, mas n�o sei como conseguir.
Apesar de saber de quem se tratava, Jacob o interrogou:
- Diga quem � meu irm�o, creia na bondade de Jesus e Ele n�o o abandonar�.
- Trata-se do homem que eu assassinei de maneira vil. Preciso pedir-lhe perd�o, mas n�o sei como fazer.
Jacob olhou para Orlando, que permanecia impass�vel, sem ousar dizer absolutamente nada.
- Est� pronto? - perguntou.
- Sim, respondeu Orlando.
Voltando-se para L�o, disse-lhe:
- Meu irm�o, a hora chegou. Ele est� aqui e traz em sua ess�ncia o sentimento de perd�o pleno e verdadeiro. Pe�a-lhe.
Orlando se mostrou. Vendo-o, L�o sentiu vergonha do que fizera �quele homem bom e sem culpa de nada do que lhe acontecia.
Arrastou-se at� ele e, descontrolado, pediu-lhe:
- Perd�o... Perd�o pelo que fiz por conta do meu desvario. Perd�o!
Orlando, abaixando-se at� ele, aconchegou-o em seus bra�os e lhe disse:
- J� o perdoei h� muito tempo, e o que quero agora � que se entregue a Jesus para finalmente conhecer a luz do amor, do respeito e da vida.
Jacob emitiu energia de paz e de equil�brio sobre L�o que, acalmando-se, adormeceu nos bra�os de Orlando. Os esp�ritos que acompanhavam Jacob nessa miss�o colocaram-no
sobre a maca. E a equipe, entregando-se � prece e permanecendo com o pensamento fixo em Jesus, retornou.
L�o foi levado ao hospital Maria de Nazar�, onde, acomodado no quarto limpo e aconchegante, permaneceu dormindo. Jacob percebeu o sil�ncio de Orlando e indagou ao
amigo:
- Orlando, vejo-o silencioso, pensativo. Posso saber o que o atormenta?
- Claro que sim, Jacob. Penso no motivo pelo qual os seres se entregam ao sofrimento, se podem usufruir da calma e da felicidade aqui na espiritualidade! Entretanto,
o que mais se v� s�o l�grimas e dor. Por que isso acontece Jacob?
- Orlando, o bem foi criado por Deus, e o mal pelos homens. Todos podem escolher o lado que preferem ficar. Quando a ambi��o, o ego�smo, a vaidade e todos os outros
sentimentos pequenos e mesquinhos invadem o cora��o, a escolha j� est� feita, e o sofrimento se far� presente na vida depois de amanh�. Vida essa em que poucos acreditam,
mas que � realidade, e essa realidade acontecer� para todos, crendo ou n�o.
- Somos n�s que atra�mos o sofrimento, � isso o que quer dizer?
- Sim, � isso o que acontece. O falso brilho e a falsa felicidade caem por terra quando deparamos com nosso rosto no espelho da vida espiritual. Espelho esse que
nos mostra como somos na verdade, sem m�scaras. O homem deve vigiar a si mesmo, suas atitudes, suas posturas em rela��o ao semelhante, porque o sofrimento dura enquanto
durar a teimosia no mal. Deus n�o quer nenhuma de suas criaturas sofrendo, mas respeita a vontade de seus filhos, porque deu a cada um o livre-arb�trio. Mas, quando
o arrependimento surge sincero e pleno, ningu�m fica sem aux�lio, e todos t�m a mesma possibilidade de se tornar bons.
Orlando estava impressionado em como tudo, na espiritualidade, acontecia com equil�brio. Nada era feito apenas para satisfazer vontade ou curiosidade. A autenticidade
e a sinceridade dos sentimentos e pensamentos eram o que contava, na realidade.
Perdoara L�o de verdade e desejava sua recupera��o espiritual. Como dizia Jacob, ningu�m fica mau pela eternidade, e L�o, assim como os outros que se arrependeram,
encontraria um dia a paz para seu esp�rito. Aprendera que, n�o importa o tempo que dure um dia tudo passa.

***

Enquanto na espiritualidade tudo era feito visando ao bem-estar e equil�brio de L�o, na Terra tanto Neide quanto Flora tamb�m se entregava ao aux�lio � Selma, que
ia se recuperando dia ap�s dia at� que, finalmente sentindo-se bem, voltou ao trabalho.
O que ocorrera com Selma modificara profundamente maneira de pensar de Neide. Envergonhava-se de como agira em rela��o �s pessoas, sempre querendo tirar proveito,
e se esfor�ava para que isso n�o mais acontecesse. Passara a freq�entar a Casa
Esp�rita juntamente com Flora, e a cada dia se interessava mais em aprender a doutrina. Selma, percebendo a mudan�a da amiga, seguiu seus passos e, juntando-se a
ela e Flora, tamb�m passou a freq�entar as reuni�es.
Com o passar do tempo, Selma foi percebendo quanto tinha sido f�til, interesseira e desleal com L�o. Arrependeu-se dos seus atos do passado e, aconselhada pelos
esp�ritos amigos, pediu perd�o a L�o, incluindo-o nas preces que passou a fazer diariamente.


A prece � recomendada por todos os esp�ritos; renunciar � prece � desconhecer a bondade de Deus, � renunciar, para si mesmo, a sua assist�ncia, e para os outros
ao bem que se lhes possa fazer.
O homem suporta sempre as conseq��ncias das suas faltas; n�o h� uma s� infra��o � lei de Deus que n�o tenha puni��o.
A severidade do castigo � proporcional � gravidade da falta.
Seria injusto situar na categoria dos maus esp�ritos os esp�ritos sofredores e arrependidos que pedem preces; estes puderam ser maus, mas n�o o s�o mais a partir
do momento em que reconhecem suas faltas e as lamentam; eles n�o s�o sen�o infelizes; alguns mesmo come�am a gozar de uma felicidade relativa.
(O Evangelho Segundo o Espiritismo.)


Selma n�o esquecia o que ouvira na Casa Esp�rita quando convidada a orar. Dissera n�o saber pronunciar palavras bonitas. Havia muito tempo que n�o elevava o pensamento
ao Pai, e se intimidava diante dos irm�os presentes. O orientador lhe dissera, transmitindo-lhe paz:
- Minha irm�, os esp�ritos sempre nos disseram: "A forma n�o � nada, o pensamento � tudo. Orai cada um segundo as vossas convic��es e o modo que mais vos toca; um
bom pensamento vale mais que numerosas palavras estranhas ao cora��o".
(O Evangelho Segundo o Espiritismo.)
Agradecida, Selma respondeu:
- Sinto-me envergonhada por tudo o que fiz em raz�o de minha insanidade espiritual. Durante minha vida toda desprezei e brinquei com as pessoas que estavam pr�ximas
a mim; n�o respeitei seus sentimentos. At� de minha m�e eu esqueci. Por essa raz�o, n�o me considero digna de orar ao Senhor, mas sou agradecida pelo carinho que
recebi nesta casa.
Jo�o se compadecia daquela irm� que iniciava sua compreens�o do bem. Sua consci�ncia despertara e seus olhos espirituais mostravam-lhe o verdadeiro caminho, n�o
aquele que poderia lhe trazer benef�cios materiais moment�neos, mas o dif�cil caminho da evolu��o por meio do amor. Fitando-a com compaix�o, voltou a dizer:
- Minha irm�, n�o se perca no seu passado de ilus�es; o julgamento � Jesus quem faz. O momento agora � de se entregar a renova��o de si mesma, ou seja, dedicar-se
com f� ao seu despertar espiritual. Nosso Mestre est� presenteando-a com a b�n��o do recome�o. Se isso est� acontecendo, � porque Jesus sabe que � chegada a hora
de optar pela felicidade no bem, no amor e na sinceridade em sua rela��o com o pr�ximo. - Percebeu que Selma chorava - Por que n�o enxuga suas l�grimas com o calor
da prece? - perguntou.
Em sil�ncio, Selma iniciou sua prece sem notar a presen�a de ningu�m. Sentia-se �nica no recinto, e nessa solid�o entregou com toda a sua alma ao Divino Amigo.
"Senhor, n�o sei se � muito tarde, mas percebo neste instante de lucidez que o amor � uma for�a gigantesca que se renova sem cessar, enriquecendo ao mesmo tempo
aquele que d� e aquele que recebe. Quero o Senhor, junto a mim para que eu possa enfrentar os obst�culos que encontrar e as tenta��es que poder�o me fazer fraquejar.
N�o quero me entregar ao des�nimo nem � ociosidade, porque agora O conhe�o e � o Vosso caminho que desejo seguir. Quero burilar meu esp�rito elevando meus sentimentos
e, conseq�entemente, aproximando-me de V�s. Pe�o a V�s, Jesus, com humildade e sinceridade, sua b�n��o e sua prote��o para que eu possa prosseguir firme na minha
inten��o. Tenha compaix�o da minha fraqueza e me fortale�a. Assim Seja!"
Selma n�o percebeu que orara em voz alta. Ao terminar, sentiu seus olhos marejados de l�grimas.
Jo�o, enviando-lhe toda a energia de fraternidade, disse-lhe:
- Que Jesus a proteja, minha irm�!
Naquele momento de busca, Selma sentiu a luz do esclarecimento iluminando sua mente. Lembrou de seu filho, t�o pequeno, entregue � sua m�e j� calejada pelos anos
e com t�o poucas for�as para educ�-lo, v�tima de enfermidade cr�nica.
"Meu Deus! Obrigada por me mostrar o caminho. Meu filho, como pude deix�-lo sem a companhia de sua m�e, como fui ego�sta. Preciso ir ao seu encontro."
Ao se despedir de Jo�o, Selma, segurando-lhe as m�os, disse:
- Obrigada, senhor Jo�o, por seu carinho e amizade pude compreender todo o mal que fiz �s pessoas, ao meu filhinho e a mim mesma. Mas a luz se fez em meu cora��o.
Vou retornar ao lugar de onde nunca deveria ter sa�do, junto � minha m�e e a meu filho. Jamais o esquecerei. Que Jesus o aben�oe sempre!
Afastou-se levando consigo a esperan�a de felicidade real, aquela em que o ego�smo, a ambi��o e a maldade n�o fazem moradas.
Uma semana mais tarde, Selma, despedindo-se de Neide e de Flora, partiu levando a promessa das duas amigas de visit�-la em breve. Iniciava-se para Selma um novo
ciclo, em que o equil�brio, os bons sentimentos e as atitudes coerentes e nobres estariam presentes, proporcionando a ela, a Felipe e a Clotilde a paz esperada.



Cap�tulo 15
O reencontro entre m�e e filho


C�ssia entrou euf�rica em casa. - Que alegria � essa, minha filha? - perguntou Antonieta.
- Nada de especial, m�e, estou apenas alegre e achando a vida maravilhosa - exclamou C�ssia.
- E o que faz voc� se sentir assim? Espere, acho que j� sei. O cora��o apaixonado.
- Acertou, dona Antonieta! Completamente apaixonado concordou C�ssia, que rodopiou pela sala demonstrando sua felicidade.
Antonieta, em sil�ncio, agradeceu ao Senhor a recupera��o da filha ap�s tanto sofrimento. E pensava: "Parece-me um sonho ver C�ssia novamente com brilho nos olhos.
Que Deus reserve para ela a real felicidade!"
Voltando � realidade, disse � filha:
- Muito bem, mocinha, conte-me agora como est� o namoro com esse rapaz. Quando pretende traz�-lo aqui para que eu o conhe�a?
C�ssia correu a abra�ar a m�e, dizendo:
- Nosso namoro vai muito bem, m�e. Posso lhe dizer que n�o se preocupe, pois � coisa s�ria. Estamos apaixonados, e ele confirmou que vir� jantar amanh�, conforme
havia dito � senhora, lembra?
- Claro que me lembro, tamb�m quero muito conhec�-lo.
- Conhecer quem? - disse Sabina, entrando na sala e ouvindo a conversa.
- Conhecer o meu amor, Sabina. O homem que despertou em mim novamente a vontade de viver; fez-me acreditar que � poss�vel ser feliz, que tudo passa e o sol sempre
volta a brilhar em nosso cora��o, se permitirmos.
- Meu Deus, esse rapaz deve ser mesmo muito especial para transform�-la desse jeito.
- Tenho certeza de que voc�s duas gostar�o dele. Sabe o que eu disse a ele? Que ter� de ag�entar duas sogras.
- Assim voc� deve ter assustado o rapaz - disse Antonieta.
- E ele, o que respondeu? - perguntou Sabina.
- Bem-humorado, respondeu: duas sogras e tr�s m�es. Realmente tenho muita sorte!
O sorriso das mulheres demonstrou o contentamento que sentiam.

***

A mesa bem-posta e as flores perfumando o ambiente esperavam por Frank e davam testemunho da alegria que reinava na casa de C�ssia.
- Sabina, voc� caprichou no jantar, n�o? - perguntou C�ssia ansiosa.
- Fique tranq�ila, minha menina, est� tudo perfeito. Tamb�m tenho interesse em agradar a esse rapaz, afinal, ele vai desencalhar voc� - disse Sabina brincando.
- Quer dizer que voc� me acha encalhada? - exclamou C�ssia abra�ando a amiga.
Sabina abra�ou-a com carinho e respondeu:
- Feliz daquele que se casar com voc�. N�o tem id�ia da j�ia que est� levando para casa.
- O que voc� diz n�o vale, � suspeita.
- N�o, filha - disse Antonieta entrando na cozinha -, Sabina tem raz�o, voc� tem tudo para fazer um homem feliz.
Com uma leve sombra de tristeza passando por seus olhos, C�ssia respondeu:
- �, m�e, mas n�o consegui fazer, e por conta disso perdi meu pai.
- O que voc� est� dizendo, minha filha, que bobagem � essa?
- Sua m�e tem raz�o, C�ssia, voc� n�o teve culpa de nada. Ningu�m podia mudar o rumo que as coisas tomaram porque elas estavam enraizadas na inconseq��ncia de L�o.
As pessoas carregam o que agasalham em seu cora��o e, quando o orgulho e a ambi��o dominam o sentimento, dificilmente conseguem perceber o caminho escuro que percorrem,
e passam a cometer desatinos. Foi o que aconteceu com L�o, C�ssia, nada tocava seu cora��o a n�o serem seus desejos pouco louv�veis.
- Mas isso tudo j� passou, filha, n�o devemos ficar trazendo o passado de volta. Agora � pensar no futuro, na oportunidade que se apresenta para voc� construir uma
nova vida. Viver nova experi�ncia com mais intelig�ncia, amar sem se anular; caminhar lado a lado com a pessoa que Deus est� colocando junto de voc� para que possam
construir uma vida digna e feliz.
- Certa vez, na reuni�o do centro - disse Sabina -, ouvi de um esp�rito amigo o seguinte: "Inseguran�as todos n�s temos, medo tamb�m, mas � preciso acreditar que
a felicidade conquista de cada um alimentando nossa alma com os valores verdadeiros. N�o devemos exigir demais de n�s mesmos, mas tamb�m n�o podemos cair na lentid�o.
� preciso encontrar o equil�brio".
- Isso diz tudo, filha. Cabe a voc� e a esse rapaz colocarem cada tijolo na constru��o da pr�pria felicidade, e nessa constru��o n�o cabe trazer de volta o passado
de tristeza e dor.
- Voc�s t�m raz�o - disse C�ssia. - O momento agora � de muita alegria e esperan�a, e tenho o direito de viver este presente de Deus.
- � isso mesmo, filha, comece ficando bem bonita para receber seu namorado.
Dando um beijo em sua m�e e em Sabina, C�ssia foi at� seu quarto se preparar para receber Frank.

***

�s 20 horas, Frank tocava a campainha da casa de C�ssia. Estava elegante na sua maneira simples de vestir.
- Boa noite, amor - disse a C�ssia assim que ela abriu a porta.
- Boa noite, Frank! Eu estava ansiosa!
- Verdade? - exclamou o namorado feliz.
- Verdade, meu amor, estava ansiosa para abra��-lo.
- Por que n�o o faz?
Passando os bra�os em volta do pesco�o de Frank, C�ssia abra�ou-o transmitindo nesse gesto o grande carinho e amor que sentia por ele.
- � melhor entrarmos, mam�e o espera.
- Vamos - concordou Frank.
Ap�s as apresenta��es, Frank sentiu-se � vontade por conta da gentileza com a qual fora recebido.
- Queria muito conhecer a senhora, dona Antonieta, assim como dona Sabina. C�ssia fala muito das senhoras e n�o economiza elogios e carinho. Conhecendo-as, percebo
que ela tem raz�o, pois s�o muito agrad�veis e gentis. Fico grato em me receberem.
Antonieta adiantou-se:
- Para n�s tamb�m � uma grande satisfa��o t�-lo entre n�s, e gostar�amos que se sentisse � vontade.
- Quanto a isso n�o se preocupe, dona Antonieta, estou realmente me sentido � vontade.
Sabina permanecia calada olhando fixamente para Frank.
C�ssia, percebendo, indagou:
- Sabina, percebo que assim que viu Frank n�o tira os olhos dele. Alguma coisa em especial?
Meio sem jeito, Sabina respondeu:
- Por favor, me desculpe, principalmente voc�, meu rapaz. N�o h� nada de especial.
C�ssia insistiu:
- Sabina, sinto-a tensa, diga-nos o que est� acontecendo.
Sentindo-se acuada, Sabina respondeu:
- Voc�s podem achar estranho, e eu tamb�m n�o entendo, mas assim que o vi tive uma sensa��o estranha, forte, como se j� o conhecesse. N�o me pe�am explica��es, porque
n�o as tenho.
- Como assim, Sabina, explique-se melhor. Frank mora em outro pa�s � pouco prov�vel que o conhe�a.
- C�ssia tem raz�o, Sabina, acho estranha essa sua rea��o.
- S�o os olhos dele, parece que j� os vi. Sinto como se tivessem sido gravados na minha mem�ria. Por favor, n�o acham gra�a, estou sendo sincera.
- Ningu�m est� achando gra�a, dona Sabina - disse Frank gentilmente. - Pode ser que j� tenha me visto na cidade, estou aqui h� algum tempo.
- �, pode ser - concordou Sabina, encerrando o assunto.
O jantar transcorria tranq�ilo.
Frank saboreava a deliciosa comida de Sabina n�o poupando elogios.
- A senhora cozinha muito bem, dona Sabina. Realmente � um tempero delicioso, n�o podendo ser comparado com a culin�ria do meu pa�s, que, a bem da verdade, est�
longe do que tenho visto aqui no Brasil.
- Eu lhe disse Frank, que iria gostar! - exclamou C�ssia.
- �, voc� n�o exagerou, meu amor.
Antonieta, querendo satisfazer sua curiosidade a respeito do namorado da filha, indagou:
- Fale-me de voc�, Frank, de sua fam�lia, enfim, o que o trouxe ao Brasil.
- M�e! - exclamou C�ssia, envergonhada. - A senhora est� pressionando o Frank.
- De maneira nenhuma, C�ssia, sua m�e tem raz�o. � justo que queira saber mais sobre a vida de seu namorado, e falar de minha fam�lia n�o me traz constrangimento
algum, ao contr�rio, causa-me prazer.
- Obrigada, Frank.
- Na verdade, dona Antonieta, nasci aqui no Brasil, mas fui adotado pelos meus pais antes de completar um ano de idade, e levado para a Am�rica do Norte, onde cresci,
fui educado e me formei. Tenho o maior respeito e amor pelos meus pais adotivos, que n�o pouparam esfor�os para que eu me sentisse feliz.
- E o que o traz de volta ao seu pa�s de origem?
- Tentar encontrar as minhas ra�zes, meus pais biol�gicos, enfim, minha fam�lia de sangue.
- E sua m�e, o que acha disso?
- Meus pais me deram o maior apoio. N�o criaram nenhum obst�culo. Sabem que mesmo que os encontre nada far� diminuir o meu amor por eles. Foram eles que me criaram,
embalaram meus sonhos, curaram minhas dores, sofreram quando sofri e sorriram com meu sorriso. Enfim, dona Antonieta, eles me escolheram como filho e serei grato
por todo o sempre.
- E quando achar sua m�e biol�gica?
- Quero conhecer sua vers�o da hist�ria. Minha m�e me disse que ela � inocente, mas preciso saber dela mesmo at� que ponto est� envolvida em uma atitude cruel, que
trouxe tanta m�goa para meu cora��o, ferindo-o para sempre. Creio n�o ser poss�vel haver um cora��o de m�e t�o insens�vel a ponto de vender o pr�prio filho com apenas
seis meses de idade.
- O que voc� est� dizendo? - perguntou Sabina, tentando se equilibrar diante da ansiedade que come�ava a dominar todo o seu ser.
C�ssia, percebendo o estado em que se encontrava, levantou-se, abra�ou-a e disse-lhe:
- Calma, Sabina, deve ser somente uma coincid�ncia. Fique calma!
Sabina mal conseguia articular uma s� palavra. Frank n�o conseguia entender a raz�o do desequil�brio de Sabina e, meio desajeitado, pediu desculpas.
- Dona Sabina, desculpe-me, jamais poderia imaginar que minha hist�ria causaria essa rea��o na senhora. Sou mesmo inconseq�ente, n�o deveria ter falado nada, afinal,
isso s� interessa a mim. Gostaria que n�o ficasse impressionada com essa hist�ria, o que importa � como me sinto. Hoje sou um homem bem resolvido, feliz, o passado
ficou para tr�s. Se quero encontrar meus pais biol�gicos � porque me sinto no direito de levantar o v�u do meu passado. N�o se impressione nem sofra por mim. Certa
feita ouvi de algu�m que, quando olhamos muito para o abismo, o abismo olha para a gente, por isso n�o detenho minha aten��o nas atitudes, menos felizes, e sim em
tudo o que Deus permitiu que eu tivesse.
Antonieta, admirando a postura de Frank, disse-lhe:
- Voc� � um homem de bem, Frank, merece todo o meu respeito e admira��o.
Sabina, com a voz entrecortada pela emo��o, perguntou:
- Voc� tem elementos para encontrar sua m�e, sabe pelo menos o m�nimo sobre ela?
- Sei o que minha m�e me contou. A cidade onde vivia, o nome de meus pais biol�gicos e dos meus av�s. Ali�s, quem me entregou para ado��o foi minha av� materna.
- Pode ser que sua m�e ignorasse esse ato de sua av� - exclamou Antonieta.
- J� pensei sobre essa possibilidade, dona Antonieta, e � essa d�vida que me move a tentar encontrar minha m�e. Existe a possibilidade de que ela seja inocente,
que n�o tenha culpa alguma.
Sabina, a cada minuto, mergulhava na esperan�a de estar diante de seu filho, que sua m�e cruelmente vendera aos estrangeiros. Ap�s refletir, Antonieta disse a Frank:
- Voc� possui documentos anteriores � sua ado��o que possam facilitar sua investiga��o?
- Documentos, propriamente, n�o, dona Antonieta. Assim que chegaram � Am�rica, registraram-me como seu filho leg�timo, trocando o nome brasileiro.
- Voc� sabe qual era o seu nome anterior, sua data de nascimento ou o nome de seus pais biol�gicos? - perguntou Antonieta.
- Sei, minha m�e nunca escondeu de mim a minha origem.
- Se achar conveniente nos dizer, poderemos ajud�-lo nessa busca - disse Antonieta.
- Meu nome brasileiro � Joaquim, o de meu pai � Ti�o e o de minha m�e �...
Antes que revelasse o nome de sua m�e, ouviram um baque e viram Sabina desfalecida e ca�da no ch�o. Todos se levantaram ao mesmo tempo com o intuito de acudi-la.
- Meu Deus, como ela est� p�lida! � melhor chamar um m�dico, C�ssia.
- O que houve com ela? - perguntava Frank, nervoso. - O que disse que a fez ter essa rea��o?
- N�o sei meu amor - falava C�ssia tamb�m nervosa. - � melhor chamarmos um m�dico.
- Fa�a isso, minha filha - disse Antonieta preocupada.
No momento em que C�ssia ia saindo, ouviu a voz fraca de Sabina:
- N�o precisa chamar m�dico algum, eu... Eu estou bem.
C�ssia se apressou a abra��-la.
- Sabina, pelo amor de Deus, diga-nos o que houve. Qual a raz�o dessa rea��o t�o dr�stica assim quando ouviu o nome de Frank?
Sem conseguir dizer uma s� palavra, Sabina deixava sentidas l�grimas escorrerem pelo seu rosto. Ningu�m conseguia entender nada do que acontecia, at� que Antonieta,
lembrando-se do dia que Sabina confidenciara seu drama, fez a associa��o dos fatos.
- Pelo amor de Deus, Sabina, voc� est� pensando que Frank �... N�o conseguiu terminar seu pensamento. Olhou para o namorado de sua filha e perguntou-lhe:
- Frank voc� realmente sabe o nome de sua m�e?
- Claro dona Antonieta, ela se chama Sa... Um clar�o se fez em sua mente. - Meu Deus! Meu Deus! - dizia sem parar, tomado pela emo��o. - Ser� poss�vel o que est�
acontecendo? N�o posso acreditar!
- Diga Frank, qual � o nome da sua m�e biol�gica - insistiu C�ssia.
- Emocionado, Frank balbuciou: Sabina, ela se chama Sabina - Abra�ou-a dizendo sem parar: - A senhora � minha m�e biol�gica, n�o resta � menor d�vida!
- Calma, vamos com calma - dizia C�ssia. - Deixe Sabina se recuperar, vamos conversar e checar direitinho todas as informa��es para chegarmos � conclus�o certa.
Assim fizeram.
Depois de muito conversarem, de Sabina ter fornecido todas as explica��es que eram coerentes com as que Frank sabia de sua m�e, a verdade apareceu em todo o seu
apogeu.
- N�o tenho a menor d�vida. Voc� � o meu Joaquim, que arrancaram dos meus bra�os. Podemos ter a confirma��o indo ao cart�rio e verificando o seu registro. O dia
do seu nascimento, o nome de seus pais e av�s. Voc� j� tem essas informa��es fornecidas por sua m�e, � s� comparar.
Emocionado, Frank disse, segurando as m�os de Sabina:
- Foi por isso que teve a sensa��o de me conhecer.
- Jamais me esqueci dos seus olhos, do brilho quando eu o apertava em meus bra�os. N�o importam todos os anos que se passaram, seu olhar nunca se apagou da minha
mente. Foi essa lembran�a que me sustentou em minha vida sofrida, foi o que restou de voc�.
Frank a abra�ou novamente.
- Minha m�e tinha raz�o quando dizia que era inocente nessa hist�ria toda. Nunca deixou que nutrisse algum sentimento de revolta contra aquela que me deu a vida.
- Mas voc� me disse que possui sentimento de m�goa por ter sido vendido - disse C�ssia.
- � verdade, mas sentia contra a minha av�, por ter me tratado como se fosse uma coisa que se vende quando n�o se quer. Mas agora, neste instante em que reencontro
a pessoa que me trouxe ao mundo, sabendo da confirma��o da hist�ria que minha m�e me contava, essa m�goa foi expulsa do meu cora��o. Quem errou que carregue sua
culpa, nada me atinge mais.
- Tem raz�o, meu querido, agora � outro momento de sua vida. O reencontro se deu, a alegria se fez no seu cora��o e no cora��o de Sabina, e o que passa a ter import�ncia
s�o seus dias daqui para frente. Como voc� mesmo disse, vai ter duas sogras e tr�s m�es.
- Voc� est� certa, meu amor. Hoje mesmo vou dar a boa not�cia aos meus pais... A senhora se importa que eu continue a cham�-los assim?
- � claro que n�o, Frank. Eles s�o seus pais, eles o criaram, amaram voc� como um filho leg�timo. Eu agrade�o a Deus por reencontrar voc� e perceber o quanto voc�
� feliz, digno, enfim, fizeram de voc� um homem de bem. Deus ouviu minhas preces, reencontrei meu filho depois de tantos anos. De voc� quero apenas o seu carinho
e respeito. Sinto-me recompensada s� em poder dizer a voc� que n�o tive culpa alguma em toda essa hist�ria, fui uma v�tima de minha m�e.
- Estaremos sempre perto, afinal, n�o pretendo deixar C�ssia fugir de mim. Quero-a junto a mim por toda a eternidade, mesmo que tenha duas sogras, ou melhor, duas
m�es e uma sogra, enfim, n�o sei...
Todos riram.
- Meus dois filhos amados unidos pelo amor - disse Sabina abra�ando-os com l�grimas nos olhos.
Quebrando o momento de emo��o, Antonieta disse:
- Que tal provarmos a deliciosa sobremesa feita pela melhor doceira que j� conheci?
- N�o exagere, dona Antonieta - disse Sabina feliz.



Cap�tulo 16
O arrependimento de L�o


Orlando se preparava para assistir � palestra di�ria de madre Teresa quando viu L�o se aproximar, ainda um pouco debilitado.
- Como se sente meu irm�o? - perguntou.
- Estou me fortalecendo aos poucos. Sei que o caminho a percorrer � longo, fiz muitas leviandades, fui inconseq�ente, para n�o dizer cruel. Hoje mergulho no arrependimento
dos meus atos insanos e procuro curar o meu esp�rito por meio do aprendizado que adquiro nas palestras, que, por miseric�rdia de Jesus, obtive permiss�o para comparecer.
- Jesus est� lhe concedendo a b�n��o do aprendizado. Foi agraciado com o perd�o de suas v�timas. O melhor � esquecer e entregar-se ao estudo, aprender a amar de
verdade, preparando-se para em outra oportunidade, se for permitida, retornar ao mundo f�sico e agir com prud�ncia, exercitando o amor em sua plenitude.
- Mas n�o consigo perdoar a mim mesmo por ter agido de maneira t�o inconseq�ente. N�o acreditei na exist�ncia da vida depois de amanh� e vivi apenas para o hoje,
o agora. Vivi para satisfazer a mim mesmo e esse ego�smo levou minha alma � perdi��o.
- O que est� feito, L�o, n�o se pode alterar, mas sempre podemos mudar as novas atitudes, ou seja, aquelas que tomaremos a partir da conscientiza��o dos nossos enganos.
Seja paciente consigo mesmo e perdoe-se, assim estar� livre para restaurar seus erros do passado.
- At� quando vai durar essa ang�stia que tanto me faz sofrer? At� quando vou carregar o peso da culpa? Pela eternidade? - perguntou L�o.
- N�o sei a resposta a essa pergunta, L�o - disse Orlando com sinceridade.
Jacob, que acabara de chegar, ouviu o di�logo entre os dois esp�ritos e prontamente respondeu:
- L�o, o ap�stolo Paulo disse: "Querer que o castigo seja eterno por uma falta que n�o � eterna � negar-lhe toda a raz�o de ser".
- O que isso significa?
- Significa que as penas futuras s�o tempor�rias e sempre proporcionais � natureza e � gravidade da falta cometida. Durar� o tempo necess�rio ao seu melhoramento.
E n�o se pode esquecer que Deus sempre concede nova oportunidade de retorno ao devedor, para que possa anular as marcas de sofrimento deixadas na encarna��o passada,
construindo um caminho de amor, fraternidade e paci�ncia ao lado das pessoas que se sentiram lesadas e n�o conseguiram ainda, por qualquer motivo, perdoar. Deus
nos concede em abund�ncia tudo o que precisamos para nos tornar verdadeiramente Suas criaturas.
Ao ouvirem o doce acorde da m�sica vinda do audit�rio onde se realizaria a palestra, dirigiram-se apressados para mais um dia de aprendizado. O audit�rio repleto
esperava em ora��o a chegada de madre Teresa.
Apenas uma t�nue luz violeta iluminava o ambiente. Sem demora, o esp�rito adentrou o recinto contagiando-o com sua alegria e amor. Ap�s breve ora��o solicitando
a Jesus permiss�o e b�n��os para aquele momento, madre Teresa iniciou sua palestra.
- Meus queridos e amados irm�os em Cristo, hoje temos aqui irm�os que ainda sofrem por n�o conseguirem se libertar da culpa dos desatinos cometidos no orbe terrestre.
Nada simplesmente se apaga na trajet�ria do esp�rito sem esfor�o, sem o pr�prio melhoramento interior, sem a quita��o de seus d�bitos com aqueles que sua inconseq��ncia
prejudicou.
Todas as nossas a��es provocam rea��es boas ou m�s, dependendo das a��es praticadas, portanto, n�o somos v�timas quando sofremos ao retornar � nossa p�tria espiritual.
Tudo o que se faz para o pr�ximo se faz para si, porque cada um � herdeiro de si mesmo.
Durante a estada no mundo f�sico, � a nossa f� no Criador, a certeza da vida futura e o bem praticado que nos ajudar�o a caminhar entre l�grimas, injusti�as ou ingratid�o
sem ferir nossos p�s nem violentar a integridade da nossa alma. Mas poucos sabem disso, e se entregam � busca incans�vel da posi��o social, na correria desenfreada
pelo sucesso, na vontade f�rrea de subir na vida e, nessa busca incessante, n�o percebem que cada vez mais descem em rela��o � vida espiritual.
Se o esp�rito encarnado pensasse na vida futura pressentindo a verdade do amanh� na vida eterna, policiaria suas palavras, para que elas jamais ofendessem ou humilhassem
seu semelhante. Ao contr�rio, confortariam, incentivariam, levantando o �nimo de quem se abate por fraqueza espiritual, levando-o a acreditar mais em si, na pr�pria
vida e principalmente em Deus.
Mas nada est� perdido, meus irm�os. Deus aceita o arrependimento sincero, e a conseq��ncia desse arrependimento � o desejo que o esp�rito sente de novamente se reencarnar
para se purificar.
� o in�cio da compreens�o de suas imperfei��es, e ele sabe que s�o elas que o impedem de ser feliz.
O sil�ncio reinava absoluto no audit�rio. Cada um sentia o efeito das s�bias palavras de madre Teresa no ponto que mais o atingia, mas todos sabiam que eram os �nicos
respons�veis pela dor que ora os atingia.
L�o n�o perdia uma s� s�laba, bebia os ensinamentos do mesmo modo que o n�ufrago se agarra a seu salvador. Seu pensamento procurou o Divino Amigo e solicitou: "Jesus
de Nazar�, sei que n�o mere�o o aux�lio, mas suplico por vossa miseric�rdia, dai-me a for�a necess�ria para enfrentar meus erros do passado. Fortale�a-me, Senhor,
para que eu possa resgatar as virtudes adormecidas em mim e, no momento adequado, retornar ao mundo f�sico para consertar os estragos que causei.
Madre Teresa, finalizando sua breve palestra, disse aos irm�os que a ouviam:
- Meus amados irm�os, a vida espiritual � muito sutil. Podemos alcan�ar essa sutileza pelo ato de amar. Quanto mais nos despojamos das vaidades que pertencem � mat�ria
e amamos verdadeiramente nosso semelhante, encarnado ou desencarnado, mais f�cil ser� sintonizar esse mundo por meio da presen�a de Deus em n�s.
Nada acontece em nossa exist�ncia terrena ou espiritual por obra de um simples acaso.
Quando Deus reserva para cada um de n�s a solid�o, � para que possamos desenvolver o amor em todas as suas formas, e uma delas � aprender a olhar o semelhante como
um irm�o e am�-lo fraternalmente.
Voltem para suas tarefas em paz e sintam o amor de Deus em cada fibra do seu ser.
Que o Divino Amigo os aben�oe sempre.
Ap�s uma singela prece, deu por encerrada a palestra do dia.
Logo o sal�o se fez vazio, mas a energia do bem e do amor continuava presente nos pequenos flocos azuis que docemente desciam do Mais Alto.
L�o caminhava cabisbaixo pensando em tudo o que ouvira.
- Como pude ser t�o cego, meu Deus? Por que pratiquei tantos desatinos? Por que infernizei tanto a vida de C�ssia e acabei tirando a vida de um homem de bem? N�o
posso ag�entar essa dor! - exclamava para si mesmo.
Jacob, acompanhado de Eneida e Orlando, foram ao seu encontro.
- Por que tanta dor, L�o? N�o ouviu as palavras da querida madre Teresa explicando que a nossa maior alegria � saber que tudo passa, que sempre podemos recome�ar
e que nenhuma dor dura para sempre? O esp�rito mais cruel um dia se tornar� bom, porque assim Deus o quer.
- N�o posso suportar a mim mesmo, Jacob. N�o consigo me perdoar nem esquecer. Preciso consertar os estragos que fiz quando encarnado.
Orlando dirigiu-se a ele, dizendo:
- L�o, eu j� o perdoei sinceramente, e creio que todos os que se sentiram atingidos por voc� tamb�m j� o perdoaram. Agora � preciso se fortalecer nas virtudes e
se preparar para, quando chegar o momento do seu retorno, estar consciente do papel que ir� desempenhar no mundo f�sico.
- Jacob, quero voltar agora. Preciso dar � C�ssia todo o amor que ela esperou receber e que eu n�o dei.
- � cedo ainda para seu retorno, L�o. � necess�rio se preparar para n�o cair nos mesmos erros. Ainda tem muito que aprender!
- N�o ag�ento conviver com meu passado, Jacob, sofro muito.
- � preciso ter paci�ncia, L�o - respondeu Jacob com suavidade.
- Mas como vou ter paci�ncia, se � justamente a impaci�ncia que me consome?
- � necess�rio saber esperar. A paci�ncia � uma virtude que se conquista mesmo que seja a duras penas. Fa�a um esfor�o, meu amigo. Pense em Jesus, que, mais do que
outro ser, demonstrou paci�ncia, e o tenha como seu melhor amigo. Ele o confortar�.
Tom�s, chegando, interrompeu Jacob com delicadeza, dizendo:
- Desculpe minha intromiss�o, Jacob, mas est�o solicitando sua presen�a na ala dois do hospital.
- O que acontece?
- Nosso irm�o que h� pouco chegou da zona umbralina est� nervoso, inquieto e muito agitado.
J� sabendo de quem se tratava, Jacob exclamou:
- Ti�o!
- Sim - respondeu Tom�s.
- Vamos at� ele - disse Jacob, despedindo-se de L�o e Orlando, e seguido por Eneida.
Orlando, sentindo o desejo de acompanh�-lo, perguntou:
- Posso segui-lo, Jacob?
- � melhor ficar com L�o. Sigam at� o lago azul e se entregue � ora��o, clamando aux�lio para o equil�brio de L�o.
Assim foi feito.
Enquanto Jacob ia ao socorro de Ti�o, Orlando e L�o seguiram a orienta��o de Jacob, foram at� o lago azul e se entregaram a prece.
Entrando no quarto de Ti�o, Jacob ficou estarrecido com o estado de desequil�brio em que o esp�rito se encontrava. Debatia-se ferozmente, clamando por miseric�rdia.
Jacob aproximou-se lentamente, orou ao Senhor pedindo aux�lio e iniciou o atendimento a Ti�o.
Acompanhado de Eneida e Tom�s, energizava-o com vibra��es de amor e paz, envolvendo-o em uma luz azulada. Os tr�s esp�ritos mantinham-se em prece, e logo o aux�lio
divino se fez presente na forma de flocos brilhantes, que ca�am suavemente sobre Ti�o, cobrindo-o docemente. Ti�o, aos poucos, foi se entregando ao doce amor de
Jesus e retomando seu equil�brio. Jacob, Eneida e Tom�s permaneceram em prece at� que Ti�o, cansado, adormecesse serenamente.
- Vamos deix�-lo dormir - disse Jacob aos respons�veis pelo setor. - O sono � muito importante para ele nesta fase de adapta��o. Sua chegada aqui ao hospital ainda
� muito recente, � preciso sempre emitir-lhe energia salutar. Assim que acordar, podem me chamar que virei imediatamente.
Deixou o recinto novamente acompanhado de Eneida e Tom�s, que perguntou:
- Diga-me, Jacob, por que Ti�o se desequilibrou dessa maneira?
- Ele ainda est� preso ao seu pr�prio inferno.
- Pode explicar melhor? - pediu Tom�s.
- Ti�o retornou do mundo f�sico com muitas d�vidas. Marcou sua estada na Terra com atos de crueldade. N�o respeitou o pr�ximo nem as leis de Deus. Agia sempre como
se fosse o dono do mundo, sem nunca se importar com as l�grimas que deixava atr�s de si. Ao se libertar do corpo f�sico, foi atra�do para o lugar onde sua sintonia
o levava, ou seja, as zonas infelizes, onde cada um vive o tormento que cavou para si mesmo.
- Mas ele n�o foi resgatado? - perguntou novamente Tom�s.
- Ap�s alguns anos perdido na dor, no sofrimento, colhendo os frutos da semente que de maneira leviana plantara na Terra, em um momento de lucidez arrependeu-se
de todo o mal que espalhara entre as pessoas que conviveram com ele. Implorou miseric�rdia ao Divino Amigo. Pediu clem�ncia sinceramente, e seu resgate foi permitido.
O resto voc� j� sabe.
- Mas por que ainda se desequilibra dessa maneira?
- Porque ainda traz gravados em sua mente os horrores pelos quais passou nas zonas de sofrimento. Logo isso tamb�m passar� a ele poder� iniciar seu caminho de paz
por meio do seu progresso e da depura��o de seus sentimentos.
- A dura��o dos sofrimentos dos esp�ritos pode ser eterna?
- Sem d�vida, se ele fosse eternamente mau, ou seja, se jamais tivesse de se arrepender nem de se melhorar. Ent�o sofreria eternamente. Mas Deus n�o criou seres
eternamente voltados ao mal. Criou-os apenas simples e ignorantes, e todos devem progredir num tempo mais ou menos longo, de acordo com a pr�pria vontade. Ela pode
ser mais ou menos retardada, assim como h� crian�as mais ou menos precoces, mas mais cedo ou mais tarde ela se manifesta por uma irresist�vel necessidade que o esp�rito
sente de sair da inferioridade e ser feliz. A lei que rege a dura��o das penas �, portanto, eminentemente s�bia e benevolente, pois subordina essa dura��o aos esfor�os
do esp�rito, jamais lhe tirando o livre-arb�trio: se dele fez mau uso, sofrer� as conseq��ncias disso.
- H� esp�ritos que jamais se arrependem?
- H� esp�ritos cujo arrependimento � tardio, mas pretender que jamais melhorem seria negar a lei do progresso e dizer que a crian�a n�o pode tornar-se adulta (S�o
Luis, O Livro dos Esp�ritos, quest�es 1006 e 1007).
Enquanto tudo isso acontecia, Orlando e L�o permaneciam ainda sentados em frente ao lago azul.
- Fale-me com franqueza, senhor Orlando, posso realmente crer que o seu perd�o � sincero?
Orlando, surpreso com a pergunta, respondeu:
- Em primeiro lugar, gostaria que me chamasse apenas de Orlando, elimine de uma vez esse senhor. Quanto ao perd�o, L�o, j� lhe disse que o perdoei plenamente, quero
e vibro para que voc� se equilibre e possa, em um futuro pr�ximo, trabalhar no aux�lio aos irm�os necessitados. Isso vai depender de voc�, do seu aproveitamento,
da supera��o de si mesmo, enfim, do seu entendimento que somente o amor transforma o ser, seja ele encarnado ou desencarnado.
- Mas tenho em mente voltar para a Terra em uma nova experi�ncia junto �s pessoas que prejudiquei, principalmente C�ssia.
- Voc� ainda n�o entendeu que � muito cedo para seu retorno? Seus mestres j� lhe disseram isso. Por que teima em querer mudar as coisas de lugar? Jesus sabe o momento
certo de todas as coisas, � preciso aguardar.
L�o abaixou a cabe�a, dizendo:
- Sei que tem raz�o. Preciso aprender, em primeiro lugar, a ter paci�ncia.
- Lembre-se do que disse madre Teresa em sua palestra: "A paci�ncia � virtude que se conquista, mesmo que seja a duras penas". N�o se esque�a disso, L�o, e se esforce.
Temos a eternidade pela frente para melhorar nossas imperfei��es.

***

Uma semana se passou desde esses acontecimentos.
Jacob mais uma vez foi ter com Ti�o, que, ap�s um sono reparador de sete dias, acordara bem disposto. Entrando no quarto, encontrou-o em uma cadeira em frente �
janela. Seu olhar divagava pelo extenso gramado verde no entorno do hospital.
- Bom dia, meu irm�o, que Jesus o aben�oe - disse sorridente.
Ti�o olhou de relance e voltou a admirar o gramado. Jacob n�o se intimidou.
- Ent�o, Ti�o, como se sente? - voltou a interrog�-lo.
- Mais tranq�ilo - respondeu sem olhar para ele.
- Gostaria de conversar um pouco, obter algum esclarecimento?
- Gostaria.
- Fique � vontade, meu irm�o, pergunte o que quiser.
- Eu me sinto muito envergonhado por haver feito tanto mal, gostaria de mudar de alguma forma minhas atitudes levianas do passado, recompensar as pessoas que prejudiquei.
Como posso fazer isso?
Com paci�ncia, Jacob respondeu:
- Meu irm�o querido, o que escrevemos na trajet�ria da nossa vida n�o podemos simplesmente apagar e agir como se nada tivesse acontecido. � preciso reescrever substituindo
o erro pelo acerto; a leviandade pela prud�ncia; a indiferen�a pela amizade e, principalmente, o desamor pelo amor fraternal e pleno. Isso se chama reforma �ntima.
A mudan�a verdadeira come�a dentro de n�s e se inicia a partir do instante em que percebemos nossos enganos, nossas imperfei��es e lutamos para nos melhorar como
criaturas de Deus. A partir da�, vamos passo a passo superando a n�s mesmos e abrindo espa�o dentro do cora��o para nosso semelhante, aceitando-o como leg�timo irm�o
e deixando rastros de amor por onde andarmos. Somente agindo assim podemos recompensar as pessoas que em algum momento lesamos.
- Quer dizer que o sentimento de amor � o principal ingrediente para o equil�brio e a paz?
- Sim. O amor � uma for�a gigantesca que se renova sem cessar, enriquecendo ao mesmo tempo aquele que d� e aquele que recebe. � por interm�dio do amor e da nossa
vontade que atra�mos as vibra��es positivas que se infiltram em nosso ser e nos fortalecem para que possamos enfrentar os obst�culos encontrados.
- E quando aparece o des�nimo?
- Devemos lutar contra ele. A vida � um buscar constante, � a luta incessante contra sentimentos mesquinhos e pequenos, mas, se soubermos usar as armas que os sentimentos
puros e elevados nos fornecem, sairemos vencedores dessa batalha constante.
- O senhor est� esquecendo que na vida f�sica encontramos muitos obst�culos dif�ceis de superar. Creio que s�o eles que nos empurram para os desatinos.
- Empurram aqueles que n�o t�m f� no Criador, cujo orgulho os faz imaginar serem merecedores de toda a sorte de felicidade sem se esfor�arem para isso. � evidente
que encontramos obst�culos durante nosso percurso na Terra. Nessas horas em que o des�nimo e a vontade de recuar tomam conta do nosso esp�rito, devemos orar. Elevar
o pensamento at� nosso Pai e pedir com humildade e sinceridade Sua prote��o, a Sua b�n��o e a for�a para prosseguir. Ti�o, Deus espera pacientemente a perfei��o
de Suas criaturas, porque Ele sabe que um dia acontecer�.
- Eu queria saber como est� Sabina, minha companheira que tanto fiz sofrer; provoquei-lhe a maior dor que um ser humano pode suportar que foi a separa��o de seu
filho. Como posso obter o perd�o?
- Ela j� o perdoou, Ti�o. Sofreu muito, � verdade, mas seu cora��o generoso o perdoou. Se isso alivia seu esp�rito, saiba que Sabina reencontrou seu filho e sua
alegria foi dupla, ou seja, abra�ou o filho querido e soube que ele e C�ssia, a menina que criou como a uma filha, se amam e ser�o muito felizes juntos.
- Isso alivia minha dor, saber que Sabina voltou a ser feliz!
Ap�s pensar um pouco, Ti�o novamente perguntou:
- Por que o gigante do mal invade nosso ser tornando-nos inconseq�entes e fazendo-nos cometer desatinos?
- Jesus deixou a �nica f�rmula de prote��o contra esse gigante do mal, Ti�o, mas os homens se esquecem facilmente das palavras do Mestre: "Orai e vigiai". Orar ao
Senhor e vigiar a si mesmo, porque o sofrimento dura enquanto durar sua teimosia e persist�ncia no mal. Agora seria proveitoso que descansasse mais um pouco, Ti�o,
precisa se fortalecer para iniciar uma nova caminhada, caminhada essa de aprendizado, reflex�es e equil�brio. Se entregue a for�a poderosa da ora��o. Traga o Divino
Amigo para engrandecer seu ser.
Jacob afastou-se deixando Ti�o assimilando suas palavras. Lembrando da recomenda��o de Jacob, ele tentou entregar sua ang�stia ao Senhor e orou:


Senhor,
Viva comigo este momento de dor, ansiedade e incerteza.
Momento em que sinto no meu ser o desespero dos descrentes,
A revolta dos fracos e o medo dos covardes.
Viva comigo, Senhor, venha ao meu encontro
Para que eu possa sentir Teus bra�os me envolvendo
E me conduzindo para o descanso.
Sentir t�o forte a Tua presen�a em mim
Dando-me a sensa��o de estar deitado em Teu colo.
Clamo Senhor,
Viva comigo este momento para que junto a Ti
Eu saiba transformar o desespero em aceita��o,
A revolta em f�; o medo em coragem
Para enfrentar meus primeiros momentos no Teu reino.
Viva comigo, Senhor,
Porque junto a Ti sei que encontrarei for�a Para escrever nova hist�ria de amor.


Terminando sua ora��o, Ti�o, sentindo-se confortado, entregou-se novamente ao sono reparador.



Cap�tulo 17
Limpando o passado


Selma acostumara-se ao novo ritmo da sua vida. Renovara seus conceitos e seus valores e, por conta disso, cuidava de Clotilde e Felipe com dedica��o. No per�odo
da tarde trabalhava em um escrit�rio ajudando sua m�e, que vivia da pens�o que recebia. Tudo parecia ir bem para aquela que um dia vivera no luxo e na futilidade.
Conhecera Magda, sua colega de trabalho, e desde ent�o freq�entava junto com a amiga o Centro Esp�rita de sua cidade.
As coisas caminhavam para o equil�brio de Selma, mas ela n�o conseguia a felicidade e a paz que tanto procurava por conta de suas lembran�as passadas. Aprendera
nas palestras que ouvia nas reuni�es do centro que a paz s� consegue reinar em nosso cora��o quando este n�o agasalha nenhum remorso ou culpa pelos atos levianos
praticados contra o nosso pr�ximo. E Selma, sabendo disso desde o seu aprendizado da Doutrina Esp�rita, martirizava-se por conta do que fizera � C�ssia, destruindo
seu casamento. Quanto a L�o, sabia que o perd�o j� existia de ambos os lados, mas, em rela��o � C�ssia, n�o sabia o que fazer, pois n�o tinha a menor ID�IA DE COMO
ENCONTR�-LA, J� QUE SABIA APENAS O NOME DE SUA CIDADE, MAIS NADA.
EM SUAS ORA��ES, PEDIA SEMPRE AO SENHOR QUE A AJUDASSE A ENCONTRAR AQUELA QUE TANTO PREJUDICARA, E ALIMENTAVA A ESPERAN�A DE QUE UM DIA ISSO ACONTECERIA.
FELIPE, NA INOC�NCIA DE SEUS POUCOS ANOS DE VIDA, PERGUNTAVA SEMPRE PELO PAPAI, DEIXANDO SELMA E CLOTILDE SEM RESPOSTA.
O TEMPO PASSAVA, DISTANCIANDO-A CADA VEZ MAIS DO SEU PASSADO.
CERTO DIA, AO CHEGAR AO ESCRIT�RIO, RECEBEU A NOT�CIA DE QUE TERIA DE FAZER UMA CURTA VIAGEM PARA O INTERIOR DE NO M�XIMO DOIS DIAS, A FIM DE RESOLVER ALGUNS ASSUNTOS
PENDENTES LIGADOS AO ESCRIT�RIO. NO PRIMEIRO MOMENTO, TENTOU JUSTIFICAR DIZENDO DA IMPOSSIBILIDADE DE SE AUSENTAR, MAS, AO SABER DE QUE CIDADE QUE SE TRATAVA, ACEITOU
DE PRONTO - ERA A CIDADE ONDE C�SSIA MORAVA.
"E A MINHA OPORTUNIDADE DE ENCONTR�-LA", PENSAVA. "DEUS OUVIU AS MINHAS PRECES. A CIDADE � PEQUENA E N�O DEVE SER DIF�CIL SABER ONDE MORA."
EM TR�S DIAS, VIAJAVA EM SEU CARRO RUMO AO INTERIOR. CHEGOU � TARDINHA, ACOMODOU-SE EM UMA PEQUENA POUSADA E, COMO SEU COMPROMISSO DE TRABALHO SERIA NA MANH� SEGUINTE,
APROVEITOU a FOLGA PARA SE INTEIRAR DO QUE REALMENTE A INTERESSAVA. ENCONTRANDO A DONA DA POUSADA, APROXIMOU-SE E GENTILMENTE INDAGOU-LHE SE CONHECIA A FAM�LIA DE
C�SSIA.
- PELO QUE EST� ME FALANDO, DEVE SER A FAM�LIA DO SENHOR ORLANDO E DA DONA ANTONIETA; MAS N�O SEI SE SABE QUE ELE J� FALECEU H� ALGUM TEMPO. QUANTO � DONA ANTONIETA,
MORA COM SUA FILHA C�SSIA, E UMA EMPREGADA QUE � CONSIDERADA DA FAM�LIA, DEVIDO AOS ANOS QUE EST� COM ELES, A DONA SABINA.
SELMA N�O ACREDITAVA QUE TUDO ACONTECERA DA MANEIRA MAIS F�CIL E TRANQ�ILA.
- SIM, FIQUEI SABENDO DA MORTE DO SENHOR ORLANDO - RESPONDEU. - GOSTARIA MUITO DE ME ENCONTRAR COM A FILHA DELE, A C�SSIA.
FOMOS AMIGAS NO TEMPO EM QUE ELA MORAVA NA CAPITAL. PERDI O CONTATO COM ELA, E ESSA VIAGEM ME DEU A OPORTUNIDADE DE ENCONTR�-LA. SE A SENHORA N�O SE IMPORTAR, GOSTARIA
DE TER SEU ENDERE�O.
- COM PRAZER. ELA DEVE FICAR CONTENTE EM REVER UMA AMIGA DE TEMPOS ATR�S.
PEGANDO UMA FOLHA DE PAPEL, ESCREVEU RAPIDAMENTE O ENDERE�O, DIZENDO:
- N�O TEM COMO ERRAR, ESSA RUA SAI DA PRA�A CENTRAL, � F�CIL.
- N�O SE PREOCUPE, ACHAREI FACILMENTE. A SENHORA ACHA QUE PODERIA IR AGORA A CASA DELA, OU MELHOR, AMANH�?
- AINDA � CEDO, ESTAMOS NO FINAL DA TARDE, CREIO N�O TER NENHUM PROBLEMA.
- MUITO OBRIGADA, SENHORA...
- IN�S!
- DONA IN�S, MUITO OBRIGADA MESMO. A SENHORA N�O IMAGINA COMO ME FEZ FELIZ PRESTANDO-ME ESTE FAVOR.
ENTUSIASMADA, SELMA SAIU LEVANDO EM SEU CORA��O A ESPERAN�A DE FINALMENTE PODER ESTAR JUNTO DE C�SSIA E PEDIR-LHE PERD�O POR SUAS ATITUDES DO PASSADO. PENSANDO
SER MELHOR CHEGAR DE SURPRESA, EVITANDO ASSIM UMA POSS�VEL REA��O NEGATIVA DE C�SSIA, ENCAMINHOU-SE AT� SUA CASA. AP�S TOCAR A CAMPAINHA, SELMA, ANSIOSA, ESPEROU
QUE A PORTA FOSSE ABERTA.
EM POUCOS MINUTOS, FOI � PR�PRIA C�SSIA QUEM A ATENDEU.
O CORA��O DE SELMA BATEU UM POUCO MAIS ACELERADO A SE VER FRENTE A FRENTE COM AQUELA A QUE TANTO FEZ SOFRER.
- BOA TARDE - DISSE AMIGAVELMENTE. - IMAGINO QUE A SENHORITA SEJA A C�SSIA, ESTOU CERTA?
- EST�. O QUE DESEJA?
- SEI QUE VOC� N�O ME CONHECE PESSOALMENTE, MAS IMAGINO QUE MEU NOME N�O LHE SER� ESTRANHO.
- E QUAL � O SEU NOME, PODE ME DIZER?
- CLARO, VIM PROCUR�-LA PORQUE TENHO MUITO QUE LHE DIZER. EU ME CHAMO SELMA.
FOI � VEZ DE C�SSIA SENTIR SEU CORA��O BATER MAIS FORTE.
- SELMA - REPETIU -, A AMANTE QUE ROUBOU MEU MARIDO, ESTOU CERTA?
- EST�.
FAZENDO MEN��O DE FECHAR A PORTA, C�SSIA DISSE:
- N�O TEMOS ABSOLUTAMENTE NADA PARA CONVERSAR, E N�O TENHO O MENOR PRAZER EM CONHEC�-LA.
SELMA SEGUROU A PORTA COM AS M�OS, IMPEDINDO-A DE FECHAR.
- C�SSIA, POR FAVOR, ME OU�A. EU VIM EM PAZ, PRECISO MUITO CONVERSAR COM VOC�. TALVEZ N�O ACREDITE, MAS QUERO LHE PEDIR PERD�O POR TODO O MAL QUE LHE FIZ.
DEIXE-ME ENTRAR, EU LHE PE�O, D�-ME A CHANCE DE TIRAR O PESO QUE TRAGO EM MEU PEITO.
ANTONIETA, APARECENDO NA PORTA, PERGUNTOU:
- O QUE EST� ACONTECENDO, MINHA FILHA? QUEM � ESSA MO�A?
C�SSIA COLOCOU A M�E CIENTE DO ASSUNTO.
- DEIXE-A ENTRAR, C�SSIA, OU�A O QUE ELA TEM A LHE DIZER. AFINAL DE CONTAS, ELA N�O PODER� MAIS LHE CAUSAR NENHUM MAL.
- OBRIGADA, MINHA SENHORA, O MEU ASSUNTO � R�PIDO E, ao CONTR�RIO DO QUE C�SSIA PENSA, IMAGINO QUE S� VAI FAZER BEM A ELA E A MIM.
C�SSIA, ABRINDO A PORTA, CONVIDOU-A A ENTRAR.
- VOU LOGO AO ASSUNTO QUE ME TROUXE AQUI - DISSE SELMA ASSIM QUE SE ACOMODOU NA SALA, PR�XIMO A C�SSIA.
- ESTOU OUVINDO! - EXCLAMOU C�SSIA.
- EU A PREJUDIQUEI MUITO. RECONHE�O E ASSUMO O MEU ERRO, MAS N�O POSSO MAIS CONVIVER COM ESSE PESO EM MEU CORA��O. VIM AQUI COM A INTEN��O DE PEDIR O SEU PERD�O
E DIZER-LHE QUE sinceraMENTE DESEJO QUE SEJA FELIZ. HOJE, DEPOIS DE TANTO APRENDER SOBRE A SINCERIDADE E O RESPEITO QUE SE DEVE TER PARA COM AS PESSOAS, N�O POSSO
MAIS SUPORTAR TODO O MAL QUE LHE FIZ.
- POR QUE SOMENTE AGORA, DEPOIS DE TANTO TEMPO, TEVE ESSA CRISE DE CONSCI�NCIA? - PERGUNTOU C�SSIA, AINDA DESCONFIADA.
- � UMA LONGA HISTORIA. SE REALMENTE ESTIVER DISPOSTA A ME OUVIR, TEREI O MAIOR PRAZER EM LHE CONTAR.
- GOSTARIA DE OUVIR. J� QUE COME�AMOS, DEVEMOS IR AT� O FIM, PELO MENOS NADA FICAR� PENDENTE.
SELMA RESPIROU FUNDO E, EM SEGUIDA, DISSE:
- C�SSIA, N�O VOU JUSTIFICAR MEUS ERROS EM RELA��O A VOC� DIZENDO QUE MINHA INF�NCIA FOI POBRE, QUE SONHAVA COM ISSO OU AQUILO. N�O. NADA DISSO JUSTIFICARIA
MINHA ATITUDE. MINHA LEVIANDADE NASCEU DA MINHA VAIDADE INCONTROL�VEL E, PARA SATISFAZ�-LA, N�O ME IMPORTAVA COM OS RASTROS DE DOR QUE DEIXAVA EM MEU CAMINHO, PORQUE
A MIM S� INTERESSAVA MINHA SATISFA��O PESSOAL. CONHECI L�O E, NO IN�CIO, N�O SABIA QUE ERA CASADO E ENTREI DE CABE�A NESSA RELA��O, PORQUE PERCEBI QUE ALI ESTAVA
� MINA DE TUDO O QUE DESEJAVA. QUANDO SOUBE DA VERDADE, J� O AMAVA E N�O QUIS RECUAR. REALIZAVA POR INTERM�DIO DELE TODOS OS MEUS SONHOS DE CONSUMO E, PERCEBENDO
QUE CORRIA RISCO DE PERD�-LO PARA VOC�, EXIGI QUE SE SEPARASSE. DESCULPE O QUE VOU LHE DIZER, MAS ELE TAMB�M ESTAVA APAIXONADO POR MIM. EU VIVIA no PARA�SO COM A
PESSOA QUE AMAVA E QUE CULTIVAVA MINHA VAIDADE. N�O ME IMPORTEI EM NENHUM MOMENTO COM A DOR QUE ESTAVA LHE CAUSANDO. MAS O DESTINO NOS TRAZ SURPRESAS. CONHECI ARMANDO
E POR ELE ME APAIXONEI DE VERDADE, CONHECENDO O QUE �, NA REALIDADE, O AMOR. N�S NOS ENCONTR�VAMOS �S ESCONDIDAS. L�O COME�OU A DESCONFIAR. EU QUIS CONTAR A VERDADE
E ME SEPARAR DELE, MAS ARMANDO ARMOU UM PLANO PARA CONSEGUIRMOS DEFINITIVAMENTE UMA PENS�O POR MEIO DE UM FILHO, E FOI O QUE FIZEMOS.
NESSE INSTANTE, SELMA SE EMOCIONOU E SEUS OLHOS BRILHARAM COM T�MIDAS L�GRIMAS.
- CONTINUE - DISSE C�SSIA, IMPASS�VEL.
- MAIS UMA VEZ O DESTINO SE INTROMETEU. ASSIM QUE SE CONFIRMOU A GRAVIDEZ, FUI LHE CONTAR, MAS FIQUEI SURPRESA QUANDO L�O ESBOFETEOU MEU ROSTO. DEPOIS DE MUITOS
TAPAS E PALAVRAS AGRESSIVAS, ELE ME REVELOU SER EST�RIL. N�O PODIA ENGRAVIDAR NINGU�M. BEM, O FIM VOC� DEVE IMAGINAR. N�S NOS SEPARAMOS E NO MESMO DIA ELE me COLOCOU
PARA FORA DE CASA. SA� ATORDOADA E FUI PROCURAR ARMANDO, QUE, SABENDO DO ACONTECIDO E DE SEU PLANO TER DADO ERRADO, N�O QUIS ASSUMIR A GRAVIDEZ. DISSE QUE N�O CONTASSE
COM ELE, QUE IRIA EMBORA PARA NUNCA MAIS VOLTAR E QUE EU CRIASSE O FILHO SOZINHA. MAIS UMA VEZ, SELMA SILENCIOU.
ANTONIETA, PERCEBENDO A GRANDE AFLI��O QUE TOMAVA CONTA DA DAQUELA POBRE MO�A, OFERECEU-LHE UM COPO DE �GUA.
- SE N�O FOR INC�MODO, EU ACEITO, DONA ANTONIETA.
C�SSIA CONTINUOU IMPASS�VEL, SEM DEMONSTRAR NENHUMA REA��O. SELMA, SENTINDO-SE MELHOR, CONTINUOU:
- DEPOIS DESSE EPIS�DIO, MINHA VIDA MUDOU. SOFRI V�RIAS AFLI��ES QUE N�O GOSTARIA DE REVELAR AGORA, PORQUE N�O CABE NO meu PROP�SITO ATUAL, QUE � CONSEGUIR O SEU
PERD�O.
- N�O PRECISA FALAR MAIS NADA, SELMA, J� SEI O SUFICIENTE. S� N�O COMPREENDO POR QUE RESOLVEU ME PROCURAR DEPOIS DE TANTO TEMPO.
- PORQUE HOJE SOU UMA PESSOA TEMENTE A DEUS. INGRESSEI NA DOUTRINA ESP�RITA E CONHECI A VERDADE. HOJE SEI SOBRE A VIDA DEPOIS DO NOSSO AMANH� TEMPOR�RIO, E ISSO
ME FEZ ENTENDER QUE ENQUANTO N�O LIMPAR MEU CORA��O DESSA CULPA QUE CARREGO, N�O PODEREI SER FELIZ NOVAMENTE, POIS S� CONSEGUIREI A PAZ QUE ALMEJO PELO SEU PERD�O.
ANTONIETA E C�SSIA ESTAVAM PERPLEXAS COM A SINCERIDADE COM A QUAL SELMA ABRIA SEU CORA��O. C�SSIA SE AVENTUROU A FAZER UMA PERGUNTA:
- PERDOE-ME, SELMA, SE POSSO MAGO�-LA, MAS E QUANTO ARMANDO? QUE SENTIMENTO NUTRE POR ELE?
- ESSA PERGUNTA N�O ME INCOMODA NEM ME MAGOA, C�SSIA, E N�O ME ENVERGONHO DE DIZER QUE AINDA O AMO. O SENTIMENTO QUE TENHO POR ELE � SINCERO, DIFERENTE DO QUE SENTI
POR L�O. HOJE SEI QUE FOI APENAS PAIX�O, QUE SE DESFEZ QUANDO ENCONTREI ARMANDO.
- TEM ESPERAN�A DE ENCONTR�-LO UM DIA? - PERGUNTOU ANTONIETA.
- INFELIZMENTE N�O, DONA ANTONIETA, ESPERAN�A ALGUMA. NEM SEI POR ONDE ELE ANDA.
- ISSO A ENTRISTECE?
- MUITO, C�SSIA, MAS ACREDITO QUE, SE TIVER NO MEU DESTINO O NOSSO REENCONTRO, ELE SE DAR� ASSIM COMO SE DEU COM VOC�.
- E SEU FILHO COMO EST�?
- � UMA CRIAN�A LINDA, CARINHOSA E INTELIGENTE. CREIO QUE ARMANDO FICARIA ORGULHOSO SE O CONHECESSE. O QUE D�I EM MIM E EM MINHA M�E � N�O TERMOS RESPOSTA QUANDO
ELE PERGUNTA PELO PAI. HOJE SEI QUE TUDO � UMA CONSEQ��NCIA DOS MEUS PR�PRIOS ATOS, QUE INFELIZMENTE ATINGIRAM UMA CRIAN�A INOCENTE.
- BEM - DISSE SELMA, LEVANTANDO-SE -, � HORA DE IR. VIM A TRABALHO E AMANH� LOGO CEDO TENHO COMPROMISSO. O MEU OBJETIVO IMAGINO QUE ATINGI. PE�O DESCULPAS SE CANSEI
VOC�S COM MINHA HIST�RIA. GOSTARIA QUE ACEITASSE MEU PEDIDO DE PERD�O, C�SSIA, E ESPERO QUE UM DIA VOC� CONSIGA ME PERDOAR.
C�SSIA, LEVANTANDO-SE TAMB�M, APROXIMOU-SE DE SELMA, SEGUROU-LHE AS M�OS E DISSE:
- ASSIM COMO VOC�, TAMB�M CREIO NA MESMA DOUTRINA, E SEI QUE T�O IMPORTANTE QUANTO PEDIR PERD�O � PERDOAR. COMO DISSE JESUS: "AQUELE QUE NUNCA ERROU QUE ATIRE
A PRIMEIRA PEDRA". QUANTO AO MEU CASAMENTO COM L�O, ACHO QUE VOC� N�O TEVE TANTA CULPA ASSIM, POIS SE ELE ME AMASSE DE VERDADE N�O SE ENVOLVERIA COM OUTRA PESSOA.
EU A PERD�O DE CORA��O E DESEJO COM SINCERIDADE QUE ENCONTRE A FELICIDADE, N�O SEI SE COM ARMANDO, MAS COM A PESSOA CERTA QUE COM CERTEZA JESUS COLOCAR� NO SEU CAMINHO.
- OBRIGADA, C�SSIA, SUA COMPREENS�O E SEU PERD�O ALIVIAM MEU CORA��O, POIS TIRAM O PESO QUE CARREGO. DESEJO O MESMO PARA VOC�, QUE SEJA MUITO FELIZ E QUE ENCONTRE
TAMB�M A PESSOA QUE A AMAR� DE VERDADE COMO VOC� MERECE.
SORRINDO, C�SSIA RESPONDEU:
- J� ENCONTREI, SELMA, E SEI QUE COM ELE A FELICIDADE VERDADEIRA SE FAR� NA MINHA VIDA. CASO-ME DAQUI A UMA SEMANA.
- PARAB�NS, C�SSIA, S� POSSO DESEJAR NOVAMENTE FELICIDADES.
DESPEDINDO-SE DE ANTONIETA E C�SSIA, SELMA VOLTOU � POUSADA SENTINDO EM SEU CORA��O A PAZ QUE SE ADQUIRE QUANDO SE TOMA AS ATITUDES CERTAS.
SELMA, AP�S SE PREPARAR, APAGOU A LUZ DO QUARTO E EM POUCOS MINUTOS ADORMECEU.
LOGO SEU ESP�RITO, ATRA�DO PELO CHAMADO DE ENEIDA, FOI AO seu ENCONTRO.
- QUEM � VOC� QUE EXERCE ESSE DOM�NIO SOBRE MIM? - PERGUNTOU SEM ENTENDER O QUE ACONTECIA.
- N�O EXERCI NENHUM DOM�NIO SOBRE VOC�, MINHA IRM�, APENAS A CHAMEI. MEU NOME � ENEIDA E VENHO COM A PERMISS�O DE Jesus PARA FALAR-LHE.
O ESP�RITO DE SELMA OLHOU PARA A CAMA ONDE SEU CORPO DORMIA E DISSE:
- O QUE � ISSO? POR QUE VEJO MEU CORPO DORMINDO E, AO mesmo TEMPO, SINTO-ME DESPERTA?
- SELMA, QUANDO O CORPO ADORMECE, OS LIAMES QUE UNEM O ESP�RITO A ELE SE AFROUXAM, E O ESP�RITO, SEMILIBERTO, PODE SE AFASTAR DO CORPO SEM QUE CAUSE NENHUM DANO
� MAT�RIA. ELE SE ENCONTRA COM OUTROS ESP�RITOS, RECEBE DOS PROTETORES ESCLARECIMENTOS, ENFIM, � UM MOMENTO EM QUE O CORPO, N�O NECESSITANDO DO ESP�RITO, ENTRA EM
RELA��O MAIS DIRETA COM A ESPIRITUALIDADE.
- O QUE VOC� QUER ME FALAR?
- SELMA, VOC� AGIU CORRETAMENTE. PEDIR PERD�O � UM ATO DE HUMILDADE, DE CONSCI�NCIA DO ERRO E DA VONTADE EXPRESSA DE SE APAZIGUAR COM AQUELE QUE FOI O ALVO DE SUA
FALTA POR MEIO DO arrePENDIMENTO. O NOBRE ESP�RITO JOANNA DE ANGELIS NOS DIZ QUE: "O erro RET�M O SEU AUTOR NAS PR�PRIAS MALHAS, QUE ESTE DEVE DESFAZEI MEDIANTE
A CORRE��O DO QUE FOI PRATICADO; ESTE LABOR FACULTA DIGNIFICA��O, PROMOVENDO O INDIV�DUO". MAS O PEDIDO DE PERD�O N�O SIGNIFICA SE LIBERTAR DO MAL CAUSADO AO SEMELHANTE,
MAS, SIM, UMA OPORTUNIDADE QUE A MISERIC�RDIA DIVINA CONCEDE PARA REPARAR O MAL COMETIDO. ISSO � UMA GRA�A, E N�O UMA ANULA��O FALSA. PERDOAR � O ATO DE ESQUECER
O MAL RECEBIDO N�O COM SIMPLES PALAVRAS, MAS COM O CORA��O SINCERO. N�O DESANIME, PROSSIGA NA CONSTRU��O DE SUA REFORMA �NTIMA, SELMA, POIS UM DIA O BEM RETORNAR�
E ESSA LUTA PARA SE MELHORAR COMO CRIATURA DE DEUS SER� RECOMPENSADA.
O ESP�RITO DE SELMA OUVIA OS ENSINAMENTOS DE ENEIDA AGRADECIDA POR AQUELE MOMENTO DIVINO.
- POR QUE CONTINUO SOFRENDO POR ARMANDO? QUERO ESQUEC�-LO E N�O CONSIGO. AJUDE-ME!
- O QUE EST� NOS PLANOS DIVINOS ACONTECER�. MUITAS VEZES, POR CAMINHOS TORTUOSOS E DE DOR, QUE SE TORNAM AGENTES DO FORTALECIMENTO DO ESP�RITO, POIS DEUS CONCEDE
A CADA UM TUDO O QUE PRECISA PARA RESSURGIR NO BEM.
- ISSO QUER DIZER QUE NUNCA MAIS VEREI ARMANDO?
- N�O. ISSO QUER DIZER QUE SE ENCONTRAR�O NOVAMENTE; VIVER�O MOMENTOS DE DOR E, AP�S ATRAVESSAREM O P�NTANO DO SOFRIMENTO, PODER�O VIVER JUNTOS AS ALEGRIAS QUE
O SENHOR LHES RESERVA.
- AO ACORDAR ME LEMBRAREI DE TUDO ISSO QUE EST� ME REVELANDO?
- N�O. ESSA PERGUNTA TODOS OS ESP�RITOS ENCARNADOS FAZEM, E A RESPOSTA � SEMPRE A MESMA. N�O, SELMA, N�O LEMBRAR�.
- ENT�O N�O VEJO PROVEITO ALGUM. DE QUE ADIANTA OUVIR CONSELHOS, REVELA��ES, SE QUANDO ACORDAR N�O VOU ME LEMBRAR DE NADA?
- "ESSAS ID�IAS PERTENCEM, ALGUMAS VEZES, MAIS AO MUNDO DOS ESP�RITOS DO QUE AO MUNDO CORP�REO, MAS O MAIS FREQ�ENTE � QUE, SE O CORPO ESQUECE, O ESP�RITO AS LEMBRA,
E A ID�IA VOLTA NO MOMENTO NECESS�RIO, COMO UMA INSPIRA��O DO MOMENTO" (O LIVRO DOS ESP�RITOS). AGORA � MELHOR RETORNAR AO SEU CORPO, O DIA AMANHECE. QUE JESUS LHE
D� MUITA F� E CORAGEM.
- OBRIGADA, ENEIDA. SE PUDER, SE FOR PERMITIDO, CUIDE DE MIM PARA QUE EU N�O COMETA MAIS DESATINOS.
GRAVANDO EM SEU SER O SORRISO DE ENEIDA, O ESP�RITO DE SELMA RETORNOU AO SEU CORPO F�SICO.
OS PRIMEIROS RAIOS DE SOL ENTRARAM PELA FRESTA DA JANELA ACORDANDO SELMA. ELA, SENTANDO-SE NA BEIRADA DA CAMA, ESPREGUI�OU E DISSE FELIZ:
- QUE NOITE GOSTOSA! H� TEMPOS N�O DESPERTAVA T�O DESCANSADA. FALAR COM C�SSIA ME FEZ MUITO BEM. ELA, SEM D�VIDA, � UMA PESSOA MUITO NOBRE, MERECE SER FELIZ.
ARRUMOU-SE COM ESMERO E FOI CUMPRIR AS OBRIGA��ES DE TRABALHO.



Cap�tulo 18
A uni�o das almas afins




O GRANDE DIA ESPERADO POR C�SSIA FINALMENTE CHEGOU. LEVANTOU-SE CEDO, ARRUMOU-SE E FOI AT� � COZINHA TOMAR SEU DESJEJUM.
- O QUE � ISSO? - PERGUNTOU ADMIRADA, MAS COM UM GRANDE SORRISO NO ROSTO.
- SEU �LTIMO CAF� COMO SOLTEIRA - RESPONDERAM AO MESMO TEMPO ANTONIETA E SABINA.
- VOC�S N�O TOMAM JEITO MESMO, PRECISA DE TUDO ISSO?
- CLARO, MINHA FILHA, UM DIA T�O ESPERADO MERECE SER COMEMORADO DESDE AS PRIMEIRAS HORAS.
- ISSO MESMO - CONCORDOU SABINA. - SUA M�E TEM RAZ�O, HOJE � O IN�CIO DE UMA NOVA ETAPA EM SUA VIDA E NA MINHA TAMB�M, AFINAL, MEUS DOIS FILHOS EST�O SE CASANDO,
UM BIOL�GICO E OUTRO DO CORA��O. E ISSO N�O � UMA COISA COMUM.
- NISSO VOC� TEM RAZ�O, SABINA.
- � VERDADE - FALOU ANTONIETA. - NENHUMA DE N�S IMAGINOU QUE UM DIA VOC� ENCONTRARIA SEU FILHO, PRINCIPALMENTE DESSA MANEIRA.
-
- S�O OS DES�GNIOS DE DEUS, DONA ANTONIETA, SOMENTE ELE SABE O QUE DEVE ACONTECER PARA O BEM DE SUAS CRIATURAS.
ABRA�ANDO SABINA, C�SSIA PERGUNTOU:
- O QUE VOC� ACHOU DOS PAIS DE FRANK?
- ORA, C�SSIA, O QUE POSSO DIZER SOBRE ELES? APENAS QUE S�O PESSOAS GENTIS QUE RESPEITARAM MEU MOMENTO JUNTO DE FRANK, A MINHA SAUDADE, O MEU AMOR POR UM
FILHO AUSENTE DURANTE TODOS ESSES ANOS. S� POSSO SENTIR POR ELES UMA ENORME GRATID�O POR TEREM FEITO DELE UM HOMEM DE BEM.
- FOI MUITO NOBRE DE SUA PARTE DEIXAR TUDO COMO EST�, SABINA.
- NEM PODERIA SER DIFERENTE, C�SSIA, TANTO MINHA M�E COMO TI�O SE NEGARAM A FALAR A VERDADE. MINHA M�E MENTIU DIZENDO QUE SOFREU UM ASSALTO E QUE A CRIAN�A
FOI TIRADA DELA SEM QUE NADA PUDESSE FAZER PARA EVITAR. E O CASO, AP�S ALGUM TEMPO, FOI encerrado, DANDO JOAQUIM COMO DESAPARECIDO. VOC� SABE QUE QUANDO N�O SE TEM
DINHEIRO N�O SE TEM SOLU��O, E COMIGO N�O FOI DIFERENTE. SOU AGRADECIDA A ESSE CASAL QUE CRIOU MEU FILHO COM AMOR, ENSINARAM-LHE OS VERDADEIROS VALORES. PARA QUE
MEXER EM UM PASSADO T�O DISTANTE, TRAZER SOFRIMENTO PARA QUEM N�O MERECE? ELE EST� BEM E FELIZ, HOJE O TENHO PERTO DE MIM, POIS VOC�S V�O MORAR AQUI CONOSCO. ESSA
FOI � FORMA PELA QUAL A VIDA DEVOLVEU O MEU FILHO E, SE ISSO ACONTECEU, FOI PORQUE DEUS ASSIM O QUIS.
ANTONIETA APROXIMOU-SE DE SABINA E, ABRA�ANDO-A, DISSE:
- � POR ISSO QUE VOC� � T�O QUERIDA POR TODOS, SABINA. VOC� � UM ESP�RITO MUITO NOBRE!
- BEM, AGORA TEMOS DE PENSAR EM C�SSIA. HOJE O DIA � DELA
- TEM RAZ�O, VAMOS JUNTAS DESFRUTAR DESSE DELICIOSO DESJEJUM.
ASSIM O FIZERAM.

***

AOS PRIMEIROS ACORDES DA MARCHA NUPCIAL, AS PORTAS SE ABRIRAM E C�SSIA, LINDA, TRANSMITINDO FELICIDADE PELO BRILHO DOS SEUS OLHOS E O SORRISO QUE ILUMINAVA SEU
ROSTO, CAMINHOU EM DIRE��O A FRANK. ELE A AGUARDAVA COM A ANSIEDADE DOS QUE AMAM E A ESPERAN�A DOS QUE ACREDITAM REALMENTE QUE SOMENTE O AMOR PLENO PODE UNIR DUAS
PESSOAS. A� EST� A M�XIMA DE JESUS, QUE DISSE: "V�S N�O SEPAREIS O QUE DEUS UNIU". POR ISSO DEVE-SE ENTENDER A UNI�O SEGUNDO A LEI IMUT�VEL DE DEUS, OU SEJA, A LEI
DE AMOR. ONDE O AMOR PLENO EXISTE N�O H� SEPARA��O, POIS ELA EXISTE EM DECORR�NCIA DA LEI VARI�VEL DOS HOMENS. O QUE SE UNE � FOR�A SEPARA-SE POR SI MESMO. OS JURAMENTOS
VAZIOS, SOMENTE COM O CONTE�DO DA PAIX�O OU INTERESSE, E N�O COM O AMOR VERDADEIRO, TORNAM-SE PALAVRAS QUE SE PERDEM AO LONGO DO TEMPO E N�O RARO LEVAM SEUS PERSONAGENS
� SEPARA��O, O QUE N�O ACONTECE QUANDO A AMOR REINA ABSOLUTO NO CORA��O DO HOMEM.
AP�S A SINGELA RECEP��O OFERECIDA AOS AMIGOS E PARENTES, C�SSIA E FRANK, DESPEDINDO-SE DE SEUS PAIS, SEGUIRAM VIAGEM, INICIANDO ASSIM UMA VIDA CHEIA DE VENTURA.


H� duas esp�cies de afei��o: a do corpo e a da alma, e freq�entemente se toma uma pela outra. A afei��o de alma, quando � pura e simp�tica, � dur�vel; a do corpo
� perec�vel. Eis por que freq�entemente aqueles que cr�em se amar com um amor eterno se odeia quando a ilus�o termina.
(ALLAN KARDEC, O Livro dos Esp�ritos, QUEST�O 939.)


ANDR� LUIZ, NO LIVRO Evolu��o em Dois Mundos - 185 - ELUCIDA: Acidentalmente o homem ou a mulher encarnado podem experimentar o casamento terrestre diversas vezes
sem encontrar a companhia das almas afins, com as quais realizariam a uni�o ideal. Isso porque, comumente, � preciso resgatar essa ou aquela d�vida que contra�mos
com a energia sexual aplicada de maneira infeliz ante os princ�pios de causa e efeito.




Antonieta levantou-se mais cedo do que de costume. Ao entrar na cozinha, encontrou Sabina tomando seu caf�.
- Sabina, conseguiu se levantar ainda mais cedo do que eu? - perguntou admirada ao v�-la.
- Para ser sincera, dona Antonieta, n�o consegui dormir esta noite. Estava ansiosa, inquieta, alguma coisa me incomodava.
- Aconteceu o mesmo comigo, Sabina. Presumo que seja preocupa��o com C�ssia, t�o longe de n�s.
- �, pode ser, mas sabemos que est� bem acompanhada. Frank � um excelente rapaz e cuidar� bem dela.
- Acredito que sim.
Silenciaram por alguns instantes. Antonieta voltou a dizer:
- Sabina, quero lhe confessar uma coisa, mas, se n�o acreditar, prometa n�o rir de mim.
- O que � isso, dona Antonieta, jamais iria rir da senhora, por nenhum motivo. O que quer me contar?
- Ontem, durante o casamento de C�ssia, tive a sensa��o de que Orlando estava presente. N�o sei como explicar, mas era uma impress�o forte. Acredita em mim?
- N�o s� acredito como lhe digo que aconteceu o mesmo comigo, dona Antonieta. Fiquei t�o impressionada que hoje, antes de o sol aparecer, levantei-me e vim para
a cozinha, fiz minhas ora��es, sentei-me aqui e n�o consigo pensar em outra coisa A senhora acha poss�vel que ele estivesse mesmo aqui?
- Acho poss�vel, sim, Sabina. Nas palestras que ouvimos no centro j� foi dito sobre essa possibilidade. O esp�rito conseguiu permiss�o para vir a seu antigo lar
com a finalidade de ver seus familiares, ajud�-los, enfim, creio que Orlando esteve aqui para aben�oar a nossa filha.
Enquanto conversavam, n�o conseguiam registrar a presen�a de Orlando, que acompanhado de Eneida e Tom�s realmente viera assistir � felicidade de sua filha.
- Para elas existe uma possibilidade, entretanto n�s sabemos que � uma realidade - disse Orlando a Eneida.
- � verdade, Orlando, os encarnados n�o imaginam com que intensidade os esp�ritos est�o presentes entre eles e qu�o grande � sua influ�ncia sobre seus pensamentos
e a��es.
- Diga-me, Eneida, essa uni�o de C�ssia ser� feliz?
- J� lhe disse em certa ocasi�o que sim, Orlando. C�ssia e Frank se reencontraram. Cada um viveu a afli��o que lhe cabia e agora � o momento de se unirem para construir
uma fam�lia crist�. Eles adquiriram o direito de ser feliz, cada um por um motivo diferente, mas os dois por meio do perd�o. O vener�vel esp�rito Emmanuel disse:
"Para a conven��o do mundo, o perd�o significa renunciar � vingan�a, sem que o ofendido precise olvidar plenamente a falta do seu irm�o; perd�o e esquecimento devem
caminhar juntos, embora prevale�a para todos os instantes da exist�ncia a necessidade de ora��o e vigil�ncia. Ali�s, a pr�pria lei da reencarna��o nos ensina que
s� o esquecimento do passado pode preparar a alvorada da reden��o".
- � uma pena que os homens ainda relutem em aprender os verdadeiros valores e prefiram, n�o raro, esconder-se atr�s de falsas virtudes. Caminham �s cegas at� o dia
em que depararem com sua verdadeira imagem. Nesse momento as l�grimas rolar�o impiedosas sobre sua face.
Tom�s, que at� ent�o nada dissera, falou a Orlando:
- Gostei de sua coloca��o, meu irm�o. Pena que os homens fa�am quest�o de ignorar a exist�ncia da vida al�m do planeta em que vivem. Sua aten��o se volta somente
para o que est� adequado aos padr�es de beleza terrenos, e anseiam possuir o que lhes causa prazer na Terra. Tolos, n�o conhecem a beleza verdadeira que transcende
a beleza tempor�ria da mat�ria; n�o conseguem imaginar que o prazer real n�o est� relacionado a objetos, e sim aos valores e virtudes da alma; fecham os ouvidos
para n�o ouvir e os olhos para n�o enxergar, mas eles abrir�o mesmo � revelia de sua vontade, e nesse dia o arrependimento e a vergonha os derrubar�o do pedestal
no qual eles mesmos se colocaram.
- Muito bem! - disse Eneida ao amigo. - Agora vamos retornar, a tarefa para a qual viemos foi cumprida.
- Vamos - disseram Orlando e Tom�s.
Os tr�s esp�ritos seguiram deixando no recinto a energia salutar de paz e tranq�ilidade que fortalecia Antonieta e Sabina.
- Voc� est� t�o quieta, Sabina - disse Antonieta.
- Se eu disser, pode ser que a senhora n�o v� acreditar.
- Diga Sabina, nunca duvidei de voc�. Fale o que �.
- Dona Antonieta, por alguns minutos tive a impress�o de sentir a presen�a do senhor Orlando entre n�s.
- N�o tenho por que duvidar, Sabina, j� que tamb�m tive a mesma impress�o. N�o que eu o tenha visto isso n�o, mas tive uma sensa��o de paz, como se algu�m estivesse
me acariciando.
- Como se algu�m dissesse que n�o estamos sozinhas, � isso?
- Exatamente - concordou Antonieta.
- Amanh�, quando formos ao centro, podemos perguntar ao orientador sobre essa possibilidade.
- Tem raz�o, faremos isso.

***

C�ssia e Frank viviam momentos de �xtase. O sentimento que tinham um pelo outro flu�a plenamente, inebriando-os de felicidade.
- Nunca pensei que viveria um amor t�o intenso - disse C�ssia ao marido. - Depois de tudo o que me aconteceu, imaginei nunca mais viver ao lado de outra pessoa.
A decep��o e o desapontamento pareciam anular qualquer possibilidade de me relacionar com algu�m.
- Isso at� eu aparecer - disse Frank brincando.
- Voc� fala brincando, mas � verdade.
Beijando com delicadeza a esposa, Frank completou:
- Eu tamb�m a amo muito, nunca senti um amor t�o intenso e verdadeiro por ningu�m. Sabe o que eu acho?
- O que voc� acha?
- Que o nosso amor estava escrito nas estrelas!
- Que lindo! - disse C�ssia beijando-o.

***

Seis meses se passaram desde o casamento de C�ssia. Juntos com Antonieta e Sabina, tanto ela quanto Frank vivia felizes, formando uma verdadeira fam�lia crist�.
Certa tarde, Frank chegou do escrit�rio sorridente, dizendo ter uma boa not�cia para comunicar.
- Diga-nos, amor, que not�cia � essa que o deixa assim t�o feliz? - perguntou C�ssia.
- Falei hoje com os meus pais e eles disseram que est�o vindo nos visitar.
- Que not�cia boa, Frank! Quando chegam?
- Daqui a uma semana.
- Precisamos deixar tudo preparado para receb�-los - disse Antonieta.
- N�o precisa se preocupar, dona Antonieta, eles v�o ficar em um hotel.
- De maneira alguma, Frank, fa�o quest�o de hosped�-los. Nossa casa � grande e n�o � incomodo nenhum, ao contr�rio, ser� um prazer.
Frank olhou para Sabina tentando perceber sua rea��o. Sabina sentiu sua preocupa��o e rapidamente lhe disse:
- N�o se preocupe comigo, causa-me satisfa��o ter seus pais aqui conosco.
- Est� sendo sincera? N�o quero lhe causar transtorno ou constrangimento.
- N�o ir� me causar nenhum constrangimento, Frank, tenho o maior carinho por seus pais e nem poderia ser diferente. Afinal, eles me devolveram voc�, mostrando que
s�o generosos, e n�o causaram nenhum problema quando voc� decidiu morar aqui no Brasil. O meu desejo � retribuir, de alguma forma, esse gesto. Receb�-los aqui com
todo o respeito e carinho � poder mostrar-lhes como s�o queridos por todos n�s.
- Obrigado, dona Sabina, sei que gostaria que eu a chamasse de m�e. D�-me mais um tempo. De qualquer forma, sinto pela senhora muito respeito, carinho e afei��o.
- Para todos os prop�sitos da vida, Frank, existe um tempo. Esse dia tamb�m chegar� no momento oportuno, n�o adianta querer passar � frente do que precisa de tempo
para acontecer.
C�ssia, abra�ando aquela que considerava sua segunda m�e, disse ao marido:
- Est� vendo por que a amo tanto? - exclamou.
Os dias se passaram.
Todos estavam ocupados com os preparativos para receber os pais de Frank. O quarto arrumado, len��is sedosos, toalhas macias e potes cheios de guloseimas. A casa
de Antonieta estava em festa. Frank n�o sabia como agradecer todo o cuidado que dispensavam para agradar a seus pais.
Chegado o grande dia, foram todos ao aeroporto da capital esper�-los.
- Voc� verificou o hor�rio certo da chegada do avi�o? - perguntou C�ssia ao marido.
- Claro, meu amor, ele est� no hor�rio. Logo estar�o aqui.
A ansiedade dominava todos eles. Ap�s quarenta minutos, o avi�o aterrissava em solo brasileiro. A alegria foi geral, abra�o beijos e sorrisos dominavam o ambiente.
- Como vamos at� sua cidade, Frank? Um carro s� n�o � o suficiente - disse seu pai.
- Sei disso, pai, por isso viemos com dois carros. Voc�s ir�o comigo em um carro e C�ssia ir� levando o outro. � melhor nos apressar porque temos uma viagem pela
frente.
- Posso ir dirigindo, filho, sempre tive vontade de dirigir aqui no Brasil.
- N�o acho prudente, pai, a m�o de dire��o aqui � diferente e o senhor n�o est� acostumado.
- Por isso mesmo tenho vontade de experimentar - afirmou seu pai.
- N�o sei pai, acho um pouco arriscado, o senhor pode se confundir.
- O que � isso, Frank - disse sua m�e -, seu pai est� acostumado, dirige h� anos. Por que haveria de se confundir? Fa�a a vontade dele. Al�m do mais, na estrada
n�o tem o que confundir, � s� seguir em frente.
Mesmo a contragosto, Frank cedeu.
Antonieta e Sabina foram acompanhando C�ssia, enquanto Frank seguiu viagem junto com seus pais.
A viagem ia tranq�ila at� o ponto em que, por causa de uma obra, os carros foram desviados da estrada principal, seguiu por alguns quil�metros, quando, ao sair de
uma curva fechada para novamente retornarem � via principal, o que Frank temia aconteceu. Seu pai confundiu-se e, antes que Frank pudesse fazer alguma coisa para
evitar, entrou na contram�o batendo de frente com um caminh�o que vinha no sentido inverso. Um estrondo e o carro todo distorcido parou embaixo do caminh�o. Logo
ap�s o sil�ncio, o cheiro de gasolina espalhada no ch�o e gritos de pessoas que corriam para tentar salvar os ocupantes do carro.
C�ssia, que acompanhava de perto o sogro, parou o carro como conseguiu e saiu em disparada como uma louca para acudir seus entes queridos.
- Liguem para o Corpo de Bombeiros! - gritava sem parar. - Ajudem pelo amor de Deus! Frank... Responda!
Em poucos minutos, o resgate da cidade mais pr�xima chegava. Ap�s um tempo longo, conseguiram retirar os corpos sem vida dos pais de Frank.
- Meu marido retire meu marido, pelo amor de Deus! Ele est� vivo? Digam-me se ele est� vivo!
- Calma, minha senhora, muita calma. Ele est� preso nas ferragens, estamos fazendo o poss�vel para retir�-lo.
At�nita, sem conseguir balbuciar direito as palavras, C�ssia, com um fio de voz, perguntou:
- Ele est� vivo? Pelo amor de Deus, digam-me se ele est� vivo!
- Calma filha - dizia Antonieta, tentando acalmar a filha, mas lutando para acalmar a si mesma.
Sabina n�o conseguia dizer nem fazer nada por causa do impacto que sofria.
- N�o pode ser meu Deus, pela segunda vez meu filho � retirado de mim. O que fiz Senhor, para merecer tanta dor?
- Senhora, seu marido ainda respira.
- Salvem-no por caridade! - exclamava C�ssia.
Assim que retiraram Frank das ferragens, protegeram sua coluna, colocaram-no na maca, ligaram o soro e o oxig�nio.
C�ssia olhava aquela cena sem acreditar que tudo estava realmente acontecendo.
Gentilmente, um bombeiro se aproximou dela e disse:
- Vamos lev�-lo para o hospital da cidade mais pr�xima. A senhora poder� nos acompanhar.
- N�o estou em condi��es de dirigir. Estou acompanhada de minha m�e e de nossa amiga, mas minha m�e n�o dirige em estrada e a outra n�o sabe dirigir.
- N�o se preocupe. Se permitir, um de nossos bombeiros poder� lev�-las.
- Aceito e agrade�o - disse C�ssia com voz entrecortada pelas l�grimas.
- Por favor, oriente-me sobre o que devo fazer com os corpos dos meus sogros.
- Eles ser�o levados para o Instituto M�dico-Legal. Ap�s os tr�mites legais, voc� poder� retir�-los para o enterro. A ambul�ncia j� foi, se quiser podemos ir.
- Obrigada, estou perdida, sem saber o que fazer.
Assim que chegou ao hospital, C�ssia soube que Frank estava sendo operado.
Seu choro compulsivo preocupava Antonieta e Sabina, que pela primeira vez em muito tempo se desequilibrava diante de uma situa��o.
- N�o � poss�vel, dona Antonieta, que depois de viver a alegria de reencontrar meu filho vou perd�-lo novamente.
- N�o diga isso, minha amiga, voc� sempre foi uma pessoa de f�, superou tantas afli��es. N�o perca a coragem agora.
- Sinto-me fraquejar, a dor � muito grande.
- Eu entendo sua dor, Sabina, seu medo, mas voc� precisa pensar que est� sofrendo por uma situa��o que n�o aconteceu e que n�o acontecer� se for da vontade do Senhor.
Ele est� vivo e sendo operado, vamos acreditar que tudo sair� bem.
Procurando a filha com os olhos, Antonieta a viu encolhida em um canto do sagu�o do hospital com o rosto desfigurado de dor. Aproximou-se dela, segurou-lhe as m�os
e lhe disse:
- Filha, n�o perca a f� em Deus nem questione Seus des�gnios. Entregue sua dor a Jesus, que � nosso Divino Amigo. Confie e aguarde, Ele vai acalmar seu cora��o.
- M�e, por que isso foi acontecer justamente no melhor e mais feliz momento da minha vida? O que foi que eu fiz para sofrer tanto sem ter o direito � felicidade?
Beijando docemente a cabe�a de sua filha, Antonieta respondeu:
- Filha, S�o Francisco de Assis disse: "N�o devemos amaldi�oar nada, porque n�o sabemos a import�ncia das coisas na nossa evolu��o espiritual".
- Minha vida tem sido de muito sofrimento, m�e. Agora que encontrei a felicidade corro o risco de perd�-la.
- C�ssia, j� aprendemos que ningu�m vem a esse mundo para se banhar em �gua de rosas, todos n�s temos a nossa cota de afli��o. Nessas horas � que devemos ser fortes,
aumentar a nossa f�, confiar mais e n�o perder a esperan�a de que tudo podem se reverter no �ltimo momento, se Deus assim quiser.
As horas passavam lentas e a agonia aumentava no cora��o de C�ssia e Sabina. Antonieta fazia-se de forte para dar suporte �s duas pessoas que amava.
Ap�s quatro angustiantes horas de cirurgia, o m�dico veio falar com elas.
- Voc�s s�o a fam�lia do rapaz que sofreu o acidente?
- Somos - responderam as tr�s quase ao mesmo tempo.
- A cirurgia terminou com sucesso. Ele estava com hemorragia interna, mas conseguimos fazer um bom trabalho.
- Posso v�-lo? - perguntou C�ssia aflita.
- Sinto, mas por ora n�o � poss�vel. Ele ficar� no CTI. As primeiras horas s�o muito importantes.
- Ele perguntou por mim?
- N�o, minha senhora, ele est� sedado e assim ficar� por dois ou tr�s dias, dependendo da rea��o do seu organismo. Fique tranq�ila, a medicina n�o � uma ci�ncia
exata, podem acontecer surpresas, mas estamos confiantes na recupera��o do seu marido. Agora, se me der licen�a...
Assim que o m�dico se afastou, C�ssia abra�ou sua m�e e entregou-se ao choro.
- Filha - disse-lhe -, aqui no hospital tem uma capela. Vamos at� l� orar ao Senhor pela recupera��o de Frank. No sil�ncio podemos ouvir a voz do Senhor, e � nessa
liga��o com o Divino que recuperamos a confian�a e a esperan�a, porque sentimos que n�o estamos sozinhos.
C�ssia, como uma garotinha obediente, seguiu sua m�e e Sabina at� a capela.
Ap�s alguns minutos entregues cada uma aos seus pensamentos, C�ssia, impulsionada pela dor e se entregando a Jesus, orou em voz alta:


Senhor, Criador de todas as formas de vida, de todas as criaturas deste imenso Universo, ouve o meu lamento. Sei que a vida � dif�cil, e n�o raro penosa. Entretanto,
aqueles que t�m f� e confiam na vida futura sabem que tudo nesse mundo � passageiro e que a dor tem um tempo para durar e nos ensina a promover nossa reforma interior.
Suplico n�o me deixe esquecer as coisas que aprendi ao longo da minha vida. Sou fr�gil e muito imperfeita, e � por isso, Senhor, que me dirijo a V�s para implorar
miseric�rdia. Se for da Vossa vontade, que meu amor volte para mim; mas se Vossos des�gnios forem contr�rios ao que desejo, segure-me em vossas m�os para que eu
n�o caia no desespero. Assim seja.


Antonieta e Sabina escutavam com aten��o a s�plica de C�ssia e uniram suas preces �s dela.
As horas passavam e nenhuma das tr�s mulheres se dava conta de que precisava arrumar algum lugar para ficar. Ent�o foram interrompidas pela enfermeira, que sol�cita
lhes perguntou:
- Soube que n�o s�o desta cidade e presumo que v�o querer ficar hospedadas em alguma pousada. Estou certa?
- N�o hav�amos pensado nisso ainda - disse Antonieta. - Claro que est� certa. Ficaremos muito agradecidas se puder nos indicar uma.
- Daqui a meia hora largo o meu plant�o e, se quiserem, posso lev�-las.
- Queremos, sim, e ficamos muito agradecidas por sua gentileza.
- Aqui � uma cidade pequena e n�o h� muitas op��es.
- Ficaremos aguardando - confirmou Antonieta.
Assim que chegaram � pousada, se deram conta de que n�o haviam levado nenhuma roupa, pois voltariam no mesmo dia.
- Amanh� cedo tomo o primeiro �nibus, vou at� nossa casa e arrumo roupas para n�s tr�s e volto. O que acham?
- Fa�a isso, m�e. Temos mesmo de ficar aqui esperando a libera��o dos corpos dos pais de Frank.
- � verdade. Temos muitas coisas para resolver - disse Sabina.
- Estive pensando, filha, que poder�amos enterr�-los em nosso jazigo, onde est� seu pai.
- Por mim est� bem. Creio que Frank vai preferir t�-los aqui a envi�-los para a Am�rica do Norte.
- Acredito nisso tamb�m.
- Ent�o est� decidido. Amanh� logo cedo tomo o primeiro �nibus.
Assim foi feito.
Os dias passaram e finalmente chegou o momento de Frank ser transferido para o quarto, o que fez com que C�ssia se entregasse a alegria, eliminando todo o estresse
dos �ltimos dias.
- Seja bem-vindo, meu amor, esperava ansiosa por este momento, que com a gra�a de Deus finalmente aconteceu!
Ainda bem debilitado, Frank respondeu:
- Que bom estar ao seu lado novamente. N�o consigo entender ainda o que realmente aconteceu.
- N�o pense nisso agora, Frank, o m�dico recomendou calma. Voc� precisa descansar. Mais tarde conversaremos sobre isso.
- Dona Antonieta e Sabina, onde est�o?
- Elas retornaram � nossa casa, mas telefonam todos os dias, e agora que veio para o quarto vir�o v�-lo.
- E voc�, C�ssia, onde est�?
- N�o se preocupe meu amor, estou hospedada em uma pousada bem aconchegante. Estou bem, melhor agora que estou perto de voc�.
Frank calou-se demonstrando cansa�o. C�ssia, percebendo, disse-lhe:
- Querido, tente dormir. O m�dico recomendou n�o cans�-lo.
Antes de C�ssia terminar, Frank entregou-se ao sono reparador.
Sentada ao lado do marido, pensava em tudo o que havia acontecido e em como Frank reagiria ao saber da morte de seus pais. Deixava seu pensamento divagar, querendo
entender por que as coisas acontecem quando menos se espera.
"Os dias que imaginei serem t�o felizes transformaram-se em trag�dia e sofrimento. Por que ser�, meu Deus, que as coisas mudam sem que possamos fazer nada para evitar?
Pergunto-me o que foi que eu fiz para passar por tantas afli��es!"


Nada acontece sem a permiss�o de Deus, porque foi Ele quem estabeleceu todas as leis que regem o Universo. Perguntareis agora por que Ele fez tal coisa em vez de
tal outra. Dando ao esp�rito a liberdade de escolha, deixa-lhe toda a responsabilidade dos seus atos e das suas conseq��ncias; nada lhe estorva o futuro; o caminho
do bem est� � sua frente, como o do mal. Mas, se sucumbir, ainda lhe resta uma consola��o, a de que nem tudo se acabou para ele, pois Deus, na sua bondade, permite-lhe
recome�ar o que foi malfeito. � necess�rio distinguir o que � obra da vontade de Deus e o que � da vontade do homem. Se um perigo vos amea�a, n�o fostes v�s que
o criastes, mas Deus; tivestes, por�m, a vontade de vos expordes a ele, porque o considerastes um meio de adiantamento; e Deus o permitiu.
(O Livro dos Esp�ritos.)
























Nenhuma criatura � vitima do destino. Ningu�m passa por afli��es sem causa justa ou simplesmente porque as leis divinas n�o favorecem esse ou aquele. A rea��o das
a��es praticadas no presente ou no pret�rito chega a galope, n�o importa quanto tempo passe; nada se perde nele. O que muitas vezes julgamos ser injusti�a � apenas
a conseq��ncia da nossa imprud�ncia, da qual n�o lembramos, porque Deus nos concede o esquecimento.
C�ssia pensava: "Fico temerosa quanto � rea��o dele quando souber que seus pais morreram. Tenho medo de que se sinta culpa pelo fato de ter cedido e permitido que
seu pai dirigisse o carro".
Quatro dias se passaram e Frank, sentindo-se mais forte, come�ou a reviver o tr�gico acontecimento.
- C�ssia - disse � esposa -, como est�o meus pais, se recuperaram bem do acidente? Gostaria de v�-los.
No primeiro momento, C�ssia ficou sem saber o que responder.
Frank insistiu:
- Diga como est� meus pais, C�ssia.
- Eles devem estar bem com toda a certeza, Frank, eram pessoas de bem.
Frank empalideceu.
- Eram pessoas de bem? O que voc� est� querendo dizer, C�ssia?
C�ssia segurou firme a m�o de seu marido, querendo transmitir-lhe coragem, beijou-o delicadamente e respondeu:
- Frank, em nossa vida acontecem muitas coisas que nos ferem profundamente, mas, se n�o perdemos a f� e a confian�a Naquele que nos criou, conseguimos passar
por sobre os espinhos sem violentar nossa alma com sentimentos de desespero ou revolta, mesmo que nossos p�s se machuquem e nosso cora��o sangre de dor.
P�lido, Frank perguntou:
- Pelo amor de Deus, C�ssia, fale de uma vez o que aconteceu com meus pais!
- Sinto muito, meu amor, mas seus pais n�o resistiram ao impacto e morreram no local.
- N�o � poss�vel... N�o � poss�vel! - dizia Frank.
C�ssia o aconchegou mais em seus bra�os e lhe disse:
- Chore meu amor, voc� tem esse direito. N�o � f�cil separar-se das pessoas que amamos. S� n�o permita que sentimentos ruins penetrem em sua alma.
- C�ssia, por que fui permitir que meu pai levasse o carro? N�o devia ter cedido ao seu pedido. Hoje n�o os tenho mais e sei que a culpa � minha.
- Frank, n�o diga isso. Acabei de lhe pedir que n�o se entregasse aos pensamentos ruins. Voc� n�o tem culpa de nada, tamb�m foi v�tima do acidente.
- Fui v�tima, mas estou aqui, eles n�o, C�ssia, e isso est� doendo demais.
- Eu imagino, meu amor. N�o � f�cil controlar a dor.
- Foram �s pessoas que me criaram, que me amaram como a um filho verdadeiro e fizeram de mim um homem de verdade. Quando chegou o momento de conhecer minha
m�e biol�gica, n�o criaram nenhum problema. Ao contr�rio, facilitaram esse encontro o mais que puderam, sem ego�smo, sem ci�mes, entendendo o meu desejo de conhecer
um pouco das minhas ra�zes.
C�ssia chorava junto com o marido. Conhecia bem o significado da perda. Sentira a mesma dor ao se separar de seu pai por uma morte violenta tamb�m. Tentando evitar
que o sentimento da culpa pudesse desequilibr�-lo ainda mais, dizia-lhe:
- Frank, voc� n�o podia prever que aconteceria essa fatalidade, apenas atendeu a um pedido de seu pai e de sua m�e, que tamb�m insistiu para que ele levasse
o carro. Portanto, n�o pode pensar em culpa. N�o � justo, meu amor.
Depois de longo tempo dando vaz�o ao sofrimento, Frank perguntou:

- E o sepultamento deles, como voc� fez?
- Deu tudo certo. Imaginamos que voc� iria gostar de t�-los aqui no Brasil, perto de voc�, ent�o os enterramos no nosso jazigo, ao lado de meu pai. Mas, se voc�
preferir, assim que estiver bem poder� solicitar o traslado deles para a Am�rica. Fa�a como achar melhor.
- N�o, C�ssia, voc�s fizeram a coisa certa. N�o tenho porque lev�-los para a Am�rica se eu estou aqui e n�o pretendo voltar. N�o sei como agradecer por esse gesto
de generosidade de dona Antonieta e tamb�m pela maneira como providenciaram tudo. Muito obrigado, meu amor.
- N�o me agrade�a, eles tamb�m s�o nossa fam�lia, s�o meus sogros. Apesar da pouca conviv�ncia, todas n�s sentimos muita estima por eles. Agora descanse, voc� ainda
est� fraco e a emo��o � muito forte. Tente dormir um pouco, vai lhe fazer bem.
Frank beijou suas m�os e disse-lhe com a voz embargada:
- Obrigado, meu amor.
Adormeceu segurando as m�os de C�ssia, que admirava com amor o rosto amado.


Cap�tulo 19
A hist�ria de Eneida


O
rlando acompanhou Jacob e Eneida na miss�o de receber os pais de Frank, que chegavam da Terra.
- S�o irm�os queridos que retornam vitoriosos - explicou Jacob. - Cumpriram a miss�o que lhes foi destinada nesta encarna��o. Trabalharam a quest�o do ego�smo e
marcaram seus passos com o altru�smo que se fez presente em todos os seus atos.
- N�o se deixaram corromper pela riqueza, mas conseguiram fazer dela uma fonte de possibilidades para os semelhantes e para si mesma - concluiu Eneida.
- Isso ainda � muito dif�cil para os encarnados, n�o � mesmo, Jacob?
- �, Orlando, ainda � muito dif�cil para o homem entender que a riqueza � uma ferramenta que pode ser usada para a constru��o do bem-estar daquele que a possui.
Mas isso s� se torna v�lido se aquele que a det�m n�o se entrega aos excessos pelo ego�smo insaci�vel de achar que nunca � suficiente o que possui. � preciso lembrar-se
daqueles que nada t�m e dar uma finalidade �til � pr�pria riqueza; somente assim, compartilhando, sabendo que disp�e de meios para fazer o bem e o fazendo, � que
n�o se perdem na pr�pria insensatez.
- Por que se torna penoso para o homem repartir o que lhe sobra com aqueles tantos que n�o t�m o fundamental, o estritamente necess�rio? - perguntou Orlando, interessado
em aprender cada vez mais.
- Simples, meu irm�o, porque ele n�o v� outro caminho que n�o seja aquele que o favorece; porque mergulha no engano de que a vida � curta e que se vive uma �nica
vez, precisando, portanto, aproveit�-la ao m�ximo. Pobres tolos que se esquecem de que a vida � eterna e n�o sabem que, ao abandonarmos o corpo f�sico, retornamos
� nossa origem. Eles n�o se importam com a vida depois de amanh�, mas ela chega para todos, sem lhes perguntar se acreditam ou n�o.
- Felizes os que aceitam a verdade do Cristo n�o s� na palavra vazia, mas nos seus atos de amor fraternal. Jesus falou da import�ncia do amor e da uni�o dos povos,
mas os homens preferem o poder que nasce da ambi��o e que aniquila os mais fracos; querem o universo para si mesmos, medindo for�as para conquist�-lo, e se esquecem
do Senhor da Vida - completou Eneida.
Orlando percebeu uma sombra no olhar de Eneida.
- Perdoe-me, minha irm�, mas noto uma leve sombra de amargura em seu olhar.
- Tem raz�o, Orlando. �s vezes, ao falar sobre o cora��o vazio de sentimento, que se suporta com as palavras que nada possuem de consist�ncia, recordo-me de como
sofri por cair nessa insensatez.
Espantado com a revela��o, Orlando disse:
- Voc�, Eneida, com toda essa bondade que espalha por onde passa, dizer que caiu nessa insensatez?
Com extrema humildade, Eneida respondeu:
- Voc� me v� agora, Orlando, mas trago uma hist�ria de engano e de exist�ncia sem nenhum conte�do.
Jacob, percebendo o desejo de Eneida de se revelar para Orlando, incentivou-a, dizendo:
- Irm�, se considerar que lhe far� bem falar sobre isso, fa�a-o. Ser� um aprendizado para Orlando.
Motivada pelas palavras de Jacob, Eneida iniciou a narrativa de sua �ltima exist�ncia.
- Orlando, Deus � bondade suprema e ter� miseric�rdia com todos os seus filhos, mas Ele nos d� a liberdade de querer ou n�o essa miseric�rdia. Nenhum de n�s
ser� abandonado, mas seremos respeitados no nosso desejo, mesmo que o que queremos seja contra n�s mesmos. Foi o que aconteceu comigo em outra encarna��o, teimei
em permanecer com uma postura inadequada. Importava-me apenas com a minha apar�ncia, o que eu passava para as pessoas com minhas palavras ocas, sem nenhum fundamento
de verdade. Alimentava minha vaidade escondendo-me em um personagem, e isso me custaram anos de sofrimento no meu retorno.
Orlando, cada vez mais interessado, perguntou:
- Desculpe-me se vou ser indelicado, mas poderia explicar melhor?
- Voc� n�o est� sendo indelicado, meu amigo, gosto de falar dos meus erros para lembrar que, assim como muitos, tamb�m errei, e essa consci�ncia me torna mais prudente
e mais compreensiva com rela��o �s falhas alheias.
Jacob, interferindo, disse:
- Eneida, penso que � mais prudente ir com Orlando at� o Lago Azul. L� poderiam conversar melhor sem causar nenhuma altera��o no equil�brio desses dois irm�os que
acabam de retornar da Terra. Como voc� sabe, eles precisam de repouso e tranq�ilidade.
- Perdoe-me, Jacob, voc� tem toda a raz�o. - Dirigindo-se a Orlando, perguntou: - Voc� gostaria de ouvir a minha hist�ria?
- Claro, Eneida, se for poss�vel, gostaria sim. Sei que vou aprender muito com voc�.
Assim fizeram.
Em segundos estavam sentados diante das �guas cristalinas e tranq�ilas do Lago Azul. Eneida, antes de come�ar sua narrativa, elevou o pensamento ao Senhor e dirigiu-lhe
singela prece, no que foi acompanhada por Orlando.
- Nesta encarna��o, nasci em uma fam�lia esp�rita, estruturada e sem maiores problemas financeiros. Meus pais eram pessoas caridosas. Dedicavam-se, nas horas vagas,
a um trabalho social no Centro Esp�rita que freq�entavam assiduamente, no que eram acompanhados por meus dois irm�os mais velhos, que pensavam e agiam como eles.
Minha inf�ncia foi colorida, com folguedos e alegria adequados a uma crian�a amada pelos pais e irm�os. Logo na adolesc�ncia, comecei a me afastar dos prop�sitos
de fraternidade de minha fam�lia. Achava injusto destinar parte dos nossos recursos �s obras de assist�ncia aos necessitados. E, por mais que meus pais explicassem
que t�nhamos o suficiente para n�s e para o nosso pr�ximo, n�o me conformava, sempre achando que pod�amos ter muito mais se n�o fosse essa atitude de meus pais,
que eu n�o aprovava. "Da maneira como voc�s agem, est�o tirando do que � meu", dizia sempre. Minha m�e, com carinho, tentava me explicar � import�ncia de agir com
fraternidade e generosidade para com nosso semelhante: "Filha, temos mais que o necess�rio. Muitas de nossas coisas s�o sup�rfluas. � preciso olhar para quem n�o
possui nem o necess�rio". Enfim, Orlando, nada me convencia de que eles andavam no caminho certo. Errado era o meu, que n�o ostentava nenhuma semente que desse fruto
de amor. Com o tempo, fui percebendo o quanto �s pessoas amavam meus pais e irm�os. Quanto a mim, n�o recebia nenhuma palavra de gratid�o nem mesmo de carinho, e
n�o podia mesmo receber, pois nada fazia para que isso acontecesse. Sempre ouvia dizerem quanto eu era diferente de todos, e isso passou a me incomodar. Achei que
poderia inverter a situa��o e me tornar t�o amada quanto eles, ou melhor, sobressair perante as pessoas. Foi o que fiz de maneira leviana. Constru� um personagem
e, por interm�dio dele, comecei minha farsa.
- Como assim, Eneida? N�o estou entendendo.
- Orlando, comecei a me interessar pelas reuni�es do Centro e a acompanhar minha fam�lia. Logo compreendi o que estudavam e o que gostariam de ouvir, e fui
me infiltrando de maneira dissimulada, at� que consegui o lugar de palestrante do Evangelho. Meus pais ficavam orgulhosos ao me escutarem pregar sobre a caridade,
acreditando realmente que afinal eu tinha entendido a palavra de Jesus. N�o imaginavam que tudo n�o passava de uma farsa, que eu continuava como antes, impiedosa,
ego�sta e falsa. Com o passar do tempo, abri o meu pr�prio Centro e passei a explorar a credulidade das pessoas mais simples. Cobrava por uma simples prece que fazia
para algu�m enfermo. Cada vez mais enganava, mentia e me afastava da verdade. Passei a criar a minha verdade, aquela que me favorecia. Minhas prega��es eram vazias,
palavras ocas, sem nenhum conte�do, serviam apenas para iludir os que me ouviam.
- E seus pais? - perguntou Orlando interessado.
- Meu pai, depois de alguns anos, desencarnou; e minha m�e, desgostosa com meu procedimento, afastou-se de mim, indo morar com meus irm�os em uma cidade pr�xima.
- Quanto tempo durou esse seu procedimento, Eneida?
- Cerca de quinze anos. Depois sofri um derrame cerebral, perdi a fala e fiquei no sil�ncio por mais seis anos, at� que o dia do desencarne chegou.
Nesse ponto, Eneida parou a narrativa, olhou fixamente para Orlando e lhe disse emocionada:
- Como disse Jesus, Orlando, a semeadura n�o � obrigat�ria, mas a colheita sim. Colhi o fruto da �rvore que plantei, ou seja, plantei a �rvore do vento e
colhi tempestade. Assim que meu esp�rito deixou a mat�ria, foi sugado para o lugar com o qual se afinava, lugar feio, esfuma�ado, onde se escutavam os lamentos daqueles
que, como eu, se esqueceram da vida que pulsa depois da morte do corpo f�sico e agiram contrariando as leis divinas.
- Quantos n�o agem assim, Eneida, jogando palavras ao vento sem se importarem com o que podem causar no cora��o e no destino de quem os escuta?
- � verdade, Orlando, aquele que se prepara somente para a vida da mat�ria, e n�o para a vida eterna, que � a p�tria de origem de todas as criaturas, � s�bio por
um momento, mas tolo para sempre.
- H� quanto tempo voc� retornou da Terra?
- H� muitos anos, Orlando. Durante doze anos fiquei nas zonas infelizes, at� que, agraciada com a piedade divina, fui recolhida e trazida para c�. Aqui recebi o
amor de Jacob e de outros irm�os, fui tratada e, quando estava apta, recebi permiss�o para participar das palestras de madre Teresa, aprendendo o verdadeiro significado
do amor, da verdade e da transpar�ncia do ser. Conheci e estudei o Evangelho do nosso Mestre e hoje trabalho junto com Jacob. O resto sobre minha trajet�ria voc�
j� sabe. Conheci C�ssia no passado, e fui agraciada com a permiss�o de acompanh�-la, inspirando-a sempre para o bem. Esta � a raz�o de me preocupar tanto quando
presencio os irm�os encarnados entregando-se � imprud�ncia, tentando tirar vantagem do semelhante, vivendo sem nenhuma responsabilidade espiritual e se julgando
muito espertos. S�bio � aquele que j� entendeu que a morte nada mais � que a volta � vida espiritual.
- Esses dois irm�os que chegaram segundo Jacob, voltaram vitoriosos.
- Sim. N�o se perderam em meio � riqueza que possu�am, mas fizeram dela a fonte de felicidade de muitas pessoas. � preciso saber que tudo o que pertence � mat�ria
na Terra ficar�; conosco s� vir�o �s virtudes que nos fazem crescer como criaturas de Deus, e as virtudes adquiridas ningu�m poder� nos tirar.
Eneida sentiu o chamamento de Jacob.
- Jacob nos chama, Orlando. � hora de voltarmos.
Orlando ainda disse a Eneida algumas palavras:
- Minha querida irm�, agrade�o por ter dividido comigo sua hist�ria. Creia que foi um enorme aprendizado e uma li��o de humildade. Que Jesus a aben�oe todo
o tempo!
Eneida sorriu e apenas disse:
- Vamos cumprir nossa tarefa.
Em poucos instantes, estavam diante de Jacob. Encontraram-no em prece. Permaneceram em sil�ncio, acompanhando sua vibra��o. Ao terminar, Jacob lhes disse:
- Que Jesus, nosso Divino Amigo, nos aben�oe e proteja.
- Parece preocupado. Problemas com algum irm�o aqui do hospital? - perguntou Eneida.
- Sim. Como sempre, � nosso irm�o L�o que reluta em prosseguir na espiritualidade. Ele quer reencarnar e n�o aceita ter de esperar o tempo necess�rio para aprender
a superar suas imperfei��es.
- J� conversou com ele, irm�o? - perguntou Orlando.
- Sim, Orlando, v�rias vezes, disse-lhe que n�o est� preparado para novamente enfrentar a vida f�sica sem cometer os mesmos erros. Ele diz que precisa se
encontrar novamente com C�ssia para pedir-lhe perd�o.
- Mas C�ssia n�o o reconhecer� - disse Orlando.
- Ele n�o consegue entender que estar� escondido em outro corpo, em outra situa��o, enfim, outra experi�ncia.
- O que se pode fazer para ajud�-lo?
- Vou transferi-lo para o departamento que cuida desses casos. L�, ele ter� todas as condi��es de aprendizado, aprender� a ter paci�ncia e saber� que n�o
se pode pular etapas. Todas as coisas chegam ao momento previsto pelo Mais Alto, e a reencarna��o n�o foge � regra. � necess�rio se preparar para reencarnar, somente
assim a chance de dar certo aumenta, na mesma propor��o em que aumentam as virtudes adquiridas pelo esp�rito.
Jacob silenciou e, em seguida, voltou a dizer:
- Jo�o Evangelista, o ap�stolo do amor, disse �queles que o acompanhavam:
"Ningu�m pode amar sem perdoar... Ningu�m pode perdoar sem entender... Ningu�m pode entender sem analisar... Ningu�m pode analisar com bom senso sem sentir no cora��o
a Fraternidade que se transforma para os outros em variadas modalidades do Bem". � isso o que L�o precisa aprender. Ele ir� para o lugar certo para que isso aconte�a
e se sentir� integrado em seus desejos de evolu��o. Para todos os prop�sitos da nossa exist�ncia existe um tempo certo para percorrer, n�o adianta querer alcan�ar
um objetivo sem ter sabedoria para sustentar nosso desejo. No momento certo, adequado e previsto, L�o retornar� para junto daquela que hoje � o motivo da sua ang�stia,
e seu esp�rito se aquietar� nos bra�os carinhosos de sua m�e.
- Quer dizer que ele vai se reencarnar como filho de C�ssia e Frank? - perguntou Orlando espantado.
- N�o, ser� o filho do cora��o de C�ssia e Frank. Aprendera por meio do abandono a valorizar e respeitar seu semelhante. Sentir� na ado��o a for�a do amor desinteressado,
o amor que une os esp�ritos e que se coloca acima de qualquer sentimento menor.
- Quando isso acontecer�? - voltou Orlando a perguntar.
- Como j� disse, no momento apropriado. Ser� o quarto filho de C�ssia, e o encontro se dar� quando ele tiver tr�s anos.
- Ent�o ainda vai demorar, pois C�ssia n�o tem ainda nenhum filho!
- A demora ser� compat�vel com o tempo de aprendizado de L�o. Tudo na espiritualidade � planejado para que a evolu��o aconte�a e a felicidade se fa�a. Os trope�os
do caminho s�o os homens que criam; o desvio da rota tra�ada � a escolha de cada um.
- Por que os homens t�m tanta dificuldade em respeitar e seguir as leis divinas?
- Porque se colocam como o centro do universo; lutam com todas as armas para se posicionar no mundo dos homens, deixando grandes marcas de sofrimento em seu caminho.
Entretanto, deveriam lutar para conquistar um bom lugar no reino de Deus, seguindo plenamente as palavras do Cristo e se portando verdadeiramente como criaturas
de Deus. Buscam a felicidade por meio do ego�smo, do orgulho e da ambi��o, e n�o percebem que essa � uma felicidade que se desfaz no menor sopro de vento.
Foram interrompidos com a chegada de Tom�s.
- Jacob, tudo est� pronto para a transfer�ncia de L�o. Podemos ir?
- Vou acompanh�-los - disse Jacob. Orlando, t�mido, perguntou:
- Permitiria que eu os acompanhasse? Gostaria de dizer algumas palavras ao L�o.
- Vamos at� ele e satisfa�a seu desejo, mas n�o poder� nos acompanhar.
- Obrigado, Jacob.
Aproximando-se de L�o, que se encontrava agitado, Orlando disse amavelmente:
- L�o, que Jesus o acompanhe e aben�oe! Aproveite esta oportunidade de aprendizado, pois � uma b�n��o que Jesus lhe concede. N�o se apresse em satisfazer a sua vontade,
pois tudo se dar� no momento certo para a evolu��o do seu esp�rito. Confie em Jesus e se entregue sem reserva ao amor divino. Meu amor fraterno o acompanhar�.
L�o fixou seu olhar naquele esp�rito que ofendera de maneira vil e que, entretanto, o perdoara. Constrangido, respondeu:



- Obrigado por haver me perdoado. Agora eu s� preciso perdoar a mim mesmo e eliminar essa culpa que me consome e me deixa intranq�ilo.
- Confie no Mais Alto e o Criador o auxiliar�.
- Eu confio! - exclamou L�o, seguindo Jacob e Tom�s.
- At� outra oportunidade, meu irm�o - disse Orlando.
Observando L�o se afastar acompanhado de Tom�s e Jacob Orlando pensou: "Por que ser�, meu Deus, que os esp�ritos, quando se encarnam, invertem os valores aprendidos
e se jogam de cabe�a na imprud�ncia, sem medir as conseq��ncias nem pensar nas que fatalmente vir�o?"
Eneida, captando seu pensamento, respondeu:
- Porque se entregam aos apelos da carne, Orlando, e esses apelos satisfazem sua vaidade e ambi��o, sentimentos que n�o foram totalmente exclu�dos da sua ess�ncia.
Mas chegar� o dia em que os homens compreender�o a inutilidade de tantas aquisi��es materiais, aquisi��es sup�rfluas que nenhum benef�cio traz � sua evolu��o como
criatura de Deus. Nesse dia, seu cora��o vai vislumbrar a luz da verdade, e � esse clar�o que os aproximar� de Jesus, proporcionando-lhes a felicidade que almejam.


N�o sou feliz! A felicidade n�o foi feita para mim! Exclama geralmente o homem em todas as posi��es sociais. Isso, meus caros filhos, prova melhor que todos os racioc�nios
poss�veis a verdade desta m�xima do Eclesiastes: "A felicidade n�o � deste mundo". Com efeito, nem a fortuna, nem o poder, nem mesmo a juventude florescente s�o
as condi��es essenciais da felicidade; digo mais, nem mesmo a reuni�o dessas tr�s condi��es t�o desejadas, uma vez que se ouvem sem cessar, no meio das classes mais
privilegiadas, pessoas de todas as idades se lamentarem amargamente da sua condi��o de ser.
Assim, pois, aqueles que pregam ser a Terra a �nica morada do homem, e que s� nela, e numa s� exist�ncia, lhe � permitido atingir o mais alto grau das felicidades
que a sua natureza comporta, iludem-se e enganam aqueles que os escutam. J� que est� demonstrado, por uma experi�ncia arquissecular, que esse globo n�o encerra,
sen�o excepcionalmente, as condi��es necess�rias � felicidade completa do indiv�duo.
(O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. V, Item 20.)




Cap�tulo 20
O sonho da gravidez


Finalmente chegou o dia t�o esperado por C�ssia. Frank deixava o hospital completamente restabelecido. Sua alegria era apenas ofuscada pela tristeza que percebia
no olhar de seu marido, pois trazia estampado no rosto � dor de saber que n�o se encontraria mais com seus pais.
Apertou as m�os de Frank querendo lhe dar for�a e dizendo, com esse gesto, que estava ali, ao seu lado, n�o para suprir a falta que sentiria de seus pais, mas para
caminhar ao seu lado sempre, apesar de qualquer afli��o que tivessem. Frank retribuiu o gesto de carinho beijando-lhe docemente sua face. Finalmente chegaram em
casa.
Frank se emocionou com o carinho e a aten��o com os quais foi recebido por Antonieta e Sabina.
- Seja muito bem-vindo � sua casa, Frank - disse Antonieta abra�ando-o.
- Obrigado, dona Antonieta; agrade�o imensamente o que fez pelos meus pais. Serei eternamente grato � senhora.
Novamente Antonieta o abra�ou.
- N�o se preocupe em me agradecer, Frank, o que fiz pelos seus pais foi por afei��o a eles e a voc�. Tenho certeza de que voc�s fariam o mesmo por mim, se necess�rio
fosse.
- A senhora � muito generosa!
Sabina presenciava tudo sem ter coragem de se dirigir ao filho. N�o sabia o que dizer. Temia que tudo o que dissesse pudesse parecer desejo de finalmente tomar o
seu lugar de m�e.
Frank virou-se para ela pedindo, com o olhar, que o abra�asse e que o fizesse sentir que continuava protegido pelo amor de m�e. De maneira t�mida, Sabina foi a passos
lentos se aproximando dele, passou as m�os em seu rosto e lhe disse:
- Frank, sinto sinceramente a morte de seus pais e jamais tentarei ocupar em seu cora��o o lugar que a eles pertence e que deve continuar pertencendo, mas quero
que saiba que estarei aqui sempre, perto de voc� e de C�ssia, para cuidar das pessoas que mais amo neste mundo. Acredite na minha sinceridade, � s� o que lhe pe�o.
- Por que n�o me chama de filho?
- Meu cora��o diz que devo, mas a raz�o me impede, por n�o saber se posso.
- Sabina, esque�a seus temores. Gostaria muito de ser chamado de filho por voc�. N�o acha que j� esperou muito por isso? S� lhe pe�o que me d� um tempo para cham�-la
de m�e. Sinto que devo isso � minha m�e que partiu.
- Filho, cham�-lo assim j� � a realiza��o do sonho acalentado durante mais de vinte anos. Quanto a me chamar de m�e, prefiro sinceramente que continue a me chamar
de Sabina. Devo isso a sua m�e por ter feito de voc� um verdadeiro homem de car�ter e de sentimentos dignos de um filho de Deus.
Abra�aram-se selando o respeito e o amor que os uniria a partir daquele momento.
O tempo passou e adormeceu todas as dores, mas a saudade dos entes amados permanecia no cora��o de cada um como uma doce lembran�a dos dias felizes que n�o voltariam
mais. Sabiam que nada mais seria como antes, mas tamb�m sabiam que dependeria de cada um dar a si mesmo a oportunidade de voltar a sorrir.
A vida segue o seu rumo tentando colocar novamente as coisas em seus lugares. E, para aqueles que cr�em no amanh�, a alegria que traz o brilho no olhar volta a acontecer,
como em uma manh� de domingo na casa de C�ssia.
Todos sentados � mesa para o desjejum saboreavam, como sempre, as deliciosas guloseimas feitas por Sabina. Antonieta observou o brilho de felicidade nos olhos de
sua filha.
- C�ssia, voc� me parece feliz nesta manh�, algum motivo especial?
Sorrindo, C�ssia respondeu:
- Sim,vov�!
Antonieta, Sabina e Frank olharam-se at�nitos e perguntaram ao mesmo tempo:
- Voc� disse vov�?
Olhando diretamente para o marido, C�ssia respondeu:
- Sim, papai!
Todos se levantaram de um salto s�. A emo��o tomou conta daqueles cora��es ansiosos por ouvir passos e sorrisos de crian�a alegrando a casa. Antonieta e Sabina,
sabendo de todo o drama vivido no passado por C�ssia, n�o continham as l�grimas.
Frank, abra�ando a esposa, dizia:
- � mesmo verdade, meu amor, voc� est� querendo dizer que vamos ter um filho, � isso?
- � isso, meu amor, Jesus est� aben�oando nossa uni�o e permitindo a realiza��o do maior sonho da minha vida, que � ser m�e.
- Definitivamente, sou o homem mais feliz deste mundo. At� m�e Jesus me deu duas, para que eu n�o me sentisse �rf�o. Como posso agradecer pelas alegrias recebidas
de Deus, que sempre vem para aliviar a dor?
Sabina respondeu:
- Agradecemos pelas b�n��os que recebemos meu filho, valorizando a vida e n�o amaldi�oando nada que nos acontece, porque n�o sabemos a import�ncia de cada epis�dio
na escala da nossa evolu��o. Quando damos a import�ncia adequada a cada situa��o e n�o sofremos mais que o justo e o necess�rio, sem desespero ou revolta; quando
conseguimos sentir a presen�a de Deus em n�s e vivemos de acordo com as Suas leis, promovendo nossa felicidade na mesma propor��o que nos tornamos sens�veis �s necessidades
do pr�ximo e tudo fazemos para aliviar suas afli��es. Essa � a maneira de agradecermos a Deus pela oportunidade e pelo benef�cio recebido.
Pela primeira vez, Frank se dirigiu a Sabina dizendo:
- M�e, como � senhora se expressa com sabedoria! - exclamou.
Todos olharam surpresos para ele, que, falando com naturalidade, n�o percebeu o espanto que causou, principalmente em Sabina.
- Amor - disse C�ssia -, voc� percebeu a maneira como chamou Sabina?
Ao ouvir o coment�rio da esposa, caiu em si e respondeu:
- Falei sem for�ar nada, com espontaneidade, e, se isso se deu de um modo t�o natural, � porque chegou o momento de acontecer. Tempos atr�s eu lhe disse que n�o
estava preparado para cham�-la assim, que tivesse paci�ncia. Acho que sua postura digna e respeitosa fez com que nosso encontro se desse de verdade. Hoje a considero
realmente minha m�e.
Sem dizer uma s� palavra, Sabina abra�ou o filho com imenso amor.
- Obrigada, meu filho, minha exist�ncia! Tudo o que passei valeu � pena, porque hoje vivo a maior alegria de minha vida. Voc� recebe a not�cia de que vai ser pai,
eu sinto voc� verdadeiramente como meu filho e, ao mesmo tempo, sei que vou me tornar av�, Acho que � alegria demais para essa velha!
- Que velha que nada, Sabina - disse C�ssia. - Voc� e minha m�e ainda v�o tomar conta dos netos. Afinal, eu e Frank vamos querer namorar bastante, n�o � meu amor?
- Claro, para isso nossos filhos v�o ter duas av�s em tempo integral.
A alegria se fez presente com toda a intensidade no cora��o de todos. A partir daquela not�cia, a vida na casa de Antonieta tomou nova dire��o. A vibra��o de amor
por aquele pequeno ser que come�ava a se formar era total. Tudo se fazia em fun��o de preparar o ambiente para receber o t�o aguardado filho e neto.
- Quem diria que um dia ir�amos ser av�s do mesmo neto! - dizia Sabina a Antonieta.
- � verdade, Sabina, constru�mos uma bela amizade e fomos recompensadas. Hoje vivemos todos juntos, em harmonia e presenciando a felicidade de C�ssia e Frank.
- O destino nos reserva surpresas, e a maior delas foi justamente encontrar meu filho, coisa que para mim parecia imposs�vel.
- Sabina, quando Deus tra�a um plano para n�s, n�o adianta lutar contra ele, pois ele se far�. Tudo o que voc� passou nesta vida; todo o sofrimento de C�ssia e o
meu pr�prio, vendo-a sofrer e passando pela dor de me separar de Orlando de forma t�o violenta, tudo isso foi recompensado por nosso Criador. Nenhuma de n�s se desesperou
a ponto de cair na descren�a. Passamos pela dor com dignidade crist�, respeitando os des�gnios de Deus. Creio que com essa nossa postura conquistamos o direito �
paz de que hoje desfrutamos.
- Penso que a senhora tem raz�o, dona Antonieta. Li, certa vez que "as dificuldades apenas testam nossa f� em Deus e a perseveran�a no bem; venc�-las com equil�brio
e sensatez � firmar no nosso cora��o a certeza de que todos t�m possibilidades de vencer". (A ess�ncia da alma, Irm�o Ivo.)
- Sabina, eu gostaria de pedir um favor a voc� - disse Antonieta.
- Por favor, dona Antonieta, diga o que deseja e terei prazer em atend�-la.
- � justamente essa maneira de se dirigir a mim, Sabina.
- N�o estou entendendo.
- Sabina, moramos juntas h� muito tempo, nos tornamos praticamente da mesma fam�lia, ou seja, somos sogras e m�es das mesmas pessoas. N�o faz mais sentido continuar
me tratando por dona Antonieta. Gostaria que me chamasse apenas pelo meu nome.
- N�o sei se vou conseguir. H� anos a chamo assim. N�o � melhor continuar do jeito que est�?
- Prefiro que mude, pois agora tudo se tornou diferente. Voc� � sogra da minha filha e eu do seu filho; nosso neto � o mesmo. Fa�a um esfor�o, sim? Vou me sentir
mais � vontade.
- Tudo bem, Antonieta.
- Assim � que eu gosto.

***

Apesar da gravidez, C�ssia, assim como Frank, continuava volunt�ria do projeto que tanto amava. Os imensos jardins de flores cultivados por aquelas pessoas t�o sofridas,
orientadas por C�ssia, devolviam os cuidados em forma de beleza e perfume. Eram momentos de intensa alegria para C�ssia, que, agora mais do que nunca, se sentia
motivada por levar consigo, agasalhadinho em seu ventre, o fruto do seu amor por Frank.
- Dona C�ssia, quando seu filhinho vai chegar? - perguntavam todos aqueles que dividiam com ela a gratificante tarefa.
- Ainda demora - respondia C�ssia sorrindo.
- Quando ele chegar podemos conhec�-lo?
- Claro que sim - respondia C�ssia. - Vou acostum�-lo a amar as flores desde pequeno, aprender que s�o elas que perfumam a vida, e que sempre fica um perfume nas
m�os de quem as distribui.
- � mesmo a minha mulher que est� dizendo coisas t�o bonitas? - perguntou Frank.
- Voc� chegou mais cedo hoje aqui no projeto, amor!
- Estava morrendo de saudades de voc� - respondeu Frank - Como est� o trabalho?
- Gra�as a Deus, indo muito bem. Veja como est�o lindos os jardins!
- A beleza maior est� na possibilidade de trabalho para toda essa gente, que adquire dignidade por meio do pr�prio sustento.
- O trabalho, a ocupa��o traz autoestima para as pessoas. Os menos favorecidos n�o querem esmolas, mas sim oportunidade de emprego, educa��o e sa�de para se sentirem
inclu�dos na vida. Quando poucos t�m muito e muitos t�m pouco, o desequil�brio se torna inevit�vel. Mas isso, Frank, s� vai mudar quando os poucos que dominam aceitarem
que todos possuem os mesmos direitos na grande casa de Deus.
- Isso ainda est� longe de acontecer, C�ssia.
- Infelizmente sim, mas se cada um fizer o pouco que lhe compete, um dia o mundo deixar� de ser o cen�rio do mal que o pr�prio homem pratica. Observe com que entusiasmo
essas pessoas trabalham aqui no projeto! Elas sabem que seu esfor�o ser� recompensado, mas, se o objetivo e os frutos desse trabalho forem desviados, cair�o na desesperan�a
e na descren�a, e a�, Frank, ser�o outros tantos a perambular pelas ruas.
- Tenho orgulho de voc�, meu amor, sabe administrar muito bem seus sentimentos, ou seja, pensa em n�s sem se esquecer do pr�ximo e pensa no pr�ximo sem permitir
que nada interfira em nosso amor. Consegue deixar marcas do bem por todos os lados.
- Frank - disse C�ssia -, aprendi com minha doutrina que nosso cora��o � el�stico, pode estar em diversos lugares, exercitar diversas formas de amor sem, entretanto,
se esvaziar. Quando evitamos as injusti�as, conseguimos ter uma posi��o ponderada diante de situa��es dif�ceis. Sempre acreditei na vida depois de amanh�. Sei que
esse amanh� chegar� como a �nica certeza que temos. Portanto, tento cuidar do hoje, porque � ele que antecede o amanh�.
- C�ssia, n�o sabia que esse seu lado era t�o forte. Que bom para voc� e, principalmente, para mim que sei t�o pouco.
- Pode at� n�o saber, mas percebo que voc� � uma pessoa boa por impulso generoso, e � por isso que o amo tanto. Bem, agora me deixe terminar meu trabalho.
Frank afastou-se indo tamb�m cuidar de suas tarefas no projeto.
- Vamos continuar, pessoal, � preciso terminar de regar as flores - disse C�ssia.
A alegria era geral em meio �quelas pessoas que, pela primeira vez, sentiam-se respeitadas e, de alguma forma, �teis para a sociedade.

***

- Sabina, venha aqui um instante! - disse Antonieta entusiasmada.
- O que foi? - respondeu � amiga. - Por que o grito?
- Terminei o casaquinho, veja como ficou lindo! - exclamou orgulhosa do seu trabalho.
- Realmente muito lindo. Voc� tece muito bem.
Antonieta percebeu que Sabina ficou s�ria de repente.
- Parece-me que voc� est� preocupada com alguma coisa. O que �?
- Antonieta, estava escutando o r�dio e ouvi uma not�cia que me deixou intrigada.
- Que not�cia?
- Lembra daquela mo�a que esteve aqui procurando por C�ssia para pedir perd�o por todo o mal que havia feito a ela?
- Lembro perfeitamente, chama-se Selma.
- Isso mesmo, Selma.
- Pois bem, ela estava dando uma entrevista na r�dio da capital pedindo ajuda para a realiza��o de um transplante para seu filho Felipe.
- Transplante? Explique isso direito, Sabina.
- � s�rio, disse que seu filho est� muito doente e que o �nico recurso � a realiza��o de um transplante de rim.
- Mas vai ser muito dif�cil conseguir um doador, Sabina, a n�o ser ela mesma, o pai ou irm�os, se ele tiver.
- A� � que est� � dificuldade, Antonieta. Ela n�o pode doar, pois tem apenas um rim funcionando, o outro est� comprometido Irm�os ele n�o tem e o pai ela n�o sabe
onde est�. Por isso pediu para ser ouvida na r�dio na esperan�a de o pai ficar sabendo e aparecer. Forneceram todos os dados, nome, a cidade onde mora, o nome do
pai, enfim, todas as informa��es necess�rias. Fiquei com muita pena dessa mo�a.
- Quem sabe ele n�o aparece! R�dio tem uma penetra��o muito grande e pode ser que algu�m que o conhe�a esteja escutando esse apelo e o avise.
- Tomara que sim, Antonieta. Segundo ela mesma disse, foi abandonada assim que ele soube da gravidez. N�o quis assumir o filho e desapareceu. Ela nunca o procurou,
somente agora para tentar salvar o filho.
- Como eu lhe disse Sabina, se estiver nos planos de Deus ele aparecer�. Ela precisa fazer o que lhe compete, se esfor�ar o m�ximo para salv�-lo, dar a ele cuidado
e amor e entregar sua dor a Jesus, confiando no aux�lio do Divino Amigo.
Mudando o rumo da conversa, Antonieta voltou a perguntar:
- Fale a verdade, n�o est� lindo o casaquinho do nosso neto?
O sorriso de Sabina confirmou o que Antonieta afirmara.



Cap�tulo 21
O retorno de Armando


Selma sentia o desespero invadir seu cora��o. N�o sabia mais onde procurar ajuda. Presenciava a enfermidade tomar conta de seu pequeno Felipe, que era t�o novinho
ainda e j� sofria o desconforto da hemodi�lise.
- A �nica solu��o � o transplante - dissera-lhe o m�dico. "Meu Deus" pensava a todo instante, "permita que Armando tenha escutado meu apelo na r�dio, ele � a �nica
esperan�a para Felipe. Poupe meu filho desta dor, Senhor".
Clotilde sofria pelo neto e por sua filha. Nada podia fazer para amenizar o sofrimento dos dois seres que amava. N�o podia ser a doadora, e nem exame para verificar
se era compat�vel quiseram fazer.
- Seu estado f�sico e sua idade avan�ada n�o permitem esse procedimento - os m�dicos disseram. - Tentem encontrar o pai.
Ele pode ser a solu��o.
- Selma - dissera � filha -, tive outra id�ia que pode dar certo.
- Qual id�ia, m�e?
- Coloque um an�ncio em um jornal de grande circula��o. Penso ser o caminho mais f�cil.
Selma pensou e respondeu:
- Realmente pode ser a solu��o, m�e. Vou tratar disso, e vou agora. Tenho uma estrada pela frente at� a capital.
- Vai sossegada, minha filha, tomo conta de Felipe. N�o corra dirija com prud�ncia.
Selma beijou a m�e e o filho e saiu levando mais uma vez a esperan�a no cora��o. Chegando � reda��o do jornal, explicou o que queria.
- Um an�ncio grande que seja f�cil de ser notado - dissera. Ap�s explicar o que pretendia, dar todas as informa��es necess�rias terminou dizendo:
- Armando, � seu filho e poder� morrer. Se voc� ainda possui em seu cora��o um m�nimo de sentimento, procure-nos, venha dar a vida novamente a Felipe.
Saiu desalentada com todo o sofrimento que se abatera sobre ela e que se arrastava havia muito tempo. Antes de tomar o caminho de volta, entrou em um templo, sentou-se
e, no sil�ncio, elevou seu pensamento ao Senhor e orou:
"Senhor, elevo meu pensamento a V�s e suplico: olhe no fundo do meu cora��o e sinta o meu sofrimento. N�o me separe do meu filho que � a �nica coisa boa que tenho
na vida. Permita meu Pai, que Armando, onde quer que esteja, tenha acesso � minha s�plica e venha salvar nosso filho. Errei muito na minha vida e por isso pe�o perd�o,
Senhor. Tenha miseric�rdia dessa filha que caiu em enganos, que sabe que n�o merece, mas, confiando na Vossa bondade, enche o cora��o de f� e esperan�a de que n�o
ser� abandonada. Desculpe-me Senhor, n�o sei orar, mas entrego meu filho nas Vossas m�os e me tranq�ilizo. Obrigada, meu Pai, por me ouvir."
Selma sentiu-se envolvida por uma sensa��o de paz e seu cora��o se aliviou. Levantou-se e tomou o caminho de volta para sua casa.
Era noite quando entrou em sua casa. Encontrou Clotilde entregue aos seus afazeres na cozinha.
- M�e, onde est� Felipe?
- Oi, filha, ele est� dormindo. Est� tudo bem, n�o se preocupe.
- Como ele passou o dia?
- Bem, apenas queixou-se de cansa�o.
- Por que ser�?
- N�o sei filha, deve ser normal. Voc� est� com fome? Quer comer alguma coisa?
- Sim, estou com um pouco de fome. N�o me alimentei na estrada, pois queria chegar o mais r�pido poss�vel. Se tiver alguma coisa pronta, eu aceito.
Com presteza, Clotilde preparou um lanche para Selma. Sentou-se ao lado da filha e perguntou:
- Como voc� est� filha? Preocupa-me a maneira como est� vivendo. N�o se alimenta direito, mal dorme � noite, desse jeito pode ficar doente e quem vai cuidar de Felipe?
Precisa ficar mais calma. Tenho f� de que tudo ir� se resolver.
- Tenho muito medo de perder meu filho, m�e. Se isso acontecer, n�o vou suportar. Ser� que ele est� pagando pelos meus erros?
- N�o, filha, creio que n�o. Ningu�m paga pelos erros dos outros, porque cada um � respons�vel pelas pr�prias atitudes. O que sei � que Deus n�o envia nada de gra�a.
Para todos os sofrimentos existe uma causa importante que gerou a dor, mas a nossa alegria � que Ele nos d� a oportunidade, o esclarecimento e as condi��es para
que possamos alcan�ar nosso ideal, nosso objetivo de felicidade. No entanto, devemos buscar o que almejamos por meio da nossa reforma interior.
- Pe�o muito a Deus que traga Armando at� n�s. Somente ele poder� salvar Felipe. Ele � o pai, e a chance de ser compat�vel � grande.
- Vamos confiar, Selma, o importante nessas horas � n�o perder a f�.
- Obrigada, m�e. Apesar de n�o ter sido uma boa filha para a senhora, tem me apoiado muito, a senhora � meu porto seguro. N�o sei como pude ir embora deixando Felipe
t�o pequeno para a senhora cuidar. Como me arrependo de tudo o que fiz - disse Selma com l�grimas nos olhos.
- Isso � passado, minha filha, o que importa � o presente. O que voc� aprendeu e o que faz agora, suas atitudes atuais, o perd�o que pediu �quela mo�a, a maneira
como trata seu filho, sua m�e... Enfim, deixe o passado onde est� e viva o presente da melhor maneira que puder, com sensatez e sabedoria.
- Obrigada, m�e, eu amo a senhora e sou muito grata por tudo o que a senhora j� fez e faz por mim. Obrigada por ter me perdoado.
Como resposta, Clotilde deu um beijo na face da filha e lhe disse:
- Agora termine seu lanche, tome um banho e v� se deitar. Precisa descansar.
Selma, cansada, seguiu o conselho da m�e.

***

Dez dias haviam se passado desde esse acontecimento. Selma cada dia mais, se entregava ao des�nimo, n�o acreditando que Armando apareceria. Culpava-se pela doen�a
do filho, considerava que tudo acontecia em virtude de seus erros passados e n�o conseguia se perdoar por se sentir causadora da doen�a de Felipe.
Certa manh�, Clotilde conversava com a filha tentando levantar sua confian�a quando a campainha da porta soou.
- Deixe que eu atendo - disse Clotilde apressando-se.
- � aqui que mora a Selma? - perguntou o rapaz � sua frente.
- Sim - respondeu Clotilde.
- Poderia falar com ela?
Um pouco desconfiada, Clotilde respondeu:
- Claro, vou cham�-la.
Voltando � cozinha onde Selma alimentava Felipe, disse-lhe:
- Selma, est� a� fora um rapaz procurando por voc�.
- Quem � m�e?
- N�o sei minha filha, n�o o conhe�o. Mas pelo modo como falou, deve conhecer voc�. V� atend�-lo que eu fico com Felipe.
Selma, ao chegar � porta, levou um susto.
- Armando! - exclamou at�nita. - � voc� mesmo? Mal posso acreditar. Deus ouviu as minhas preces - concluiu.
- Como est�, Selma? H� quanto tempo n�o nos vemos! Voc� est� muito bem - concluiu.
- Obrigada, Armando, voc� tamb�m est� �timo. Entre, por favor.
Levou-o at� onde estava Clotilde.
- M�e, este � Armando, o pai de Felipe. Esta � minha m�e e este garot�o � o seu filho.
- Muito prazer senhora...
- Clotilde!
Aproximou-se de Felipe. A emo��o, ao contr�rio do que pensara, tomou conta de seu cora��o. Abriu os bra�os e disse ao filho:
- Venha me dar um abra�o, filho, eu vim at� aqui para ser seu pai de verdade. Quero muito que me perdoe. A partir de agora, se sua m�e permitir, quero estar presente
na sua vida.
Selma, ao ver o filho abra�ado ao pai, n�o suportou a emo��o e a felicidade que invadiu seu ser e, sem tentar esconder, permitiu que l�grimas escorressem pelo seu
rosto, dando testemunho de seu sentimento.
- Voc� presente na vida de Felipe � tudo o que sempre sonhei, Armando. Ele merece conviver com seu pai.
Ap�s a esfuziante demonstra��o de carinho, Armando sentou-se com Felipe no colo.
- Como ele est�? - perguntou.
Selma fez um sinal para sua m�e, que de imediato compreendeu que ela n�o queria falar perto do filho.
- Vamos com a vov� separar alguns brinquedos para voc� mostrar para seu pai?
Alegre, a crian�a pulou do colo de Armando e seguiu a av�.
- Desculpe, mas n�o acho prudente conversar sobre sua doen�a na presen�a dele - disse Selma.
- Voc� tem raz�o.
- Ele n�o est� bem, Armando, h� tempos vem sofrendo com essa doen�a, e os m�dicos disseram que somente um transplante poder� salv�-lo. N�o tive outra sa�da, a n�o
ser apelar para a m�dia para tentar encontrar voc�, que tem grande chance de ser compat�vel com ele. Como voc� tomou conhecimento? Pela r�dio ou pelo jornal?
- Um colega de trabalho viu a reportagem no jornal, leu a hist�ria, viu meu nome e imediatamente entrou em contato comigo. Eu estava viajando a neg�cios. Assim que
soube, antecipei minha volta e vim procur�-la.
- Foi Deus que nos ajudou, Armando. Eu estava desesperada e com medo de perder Felipe, mas agora me sinto confiante e creio que tudo vai dar certo.
- Sei que n�o � o momento prop�cio, Selma, mas quero lhe dizer que me arrependi muito pelo que fiz com voc�. Compreendi tardiamente que agi como um canalha quando
a tratei daquele jeito. Eu estava cego e coloquei interesses mesquinhos acima do amor que sempre senti por voc�.
- Por que n�o me procurou?
- Sinceramente n�o tive coragem, imaginei que voc� jamais me perdoaria. Mas, acredite, hoje penso diferente e me envergonho do que fiz. Se voc� puder, gostaria que
me perdoasse.
Selma sorriu.
- Claro que o perd�o, Armando. Como voc�, eu tamb�m me arrependi dos atos levianos que pratiquei com o L�o e, principalmente, com a C�ssia. Quanto a ela, procurei-a
e, do mesmo jeito que voc� est� me pedindo perd�o, pedi a ela. Se me senti feliz por ser perdoada, por que n�o perdoaria voc�, que � o pai do meu filho? Todos n�s
erramos, Armando, voc�, eu e o L�o. A �nica inocente nessa hist�ria foi a C�ssia.
- Quanto ao L�o, voc� tamb�m o procurou para se desculpar?
- Infelizmente n�o pude fazer isso. Ele morreu h� algum tempo, mas pedi perd�o a ele nas minhas preces e acredito que ele tenha me perdoado. Oro para que ele tenha
encontrado a paz pelo arrependimento.
Armando segurou a m�o de Selma e falou:
- Selma, gostaria de lhe dizer que amei voc� de verdade e ainda a amo. Naquela �poca, estava com minha cabe�a perdida, confusa, querendo me dar bem na vida de qualquer
jeito, e de maneira leviana planejei uma maneira que achei f�cil de alcan�ar meu objetivo. Quando voc� me contou que L�o n�o assumiria a crian�a porque sabia que
n�o era filho dele e a expulsou de casa, assustei-me com a gravidez, achando que ela prejudicaria minha meta de conquistar o mundo. Sem medir conseq��ncias, tomei
atitudes levianas, desastrosas, sem me dar conta dos rastros de dor que poderia ter deixado para tr�s. Hoje eu sei que fui o principal prejudicado. Perdi voc�, n�o
vi meu filho nascer, crescer, enfim, s� conquistei solid�o e arrependimento. N�o sei se � v�lido lhe dizer, depois de tudo o que fiz, que o meu sentimento por voc�
nunca mudou, que hoje o meu desejo � ter voc� de volta, reconhecer meu filho e formar com voc�s dois uma fam�lia de verdade. Se a ofendo dizendo isso, desculpe,
n�o fique constrangida em dizer o que realmente pensa, seja o que for vou entender.
Selma n�o conseguia responder, tamanha era a sua surpresa diante da confiss�o de Armando. N�o conseguia parar de chorar.
- N�o consigo traduzir o que representam suas l�grimas - disse Armando.
- Representam alegria e agradecimento a Deus por ter permitido uma nova chance a n�s dois. Eu tamb�m nunca deixei de amar voc�, Armando, mas confesso que nunca esperei
que um dia pud�ssemos nos reencontrar e que fosse ouvir de voc� o que esperei ouvir naquela �poca. N�s dois erramos, como j� disse, mas acredito que aprendemos muito
com o sofrimento, e acho que podemos tentar novamente, dessa vez com mais prud�ncia, com os p�s no ch�o, valorizando o que realmente importa. A enfermidade de Felipe
nos deu a oportunidade de nos reencontrar, e creio que pelo sofrimento iremos nos aproximar mais ainda.
- Posso abra��-la? - perguntou Armando.
- Pode. N�o s� abra�ar, mas tamb�m me dar o beijo que espero h� tanto tempo.
Clotilde, entrando na sala com Felipe, viu os dois unidos selando com um beijo o reencontro.
- Felipe, � melhor os deixarmos a s�s. O que voc� acha?
Com a vozinha meiga de crian�a, Felipe respondeu:
- Papai... Mam�e?
- Sim, meu amor, agora voc� ter� ao seu lado o papai e a mam�e. Est� feliz?
- T� - respondeu Felipe, acrescentando: - E a vov� tamb�m.
Clotilde abra�ou o netinho com todo o amor.
Depois de todos os exames feitos, veio a confirma��o de que Armando era realmente compat�vel, podendo ser o doador. A esperan�a se firmava no cora��o de Selma, Armando
e Clotilde. A paz parecia estar voltando � vida de todos. Enquanto aguardava os procedimentos ficarem prontos para a cirurgia, Armando retornara � capital para resolver
os neg�cios que haviam ficado pendentes desde a sua partida. Ficara acertado que ele continuaria trabalhando na mesma empresa e retornaria para casa nos fins de
semana.
Selma n�o colocara nenhum obst�culo nas decis�es de Armando. Tudo caminhava para a felicidade de ambos. No dia da interna��o de Felipe, Selma e Armando se abra�aram
e juntos oraram ao Senhor:

Senhor Jesus, amigo misericordioso, dirija Teus olhos at� onde nos encontramos e compade�a-se de n�s e de nossas mis�rias. Ajude-nos a encontrar nossas verdades
dentro do nosso ser. Muitas vezes nos perdemos em desesperan�as, confus�es, erros e ansiedades; agimos com imprud�ncia e leviandade, mas Te pedimos que nos traga
de volta para a verdade que nos faz crescer aos teus olhos. Se nos julgar merecedores, permita que nosso filho se salve, d�-nos a alegria de abra��-lo novamente
e gui�-lo pela vida com a dignidade que o far� verdadeiramente filho de Deus. Assim seja, Jesus!

Se acreditarmos firmemente na palavra de Deus, nos ensinamentos que Jesus nos deixou, n�o devemos nos amedrontar diante das dificuldades que enfrentamos na nossa
caminhada neste mundo f�sico, ao contr�rio, precisamos tirar dessa dificuldade o alento, a for�a para prosseguirmos; tentar encontrar a mensagem contida nesses obst�culos.
S� aprendemos quando encontramos empecilhos, porque, ao tentar venc�-los, estamos promovendo nossa pr�pria evolu��o.

Tudo aconteceu dentro dos planos de Deus.
A cirurgia foi um sucesso e Felipe voltou a ser crian�a novamente; sorrindo e brincando na companhia de seus pais. Armando se sentia pai duas vezes. A felicidade
de ver seu filho curado e a certeza de que tudo acontecera pela b�n��o e miseric�rdia de Deus fez com que ele e Selma se motivassem a levar at� as crian�as que passavam
seus dias internadas em hospitais, � espera de cura para a enfermidade que as prendia ao leito, a alegria, o carinho e a palavra de consolo que colocavam nos brinquedos
que despertavam o sorriso infantil.
Mais uma vez o encontro anulou o desencontro. Mais uma vez o bem se projetou forte e verdadeiro, mostrando a todos os homens a responsabilidade que t�m para consigo
mesmos, para com o mundo t�o cheio de maldades, malqueren�as, ang�stias e desatinos e, principalmente, para com Deus. � preciso n�o deixar morrer a esperan�a de
um mundo melhor, mais humano, fraterno e espiritualizado. Se o homem continuar alimentando a leviandade de costumes negativos, preso em si mesmo pelo ego�smo e se
afundando em prazeres f�sicos desregrados, como bebidas, fumo, drogas, orgias sexuais e a ambi��o de tudo querer possuir mesmo que por meio da viol�ncia, em que
o mundo vai se transformar daqui a alguns poucos anos? O que o homem vai ver � sua volta? Os velhos ver�o com desilus�o a humanidade se digladiando para satisfazer
a cobi�a do dinheiro e do poder. As crian�as ver�o a perda da esperan�a de serem felizes e amadas em um mundo de amor e solidariedade. Os jovens se perder�o nos
pr�prios desatinos.
Ser crist�o, ser bom, n�o implica esquecer totalmente as satisfa��es do mundo material, � preciso apenas ser regrado, coerente, humano e saud�vel.
Pode-se auxiliar o pr�ximo sem que, com isso, seja necess�rio esquecer completamente de si mesmo. E pode-se lembrar de si mesmo sem que seja preciso se esquecer
do pr�ximo, porque somos um todo sem que deixemos de ser um.
N�o se pode ter vergonha de ser bom nem fingir que n�o temos necessidade de Deus em nossa vida. Necess�rio se faz construir o mundo do futuro, aquele onde os homens
ter�o consci�ncia de que o bem se faz aqui e a recompensa se dar� na vida depois de amanh�.
Armando e Selma aprendeu que nenhum ser vem ao mundo f�sico para aprender a ser amado, e sim para aprender a amar, respeitar e desejar para o pr�ximo o bem que deseja
para si.
Dentro dessa consci�ncia, arrependeram-se, perdoaram-se e a felicidade se fez em suas vidas.


Cap�tulo 22
A oportunidade de reajuste de L�o


L�o foi chamado para uma entrevista com o respons�vel pelo Departamento Reencarnat�rio. Durante todo o tempo em que estivera afastado de Orlando, em outro educand�rio,
aprendera muito sobre o significado do verdadeiro amor, o respeito que se deve ter para com o semelhante, enfim, aprendera sobre o que na verdade � a evolu��o.
Acalmara seu esp�rito e ansiava por nova oportunidade de aprendizado no planeta Terra. N�o se culpava mais, pois sabia que teria outra chance para reparar o mal
que causara �quela que tanto fizera sofrer. J� havia sido comunicado sobre a prova pela qual teria de passar e aceitara prontamente, confiante em que estava preparado
para vencer e n�o cair novamente nos mesmos erros do passado. Sabia que teria de enfrentar s�ria doen�a respirat�ria, conseq��ncia do seu enforcamento, mas n�o se
importava. O que realmente queria era reconciliar-se com C�ssia.
Assim que L�o chegou ao Departamento, encontrou-se com o respons�vel, que de imediato lhe perguntou:
- Acha-se preparado, L�o, para enfrentar a prova que voc� mesmo escolheu?
- Acredito que sim, meu irm�o.
- Chegar� a Terra por interm�dio de uma irm� que, assim que voc� nascer, vai abandon�-lo, com medo de enfrentar a sociedade como m�e solteira. Ela vai deix�-lo na
porta de um orfanato, onde permanecer� at� os tr�s anos. Voc� ser� uma crian�a muito doente e franzina, em raz�o das les�es do seu perisp�rito, e precisar� de s�rios
cuidados at� o �ltimo dia de sua perman�ncia na Terra. Assim que completar tr�s anos, se encontrar� com C�ssia, que visitando o orfanato junto com seu esposo, ficar�
encantada com voc�, sensibilizada com seus olhos tristes, e o levar� para sua casa adotando-o como filho. Voc� ser� amado por todos como filho verdadeiro
e, por meio desse amor recebido durante toda a sua vida, nascer� em voc� o sentimento do amor pleno, o reconhecimento do bem e da verdade. Voc� conhecer� Jesus pela
Doutrina Esp�rita, que seus futuros pais adotivos militam com sabedoria e prud�ncia. Essa encarna��o ser� a grande oportunidade do seu esp�rito se sensibilizar,
limpar seu cora��o do orgulho e ego�smo que sempre geraram em voc� atitudes desastrosas, levando-o a praticar desatinos, e aprender� a amar e respeitar seu semelhante.
Se souber levar sua vida dentro dos padr�es �ticos morais e espirituais, retornar� vitorioso, reconciliado com as leis divinas, com C�ssia e consigo mesmo.
- Quando vou poder retribuir a ela o bem recebido?
- Quando completar dezoito anos, C�ssia sofrer� de uma doen�a que a deixar� na cama por tempo longo, e ser� voc� quem cuidar� dela, retribuindo com amor o amor recebido.
Lembre-se, L�o, tudo depender� exclusivamente de voc�. Geralmente, o esp�rito permanece mais tempo na erraticidade. Foi-lhe concedido o retomo porque o Mais Alto
considerou ser �til para voc� seu encontro com C�ssia, portanto, n�o desperdice essa oportunidade recebida, fa�a de tudo para essa encarna��o dar certo.
- Tudo � pensado na espiritualidade, n�o?
- Tudo � pensado com o intuito de auxiliar aquele que parte, mas sempre depender� de cada um comemorar a vit�ria ou cair na derrota; conseq��ncias das escolhas que
fizer. Deus respeita o livre-arb�trio de cada um.


O esp�rito tem consci�ncia e previs�o do que lhe vai acontecer durante a vida?
Ele mesmo escolhe o g�nero de provas que deseja sofrer; nisso consiste o seu livre-arb�trio.
- Se o esp�rito escolhe o g�nero de provas que deve sofrer, todas as tubula��es da vida foram previstas e escolhidas por n�s?
Todas n�o � bem o termo, pois n�o se pode dizer que escolhestes e previstes tudo o que vos acontece no mundo, at� as menores coisas. Escolhestes o g�nero de provas,
os detalhes s�o conseq��ncias da posi��o escolhida e freq�entemente de vossas pr�prias a��es. Os detalhes nascem das circunst�ncias e da for�a das coisas. S� os
grandes acontecimentos, que influem no destino, est�o previstos.
(O Livro dos Esp�ritos, Cap. VI, Item V.)


- O que vai acontecer comigo agora? - perguntou L�o impaciente.
- Elimine sua ansiedade, L�o, pois n�o lhe far� bem. Agora o momento � de se comunicar com Jesus, deixar o esp�rito livre para se encontrar com nosso Divino Amigo.
Despe�a-se de seus amigos, pois amanh� ser� transportado para junto de sua m�e biol�gica e ligado ao corpo que lhe servir� de abrigo. Daqui a alguns meses abrir�
seus olhos no mundo f�sico. N�o tenha medo e n�o recue, tudo ser� feito para sua evolu��o.
Despedindo-se do orientador, L�o seguiu Tom�s, que o encaminhou at� onde se encontrava Jacob, Eneida e Orlando, com a finalidade de permitir-lhe despedir-se dos
amigos que tanto o ajudaram.
L�o acompanhava Tom�s sentindo-se apreensivo, com receio de n�o conseguir cumprir sua tarefa de evolu��o.
Assim que chegaram, todos vieram cumpriment�-lo e desejar sucesso na nova oportunidade que Jesus lhe concedia. Orlando foi o primeiro a se dirigir a ele:
- Ent�o quer dizer que vai ser meu neto posti�o, L�o? Isso me causa muita alegria. Sei que conseguir� vencer. Ter� ao seu lado um esp�rito valoroso que o ajudar�
na conquista das virtudes e nas horas de desalento ter� o suporte necess�rio para transpor as dificuldades que surgirem. Se me for permitido, acompanharei sua caminhada
inspirando-lhe a paci�ncia e lembrando-lhe que acima de n�s existe o ser da bondade. Que nosso Divino Amigo o acompanhe e proteja!
- Obrigado, Orlando, por sua compreens�o dos meus erros, por me aceitar e perdoar de cora��o, com sinceridade. Essa atitude me d� mais for�a e vontade de me transformar
em um ser do bem.
- Desejo-lhe o mesmo, L�o, sabedoria para fazer as escolhas certas, escolhas do bem e do amor. Que seus passos marquem definitivamente o que lhe vai ao cora��o.
- Obrigado, Eneida, cuide de mim para que eu possa acertar.
Jacob, mais experiente no tratamento daqueles que retornam a Terra, disse-lhe:
- L�o, o conhecimento da verdade nos torna seres mais alegres e mais felizes, porque nos d� condi��es de distinguir o bem do mal. E quem conhece a verdade abriga
Jesus no cora��o, e o Divino Amigo d� a paz que nos proporciona a felicidade que esperamos. Voc� conhece a verdade, sofreu para encontr�-la, portanto lute para que
nada o afaste dela. Tenta��es acontecer�o, e ter� de vencer as dificuldades por conta da enfermidade que enfrentar�, mas, se permitir a presen�a de Jesus em seu
cora��o, conquistar� a coragem que se far� necess�ria e a paz que vai adquirir pela transforma��o da sua alma, porque tudo se consegue por merecimento. L�o, emocionado,
disse a Jacob:
- Posso abra��-lo?
- Claro, meu irm�o!
- Abra�aram-se, despedindo-se temporariamente.
- Siga com Jesus, meu irm�o, todos estar�o enviando energia positiva para voc� e aguardando o reencontro que novamente se dar� no reino de Deus.
- Vamos, L�o - disse Tom�s.
- Estou pronto - respondeu L�o confiante.
Logo ao amanhecer do novo dia, L�o foi levado para junto daquela que seria sua m�e biol�gica.


A alma que n�o atingiu a perfei��o durante a vida corp�rea acaba de se depurar submetendo-se � prova de uma nova exist�ncia.
- Qual a finalidade da reencarna��o?
- Expia��o, melhoramento progressivo da humanidade. Sem isso, onde estaria a justi�a?
- Todos os esp�ritos tendem � perfei��o, e Deus lhes proporciona os meios de consegui-la com as provas da vida corp�rea. Mas, na sua justi�a, permite-lhes realizar,
em novas exist�ncias, aquilo que n�o puderam fazer ou acabar numa primeira prova.


A doutrina da reencarna��o, que consiste em admitir para o homem muitas exist�ncias sucessivas, � a �nica que corresponde � id�ia da justi�a de Deus com respeito
aos homens de condi��o moral inferior; a �nica que pode explicar o nosso futuro e fundamentar as nossas esperan�as, pois nos oferece os meios de resgatarmos os nossos
erros atrav�s de novas provas. A raz�o assim nos diz, e � o que os Esp�ritos nos ensinam.
Qual � aquele que, no fim de sua carreira, n�o lamenta ter adquirido demasiado tarde uma experi�ncia que j� n�o pode aproveitar? Pois esta experi�ncia tardia n�o
estar� perdida ele a aproveitar� numa nova exist�ncia.
(O Livro dos Esp�ritos, Cap. IV, Item II.)


Passados os meses necess�rios, L�o deu entrada no mundo f�sico trazendo plasmado em sua alma o desprezo de sua m�e, que se negando a ficar com a crian�a, em menos
de vinte e quatro horas o deixa enroladinho em um cobertor no port�o de um orfanato.
Ao ser resgatado por uma funcion�ria, ela percebeu de imediato a dificuldade para respirar do rec�m-nascido e levou-o ao m�dico, que constatou irregularidades em
seu sistema respirat�rio, deixando-o internado em um hospital municipal. Um m�s depois, deixando o hospital, foi levado ao orfanato onde carinhosamente recebeu o
nome de Bernardo. Ap�s incans�vel procura, sua m�e n�o fora encontrada. Iniciava-se, assim, a caminhada de L�o na sua nova exist�ncia na Terra. Esperaria, ao lado
de outras tantas crian�as cujas m�es as renegaram, pelo dia em que C�ssia o encontraria e abriria seus bra�os para aconcheg�-lo no amor materno.


Quantas mulheres sofrem a desilus�o de n�o poder ser m�es e realizar o desejo mais concreto e sublime que abrigamos em nosso cora��o, que � poder formar em nossas
entranhas um pedacinho de n�s, a continua��o de nossa vida, dando oportunidade para que Esp�ritos se introduzam no mundo terreno pela reencarna��o, para evolu�rem,
e conceber no mundo f�sico o ser que amamos e queremos junto de n�s?
Quantas mulheres, algumas sem causa aparente, n�o conseguem engravidar, consultando os mais variados m�dicos e ouvindo sempre a mesma resposta? Quanta dor e amargura
sentem essas irm�s, na frustra��o de n�o conseguirem realizar o sonho?
Por que ser� que isso acontece?! Por que algumas se realizam pela maternidade enquanto outras sofrem o desengano?
A resposta, meus irm�os, quando n�o a temos na vida presente, encontramo-la em outras reencarna��es: � a lei de causa e efeito. Deus � justo e s�bio, e toda a��o
provoca uma rea��o. Hoje sofremos pelos erros que n�s pr�prios cometemos em outra exist�ncia f�sica. � a lei de Deus, porque, se assim n�o fosse, Deus cometeria
injusti�a ao dar a alegria da maternidade a algumas e negar esta mesma alegria e felicidade a outras.
Mas, se Deus achou necess�rio que pass�ssemos por esta prova de n�o realizarmos o sonho de ser m�e, colocou tamb�m em nosso caminho oportunidades para que pud�ssemos
exercitar o ato de amor. Quantas m�es sem filhos, e quantos filhos sem m�es! Quantas crian�as ansiando por um lar, um colo protetor, uma repreens�o de amor, algu�m
que esteja sempre ao seu lado durante sua trajet�ria na Terra!
Por que n�o trazer para n�s estas crian�as que nos pedem um lar? Por que n�o adotar uma crian�a, quando o cora��o anseia por um filho? Ser� que somos t�o pequenos
que nos tornamos incapazes de transformar nosso cora��o em �tero e receber o filho do amor que transcende, transformando-o pelos la�os sagrados da fraternidade e
do instinto maternal em nosso filho verdadeiro?
N�o sabemos se a crian�a que chega at� n�s pedindo um lar, uma fam�lia para que se fa�a o alicerce que a conduzir� na vida terrena, n�o foi, em outra exist�ncia,
algu�m muito querido nosso; algu�m a quem prejudicamos ou mesmo um filho que matamos pelo aborto e que retorna aos nossos bra�os atrav�s da caridade que podemos
fazer.
Quantos lares vazios e quantas crian�as sem lar!
Quantos sonhos acalentados nesses cora��ezinhos abandonados podemos realizar, se abrirmos nosso cora��o para o amor ao pr�ximo! Quanta felicidade para n�s e para
os pequenos seres que anseiam por existirem dignamente!
Muitos sentem medo por acreditarem que poder�o sofrer com os filhos adotivos, e n�o querem ter problemas. Outros, se j� sofrem, julgam que se fossem filhos biol�gicos
isto n�o aconteceria. Engano, meus irm�os, puro engano. O sofrimento que porventura acontecer estar� apenas seguindo o seu curso normal de resgate e evolu��o.
Os compromissos que assumimos com nossos irm�os, mais cedo ou mais tarde ser�o cobrados, para que a evolu��o espiritual se processe. N�o se pode evoluir na espiritualidade
deixando velhas contas para tr�s. Tudo precisa ser reajustado para que nossos inimigos de outrora se transformem em nossos amigos de hoje. Somente assim estaremos
livres para prosseguirmos na nossa caminhada em dire��o a Cristo.
N�o tenham medo de serem bons; n�o sintam vergonha de amar, de aconchegar em seus bra�os os filhos que, por interm�dio de outras irm�s, Deus enviou a voc�s.
O que realmente temos de nosso, o que nos pertence verdadeiramente s�o nossos sentimentos. � a nossa capacidade de nos desprender do eu para nos dedicar ao n�s.
Necess�rio se faz levantar a bandeira do bem t�o alto para que nenhum mal possa alcan��-la.
(Falando de amor, Irm�o Ivo.)


Filho Adotivo
Estou s�.
Sinto no peito o amargor da solid�o.
Quero sentir junto �s minhas
O calor de tuas m�ozinhas quentes e macias,
Transmitindo-me confian�a e uni�o.
Sei que n�o nascestes de mim,
Do meu �tero, mas vive dentro do meu cora��o.
Es meu, porque �s filho do meu Esp�rito,
E do meu amor.
Preciso de ti mais do que precisas de mim.
Adotivo... N�o, verdadeiro,
Como verdadeira � essa alegria,
De estreitar-te em meus bra�os,
Apertar-te em meu peito
E agradecer a Deus por teres vindo at� onde estou,
Para que n�s, M�e e filho,
Nos torn�ssemos apenas... Um!
(S�nia Tozzi.)


Todo sacrif�cio pessoal, tendo em vista o bem e sem qualquer id�ia ego�sta, eleva o homem acima da sua condi��o material. (Alan Kardec.)


Cap�tulo 23
Um ato de amor: a ado��o


Algazarra de J�nior e Roberto, que todos chamavam carinhosamente de Betinho, enchia a casa de Antonieta de vida e alegria. Brincavam com o entusiasmo de seus poucos
anos, deixando as duas av�s e seus pais felizes e agradecidos a Deus pela vida venturosa que levavam.
C�ssia entrou na sala trazendo em seu colo Maur�cio, o ca�ula, que apenas iniciava seus primeiros passos.
- Crian�as, com essa algazarra toda acordaram seu irm�o. Por que n�o brincam no jardim?
Cada um pegou o que lhe interessava e foi correndo para fora de casa brincar no gramado.
- M�e, �s vezes nem acredito que realizei meu sonho, que tenho ao meu lado tr�s filhos saud�veis, felizes e um marido digno que me ama.
- �, filha, os sofrimentos n�o s�o eternos, um dia eles acabam e aquele que for s�bio aproveita a tr�gua e constr�i nova hist�ria. � preciso saber aproveitar as
oportunidades que Deus nos envia, sair da auto-compaix�o, somente assim ressurgiremos das cinzas da dor.
Antonieta pensou e concluiu:
- C�ssia, h� algum tempo ouvi no Centro Esp�rita uma palestra cujo palestrante dizia o seguinte:
"Certa vez, um bom homem ganhou uma muda de planta bem tenra e verdinha de um amigo querido. Com todo o cuidado, levou a plantinha para casa.
Preparou o terreno arando uma parte do canteiro, adubou devidamente e s� depois de bem umedecido colocou a plantinha no solo. Para garantir que ela ficaria firme,
fincou um cabo de vassoura para servir de apoio.
Diariamente, regava com carinho a sua planta, mas, apesar de sua aten��o, a planta morreu depois de algum tempo.
Dias depois, passando pelo jardim, o homem lan�ou um olhar despretensioso para o local e teve uma grande surpresa: o cabo de vassoura tinha brotado!"
Agora eu pergunto a voc�, minha filha. Quem � voc�: a plantinha que n�o soube aproveitar tudo o que lhe fora ofertado ou o cabo de vassoura, que oportunamente aproveitou
a fertilidade e umidade do solo para ressurgir? Vejo-a como o cabo de vassoura, C�ssia. Voc� aproveitou o sofrimento e cresceu por meio da dor, fortaleceu-se e construiu
uma nova edifica��o com a pessoa que Jesus colocou em seu caminho e, por conta disso, da sua f� e por acreditar que sempre podemos ser felizes, visto que nenhum
sofrimento dura para sempre, fez a op��o mais acertada e hoje agasalha em seu bra�os os frutos do seu sonho.
- � m�e, em algum momento deixei de acreditar que tudo daria certo para mim, mas a chegada de Frank em minha vida fez renascer a certeza de que eu poderia ser feliz
novamente. Hoje, quando observo meus tr�s filhos t�o lindos, saud�veis e que me trazem tanta alegria, confesso � senhora que sinto at� vontade de ter outro filho.
- Ouvi a palavra engravidar? - disse Frank, aproximando-se.
- N�o, eu n�o disse a palavra engravidar - explicou C�ssia. Eu disse ter outro filho.
- N�o � a mesma coisa? - perguntou Frank.
- N�o, meu amor, n�o � a mesma coisa, pelo menos para mim.
- O que quer dizer, C�ssia?
- Quero dizer que sinto dentro de mim um forte desejo de adotar uma crian�a. O que voc� acha?
- Querida, apoio tudo o que deseja fazer, apenas acho que nosso ca�ula � ainda muito nova, tem apenas um ano. Seria uma tarefa �rdua cuidar de duas crian�as pequenas.
- Frank, n�o tenho a inten��o de adotar um beb�. Gostaria que fosse uma crian�a um pouco maior, mais ou menos com tr�s ou quatro anos.
Antonieta e Frank se espantaram.
- O que voc� est� dizendo, minha filha? - perguntou Antonieta. - Por que isso agora?
- M�e, pode parecer loucura, mas de uns tempos para c� tenho pensado muito nessa possibilidade.
- De onde vem esse s�bito desejo de adotar outra crian�a, C�ssia, nossos tr�s filhos n�o a satisfazem? - perguntou Frank.
- Meu amor, � �bvio que me satisfazem e s� me d�o alegria e prazer; mas � por isso mesmo que penso em adotar.
- N�o estou lhe entendendo, C�ssia, desculpe-me, mas n�o vejo rela��o alguma.
- Frank, nossos filhos s�o saud�veis, bonitos, inteligentes. Damos a eles tudo o que necessitam para terem uma vida equilibrada e prazerosa. Entretanto, penso em
quantas crian�as vivem em abandono, sem carinho maternal, sem uma cama sua, sem nada seu de verdade. A maneira que encontro de agradecer a tantas b�n��os que recebemos
de Deus � contribuir com um gr�o de areia na imensid�o do mar e proporcionar a uma crian�a a realiza��o de seu sonho. Voc�, mais do que ningu�m, Frank, deve saber
o que � ser filho do cora��o generoso de algu�m.
Antonieta e Frank olharam-se admirados com as palavras caridosas de C�ssia.
- Voc� � mesmo muito especial, C�ssia, e eu a amo cada dia mais pelo seu cora��o generoso.
- Eu tamb�m o amo, Frank, e agrade�o o seu apoio.
- Como e quando voc� pretende tomar essa atitude, C�ssia? - perguntou Antonieta.
- Estive pensando em ir at� o orfanato da cidade vizinha. Sei que l� est�o muitas crian�as � espera de pais. Se voc�s concordarem, poderemos ir ao pr�ximo domingo.
O que acham?
- Est� certo, meu amor, iremos todos no domingo.
- E voc�, Sabina, at� agora n�o disse nada sobre o que acha.
- O que poderia dizer C�ssia, sen�o que pode contar comigo para o que precisar? Ajudarei como sempre fiz, a cuidar das crian�as, e n�o existir� no meu cora��o diferen�a
alguma entre elas.
- Sabia que podia contar com voc�, minha querida amiga, m�e e sogra!
- Sempre poder� contar comigo, C�ssia, seja para o que for.
Orlando, que tudo presenciara ao lado de Jacob e Eneida, disse:
- Jacob, esse desejo de C�ssia de adotar uma crian�a nasceu de uma inspira��o do Mais Alto?
- Sim, Orlando, � chegado o momento de se cumprir o que foi estabelecido. Bernardo j� completou tr�s anos e � hora do seu encontro com C�ssia.
- E se ela n�o se agradar dele e quiser outra crian�a, o que poder� acontecer?
- Orlando, espere e ver�. C�ssia � um esp�rito nobre, sens�vel e disposto a praticar o bem. Ao se encontrar com Bernardo, seu cora��o vai sentir, por meio da nossa
inspira��o, que ele � a crian�a destinada a ela, e o previsto acontecer�.
"O que necessitamos fazer � inspirar os encarnados, guiando-os para o bem. A humanidade est� se perdendo. As pessoas procuram e pedem a paz e, no entanto, esquecem-se
de reavaliar suas posturas diante da vida e perante Deus. Desejam a paz e iniciam guerras; desejam a paz e fecham os olhos para a mis�ria que atinge tantos irm�os;
jamais a humanidade ter� paz se cada um dos encarnados continuar permitindo que sua vida gire em torno da satisfa��o dos pr�prios desejos. Os homens gostam do brilho
da opul�ncia terrena, brilho esse que se apaga assim que seus olhos se fecham para a mat�ria e se abrem para a espiritualidade. Somente quando o bem e o amor se
instalarem na Terra definitivamente, como os sentimentos maiores da alma humana, os encarnados poder�o usufruir da paz que tanto almejam. Antes de isso acontecer,
ter�o de amargar a dor de sua pr�pria imprud�ncia ao abrigar em seus cora��es o orgulho e o ego�smo como senhores absolutos.
- Essa � a tarefa dos bons esp�ritos: inspirar os homens sempre na dire��o do bem.
- Isso mesmo, Orlando. Algumas, como C�ssia, s�o alunos f�ceis porque j� trazem no cora��o a marca da bondade. Entretanto, outros se tornam portas fechadas dif�ceis
de abrir, e Jesus n�o arromba o cora��o de ningu�m, espera sempre ser convidado.
- � o respeito ao livre-arb�trio, n�o � mesmo, Jacob?
- Sim. Praticar o bem, Orlando, � colocar em movimento as for�as da alma, dizem nossos mestres. S�bio � aquele que consegue entender isso.
No orfanato, Bernardo seguia seus dias sem nenhum entusiasmo. Era uma crian�a triste, quase n�o falava, agia como se nada importasse. Estava sempre isolado das outras
crian�as, com os olhinhos infantis perdidos ao longe, passando a impress�o de estar � espera que alguma coisa acontecesse e desse a ele motivo para sorrir.
Dificilmente se misturava com as outras crian�as, e sempre recusava o convite para brincar. Sua prefer�ncia era estar sempre s�.
- O comportamento de Bernardo n�o condiz com o de uma crian�a de apenas tr�s anos - diziam as funcion�rias do orfanato.
- Talvez seja porque est� sempre doente.
- � verdade, est� sempre precisando de interna��o no hospital, e isso deve deix�-lo estressado.
- Tenho um carinho muito grande por ele - dizia outra. - D�i meu cora��o ver uma crian�a assim t�o ap�tica. N�o � comum.
- O que mais me entristece � saber que ser� muito dif�cil conseguir uma fam�lia para adot�-lo. J� est� crescidinho, n�o possui boa sa�de e tem dificuldade para se
comunicar.
- Concordo com voc�, n�o vai ser f�cil. Provavelmente, passar� toda a sua inf�ncia aqui e, ao chegar � idade adulta, s� Deus sabe o que poder� acontecer.
- O que podemos fazer, por enquanto, � trat�-lo com carinho. Se ele se sentir seguro afetivamente, pode ser que modifique seu comportamento.
Afastaram-se, dando uma �ltima olhada na dire��o de Bernardo, que se distra�a com um pequeno carrinho.

***

O domingo t�o esperado por C�ssia finalmente chegou. Animada, arrumou as crian�as, que se divertiam, dizendo que iam "comprar" um irm�ozinho.
- Filhos, cheguem aqui perto da mam�e.
Aos trope�os, J�nior e Betinho correram derrubando Maur�cio, que nos seus passos ainda vacilantes n�o conseguia acompanhar os irm�os. Frank correu a levant�-lo,
entregando-o a C�ssia, que carinhosamente o abra�ou, colocando-o em seu colo. Beijando seus olhinhos �midos, disse-lhe:
- N�o chore meu amor, j� passou. Fique aqui no colinho da mam�e.
- N�s j� vamos comprar nosso irm�ozinho, mam�e? - perguntou J�nior. - Eu quero escolher, t� bom?
- Filho, voc� � Betinho j� t�m condi��es de entender o que a mam�e vai explicar para voc�s.
Interessado, Betinho respondeu:
- Pode falar mam�e.
- N�s n�o vamos comprar um irm�ozinho para voc�s.
- N�o? - exclamaram juntos J�nior e Betinho. - Por qu�?
- Porque n�o se compra pessoas. As pessoas que amamos n�s as trazemos para perto de n�s. N�s vamos buscar o irm�ozinho que Jesus deixou em outro lugar, mas que vai
fazer parte da nossa fam�lia, mesmo n�o nascendo da barriga da mam�e, como voc�s.
- Como Jesus sabia que voc� ia busc�-lo?
- Porque Jesus sabe de todas as coisas, conhece todos n�s, confiou na mam�e, no papai, em voc�s e nas duas vov�s. Sabe que iremos am�-lo muito, que ele ser� de verdade
um irm�ozinho para voc�s, e � como tal que devem trat�-lo.
- Eu gosto dele - disse Betinho entusiasmado.
- Eu tamb�m, seu bobo, pensa que � s� voc� que gosta dele?
Maur�cio, encostadinho no peito de sua m�e, adormeceu alheio a tudo o que falavam.
- Ele j� vem hoje mesmo conosco, mam�e?
- N�o, hoje n�o. Ainda demora um pouco.
- Por qu�?
- Hoje mam�e vai conhec�-lo e sentir se ele tamb�m gosta de n�s. Depois, o papai e a mam�e v�o conversar com as pessoas respons�veis por ele. Somente quando o juiz
considerar que est� tudo bem ele vir� morar conosco. Isso vai demorar um pouco, � preciso ter paci�ncia.
Desapontado, J�nior disse:
- Que pena, pensei que quando a gente voltasse eu ia poder jogar bola com ele.
C�ssia e Frank acharam gra�a da ingenuidade do filho.
- Voc� vai poder jogar muita bola com ele, mas no momento certo, quando tudo estiver legalmente resolvido. Demora um pouquinho, filho, o tempo necess�rio para que
todas as provid�ncias sejam tomadas. Precisamos arrumar um quarto para ele, voc�s n�o acham?
- Vou dar meu carrinho para ele, tenho muitos - exclamou Betinho.
- Jesus fica feliz de ouvi-lo falar assim, filho, mam�e e papai tamb�m.
- Eu tamb�m, mam�e, vou dar uns brinquedos para ele - disse J�nior n�o querendo ficar para tr�s.
- Que bom, filho, Jesus est� contente com voc� tamb�m - respondeu C�ssia sorrindo.


Cap�tulo 24
O reconhecimento das almas


Orlando se sentia feliz ao ver sua querida filha t�o equilibrada e consciente da miss�o que cada um traz para cumprir na Terra. Era um esp�rito valoroso, forte,
confiava nas inspira��es benfazejas que sentia e trazia em seu cora��o a certeza de que todo o bem vem de Deus. Acreditava na bondade divina e, em vista disso, n�o
se amedrontava diante das dificuldades que aparecem na vida d� todos os encarnados, inclusive na sua pr�pria.
- Mas nem sempre ela foi assim, Jacob - dizia ao seu amigo.
- � verdade, Orlando, mas s�bio � aquele que se fortalece com os tombos e as afli��es que a vida lhe causa. C�ssia aprendeu a tirar a mensagem contida nesses obst�culos,
cresceu e se firmou como verdadeira criatura de Deus. Hoje, acalenta a caridade e o amor ao pr�ximo em seu cora��o. Felizes aqueles que trabalham em nome de Jesus
com desinteresse e sem outro motivo sen�o o de auxiliar o pr�ximo.
- Tudo o que se quer ensinar ao semelhante precisa, antes ser bem aprendido e exercitado para que o outro aprenda pelo exemplo - disse Orlando.
- Tem raz�o, Orlando. � preciso saber perdoar para falar de perd�o ao semelhante. Aquele que busca a paz interior precisa aprender a calar em seu cora��o a inveja
e a disc�rdia para que a paz flores�a, fruto do amor na sua express�o mais pura.
- Esses aprendizados, essa evolu��o, s� podemos conseguir com a reencarna��o, n�o � assim, Jacob? Viver novamente situa��es que poder�o abrir os nossos olhos para
a verdade?
- Orlando, a reencarna��o est� fundamentada na incontest�vel justi�a de Deus, que nos concede nova oportunidade para resgatar nossas d�vidas, saldar os compromissos
assumidos com o mundo espiritual, enfim, desculpar-nos perante as pessoas que de maneira imprudente prejudicamos no pret�rito.
"Todos os nossos atos praticados por pensamentos, palavras e obras, em vidas anteriores, acarretam para n�s venturas ou desgra�as, na propor��o do bem ou do mal
que deles resultou. Portanto, seus efeitos v�o atuar posteriormente na felicidade, na vontade, nos desejos ou no car�ter do homem em vidas futuras. Esta � a lei
do carma, o que quer dizer a lei de causa e efeito".
"Quanto mais elevado se torna o esp�rito, menores se tornam suas necessidades materiais. Os seus desejos se tornam menos grosseiros, a sua purifica��o reflete-se
na sua perfei��o moral, nos seus sentimentos cada vez mais puros e mais fraternos. Se sabemos que estamos aqui para depurar o nosso esp�rito; se temos consci�ncia
de encontrar em nosso caminho pessoas a quem, de uma forma ou de outra, devemos alguma coisa, vamos procurar ser mais pacientes, mais generosos, mais compreensivos
e solid�rios com o pr�ximo".
"O importante", concluiu Jacob, "� viver de uma maneira em que n�o tenhamos medo de encarar a morte, porque acreditamos na vida futura e sabemos que para o homem
de bem o despertar � sempre tranq�ilo. A vida que nos espera no mundo espiritual � conseq��ncia da vida que constru�mos aqui na Terra".
- Vai ser importante para L�o a conviv�ncia com C�ssia; estar ao lado dela, receber seu carinho e amor maternal. Isso acalmar� seu esp�rito?
- Sem sombra de d�vida, Orlando. Voc� presenciou a ang�stia dele, o desejo de retornar e dar a ela o amor que negou no passado. Agora s� depender� de ele cumprir
ou n�o o seu prop�sito.
- C�ssia o ajudar� e lhe dar� o suporte necess�rio para sair vitorioso.
- Vamos, agora, acompanh�-los at� o orfanato.
Assim que o carro de Frank parou em frente ao casar�o quase que totalmente encoberto com frondosas �rvores e imensos jardins, puderam ouvir o som das vozes infantis
e as risadas que cortavam os ares.
- Que lugar agrad�vel! - disse Sabina. - Muito bem cuidado.
- Tem raz�o, muito bonito o lugar - concordou Antonieta, que, segurando Maur�cio no colo, deu-lhe um beijo e completou.
- � uma pena que a beleza seja somente exterior. L� dentro deve existir a solid�o, mesmo em meio a tantas risadas.
- O que est� dizendo, Antonieta? - perguntou Sabina.
- Estou dizendo que, por mais que se fa�a para compensar a indiferen�a em que vivem essas crian�as, ela sempre existir�. Sabe por que, Sabina? Porque o sentimento
de abandono est� dentro do cora��o de cada um desses pequenos �rf�os, a maioria deles com pais vivos.
- Vamos ver as coisas pelo lado melhor, m�e - disse C�ssia.
- Sempre existe quem seja sens�vel ao sorriso ou � l�grima de uma crian�a. Este orfanato � muito bem conduzido. S�o pessoas capacitadas para oferecer aos menores
o suporte que precisam para administrarem melhor sua posi��o na sociedade. As informa��es foram �s melhores. As pessoas de boa vontade acabam fazendo o que podem
m�e. Mas � verdade que tirar de dentro de si a m�goa por ter sido desprezado pelos pais ou pela fam�lia � uma tarefa que cabe a cada um.
- Vamos tocar a campainha - disse Frank.
Uma senhora simp�tica, de apar�ncia amistosa, abriu a porta e, sabendo das inten��es do casal, convidou-os a entrar.
- Fiquem � vontade - disse. - Vou chamar nossa diretora para atend�-los.
Assim que entraram na sala de espera, repararam na simplicidade do ambiente e na limpeza impec�vel. Apenas alguns objetos decorativos, algumas plantas e um painel
que exibia desenhos feitos pelas crian�as.
- Realmente � um lugar agrad�vel, percebe-se no esmero com o qual as coisas s�o cuidadas - disse Frank.
C�ssia ia responder quando foi interrompida com a chegada da diretora.
- Muito prazer! - disse dona Jussara. - Sou a diretora do orfanato e tenho muito prazer em receb�-los. Espero que fiquem � vontade. Em que posso ser �til?
C�ssia, adiantando-se aos demais, respondeu:
- Dona Jussara, eu e meu marido estamos com a inten��o de adotar uma crian�a e fomos informados sobre este orfanato. Gostar�amos que a senhora nos desse informa��es
sobre o procedimento nesse caso. Por onde devemos come�ar, enfim, o que devemos fazer?
Jussara olhou-os de cima a baixo.
- Vejo que o casal j� tem filhos, estou certa?
- Est�. S�o nossos filhos, J�nior, Roberto e Maur�cio. Este � Frank, meu marido, minha m�e e minha sogra.
- Possuem uma bela fam�lia, filhos lindos.
- Obrigada.
- Mas diga-me o que a faz querer adotar uma crian�a, se j� possui tr�s filhos? N�o acha suficientes os que j� t�m? O senhor concorda com sua esposa?
- Claro, quero tanto quanto ela, senhora.
- Desculpem-me questionar, mas � dif�cil aparecer casais com filhos, principalmente tr�s, querendo adotar mais um. Geralmente, s�o casais que, por algum motivo,
a esposa n�o consegue engravidar.
- Entendemos sua estranheza, dona Jussara, mas achamos que podemos amar tanto quanto os nossos o filho que vier pelo cora��o - respondeu C�ssia.
- E n�s tamb�m estamos ansiosas para abra�ar outro netinho - disse Sabina.
- Ela tem raz�o, estamos mesmo - reafirmou Antonieta.
- Desculpem-me mais uma vez, mas estou realmente impressionada com a certeza com que falam a respeito. Noto que � uma decis�o bem pensada, e � assim que deve ser.
- Podemos conhecer o orfanato?
- Claro que sim - respondeu Jussara. - Gostaria, em primeiro lugar, que preenchesse uma ficha com os dados da crian�a que desejam, provavelmente um beb�, claro,
saud�vel, etc. Depois vamos ver se temos alguma que preenche os requisitos que os candidatos exigem.
C�ssia notou certo ar de cinismo na voz de Jussara. N�o gostando do que ouviu, respondeu em seguida:
- Dona Jussara, compreendo que a senhora deva estar acostumada com pessoas que n�o querem um filho, e sim algu�m para preencher um vazio em sua vida, algu�m que
possam exibir para a fam�lia, os amigos e que prove para os outros o quanto s�o generosas. Mas esse n�o � o nosso caso. N�s n�o vamos preencher a ficha de aspecto
f�sico, de apar�ncia, porque isso n�o nos importa. Estamos falando de pessoas, e n�o de bonecos. N�s queremos um filho, e que ele tenha a apar�ncia que tiver, porque
o que vai importar � a afinidade que iremos sentir um com o outro. A senhora me desculpe, mas gosto de expor meus sentimentos.
- Nada tenho que desculpar - disse Jussara. - Ao contr�rio, sinto em voc�s o desejo verdadeiro, aquele que coloca o amor em primeiro lugar, que n�o escolhe, mas
aceita a crian�a como ela �. Feliz a crian�a que ser� escolhida, ter� um verdadeiro lar com pais de verdade.
- Podemos ir at� o p�tio? - perguntou Antonieta um pouco impaciente.
- Claro, depois conversaremos.
Jussara os conduziu at� onde as crian�as brincavam.
C�ssia acompanhava com o maior cuidado, olhando com aten��o cada detalhe. Seu cora��o bondoso procurava com os olhos aquela crian�a que tinha certeza que Jesus iria
colocar no seio de sua fam�lia.
A verdadeira caridade ensinada por Jesus n�o consiste somente em dar esmolas, n�o � s� isso que Deus exige de n�s, mas tamb�m a nossa benevol�ncia concedida sempre
e em todas as coisas ao nosso pr�ximo.
C�ssia adquirira a consci�ncia de que a verdadeira caridade se faz sem humilhar aquele que recebe o benef�cio, e julgava-se preparada para se doar inteira �quele
que, sentia, chegaria at� ela por algum motivo que desconhecia, mas sabia que existia. Aprendera que deixar de praticar o bem � um grande mal, e lutaria enquanto
pudesse para que as crian�as que pouco ou nada tinham se tornassem homens de bem, em vez de pequenos marginais. Por isso dedicava-se a ensinar para as crian�as do
projeto o Evangelho de Jesus.


Vicente de Paulo, com toda sua bondade, humildade e sabedoria, certa feita disse: "Homens de bem, de boa e forte vontade, uni-vos para continuar amplamente a obra
de propaga��o da caridade; encontrareis a recompensa dessa virtude no seu pr�prio exerc�cio; n�o h� alegria espiritual que ela n�o d� desde a vida presente. Sede
unidos; amai-vos uns aos outros segundo os preceitos do Cristo. Assim seja.


J�nior e Betinho uniram-se �s crian�as que jogavam bola, correndo e sorrindo em meio �queles pequenos que s� tinham como divertimento a boneca e a bola.
C�ssia procurava avidamente entre tantas pela �nica que lhe interessava, aquela que acreditava que iria se aproximar dela trazendo-lhe de alguma forma um sinal.
De repente, avistou um garotinho sentado em um banco, sozinho e segurando nas m�os um pequeno livro de figuras coloridas. Instintivamente, dirigiu-se a ele, sendo
acompanhada por Jussara e Frank.
Ao se aproximar, parou diante da crian�a e lhe disse:
- Ol�, como voc� se chama?
Antes que Bernardo respondesse, Jussara falou para C�ssia:
- N�o espere resposta, ele � muito fechado em si mesmo, quase n�o fala e n�o consegue se relacionar com ningu�m.
- Existe algum motivo especial para ele se comportar assim?
- N�o sei se isso � motivo, mas ele sofre de uma enfermidade respirat�ria que o prende na cama com assiduidade. Precisa de cuidados especiais, tem uma sa�de muito
prec�ria.
- Os seus pais, onde est�o?
- Ningu�m sabe. Foi deixado aqui no port�o do orfanato com apenas um dia de vida. Ningu�m conseguiu encontrar sua m�e ou algu�m da fam�lia; e nunca recebeu uma visita
sequer. Isso foi h� tr�s anos. Desde ent�o, tornou-se o mascote do orfanato, e at� as outras crian�as cuidam dele. Recebe todo carinho e aten��o, mas infelizmente
n�o conseguimos modificar sua maneira de agir. Quase nunca sorri e tem sempre essa fei��o de tristeza no rosto.
C�ssia pensou: "E esse. Tenho certeza de que � esse o meu filho".
Colocou-se bem na sua frente e, abrindo os bra�os, o chamou:
- Bernardo venha me dar um abra�o!
Para a surpresa de Jussara, Bernardo levantou e colocou seus bracinhos ao redor do pesco�o de C�ssia, dando-lhe um gostoso abra�o, que foi carinhosamente retribu�do.
- Bernardo, voc� gostou dessa tia? - perguntou Jussara.
Bernardo respondeu balan�ando afirmativamente sua cabecinha.
- � incr�vel - disse Jussara, realmente impressionada. - � a primeira vez, em tr�s anos, que vejo Bernardo tomar essa atitude.
- Dona Jussara, acho que encontrei o filho que procurava! - exclamou C�ssia.
- Voc� tem certeza? Quer mesmo depois do que lhe contei? Caso contr�rio, n�o crie ilus�o na cabecinha dele, n�o o fa�a sofrer mais.
C�ssia olhou para Frank e perguntou:
- Amor, o que voc� acha?
- C�ssia, quero o que voc� quiser. Se acha que � esse o nosso filho, n�o se discute, ele ser� o nosso filho.
- Aproxime-se dele, Frank, vamos ver sua rea��o.
Frank aproximou-se dizendo:
- Bernardo, tamb�m quero ganhar um abra�o seu. Pode me dar?
Abriu os bra�os e esperou. Bernardo repetiu o mesmo gesto que fez com C�ssia. Levantou-se e abra�ou Frank, transmitindo-lhe todo o carinho que estava disposto a
dar.
Ao fazerem men��o de se retirar, Bernardo levantou-se novamente e, segurando as m�os de C�ssia e Frank, acompanhou-os.
- Mal posso acreditar no que estou presenciando - dizia Jussara, realmente impressionada.
- Dona Jussara, gostaria que a senhora tomasse as provid�ncias cab�veis para que possamos adot�-lo como nosso filho.
- O senhor deve saber que demora um pouco at� que saia a ado��o definitiva, mas podem vir v�-lo sempre que quiserem. Seria bom que viessem, assim tanto voc�s quanto
ele iria se adaptando � nova situa��o. Traga as crian�as, para que elas se entrosem tamb�m.
- Poderemos lev�-lo para casa?
- Por enquanto n�o, mas logo o juiz dar� autoriza��o para que ele passe o fim de semana com voc�s, at� que o levem definitivamente. Permitem que eu fa�a um coment�rio?
- perguntou Jussara.
- Claro, o que quiser.
- Sou diretora deste orfanato h� muito anos e, sendo absolutamente sincera, nunca vi uma ado��o acontecer dessa maneira. � incr�vel como houve afinidade de ambas
as partes. Voc�s passam a certeza de que realmente querem um filho para amar, cuidar e transformar em um homem de bem, n�o para superar depress�o ou m�goa. Que Jesus
aben�oe a sua fam�lia, que ir� aumentar em n�mero e em felicidade.
- Dona Jussara, n�s j� recebemos as b�n��os de Jesus. Temos filhos saud�veis, vivemos com nossa m�e em perfeita harmonia. Por que n�o proporcionar a outras crian�as
a oportunidade de ter um lar? A felicidade, quando compartilhada, aumenta cada vez mais, e � nisso que acreditamos.
Foram interrompidos pelos gritos de J�nior e Betinho, que chegaram ofegantes e trazendo Bernardo pelas m�os.
- Mam�e, � ele que vai ser nosso irm�ozinho?
- �, filho, � ele.
- Ele vai hoje para nossa casa?
- Hoje n�o, filho, mas logo vamos poder lev�-lo conosco para sempre. Voc�s est�o contentes?
- Muito, mam�e - respondeu J�nior.
- Eu tamb�m estou muito contente, mam�e - falou Betinho.
- Como a mam�e falou, viu que irm�ozinho bonito Jesus mandou para voc�s?
- S� o Maur�cio n�o o conhece, n�o para de dormir...
- Ele ainda � muito pequeno. Agora tenho tr�s para me ajudar a tomar conta do Maur�cio e ensinar muitas coisas legais a ele.
- Eu vou ajudar!
- Eu tamb�m!
- Fala que voc� tamb�m vai ajudar Bernardo, nossa m�e precisa de ajuda - falou J�nior.
Ap�s ficar em sil�ncio por alguns instantes, Bernardo respondeu:
- Eu tamb�m - deixando Jussara cada vez mais surpresa.
Aproximando-se de Antonieta e Sabina, disse-lhes:
- Penso que essa � uma ado��o programada por Deus. N�o � poss�vel uma afinidade t�o grande entre todos! Em se tratando de Bernardo, fico ainda mais surpresa, pois
o conhe�o o suficiente para esperar outra rea��o que n�o essa.
- Como dizem por a�, dona Jussara, h� mais mist�rios entre o c�u e a Terra do que cr� a nossa v� filosofia.
- A senhora tem raz�o. Deus coloca suas criaturas nos lugares certos para que haja a evolu��o de cada um.


Deus criou os esp�ritos simples e ignorantes, ou seja, sem conhecimento. Deu a cada um deles uma miss�o, com o fim de esclarec�-los e progressivamente conduzir �
perfei��o, pelo conhecimento da verdade e para aproxim�-los Dele. A felicidade eterna e sem perturba��es, eles a encontrar�o nessa perfei��o. Os esp�ritos adquirem
o conhecimento passando pelas provas que Deus lhes imp�e. Uns aceitam essas provas com submiss�o e chegam mais prontamente ao seu destino; outros n�o conseguem sofr�-las
sem lamenta��o, e assim permanecem, por sua culpa, distanciados da perfei��o e da felicidade prometida.
(O Livro dos Esp�ritos, Cap. I, Segundo Livro, Item 115.)


Despediram-se de Bernardo prometendo-o que viriam v�-lo sempre aos domingos at� que pudessem lev�-lo para casa. Bernardo ouviu-os colocando novamente a tristeza
em seus olhinhos. C�ssia, percebendo, disse-lhe carinhosa:
- N�o fique triste, pode esperar que logo voc� estar� indo para sempre para sua casa.
Beijou-o despedindo-se.
Ao v�-los sair, Jussara aconchegou Bernardo em seus bra�os e lhe disse:
- Pode ficar feliz, voc� acaba de ganhar uma fam�lia. Creio que n�o ir� demorar muito para ir com eles. Voc� quer ir morar com eles, n�o quer?
Bernardo balan�ou a cabecinha afirmativamente.
- Ent�o tenha um pouquinho de paci�ncia e aguarde. Vou pedir para que tudo saia o mais r�pido poss�vel, est� bem?
Novamente Bernardo balan�ou a cabe�a.
Jussara sorriu e deu--lhe um beijo.


Cap�tulo 25
A chegada de Bernardo ao lar


Para todos da casa de C�ssia os dias pareciam longos, tamanha era a ansiedade em receber Bernardo. C�ssia e Frank tomavam todas as provid�ncias para a arruma��o
do quarto; queriam que tudo ficasse de acordo com o quarto dos outros filhos.
- Nenhuma diferen�a deve ser feita - dizia C�ssia. - Vamos trat�-lo da mesma maneira e com o mesmo carinho com que tratamos J�nior, Roberto e Maur�cio. Quero que
fique bem claro que ele � tamb�m nosso filho, n�o importa se est� chegando agora, quero para ele o mesmo bem que quero para os outros.
- Fique tranq�ila, minha filha - dizia Antonieta. - Claro que todos v�o trat�-lo com amor. Ele � uma crian�a e tem direito de se sentir amado e feliz.
- Antonieta tem raz�o - disse Sabina. - N�o faz nenhum sentido adotar uma crian�a para priv�-la de fazer parte realmente da fam�lia.
- Precisamos prestar muita aten��o nas crian�as. S�o ainda muito pequenas e n�o possuem total dom�nio de suas emo��es. Cabe a n�s orient�-las sempre para o caminho
do bem, mostrando-lhes que o amor � um sentimento que, quanto mais damos, mais ele cresce favorecendo a n�s mesmos.
- Tudo vai dar certo, meu amor - disse Frank. - Seremos uma fam�lia feliz.
- Tenho certeza que sim - afirmou C�ssia. - Afinal, vivo ao lado das melhores pessoas que conhe�o.
Os dias foram passando.
Aos domingos, toda a fam�lia de C�ssia ia ao orfanato visitar Bernardo, que cada vez mais se apegava a eles. Jussara informava-os sobre o andamento do processo de
ado��o. At� que um dia, ao chegarem, Jussara sorrindo lhes disse:
- Tenho uma boa surpresa para voc�s.
- Diga-nos do que se trata Jussara.
- O juiz autorizou voc�s a levarem Bernardo para passar o fim de semana em sua casa, para que comece a adapta��o de ambos os lados. N�o � formid�vel?
- Claro, Jussara, � uma �tima not�cia, a que mais aguard�vamos - respondeu C�ssia emocionada.
- Isso quer dizer que podemos lev�-lo para passear? Hoje � domingo. Poder�amos lev�-lo ao parque para brincar com os irm�os e � tardinha traz�-lo volta, pode ser?
- perguntou Frank.
- Claro que sim - respondeu Jussara. - Venha, Bernardo, vamos trocar a roupinha, quero que saia bem bonito para passear, assim como seus irm�os.
Com o rostinho alegre, Bernardo acompanhou Jussara.
- Frank, est� dando tudo certo, acho que Jesus aben�oou a todos n�s.
- Claro que sim, meu amor, onde h� o bem Jesus est� presente. Aprendi com meus pais que todos n�s devemos lutar por um mundo melhor e mais pac�fico. E, para que
isso aconte�a, precisamos come�ar de alguma forma. Creio que n�s encontramos a nossa maneira de lutar, l� no projeto e aqui com Bernardo. Sei que � um gr�o de areia
no oceano, mas estamos contribuindo. Apesar de agirmos com pureza de alma, sempre haver� quem nos atire a primeira pedra. Se isso acontecer C�ssia, temos a quem
recorrer: ao amor de Jesus.
- Voc� mencionou uma quest�o interessante, Frank. Atirar a primeira pedra � imprud�ncia; julgar impulsivamente, quase sempre � errar no julgamento e se arrepender
mais tarde. Nutrir o cora��o com justi�a e solidariedade �, pelo menos, dar a si pr�prio a oportunidade de acertar.
De repente, Frank percebeu uma sombra de tristeza no rosto de C�ssia.
- O que foi meu amor, parece que ficou tristonha. Alguma coisa que eu n�o sei a aborrece?
- N�o, Frank, n�o � nada, tolice minha.
- Diga-me do que se trata e eu mesmo avalio se � tolice ou n�o.
C�ssia hesitou por um instante, mas acabou desabafando:
- Sabe Frank, �s vezes lembro-me de como vivia quando era casada com L�o, uma vida vazia de obras. Dedicava as horas a cuidar de minhas plantas e a fazer a vontade
de L�o. Sempre acreditei na vida futura, mas parecia uma coisa t�o distante que seria quase imposs�vel alcan��-la. Entretanto, hoje a sinto perto de mim. N�o sei
se pela morte do meu pai e de seus pais, enfim, parece-me t�o real que hoje sei que pode acontecer a qualquer instante; para isso basta a vontade de Deus.
- Mas por que tudo isso lhe traz melancolia? - perguntou Frank.
- Porque vejo que perdi muito tempo. Demorei a acordar e dar aten��o �s coisas que aconteciam diante de meus olhos e enxerg�-las na sua real dimens�o. Voc� me entende?
- Entendo querida, mas n�o � voc� mesma quem sempre diz que tudo tem sua hora para acontecer? Com voc� n�o foi diferente. Tudo aconteceu na hora certa. No momento
em que voc� estava preparada para reavaliar sua vida e ir � busca do seu ideal de fraternidade, foi o que voc� fez.
C�ssia olhou para o marido e sorriu.
- Voc� � mesmo algu�m muito especial e eu o amo cada dia mais.
- Nossa, que declara��o de amor! - disse Frank feliz.
Foram interrompidos por Antonieta que, ofegante, lhes disse:
- Dona Jussara ligou do orfanato e disse que Bernardo foi internado novamente. Se voc�s quiserem ir v�-lo, aqui est� o endere�o do hospital - disse, entregando um
peda�o de papel rabiscado �s pressas.
Frank e C�ssia levaram um susto com a not�cia.
- Por favor, m�e, a senhora e Sabina podem cuidar das crian�as para mim? Frank e eu vamos at� o hospital.
- Podem ir e n�o se preocupem com as crian�as, cuidaremos delas.
Assim que sa�ram, Antonieta comentou com Sabina:
- Ser� que C�ssia acertou mesmo adotando uma crian�a com s�rios problemas de sa�de, Sabina? Tenho receio de que venha a sofrer.
- Ela deve saber o que est� fazendo, Antonieta, mesmo porque Bernardo tinha poucas chances de ser adotado, � uma crian�a crescidinha e doente. Cuidaremos bem dele
e ele ficar� melhor.
- Deus a ou�a, Sabina! � uma crian�a t�o triste, merece ser feliz. - Se depender de mim, ser� realmente - exclamou Antonieta.
- De mim tamb�m - completou Sabina.


As tribula��es da vida podem ser impostas aos Esp�ritos endurecidos, ou muito ignorantes, para fazerem uma escolha com conhecimento de causa, mas s�o livremente
escolhidas e aceitas pelos esp�ritos arrependidos, que querem reparar o mal que fizeram e tentar fazer melhor. Tal � aquele que, tendo feito mal a sua tarefa, pede
para recome��-la a fim de n�o perder o benef�cio do trabalho. Essas tribula��es, pois, s�o, ao mesmo tempo, expia��es pelo passado que elas punem e provas para o
futuro que elas reparam. Rendamos gra�as a Deus que na Sua bondade concede ao homem a faculdade da repara��o e n�o o condena irrevogavelmente pela primeira falta.
Entretanto, n�o seria preciso crer que todo o sofrimento suportado neste mundo seja necessariamente o ind�cio de uma falta determinada; s�o freq�entemente simples
provas escolhidas pelo esp�rito para acabar sua depura��o e apressar seu adiantamento. Assim, a expia��o serve sempre de prova, mas a prova n�o � sempre uma expia��o,
mas, provas ou expia��es, s�o sempre sinais de uma inferioridade relativa, porque o que � perfeito n�o tem mais necessidade de ser provado.
(O Livro dos Esp�ritos, Cap. V, Item 8.)


C�ssia e Frank chegaram ao hospital receosos. Ao avistarem Jussara, perguntaram-lhe:
- Como ele est�? � grave?
- � como eu lhes disse, sua enfermidade o prende ao leito por diversas vezes. Esta � s� mais uma. N�s estamos acostumados. Ele vai ficar bom.
C�ssia andava de um lado para outro esperando alguma not�cia. Assim que avistou o m�dico, correu a perguntar:
- Por favor, doutor, como ele est�?
- A senhora � o que da crian�a.
- Sua m�e.
Espantado, o m�dico respondeu:
- A senhora disse m�e?!
Jussara interveio:
- Este � o casal que vai adotar Bernardo, doutor.
- Parab�ns, dona...
- C�ssia!
- Dona C�ssia - repetiu o m�dico. - Meus parab�ns por essa atitude generosa. Essa crian�a precisa mesmo de carinho, de uma fam�lia. Sua enfermidade piora muito com
o desequil�brio emocional. � muito pequeno ainda para saber lidar com o abandono.
- O senhor acha melhor o transferirmos para um hospital particular? - perguntou Frank. - Queremos que ele tenha todas as condi��es para se tratar.
- N�o h� necessidade. Este hospital � bem equipado, possui �timas condi��es para tratar os pacientes. Se tudo correr bem, amanh� mesmo ele volta para o orfanato.
- Jussara, ajude-me, n�o quero que ele volte para o orfanato; quero lev�-lo para casa. Consiga essa autoriza��o, por favor!
- Fique tranq�ila, dona C�ssia, provavelmente conseguir�. Vou entrar em contato agora mesmo com o juiz. Ele tamb�m quer o melhor para a crian�a.
Mais calma C�ssia agradeceu a Jussara e perguntou ao m�dico se podia ver Bernardo, no que foi prontamente atendida.
Entrou na enfermaria e o encontrou com os olhinhos fechados, com oxig�nio e muito p�lido. Pegou delicadamente em suas m�ozinhas e beijou-as. Bernardo abriu os olhos
e esbo�ou um t�mido sorriso.
- Fique tranq�ilo, meu amor, mam�e est� aqui com voc�. Assim que ficar bom, vou lev�-lo para nossa casa e vai ficar junto de seus pais e irm�os. Tudo vai dar certo,
papai do c�u vai ajudar voc� a ficar bom. Voc� esta contente em ir para casa comigo?
Como resposta, Bernardo apenas levantou sua m�ozinha e tentou pass�-la no rosto de C�ssia. Como n�o conseguia, C�ssia abaixou-se para que ele a tocasse.
- Obrigada, meu amor, voc� me deixou muito feliz. N�s vamos ser muito felizes.
Sentou-se ao lado da cama e, acariciando suas m�os, cantou baixinho uma linda can��o de ninar, at� que, tranq�ilo, Bernardo adormeceu. A enfermeira presente n�o
se conteve e, chegando perto de C�ssia, disse-lhe:
- Que Jesus aben�oe a senhora! Disseram-me que est� adotando o Bernardo. N�s j� o conhecemos e ficamos felizes quando soubemos da ado��o. Esta crian�a merece um
lar e principalmente uma m�e como � senhora. Emocionei-me com o carinho que a senhora dedicou a ele. O amor de Jesus h� de aquecer seu lar todos os dias.
- Eu agrade�o e desejo o mesmo a voc� - respondeu C�ssia. - Agora preciso ir. Cuide bem dele, por favor.
- Fique tranq�ila, todos aqui no hospital o conhecem desde pequenininho. Cuidaremos muito bem dele.
- Obrigada. At� amanh�.
- At� amanh� - respondeu a enfermeira.
Assim que chegou ao sagu�o do hospital, Frank veio ao seu encontro �vido por not�cias concretas a respeito de Bernardo.
- Como ele est�? O que voc� achou do seu estado?
- N�o sei responder, Frank. Achei-o muito fraquinho, est� com o oxig�nio, enfim, est� medicado. Como disse o m�dico, � preciso aguardar.
- Ser� que ele sai dessa crise, C�ssia? Jussara disse que � uma das piores.
- Olhe Frank, quero acreditar que sim. Vamos confiar em Jesus e esperar. Amanh� voltaremos para v�-lo.
Retornaram para casa.
Antonieta e Sabina, assim que os viram, cobriram-lhes de perguntas:
- N�o podemos dizer nada por enquanto - respondeu C�ssia.
- O que podemos fazer � orar ao Senhor implorando aux�lio para que Bernardo se recupere. Vamos pensar no melhor e confiar.
- Mam�e, papai, voc�s trouxeram nosso irm�ozinho? - perguntou J�nior entrando correndo na sala.
Frank, antecipando-se a C�ssia, respondeu:
- Ainda n�o, filho, mas logo ele estar� aqui.
- "Joj�" disse que ele est� doente - completou Betinho.
- N�o � joj�, � vov� - corrigiu J�nior.
- Eu s� sei falar assim - respondeu Betinho, bravo.
- N�o v�o brigar agora, v�o? Como papai falou logo Bernardo estar� aqui conosco.
- Eu vou rezar para ele ficar bom, viu mam�e.
- Eu tamb�m.
- Fa�am isso.
Satisfeitos, voltaram a brincar no jardim.
- E Maur�cio? - perguntou C�ssia. - Onde est�?
- Brincando no quarto - respondeu Sabina. - Eu estava com ele at� agora.
- Vou v�-lo - disse C�ssia, indo em dire��o ao quarto de Maur�cio.
Assim que C�ssia saiu, Antonieta disse a Frank:
- Estou preocupada com C�ssia. Se alguma coisa mais grave acontecer com essa crian�a ela vai sofrer muito.
- Ela tem consci�ncia de que pode acontecer, dona Antonieta. Dona Jussara n�o escondeu nada sobre a sa�de dele. N�s sab�amos que sua sa�de � prec�ria, que ele �
uma crian�a que requer muitos cuidados. Mesmo assim, foi o filho que C�ssia escolheu e deve haver um motivo forte que nos uniu a ele. Mesmo achando que podemos vir
a sofrer, n�o vamos recuar, ele tem o direito de ser feliz, nem que seja por pouco tempo.
- Voc� tem raz�o, meu filho - disse Sabina. - Todos n�s vamos nos esfor�ar para proporcionar a essa crian�a dias de paz.
- Obrigado, m�e.
Ap�s dez dias de muita ang�stia, C�ssia finalmente recebeu a not�cia de que Bernardo iria receber alta. Jussara conseguira autoriza��o do juiz para que C�ssia e
Frank levassem Bernardo para casa. Poderiam ficar com ele at� que sa�sse a ado��o definitiva. A alegria dominava o cora��o de todos. Bernardo maravilhava-se com
tudo o que era apresentado a ele como sendo seu. Nunca seus olhinhos se encantaram com tantos brinquedos e seu cora��o magoado sentira paz e certeza de que tudo
na sua vida iria mudar. Pela primeira vez, Bernardo deu o sorriso que iria acompanh�-lo pela vida inteira.


O amor resume inteiramente a doutrina de Jesus, porque � o sentimento por excel�ncia, e os sentimentos s�o os instintos elevados � altura do progresso realizado.
No seu in�cio o homem n�o tem sen�o instintos; mais avan�ado e corrompido, s� tem sensa��es; mais instru�do e purificado, tem sentimentos; e o ponto delicado do
sentimento � o amor, n�o o amor no sentido vulgar do termo, mas esse sol interior que condensa e re�ne em seu foco ardente todas as aspira��es e todas as revela��es
sobre-humanas. A lei do amor substitui a personalidade pela fus�o dos seres e aniquila as mis�rias sociais. Feliz aquele que, ultrapassando sua humanidade, ama com
amplo amor seus irm�os em dores! Feliz aquele que ama, porque n�o conhece nem a ang�stia da alma, nem a mis�ria do corpo; seus p�s s�o leves, e vive como que transportado
para fora de si mesmo.
Quando Jesus pronunciou essa palavra divina - amor - ela fez estremecer os povos, e os m�rtires, �brios de esperan�a, desceram ao circo.
(O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XI, A lei do Amor.)



Cap�tulo 26
A doen�a de C�ssia


Os dias, os meses e os anos se passaram. No lar de C�ssia e Frank, os sorrisos e as l�grimas se alternavam cumprindo a lei natural da vida.
Bernardo se adaptara facilmente ao conv�vio com sua nova fam�lia. Os filhos de C�ssia e Frank, como acontecem em todos os lares, viviam entre abra�os e brigas, muitas
vezes disputando a aten��o dos pais. A sa�de de Bernardo sempre fora preocupa��o para seus pais. As constantes idas ao m�dico e interna��es afetavam um pouco o humor
de Bernardo, em raz�o das limita��es que enfrentava no seu dia a dia. J�nior tornara-se seu melhor amigo, defendia-o quando necess�rio, n�o permitindo que ningu�m
o magoasse. Eram realmente ligados um ao outro, o que deixava C�ssia e Frank felizes.
Sabina retornara � p�tria espiritual havia alguns meses, o que deixara todos, principalmente Frank, com o cora��o marcado pela saudade.
C�ssia, para aliviar sua dor, sempre lhe dizia: - Frank, as pessoas de bem s�o recebidas com alegria no reino de Deus. Sabina foi uma mulher de fibra, nunca se abateu
com a dor, jamais culpou o Criador por afli��es, ao contr�rio, sempre consolou as pessoas que passavam por sofrimentos, esquecendo de si mesma. Onde estiver, deve
estar olhando por n�s, principalmente por voc�.
- Eu sei C�ssia. Sofro por ter ficado t�o pouco tempo em sua companhia. Aprendi a am�-la de verdade como minha m�e.
- Ela sabia disso, meu amor. Voc� a tratou como sua m�e; deu-lhe carinho, aten��o, enfim, foram dias maravilhosos que passaram juntos. Ela partiu sem sofrimento,
apenas fechou os olhos e partiu. Desencarne assim � uma b�n��o de Deus.
Antonieta, chegando, disse a Frank:
- Desculpe-me, Frank, mas n�o pude deixar de ouvir a conversa de voc�s. Quero lhe dizer que, mesmo sabendo que ningu�m ocupa o lugar de ningu�m, gostaria que soubesse
que o tenho como um filho, pelo que voc� �, pelo que representa na vida de minha filha e na dos meus netos, pela humildade que o faz maior. Agrade�o a Deus por t�-lo
colocado no caminho de C�ssia e por faz�-la t�o feliz.
- Obrigado, dona Antonieta, sei que me quer bem e eu tenho muita afei��o pela senhora, mas acho que quem ganhou mais com nossa uni�o fui eu. Dificilmente encontraria
uma pessoa como C�ssia, com todas as qualidades para fazer feliz qualquer pessoa que dela se aproxima. Em todas as afli��es, C�ssia se comportou como verdadeira
criatura de Deus; sua for�a sustenta esta fam�lia, dona Antonieta.
- Gostaria que soubessem que n�o sou t�o maravilhosa assim. Tenho muitos momentos de ang�stia e medo, mas aprendi nas palestras do Centro que ningu�m vem a Terra
para ser feliz para sempre, mas para aprender o que n�o julgou importante em outra ocasi�o. Hoje sei que a felicidade � conseq��ncia do bom aproveitamento que fazemos
das oportunidades recebidas. O mais importante � vencer os obst�culos sem deixar derrotados nem sofredores ao longo do caminho; vencer pelo amor vivido e exemplificado.
Ao ouvir o chamado de Betinho, correu ao seu encontro. Vendo-a se afastar, Frank pensou:
- Sou t�o feliz com voc�, C�ssia, que tenho muito medo de perd�-la.


A dor � uma b�n��o que Deus envia aos seus eleitos; n�o vos aflijais, pois, quando sofrerdes, mas bendizei, ao contr�rio, o Deus todo-poderoso que vos marcou pela
dor nesse mundo para a gl�ria no c�u.
(O Evangelho Segundo o Espiritismo.)


Bernardo cada vez mais se apegava a C�ssia. Tudo corria com tranq�ilidade, at� o dia em que C�ssia n�o se levantou no seu hor�rio habitual. Todos estranharam.
- Dona Antonieta, estou preocupado com C�ssia. Chamei-a, como de costume, mas ela disse que queria dormir um pouco mais, que n�o se sentia bem. Acho muito estranho.
N�o seria bom chamar um m�dico para examin�-la?
- Vou falar com ela, Frank.
Antonieta foi at� o quarto da filha e realmente notou-a muito p�lida.
- O que voc� sente minha filha?
- N�o sei m�e, muito cansa�o e uma sensa��o de fraqueza.
- Frank tem raz�o, � melhor chamar o m�dico.
- N�o precisa, logo passa.
Contra a vontade de C�ssia, Frank foi � busca do m�dico da fam�lia. Iniciava-se, naquele dia, a enfermidade que a manteria presa ao leito por dois anos, sofrendo
e vendo sofrer seus entes queridos, at� que Orlando, Eneida e Jacob viessem busc�-la.
Como o previsto, Bernardo dedicou-se inteiramente aos cuidados de sua m�e. Permanecia noite e dia ao seu lado, vivendo cada minuto de dor, sem nunca ouvir dos l�bios
de C�ssia uma s� palavra de revolta ou lamenta��o.
- Mesmo quando sofre, sua m�e nos d� li��es de dignidade e f� - dizia Frank aos filhos.
Em uma manh� chuvosa de domingo, Bernardo, como sempre fazia, foi dar bom-dia a sua m�e. Encontrou-a com os olhos fechados e um leve sorriso esbo�ado em seus l�bios.
Pela palidez de suas faces, sentiu que o pior havia acontecido.
C�ssia partira do mundo f�sico deixando exemplos a serem seguidos. Passara por dores, afli��es e m�goas, mas nunca perdera a alegria, a f� e a certeza de que tudo
acontece para o crescimento do ser. N�o permitiu que o orgulho e o ego�smo matassem impiedosamente sua possibilidade de fazer parte dos eleitos, pois sabia que o
orgulho nos faz acreditar ser mais do que somos, e o ego�smo nos impede de ver al�m do nosso pr�prio eu.
Cumprira sua tarefa com dignidade crist�, ensinara aos filhos a import�ncia da uni�o dos seres; entendera, por meio dos acontecimentos de sua vida, que nenhum de
n�s vem ao mundo a passeio, todos retornamos com a finalidade de nos aperfei�oar como criatura de Deus, e essa compreens�o lhe propiciara a paz que fortaleceu seu
cora��o.
Adormecida, deixando not�rias em seu corpo f�sico a tranq�ilidade e a paz, C�ssia foi levada por Jacob, Eneida e Orlando, que acompanhavam a equipe do desencarne
at� o hospital Maria de Nazar�, aonde iria se fortalecer para continuar, no tempo certo, o seu trabalho fraterno.
Deixara para seus filhos os exemplos do bem e da moral crist�. Era chegada a hora de cada um seguir o seu caminho e continuar a edifica��o em terreno f�rtil.
Bernardo, em pouco mais de um ano, abalado com a separa��o de C�ssia e n�o suportando mais as agress�es da enfermidade que o acompanhava durante tantos anos, desencarnou
rodeado por seu pai, irm�os e Antonieta, que se curvava com o peso de sua idade avan�ada.
A vida, mais uma vez, seguiu seu curso e mais uma vez os planos de Deus se fizeram presentes, envolvendo cada um com sua bondade e miseric�rdia.



Considera��o


Necess�rio se faz ao homem compreender o que na realidade significa viver; conscientizar-se de que somos mais que um corpo bonito e perfeito; que o mais importante
ser� sempre a perfei��o da nossa alma; � ela que retorna � sua p�tria de origem. Por mais que a humanidade possa duvidar, a vida depois de amanh� � uma realidade,
e essa � a nossa maior alegria, saber que nenhuma criatura simplesmente se desintegra. Ao contr�rio, ao abandonar o corpo f�sico, renascemos plenos no reino de Deus.
Nem podia ser diferente, pois a sabedoria do Criador, Sua justi�a e bondade, n�o se ajustariam em criar o ser para destru�-lo impiedosamente, sem nenhuma chance
de se renovar. Ao contr�rio, propicia a todos novas oportunidades para recome�ar e poder se elevar no bem, na sublime trajet�ria da evolu��o.
Todos os seres vivem em meio a alegrias e tristezas, erros e acertos, d�vidas e certezas, enfim, todos navegam no imenso universo de Deus procurando seu caminho
e promovendo sua reforma interior. Todos n�s sabemos, intuitivamente, que temos uma miss�o a cumprir, que precisamos aparar as arestas da nossa personalidade, desenvolver
em n�s os sentimentos do bem e do amor e nos melhorar como criaturas de Deus. E lutar contra essa verdade � agir como um tolo, impedindo a si mesmo de ser feliz.
S�bio � aquele que consegue entender que jamais teremos paz se permanecermos com os olhos fechados ignorando a mis�ria que atinge tantos e tantos irm�os; quando
nos negamos a repartir o sup�rfluo, o muito que temos, com os que, por motivos v�rios, nada possuem, vivem sem perspectivas de futuro, com o cora��o sem esperan�as,
mas que apenas uma palavra ou uma m�o estendida pode fazer renascer em sua alma a for�a e a coragem para lutar e vencer a si mesmo. Como ter paz quando se permite
que a pr�pria vida gire em torno da satisfa��o dos pr�prios desejos?
As �guas correm para o oceano e se unem ao todo. Os homens, n�o raro, teimam em caminhar sozinhos, acreditando possuir duas asas para voar. Puro engano!
Assim como as �guas fazem, tamb�m se faz necess�rio nos unir �s pessoas, todas as criaturas de Deus, e com o mesmo direito na imensa casa do Senhor. Quando todos
compreenderem e aceitarem que somente por meio do amor construiremos a felicidade, e que n�o � prudente dormir serenamente enquanto muitos sofrem o descaso de alguns,
prosseguir�o em sua jornada em dire��o ao Criador, como pequenas part�culas que s�o, mas que podem alimentar o cora��o com o sentimento de fraternidade, aliviando
as afli��es de muitos nos momentos dif�ceis de solid�o.
Que o Divino Amigo ilumine o cora��o de cada criatura, para que possa plantar aqui na Terra a semente de felicidade que ir� florescer na vida depois da amanh�.

At� mais ver!
Irm�o Ivo



Aos leitores



A manjedoura acolheu o rebento e a luz se fez.
A do�ura do amor se espalhou por todo o Universo e o homem recebeu do Mais Alto nova oportunidade para repensar e reavaliar seus conceitos, nem sempre louv�veis;
mas o homem, por causa da pressa em conquistar fortunas, esqueceu-se de perceber a luz que clareava o mundo.
Pobres de n�s... Andamos t�o distra�dos que n�o somos capazes de sentir ao nosso lado o Criador deste fant�stico mundo em que vivemos.
"Pela obra se conhece o autor", j� disse algu�m.
Mas, acostumados que estamos a ser alvos de tamanha bondade, n�o damos tanta import�ncia a essa cria��o e destru�mos rios e florestas em nome do progresso; destru�mos
at� o ar que respiramos; n�o aprendemos ainda a valorizar a vida, seja no reino mineral, seja no vegetal ou no animal. E, o que � pior... A vida humana.
O respeito nos impede de cometer absurdos; o respeito nos faz olhar o nosso semelhante como um ser igual a n�s e, conseq�entemente, desejar o melhor para ele. O
respeito e o amor andam de m�os dadas, e aquele que ama �, verdadeiramente, filho de Deus.
A �gua borbulha por entre as pedras com toda a sua exuber�ncia, porque � simplesmente o efeito de uma nascente cristalina.
Assim como a �gua, a caridade tamb�m � o efeito de uma nascente de amor nos cora��es generosos que se doam sem nenhum outro desejo sen�o o de estar exercitando a
lei do amor.
A cada abra�o que trocamos, a cada m�o que apertamos, unimos nosso ideal e ajudamos o Cristo a descer da cruz. Devemos agir de maneira que nossa caminhada rumo a
Jesus n�o se interrompa para que possamos tornar bom o que parece mal, ou seja, o outono da vida. As palavras de Jesus est�o se misturando, se perdendo nas atitudes
enganosas de falsos profetas, e isso nos faz crer que todos est�o surdos, est�o ficando cegos e se esquecendo de que aqui � sementeira de felicidade para a vida
futura.
Necess�rio se faz aprender a amar sem ter medo de sofrer, e sofrer sem nunca deixar de amar, essa � a m�gica que ir� nos transportar com equil�brio e paz para a
vida depois de amanh�.
Pe�o licen�a aos leitores para dar testemunho da grande f� que possuo na vida futura, transcrevendo uma pequena carta para meu filho que hoje reside no reino de
Deus, na certeza de que ser� entregue a ele pelos tarefeiros de Jesus.


Filho, voc� vive em mim e no meu amor.
Voc� vive com a for�a e a espiritualidade que s� os bons possuem.
Vive em mim... Junto de mim... Atrav�s de mim.
Em cada pensamento,
Em cada gesto,
Em cada pulsar do meu cora��o voc� est� presente,
Porque te amo... Te sinto... E te aben��o.
Agora, mais do que nunca, estaremos juntos,
Neste lar de amor, trabalhando em favor do pr�ximo,
Unindo-nos no amor de Jesus,
Entrela�ando nossas vibra��es atrav�s do infinito,
Para que eu receba de voc� e de seus mentores
A for�a necess�ria...
Para eu continuar vivendo.


S�nia Tozzi



Fim









A VIDA DEPOIS DE AMANH� fy-& 211

A VIDA DEPOIS DE AMANHA fy-^ 207









266 fy-<?. S�nia Tozzi I Irm�o Ivo
A VIDA DEPOIS DE AMANH� 267





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A VIDA DEPOIS DE AMANH� 285
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Muita paz !

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