terça-feira, 1 de dezembro de 2015

{clube-do-e-livro} :Corpo Fechado - Robson Pinheiro

Para os homens de boa vontade, sem preconceitos, para mentes sem fronteiras é para estes que W.
Votiz


escreve o texto que chamou de ensaio mediúnico.
Desde 1997 esse espírito está próximo de nossa equipe espiritual, estudando e dedicando-se a
compreender os diversos aspectos da mediunidade e sua riqueza de manifestação na cultura espiritual
brasileira.


Auxiliou-me intensamente na construção de diversos pensamentos, dissertações e influenciou


positivamente a minha forma de ver a mediunidade fora do âmbito espírita.
Como escritor,mostrou-me como os espíritos, os fantasmas ou os chamados mortos já se utilizavam
desde


há muito tempo de outros médiuns, não religiosos.


Aqueles que nem mesmo se davam conta de sua faculdade, como ocorreu consigo. Do lado de cá da
vida, a
convite de Joseph Gleber e sua equipe, pôde avaliar a imensidade de fenômenos mediúnicos e


paranormais
que experimentou em sua própria vida.
Durante mais de 40 anos, vivenciou-os sem saber que tais fenômenos eram de origem espírita, mesmo
porque não lhes eram familiares, quando encarnado, os conceitos espirituais aos quais hoje se dedica


com afinco a estudar e aprofundar.
Cativou-se, nesse meio tempo, pela forma simples, sincera e serena do espírito João Cobú, o Pai João,
e



pediu-me para auxiliá-lo em seu primeiro ensaio mediúnico, um romance ao longo do qual gostaria de

testar sua habilidade para escrever através do médium.
A afinidade se mostrou de pronto, devido a fatores de um passado recente que já os aproximava, em
virtude do pensamento universalista de Voltz e de sua maneira livre e inventiva de abordar os
problemas humanos, sociais e científicos, visando a um futuro caminho para uma humanidade sem
fronteiras e sem preconceitos.

Do modo como ocorreu comigo mesmo, escritor dos dois lados da vida, ele não pretende trazer
ensinamentos nem formar gurus, tampouco doutrinar quem quer que seja.
Não aborda temas doutrinários de religião alguma; apenas reporta o que ouviu, o que acompanhou nas
conversas de João Cobú ao tratar de certos casos, cujo relato, talvez, traga alguma contribuição para o


leitor destituído de espírito cético e preconceiruoso.


Este romance é o primeiro de uma série que pretende escrever, mostrando aos homens de boa vontade
que
a mediunidade e a paranormalidade não são propriedade exclusiva de ninguém e de nenhuma religião


em


particular. Nem mesmo as interpretações de tais fenômenos são únicas. Ao contrário, são diversas as
visões e os ângulos pelos quais se podem ver certas verdades relativas no mundo atual.
Com você, leitor, o amigo João Cobú, na visão humanista de Voltz, escritor, médium e paranormal


que


retorna, pelas mãos da psicografia, para dedilhar na harpa da mediunidade uma nota, apenas uma nota
neste grande concerto da espiritualidade sem fronteiras, sem bandeiras, vista sob o olhar do amor e da
fraternidade.
Ângelo Inácio -Belo Horizonte, 4 de abril de 2009.
"Andarei vestido e armado com as armas de Jorge. Para que meus inimigos tenham pés e não me


alcancem; mãos tendo, não me peguem; olhos tendo, não me enxerguem e nem pensamentos possam


ter para me
fazerem mal. Armas de fogo o meu corpo não alcançarão; fadas e lanças se quebrem sem meu corpo
tocar;


cordas e correntes se arrebentem sem o meu corpo amarrar. Porque andarei vestido com as roupas e as
armas de Jorge."
Conversa de pai-velho.



A tarde se esvaía em meio às últimas claridades do sol enquanto o vendaval marcava o início de uma
noite tumultuada, entre relâmpagos e trovoadas. Iansã parecia competir com Xangô no reino de
Aruanda; raios e

trovões se alternavam enquanto a chuva aumentava vertiginosamente, trazendo preocupações para a

comunidade já sofrida, que dependia das bênçãos da natureza para sua sobrevivência. Na cabana de
Pai

João, os filhos e filhas do devotado pai-velho reuniam-se para ouvir do ben-feitor as palavras de
sabedoria que lhes definiriam os caminhos da vida espiritual. Estavam numa casa onde se adorava a
Deus e se

praticava a caridade segundo a orientação dos espíritos do bem.

Sabe, meus filhos

— principiava o pai-velho, incorporado em seu médium.
— O caminho da espiritualidade tem muitas faces interessantes. Nego-velho diria que esse caminho é
feito de muitas cores, de muitos aromas, de muitas ervas. Diferentemente das religiões, em que cada
uma
pretende ser a única forma de agradar a Deus; diferentemente de outros filhos espiritualistas, que
também querem acreditar que a sua maneira de buscar o Pai é a mais correta, a espiritualidade em
nosso país é feita de diversas culturas, da fusão de muitas raças, crenças e concepções religiosas.
Afinal, aqui onde nós

trabalhamos respeitam-se as diferenças, porque existem inúmeras nuances e visões acerca da

espiritualidade.

Meu pai !

— perguntou a Efigênia, trabalhadora da cabana do pai-velho.
— Eu não entendo a sua forma de falar a respeito da espiritualidade. Queria entender um pouco da
umbanda, já que muita gente fala tanto dessa religião e nós sabemos tão pouco...
É bom entender, minha filha, que não existe apenas uma maneira de cultuar a umbanda. Também é
preciso

compreender que umbanda não é apenas uma denominação religiosa; antes de ser assim usada, a
palavra

sagrada era, acima de tudo, o nome divino da suprema lei do Pai.

Aumbandã é lei de caridade, é lei divina. De modo mais particularizado é que foi empregado o nome
sagrado para designar o culto atual; daí a umbanda nasceu, com a finalidade sagrada de congregar, sob


a bandeira de Oxalá, o povo de Deus disperso.
E há outras umbandas diferentes das que vemos por aí, meu pai?
Pai-velho compreendeu sua pergunta, meu filho
Respondeu de boa vontade o pai-velho para José Benedito, um dos médiuns da casa.


— Não é que existam "outras umbandas", como diz meu filho.
O que há são diversas formas de praticar os ensinamentos da espiritualidade; nesse caso, também
diversas maneiras de cultuar os orixás, de adorar a Deus ou de praticar a umbanda. Acima de tudo,
filhos, o que
importa mesmo não é a forma externa, mas sim a intenção, o que se faz em nome da lei suprema.
Uns cultuam a umbanda misturada a certo conhecimento a respeito dos orixás, com um ritual


inusitado, ao


menos para vocês. Vestem-se com roupas coloridas, cantam numa língua diferente, familiar a certo
número
de indivíduos. E também chamada de língua de santo ou do povo do santo. Na verdade, trata-se de um
idioma antigo, dos povos da mãe África.
Esse é o culto umbandista conhecido como omolocô.
Dando um tempinho para que seus filhos pudessem absorver as coisas que ele explicava, o vovô,
incorporado em seu médium, falava mansinho, devagar, com paciência digna de um verdadeiro sábio:
Existem aqueles filhos que praticam uma um banda com mais simplicidade, como a que vocês
conhecem... Alguns chamam essa variação de um banda pés-no-chão, ou pés-descalços. Não impor
tam os nomes dados aos cultos; essencial é que todos trabalhem conforme as regras do coração e de
maneira a praticar a suprema lei do bem.
"Outros filhos fazem um culto mais refinado, desprovido dos elementos africanos.
Tentam desafricanizar a umbanda, no sentido de afastar aquilo que a aproxima dos métodos do


candomblé,


tais como matança de animais, toque de atabaques e outras características próprias dos rituais de
origem africana.
Introduziram o estudo entre os médiuns e desenvolveram uma visão mais detalhada a respeito dos


orixás e


seu simbolismo, formando uma teologia umbandista bastante interessante."
Mas, meu pai, ainda tem gente que usa atabaque nos terreiros?
É claro que sim, meu filho
— agora o velho dirigiu-se a Antônio de Freitas, outro trabalhador muito dedicado de sua cabana. —


Como eu dizia no início, existem muitas maneiras de praticar a umbanda...
Não podemos ignorar que, como humanidade, estamos ainda distantes de um estágio em que a vi
são acerca de espiritualidade e da forma de buscar as coisas do espírito seja única.
Devemos respeitar as crenças e os métodos alheios tanto quanto desejamos ver nossos fundamentos
respeitados.Mas, vovô — assim muitos chamavam o preto-velho.


— Para que servem os atabaques que os outros irmãos usam em seu culto e por que não os
empregamos
em nossa cabana?
Ah! Meu filho


— falou com boa vontade o pai-velho. — E preciso estudar em profundidade os fundamentos por trás
do uso
de certas ferramentas de trabalho. Nego-velho já falou pra vocês a respeito da força do som em toda a
natureza, se lembram?
Muitos de meus filhos devem se lembrar da conversa que tivemos outro dia...
—Lembro sim, vovô, mas muita coisa não ficou gravada na minha cabeça. Parece que estou de miolo
mole...


— essa era Zefa do Malaquias, a mulher que chegara à casa de Pai João com um encosto daqueles.
Havia
se curado, mas se submetia agora ao cuidado médico. O benfeitor estabeleceu como exigência que ela
prosseguisse com o tratamento e acatasse os conselhos de seu médico a fim de poder continuar junto à
comunidade.
Pois então nego-velho vai lembrar um pouco do que já falou pra vocês


— sendo interrompido para ouvir outro de seus filhos que levantara a mão, pedindo a oportunidade de
se

expressar.
O pai-velho ouviu serenamente o que tinha a dizer:
Sabe, meu pai, eu até que me alembrei istrudia do que o sinhô falou pra nóis. Mas óia que eu até tento
intende as coisa, mas a minha cabeça aqui, dizia batendo a ponta do dedo em si, num tá querendo


aprende
muita coisa não... Parece que os males da Zefa tão querendo me pegar.
E preguiça, meu filho — falou o pai-velho, dando gostosa gargalhada.


— Preguiça mesmo.
O que eu gosto mesmo é de fazer os servicinho que o sinhô passa pra nóis...
Então faz o seguinte, meu filho: que tal você visitar pelo menos uma vez por semana a sinhá Antônia,
que ficou sozinha depois da morte do seu marido?
Ela está acamada e precisa que alguém limpe a casa dela. Você se compromete a fazer isso?
—Com certeza, meu avozinho, isso eu entendo muito bem. Eu posso muito mermo fazê isso e não
é somente uma vêis pro semana, não. Eu vô é mais vêis visitar don'Antônia.
Aproveite, meu filho, e leve pra ela uns banhos de firmeza que estão guardados ali no outro cômodo...
Parece que a interferência do rapaz acabou por ali, pois assim que Pai João falou as últimas palavras,
ele saiu correndo, nem sequer esperando para ouvir os ensinamentos do preto-velho.
Cada um sabe ser útil a sua maneira, não é, meus filhos?


— Pai João se dirigiu ao restante de seus filhos, referindo-se com imenso carinho àquele que tinha
dificuldades no aprendizado. Depois de suspirar um pouco e ajeitar-se na cadeira, o pai-velho
prosseguiu com a tranqüilidade que lhe era característica:
—Como dizia antes, filhos, nego vai lembrar um pouquinho do que disse a respeito do valor e da

função do som em nossas vidas.

Quando meus filhos pensam alguma coisa, elaboram idéias ou fazem algum planejamento mental,
tudo isso
tem que se materializar de algum jeito no mundo, não é mesmo?
Ah! Meu pai, agora me lembro um pouco do que o senhor falou...
Pois é. Dessa forma, o som é uma das principais formas de materialização do pensamento na realidade



objetiva da vida. Quando nosso Senhor Jesus Cristo fez as coisas no mundo, ele foi considerado a
palavra viva de Deus. E a palavra divina ou o verbo divino é, para nós, a precipitação do pensamento
do Pai.


O som tem essa função, de condensar certas energias, certos pensamentos, e fazer com que repercutam
nos


planos astral, físico e etérico, de acordo com as características e disposições advindas da fonte.
Quando vocês provocam um som e esse som obedece a um ritmo, produz-se um efeito que varia
conforme a


cadência entoada. Isso é válido desde uma cantiga que desperta a saudade a uma música que irrita o
pensamento e as emoções de meus filhos.
"O atabaque produz determinado tipo de som. Se for explorado por uma pessoa que entenda da lei do


ritmo, da harmonia, e saiba como conduzir esse som de modo a atender a um propósito específico, ele


será um
bom instrumento. Quando tocado no ritmo de algumas cantigas dos orixás, o som dos atabaques
desperta


energias primárias em meus filhos, movimentando a força dos chacras localizados na região inferior,
abaixo do umbigo."
Eu já senti uma força quase me dominando, uma vez


— interferiu grosseiramente um dos filhos do pai-velho.
— Quando fui a um lugar onde tocavam atabaque, senti que minhas pernas pareciam querer se
movimentar.
Uma coisa parecendo um fogo subia dos meus pés...
Sei, meu filho

— tornou o pai-velho delicadamente, enquanto os outros filhos seus olhavam o colega de soslaio.
— O que você sentiu provavelmente foi a vibração que o som do atabaque provocou em você te que
repercutiu imediatamente em seu sistema nervoso.
Isso não tem qualquer relação com espírito ou fenômenos da mediunidade. Trata-se apenas de uma
reação
nervosa e emocional que pode muito bem ser dominada por você. Mais outro levantou a mão entre os
presentes, pedindo a palavra:


E então, Pai João: por que nós não usamos o atabaque em nossos trabalhos?
Pois é, meu filho. A pergunta é muito interessante.
Em nossas atividades não temos necessidade de certas energias e, por conseguinte, de alguns


instrumentos usados em outros terreiros. Isso não significa que esses instrumentos não tenham valor.


Percebem? Ser útil não é um atributo absoluto, mas relativo ao contexto em que se aplica.
Determinado
remédio pode ser bom e eficaz, o que não implica seja adequado para este ou aquele caso. Em nosso
meio, aos poucos temos procurado retirar algumas expressões de religiosidade cuja função, ao menos
para nós, se extinguiu.
"Mas veja bem, meu filho. Não fique pensando que quem emprega instrumentos de trabalho diferentes
daqueles que usamos estejam errados ou sejam atrasados na vida espiritual. E que se ocupam com


energias
ainda primárias e só conhecem essa forma de interagir com elas. Por outro lado, estamos aprendendo a


lidar de outra maneira com tais energias, e é por isso que não temos mais necessidade de instrumentos
daquela
natureza. De mais a mais, qualquer que seja o instrumento, a eficácia do método depende em larga


medida


da dedicação, da habilidade e do conhecimento de quem o opera, bem como da resposta mental e
emocional
das pessoas envolvidas.
"Em resumo, o que nego-velho quer dizer é que não devemos julgar ninguém porque lança mão de


vestes, rituais ou instrumentos diferentes; enfim, qualquer item que, em nossa comunidade, julgamos
desnecessário.
Em matéria de espiritualidade, vale muito mais a intenção e o coração do que as palavras bonitas, a


roupagem externa ou mesmo a maneira como se pretende buscar a vida espiritual.
A forma não é nada se não há força moral, força vital ou o poder iniciático real e verdadeiro. Mais do
que espiritismo, umbanda e espiritualismo


— com ênfase nos "ismos" das religiões
— precisamos mesmo é de mais espiritualidade, ou seja, de uma visão mais abrangente das coisas.
"Vejam bem como ocorre com algumas pessoas que usam o método dos passes. Não adianta a pessoa

estender as mãos, querer ser magnetizador, se não sabe como funciona o processo e não domina sequer
os
rudimentos de como manipular as energias que pretende administrar. E preciso estudo constante para


aperfeiçoar a forma de servir.
Porém, não basta: também é preciso a pessoa ter axé, isto é, a força espiritual outorgada pelo Alto.
"Por isso vemos muitos filhos-de-santo ou simplesmente pessoas de boa vontade por aí a fundar
terreiros de umbanda ou centros espíritas que, apesar de certo conhecimento adquirido em alguns anos
de estudo, não têm força espiritual para solucionar os problemas que naturalmente se apresentam na
jornada.


Não são dotados daquilo que se convencionou chamar de axé, a força superior para manipular as
energias;


não são iniciados."
Mas, meu pai, então todo o mundo tem que fazer uma iniciação para manipular certas forças da
natureza?


Nego-velho não quer dizer da iniciação que se faz nos terreiros, que, em sua grande maioria, não passa
de um conjunto de rituais que não transmite a força ou energia necessária para a pessoa converter-se
verdadeiramente numa iniciada.
Muitos foram submetidos à iniciação num ou noutro culto, mas só possuem aparência de sabedoria;


participaram de um monte de ritos que não resolvem o problema de ninguém nem cumprem o objetivo
principal, que supostamente seria introduzir o indivíduo no conhecimento de determinadas leis
naturais.


Nem mesmo a própria pessoa que patrocina a iniciação consegue solucionar seus dramas por meio das
práticas recomendadas. Ou seja, quer ajudar o outro, mas não consegue nem ao menos se ajudar.
"Nego-velho refere-se, na verdade, a uma iniciação superior, realizada no plano espiritual, assim como

ao conhecimento das leis da natureza adquirido no passado remoto, em experiências de outras vidas,
através de anos e anos de dedicação. Para se ter uma idéia dos diferentes níveis de aprofundamento,
façamos uma

comparação entre o que significava iniciação em sociedades antigas e o que significa na atualidade.

Ainda que houvesse variações de cultura para cultura, os ritos serviam apenas para completar, coroar
um
processo de iniciação; a iniciação já havia ocorrido e se processado dos 7 aos 49 anos de idade,

período em que o pupilo permanecia internado no colégio de sábios, no pretérito.


Portanto, iniciar-se nos mistérios da natureza consistia em estudar, praticar, adestrar faculdades,

amadurecer e provar não só o conhecimento, mas a capacidade de administrá-lo. "Pessoas que
passaram por uma verdadeira iniciação, quando encarnadas, trazem um rastro de realizações atrás de
si. Não precisam fazer propaganda de seus dons ou de suas pretensas habilidades. Só se pode
identificar alguém com tal

força e energia superiores por meio das obras que realiza; em tor



no delas, há uma movimentação que revela a construção de algo maior, em benefício da humanidade.

Ao
contrário dos rituais pueris e sem maior significado de nosso tempo, a iniciação real não está atrelada
a recursos materiais e financeiros nem ao ganho à custa de dores alheias, tampouco se macula com
troca de

favores e com pagamento por serviços de ordem espiritual.
Na presente existência, a maioria dos iniciados verdadeiros jamais passou por rituais exóticos que
pretendessem fazer deles pessoas mais poderosas, zeladores de forças da natureza. Refiro-me a uma
iniciação constante, progressiva, espiritual, profundamente comprometida com a ética e o crescimento

do
espírito humano.
E algo bem distante das barganhas e fantasias pensadas para festas... Um dia, em longínquas culturas,
talvez guardassem algum sentido espiritual, porém hoje não passam de desfiles carnavalescos de que
sobressai apenas o cuidado com as coisas da matéria: a profusão de comes e bebes, as roupas vistosas

e

inusitadas, sem contar a disputa e o jogo sensual ou erótico, elementos que servem somente para
mascarar a pobreza espiritual de quem alimenta tais espetáculos de viciação espiritual."
Após breve intervalo para que seus filhos examinassem melhor as idéias por ele ventiladas, o pai-

velho
continuou, imprimindo novo enfoque à conversa:
—À parte essas coisas, hoje nego-velho quer falar de algo que julga extremamente necessário para

meus
filhos e irmãos. Diante de tanta gente que vem à procura de auxílio espiritual ou que, em seu

desespero, deseja encontrar proteção, nego-velho acha urgente que os filhos entendam um pouco mais
a respeito de
defesa energética. E preciso caminhar em busca de sua espiritualidade de forma tranqüila e com a
certeza de quem sabe lidar com energias contrárias,antagônicas ou mesmo discordantes.
"Meus filhos ficam muito à mercê de ataques energéticos, de fluidos malfazejos ou de outros tipos de

energia que acabam por minar suas defesas. Vejo muita gente boa se envergar diante de um ataque de


origem
energética e, pior: acreditando que tem espírito por trás de seu mal-estar.
Outros tombam com suas próprias questões espirituais, íntimas, e não se dão conta de que suas


emoções é


que estão desajustadas e os fazem vacilar. Alguns reclamam de peso nas costas, dor na coluna,
cansaço
sem motivo aparente ou incômodos que se manifestam aqui ou ali.
Percebo que meus filhos desconhecem questões simples da vida espiritual que poderiam levá-los a
significativo ganho na qualidade de vida." Antônio de Freitas aproveitou uma pausa na fala de Pai


João e transformou suas dúvidas em palavras:


—Eu mesmo, meu pai, muitas vezes senti como se quisesse desistir da minha jornada de
espiritualidade.
Senti tanto desânimo outro dia que julguei que tudo a minha volta conspirava contra mim e passei a
considerar que estava a tal ponto desequilibrado que o melhor a fazer era afastar-me dos trabalhos.


Estava convencido de que minha presença prejudicava os demais.


— Pois é, filho, comentou afetuosamente o benfeitor.
— Como você, muita gente envolvida com o trabalho espiritual fica remoendo certos pensamentos em
sua
cabeça, devido muitas vezes a uma insatisfação pessoal. Em vez de se pronunciar, ou procurar ajuda,
faz da insatisfação um trampolim para se afastar do grupo em que milita.


Esse é um tipo de desgaste de origem mental e emocional que afasta muita gente do trabalho. A
pessoa

chega a se sentir culpada de algo que não sabe o que é e nem imagina que seu mal-estar é sem
consistência. Afasta-se gradativamente do trabalho: primeiro, distancia-se das tarefas mais simples;
depois, parece não se enquadrar mais nas idéias que fazem parte da coletividade e são características
do

agrupamento. E como se estivesse alheia a tudo e a todos.
O passo seguinte é achar que os outros a deixaram de lado, não mais se comunicam com ela nem a
convidam para as tarefas. Sente-se incomodada com algo que, na verdade, é de sua inteira

responsabilidade.


Ou seja, é o indivíduo que está desajustado mentalmente e envolve-se com situações outras, que
acabam

por ocasionar seu desligamento da tarefa ou da meta espiritual, permitindo-se assim boicotar a própria
escalada de sucesso espiritual. Para isso tudo nego-velho tem um nome, que é desequilíbrio energético
e

emocional.
E tem remédio pra isso, meu pai?
O remédio está na própria natureza, meu filho respondeu o pai-velho.


— Seja dentro da própria pessoa ou na natureza em si. O certo é que muita coisa depende de se
desenvolver uma postura mental e emocional sadia. Antes de qualquer coisa, é preciso ver que a fonte
do problema está em si mesmo. Nada de culpar o outros por seu fracasso espiritual ou pela situação
interna que traz
incômodos variados.
A gente pode entender um pouco melhor a respeito de como combater esses males, meu pai?
—tornou a perguntar Antônio de Freitas.
__É preciso agir a tempo, meus filhos, sem delongas. Muita gente reage às situações. Alguém toma
uma atitude e, como reação a esse movimento externo, o sujeito caminha como se tivesse desperta
do de um sono letárgico. Nunca toma a dianteira.
Por isso pai-velho diz que se deve adotar uma atitude provativa, isto é, que envolva ação; é preciso ser


o fator de realização, aquele que gerencia suas escolhas, toma as rédeas de sua vida nas próprias mãos
e não apenas tem reações aos atos de outrem.
"Quando você toma a decisão de fazer alguma coisa e a faz, você movimenta energias, e movimentar
implica deixar de lado a ociosidade espiritual, emocional ou energética. Eqüivale a fazer uma faxina
em seu interior e limpar tudo de dentro para fora. Esse é o resultado de uma atitude deliberada, de uma
ação construtiva.

Fazer alguma coisa, e não apenas pedir ajuda ou deixar que outros façam por você."

Muitos vêm aqui na cabana pedir por um descarrego, Pai João, que a gente reze por eles, ou ainda

pedem passes que querem tomar. O que o senhor pensa a respeito?

É bom pedir ajuda, meu filho. Muitas vezes a gente precisa mesmo é de aprender a gritar por socorro
quando não damos conta de carregar, sozinhos, o peso de nossos incômodos. Mas não deve esquecer
que, embora


a eficácia de certas energias da natureza ou de certos métodos de manipulação energética, esses
elementos só serão eficientes quando a pessoa que as recebe estabelecer em si uma atitude de
autodefesa energética ou autodefesa psíquica.

Fazer um descarrego com ervas, passes ou outro método qualquer consiste apenas em se tomar
empresta

das energias alheias em benefício próprio.

Quando tais energias se esgotam, pois que são um empréstimo, volta-se ao estado anterior. Sendo
assim, a única maneira de restaurar o equilíbrio é desenvolver novas posturas íntimas, mentais e
emocionais capaz de gerar em si o estado almejado, preferencialmente enquanto dura o suprimento
externo.

"Banhos, defumações, passes ou qualquer outro recurso empregado na defesa de meus filhos só será
eficaz

caso desenvolvam uma atitude mental e emocional sadia. Não adianta pensar que os espíritos
resolvem tudo, porque não resolvem. Não temos resposta para todas as perguntas, nem sequer
sabemos solucionar os

problemas que vocês mesmos originaram".

O máximo que podemos fazer é direcionar meus filhos, mas isso não exime cada um de caminhar com
as

próprias pernas, com os próprios pés. E vivendo e desenvolvendo uma ação construtiva e ética diante
da vida que meus filhos se sentirão ao abrigo de forças inferiores.

Rezas fortes nem banhos, ebós nem sacudimentos conduzirão ao objetivo desejado se meus filhos não

aprenderem a viver intensamente e com profundo respeito a espiritualidade e os conceitos de defesa

psíquica." Dando novo enfoque a suas palavras, para melhor traduzir seu pensamento de orientador
evolutivo daquela comunidade, arrematou:

— Com o tempo, meus filhos,continuou o espírito milenar que se apresentava na roupagem fluídica de
pai-
velho, os homens se libertarão da dependência de muletas psíquicas. Muita gente tem imensa boa
vontade

em sua expressão de religiosidade, mas ainda se conserva prisioneira de expressões e convicções
primárias e dispensáveis no caminho da espiritualidade.

Enquanto não atingem um estado de independência espiritual, reclamam elementos mais ou menos

educativos, que funcionam como alavancas em sua caminhada evolutiva. Muita gente deixa de estudar
e


experimentar vivências superiores, libertando-se de crendices, para ficar cativa de suposições pessoais
cegas, as quais carecem de comprovação. Outros indivíduos, alguns dotados mesmo de vontade firme,
encontram-se presos a crenças impostas por pseudo-sábios e mestres que mantem fascinada a


multidão.
Até em certas expressões religiosas louváveis encontramos pessoas prisioneiras dos efeitos quase


hipnóticos de cânticos, danças e rituais esdrúxulos, que se apóiam na característica sugestionável de
pessoas inseguras ou imaturas para uma vivência espiritual mais ampla.
Mesmo sabendo disso, nós, os espíritos comprometidos com a libertação desse cativeiro da alma,


utilizamos alguns poucos recursos pedagógicos que teriam significado para certas comunidades
religiosas, a fim de


conduzir o maior número de pessoas a livrar-se de expressões primárias de espiritualidade.
Ainda não há como dispensar simbologias e um ou outro elemento que tenha representatividade para
os


encarnados. No entanto, aos poucos, vamos conduzindo meus filhos para a compreensão maior das leis
da
vida, na esperança de que, em breve, possam abdicar dos atavismos milenares que impedem vôos mais


altos nos céus da vida espiritual."
Com estas palavras, Pai João deu por encerrada a conversa com seus filhos, a fim de poder atender o
povo que chegava à tenda para clamar ajuda. Renovados com as palavras do pai-velho, os
trabalhadores daquele


recanto se levantaram para dar as mãos aos que sofrem, com maior vontade de servir e com um pouco
mais
de consciência de suas responsabilidades.
Os trovões e relâmpagos não impediram que a tenda de Pai João ficasse cheia de gente que pedia por
socorro espiritual. Aquele era um refugio seguro, e nem sempre os espíritos atendiam diretamente as


pessoas. Muitas vezes, ao emitir uma comunicação, eles davam por encerrada a sessão, deixando os
ouvintes refletir sobre o sentido daquilo que se pronunciara. Esse era o melhor remédio que os
benfeitores podiam indicar para muita gente.


"Eu tenho o corpo fechado, Xangô é meu protetor, afirma o ponto, meu pai, pai de cabeça chegou..."
Após uma pausa necessária para os preparativos do ambiente psíquico, o povo foi entrando no salão
onde os médiuns atendiam em nome da caridade. Ali os sensitivos eram costumeiramente chamados



de cavalos,


como uma forma alegórica de dizer que o cavaleiro ou condutor são os espíritos e eles, os médiuns,
são


guiados por aqueles mais competentes, que têm uma visão mais ampla da vida.
Como cavalos, seriam conduzidos, embora tivessem movimentos próprios, tal como esses animais.
Tinham a


liberdade de ir e vir, de atuar, interferir, impedir excessos, sendo responsáveis pelas ações realizadas
através de si. Não eram marionetes sem vida, mas obedeciam às intuições conforme o bom senso, a
razão.


O termo cavalo era apenas uma figura simbólica muito utilizada na linguagem cabocla, mas bastante
apropriada, considerando-se o tipo de trabalho que era realizado e os costumes locais.
Abstraindo-se dos nomes usados aqui e acolá, todos eram médiuns de seus guias, a serviço do amor ao
próximo, da caridade. Este era um aspecto que fazia toda a diferença nas atividades realizadas sob o
patrocínio do preto-velho Pai João: nada se cobrava pelas orientações dadas pelos guias espirituais ou


pelos serviços prestados pela comunidade.


Fazia questão de deixar muito clara a natureza filantrópica e espiritual de suas atividades junto àquele
agrupamento. Em respeitoso silêncio, as pessoas foram se acomodando nos bancos simples do salão,
construído em meio a várias árvores e jardins. A simplicidade, no entanto, não significava desleixo.


Tudo era muito arrumado.
As paredes claras com algumas samambaias e outras plantas faziam a decoração do lugar. A frente da
cabana ou do salão de atendimento ao público, uma espécie de altar, onde se via apenas uma cruz
simbolizando o compromisso com o Cristo, envolta num ramo de parreira, cujo simbolismo remetia


ao
espiritismo, às falanges do espírito Verdade.
Uma toalha branca alvíssima emoldurava o altar singelo, onde se concentravam as energias dos


médiuns e


visitantes. Era um condensador energético de grande potência, pois para ali convergiam as vibrações
dos
médiuns e dos benfeitores como se fosse uma bateria, pronta para ser utilizada a fim de abastecer a


corrente mediúnica em suas necessidades magnéticas.



Nenhuma imagem de santo nem qualquer outro adereço compunha o quadro, que, de tão simples,
passaria
despercebido a qualquer um que não fosse informado de suas finalidades. Dali irradiavam energias
benfazejas, que eram diariamente renovadas pelos benfeitores daquela comunidade.
Não era um centro espírita, portanto não se poderia esperar que a forma de culto ou de intercâmbio

obedecesse ao rigor observado nos centros que chamavam de mesa ou nos que seguiam à risca as
convenções do movimento espírita. Era uma casa de caridade apenas, um templo em cujas
dependências se

praticava a lei da caridade conforme os espíritos mais simples ensinavam. Nada mais.

Ouvia-se, desde o salão, um cântico suave, harmonioso, que vinha dos aposentos atrás da mesa-altar
ou
condensador energético. Era o local onde se reuniam os médiuns, preparando-se para o atendimento ao
público. Todos se movimentavam tendo em mente a santidade do lugar, conforme Pai João ensinara.
Um a um os médiuns tomavam seu banho de asseio para depois entrar em contato com as energias
benéficas da natureza extraídas das plantas. Era o banho de ervas, conforme haviam aprendido. Afinal,

os médiuns vinham todos de suas atividades diárias, de seu trabalho.

Segundo o ensinamento recebido dos benfeitores de suas atividades, durante o banho mentalizavam
uma
limpeza não somente física, mas sobretudo energética. O banho com o perfume das ervas remetia às

forças
da natureza, de onde tais ervas eram retiradas, de acordo com as instruções dadas previamente pelos
pretos-velhos.
Os médiuns respiravam fundo, faziam uma oração; ao despejar o banho sobre si, reabasteciam-se de


fluidos balsâmicos, preparando-se para o atendimento aos consulentes.
Ali, tomava-se precaução quanto às eventuais energias daninhas e discordantes que alguém porventura
trouxesse impregnadas em sua aura. Ao exalar o cheiro das ervas do próprio corpo, os médiuns, muitas
vezes sem o saber, contribuíam para que o consulente pudesse aspirar o magnetismo primário da


natureza.
Isso fazia diferença. O perfume natural das substâncias medicamentosas penetrava fundo através do



olfato e atingia certas regiões do cérebro, liberando químicos que favoreciam novo estado
consciencial.
Os próprios médiuns, ao inspirar o perfume e as essências aromáticas, colocavam-se em sintonia com
energias balsâmicas. A higiene física realizada antes dos trabalhos predispunha à higiene mental e
emocional, proporcionada pelo contato com a natureza.
Conforme Pai João falara para seus filhos certo dia: "Se vocês não convivem tão intensamente com a


natureza, meus filhos, vamos trazer a natureza para perto de vocês através das ervas".
Na atualidade ainda há quem conteste a eficácia dessas técnicas; contudo, entre aqueles supostamente
mais esclarecidos, esses métodos caboclos são chamados de fototerapia. Mudam-se os nomes, a
nomenclatura,


mas o ensinamento e os efeitos são idênticos.


Os médiuns vestiam-se de branco, essas roupas eram feitas de forma simples, sem adereços, colares
ou
qualquer outro tipo de enfeite. Apenas a roupa, que era preparada especialmente para o trabalho. A


adoção desse comportamento ocorria para que os médiuns não precisassem permanecer com suas
próprias roupas


durante os trabalhos práticos, pois muitas vezes estavam sujas, usadas ou com odores desagradáveis,
O frescor e a limpeza dos trajes refletiam o cuidado com o aspecto externo, lembrando da necessidade
de


preparar-se internamente. A roupa branca, além de revelar um aspecto simbólico que lhe é inerente,
transmitindo asseio e leveza, apresentava também a vantagem de ser fácil de lavar e de extrair dela
possíveis manchas. Todos ali cultivavam um sentimento de respeito muito profundo para com o

trabalho
mediúnico. Algo que, aos poucos, muita gente perdeu.
Em alguns locais, os indivíduos penetram em ambientes dedicados ao trabalho espiritual como se
adentrassem uma reunião qualquer. Com freqüência, os trabalhadores vêm de suas atividades

profissionais e nem sequer têm tempo de passar em casa para a higiene pessoal ou para reabastecer-se
energeticamente.
Comumente, as roupas impregnadas de poeira ou de outros elementos, como os resíduos da poluição
atmosférica, são as mesmas com que adentram os ambientes de seus templos ou casas espíritas e com


as


quais atendem o público. Não que isso seja errado, mas pode refletir a perda, observada em muitos
lugares, do sentido de santidade que envolve o intercâmbio com os benfeitores espirituais e o respeito
para com

aqueles que são atendidos, de um e outro lado da vida.
Quantos levantam os braços para aplicar os passes curadores, exalando cheiro tão desagradável que se
anula o resultado esperado, devido às reações causadas nos consulentes?
Em outras ocasiões, a roupa inapropriada do trabalhador desagrada os conceitos mais simples de bom


senso e respeito: curtas ou apertadas demais, evidenciando partes, e decotes em excesso, composições


esdrúxulas ou simplesmente trajes criados para o lazer, e não para o trabalho.
A fim de evitar situações semelhantes, Pai João definiu entre os seus filhos a adoção de algumas
medidas naquele recanto de trabalho. Além do uniforme branco, todos deveriam realizar a higiene
física e energética ali, antes do atendimento ao público.


Após os banhos de asseio e com as ervas, os médiuns deveriam receber o passe magnético antes de


adentrar o salão de atendimento ou as salas de manipulação magnética, local onde eram tratados os
casos
mais graves de saúde e alguma emergência de natureza espiritual ou energética. Aquelas não eram


regras
rígidas, que nunca pudessem ser quebradas.
Aliás, Pai João adiantara para seus filhos, os trabalhadores do remanso de paz, que toda regra é para


ser quebrada quando necessário, uma vez que imprevistos surgem aqui e acolá. Era necessário pedir a
sabedoria do Alto a fim de entender quando e como agir; em que momentos deveriam se apressar ou


diminuir o ritmo da caminhada e, ainda, quando precisavam simplesmente parar, a fim de evitar zelo
em excesso, o
que, em geral, se aproxima perigosamente do fanatismo religioso.
Na hora em que os médiuns penetraram o ambiente onde se encontrava o público, já encontraram um


lugar


harmonizado. Aroma de ervas muitíssimo discreto exalava não se sabia de onde. Era algo muito sutil,
quase imperceptível, não agressivo ao olfato nem a alguma sensibilidade.
Quando as pessoas ingressavam no salão, as precauções energéticas já haviam sido tomadas. A


limpeza
fluídica do ambiente já se realizara, e as vibrações necessárias à manutenção da harmonia já haviam



sido feitas anteriormente. O respeitoso silêncio dos consulentes daquela noite, e de tantas outras, era


algo
notável. Tinham em mente que o lugar era dedicado ao intercâmbio com os representantes do bem
maior,


das fraternidades do espaço e consagrado ao contato com os próprios benfeitores.
De branco, os médiuns lembravam enfermeiros que, instantes antes, haviam se preparado e se


higienizado e então estavam aptos a receber os médicos do Alto, que atenderiam os convidados de
Jesus, os necessitados de carinho, de aconchego ou simplesmente de uma palavra amiga.
Música suave e com tons harmoniosos começou a ser cantada por um dos médiuns, acompanhada


pelas


notas harmônicas de um violão, dedilhado por alguém que sabia como dar o tom certo a fim de tocar
os
corações. Era uma cantiga que lembrava o paraíso espiritual; era uma cantiga de Aruanda.
Após a prece de abertura dos trabalhos, um a um os médiuns foram incorporando seus mentores. Pai


João


assumiu seu médium em conformidade com as práticas daquele recanto de trabalhos fraternos. Em
silêncio,
os presentes ouviam a mensagem do pai-velho, que abria os trabalhos da noite:


— Deus seja louvado, meus filhos. Estamos aqui nesta noite abençoada para dar uma palavra de
conforto
aos filhos que vêm em busca de consolo. Nosso objetivo não é solucionar os problemas materiais nem
trazer respostas para questões de ordem íntima, vividas por todos.

Trabalhamos na tarefa do consolo, do esclarecimento e da cura espiritual. Não viemos substituir a
medicina nem os médicos. Nosso trabalho, meus filhos, é auxiliar, amparar de acordo com as
necessidades

energéticas e espirituais de meus filhos.

Vestimos a roupagem do pai-velho para que possamos falar aos simples, de forma simples. Não somos
mais
escravos, tampouco estamos aqui para satisfazer os desejos de quem quer que seja. Nosso intuito é
combater o preconceito, é indicar caminhos na busca da espiritualidade.
Se porventura houver algo mais complexo no histórico de vida de meus filhos, faremos de nossa parte

o


possível para orientar cada um quanto à melhor maneira de se libertar das complicações de origem
espiritual ou energética. Mas não pensem que resolveremos seus problemas nem que tenhamos
respostas para todas


as indagações e dúvidas. Não adivinhamos nada da vida de ninguém nem pretendemos fazer aquilo
que
cabe somente a vocês. Não trabalhamos por interesses mesquinhos, não fazemos casamento, não


arranjamos emprego nem pretendemos curar os males do corpo.
Também não lidamos com questões sentimentais ou conjugais. "Nosso objetivo aqui é de ordem
espiritual.


Tenham fé em Deus e confiem na força que existe dentro de vocês. Juntos podemos muito, e nessa


parceria
entre o esforço de cada um e as vibrações divinas é que serão vencedores. Deus seja louvado!" Após as
palavras do preto-velho Pai João, os consulentes foram encaminhados um a um para a conversa
fraterna e


consoladora com os espíritos que atendiam através de seus médiuns.
Perto de cada médium havia outro trabalhador, responsável por transcrever as prescrições e o
aconselhamento propriamente dito.
De repente, um dos presentes foi envolvido por uma energia estranha. Primeiro, foi um arrepio que
considerou como algo comum, natural, como tantos outros que já sentira.
Em seguida, Tony, que visitava a casa pela primeira vez, notou um pensamento estranho imiscuir-se


em sua mente, como se fosse tateado por tentáculos invisíveis. Estava ofegante diante da presença de
alguém que não podia ver, embora o percebesse de maneira intensa. Já sentira algo assim antes,
principalmente quando chegava em casa tarde da noite, após freqüentar alguns ambientes que ele
próprio julgava inapropriados.


Certo dia, viu-se quase arrancado de seu próprio corpo, como se alguém estivesse empurrando-o ou
querendo assumir o controle de sua mente e de seu corpo.
Era uma força estranha, uma presença marcante. Em ocasiões como essa, seus braços movimentavam-


se


de modo involuntário e a cabeça parecia ganhar vida própria. Era como se sua voz se modificasse
levemente e ele começasse a pronunciar coisas que não tinha o costume de falar.
Depois de tentar os recursos da psicologia, inclusive fazendo regressão de memória, qual não foi sua



surpresa quando se ouviu falando com o terapeuta num timbre de voz desconhecido. Não conseguia


dominar-se nesses momentos. Foi então que um amigo o conduziu à tenda onde agora se encontrava,
para
uma entrevista com os espíritos, a fim de que pudesse compreender o que se passava.
Agora Tony estava ali, sentado e aguardando o seu momento de falar com o preto-velho, quando


aquilo tudo, aquela sensação estranha, parecia querer eclodir novamente. Tinha medo de si mesmo.
Seria essa força um

espírito?
Pai João, demonstrando conhecer o quê se passava com Tony, interrompeu sua conversa com a
consulente


que atendia e pediu a um dos trabalhadores que conduzisse o rapaz a um cômodo ao lado.
Lá deveria receber um passe, uma transfusão de energias; tal iniciativa serviria para acalmar a


entidade e também para revigorar o moço, que sofria visivelmente ao tentar conter o assédio
espiritual, embora não
conhecesse o bastante a respeito do assunto para obter completo êxito.
Pai João retomou sua conversa com a mulher que lhe pedira auxílio:


— Sabe, minha filha, muitas vezes os filhos de Terra desconhecem certas questões espirituais e não
atentam para o fato de que suas atitudes definem o tipo de energia que atraem para si. Tudo é sintonia
neste mundo de Deus.
E preciso ficar atenta, porque todos vocês estão mergulhados num oceano de energias, com o qual

interagem o tempo inteiro. No mundo, estando encarnado ou não, não podemos deixar de pensar que
nossas
ações, pensamentos e emoções são poderosos instrumentos de elevação ou de queda.
Portanto, filha, pense um pouco em como você tem conduzido sua vida; como tem agido ou reagido

em face

das diversas situações que tem encontrado como desafios. Ao que parece, filha, você tem criado em
sua
mente os próprios fantasmas que a perseguem e julga que tem coisa-feita, magia ou maleita que

alguém
imaginário está enviando contra você.
"Nego-velho pede apenas que possa sondar seu interior e procurar em seus pensamentos a própria


fonte de tudo o que julga estar lhe atingindo. Minha filha tem gerado energias a partir de sua atitude
mental, do tipo de pensamento que está alimentando e das emoções que acompanham tais
pensamentos. E é natural que esse

padrão específico de imagem mental, oriunda de si própria, atraia emoções e imagens compatíveis,
com o

mesmo peso ou teor energético.

Essa é a magia mental, talvez a mais difícil de ser enfrentada, pois exige da pessoa uma mudança de
rota, uma redefinição para modificar completamente o foco de sua atenção e educar as emoções e
sentimentos

com vistas a melhorar a qualidade da vida íntima."

Mas, meu pai, falou a consulente.

— Eu tenho me sentido dividida entre o que devo fazer e as minhas emoções...
Você está numa encruzilhada energética, minha filha, tornou o pai-velho.
— É o entroncamento entre razão e emoção. Aí, nesse exato lugar, é que se define a vida de muitos
filhos de Terra. Sabem que há algo errado ou que precisam mudar, modificar a rota e estabelecer novo
rumo ou nova
meta pra suas vidas. Contudo, minha filha, tão-somente saber disso parece não servir de impulso para
as
realizações.

É que as emoções de meus filhos encontram-se comprometidas ou desarmonizadas, e, embora saibam
intimamente qual é o caminho, querem que as coisas se modifiquem de acordo com suas emoções, e
não o

contrário; querem que o mundo se adapte a si, e não o contrário.
Desejam que as emoções, freqüentemente desajustadas, estejam acima da razão e sofrem por ver que a
realidade não é assim. Ninguém consegue mudar a lei divina, minha filha. Não há como fugir da
responsabilidade de ser o próprio semeador de sua felicidade ou infelicidade. Não adianta culpar

espíritos, procurar coisa-feita ou mandinga ou mesmo tentar fazer um trabalho para mudar a situação.

Somente você
poderá fazer o trabalho operoso de modificação. Não há como mudar os sentimentos dos outros nem
as

emoções alheias.


"Mas existe uma maneira de você se modificar, de investir em suas próprias emoções, usando a razão
para

definir um estado melhor de vida mental e emocional para si. Não espere o outro mudar, filha; mude
você

primeiro. Comece em si mesma as mudanças que deseja no outro e verá como sua vida ganhará em

qualidade".

Tire esse negócio de mandinga, de trabalho feito ou de alguma maleita de sua cabeça; aprenda de uma
vez

por todas, minha filha: se há qualquer coisa que pode modificar sua vida para melhor ou para pior,
essa força parte é de dentro de você. É a sua própria mente que vai definir o tipo ou a qualidade de
vida que você terá deste ponto em diante.

"Pai-velho sabe que você está numa encruzilhada vibratória, dividida entre a razão e a emoção. Mas
vou lhe dizer, filha. Certo amigo bem mais elevado do que pai-velho disse uma vez que Deus colocou
a cabeça acima do coração para que a gente possa pensar primeiro antes de agir".

Vamos aprender com esse pensamento e traçar novos rumos para a vida. Não aja por impulso nem
baseada

nas emoções, porque se arrependerá sempre. Pare de reagir e aja; seja uma pessoa ativa, que toma as

decisões baseada num planejamento de sua vida.

Não transfira a outros, quer espírito ou encarnado, a direção de sua vida. Você é arquiteta da própria

felicidade, minha filha." Antes que a consulente pudesse falar mais alguma coisa, o pai-velho deu por
encerrado seus conselhos e, levantando a mão direita, evocou as forças superiores do bem às quais se

vinculava, rogando as bênçãos da misericórdia divina para a vida daquela que o procurava. Com essa

atitude, o pai-velho João Cobú ou Pai João de Aruanda deu por encerrada a conversa com a consulente.
Ele precisava atender o rapaz que naquele momento recebia o passe na sala ao lado.

Incorporado em seu médium, o preto-velho levantou-se da cadeira e dirigiu-se ao outro aposento,
enquanto no salão os demais médiuns atendiam aqueles que procuravam socorro emergencial.
Mentalmente, tateara

os pensamentos de Tony, o moço que sentia uma ação estranha sobre si. O pai-velho já sabia a forma
exata de abordar a questão.

Adentrou o ambiente reservado, onde poderia atender o caso fora do olhar atento dos curiosos,
respeitando a ética, que resguardaria tanto a pessoa quanto o espírito dos olhares alheios. Ali, em sua
tenda, Pai João optara por trabalhar apenas na presença de outros médiuns, sem expor o consulente
diante de outras


pessoas.


Ao chegar ao local onde estava o rapaz, rodeado por quatro trabalhadores da casa de caridade, pôde

perceber mais precisamente a dimensão do problema que o moço enfrentava. A princípio, o rapaz
lutava
intimamente contra a força que o pressionava, que quase o tornava impermeável aos fluidos

transmitidos

através dos passes. Quando o pai-velho adentrou o ambiente, aí sim, ele pareceu perder
completamente o
equilíbrio e cedeu lugar quase imediatamente à entidade que o acompanhava.
No mesmo instante, Pai João pediu a um dos médiuns que se colocasse à disposição para aquilo que na
umbanda se denominava puxada. O espírito que acompanhava o rapaz seria imantado à aura do


médium a
fim de ser encaminhado a tratamento.
Nada de força, nada de constrangimento.


— Este caso, falou baixinho o preto-velho para os outros médiuns presentes, é o típico caso do
encosto, conforme dizem meus filhos. Um espírito qualquer se sentiu atraído pela aura do rapaz e, de
modo bastante natural, sentiu afinidade com o comportamento dele. O espírito não pretende fazer mal
algum; porém, está quase que aprisionado magneticamente à sua aura.
Mas não adianta nada separarmos os dois se o moço não modificar a vibração de seus pensamentos e
emoções, adquirindo atitudes mais sadias. Vamos ver o que se pode fazer.
O pai-velho induziu um dos médiuns a ficar ao lado do rapaz, que se contorcia e chorava, como se


estivesse numa luta intensa.
Do outro lado da situação, a entidade tremia violentamente, quase em espasmos, literalmente grudada


à aura do rapaz. Energias sutis eram sugadas pela entidade, que subtraía de Tony fluidos preciosos,
porém em
grande medida comprometidos pela qualidade das emoções do consulente.
Eram fluidos pesados, que pareciam se esvair através dos poros ao mesmo tempo em que eram


absorvidos
pelo espírito errante o médium entrou em sintonia com o pensamento da entidade, e a transferência
magnética foi imediata, liberando Tony da influência estranha.


O espírito acoplou-se vibratoriamente à aura do médium e começou a se utilizar da sua voz para
expressar-se:

—Eu não tenho culpa — falou, quase gaguejando, a entidade através do médium Paulo César.

— Fui atraído para perto dele e, a partir daí, não consegui mais me livrar, estou amarrado a ele!
Sob a orientação do pai-velho, a entidade foi desligada fluidicamente da aura do consulente. Espíritos
amigos aproximaram-se do rapaz, manipulando energias magnéticas com tal intensidade que os laços
fluídicos com
a entidade foram desfeitos de imediato.
Contudo, via-se claramente que fluidos pesados ainda ficaram aderidos ao corpo espiritual de Tony.


Parecia uma fuligem, que impregnava a aura do moço, penetrando pelo interior de seu corpo.
—Você está com uma crosta de sujeira energética, meu filho, falou o pai-velho para o rapaz, que
recobrava seu domínio mental.

— É como se você, durante longo tempo, tivesse se envolvido com ambientes ruins e nocivos a sua
saúde
espiritual. Elementos de baixíssima vibração impregnaram sua aura. E olha que a culpa não é do
obsessor, mas é responsabilidade sua.

O rapaz baixou o rosto sensibilizado e, ao mesmo tempo, envergonhado.

— Sua conduta, filho, é que define o tipo de companhia espiritual que circunda ao seu redor. Não
adianta estar vestido de terno e gravata e ter um verniz social, sem uma vivência real de qualidade.
Pode até ser que você pense estar escondendo algo de seus amigos ou de alguma pessoa, mas sua vida,
na verdade, é um
livro aberto. Para nós, espíritos, as atitudes e os comportamentos se transformam em entidades vivas,
em energias poderosas, sejam eles bons ou maus.

É dessa forma que você atrai outros seres que se apegam a seus vícios e paixões e, de alguma maneira,

passam a se alimentar de seus pensamentos mais secretos, espelhando-se em seu comportamento.
Nem

sempre esses espíritos despreparados querem prejudicá-lo, mas com certeza a qualidade de seus

pensamentos e atitudes os excita e atrai. Por sua vez, através do processo de sintonia mental, eles
acabam por influenciar você também, embora nem sempre tenham consciência do que lhes ocorre.
Tenha cuidado,

filho, pois semelhante atrai semelhante.


Depois de algum tempo, oferecido para reflexão de Tony, o pai-velho arrematou:

— Fique mais um pouco por aqui e veja se assimila algum ensinamento para sua alma. Depois, vá
entrar em
contato com a natureza, respirar ar puro ou simplesmente tomar um banho de ervas de cheiro.
Os filhos que trabalham com pai-velho lhe darão as ervas e ensinarão o que fazer com elas. Do outro
lado da vida, espíritos especialistas conduziram a entidade responsável por parte do mal-estar de Tony
a um recanto da natureza. Um dos espíritos socorristas, cuja vestimenta fluídica tinha o aspecto de um
caboclo, trouxe recursos extraídos da natureza.

Dentro de uma espécie de pote, havia um preparado de diversas ervas, que lançavam no ar um cheiro
peculiar, um aroma forte e ao mesmo tempo agradável. O espírito que se afastara do rapaz aspirou o
perfume que exalavam, e o que se viu em seguida foram estruturas semelhantes a vapores densos


serem
expulsas ou exsudarem de seu corpo espiritual.
A tal entidade parecia adormecer lentamente, enquanto o aroma das ervas cumpria seu efeito


terapêutico,
sob a ação do caboclo juremeiro — isto é, especialista na força das plantas. Outros espíritos


especialistas nesse tipo de auxílio levaram a entidade a um posto de socorro no plano extra-físico,
onde certamente obteria mais recursos para recuperar-se e reeducar-se.
O caboclo que agiu sob a orientação de João Cobú era um profundo conhecedor das ervas e de outras
terapias naturais. Quando encarnado, fora um estudioso da fitoterapia e desenvolvera amplo


conhecimento
acerca da homeopatia. Escolhera trabalhar ali devido aos inúmeros casos que ofereciam grande
oportunidade de ser útil.
A roupagem fluídica de caboclo era referência a uma de suas existências, em que fora um velho


cacique


numa aldeia da Terra de Santa Cruz. Ali, naquela casa de socorro, desempenhava um papel
importante:
auxiliava na limpeza energética ou fluídica dos corpos espirituais. Recebia sob sua custódia espíritos
sofredores e outros mais, que acompanhavam as pessoas que ali acorriam em busca de ajuda.


Enquanto
isso, Pai João, incorporado em seu médium, dedicava-se à orientação, à conversa fraterna e a ouvir as


pessoas que o procuravam.


Retornando a atenção para a tenda, no salão onde se encontravam diversas pessoas se consultando com
os
médiuns incorporados, algo nada comum numa casa espírita, mas perfeitamente compreensível dentro


da
filosofia do culto umbandista, de suas práticas e costumes.
O pai-velho atendia uma pessoa que parecia interessada em conhecer algo mais a respeito dos


espíritos e da forma fluídica que adotavam ao se manifestar em outros cultos.


Venho aqui, Pai João, começou a falar o homem que pedia auxílio em seus estudos para entender um
pouco
como funciona o culto no formato da umbanda.
Eu não sou umbandista, mas espírita; portanto, nunca vi nada semelhante ao que ocorre por aqui.


Queria sua ajuda para meus estudos, a fim de obter maiores detalhes a respeito das diversas


manifestações espirituais em sua tenda.
Eu entendo, meu filho. Primeiro, louvo a Deus que alguém queira estudar um pouco das manifestações
tais


como ocorrem em locais ou cultos diferentes do seu, destituído de preconceito. Mas é bom que saiba,
meu
filho, que por aqui não se pratica a umbanda da forma ortodoxa, como outros irmãos umbandistas a
entendem; temos aqui uma espécie de transição em matéria de vivências espirituais.
Não posso classificar nosso método como umbanda propriamente dita. Estamos nos esforçando por
trazer apontamentos aos trabalhadores desta tenda, de modo a ensinar outros métodos tão eficazes


quanto os praticados na umbanda de raiz.
Os filhos que aqui trabalham estudam bastante, aprendem diretamente, no campo abençoado do dia-adia,


como lidar com os problemas de ordem espiritual.


Acredito que estamos, aos poucos, conseguindo liberar meus filhos do misticismo exagerado e de
certas
fantasias que são fruto de crenças irrefletidas, assim como educá-los para que possam dar um passo


além, em termos de espiritualidade.



"Contudo, aqui trabalhamos com caboclos, pais-velhos e outras entidades que preferem essa forma
fluídica a fim de cativar aquelas pessoas mais simples ou aqueles que se sentem mais afinados com
certos elementos

que são familiares a seu conceito de vida espiritual e sua cultura, do ponto de vista reencarnatório.

Também optamos por esse formato ou aparência fluídica porque, no plano astral, trabalhamos com
espíritos que, durante muito tempo, ficaram presos a crenças bem distorcidas ou mesmo a
interpretações equivocadas sobre a vida espiritual Apresentarmo-nos com o aspecto de pais-velhos ou
caboclos geralmente resulta em

mais impacto e maior respeito entre esses espíritos, além, é claro, de podermos cativar aqueles mais
simples, a quem dedicamos nosso trabalho e nossa atenção."

Mas não entendo por que vocês são chamados de pais-velhos, e não de irmãos, como nos centros

espíritas...

Pai, irmão, primo; tanto faz, meu filho. Você mesmo pode escolher o tratamento, como quiser. Os
filhos nos chamam de pais-velhos apenas como forma de distinguir aqueles espíritos mais experientes,
os responsáveis por sua condução ou orientação espiritual. O termo pai-velho significa apenas isto:
alguém mais experiente, mais vivido.

De todo modo, não se atenha a essas minúcias, filho. Chame-nos como quiser e estaremos próximos,

conforme a vontade de Deus, nosso pai. "Se bem que nego-velho também poderia questionar meu
filho sobre

o porquê de se referir aos obsessores, de maneira generalizada, como irmãos ou irmãozinhos, quando
na
verdade não há nenhuma identidade espiritual entre eles e aqueles que, ao menos em tese, buscam o
bem e

o amor do Cristo".
No mínimo, não se poderia chamar de irmão quem luta contra o estabelecimento do bem sobre a
Terra!
Acredito que essa acepção da palavra irmão seja exclusiva do movimento espírita. Agora, vocês

querem que em todo lugar onde se manifestem espíritos o vocabulário empregado seja o mesmo,
tomando por base a

forma comum a vocês?
Isso nego-velho não entende também. Se assim fosse, meu filho, como iríamos encaixotar as mentes
de

todas as pessoas que trabalham com manifestação mediúnica ao redor do mundo, de maneira que


falassem
do mesmo jeito, com as mesmas palavras?"
É, eu não havia pensado nisso...
Portanto, meu filho, fica a sua inteira escolha chamar um espírito de pai, irmão ou usar um pronome


qualquer, sem que nenhuma forma escolhida seja considerada errada.
Errado, no entender de nego-velho, é o preconceito arraigado, que se esconde por trás dessa idéia ou
questionamento.
Pare pra pensar, filho: por que será que o espírito de um pai-velho é rejeitado como se fosse inferior,


apenas por se manifestar como um ancião negro?
Unicamente por causa da aparência fluídica?
Será que no plano espiritual ou astral existe uma forma correta de manifestação ou uma prescrição a
respeito?
Onde está escrito que todos os espíritos têm de se manifestar como brancos?
As vezes tenho a impressão de que muitos acham que a conformação original do espírito é branca...


Negro
ou indígena seriam formas transitórias, inferiores. "Por que, na forma espiritual de um negro, um


espírito não pode ser recebido entre aqueles que proclamam a fraternidade e se dizem representantes
do Cristo, que
nunca fez acepção de pessoa?".
Nego não consegue entender como em certos locais não se admitem espíritos de negros velhos, mas se
admitem de brancos velhos, padres, doutores ou o que for, que levam seus médiuns a falar com voz
embargada, quase curvados, adotando evidente aspecto de ancião, mas, como são médicos, letrados ou
católicos, e brancos são considerados quase anjos, são quase venerados.
Caso outro espírito se apresente como negro, envergando um pouco o médium e falando com voz
entrecortada, num tom ligeiramente diferente do habitual, logo ele é rotulado como obsessor, espírito


inferior,
'apegado a seu passado espiritual', e acaba rejeitado porque se utiliza de um vocabulário mais simples.
Engraçado... O espírito não tem de escolher alguma forma para se comunicar?



No entanto, nego-velho nunca viu alguém dizer que aparecer com vestes eclesiásticas era sinônimo de


apego ao passado, a despeito de todos os horrores patrocinados pela Igreja na história da humanidade.
"Pense nisso, meu filho, e reflita onde está a raiz do problema. Analise se não há uma contradição
nessa postura ante os espíritos ou, quem sabe, algo que ainda incomoda meus filhos desde a época da
escravidão moderna: o preconceito racial e religioso escondido sob o manto de conceitos espirituais
mais sofisticados".


Você sabe, os jesuítas também achavam que estavam fazendo um favor ao converter negros e


indígenas ao
catolicismo, ainda que à custa de ameaça, pois, afinal, estavam salvando-os do inferno! Intolerância,
falta de disposição em conviver com o diferente, adotar as próprias convicções como referência —
alguns séculos


depois, tudo permanece ainda muito forte na alma humana, não é, meu filho?".


"Pense mais: por que se podem receber antigos padres, freiras, médicos e orientais, enquanto no
mesmo
lugar os espíritos dos negros e índios não encontram abertura para trabalhar?".
Um pouco de pesquisa a respeito do passado do nosso país, meu filho, lhe dirá a respeito do que se


passou entre padres, irmãs de caridade e outros tipos que, no passado, abusaram dos negros e
indígenas e
veneravam pessoas procedentes da Europa e de países do Oriente como representantes de uma cultura


mais evoluída.
Passado algum tempo, ao se manifestarem em centros espíritas, é natural que ainda tragam resquícios
de


seu passado através da religiosidade exagerada e do preconceito transferido para a esfera extra-física."
Dando uma pausa para o homem pensar, Pai João continuou:
Agora, filho, vocês têm de ficar atentos, pois se padres e irmãs de caridade não conseguiram deter
a marcha do espiritismo como desencarnados, cuidado, muito cuidado, pois muitos deles se encontram
disfarçados numa roupagem de carne e intentam dominar os centros espíritas com uma catequese
castradora dissimulada de espiritualidade.
Pois é, Pai João, fico pensando em algo semelhante quando avalio o perfil das pessoas que geralmente
compõem a diretoria de nossas casas espíritas...



No entanto, deixando de lado minhas preocupações, queria entender melhor a natureza dos espíritos
que
tradicionalmente se manifestam na umbanda e noutros cultos semelhantes, especialmente quanto à
especialidade dos pais-velhos.
Como entender o tipo de atividade que realizam no plano astral?

— Quando alguns espíritos se apresentam com aspecto de pais-velhos, isso não implica
necessariamente
que tenham sido escravos ou negros em sua última existência. Muitos escolhem essa figura humana a
fim de estampar em sua vestimenta perispiritual algo que tenha afinidade com a cultura brasileira,
com a formação espiritual de nosso povo e, assim, aproximar-se das pessoas simples e atingi-las mais
facilmente. A forma exterior que ostentam tais benfeitores pode conter muito mais de simbolismo do
que revelar que tenham sido escravos.

Querem combater o preconceito e quebrar barreiras raciais, religiosas, sociais. "Há espíritos que
realmente foram negros e desencarnaram em idade avançada, embora nem sempre tivessem
conhecimento de

questões espirituais. Não se pode ignorar que muitos experimentaram enorme sofrimento e,
impotentes, sem ter como se defender, desenvolveram amarga revolta contra seus senhores.
Evidentemente, isso também

revela que não possuíam a devida maturidade espiritual".

"Por outro lado, posso dizer também que verdadeiros iniciados do passado glorioso de certascivilizações buscaram, no seio da mãe África, o meio de desempenhar seu papel, servindo de
referência para os povos

que precisavam de orientação, principalmente no momento em que se enchiam os navios negreiros
rumo à

terra brasileira.

Reencarnaram no Congo, em Daomé [atual Benim] e em outras nações da costa ocidental africana,
trazendo

o conhecimento de suas experiências passadas. Estes, sim, são os verdadeiros pais-velhos,em oposição
a
pretos-velhos.
Repare que o termo pai aqui é empregado com muito acerto, pois ressalta a dilatada experiência de
vida que tais espíritos possuem, algo muito bem representado na figura do ancião.


Necessariamente possuidores de algum conhecimento iniciático ou espiritual, os pais-velhos são


entidades geralmente mais experientes que os demais, inclusive que os pretos-velhos.
Claro que essa é uma separação didática; no dia-a-dia, ambos os termos são empregados sem
distinção: pai-velho e preto-velho. A rigor, entretanto, há diferença entre eles, conforme expliquei.


"No que diz respeito à forma astral escolhida pelos pais-velhos para se manifestar, não somente em
seus médiuns, mas no plano
extra-físico também, ela remete à idéia de humildade, sabedoria, simplicidade e experiência, próprias


da maturidade espiritual.


"Iniciados de antigas civilizações e, hoje, na roupagem fluídica de pais-velhos, tais espíritos possuem
vasto conhecimento acerca do desmanche de magia negra ou antigoécia, por exemplo.
São respeitados entre os representantes das sombras, na sub-crosta, e muitos deles, inclusive, são


temidos por essas falanges de obsessores. No campo da saúde, conhecem muito sobre os recursos da


medicina
espiritual e natural, tal como o uso de ervas, que meus filhos atualmente chamam de fitoterapia. Além
disso, os pais-velhos dominam o elemento ectoplasma, do qual são hábeis manipuladores. Sabem
empregar essa


substância a fim de materializar certos medicamentos, utilizados para a cura dos filhos da Terra, sem
contar sua extrema habilidade na área do magnetismo.
Eu não tinha idéia da procedência espiritual, tampouco da especialidade dos chamados pais-velhos.
Pois é, filho, mas como você veio em busca de conhecimento, Pai João gosta muito disso e aproveita
para falar a respeito dessas e de outras coisas importantes. E preciso formar uma idéia mais ampla
sobre a diversidade de espíritos que trabalham em nosso planeta.


"Examine, por exemplo, o caso dos caboclos. As entidades espirituais que se manifestam tanto em
seus médiuns quanto no plano astral com a vestimenta de caboclo não foram obrigatoriamente índios
ou


selvagens em sua última encarnação. Muito pelo contrário!


"Grande número dos espíritos que adotam a característica de caboclo tiveram seu caráter firme forjado
em templos do passado, principalmente entre as civilizações inca e asteca, entre outras.
Tal como ocorre com os pais-velhos, possuem íntima ligação com certas energias da natureza, tanto


quanto com a cultura da qual procedem.


Em virtude desse fato, preferem estampar a imagem de um índio, de um sertanejo ou de um
bandeirante em
sua vestimenta espiritual, em sua aparência.



Daí se pode entender por que alguns caboclos são recrutados para trabalhar ao lado de grandes
luminares

da espiritualidade, que foram sábios em sua última existência. Além de tudo isso, a forma astral do
caboclo também traz um simbolismo.

Representa jovialidade, energia, destemor e valentia, bem como capacidade de transformação eprogresso. É

a representação do jovem guerreiro, daquele que tem a característica de mudar o panorama, de
enfrentar os desafios da existência e modificar as situações menos favoráveis em outras mais nobres.

— Então os caboclos também foram iniciados em outras civilizações, como os pais-velhos?
— Não se pode generalizar, meu filho. Especialmente se considerarmos que, na umbanda e em certos
cultos
de transição, observa-se uma variedade de seres espirituais a que muitos dão o nome de caboclos.
"Antes de continuar com as explicações, é preciso dizer que este pai-velho está lhe dando apenas um
ponto de vista a respeito da variedade de manifestações.


O que estou lhe falando não é consenso nem mesmo entre os representantes da umbanda. No entanto, é
sob


esse ponto de vista que nego-velho quer conduzir seu olhar.
"Assim sendo, dentro da variedade a que me referi, temos os chamados caboclos índios. Eles integram
imensa legião de trabalhadores, guardiões, baluartes da lei e da ordem, combatentes que são das
falanges do mal.


Como verdadeiros caças, saem pelo umbral afora em tarefas de defesa e disciplina, temidos que são


por
muitos espíritos das trevas. "Na umbanda e em outras expressões de espiritualidade, são comuns
outros tipos, tais como os boiadeiros, especialistas em desobsessões, coletivas e individuais, investem
contra as bases das sombras e destroem as fortalezas do astral inferior.


Dotados de grande magnetismo, são respeitados e temidos pelas entidades do mal, sobretudo pelos
marginais ou kiumbas, tão comuns em ambientes que oferecem grande perigo aos encarnados."
Após breve intervalo, para que o interlocutor pudesse assimilar o que dizia, Pai João prosseguiu:
Como já lhe disse, nego-velho está lhe dando uma explicação baseada não na teologia umbandista,

mas
na realidade cultural mais próxima da que você está habituado, meu filho.
Certamente encontrará outros pontos de vista sobre esse assunto entre os representantes da umbanda e


do


candomblé. Porém,nego-velho, neste momento, não tem por objeto religião e doutrina, mas a
descrição da
realidade espiritual que transcende as interpretações religiosas.
Entendo, meu pai. Se julgar apropriado conceder mais informações, estou aberto a ouvir e estudar.
Pois bem, meu filho, retomou Pai João calmamente.


— Ainda sobre a forma espiritual adotada por alguns espíritos, alguns caboclos adotam não a forma
do índio, mas do marinheiro. De alguém que viveu junto às águas, ao mar, portanto trabalhando com
emoções,
inclusive por ter vivenciado os tremendos desafios que envolvem a navegação: desde tormentas e

fenômenos climáticos até a solidão dos meses e anos singrando pelos mares, longe da família e dos
seus.
Na umbanda, bem como em alguns candomblés que recebem sua influência, chama-se freqüentemente

de

marinheiro aquele espírito que lidera falanges acostumadas a lidar com o sentimento e as emoções e
que
atuam no contato com o elemento água, que remete à suavidade e ao amor e auxilia na libertação de
vinculações magnéticas.
Quando se pretende fazer uma limpeza energética com suavidade, o elemento água é o mais indicado,
liberando fortes emoções que anuviem a visão espiritual dos filhos. E lógico concluir que quem teve
experiências reencarnatórias junto ao elemento água pode ser bastante eficaz nessa tarefa.
Era muita informação para aquele homem reservado, que não queria se expor perante os presentes. Era

ele
um representante do espiritismo e, por essa razão, não desejava, ao menos até aquele momento, ser
identificado numa tenda onde a manifestação mediúnica ocorria segundo parâmetros diferentes

daqueles
com os quais se familiarizava. Entendendo isso, o preto-velho vez ou outra dava um tempo para ele
refletir e depois de um suspiro, uma pausa, continuava.

— Os chamados kimbandeiros constituem outra espécie de caboclo. Sua especialidade é enfrentar os
magos

negros e seus dirigidos nos campos de batalha do umbral e da sub-crosta. Gostam de estar à frente das
demandas que ocorrem na esfera astral, muitas vezes nem sequer percebidas pelos médiuns.
Como se fossem generais guerreiros, trabalham para a defesa, porém com ênfase em limitar e cercear


a
ação das trevas, o que, muitas vezes, os leva a afirmar que transitam entre o bem e o mal.
Além, é claro, do fato de que conhecem em profundidade as artimanhas dos seres da escuridão. "Não


há dúvida, meu filho, de que nego-velho está procurando usar a linguagem mais espírita possível para


que
possa entender os diversos perfis e especialidades daqueles seres que trabalham na vibração da
umbanda,


em suas variadas manifestações e interpretações.
Por estarem ligadas à vibração e à atmosfera cultural, e não a rótulos religiosos, essas mesmas


entidades também militam nos centros espíritas, caso encontrem abertura dos médiuns e dirigentes.
Ainda que, em
certas ocasiões, optemos por nos apresentar em outra roupagem fluídica, conforme seja conveniente


ao
trabalho e tenhamos condições para tal."
—São tantas informações, meu pai... Simplesmente não imaginei ter à disposição tanto conhecimento


novo
para estudar e aprofundar minhas observações.
—Ah! Meu filho... Se Allan Kardec tivesse a oportunidade de estudar as manifestações da


mediunidade no
âmbito da cultura e da religiosidade brasileiras, com seus ricos e diversificados elementos, com
certeza ele desbravaria todo um aspecto da vida espiritual.
É impossível negar que as manifestações de caráter mediúnico revelam um país que é um celeiro de
médiuns, dos mais férteis no aspecto fenomênico.
No entanto, nego-velho deve dizer que, ao reverenciar e valorizar características e traços próprios do
desenvolvimento histórico e sociocultural do Brasil, não pretende aprovar ou sancionar certas práticas
exóticas e abusos que se encontram aos montes por aí. Não é mesmo, meu filho?



Quando o homem se levantou, agradecido pela conversa franca e aberta com o pai-velho, já estava


modificado intimamente. Com certeza teria muito para refletir a partir da conversa com o pai-velho
João
Cobú.
Os trabalhos se encerraram com uma mensagem do benfeitor e a prece final, realizada por um dos
trabalhadores. A noite ia alta quando os médiuns retornaram a seus lares para o repouso que antecedia


o
trabalho profissional, no dia seguinte.
"Entre o fogo e a espada, passarei despercebido e defendido. Entre a faca e o punhal, a bala perdida ou


dirigida, serei protegido, sarado e ungido pelo poder da cruz e as forças da luz."
"Aquele que habita no esconderijo do Altíssimo à sombra do Onipotente descansará. Certamente ele te


livrará do laço do passarinheiro, e da peste perniciosa. Não temerás o terror noturno, nem a seta que
voa de dia, nem peste que anda na escuridão, nem a praga que destrói ao meio-dia."
Mais tarde naquela mesma noite, viam-se os benfeitores dirigir-se às casas dos trabalhadores da tenda


de Pai João. Sob a orientação do espírito amigo que dirigia os trabalhos naquela seara, um a um os


médiuns
foram desdobrados, conforme necessário às tarefas da noite, e conduzidos a um sítio natural junto a
matas e cachoeiras, onde recebiam fluidos benéficos para seu refazimento. Um dos dirigentes
espirituais da


comunidade recebia pessoalmente os sensitivos ao redor de um lago esculpido em meio a um bosque
localizado na esfera extra-física.
A luz do luar refletia raios revigorastes sobre a natureza física e a astral, inundando a todos com


energias salutares.
0 espírito que atendia pelo nome de Macaia conduziu dois dos trabalhadores para o lago e com eles
levitou por sobre a superfície de água brilhante, que refletia o tom prateado do luar. Nenhum dos dois


sensitivos guardava lucidez extra-física de forma plena; assim, após retornar a seus corpos físicos,
horas depois, teriam somente vagas lembranças do ocorrido.
Pairando acima do lago, Antônio e Efigênia sentiram medo ao perceber que estavam andando sobre as
águas. Os demais companheiros de atividades, de pé nas margens, observavam atentos o que se


passava
com a dupla.
Macaia levou-os até um local que parecia ser o centro do lago e fez Antônio e Efigênia se deitarem



com as cabeças perispirituais voltadas para o norte. O espírito, especialista em magnetismo e no trato
com as forças elementais, aspirou profundamente o ar levemente rarefeito e aplicou um passe de sopro
em ambos os

trabalhadores, que, desdobrados em corpo astral, recebiam os benefícios da transfusão energética.
O sopro de Macaia estava impregnado de elementos vitalizantes, pois, a cada vez que ele enchia os
pulmões, absorvia do ambiente extra-físico mais e mais propriedades balsâmicas.
Os dois médiuns pareciam mergulhados numa onda de fluidos e energias que atuavam diretamente em


seu
centro de memória, liberando imagens mentais e clichês indesejáveis de seu campo mental. A uma
observação atenta, poderiam ser vistas pequenas bolhas, semelhantes a bolhas de sabão, que se


dissipavam mediante o sopro renovador.
Eram concentrados de formas-pensamento que os dois trabalhadores haviam absorvido de pessoas
atendidas durante os trabalhos de assistência espiritual.
As pessoas que chegavam à tenda em busca de socorro, principalmente se apresentassem quadro
emocional mais grave ou complexo, traziam criações mentais e certas concentrações energéticas de


baixa
vibração, as quais eram transferidas para a aura dos médiuns que os atendiam.
De igual maneira, os conteúdos sutis acumulados pelos médiuns costumavam ser absorvidos pelos
consulentes, quer estivessem aqueles em transe mediúnico ou não. Em razão disso, durante o sono


físico os mentores trabalhavam intensamente, liberando a carga de fluidos indesejáveis e
reabastecendo os médiuns
com novas e balsâmicas energias, conforme a necessidade de cada um e a capacidade desenvolvida de


armazenar fluidos mais ou menos sutis.
Não havia milagres, evidentemente. Depois de algum tempo, Macaia levantou as mãos e colocou-se
em


oração:
Supremo Pai e senhor da vida, concede aos teus filhos a oportunidade de se refazer com as energias da
criação, com os fluidos benéficos da mãe natureza. Cá estamos como trabalhadores teus, necessitados


da



proteção espiritual e de forças, a fim de prosseguir com a tarefa que nos foi confiada.
Respirando mais profundamente, prosseguiu:
Permite, ó Pai, que os elementais, criaturas tuas sob nossa responsabilidade, possam atender ao
nosso chamado e vir em socorro daqueles teus filhos que de ti necessitam.
Antes mesmo que terminasse a oração sentida, milhares de seres minúsculos, semelhantes a


pirilampos,


subiam das águas cristalinas do lago e envolviam não somente os dois médiuns atendidos diretamente
por
Macaia, mas também os demais, que permaneciam na margem.
O fenômeno inspirava elevados pensamentos de gratidão, tão fantástico se mostrava. O psicossoma


dos


médiuns foi envolvido por cintilações dos elementais, que pareciam sugar os fluidos densos
acumulados na aura dos trabalhadores.
Uma emanação semelhante a vapor, de coloração acinzentada, exalava levemente de cada corpo
perispiritual desdobrado na dimensão extra-física. Em contrapartida, outro vapor, na verdade uma


bruma
luminosa subia da superfície do lago e era canalizada pelos elementais para fins terapêuticos. Macaia
mantinha os braços elevados, como que a polarizar energias sutilíssimas que se derramavam de mais


alto.
Os demais médiuns, que ficaram à margem do lago, elevaram-se alguns centímetros no ar e pareciam
adormecer um a um, novamente, porém em corpo espiritual.
Neste momento, João Cobú aparece rodeado de trabalhadores da Aruanda, advindos das matas que
emolduravam o local.
Traziam cumbucas cheias de bioplasma e de outros componentes extraídos das plantas, que, sob a
orientação do pai-velho, ministravam aos médiuns adormecidos.


— Temos de cuidar bem de nossos parceiros, falou João Cobú para um espírito que se mostrava com a
aparência de um índio apache. Corpulento, olhar penetrante e irradiando forte magnetismo, o antigo
guerreiro conduzia o vasilhame que continha os extratos naturais, para que cada médium pudesse
inalar.


— Atendemos casos bastante complexos, que vários outros afirmam não se tratar de questões
espirituais.
Seja como for, as energias densas oriundas de tais processos aderem-se à aura de nossos médiuns e
devem

ser liberadas a todo custo, de modo que se reabasteçam, visando à continuidade das tarefas que
desempenham conosco.
Médiuns há que não se importam, nem ao menos se interessam pela higiene energética nem pelos
procedimentos de autodefesa psíquica; ignoram que, a fim de ser amparados pelos benfeitores que os
assistem, necessariamente devem se colocar em atitude receptiva, de abertura mental.
É uma ilusão acreditar que se pode realizar um trabalho intenso, do ponto de vista energético, e

permanecer com o próprio campo energético inalterado.

Ao mesmo tempo em que administrava os recursos da natureza aos médiuns que já haviam sido
submetidos
ao contato benéfico com os elementais da água doce, as ondinas, o espírito apache acrescentou ao
comentário do pai-velho:

— Os elementais são seres singulares e, para muita gente que lida com as questões espirituais e
energéticas, ainda envoltos em superstição e mistério; contudo, obedecem a uma vontade superior e
estão à disposição para auxiliar na manutenção das energias vitais, tão necessárias aos trabalhos desta
ordem. Não entendo por que nossos irmãos não recorrem com maior freqüência a esses seres da
natureza, tendo em
vista seu próprio bem-estar e o reabastecimento energético.
-Tais seres da natureza, elucidou João Cobú, incorporam em si as substâncias medicamentosas

próprias

dos sítios naturais aos quais estão relacionados, constituindo-se em expressões da natureza em estado
de evolução. Potencializam forças e energias, obedecendo às leis naturais.
Não podemos deixar de nos valer deles. Contudo, sua existência permanece ignorada pela maioria das
pessoas.


— E quanto à bênção oferecida pelas plantas, pelas águas e por outros recursos encontrados na
natureza?
Não vejo como desprezar esse manancial colocado pelo Pai à disposição de seus filhos.


Todos que lidam com os aspectos espirituais da vida em planos mais densos ou mesmo atendem


indivíduos
cujas emoções estão conturbadas e em ebulição poderiam ser abastecidos com os fluidos que exalam a
cura


e equilibram.
Sim, meu amigo, complementou João Cobú, uma vez mais.


— Entretanto, parece que algumas pessoas cheias de pretensa sabedoria ignoram certas propriedades
terapêuticas da natureza ou, então, relegam esses meios de amparo e refazimento a segundo plano,
como se fossem ferramentas menores, próprias de matutos ou seres inferiores. Talvez justamente por
serem

elementos simples demais, que estão à disposição de qualquer um... Enfim, continuemos com nossos

parceiros, os médiuns.

Eles precisam de nós tanto quanto precisamos deles. Os médiuns desdobrados eram atendidos pelos

espíritos do bem. A luz do luar canalizava outras energias também benéficas, para equilibrar os
centros de força do corpo espiritual dos médiuns. Embora estivessem quase todos ali, ainda faltava
um, devido ao fato de que estava trabalhando até tarde. Não fora tirado do corpo, como os demais, em
respeito ao seu trabalho profissional, que o ocupava num horário diferente.

Os espíritos sabiam respeitar o chamado "fuso horário" de cada um. Após o atendimento àquele grupo
de trabalhadores desdobrados, um espírito guardião dirigiu-se à casa de Tobias, que enfim se
preparava para deitar-se. Como era um homem religioso, recitava uma oração, conforme aprendera de
sua velha avó, antiga benzedeira. Acostumado com as palavras decoradas, sua mente respondia à
citação conforme ele esperava.

Habituou-se àquele tipo de oração e não a pronunciava como se fossem expressões vazias; ao
contrário,

acreditava naquelas palavras, no significado de cada uma, depositando emoção vigorosa à medida que
as

declamava, a ponto de fortalecer sua fé. Em virtude da resposta que obtinha de sua própria mente,
atingia o efeito desejado com a oração, isto é: a proteção energética.

Dizia Tobias: "Chagas abertas, sagrado coração, todo amor e bondade. O sangue do meu Senhor Jesus

Cristo no corpo meu se derrame hoje e sempre. Eu andarei vestido e armado com as armas de São
Jorge.

Para que meus inimigos, tendo pés, não me alcancem; tendo mãos, não me peguem; tendo olhos, não
me


enxerguem e nem pensamentos eles possam ter para me fazerem mal".
Respirando profundamente, pronunciou as palavras finais: "Armas de fogo meu corpo não alcançarão,


facas e lanças se quebrarão sem ao meu corpo chegar, cordas e correntes se arrebentarão sem o meu
corpo
amarrar...". Os guardiões chegaram à casa de Tobias exatamente no instante em que dizia as palavras


tidas por ele como sagradas. A proporção que recitava a oração, deitava-se lentamente, deixando seus


sentidos
em alerta para as percepções do mundo extra-físico. Ferreira, ex-soldado e um dos guardiões
responsáveis por Tobias, ao ouvir a reza de seu protegido perguntou ao companheiro de atividade:


Essa coisa de reza forte funciona mesmo ou é apenas crendice? Você sabe, estou há pouco tempo em
contato com este médium e preciso me inteirar de certas coisas...
Bem, pelo que me ensinaram em alguns cursos que fiz após meu desencarne, pode-se dizer que as


rezas
funcionam sim, mas de maneira diferente daquela que se divulga por aí.
Por exemplo: muita gente reza o Salmo 91, que é uma destas orações consideradas fortes e sagradas


por
muitos religiosos...
E ela faz um efeito interessante de se observar, segundo já presenciei. Quando a pessoa acredita


mesmo
naquilo que pronuncia, ao longo do tempo, à medida que repete a citação, seu cérebro e sua mente
processam as palavras de modo a obedecer àquela espécie de comando, formando algo similar a uma


aura
em torno de si.
Caso os dizeres dessas orações ou rezas de fato estejam calcadas em uma convicção pessoal, em uma
crença íntima genuína, então gradativamente passam a agir sobre a mente do indivíduo, que é


acionada com a finalidade de erguer um campo de forças, uma aura de proteção a seu redor.
É claro que, segundo essa ótica, palavras idênticas não têm o mesmo efeito sobre pessoas diferentes.
Portanto...
Portanto, não é a reza ou oração que tem um poder intrínseco, mas a crença pessoal, a força mental da
pessoa que pronuncia a oração e a energia depositada naquele ato.



Mais ou menos isso, Ferreira. Ocorre que, se por ventura a pessoa repetir determinada oração
acreditando verdadeiramente no que está realizando, sua mente aos poucos desenvolve a capacidade
de arregimentar

forças ou energias, que são atraídas para a própria aura. Tais energias têm um efeito cumulativo, ou

seja, quanto mais se exercita o pensamento, mais intensamente agirão em torno do sujeito.
-Então posso entender que as orações fortes ou rezas fortes funcionam como um tipo de muleta
psíquica


para alguns — ou, mais exatamente, um instrumento de que a mente lança mão e que, de acordo com a
vontade depositada nesse ato, pode desencadear um processo de autodefesa psíquica. Correto?
—Pelo menos é o que pude perceber em meus estudos. Veja o caso de Tobias — indicou o guardião,
sinalizando para o rapaz que se deitava justo é quem possa depreender dessas linhas que se está a
recomendar o uso de preces sacramentadas.
Não só não é assim, como as passagens demonstram perfeita coerência com o que afirmam os


espíritos na


codificação do espiritismo: "A forma nada vale, o pensamento é tudo. Ore, pois, cada um segundo suas
convicções e da maneira que mais o toque. Um bom pensamento vale mais do que grande número de
palavras com as quais nada tenha o coração" (kardec, Allan. 0 Evangelho segando o espiritismo. Rio


de Janeiro: feb, 2002.120a ed. luxo, cap. 28, item 1, p. 493).


Ora, é justamente o pensamento, a vontade e a fé que são destacados pelos personagens como
elementos
cruciais. De todo modo, é válido confrontar essa passagem de O evangelho segando o espiritismo com


outro trecho, logo adiante, no mesmo Preâmbulo escrito por Kardec para sua Coletânea de preces
espíritas: "O
Espiritismo reconhece como boas as preces de todos os cultos, quando ditas de coração e não de lábio
somente. Nenhuma impõe, nem reprova nenhuma" (Idem, ibidem, p. 494 — grifo nosso).
A aura de Tobias iluminava-se por inteiro quando pronunciava a chamada oração de São Jorge, que ele
acreditava piamente ser uma oração forte.


— Analisemos as palavras da oração feita por Tobias, prosseguiu Simas, o guardião que conversava
com
Ferreira.


— Ao introduzir sua prece: "Chagas abertas, sagrado coração, todo amor e bondade...", e por aí vai,
claramente relembra a crucifixão de Jesus. Essas palavras estabelecem ligação mental com o episódio
que
os cristãos talvez considerem o mais sagrado de todos e, provavelmente, o símbolo por excelência da
vitória espiritual.

Tobias evoca em seus pensamentos, portanto, a força moral do Cristo e sua misericórdia; pede amparo
superior da maneira que sabe pedir e segundo acredita. "Depois ele continua a oração, dizendo: 'Eu
andarei vestido e armado com as armas de São Jorge. Para que meus inimigos, tendo pés, não me
alcancem; tendo

mãos, não me peguem; tendo olhos, não me enxerguem e nem pensamentos eles possam ter para me
fazerem maP. Nesse trecho, o médium define uma postura mental de defesa íntima.
Como reafirma dia após dia tais palavras, com todo o seu espírito, elas alimentam uma decisão

mental,

consciente e portadora de força real, em que ele se vê e se coloca na posição de defesa psíquica. Ou
seja, proporciona um estado íntimo de segurança.
Na verdade, não são os espíritos malévolos que têm medo da oração, nem são os desastres e acidentes

que

evitam Tobias, mas é ele quem gera um comando mental de tal intensidade que sua aura se ilumina e
ele
passa a atrair forças do plano extra-físico capazes de envolvê-lo fortemente e lhe dar segurança.
Em matéria de segurança espiritual e energética, o importante é que a pessoa se sinta plenamente

segura e tenha atitudes compatíveis e coerentes com aquilo que busca, num nível mais amplo.

Em termos psicológicos, possivelmente esse hábito de Tobias pudesse se classificar como redefinição
ou
reprogramação mental e emocional, a que sua mente responde de modo eficaz."
__A oração então é uma mola propulsora, uma forma de desencadear ações mentais e emocionais para

se
estabelecer a atitude interna desejada...
—Exatamente! E funcionará contanto que a pessoa progressivamente se reprograme no âmbito mental
e emocional, de acordo com as palavras que recita.
Talvez se possa fazer um paralelo com o que os psicoterapeutas modernos realizam em seus


consultórios


utilizando a terapia de vivências passadas, conhecida como tvp. É costume eleger uma frase para o
paciente pronunciar durante algum tempo.
Ela deve refletir a nova postura mental e emocional que se estabeleceu na reprogramação.
Uau! Nunca havia visto a questão sob esta ótica!...
Examine a aura de Tobias após a oração.
Ambos encheram os olhos nas irradiações coloridas em torno de Tobias, o médium que pretendiam


auxiliar e conduzir para experiências fora do corpo. O rapaz parecia uma usina de energias potentes,
um gerador. De seu cérebro, onde se concentrava com maior intensidade o foco do corpo mental, raios
eram produzidos com tal intensidade que iluminavam completamente o ambiente do quarto do rapaz.

Fios tenuíssimos irradiavam de si, tateando o espaço ao redor até se fixarem nos dois guardiões,
como imãs, atraindo-os de forma leve e persistente, até o corpo deitado.
Veja que os raios que partem da aura de Tobias são atraídos automaticamente por nossas auras


pessoais,
observou Simas.


— É como se, através de filamentos elétricos, ele se ligasse a nós, seus guardiões pessoais.Ou seja, a
partir do estado induzido pela prece.
Tobias se conecta mentalmente com quem possível representar um fator de segurança energética pari
si. Neste caso, somos nós.
Mas não é somente isso que ocorre. Observe corre mais intensidade, disse com o dedo indicaria:
determinado ponto.


— Veja os corpúsculos mental que são liberados da aura dele. Os guardiões notaram algo semelhante
a uma
comunidade imensa de matéria mental desnecessária à manutenção do equilíbrio energético do
médium, que

era literalmente expulsa de sua aura.

Até então, tais corpúsculos mentais gravitavam em torno da aura do sensitivo, aguardando o momento
em

que se diluiriam em suas glândulas através do fenômeno da repercussão vibratória. No entanto, o
estado


íntimo no qual se abrigara através da oração estimulou seu corpo mental a produzir anticorpos
energéticos ou irradiações magnéticas capazes de liberar de sua aura os elementos daninhos ou
nocivos à sua saúde

espiritual.

— Antes de qualquer pessoa desejar e verbalizar seu desejo ou sua necessidade de proteção energética
e
espiritual, é mais sensato e inteligente que produza por si mesma as energias que geram um estado
íntimo de segurança ou que inspirem segurança. Só assim, nós, os guardiões, encontraremos
elementos para

trabalhar suas defesas energéticas, sobretudo no caso dos médiuns.

Explicando seus passos ao amigo Ferreira, o guardião Simas aproximou-se de Tobias, que a esta hora

estava sonolento sobre o leito. Levantou as mãos e aplicou-lhe um passe longitudinal lento, da cabeça

aos pés. Executados poucos movimentos, transcorrido tempo mínimo, Tobias já ensaiava sair do
corpo,

rodopiando em torno de si mesmo.
Embora a sonolência, o sensitivo notou quando as energias magnéticas de Simas o atingiram. Sentiu
um

formigamento nas extremidades do corpo, que lhe percorreu, gradualmente, todo o organismo. Após o

formigamento, Tobias percebeu uma irradiação, que se intensificou à medida que o guardião
continuava com os movimentos longitudinais.
O médium vibrava intensamente e se sentia como uma corda de violão tangida por hábil

instrumentista.

Estava em processo de decolagem do corpo e, tão logo se estabelecera suficiente cota de magnetismo
em
seu organismo perispiritual, subiu ao teto como um balão, para logo depois descer lentamente, até

ficar a poucos centímetros do solo.
Vamos, Tobias, o velho está esperando por você, falou Simas ao médium agora desdobrado.
Pai João? — perguntou o rapaz.
Quem mais? Não é ele quem nos orienta as atividades? O nosso amigo João Cobú está com os outros
médiuns desdobrados como você, em meio à natureza. Ele espera por nós.



Ferreira, de soslaio, observava o comportamento do médium, como a mirar cada detalhe de suas
atitudes
fora do corpo. Enquanto se dirigiam ao sítio natural onde os demais se encontravam, Ferreira, curioso,
perguntou ao amigo guardião:
Será que ele se lembrará de nós dois ou dos eventos que marcam esta noite?
Por certo se lembrará de alguns detalhes. Depende muito do que João Cobú decidir.
Quer dizer que as lembranças das ocorrências em nossa dimensão estão subordinadas à vontade


de quem coordena as atividades?
—Perfeitamente, Ferreira. O espírito responsável ou o amparador de cada médium é quem define se
ele deve ou não guardar certas lembranças.


Essa regra é válida para todos os médiuns a serviço do bem maior. Não obstante, em casos
particulares,
observa-se que o organismo de certos médiuns possui facilidade relativa para registrar ao menos
alguma parcela das lembranças do que foi vivenciado do lado de cá.
Após breve pausa, Simas alertou:


—Vamos logo. Afinal, os outros estão apenas nos aguardando a chegada.
Os três planaram sobre o lago onde se reuniam os demais, médiuns e benfeitores. Desceram
lentamente


perto do pai-velho, que os aguardava.
—Vejo que aproveitaram a tarefa para estudar um pouco, observou João Cobú.


— Gostei de ver como estão aprimorando o conhecimento de vocês.
Ferreira apresentou algumas questões que julguei apropriado esclarecer, compartilhando alguns
ensinamentos que tivemos no colégio dos guardiões.
Isso é muito bom. Compartilhar conhecimentos e experiências entre amigos de trabalho é o princípio
da

fraternidade universal. Ensaiamos assim a convivência pacífica entre irmãos, inclusive entre aqueles
que não pensam de forma igual.
Voltando-se para Tobias, o preto-velho perguntou:



__Então, meu filho, está se sentindo bem? Pronto para o trabalho?
Sim, meu pai! — respondeu Tobias, dando ênfase às palavras.

— Estou à disposição para servir.
Sem delongas, João Cobú convidou Tobias:
Vamos ao trabalho, então. Temos muito que fazer nesta noite.
Não vamos realizar os procedimentos de limpeza energética em Tobias, conforme foi feito com os
outros? Perguntou Simas.
—Não há necessidade. Tobias, ao deitar-se para dormir, teve uma atitude pro-ativa. Ele se cuidou
energeticamente e colocou-se ao abrigo de energias contrárias ou discordantes. Os demais confiaram
tanto em nós, Pai João fez questão de emprestar um tom diferente às suas palavras, quase irônico, que
não se cuidaram, ou melhor, descuidaram das defesas psíquicas. Esperaram que nós fizéssemos por
eles, como

realmente fizemos aquilo que poderiam ter feito por si sós.
Então perdemos um tempo grande com os procedimentos de limpeza energética que efetuamos nos
outros

médiuns?
Não que tenhamos perdido tempo, meu filho, mas é fato que empregamos uma cota de energia nesse
procedimento que poderia ter sido aplicada em outras atividades. Nem todos os médiuns têm atitudes
que exprimam segurança íntima.
Confiam que façamos tudo, e eles mesmos acabam por deixar de lado as obrigações pessoais

relacionadas a
sua defesa ou imunidade energética. Investe-se grande quantidade de energia a fim de preparar os

médiuns para o trabalho ou para liberar certos componentes magnéticos de suas auras. Caso
estudassem mais e,
além disso, tivessem atitudes mentais que os imunizas sem das energias nocivas, aproveitaríamos

melhor o magnetismo nosso e o da natureza para atender àqueles necessitados que nos procuram.

Dando por encerrado o comentário, João Cobú reuniu os médiuns, visando conduzir à tarefa
programada os
que apresentavam condições.


No leito, em suas casas, os corpos repousavam, sob a vigilância atenta de sentinelas especialmente
destacados para esse fim, enquanto essas experiências eram vividas em conjunto.
Porém, cada um, depois de acordar, conservaria apenas parte das memórias em relação ao ocorrido.
João Cobú conduziu alguns médiuns ao lar de Tony, o rapaz que procurara a tenda na última reunião.
Lá chegando, alguns médiuns tiveram dificuldade de penetrar no ambiente devido à densidade


energética,


incompatível com o estado vibracional de seus corpos perispirituais. João Cobú designou dois
guardiões e o médium Tobias para ajudar.
As emanações do pensamento de Tony criaram uma crosta suja em torno do local onde residia.


Espessa
película envolvia o ambiente extra-físico. Tal era a densidade de materialização que, entre os
encarnados desdobrados na dimensão extra-física ali presentes, apenas Tobias poderia ajudar mais


intensamente. João Cobú produzia sons na atmosfera, por meio dos quais arregimentava recursos da
natureza nas proximidades.
Mediante o comando do pai-velho, Tobias arrancava, com as próprias mãos, a película de matéria


mental
densa que envolvia a casa do rapaz.
Com as duas mãos, num trabalho notadamente braçal, o médium literalmente rasgava a dura camada


de


sujeira semimaterial que bloqueava o acesso à moradia de Tony. Quase materializados, os guardiões,
que
vibravam numa freqüência diferente da de alguns espíritos ali reunidos, auxiliavam o médium em sua


tarefa.


Podíamos contar com a ajuda de mais médiuns? pediu Ferreira a João Cobú e a Macaia, os espíritos
que
lideravam aquela comitiva e se apresentavam ao grupo de trabalhadores desdobrados como


responsáveis
por aquela tarefa.
Somente Tobias detém condições de ajudar mais de perto. Infelizmente, temos que contar só com ele,


pois
os demais, ainda que amparados por nós, têm a mente dispersa. Embora conduzidos por seus mentores



pessoais, neste mom

João Cobú abriu cam
conseguir
uma espécie de semi

arrancar com as mão
principalmente

por Tony.
Depois de algum tem
matéria

astral. Os outros méd
estavam confusos e n
na dimensão

extra-física, ao meno
Em seguida, o pai-ve

Adentraram o ambie
amontoavam nos can
dos cômodos da resi
aderidas às paredes.
—Isto vocês podem
paredes, que assumir
fazer em benefício d
Na mesa de cabeceir
permanecia ligada en

envolvido por dois e
em torno de sua
cabeça. Macaia adia

—Estas bolhas que v
São clichês que ele n
torno

dele são elementos e
os























tos, encomendados a outros com o propósito de resolver aquilo que cabe somente ao indivíduo.

Vi muitas vezes o senhor falando a respeito das imagens mentais, meu pai — interpelou-o nova mente
o
trabalhador. — Como elas atuam e exercem influência sobre nosso comportamento no dia-a-dia?

Afinal,
essas imagens afetam nosso estado de espírito, correto?
Por certo que afetam. As imagens mentais são o resultado de pensamentos recorrentes, mais ou menos
constantes, de um mesmo padrão vibratório. Tanto o cérebro físico quanto o sistema nervoso


respondem de
maneira rápida e intensa às figuras criadas e mantidas pelo indivíduo.
Elaborada a partir dessa repetição de pensamentos de qualquer natureza, a imagem torna-se um tipo de
impressão mental ou clichê, do qual o subconsciente lançará mão toda vez que houver associação com
novos estímulos, sejam endógenos ou exógenos.
Dito de outro modo: o ser forja os clichês em sua mente, e, no momento em que surge alguma situação
externa que estabeleça sintonia com o tipo de imagem mental que cultivou, o sistema é ativado,


entrando
num estado de interretroalimentação.
Quanto mais estímulo, mais vida ganha a imagem mental; quanto mais consistente esta se torna, mais


incita novas doses. É um círculo vicioso, como se pode ver. O próximo passo é materializarem-se, no


corpo ou em suas emoções, quadros ou comportamentos que consolidam o desequilíbrio.
"Observe, meu filho, que muitas pessoas querem erguer em torno de si um campo de defesa energética
ou espiritual, contudo não cuidam da natureza dos pensamentos que cultivam e dos clichês que
elaboram em

torno de si. Ora, qualquer proteção energética ou espiritual depende inteira e diretamente da qualidade
da produção e do substrato mental de quem almeja a imunidade vibratória ou fluídica.
A força e o dínamo da corrente magnética que mantêm ativos e eficazes os campos de proteção que
envolvem o indivíduo, tanto quanto a comunidade, estão enraizados na sua conduta mental.
Não há como escapar a essa realidade; é do arcabouço psíquico que se extrai a matéria-prima para


sustentar a defesa ou imunidade espiritual. Irradiar pulsos magnéticos e fortalecer escudos das mais
variadas formas e métodos será inócuo se o ser não cuidar das fontes do pensamento e não
compreender tais leis de

manutenção do equilíbrio energético.

"Quando realizamos tarefas de desobsessão e fortalecimento da proteção fluídica, observamos que a
maior contribuição que se poderia dar às pessoas assistidas é um curso intensivo mostrando a
responsabilidade

pessoal na manutenção do pensamento e das emoções organizados.

Enfim, como já disse: não se pode abrir mão de um acompanhamento emocional junto com o
atendimento

desses casos. Afinai, é ingênuo supor que apenas alguns comandos mentais estimulados pelo
magnetismo

sejam suficientes para erguer e sustentar a defesa energética, seja no âmbito individual, seja no
coletivo, sem levar em conta o cuidado com a fonte propulsora da força magnética, que são as
emoções e os

pensamentos."

E, Pai João, então temos de zelar de verdade por nossos pensamentos, e no caso dos médiuns não
somente

no dia das tarefas espirituais ou magnéticas, como também em nosso dia-a-dia...

Essa é a realidade, meu filho, a pura e simples realidade; ela demonstra o princípio que deve nortear a
forma de lidar com as questões do magnetismo.

Também essa é a maior necessidade daqueles que procuram ajuda para suas vidas. No fim das contas,
não

há nenhum proveito em conversar com espíritos, sejam eles pais-velhos, caboclos ou quaisquer outras

figuras espirituais, a não ser com o objetivo de despertar para tais fatos. Do contrário, o auxílio serve
apenas de muleta para fomentar a de pendência doentia que certas pessoas desenvolvem em relação
aos espíritos.

O remédio de que precisa mos mesmo é trabalhar as emoções e os pensamentos por meio do

esclarecimento das pessoas.

"Ele te cobrirá com as suas penas, e debaixo das suas asas estarás seguro. Mil cairão ao teu lado, dez
mil à tua direita, mas tu não serás atingido. Se fizeres do Senhor o teu refugio, e do Altíssimo a tua
habitação, nenhum mal te sucederá, nem praga alguma chegará à tua tenda. Pois aos seus anjos dará
ordem a teu


respeito, para te guardarem em todos os teus caminhos; eles te sustentarão nas suas mãos, para que
não

tropeces em alguma pedra."

— Deus me livre! Exclamava a mulher a plenos pulmões.
— Eu não tenho nada a ver com o Diabo. Esse negócio de espírito é obra de Satanás!
Imagine, Zuleika, se nós podemos conviver com gente atrasada que vive fazendo obra do demônio...
O pastor falou no culto que nós devemos combater esse tipo de coisa.
Que é isso, Isabel? — respondeu Zuleika. — É claro que sei que isso é do Diabo, mas e se por acaso a
gente estiver enganada? Como ficam as coisas?
Você duvida, minha amiga? Você duvida então da palavra de Deus?
Ora, Isabel, você com suas idéias... Sabe muito bem que vou ao culto todos os domingos e adoro
participar das orações no templo. Como eu poderia duvidar? Estou apenas procurando conversar e


saber como as
coisas seriam se a gente estivesse enganada a respeito dessas questões. Não é que eu duvide, mas
sabe? E


se...


"Se" coisa nenhuma, minha amiga. O pastor lá da igreja sempre está certo. Não podemos mexer com
quem já morreu...
Zuleika é uma mulher experiente. Trinta e oito anos, morena clara, cabelos cacheados e olhos pretos.


Desde criança convive com situações incomuns, para as quais não encontrou explicações satisfatórias


em sua
religião. Freqüentava a igreja renovada por razões sociais e, atendendo ao apelo da mãe no leito de
morte, não abandonara a religião. Temia descumprir o juramento feito à morta. Com esse pensamento
é que ia


semanalmente ao templo, apenas para aplacar seus medos quanto à promessa feita, sem raciocinar
sobre


quais seriam as implicações dessa decisão. Era religiosa, dedicada a Jesus.
Assim jurava de pés juntos para as amigas que professavam a mesma fé. Mas, no fundo, no fundo,
desejava


mesmo era arranjar um bom namorado entre os fiéis, pois entre todas as irmãs somente ela ficara
solteirona.


Ah! Como era difícil permanecer na solidão assim, sem ninguém com quem compartilhar a vida, as


paixões e os anseios de mulher.
Até que tivera algumas aventuras amorosas, entretanto isso não a satisfazia. Era mulher casadoira, e o
que mais queria era encontrar alguém com quem se unir até que a morte os separasse. Amasiar-se?
Nem ver.


Que falariam dela na cidade? Afinal, ela podia até morar na capital, mas a turminha com a qual


convivia no dia-a-dia era um povo exigente e conservador.
De jeito nenhum perdoariam caso morasse com um homem sem a devida cerimônia, com direito a véu
e


grinalda. Exatamente da maneira como a velha mãe idealizara e como fizera a irmã mais nova.
Entrar na igreja com toda aquela gente jogando pétalas de flores sobre o casal... "Ah!", suspirava só de

imaginar. Zuleika sonhava constantemente com o casamento. Mas, infelizmente, não conseguira o
noivo.
Resolveu então aderir ao movimento carismático e, deste, foi para uma igreja evangélica. Assim, se

uma
religião não ajudasse, ela teria duas. Por segurança.
Era um povo alegre o pessoal da igreja, uma turma renovada, embora não pudesse negar sua queda por
outras religiões. Já que tinha de cumprir a promessa com a morta, que fizesse uso conveniente da


situação...
Afinal, ela só prometera não abandonar a religião, qualquer que fosse a denominação religiosa! Jamais
garantiu à mãe que não iria a outras igrejas nem se interessaria por outras religiões.
Até porque, apesar de haver muitos rapazes atraentes, estava tão difícil achar um marido ali na


igreja... E


amasiar-se ela não queria mesmo. Isso era ponto decidido. Já fizera até promessa para Santo Antônio,
o
santo casamenteiro, e nada

— aif se Isabel descobrisse! Um dia ensinaram a ela que deveria adquirir uma imagem do dito santo e
cozinhá-la de cabeça para baixo no feijão. Pobre santo!... Não é que ela fez tudo conforme o figurino?
E para que adiantou? Nada, nenhum homem ou maridão foi pescado. Submeteu-se a todo tipo de
fantasia criada

pela imaginação popular, inclusive tomar banho de pipoca nuazinha em pêlo, à noite, em frente a uma
igreja.


Já pensou se passa alguém e vê?


Pobre Zuleika, agora tinha de apelar. As simpatias não surtiram resultado e ela continuava solteirona,

rezando e fazendo promessas. E as velas que acendera? Já perdera as contas... Evidentemente, fez tudo

isso escondido da amiga, que era uma legítima fanática.

A busca de Zuleika por um marido foi tão intensa e determinada que até uma "vidente" ela procurou.
Dessas que afixam folhetos nas ruas e nos postes: "Mae Fulana de Tal — traz a pessoa amada em 7
dias". E olha que, nos dias de hoje, o mercado está tão concorrido que tem gente anunciando prazo de
5 ou 3 dias e até de 24 horas!

A amiga Isabel bem que alertou: "Isso é obra do demônio". Afinal de contas, o pastor falou, está
falado. Nada adiantou também. Zuleika continuava sonhando com o noivado, o casamento. A tal
mulher que lhe prometera

arranjar um marido em uma semana só soube comer seu rico dinheirinho. Fora embora todo o seu
salário e

as economias que fizera para comprar o enxoval. Em vão. Zuleika se transformara numa devota da
igreja

renovada.

A amiga Isabel contara que o Espírito Santo estava obrando na igreja e que ela mesma tivera provas
do seu poder: depois das orações ela falara em línguas, conforme constava da Bíblia. Eram línguas
estranhas, na verdade, que ninguém entendia. Os crentes diziam ser línguas dos anjos. Quem sabe? "Já
que estão

ocorrendo milagres tão fantásticos na igreja, será que eu não consigo um milagrezinho assim, desse

tamanhinho, só para ajudar a amarrar meu homem?" — tentava se convencer Zuleika. Estava louca,

desesperada, endiabrada... "Ah! Que calor! Que calor, meu Deus!" Zuleika não agüentava mais pensar
na situação.

Outra amiga — Morgana, a esotérica — dissera-lhe que sua energia yang estava em ebulição. Ou seria
a

energia biang? "Sei lá" — pensava ela. "Esse povo todo é muito maluco!" Mas, se essa maluquice toda
servisse para ajudá-la a ter sucesso em seu intento, então se encheria de balangandãs, penduricalhos,

incensos, cristais e decoraria todas as rezas, mantras e assemelhados. Em nome de Deus ou de quem
quer

que fosse, ela precisava casar, tinha de arranjar um noivo a qualquer preço. Não agüentava mais
esperar.


Foi numa dessas conversas com Isabel que ela se distraiu e deixou escapar que Morgana era esotérica.
Justamente sua amiga Morgana, a única que a entendia... Bastou um instante de desatenção e o caos


estava armado, a pregação havia começado. Também, por que não ficou com o bico calado? Tinha de
falar sobre
esoterismo logo com Isabel, sua companheira de igreja?
Isabel era outra... Mal-amada, não se conformava com as estripulias do marido. Para curar sua


inquietação com o casamento, que vivia só de aparências, resolveu então "entregar seu coração para
Jesus". "Também pudera" — pensou Zuleika. "Depois de aprontar todas que tinha direito e de ser
rejeitada


pelo marido, só tinha uma saída: entregar para Jesus! Coitado, tadinho dele..." — ela ria sem se
incomodar com Isabel, que estava bem ali, a seu lado.
—Que é isso, Zuleika? Está doida, mulher? — perguntava Isabel, sem entender o motivo do riso re


pentino da colega.
E Zuleika, sem responder, absorta em seus pensamentos, continuou o raciocínio: "Ele recebe cada
coisa...


Depois de a pessoa virar um bagaço, depois de pintar e bordar e não ter mais nada que presta, entrega
o


restolho pra Jesus.
E um tal de ex-marginal, ex-prostituta, ex-ladrão, ex-ma-cumbeiro... Ele ganha cada coisa nesse
mundo!" —


pensou Zuleika, com seu sorriso maroto. "Será que o tadinho não ganha nada que presta?"
Zuleika!!! — berrou a amiga.
Deixa de ser abestalhada, mulher... Me deixe em paz, de uma vez!
Mas você está pensando bobeira. Conheço este seu sorriso cínico. Pensa em Jesus, minha amiga.
E, olhando de soslaio para Isabel, abana-se como que para dar fim àquela conversa chata e sai na
frente, rebolando exageradamente, feito doida.
Ai, mais que calor... Que calor, meu Deus! — exclamou Zuleika.
As duas entraram no templo com o sentimento voltado para Deus e as coisas do espírito. Pelo menos


Isabel, pois Zuleika estava com os olhos revirando na órbita de tanto olhar para os lados. Tudo o que
via eram



aqueles irmãos que ali chegavam para orar e louvar a Deus, nada mais. Afinal, se não podia ver Jesus
mesmo, em pessoa, poderia aproveitar para olhar e admirar os filhos do Senhor, seus seguidores...
Sagrado Jesus, Senhor da glória! — balbuciava Zuleika ao ver todos aqueles homens reunidos,

tentando
apascentar sua libido e minorar o incômodo comsua situação emocional, sua solteirice compulsória.
Tão logo o pastor começou a pregar e, na conclusão da predica, a orar, o público foi aos poucos

entrando em sintonia com as suas palavras. As emoções de cada um pareciam adquirir vida própria, e

o clima psíquico era algo palpável, facilmente perceptível. O pastor sabia manipular as palavras de
maneira a falar aos desejos e às emoções dos presentes. Um clamor coletivo dominava o ar.
Em torno do missionário enrolava-se intenso magnetismo. De suas mãos e olhos partiam irradiações
eletromagnéticas de tal intensidade que reforçavam a convicção dos fiéis ali presentes, que realmente
acreditavam ser ele um enviado de Deus para resolver suas mazelas. De repente, o pastor gritou em
sua

oração renovada e inspirada:

Coloquem a mão direita sobre o local onde dói ou onde julgam estar o problema que os incomoda!
Neste
momento, pedirei aos anjos do Senhor que toquem seus corações e suas mentes, que libertem do mal

que

acompanha os irmãos. Esta é uma noite de libertação. Em nome do Senhor, eu repreendo os espíritos
da
maldição! Em nome do Senhor Jesus, eu repreendo os espíritos da macumbaria e da feitiçaria!
Em nome de Deus, eu declaro a vitória sobre o inimigo, sobre as pomba-giras, os exus do mal e sobre

toda sorte de demônios que afetam as vidas dos irmãos. Aleluia! Aleluia! O glórias...

No auge da oração forte, as pessoas já estavam de tal modo entregues, abertas ao transe anímico que
se
predispunham ao que quer que o pastor as induzisse. A oração funcionava como recurso magnético e
hipnótico de grande potência.
Pessoas perdiam o controle emocional, choravam ou começavam a rir nervosamente, sem parar,

enquanto
se viam outros a pronunciar palavras desconexas, interpretadas pelos crentes como sendo o idioma dos


anjos.


— Eu os liberto de toda ação do Demônio, de toda artimanha do Maligno e dos laços de Satanás —
anunciava o pastor com autoridade e firmeza impressionantes. Simultaneamente às palavras que


constituíam o ápice de sua oração, ele bateu o pé direito no tablado do púlpito de uma só vez,
produzindo forte som em meio ao burburinho crescente.
De repente, mediante as sugestões hipnóticas emitidas pelas calculadas palavras do pastor, Zulei-ka


pôs-se a tremer convulsivamente. Tremia tanto que a amiga Isabel parou de falar a língua dos anjos e


tentou segurá-
la, o que se demonstrou inútil. Neste instante, o missionário gritou ainda mais alto e então foi
acompanhado por um grupo de mais ou menos 10 obreiros que com ele dividiam o tablado, os quais,
em meio aos apelos


magnéticos do pastor, passaram a bater os pés em uníssono, emitindo estrondos ritmados que
sobressaíam


da algazarra de línguas e gemidos da turba.
Zuleika surtou de vez e foi ao chão feito uma fruta madura quando cai da árvore. Debatia-se
loucamente, num ataque de nervosismo que denotava o intenso grau de desequilíbrio que a dominava.


—É a pombajira dos infernos! — exclamou a amiga Isabel a plenos pulmões. — Valha-me, Deus,
nosso


Senhor!
O pastor aproveitou a situação e desceu do tablado, sempre orando com palavras cada vez mais
insufladas


de emoção e vitalidade. Dirigiu-se logo para onde Zuleika se estrebuchava no chão.


—É o poder de Deus que repreende os demônios da maldade! — anunciou o pastor enquanto a
multidão
cantava, gritava e falava a língua dos anjos, conforme se manifestava a histeria nas pessoas.
Eu te repreendo, demônio, em nome do Senhor Jesus. Salve, salve! Aleluia, aleluia! Glórias...
Zuleika foi então erguida por dois brutamontes que acompanhavam o pastor Moisés naquela noite de
libertação e descarrego. Em franco desequilíbrio emocional e nervoso, ela tremia dos pés à cabeça,
quando o pastor resolveu interpelá-la, tal como se ele se dirigisse a um espírito incorporado:
Fale, demônio da pomba-gira, diga o que você quer desta mulher — ordenava o pastor em pleno


volume, ao



mesmo tempo em que batia na cabeça de Zuleika com pesada Bíblia, incitando a pobre mulher a se
expressar como se fosse um demônio incorporado.
Gemia, rugia e soltava palavrões como se fosse mesmo um espírito do mal Não havia outro jeito: ou

cumpria o protocolo daquele lugar ou seria espancada com a Bíblia indefinidamente.
Zuleika fingiu desmaiar diante de tantos golpes que levara na cabeça e de tal estardalhaço em torno de
si. Isabel pulava e soltava sons incompreensíveis durante o descarrego feito pelo pastor, que, àquela
hora, já se consagrava como o enviado do Altíssimo para a libertação da mulher possuída. Conduzida

a
outro cômodo, todos acreditavam que Zuleika estava inconsciente.
Sua amiga Isabel, pulando e louvando em meio aos hinos dos fiéis, acompanhava a recém-liberta, que

fora

levada do ambiente pelos dois homens que escoltavam o pastor. Enquanto isso, o pastor Moisés
continuava
no salão curando e libertando outras almas da perdição. Quando a mulher deu por si na poltrona da

sala
anexa, completamente sugada e desvitalizada, a amiga foi logo comentando:
—Irmã Zuleika, a pomba-gira estava com você. Eu falei, eu falei que você estava possuída pelo


demônio!
Aquele calor todo que você sentia era o fogo do inferno.
Mas, graças a Deus, o pastor Moisés libertou sua alma. Você agora está salva por Jesus e a "demônia"


da
pomba-gira te largou e foi queimada pelo fogo do Espírito Santo.
Zuleika abriu os olhos lentamente, enquanto a amiga tagarelava a seu lado, quase possuída — quem


sabe


pelo Espírito Santo? Certificou-se de que estavam sozinhas e de que os homens haviam retornado ao
salão
da igreja. Num átimo, reuniu as poucas energias de que ainda dispunha e pôs-se de pé, falando à amiga
Isabel, interrompendo-a:
Que pomba-gira, que nada, amiga! Eu é que não volto mais aqui. Me deu uma tremedeira tão grande


que não



tive como me dominar, mas sei que não era nenhum demônio coisa nenhuma.

Era ela sim, Zuleika! Era a pomba-gira dos infernos que estava danando sua alma, amiga. Ela é a
mulher do Satanás. Logo notei, quando a gente vinha pra igreja, que você estava estranha. Ela te jogou
no chão quando o pastor se aproximou. Ele orou o Salmo 91 sobre você, que é uma oração poderosa, e
retirou a danada de

seu corpo. Você agora está com o corpo fechado, amiga, nenhum demônio pega você mais.

— Que nada, Isabel Fui obrigada a fingir que havia um espírito em mim, pois não conseguia dizer
nenhuma
palavra, tamanha força me dominou.
Se eu não fingisse, apanharia ainda mais com aquela Bíblia enorme com a qual o pastor surrava minha
cabeça. Passando a mão sobre o couro cabeludo para certificar-se de que não sofrerá nenhuma
contusão,

Zu-leika tratou de sair quase correndo pela porta dos fundos da igreja, deixando para trás a amiga

boquiaberta, na certa acreditando que o demônio, ou melhor, a demônia havia se apossado novamente
de
Zuleika. Depois desse teatro todo, as duas nunca mais se viram. Zuleika ficou realmente possessa de

raiva da igreja, do pastor e dos demônios evocados por ele naquela sessão de descarrego. Tinha
também raiva de Jesus. "O povinho miserável que ele arrumou para lhe representar" — pensava a
mulher endiabrada, indignada e desiludida com a religião.

Foi assim que resolveu apelar. Não voltaria mais à igreja, nem que Jesus ou sua falecida mãe a
amaldiçoassem, deixando-a solteira para o resto da
vida. Tamanho desespero acometia a pobre mulher que acabou procurando um terreiro. Tudo o que a


antiga
amiga não queria e que lhe desaconselhara veementemente.
Que se danasse a promessa feita à mãe morta! No fim das contas, ela estava morta mesmo, não


estava?
Encontrou uma mulher que se dizia mãe-de-santo. Se era alguém confiável ou não, Zuleika ainda não


sabia, mas que tinha conhecimento da coisa, isso sim. Não podia negar. Dizia-se ser do candomblé, e
foi em sua
roça que Zuleika conheceu o jogo de búzios, Ela tinha de consultar o seu santo de qualquer jeito. Ver o

que estava atrapalhando sua vida.
O búzio é uma espécie de concha ou caramujo



africano usado para interpretar a vontade dos ori
xás — informava Mãe Mercedes. — Você tem de vir
aqui um dia desses para eu jogar búzios e ver o que
os orixás determinam para sua vida.
Vir eu até venho, Mãe Mercedes, mas primeiro
eu tenho de conhecer alguma coisa a respeito. A se
nhora sabe, sou uma pessoa inteligente, que usa a
cabeça, e não vou me jogar num lance desses aí sem
saber com que estou mexendo...
Então, vamos lá, que eu vou dar a você algumas
explicações antes de jogar.
Mercedes era uma mulher esguia, alta, com o rosto marcado por rugas fortes e expressão que remetia

a


uma cigana. Usava óculos com lentes grossas e roupas simples, nada vistosas. Em sua casa havia um

cômodo onde repousava uma peneira sobre pequena mesa. Colares, contas e um cristal faziam parte
dos
apetrechos que eram vistos sobre a mesa coberta de pano muito alvo. Dentro da peneira estavam

dispostas

16 contas africanas. Eram os búzios, considerados sagrados. Mãe Mercedes era representante do culto
de
kêtu —• segundo dizia. Ao lado da peneira, destacava-se um copo branco com alguma coisa dentro,

que

Zuleika jamais vira.



Esta é a raiz de ázio, que faz parte do ritual do

jogo. As raspas da raiz sagrada devem ser trocadas

diariamente, duas vezes ao dia. A bigorna de ferro

em tamanho reduzido é o instrumento de Ogum, o

orixá da guerra, do ferro e da tecnologia. A outra

bigorna que você vê aqui, de alumínio, é represen

tativa de Oxalá, e a figa de chumbo, de Nana, a avó

dos orixás.

Após fitar a mulher que a procurara e perceber que, com toda a sua inteligência, não entendera quase

nada do que havia explicado, Mãe Mercedes continuou:



Aqui, Zuleika, eu uso alguns instrumentos simbó

licos que me auxiliam nas predições. No meu caso,

preciso disto tudo a fim de abrir minha clarividên


cia no contato com as forças da natureza. Tem gen



te boa por aí que não precisa destes elementos. Mas eles fazem parte da tradição que herdei de minha
velha avó. Uso minerais, algumas pedras preciosas, como vê, além de um idê de ferro para o Sr.
Ogum, que abre

os caminhos da minha vida. As sementes de aridã, junto com os obis e orobós, representam os
elementos

masculino e feminino. Também fazem parte do ritual do jogo de búzios e possuem sua função para os

representantes do candomblé. É claro que falo daquelas pessoas que realmente têm o fundamento do
santo,

não daqueles que aprendem de qualquer jeito e ficam a enganar as pessoas por aí. "Esta aqui — falou
apontando para uma pedra à frente da mesa — é a pedra d'ara, que representa para nós, da nação, o

compromisso com a verdade, em dizer exatamente aquilo que os orixás determinam no jogo. Antes de
ser

usados, os búzios devem ser preparados. Há todo um ritual do candomblé para isso. Têm de ser
colocados

numa infusão de determinada erva que dá dentro d'água, a chamada santos-olhos. Neste meu jogo
utilizo 16

contas de búzios, mas essa quantidade varia conforme a orientação do culto e da nação." Vendo que a
mulher começara a se interessar, Mercedes ousou perguntar:

— Quer que eu jogue pra você agora? — ofereceu a dirigente do culto de nação.

Sem saber muito bem o que queria e confusa com tanta novidade, Zuleika cedeu ao impulso e aceitou
a

oferta do jogo.

— Bem, já que você quer saber dos detalhes do que vai acontecer, vou lhe dar algumas informações
enquanto preparo o jogo no tabuleiro dos búzios. "Segundo a mitologia africana, e também segundo
alguns cultos de nação, Lebá ou Elegbará, que representa Exu, era o mensageiro dos orixás e possuía o
dom da
adivinhação. De um momento para outro, Lebá pediu a Urumilá, o deus supremo na mitologia ioruba,

que
desse a Ifá o privilégio desse dom, e, desse modo, foi transferida a este orixá a ascendência nos jogos
divinatórios. (A título de comparação, Ifá talvez corresponda ao mesmo papel do Espírito Santo, na

linguagem da Igreja.) Esse orixá, então, assumiu o compromisso de, sempre que procurado pelos
homens, servir de

guia na interpretação da vontade dos orixás.
Por ter abdicado do dom da adivinhação em favor de Ifá, Exu, o mensageiro, passaria a ser
reverenciado

primeiro no jogo, como forma de recompensar sua generosidade.

"Ainda de acordo com a mitologia, segundo pude estudar, Ifá não cumpriu sua parte no trato. Em
virtude
disso, Oxum recorre ao deus supremo requisitando para si a incumbência do jogo. Revoltado com a
interferência desta iabá, Ifá resolve assumir sua responsabilidade; porém, a partir de então, Orumilá
reorganiza a situação e divide entre Oxum e Ifá a obrigação do jogo, desde que consultassem Exu, o
guardião, toda vez que jogassem as contas sagradas".
Assim se fez, e até hoje, antes de jogar os búzios, nós, os praticantes do candomblé, reverenciamos

Exu
como aquele que por direito sagrado detém o poder de abrir as portas da adivinhação, os caminhos e as
porteiras da vida."
—Deus me livre, Dona Mãe Mercedes — falou Zuleika, apavorada com a palavra exu e o que


significava para
ela, que vinha de uma formação religiosa diferente.


— Mas Exu não é o Diabo?
Soltando gostosa gargalhada, Mãe Mercedes respondeu boamente:
—Nada disso, Zuleika! Quando falo de Exu, não me refiro a entidades que se manifestam com esse
nome na
umbanda ou em outros cultos. Aqui não trabalhamos com eguns ou almas de mortos. Em nossa nação,
trabalhamos exclusivamente com forças da natureza, com os elementos ou encantados, como se diz


em


outras nações. Dessa maneira, assim como acontece com cada orixá, Exu para nós é apenas uma
vibração,
uma força da natureza.
E arrematou, depois:
—Claro que falo assim para que você possa entender; afinal, você não é do santo, portanto não adianta


lhe explicar os detalhes. Por isso, estou resumindo tudo de forma que você entenda, numa linguagem
mais
comum.
Então a senhora me garante que esse tal de Exu que vocês falam não é nenhum demônio?
Com certeza, Zuleika! O único demônio que a gente conhece aqui são as pessoas que fazem o mal ou


aquelas que aqui vêm pedindo ou querendo evocar a força dos orixás para vinganças, maldades e
mesquinharias. Mas pode ficar tranqüila, porque aqui a gente não faz maldade e nem encomenda
serviços de amarração, demandas e outras coisas inconfessáveis. Sou filha de Xangô e o meu orixá é
santo de justiça.


Ninguém fica impune diante da lei de Oxalá e Orumilá.
Antes de jogar os búzios, Mãe Mercedes acrescentou mais alguns detalhes:
Tenho de lhe falar alguma coisa mais, Zuleika, e talvez isto até possa assustá-la um pouco, mas peço


que primeiro me ouça, antes de me julgar.
Ai, meu Deus, lá vem você com essa mania de deixar a gente com medo! Tem alguém perto de mim?
A senhora está vendo alguma coisa me rondando?



Fale, mulher, fale logo senão dou um troço...
Não é nada disso, Zuleika! É sobre a lei de santo. Existe uma lei que é conhecida por nós como a
lei de salva. Ela é muito mal interpretada por quem não nos conhece. Diz a lei que toda vez que vamos


jogar os búzios a pessoa deve dar uma oferta para a manutenção dos trabalhos com os orixás. O
pagamento pelo
serviço de Exu, conforme lhe falei antes, na história que lhe contei.
Ah! Então não é nada de espírito perto de mim, não, né? Graças a Deus, Mãe Mercedes.


Então eu terei de pagar pra jogar para mim?
Pois é, Zuleika. No candomblé, respeitamos algumas leis que membros de outras religiões
desconhecem ou


fazem de conta que não existem.
Como na igreja evangélica, por exemplo, onde os fiéis têm de doar o dízimo; na igreja católica,


pagam-se os sacramentos para sustentar o culto e tudo o mais que envolve o trabalho dos sacerdotes.
A manutenção do
templo envolve desde a limpeza e os pequenos reparos até o pagamento de funcionários, impostos,


contas
de água, luz e telefone, entre outras despesas. No meu caso, estabeleci que o consulente deve doar de
acordo com o que ele propuser, de coração, assegurando que o dinheiro será empregado para levar


adiante


o serviço dos orixás, adquirir ervas e material de culto.
Ajeitando-se toda na cadeira em que estava sentada, quase rebolando, Zuleika respondeu:
—Ixe! Não precisa explicar essas coisas pra mim, Mãe Mercedes. Sei muito bem que a senhora está
tirando
do seu tempo, do seu trabalho para me atender de boa vontade...
Mas ainda não é isso, Zuleika. Eu não fico com o dinheiro da salva. Também fiz um compromisso

com meu
pai Xangô que empregaria todo o recurso financeiro dos jogos numa creche aqui do bairro.
Na verdade, me inspirei na vida e nos ensinamentos de Mãe Menininha do Gantois. Pessoalmente, não
preciso desse dinheiro, pois tenho uma boa pensão do meu falecido marido e trabalho como

enfermeira em


serviços particulares, atendendo idosos.


Não se preocupe, Mãe Mercedes. Entendo isso, de verdade. Afinal, fui evangélica e já entreguei pra
Jesus um dia. Lá na igreja, a gente era acostumada a doar de coração, e eu fazia com muita boa
vontade. Só que aqui eu posso ver no que a senhora em prega as contribuições...

Antes que Zuleika entrasse em detalhes, Mercedes a interrompeu:
—Vamos lá, minha filha, não é hora da gente abrir brecha para mágoas ou desconfianças infundadas!
Zuleika ficou sentada ali mesmo, em frente à pequena mesa atrás da qual se colocara Mercedes. A
mãe-de-santo pediu a Zuleika para orar, elevar o pensamento ao seu anjo da guarda, enquanto ela


própria
recitava uma oração numa língua diferente, enquanto sacudia as contas sagradas nas mãos em concha.
Ao jogá-las na peneira, Mercedes olhava atentamente a posição dos búzios, e depois de algumas outras
manobras, rezando suas rezas sagradas, a sacerdotisa falou para Zuleika:
—Quem responde por você é Iansã, o orixá dos raios e das tempestades. Oxalá interfere na resposta, e
Oxum é quem interpreta. Você precisa procurar um lugar onde se trabalha com eguns.
Aqui em minha roça não me envolvo com alma de pessoas mortas, mas com encantados ou orixás.


Segundo


o jogo me mostra, há alguém que normalmente chamamos de egum — ou um ser desencarnado — que
lhe cobra algo do passado. E um homem a quem você amou muito, e ele igualmente se dedicou
intensamente a você.
Jogando novamente as contas sagradas, Mercedes acrescentou:
—Não adianta tentar afastar egum, pois ele só será encaminhado mediante o trabalho com os espíritos,
algo que eu não faço aqui. Esse egum, seu antigo afeto, está o tempo todo a seu lado.

Você sonha com ele como se fosse um vulto lhe seguindo. Não perseguindo, mas caminhando sempre
no
seu rastro.
"Iansã diz pra não se preocupar, mas você precisa resolver essa situação com urgência, senão você fi

cará à mercê de uma força muito poderosa, a força sexual, que está tão contida e mascarada em você
que, de um momento para outro, você poderá perder o equilíbrio."
Após jogar mais umas duas vezes as contas sagradas, a mãe-de-santo acrescentou, sem que Zuleika


tivesse
falado qualquer coisa com ela:
Ah! Minha filha... Iansã diz aqui que o ocorrido lá na igreja com você era o tal moço, o egum que está


junto de você e que, num momento de transe, você se descontrolou por completo e o sentiu de forma
mais intensa.
Ele precisa ser encaminhado por alguém que é especialista nisso. E não sou eu a pessoa indicada pelos
búzios.
E será que não fala aí a respeito de um marido para mim? De um namoradinho que seja?
—Olha, Zuleika, acho que você está procurando em lugar errado. Como eu lhe disse, não pratico a


lei do santo conforme muitos fazem por aí.
Tenho meus valores espirituais e minha própria lei. Aqui não faço amarração nem conheço esses tais
arran jos matrimoniais. Outra coisa, mulher — falou Mãe Mercedes, em tom mais sério. — Procure
logo um


lugar para ir e resolver essa pendência em relação a esse egum, senão corre o risco de complicar mais
ainda sua situação espiritual. Acho que deve procurar... Espere aí. Vou jogar outra vez.
Rezando num idioma desconhecido, Mercedes procurou se concentrar e jogou novamente os búzios.


— Quem responde é Xangô, o orixá da justiça. Ele diz para procurar um lugar onde certo homem
trabalha
com eguns. Há um local numa cidade próxima daqui que você deve procurar. É um filho de Xangô,
mas ele

não é da nação, é um homem que faz ponte entre dois mundos.

Segundo os orixás, ele trabalha com um velho que tem competência para ajudar no seu caso. Xangô
encerra

o jogo. Após a conversa com os búzios, em que Mãe Mercedes interpretara as ocorrências no jogo, ela
passou por escrito as indicações. Assim, Zuleika deixou-se cativar pelo trabalho de Mercedes,
entendendo que já era hora de colocar fim a seu preconceito.

Encontrara alguém que, embora não professasse sua religião, tinha compromisso sério com as
questões

espirituais. Mercedes era adepta do candomblé e era respeitada, confiável e, dentro daquilo que
acreditava, fazia o que podia para auxiliar, sem exageros e sem viver à custa da religião.


Impressionada, Zuleika saiu da casa da sacerdotisa com novos elementos para pensar.

Entre outras coisas fazia uma reflexão a respeito de sua caminhada em busca do casamento, do uso
que fez da religiosidade apenas para encontrar um homem e de sua insatisfação com as questões
espirituais.

Contudo, demonstrando seu jeito maroto, a mulher remexeu-se toda em meio aos pensamentos,
arrumou o

decote enorme, mostrou seu requebrado pra nem sabe quem que passava na rua e pensou: "Ah!
Também,

depois que entreguei pra Jesus e ele não fez nadinha comigo nem por mim, eu até que mereço essa
vida

mesmo. Preciso me resolver senão vou morrer velha, um cangaço. Vou procurar esse sujeito na outra
cidade e já, já resolvo meu problema."

E, em voz alta, de maneira que qualquer um na rua pudesse ouvir, Zuleika declarou, abanando-se toda:

— Ai, meu Deus! Que calor, que calor! Minha energia hoje está a todo o vapor... Acho que ela vai se
derramar toda uma hora dessas. E aí, quando ela se esparrama, ninguém me ajunta depois... Posso
morrer solteira, mas
não desço do tamanco jamais!

"Ela era uma moça bonita e tinha sua espada brilhosa, sua coroa cravejada de brilhantes, babalaô,
babaloá...
Oi, Santa Bárbara, rainha do jacutá!"
Filha de Iansã
Naquele dia Zuleika chegou de mansinho. Sonhara que havia um vulto a seu lado e ficara


ensimesmada


desde então. Pegou o ônibus logo no começo da tarde e demandou para a cidade vizinha, onde,
segundo
indicações, encontraria o homem acostumado a lidar com espíritos de gente morta. Os chamados


lunduns,
segundo Zuleika ouvira. Ou será que eram os luluns?
Zuleika era uma mulher nada dada a delicadezas nem a detalhes e, portanto, com freqüência confundia
nomes de objetos e de pessoas.
Como não se importava muito com minúcias, vivia se desculpando toda vez que errava o nome de


alguém


com quem tinha se encontrado. Não se poderia esperar que aquela mulher conseguisse gravar nomes
que
não eram comuns ao seu vocabulário.
Tentando chegar a alguma conclusão a respeito das inquietações íntimas e dos luluns foi que Zuleika

encontrou o recanto de caridade onde o tal médium do pai-velho atendia os consulentes.
Adentrou o ambiente tentando ser sutil, mas não conseguiu, com todo aquele remelexo, os
penduricalhos que trazia nos punhos em forma de braceletes, a roupa vermelha, discretíssima , sapatos
com salto alto e bico finíssimo e cabelos soltos feito um bambuzal numa tempestade. Para completar

o visual tão modesto, trazia enorme bolsa prateada a tiracolo...
Foi assim que ela entrou no ambiente, desejando que ninguém a percebesse. Não se arrumara
conforme

tinha o hábito, pois queria parecer uma simples mortal, perdida na multidão sem ninguém a notar.
Afinal, segundo a sacerdotisa, ela era filha de Iansã, uma santa. No verdadeiro sentido da palavra. Ela
era uma

pessoa requintada, devota a Deus, discreta. Concluindo, uma mulher fina.

Sentou-se no banco um tanto desconfortável e aguardou o momento da sessão. Não vira nada
semelhante

ao que encontrou na roça de Mercedes. Havia ali uma singeleza que beirava a austeridade. Nenhum
quadro

nas paredes, nada de imagens nem velas.

Apenas um discreto cheiro de ervas pairando no ar, como se fosse algum perfume ou água-de-cheiro.
Música suave, mais como uma cantiga, parecia vir de um outro cômodo, deixando Zuleika com as
emoções à flor da

pele. Alguém se introduziu no ambiente quando já havia muita gente sentada e em atitude de oração.
Dirigiu algumas palavras ao público, explicando o objetivo das atividades daquela tarde, e
prontificou-se a conversar, depois da sessão, com quem tivesse alguma dúvida.

Ao que tudo indicava, era o encarregado dos trabalhos ali. Em seguida, fez uma prece sincera e cheia
de

gratidão, abrindo os trabalhos. Um homem assumiu a frente do salão e começou a falar, discorrendo
sobre

Jesus e seu exemplo de bondade. Fez uma comparação entre as várias formas de ver Jesus, segundo
cada

religião, e mostrou como o espiritismo via a pessoa do Mestre. Citou nomes que Zuleika nunca havia


ouvido: Allan Kardec, Alziro Za-rur, W. W. da Marta e Silva, Chico Xavier, Madre Teresa de Calcutá.
Os personagens foram desfilando na fala do homem como exemplos de espiritualidade e de indivíduos
dotados de uma visão

ampla da vida.
Novas perspectivas se abriam ao pensamento de Zuleika, que, a esta hora, já se sentia incomodada
com seu jeito de se vestir e sua maneira "discreta" de estar ali, naquele ambiente. Sem que ninguém

falasse nada, ela sentiu que em algum momento deveria mudar, principalmente quando fosse visitar
uma casa de caridade
onde se pretendia buscar espiritualidade. Uma a uma as pessoas foram chamadas para serem atendidas
numa sala contígua, por meio dos médiuns, que, até então, ainda não vira.
Ela ficava para depois, talvez a última. Será que precisava ouvir a pregação do sujeito e, por isso, não

fora chamada ainda? Bem, até que estava aprendendo bastante a respeito de uma série de coisas que
nunca

pensara.
Quando já estava se conformando com a idéia de que não seria chamada para conversar com algum
médium

da casa, alguém apareceu numa porta à esquerda do salão e apontou discretamente para ela. Zuleika
levantou-se — não sem chamar a atenção de todos — e dirigiu-se, humilde como ela só; para a sala de
atendimento.
Esperava-lhe o espírito incorporado em seu médium. Pai João foi logo cumprimentando Zuleika feito

alguém que a conhecia há muito tempo: — Deus seja louvado, minha filha! Nego-velho estava lhe
esperando há

muito tempo. Que bom que você chegou hoje, num momento muito especial para sua vida.
Sem saber como se comportar na frente do espírito que falava através de seu médium, a mulher
gaguejou


algumas frases:
Salve, salve! Vós é o espírito que vai conversar comigo?
Eu não sei direito como falar com vós usava um jeito diferente ao se referir à entidade.
Fique à vontade, minha filha. Nego-velho é apenas um filho de Deus que foi designado para servir aos


filhos da Terra.
Notando que Zuleika relaxara um pouco, o pai-ve-lho conduziu a conversa, de modo direto:



Você vem aqui em busca de ajuda para sua vida. Procura ajuda porque julga que tem alguém em sua


companhia que está atrapalhando você, não é, filha?


Zuleika ficou boquiaberta com a revelação do pai-velho. Ela nem tivera tempo de dizer nada e já ou
via dele a respeito do tal espírito de que Mercedes lhe falara.
Você também está cansada de alisar bancos de igreja e procurar ajuda para sua vida sentimental.
Mas primeiro nego-velho quer lhe dizer, minha filha, que é preciso aquietar seu coração e trabalhar


um pouco sua ansiedade. Se não, vai se tornar mais e mais amarga com o tipo de vida que vem
levando. Vamos


primeiro resolver o problema maior que a impede de ser feliz.
E, chamando um médium da equipe, pediu-lhe auxílio, junto com mais dois outros trabalhadores, a
fim de


abordar o caso de Zuleika. Deveriam os três ir a outro aposento e lá evocar o espírito que


acompanhava a mulher.
Enquanto isso, o pai-velho continuava a conversar com Zuleika sobre suas decisões e escolhas em
busca da felicidade:


— Você passa muito tempo pensando em ser feliz, minha filha. Enquanto pensa demais, a vida vai
passando
lentamente, sem que você perceba. Pensar é bom, mas deve-se ter o cuidado para não ter a cabeça
cheia de boas idéias e conservar-se sem nenhuma realização, com as mãos vazias.

Você escolhe tanto a pessoa com quem quer se casar que deixa passar ótimas oportunidades de se
relacionar.
Deseja uma pessoa que se enquadre em seu ideal, quer alguém que seja do seu jeito e vive buscando

nos
olhos de outras pessoas o tipo mais perfeito para ser aquilo que você denomina de alma gêmea.
De que adianta escolher tanto e ficar só? Por que você não enfrenta a realidade de que os seres

humanos

são únicos, sem cópias? Assim, não ficará esperando alguém do seu jeito. Imagine, filha Zuleika, caso
você encontrasse outra pessoa igual a
você, com os mesmos gostos, os mesmos sentimentos e idêntica visão a respeito da vida... Esse
relacionamento seria fadado ao fracasso, filha, ou vocês se tornariam dois seres em simbiose; seria

uma


doença emocional. Aprenda que, na natureza, as diferenças se complementam, se completam. Culpar a
vida
por um excesso de zelo de sua parte é imaturidade emocional.


Mas, meu pai, então não é verdade que tem um espírito me atrapalhando a vida e a felicidade?
Ah! Filha... E se a gente pensar de forma diferente? E se for você que estiver alimentando esse espírito
com seus traumas emocionais, suas fantasias mais secretas ou com pensamentos tão voltados para
seus desejos


mais íntimos que o tal espírito tenha sido atraído para perto de você?


Suponha ainda que esse excesso de emoções mal-resolvidas e essas idéias abrigadas em sua mente
sirvam
de alimento para a vida mental de alguma entidade, viciando o desencarnado em formas-pensamento


dessa
natureza. Então nego-velho pergunta: quem está atrapalhando quem?
Pergunto mais, minha filha: quem pode acusar um desencarnado de alguma coisa, dizendo que não


tem


nada a ver com a situação, isentando-se de toda responsabilidade, como se o desencarnado fosse o
único
culpado pelo processo que acomete a pessoa?
Zuleika baixou os olhos evitando encarar o pai-veIho, meditando no assunto, envergonhada.
Espírito nenhum constrange nem obriga ninguém a fazer aquilo que a pessoa não traz, de algum modo,
mascarado ou disfarçado dentro de si.
O chamado obsessor somente realça aquilo que já existe dentro da pessoa, que o alimenta com
pensamentos, emoções e desejos complicados. Se você não quiser nem deixar, nenhum espírito tem


poder


sobre você. Portanto, filha, deixe de culpar os outros, seja encarnado ou desencarnado, pela sua
infelicidade.
Até quando você baseará sua felicidade nas reações emocionais de outra pessoa? Pense nisso um


pouco
antes de ficar procurando culpados pela vida afora. Abra seu coração para viver com mais qualidade,
aproveitando as oportunidades de ser feliz tanto quanto você pode.



Sabe, meu pai — falou Zuleika. — Já fui em busca de muita gente para fazer trabalhos para mim, ten
tei arranjar um namorado ou um marido em igrejas, festas e em tanto lugar... É que tenho medo de
morrer solteirona.
Filha, não adianta gastar seu dinheiro com serviços de embusteiros, que pretendem trazer seu amor
amarrado, em meia dúzia de dias. Mude o foco de sua atenção e deixe-se levar pela correnteza da vida.
Caso funcionassem tais trabalhos, de que adiantaria você ter alguém ao seu lado sabendo que esta


pessoa
estaria ali apenas porque uma força estranha agiu, que não a sua própria, minha filha?
Será que seu espírito ficaria tranqüilo tendo consciência de que esse amante poderia descobrir o que


você fez ou encomendou, com vistas a deixá-lo preso a você? Que segurança você sentiria num caso
encomendado?
"Nego-velho quer que você pense com muito carinho nisso tudo. Há muita gente no mundo precisando


de


amor e de ser amado. Tantas crianças aguardam o aconchego de um coração, tantos adultos
abandonados
circulam pelas avenidas da vida necessitando de consolo, carinho, coração e amparo... E você


desperdiça


essa capacidade de amar a troco de feitiços, quebrantos e trabalhos que lhe tragam aquilo que você
mesma afasta de si com suas atitudes".
Sabe, filha, muita gente encarnada no mundo possui um magnetismo bastante forte e se dá conta de


que


pode se nutrir emocional e financeiramente das crendices e superstições de pessoas simples.
Empregue
seus recursos com mais inteligência e pare de contribuir com esses vendedores de sorte, exploradores


de
felicidade e promessas vãs. É preciso que você se liberte de tais artimanhas, filha, que são fruto de


emoções mal-resolvidas, do desespero existencial e de desejos frustrados. Viva sua vida e aprenda a
olhar mais perto de você."
Em geral, a felicidade que você procura distante e muito além está ao seu lado, bem pertinho,


esperando
que você aperceba..."



Enquanto o pai-velho falava com Zuleika a respeito de suas escolhas, de sua felicidade, dando
elementos
para sua reflexão, na sala ao lado os médiuns atendiam o espírito que a acompanhava:
Ela é quem me persegue; e não eu, a ela — dizia a entidade incorporada num dos médiuns.
Então por que você não a deixa e prossegue a vida, buscando sua felicidade? — perguntou um dos

trabalhadores ao espírito.
Eu bem que tentei, juro que tentei bastante. Porém, quando chega a noite, ela se liberta do corpo físico
e sai como uma bruxa a minha procura, buscando me alcançar de todo jeito. Ontem mesmo ela saiu do
corpo

gritando meu nome! Exalava desejo e tinha um cheiro peculiar; um odor que lembra sexo, lascívia ou
coisa assim. Fugi e me escondi dentro de uma igreja, onde julguei estar ao abrigo dela. Mesmo assim,
ela me

encontrou. Os pensamentos dela me alcançaram como tentáculos de um polvo gigantesco, como
serpentes

de uma Medusa dos infernos, e aí não tive como resistir.
Mas você também não está contribuindo para a situação de infelicidade da moça? Além disso, estando
perto dela você não somente a influencia, mas também recebe a influência direta de seus pensamentos.


No princípio eu a procurei na esperança de encontrar amparo em seu coração, sim, não posso negar.
Afinal, fui pai dela e me sentia com o coração despedaçado ao morrer... ou desencarnar, como vocês
dizem. Hoje

em dia, no entanto, vejo-me prisioneiro dos pensamentos dela.

Descobri apenas mais tarde que havíamos sido amantes, marido e mulher, antes da existência mais
recente, como pai e filha.
Logo que me aproximei dela, depois da morte, fiquei quase paralisado ao ver as imagens de nossas
vidas passando em sua mente. Desde então, ela reacendeu o desejo do passado, duramente reprimido
durante a última existência. Agora ela me culpa por não se casar. Ora, ela é quem não me larga e não


se
permite prosseguir num caminho novo, em busca da sua felicidade!
Portanto, você gostaria de seguir avante, afastando-se dela e procurando por si mesmo sua felicidade,
correto?



Com certeza eu gostaria! — concordou o espírito imediatamente.


Vocês estão vivendo uma espécie de circuito fechado entre suas mentes; um é prisioneiro do outro.


Sei disso! Porém, nos poucos momentos de lucidez que tenho, vejo-me apanhado feito uma presa
numa teia
de aranha. Sinto-me apanhado numa emboscada, ameaçado, sugado ou vampirizado por ela, a filha


que não
me larga.
Vamos ver o que se pode fazer para libertá-lo tornou o trabalhador-terapeuta. — Pai João está falando


com ela neste momento, e ainda na noite de hoje veremos o que fazer a fim de romper esse elo infeliz.


No aposento ao lado, o salão de atendimento, Pai João avançava no diálogo, que tinha por objetivo
provocar reflexões em Zuleika. Ao final, propôs a ela:
Esta noite, filha, ao deitar, faça uma oração. Mas reze do fundo da alma, com toda a fé que possui.
Nessa prece, mentalíze você mesma, minha filha.
Procure ler o Salmo 91, mas não apenas recitar o texto a sua frente. Procure meditar em cada pa
lavra, no significado daquilo que está escrito e, só depois, durma, sabendo que a visitaremos ao longo
da madrugada.
Deus seja louvado! Vai ter espírito em minha casa hoje à noite? Será que vou conseguir dormir


sabendo que irão me visitar?
Não se preocupe, filha, que você não nos verá.
Será um sono sem pesadelos, sem sonhos, sem lembranças. Você apenas se sentirá bem, nada mais.
Após a conversa com o pai-velho, Zuleika retornou ao seu lar, agora com muitos elementos em que


pensar.


Não se remexia mais como fizera ao entrar no ambiente. Sentia vergonha de seu jeito, pois encontrara
ali, naquele recanto de paz, muito mais segurança e simpatia do que esperava.
A noite descia lentamente e calma quando os espíritos João Cobú e Macaia se reuniam com o médium
Tobias, já desdobrado.
—Preciso atender com urgência um chamado que nos foi encaminhado pelo Alto — principiou o pai-


velho.


— Guarda ligações com a situação espiritual da mulher que pretendemos ajudar. Deixarei você por

algum


tempo e o encontrarei na casa de Zuleika. Ferreira, o guardião, permanecerá o tempo todo com você.
Fique atento ao que vir, mas não interfira até eu chegar. Precisamos de mais informações para poder
agir com

acerto.

O pai-velho deixou Tobias já na porta de entrada da casa de Zuleika. Dali prosseguiu com as medidas
que
julgava necessárias, juntamente com Macaia, a fim de poder melhor ajudar no caso que lhe fora
encaminhado. Entrementes, Tobias dialogava com Ferreira, o guardião de noites anteriores, que ali já

o
aguardava:
Podemos entrar na casa de Zuleika enquanto Pai João não vem? — perguntou Tobias ao guardião.
Temos de ter cuidado, Tobias, pois não sabemos com que depararemos no interior da residência.


Refiro-me
às companhias espirituais de Zuleika.
Mas ela não é uma pessoa recatada, religiosa?
Terá alguma companhia complicada por perto?
Não sabemos, meu amigo. Por certo as pessoas religiosas deveriam ser as mais protegidas... Mas
quem nos protegerá delas?
Não entendo o que quer dizer — realmente Tobias não entendeu a ironia do guardião.
Vamos lá, Tobias... Algum dia você entenderá.
Penetremos o ambiente com cuidado. Em seguida veremos os detalhes.
Adentraram a morada da mulher que procurara ajuda e notaram, logo de início, que havia algo


estranho no
ar. Imagens e figuras bizarras pairavam na sala de estar, parecendo orbitar em torno do quarto ou em


sua direção. Eram imagens mentais plasmadas por Zuleika, fortemente imantadas ao ambiente
doméstico.
—Coisa estranha, Ferreira — falou Tobias sem entender nada do que percebia. — Nunca vi nada igual
durante os desdobramentos.



Eram imagens relacionadas a sexo, a relacionamentos íntimos, com impressionante riqueza de
detalhes.
Sem dúvida, poderiam arrebatar qualquer um para vivências nessa área. Até porque eram vividas,


extremamente envolventes.
Caso não houvesse concentração nos objetivos do trabalho e disciplina mental, até mesmo obstinação,
da


parte do médium, aquele lhe seria um ambiente vedado, para sua própria segurança. Impregnada às
paredes, uma gosma violácea escorria lentamente até o chão. Forte cheiro exalava daquela substância,


cuja lembrança teimava em emergir da memória de Tobias, muito embora ainda não estivesse claro a
que se
referia aquele odor. Seria algum perfume?
Os dois se dirigiram ao aposento onde repousava o corpo de Zuleika. Ela estava quase em sono


profundo.
Sobre seu corpo físico, que estava de barriga para cima, havia uma duplicata exata de si, porém com o


rosto voltado para baixo, como que beijando a si própria, imóvel, parada. Assim que o guardião
entrou,
acompanhado de Tobias, viram um vapor esvoaçar sobre os dois corpos, o físico e o etérico — a


duplicata ou duplo de Zuleika.


O fluido semelhante a fumaça parecia ganhar consistência enquanto os dois examinavam-na sobre a
cama. A
emanação formava lentamente uma imagem quase idêntica a Zuleika, não fossem as distorções da


forma.
Ela estava em processo de desdobramento do corpo astral. Porém, que aparência!
A mulher religiosa permanecia deitada sobre a cama, vestida de maneira sóbria. O perispírito, no


entanto, desprendera-se com trajes sensuais, ou melhor, lascivos, embora o aspecto fosse o de uma
vampira
decadente, de alguém que tivera sua conformação perispiritual deformada.


Seu perfil lembrava o das bruxas esquálidas e maquiavélicas dos antigos contos de fada, o que não
combinava com o corpo físico, que sugeria idade entre 20 e 23 anos. Igualmente degenerados, os
braços


pendiam estranhamente do corpo astral e apresentavam mãos desfiguradas e dedos cadavéricos, com
unhas



grandes e pontiagudas.


Os cabelos que compunham o quadro horripilante eram esparsos, como se tivessem caído da cabeça


extrafísica,
revelando partes perfeitamente visíveis do couro cabeludo. Zuleika-espírito rodopiava sobre o
corpo somático, espumando e babando como se estivesse em meio a uma convulsão severa. Mas não.


Juvenal!... — gritou várias vezes a plenos pulmões,exigindo a presença imediata de alguém invisível.
Tobias ficou com os olhos arregalados e amparou-se no guardião.
Venha, miserável! — prosseguiu a criatura em franco desequilíbrio. — Você não me escapa. Tentou


me
enganar dizendo que era meu pai e agora, que descobri tudo, você é meu, inteiramente meu!
Zuleika-espírito saiu do quarto grasnando feito louca em direção à sala. Não podia atravessar as pare
des e então optou por cruzar a porta que separava os aposentos.
O guardião Ferreira acompanhou-a, juntamente com Tobias, que assistia à cena assustado.


Evidentemente,


ela não os podia ver, em parte devido à distância vibratória, mas, sobretudo, ao fato de que estava
obcecada, cega, com a atenção voltada exclusivamente à perseguição de Juvenal, o pobre infeliz.
Levantando as mãos esquálidas, indicando lhe faltarem forças, a mulher desdobrada tateava o ar,


como se
estivesse à procura de uma presa, à maneira de uma fera completamente irada. O odor no ambiente
aumentou sobremaneira.
As imagens mentais que exalavam da aura de Zuleika desdobrada eram impregnadas de fluidos de


ordem


sexual e libidino-sa. Já não havia como confundir a natureza das formas-pensamento que gravitavam
em
torno de dela. Num canto da sala, o espírito de Juvenal, amarrado por uma coleira que mais parecia


um
apetrecho sadomasoquista, estava acuado, gemendo, soluçando.
Me solte, Zuleika! Pelo amor de Deus, me solte!
Eu preciso respirar, preciso sair daqui...



Pensa que pode me deixar? Ou por acaso acredita que eu o deixarei? Vamos os dois para o altar, meu
bem...


Será meu para sempre!
Segurando o pobre espírito pela coleira, levantou-o vagarosamente, enquanto, a longos haustos,
absorvia de seus chácra os fluidos que lhe roubava. Passivo, Juvenal parecia perdido em meio àquilo
tudo. Era prisioneiro daquela que fora sua própria filha na última existência.


Ambos viviam e morbidamente se alimentavam um do outro, Ela literalmente cravava os dentes no


espírito,
mordendo-o lentamente, à moda vampiresca, como se quisesse apropriar-se de seu sangue; na falta
deste,


entretanto, esgotava as reservas vitais ainda restantes no perispírito de Juvenal.
Ao terminar o festim doentio, antes que iniciasse outro ato criminoso, dava gostosas gargalhadas,
embriagando-se visivelmente naquela espécie de droga que saciava seu instinto infernal.
Neste exato momento, João Cobú adentrou o ambiente junto com Macaia e mais um espírito. Pai João
trouxera a mãe de Zuleika, desencarnada, que se prontificara a interferir.
Quem sabe poderiam reverter o processo?
Ao deparar com sua filha desdobrada usurpando as energias do próprio genitor, aquele que fora seu
companheiro, Alzira falou com lágrimas nos olhos:


— Zuleika foi, no passado, dona de um cabaré, uma casa de prostituição numa vila espanhola. Pobre
Juvenal, por diversas vezes submeteu-se a seus caprichos em outras experiências reencarnatórias.
Quando
retornou na última encarnação, trazia a meta de ampará-la como filha no intuito de, exercendo papel

de
autoridade, modificar o quadro infeliz ao qual se lançara em outras vidas. Mas faltou-lhe vontade e
determinação. Juvenal abusou sexualmente de Zuleika durante a adolescência da filha, fazendo com

que

eclodissem em sua mente as lembranças do passado. Tão logo eu soube desse fato, não resisti, e a
morte
levou-me num momento complicado da vida dos dois.


O espírito da mãe chorava ao ver a cena da filha vampirizando Juvenal. João Cobú a amparou nos
braços,

serenamente.
Vamos interferir agora, Alzira. Não se aflija. Creio que o momento é propício, pois, ainda que de
maneira incipiente, Zuleika tem renovado seus pensamentos e refletido sobre o que ocorre consigo.


Pois é, meus amigos, induzi Zuleika a me prometer que não se afastaria da religião, pensando que,
com isso, ela seria amparada. Vejo que não adiantou.
Quando Alzira se pronunciou, Zuleika parou em meio ao ato que realizava, buscando tatear o pensa


mento
que a atingia.
Mãe?! — gritou Zuleika desdobrada, soltando sua vítima e desviando dela a atenção.
Neste instante, João Cobú deu um sinal para Ferreira e Macaia, a fim de que interferissem. Os dois


espíritos, aproveitando o lapso de lucidez de Zuleika, tomaram Juvenal nos braços e o libertaram das
amarras fluídicas, levando-o a outro ambiente.
—Mãe!! E você?
O espírito trazido por João Cobú aproximou-se da filha, deixando as lágrimas descer como águas que
lavavam o perispírito deformado de Zuleika. Abraçou-a, aconchegando -a a si.
Mãe! — começava a soluçar a mulher desdobrada.


— É você, minha mãezinha? Por que você me deixou com ele?
Eu tinha de me defender, mãe...
Sem que a filha a visse, pois estavam em dimensões diferentes — embora no mesmo plano astral —,
Al
zira abraçou-a ainda mais, falando, entre prantos:
Filha, querida, não faça isso com seu pai! Sei que ele errou, e errou muito, porém após eu partir foi
ele quem cuidou de você, a educou e alimentou. Ele traz a consciência culpada, Zuleika, tanto que pro
curou até o fim de sua vida, a seu modo, reparar o mal que lhe causou. Perdoe, minha filha amada,

liberte seu pai...
As lágrimas de Alzira caíam sobre o corpo espiritual desfigurado de Zuleika. As duas pareciam se
fundir, molhadas em pranto. Enquanto isso, João Cobú apenas olhava, orando. Pedia em sua prece:



—Povo de Aruanda, Mãe Santíssima, tomem esta filha em seus braços de misericórdia e façam com


que ela possa ter consciência da importância deste momento para sua vida eterna...

A medida que as lágrimas de Alzira caíam sobre a filha, sua forma perispiritual gradualmente se
modificava.
Não retomou completamente a conformação do corpo físico, no entanto não trazia mais estampada a

imagem
da bruxa, da vampira de energias.
Era mais humana, quase harmoniosa a aparência de Zuleika. Ainda abraçadas, aos poucos ambas se
acalmaram, e João Cobú, neste momento, conseguiu magnetizar Zuleika, fazendo-a adormecer fora do
corpo. De nada ela se recordaria, mas com certeza acordaria modificada intimamente, com novas
disposições.
João Cobú conduziu Zuleika a um recanto natural, junto a matas e cachoeiras, promovendo seu contato

com

energias ao mesmo tempo revigorantes e calmantes. O pai-velho comandou um exército de elementais
das
águas para que realizassem profunda limpeza no corpo psicossomático de Zuleika, removendo placas

ou
cascões de energia sexual deletéria que se viam aderidos a seu perispírito, sua aura.


— Caboclos da mata virgem e da mata fria! — rezou o pai-velho. — Trazei o sumo das ervas do reino
e
vinde descarregar esta filha de Terra dos fluidos daninhos.
Dois caboclos se prontificaram a atender a evocação feita por João Cobú. Ao longe Alzira observava a
filha projetada na dimensão astral sendo amparada e medicada pelos mestres na manipulação das
energias da

natureza.
Os dois espíritos trouxeram extratos de ervas em forma astral e etérica semelhante a um emplastro,
depositando-o sobre o corpo perispiritual de Zuleika, que dormia profundamente sobre a superfície de


águas tranqüilas.
Ela parecia balbuciar algumas palavras sem nexo enquanto recebia os cuidados dos espíritos do bem.
Os



extratos de ervas ou bioplasma trazidos pelos especialistas da natureza — o grande laboratório divino


absorveram lentamente grande parte das impurezas acumuladas no psicossoma de Zuleika. O
bioplasma

sem dúvida surtia efeito, pois as criações mentais que gravitavam em torno da mulher desdobrada
pouco a

pouco estouravam como bolhas, liberando certa fuligem que ali mesmo dissipava-se nas matas e águas
do

reino, conforme Pai João denominava os sítios naturais.

Após o processo levado a cabo pelos benfeitores, Zuleika foi reconduzida ao corpo físico, que ficou
sob a vigilância atenta de sua mãe desencarnada. A partir de então, Alzira permaneceria ao lado da
filha, ao menos por algum tempo, visando amparar-lhe com orações, energias e fluidos benfazejos.
Tobias acompanhara

Juvenal juntamente com Macaia e o guardião Ferreira. O espírito subjugado fora encaminhado
diretamente a um posto de socorro na esfera extra-física.

Mais tarde, ele se recuperaria e então deveria retornar à tenda de Pai João para receber um choque
anímico, liberando-o de certos fluidos e imagens mentais nos quais estava mergulhado, devido ao
sentimento de

culpa.

Veja, Tobias — comentou Macaia. — Nem sempre, ao se queixar de perseguição espiritual, as pessoas
têm

razão nas reclamações. Repare como Zuleika a um só tempo se vingava do pai e mantinha-o
prisioneiro de

seus caprichos e desejos.

Não entendo, Macaia. Zuleika era uma mulher religiosa...

Muita gente se esconde na religião, Tobias, emvez de adotar a postura ética que sua filosofia inspira e
de dedicar-se à busca por espiritualidade. Trocam espiritualidade por religiosidade, e esta, no fundo,
para grande parte dos adeptos, representa fuga e não realização. Ignoram o fato, mas sua motivação é
fugir do passado culposo registrado na memória espiritual, que os compele a entregar-se a cultos
exóticos e religiões

salvacionistas. Inconscientemente, objetivam sufocar recordações dolorosas em práticas e rituais
religiosos.

As pessoas procuram esconder-se de si mesmas; contudo, ao dormir, libertam-se dos limites estreitos
do


corpo e se revelam em sua realidade nua e crua. Irrompem os desejos mais secretos, íntimos,
inconfessáveis durante a vigília física, cuja vazão se dá durante o desdobramento pelo sono.
Soltam-se as amarras sociais e quedam-se as convenções humanas; como espíritos, embora ainda
encarnados, avidamente perseguem o objeto dos seus clamores reprimidos. Visitam os ambientes que,


quando acordados, afirmam abominar.
A religião muitas vezes apenas mascara a realidade espiritual e energética dos indivíduos. Macaia,
Ferreira e Tobias retornaram para a casa de Zuleika, onde encontraram João Cobú novamente em
oração.


Era hora de liberar as energias ali acumuladas, fazendo uma limpeza energética eficaz — agora no
ambiente doméstico.
Devemos ensinar Zuleika a fazer uma limpeza com ervas de cheiro.


Posso passar a ela algumas informações, se o senhor me permitir — falou Tobias, ainda desdobrado.
Veremos, meu filho. Será necessário conduzir nossa filha novamente até o nosso recanto fraterno.
Assim que ela acordar se sentirá melhor e, com certeza, terá vontade de voltar à tenda. Lá, você terá
condições de indicar o modo adequado de usar as energias das ervas para promover uma limpeza
energética intensa em


sua casa.
Os espíritos benfeitores retornaram à Aruanda, a dimensão espiritual à qual estavam ligados, enquanto
Tobias era levado ao corpo físico para prosseguir com as atividades de sua vida social.
"O vento soprou lá nas matas, jogando as folhas da Jurema no chão. O vento vai soprando, as folhas


vão caindo, caboclo vai apanhar folha no chão/'
A noite seria muito especial. Os filhos de Pai João ou os trabalhadores daquele recanto se reuniriam
para ouvir do pai-velho algumas informações a respeito das terapias energéticas. Mais precisamente,


discorreria sobre as ervas, seu poder de absorção e outras propriedades que lhe são associadas. Todos
haviam
preparado suas perguntas, a fim de escutar, nas palavras simples da entidade, as indicações e os
ensinamentos que lhe favoreceriam as tarefas no dia-a-dia. — Hoje em dia, meus filhos — principiou


o pai-velho —, por todo lado, ao redor do globo, observa-se um surto de progresso, de busca por
espiritualidade, mas também há um reacender do misticismo.
De modo geral, as pessoas dão mostras de estar cansadas diante de tantas promessas vãs no que tange
às

simples coisas da vida, como as entendem políticos e administradores das nações do mundo, tanto


quanto

vêem com descrédito o constante vaivém da ciência. Nessa caminhada à procura de satisfação,
entregam-se
ao misticismo, ao religiosismo e às religiões salvacionistas.
Estas pretendem resolver os problemas das massas de um instante para outro, porém, conservando a
população ignorante das idéias renovadoras a respeito de espiritualidade. Fazem sua parte, embora

sem ser este seu objetivo central, ao tirar multidões das garras do materialismo e das conseqüências

desastrosas das drogas e de outras verdadeiras prisões mentais.
No entanto — deu maior ênfase às suas palavras — temos de considerar, filhos, que cada ser humano
tem

em si uma identidade espiritual, e é a partir dessa identidade de natureza energética que ele empreende

sua busca, sua caminhada. Não há como violentá-lo em sua visão de mundo e da vida.
Como fica nossa fé, Pai João, em meio a tantas formas de expressar a religiosidade e a
espiritualidade?

— perguntou Tobias.
A fé está dentro de cada um de nós, filho. Aqueles que têm fé — porém não de maneira requintada, e
sim mais simples — são os místicos de todas as épocas.
A fé mais trabalhada, aliada à inteligência ou à razão, é atributo daqueles que questionam, pesquisam
e
deduzem suas observações da realidade que experimentam. Credos, religiões, seitas e confrarias ou
fraternidades existem como classes de uma grande escola espiritual, que é o planeta
Terra. Nessa escola, ninguém está mais adiantado do que outro, apenas a linguagem ou o vocabulário


se
rão mais ou menos adequados ao tipo espiritual ou à identidade energética de cada aluno.
Notando que dava elementos de reflexão para a platéia de ouvintes atentos, o pai-velho continuou:
—Podemos afirmar, sem correr o risco de sermos religiosos por demais, que a fé é a base de toda a


procura pela ciência e pela espiritualidade. Ou — quem sabe? — pela busca da ciência espiritual. Com


a fé,
acreditando, pode-se utilizar dos elementos da natureza para restaurar a saúde. Por meio da fé,
associada ou a partir de certos conhecimentos, é possível recuperar a auto-estima das pessoas, insuflar
maior



qualidade de vida à sua caminhada espiritual.

Através da fé, a água adquire propriedades terapêuticas, os cristais ampliam as energias emanadas por
uma mente que crê, ou, ainda, as cores podem ser empregadas como fonte de energias que
harmonizam meus

filhos. Pessoalmente, nego-velho acredita que a fé é o grande elixir que faz com que os métodos
terapêuticos alcancem o efeito desejado.

E, quando nego-velho fala de fé, não se trata de simples crença induzida por mentes alheias ou
vivenciada apenas na esfera social e cultural Nego se refere a uma fé que é operosa, que investiga e
que se amplia na medida exata em que as investigações se convertem em convicções pessoais, em
ciência da alma. Meu pai

— perguntou um dos trabalhadores. — O senhor poderia nos falar como são os laboratórios do mundo
invisível, onde os guias preparam os medicamentos, as poções e tudo aquilo de que se utiliza para a
cura das pessoas na Terra?
Bem, meu filho, há no invisível uma diversidade muito grande de metodologias, cada uma delas de
acordo com o perfil psicológico dos filhos que necessitam de ajuda.
"Existem, então, os laboratórios que trabalham exclusivamente com os remédios que meus filhos

denominam de alopatia, ou seja, com substâncias químicas extraídas da natureza, com radiação de
minerais e outros
produtos ainda desconhecidos pelos homens de ciência do mundo.

Não se pode pretender curar tudo apenas com aquilo que na Terra se convencionou chamar de natural.
Embora os produtos químicos também provenham da natureza, as pessoas mais esotéricas ou aquelas
que

são mais radicais em seu pensamento religioso desejam tratar as enfermidades estritamente com

remédios
que considerem naturais, desprezando ou relegando ao segundo plano as conquistas da ciência na área
da

alopatia.

Os laboratórios do mundo invisível consideram e muito as conquistas da ciência, de modo que
nenhuma
terapia séria poderá menosprezar tais substâncias, que, ao longo dos séculos, têm podido contribuir
sensivelmente para a restauração da saúde de meus filhos na Terra. Espíritos altamente

comprometidos com o equilíbrio do ser humano têm incentivado, desde os institutos de pesquisa do


invisível, a investigação e o aprimoramento dos recursos alopáticos.
Levam a cabo estudos altamente especializados, relacionando o tipo psicológico das pessoas que
desenvolvem certas enfermidades e o uso de medicamentos alopáticos, radiações minerais e diversas
metodologias tidas, por muita gente preconceituosa, como antinaturais.
"Há laboratórios nos quais se exploram os aromas da natureza, tais como os conhecem no mundo

físico, além de outros que meus filhos ignoram. Alguns são especializados em homeopatia; outros, em
fitoterapia, e outros, ainda, no uso de cores, aromas, sumos, frutos e flores. Na verdade, observa-se
uma variedade


dificilmente mensurável no que toca às nuances e especialidades desses laboratórios do lado de cá da
vida.
Nos últimos 50 anos, têm-se multiplicado as pesquisas da ciência espiritual e energética acerca das


emanações de plantas em geral, metais e minerais do planeta.
"Também por aqui se empregam pipetas, bicos de Bunsen e outros instrumentos similares aos
encontrados no mundo físico, tais como discos de ouro e outros elementos. Na realidade, os
laboratórios da Terra é que são a cópia daqueles que temos do lado de cá.


Grande número de cientistas, durante o sono físico, visita centros de pesquisa da erraticidade para aí
dar seqüência a seus estudos, devido às limitações inerentes aos métodos do mundo material. Muitas
vezes, ao acordar após estas experiências, trazem intuições e promovem descobertas que tão-somente
traduzem o


conhecimento armazenado na memória espiritual."


— Então vocês dispõem de grande variedade de estudos para ajudar o ser humano, não é assim? Em
que
mais se concentram esses conhecimentos desenvolvidos no mundo espiritual? — tornou a perguntar
Tobias,

interessado no assunto. — Por aqui, meu filho, estuda-se de tudo, a depender do interesse do espírito e
da necessidade dos habitantes tanto do mundo físico quanto do extra-físico.

Cirurgias mediúnicas, sua técnica e sua eficácia, ou simplesmente curas psíquicas, são aqui
investigadas por cientistas da alma — e não somente por espíritos espíritas e médiuns. Uso de plantas
ou ervas,

magnetoterapia, bioenergia, ectoplasmias e até mesmo as chamadas poções mágicas dos xamãs aqui
são

es-crutadas com zelo e dedicação pelos representantes da ciência espiritual.


Nada é menosprezado. "Contudo, na prática, pequena parcela das técnicas é canalizada de maneira
eficiente pelos terapeu-tas e sensitivos na Terra. Muitos captam intuições a respeito de algumas
práticas terapêuticas, mas acrescentam suas próprias idéias, seu achismo, sua imaginação e, por
encontrar pessoas altamente

crédulas, acabam fazendo escola ou proselitismo, à semelhança de uma religião qualquer.

Transformam o processo terapêutico numa iniciação cheia de ritos que vão do exótico ao misterioso,
com
práticas nada científicas. Nem sequer se ocupam de separar aquilo que provém de sua mente ou de

suas
crenças pessoais daquilo que é o objetivo real da terapia empregada.
Como resultante, temos indivíduos bem intencionados que tentam fazer o melhor; ocorre, porém, que

seu

melhor vem recheado de idéias particulares, às quais querem conferir o status de necessárias e
importantes.
Para tanto, emprestam certo sentido religioso, esotérico, iniciático ao processo, ou simplesmente

imprimem a ele característica ou selo pessoal, tornando complexo e sofisticado algo que deveria ser
simples e bem mais eficaz, até porque teria também um efeito educativo. "Feliz ou infelizmente,
temos de trabalhar com os limites e maneirismos das pessoas encarnadas.

Isso nos obriga a adaptar a ciência espiritual ao jeito de cada terapeuta, na esperança de que mais dia,
menos dia os homens amadureçam e comecem a pensar, a raciocinar, sem se deixar levar por idéias

esdrúxulas."
Respirando profundamente, o pai-velho prosseguiu, aprofundando suas observações: — Vamos falar
das

ervas, meus filhos, que é o que mais de perto temos como trabalho terapêutico. No mundo, as
observações

dos estudiosos dedicados ao assunto já evoluiu bastante. Em razão disso, a intenção aqui é descrever
apenas um método, de modo algum o mais correto entre tantos disponíveis. Nego-velho não vai
abordar o

uso ritualístico das ervas, conforme se adota no candomblé ou na umbanda. Isso nego deixa a cargo
dos
chamados mestres e sacerdotes de tais religiões.
Nego-velho quer falar aos meus filhos de uma metodologia que une diversas práticas e que facilita a


identificação das ervas mais apropriadas aos trabalhos e desafios que encontramos cá em nossa tenda.
"No universo há dois tipos de força ou de particularidade da energia. Aquilo que os nossos irmãos
chineses


denominam como yang ou pólo positivo, e o que eles identificam como polaridade negativa,


complementar ou simplesmente yin.
Essas duas particularidades da energia referem-se respectivamente ao que é ativo, positivo, masculino
e ao aspecto feminino, passivo, negativo. Isso, apenas em termos de polaridade ou de caráter
emocional; não há qualquer juízo de valor implícito nessa divisão.


"Nego-velho quer apresentar uma classificação das ervas de acordo com essa ótica, ou seja, à moda
taoísta de entender os aspectos da energia. Portanto, não esperem que este pai-velho relate ou comente
a maneira como se faz nos terreiros ou nos barracões de religiões de procedência africana ou
influenciadas pela mãe África.


Nego prefere associar os ensinamentos oriundos do continente africano, que os negros trouxeram e
que se


desenvolvem amplamente na América, às pesquisas e conhecimentos adquiridos nos altos estudos
realizados nos laboratórios do invisível. Isso visa possibilitar aos meus filhos a adoção de um método
simples, porém eficiente, quando lidam com a natureza e os recursos de cura que oferece.


"Obedecendo a essa divisão, as ervas podem ser agrupadas em duas categorias distintas. De um lado,


positivas, ativas ou yang; de outro, negativas, passivas ou simplesmente yin, se não houver objeção da
parte de meus filhos quanto aos nomes.
Os filhos poderão observar que a maioria das plantas com tons fortes, tais como verde-musgo, verde-
bandeira ou verde-escuro, mais intensos, são exatamente as de característica positiva ou ativa, isto é:


yang, de acordo com a terminologia chinesa. Igualmente, as de cor laranja, vermelha e amarela com
traços


avermelhados.
De modo oposto, aquelas que apresentam coloração verde-clara ou esmaecida, bem como amarelo-
clara,


azul e qualquer outra tonalidade mais suave pertencem à classe negativa ou passiva — yin — e são
ótimas
para trabalhar emoções, sentimentos e intuições." Interrompendo o pai-velho em sua explicação, um
trabalhador perguntou, afoito:
Mas como podemos aprender a colher a erva certa de acordo com a necessidade da pessoa?



Primeiro é preciso identificar outros aspectos das ervas, meu filho. Por exemplo: toda erva que tenha
a terminação pontiaguda ou que exala um cheiro forte, intenso, possui a propriedade absorvente, tais
como: arruda, guiné, alho, samambaias em geral e outras mais.
Assim sendo, caso meus filhos queiram fazer algum procedimento para absorver energias densas,
contagiosas e de natureza muito inferior, prefiram esse tipo de planta. "No entanto, há aquelas ervas

aromáticas de cores suaves ou vibrantes, porém que exalam cheiro agradável, semelhante ao de
manjericão, poejo, menta, erva-cidreira, capim-de-aruanda e outras, que, além de assimilar elementos
emocionais ou

emoções densas de ambientes domésticos, favorecem um estado de consciência mais harmonioso,
saudável.
Esses vegetais agem diretamente no plexo solar das pessoas, limpando energias densas e acalmando


em


profundidade. As energias ou fluidos exalados pelas chamadas ervas-de-cheiro atuam na intimidade
do
sistema nervoso, no hipotálamo, conforme observações nos laboratórios da erraticidade.
Estimulam aí certos elementos químicos do cérebro humano, de maneira a causar estados consciências
agradáveis, como melhor auto-estima, dispondo o indivíduo à vida com maior qualidade. Os aromas


cítricos de determinadas ervas, frutos ou mesmo flores vibram em sintonia com emoções superiores,


liberando
toxinas mentais, etéricas e físicas, favorecendo também estados de saúde mais harmônicos." Sorrindo
para o trabalhador, que ficou satisfeito com as explicações do pai-velho, João Cobú prosseguiu:

— Entretanto, é necessário examinar a forma de retirar as ervas de seu habitai natural. Para isso, meus
filhos, temos de ficar atentos ao seguinte. De forma alguma, ao ser utilizada para fins terapêuticos, a
erva pode ser colhida na madrugada ou à noite, isto se quisermos aproveitar ao máximo suas
propriedades

medicamentosas e fluídicas.

Mesmo que não haja sol e o dia esteja nublado, deve-se colher desde a alvorada até o momento do pôr-
do-

sol ou ao entardecer, antes de cair a noite. Mas não basta obedecer a esse critério; há cuidados
adicionais: as ervas só devem ser apanhadas respeitando-se o fluxo do fluido vital ou do bioplasma, se
quisermos ser mais exatos. Pela manhã, até aproximadamente as 9 horas, quando os raios solares
ainda estão no processo de aquecimento da morada dos homens, colhem-se apenas raízes, pois é ai que


o fluido vital ou bioplasma
das plantas se concentra.
Desse momento até mais ou menos as 15 horas, podem-se apanhar folhas e flores para uso da
medicina
espiritual ou terapia energética. Durante esse período, em que o sol irradia com maior intensidade seus


raios revitalizadores, a vitalidade circula mais vigorosamente nas extremidades da porção exposta,
acima do chão.
Somente após as 15 horas tira-se o caule, pois este é o horário em que o bioplasma inicia o processo


de
"descida" em direção à terra, energizando o caule das plantas.
À noite se dá o repouso do bioplasma; durante o período noturno, a vitalidade manifesta-se apenas o
suficiente para manter a vida orgânica da planta.
Então não tem efeito colher as plantas de qualquer jeito, em horários diferentes do que meu pai


indica?
Não é bem assim, meu filho. Podem-se colher as ervas em qualquer horário, sim; contudo, não se


aproveita a seiva energética ou bioplasma, que obedece ao fluxo da energia solar em todos os rei nos
da natureza.
Apanhando-as sem levar em conta esse fluxo, apenas os elementos de sua constituição química serão
extraídos, mas de forma alguma a vitalidade.
E quanto às ervas secas, elas servem para finalidades terapêuticas, meu pai?
Ainda aí temos de considerar qual propriedade terapêutica se pretende explorar. Caso a busca se


resuma


aos elementos químicos, que favorecem exclusivamente a saúde física, então as ervas secas atenderão.
No
entanto, se o objetivo é extrair os elementos fluídicos, etéreo e mais dinâmicos que oferecem, as


plantas são destituídas de tais elementos no processo de secagem, ao longo do qual a energia vital é


corrompida ou
alterada. Muito embora haja, mesmo com as ervas secas, uma maneira de fazer o bioplasma retomar
seu


fluxo natural, nego-velho só pode
ensinar essa técnica quando meus filhos avançarem no estudo sobre bio-energias e magnetismo. Sem


amplo

conhecimento do magnetismo não há como alterar o fluxo energético e vital das plantas.

E quanto à forma de preparo das ervas, meu pai? Devem ser administradas sempre por meio dos
banhos ou

existe outra maneira que ainda não conhecemos?

Quando há indicação para uso de banhos, meus filhos hão de convir que é o meio mais fácil de
usufruir das substâncias terapêuticas e energéticas das ervas. E um recurso que está ao alcance de
qualquer pessoa.

Porém, ao se prepararem banhos de imersão (como, por exemplo, se faz com a camomila, indicada
para

estresse, ansiedade e ainda crises de pânico), não é adequado ferver a água juntamente com as ervas. O

melhor método, o mais eficaz é, após a fervura, apagar o fogo e somente então adicionar as ervas,
deixando-as em repouso até o chá esfriar ligeiramente. Depois de alguns minutos de decocção — é
esse o nome do

processo — as ervas devem ser retiradas da água, restando apenas o sumo e as propriedades

medicamentosas e energéticas. Aí, sim, o produto está pronto para ser usa do para banhos de imersão,
para aspersão ou outra coisa qualquer, de acordo com a prescrição, inclusive como chá fototerápico.

"Caso tais cuidados não sejam tomados, corre-se o risco de surgir alergia ao elemento material, sem
relação com o extrato ou fluido. Reações indesejadas podem ocorrer ao menos de duas maneiras: tanto
em razão da

fervura de determinadas ervas, quanto devido à falta de coagem, isto é, por causa do contato direto da
erva com a pele. Na última hipótese, o processo alérgico pode-se estender por semanas. "Há ainda,
meus filhos, outra forma mais requintada e também muito eficaz de explorar os recursos
bioenergéticos das plantas.

Para quem tem acesso a tais meios, é possível retirar a essência, o extrato ou a tintura da erva,
respeitando determinado fator que nego-veho por ora não deseja explicar. Para fins de terapia
energética, primeiramente deve-se subtrair da tintura o componente alcoólico comumente empregado
em sua elaboração.

Em seguida, despeja-se a tintura em um recipiente com água, de preferência advinda de cachoeiras,
olhos

d'água, fontes naturais preservadas, do mar ou simplesmente coletada durante as chuvas. No frasco
onde o extrato foi misturado à água, o ideal é que haja um dispositivo para aspergir o conteúdo no
corpo, em forma de gotículas, como se fosse um chuvisco que caísse sobre a pessoa, após o banho de
higiene. A água com


as substâncias medicamentosas e energéticas deverá ficar em contato com a pele por algum tempo,
sem
enxugá-la, a fim de que absorva os fluidos acumulados na água após a adição da tintura."


Então não é somente através de banhos que se pode aproveitar os recursos fluídicos das plantas?
Não, Tobias — respondeu o pai-velho. — Como disse antes, o banho é a forma mais simples,
consagrada


por nossos ancestrais e ao alcance da maioria.
Todavia, os tempos mudaram, e nada impede que a técnica seja aperfeiçoada. Ao manipular as ervas, o
importante é preservar suas propriedades terapêuticas de natureza sutil, a fim de que sejam absorvidas


no contato com a pele humana. Vendo por essa ótica, pode-se lançar mão de outro método, ainda mais
eficaz,
porque a pessoa consegue permanecer mais tempo em contato com os extratos herbáceos.


E qual é esse método, meu pai?
Calma, meu filho, que nego-velho vai explicar e você verá que é algo bastante simples. Imagine se
tiver uma banheira ou similar cheia de água e o produto obtido com a infusão das ervas puder ser nela
derramado? Aí a pessoa em tratamento entra na banheira, imergindo naquela solução, e ali per


manece por um tempo maior em contato com o líquido que contém as propriedades terapêuticas.
Naturalmente, o sujeito receberá assim benefícios em mais alto grau do que simplesmente se deitasse
a água sobre o corpo por alguns segundos. O contato prolongado com os elementos curativos das


plantas


produzirá efeitos bem mais rápidos e duradouros, devido ao aumento da exposição e,
conseqüentemente, da
intensidade de absorção dos fluidos presentes no líquido.
Ah! Pai João... Então não precisa jogar a água sobre o corpo durante o banho, como a gente é ensinada


a
fazer? Podemos mergulhar na banheira como líquido dentro?
Bem, meu filho, nego-velho corre o risco de ir de encontro aos ensinamentos de muita gente que se diz
especializada. Mas, como disse antes, nego não visa trazer ensinamentos de acordo com o que é


difundido
nos barracões de candomblé nem tampouco em consonância com o método tradicional de alguns



irmãos


umbandistas. Portanto, permite-se alargar um pouco a visão de meus filhos a respeito do assunto,
ampliando pontos de vista.
O tema estava interessante, e as pessoas ali presentes, ávidas por maiores detalhes acerca da


fitoterapia sob a perspectiva de uma ciência espiritual destituída de misticismos, preconceitos e


apêndices
acrescentados pelos homens ao longo do tempo. Pai João sentia-se à vontade podendo contribuir com
sua


visão a respeito do assunto.
—Também temos de considerar outro aspecto, meus filhos, que diz respeito à atitude daquele
que interage com os recursos que ora analisamos. No trato com as fontes de energia vital do planeta, a
oração funciona como precioso instrumento, que, arregimentando a força do pensamento e da fé, age


sobre


os fluidos dispersos ou concentrados na natureza — ou nas plantas, em particular, que constituem
nossa
matéria de estudos de hoje.
Quero dizer mais claramente que, durante o processo de maceração, o ato de pedir aos espíritos da


natureza que ajam nos elementos curativos das ervas e extraiam o bioplasma de modo mais intenso
incrementa
sobremaneira os resultados atingidos.


Na prática, é quase imperativo conectar-se com as forças superiores que administram os destinos da
humanidade, as quais detêm os recursos da ciência espiritual e o conhecimento de fluidos e bioenergias.


Esse é um fator que não deve ser desprezado jamais.
Cabe aqui um alerta, porém. Nego se refere à oração verdadeira, ou seja, a ligar-se deliberada-mente


ao Alto como uma técnica eficaz de mobilizar elementos em favor da cura, e não de recitar palavras
ao vento, da
boca para fora, apenas para cumprir um rito qualquer.
E será que meu pai poderia nos indicar algumas fórmulas, visando ao uso de ervas ou de sua força


fluídica para atenuar certas dificuldades?
Meu filho, nego-velho sente-se imensamente feliz em poder ajudar. Se não houver questionamentos e



interesse, nego interpreta como se todos já estivessem satisfeitos com o que sabem. Mas quando meus
filhos perguntam e demonstram desejo de aprender, então os espíritos se sentem honrados em
esclarecer.

"Antes de prosseguir, nego-velho quer deixar claro que aquilo que vai ensinar não deve ser
interpretado, de maneira alguma, como substituto à orientação médica. Muita gente precisa mesmo é
da alopatia, com seus

recursos mais agressivos, a fim de debelar os males do corpo. Não adianta usar fitoterapia e
homeopatia
quando se está diante de uma infecção ou inflamação aguda, que ocasiona dor ou limitação de alguma
espécie. Para esses casos, a melhor saída é a prescrição médica convencional, com seus antibióticos e
antiinflamatórios, embora também haja remédios ditos naturais com propriedades terapêuticas que

apresentam bons resultados.
"De toda forma, ficar sentindo dor enquanto se tem à disposição excelentes drogas desenvolvidas pela
medicina é, acima de tudo, indício de preconceito e de falta de auto-amor e auto-estima, e não sinal de

suposta espiritualidade, como geralmente julga quem defende tal atitude como opção por uma vida
mais

natural. Não se deve fazer do emprego de quaisquer terapias uma religião, muito menos sectária e
fundamentalista, que não admite colaborações diversas que concorram para igual e sagrado objetivo: o
bem-estar do ser humano.


O médico que rejeita toda abordagem que escapa à alopatia sem sequer examiná-la erra tanto quanto o
naturalista radical, que professa sua crença nas terapias que elegeu de maneira excludente. "A dor, a


infecção e a inflamação devem ser combatidas imediatamente com os recursos clássicos da medicina,
e,
durante o tratamento ou mesmo prévia e posteriormente, é possível acompanhá-los com ferramentas
acessórias, que aumentem a imunidade.
Como se vê, os recursos fitoterápicos são muito mais coadjuvantes e complementares do que


substitutos
para os instrumentos da medicina tradicional."
É, Pai João, conheço muita gente que padece de sérios problemas de saúde, com infecções ou dores
fortes e se recusa terminantemente a usar medicamentos alopáticos. Querem se curar estritamente



com remédios naturais, fitoterápicos, homeopáticos e outros semelhantes. E ainda inventam uma fi


losofia da dor para dar suporte à sua decisão...
Pois é, meu filho — comentou o pai-velho. — Temos de desenvolver o bom senso e aprender que a
dor não nos leva a lugar nenhum, a não ser à revolta. É necessário cultivar o bom senso ao lidar com
muita coisa na vida, inclusive com a própria saúde e a alheia. Nego-velho chega a acreditar que o


terapeuta que se recusa a indicar o tratamento convencional e recomenda somente o uso de métodos


que vê como
naturais enquanto o consulente ou ele mesmo sentem dores, de duas, uma: ou se acha num estado
grave de


limitação de suas atividades, ou não merece respeito como terapeuta do espírito.
A ciência holística (como o próprio nome diz, hólos: do grego, todo) engloba todas as metodologias, e


não somente as que se convencionou serem chamadas de naturais. Por isso, nego repete: bom senso
nunca é
demais. Tem gente que quer ser mais espiritualizada do que Deus exige! Adotam tom de voz manso e


macio


e métodos "alternativos" como se fossem os únicos eficazes. Na verdade, estão desprezando as
bênçãos que a vida lhes oferece; não podem se queixar.
Definitivamente, não é esse o comportamento que pai-velho quer incentivar ao ensinar estas coisas


para
meus filhos. Depois de discorrer sobre o assunto, o pai-velho prosseguiu, introduzindo conceitos e
fazendo ressalvas ao conteúdo ou às dicas que emitia, a pedido dos trabalhadores de sua tenda.


— Em segundo lugar, nego-velho quer observar mais alguns pontos acerca das indicações que fará.
"As fórmulas que vou passar aos meus filhos devem ser utilizadas com discernimento, e não como
uma panacéia, isto é, uma substância mágica capaz de erradicar qualquer mal.
Não é como cura, e sim como auxiliares ao tratamento de meus filhos que pai-velho recomenda tais

remédios. Além disso, entendam que, se não houver mudança de hábitos e reeducação das emoções e
dos
pensamentos, grande quantidade dos males que se pretende debelar retornará após algum tempo, e,
freqüentemente, em grau mais alto.
"Notem, meus filhos — disse, com entonação mais grave.


— No que tange às fórmulas de fitoterapia que nego-velho vai transmitir, deve-se prestar atenção aos

detalhes e cumpri-los à risca, pois trata-se de uma fórmula, que apresentará resultados compatíveis


com o esperado apenas se devidamente seguidas todas as instruções.
Vamos enumerá-las, para facilitar a compreensão de meus filhos. Para o preparo dos banhos de
imersão


que nego-velho indicar a partir daqui, valem as seguintes regras:
"1. Obedecer sempre à proporção de 2 litros para infusão de 50g de flores ou ervas indicadas.
"2. Quando houver essências florais, devem ser acrescidas ao líquido na medida de 30 gotas para cada


litros. Os remédios florais podem ser: de Bach, de Gaia, de Minas, californianos,australianos, entre
outros.

'3. Aquilo que nego chamará de essências ou extratos especiais deve ser adicionado numa proporção
de

10% do líquido, ou seja, 200ml para cada 2 litros.

4. Os demais itens se referem ao uso de minerais. As pedras para os elixires necessariamente
permanecem
todo o tempo submersas quando guardadas. Exige-se água mineral para o mergulho e repouso das
pedras, a


qual precisa ser trocada após a elaboração de cada elixir.


'5. Todo elixir usando minerais preferencialmente será confeccionado após a pessoa responsável haver
se
higienizado, tomando seu banho de asseio, tendo feito também suas preces, buscando conexão com a
dimensão superior. A idéia é a pessoa se ligar ao elemental correspondente àquele plano específico da
natureza que será manipulado — no caso, o reino mineral, representado pela pedra.
'6. Depois de orar, pode-se colocar uma música para favorecer a harmonização mental e emocional.


Somente concluídos esses preparativos é que se devem iniciar os procedimentos propriamente ditos


para produzir os elixires, nos quais se pretende fixar a força natural dos dementais.
'7. Depositar as pedras na água, conforme indicação, empregando para tal um vidro transparente,
cristalino e incolor, de modo a receber os raios do Sol ou a luz do luar, novamente a variar de acordo
com a prescrição.


"8. Durante o processo, ministrar passe magnético longitudinal no vidro onde estão contidos a pedra e

o líquido, imantando-os com o magnetismo animal, que apenas o ser humano possui.

"9. Caso a instrução determine exposição ao Sol, deixar durante todo o dia até aproximadamente as 17
horas ou até o momento em que se prenuncia o ocaso, a depender da região. Recolher e repetir a
exposição por

mais duas vezes, isto é, dois outros dias.
"10. Se a indicação for para submeter à luz do luar, expor o recipiente apenas quando a noite estiver


completamente instalada, ainda que não se veja a Lua. Retirar antes do alvorecer, portanto mais ou
menos às 5 horas, a variar de uma localidade para outra.
"11. Prestar especial atenção ao que a fórmula determina: se o conteúdo deve ser exposto à luz solar


ou às influências lunares, pois são vibrações bem distintas. Aquela é positiva, yang e ativa, enquanto
esta é


passiva, negativa e yin.
"12. Em ambos os casos é necessário magnetizar por meio de passes longitudinais, como explicado no
item 8. Idealmente, essa operação se realiza com número ímpar de pessoas: 1,3,5,7 etc;


"13. Por último, uma recomendação válida para flores, frutos, folhas, sementes, caules e raízes: todos
devem ser preparados conforme a Lua especificada; porém, qualquer que seja a fase lunar, considera-
se somente o período depois dos 3 primeiros dias da lunação. Dito de outra forma: a Lua pode ser
nova, cheia, quarto


crescente ou minguante, mas apenas do quarto dia em diante a fase torna-se favorável à realização dos
procedimentos aqui descritos.
"Meus irmãos hão de se lembrar de que a Lua exerce influência muito marcante nas marés, no clima e
noutros eventos da natureza, inclusive sobre o parto das mulheres e dos animais. Desse modo, ao se
trabalhar com os instrumentos da natureza, não se pode menosprezar a intervenção energética e
gravitacional que a Lua exerce sobre os fluidos." Interrompendo o preto-velho, Tobias indagou sobre


algo que fazia parte de suas dúvidas:


— Pai João, há alguns dias o senhor indicou para mim um elixir de prata. Nem perguntei antes, porque
fiquei com medo de ser inoportuno. Mas o certo é que não consegui encontrar o tal elixir e fiquei com
receio de incomodar o senhor com o questionamento.
— Pois é, filho, quem não incomoda não aprende. Não é assim? — o pai-velho explicava
pacientemente. —
Entenda que sempre, em qualquer fórmula que nego-velho indicar o uso do elixir de prata, quer dizer a
prata coloidal, excelente remédio contra muitos males que afligem meus filhos.

Portanto, basta adquirir a prata coloidal nas farmácias especializadas e adicioná-la à fórmula ou,
conforme a prescrição, usá-la diretamente. Nego-velho vai tocar nesse assunto novamente, quando


ditar algumas


fórmulas. Por enquanto, só estou listando algumas diretrizes básicas a fim de facilitar para os meus


filhos a manipulação dos remédios energéticos.
"Aproveitando a pergunta de meu filho, ainda sobre certas particularidades de elixires específicos.
Toda vez que, em suas indicações, nego-velho mencionar o elixir de cristal de quartzo, será necessário
ferver o quartzo durante 30 minutos antes de ser empregado na fórmula.


"Recomendações entendidas, vamos ao preparo de alguns remédios energéticos. "Ao primeiro
preparado nego-velho dá o nome de Águas-de-Cheiro. Lembro que as essências especiais e o
composto energético,


que aparecerão nas fórmulas a seguir, nego-velho ensinará a preparar em outra oportunidade.
AGUAS-DE-CHEIRO
Ingredientes: Folhas e flores de alfazema e manjericão; remédios florais: Alfazema, Artemísia,


Rosmarinus; águas de cachoeira e orvalho ou sereno; essências especiais.
Preparo: Lua nova.
Indicação terapêutica: Suaviza e tranqüiliza. Útil à revitalização das energias da aura. As propriedades


etérícas dessas flores e folhas enchem o indivíduo de vitalidade, pois trazem elementos da natureza
ricos em bioplasma, estimulantes das reservas fluídicas do duplo etérico.


Ao mesmo tempo, agem no plexo solar, no nível emocional, liberando formas adensadas.
"O próximo remédio energético que vou descrever denomino Águas-de-ísis, pois é inspirado numa
fórmula semelhante, utilizada por alguns hierofantes do Egito antigo.


AGUAS-DE-ISIS


Ingredientes: Rosas vermelha e branca, flores de alfazema, hibiscos vermelhos e crisântemos amarelo
e
branco; remédios florais: Quince, Hibiscus,
Rock Water, Sempervivum, Orelana; águas de chuva e de cachoeira; essências especiais. Preparo: Lua
nova.
Indicação terapêutica: Libera o coração de mágoas e desperta o lado feminino, o sentimento, a


intuição.


Favorece a manifestação do auto-amor. Estimula pensamentos altruístas e eleva a freqüência
vibratória do chácra cardíaco.
"O próximo remédio natural e energético deve ser administrado a pessoas que se encontram desvitali



zadas, abatidas física e moralmente. Indicado como auxiliar no processo de recuperação de indivíduos


que
enfrentaram longos períodos de enfermidade ou processos de vampirismo energético, principalmente.
A este remédio chamo Raio-de-Luz.


RAIO-DE-LUZ
Ingredientes: canela em pau, cravo e gengibre; flores: pétalas de girassol e rosas vermelhas; remédios

florais: Sempervivum, Moutain Pride, Rescue e Buquê de 5 Flores; águas de fonte e de cachoeira;
essências
especiais e composto energético. Preparo: Lua nova ou cheia. Indicação terapêutica: Desperta a

energia
yang
e revitaliza, liberando substâncias etéricas densas, tanto do corpo físico como do duplo. Fortificante
energético, que transfere a vitalidade das ervas e da essência para o corpo e a mente.
Tobias ouvia e anotava tudo, pois não queria perder as indicações de João Cobú, que, como sabia o

médium, fora também médico em outra existência.
Continuando, o pai-velho falou mais:

— Outro remédio energético que indico para certos filhos é aquele que denomino Chuva-de-Prata.
Desde já, entretanto, peço aos meus filhos que não se atenham à nomenclatura. Chamo-os assim
apenas para
distinguir uma fórmula natural da outra, nada mais. Nenhum dos nomes tem qualquer sentido oculto
ou
esotérico.

CHUVA-DE-PRATA
Ingredientes: Rosas brancas, camomila, flor de laranjeira, alecrim e manjericão-branco; remédios
florais: Momórdica, Star Tulip, Rosmarinus; águas de chuva e de cachoeira.

Preparo: Lua cheia e exposição ao sereno durante a noite, com o vidro aberto.

Indicação terapêutica: Libera energias nocivas e toxinas do organismo, dilui ou atenua emoções
densas e
promove a harmonia da aura. Aumenta as defesas naturais e energéticas.
Creio que devo frisar — continuou o pai-velho que esses remédios energéticos não são para

administração


via oral, e sim como banhos, conforme explicado anteriormente. De preferência, banhos de imersão,


semelhantes aos chamados banhos de ofurô, que se vêem em spas e clínicas atualmente.
Ou seja, as fórmulas devem ser derramadas numa banheira de qualquer espécie, onde meus filhos
procurarão relaxar ao longo de 20 a 40 minutos, no máximo. Na impossibilidade, faz-se o banho de

aspersão, isto é, borrifando ao longo de todo o corpo os preparados líquidos. Durante os banhos de
imersao ou após aspergir o produto sobre o corpo, na falta de banheira ou similar, meus filhos poderão
ingerir o chá da

camomila, indiscriminadamente, o que será muito benéfico para as emoções.
"Outra fórmula desenvolvida do lado de cá pelos espíritos responsáveis pela natureza é a Silvestre.
SILVESTRE
Ingredientes: Hortelã, espada-de-são-jorge; arruda, levante, canela, sementes de mostarda e mirra;


remédios florais: Pink Yarrow, Buquê de 9 Flores, Manto de Luz, Crab Apple, Sulphur Flower; águas
de chuva, de
cachoeira, bem como água mineral ga-sosa natural ou sulfurosa; essências aromoterápi-cas verdes e
silvestres.


Preparo: Lua cheia e exposição aos raios solares. Composto especialmente sob a ação dos dementais.
Indicação terapêutica: Auxiliar na limpeza do campo áurico e tratamento de emoções conflitantes.
Liberação de mágoas e pensamentos recorrentes. Trabalha as energias de cura do duplo etéri-co.
Bastante eficaz

principalmente para quem lida com público em geral e com pessoas difíceis, portadoras de conteúdo
emocional grave, tal como é a rotina de terapeutas e médiuns.
Meu Deus, Pai João — falou um dos trabalhadores. — Existe tanta coisa que desconhecemos!...
É, meu filho. E assim mesmo há quem critique a sabedoria milenar dos pais-velhos sem sequer


experimentar, classificando tudo como pura fantasia e misticismo. Nego-velho espera que, ao menos,
façam-se testes e
análises antes de atribuir tudo ao domínio do fantástico.


"Mas vamos continuar mais um pouco, filho. Acredito ser possível passar mais algumas dicas para
aproveitarem em seus trabalhos e, assim, não ficarem tão dependentes de orientação espiritual. "Opróximo remédio energético, nego-velho o chama de Águas-de-Hórus, apenas relembrando um
preparado muito


eficiente da Antigüidade.

AGUAS-DE-HORUS

Ingredientes: Rosas brancas e vermelhas, alecrim, manjericão, alfavaca, alfazema, girassol, mir-ra e
levante; remédios florais: Rosmarinus, Aristoló-quia, Holly, Chaparral, Floral de Emergência
Australiano; tinturas: arnica, espinheira-santa e menta; águas de mar, cachoeira, chuva e fonte.
Preparo: Lua nova ou cheia.

Indicação terapêutica: Ideal para iniciados ou pessoas que estejam despertando para o caminho
espiritual.

Desperta o sentido do belo e do bem. Promove o aumento da freqüência vibratória dos chacras
superiores e sensibiliza o psiquismo.

— Pai João — interpelou Tobias. — Conforme o senhor explicou, a pessoa pode apresentar excesso
nas
características de determinada polaridade energética, tanto com perfil de ansiedade, mais ativo,
elétrico ou yang quanto, de modo contrário, evidenciando traços mais sensíveis, emotivos ou yin.

Nesse caso, existe alguma fórmula indicada para auxiliar no equilíbrio energético desse indivíduo?

— Claro, filho — respondeu o pai-velho.
— Tenho duas recomendações baseadas em observações e anos de estudo com os tipos citados. É claro
que tais indicações, como as que fiz antes, não são fórmulas milagrosas, mas auxiliares. Apenas isso.
"Estes são os remédios energéticos que denomino simplesmente Yin e Yang, devido aos tipos de ervas
empregadas.
YANG
Ingredientes: Espada-de-são-jorge, arnica, cravo, canela, sementes de girassol e de mostarda, picão,


cipó


mil-homens, gengibre; água do mar, exclusivamente; remédios florais: Sempervivum, Pink Yar-row,
Moutain
Pride, que visam equilibrar as energias do indivíduo. Preparo: Lua nova ou cheia. Indicação


terapêutica: Aumenta o tônus vital e combate o esgotamento energético. Trabalha as energias vitais do
organismo, a
kundalini. Estimula a libido e desperta o lado yang, ativo e positivo do ser. Combate dificuldade de
concentração, dispersão mental e emoções mais afloradas ou intensas.
YIN


Ingredientes: Alecrim
chuva; remédios flor

Preparo: Lua nova co
sensível, emocional.
emotivo do ser. Para
hiperativas mental o

"Por último, nego-ve
sônia, como auxiliar
velho o chama de So
como solução oral, a

SONHOS

Ingredientes: Tintura
Valerian, Agrimony,

Dosagem: Tomar 30
Indicação

terapêutica: Insônia.

"Como vêem, meus
diversas modalidade

Entretanto, para sabe
aos outros o uso dess
forças

positivas durante o p
composto

feito sob a influência

Encerrando o assunt
de

pôr ou não em prátic

Fundamentos da vid

— Pai João — inicio
Ficamos sabendo qu
por

meio do jogo de búz
dizer, a respeito da r















































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Sinopse - Corpo Fechado - Robson Pinheiro
Eu andarei vestido e armado, com as armas de Jorge. Para que meus inimigos tendo pés não me alcancem, tendo mãos não me peguem, tendo olhos não me enxerguem, nem pensamentos eles possam ter para me fazerem mal. Armas de fogo o meu corpo não alcançarão, facas e lanças se quebrem sem ao meu corpo chegar, cordas e correntes se quebrem sem ao meu corpo, amarrar.

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Muita paz !

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