Estudantes
NA FLOR DA JUVENTUDE
PEREZ BA��AN
CAPITULO 1
A possante motocicleta guinou para a de couro e cal��as desbotadas, o rapaz
direita e passou por entre dois autom��-
girou o rosto para olhar o carro que
veis, sempre acelerando, depois for��ou parara ao seu lado.
para a esquerda, cortando a frente de
Chamou-lhe a aten����o a garota que
um ��nibus. Avan��ou velozmente rente acompanhava o motorista do auto. Era
ao meio-fio, e freou quando o sinal tor-
morena, de cabelos longos e negros. Seus
nou-se vermelho.
olhos verdes concentravam-se na figura
Ronronando, a m��quina ficou im��vel. imponente do motoqueiro, que esbo��ou
Sobre ela, vestindo um blus��o colante um leve sorriso. A mo��a n��o p��de re-
sistir e retribuiu. O motorista ao lado testemunhas aqui. Pode ferrar o sujeito dela olhou-a, depois voltou-se furiosa-do Maverick ��� sugeriu algu��m.
mente para o motoqueiro.
��� N��o, deixa estar. Eu o pego de
O sem��foro abriu, a moto arrancou. qualquer jeito ��� disse o motoqueiro,
O motorista do carro fez o mesmo, pi-
enquanto se lembrava daqueles olhos
sando forte no acelerador, avan��ando ve-
verdes e daquele sorriso espont��neo e
lozmente pela Avenida JK, alcan��an-
delicioso.
do-a.
O motoqueiro voltou o rosto para o
* * *
perigo. O carro fechava sobre ele, em-
purrando-o para o meio-fio. Ele freou.
V��tor estacionou o carro diante de um
A moto dan��ou sobre o asfalto. O rapaz
barzinho na Rua Par��. Patr��cia o olha-
fez um esfor��o supremo para mant��-la va. Seu rosto demonstrava ainda surpre-firme. No ��ltimo instante, um pis��o mais
sa e revolta ao mesmo tempo. Ela n��o
firme no freio a fez tombar lateralmen-
compreendia como ele tivera coragem
te, atirando-o longe. Ele rolou pelo as-
de fazer o que fizera.
falto, indo estatelar-se junto ao primeiro
��� Voc�� pode ter matado aquele ra-
poste.
paz ��� ela disse, ap��s respirar fundo e
Por algum tempo ficou ali, im��vel, en-
medir as palavras.
quanto carros freavam e um ajuntamen-
V��tor levou um cigarro �� boca e o
to se formava ao seu redor.
acendeu. Ap��s algumas baforadas, vol-
��� Voc�� est�� bem? ��� indagou-lhe um
tou-se e olhou-a entre c��nico e agres-
rapaz, inclinando-se sobre ele.
sivo.
��� Minha m o t o . . . O que houve com
��� N��o gostei do modo como ele a
minha moto? ��� indagou o piloto, ainda
olhou.
aturdido.
��� N��o vamos come��ar, por favor!
��� Est�� inteira, e voc��? ��� insistiu o
��� N��o estou come��ando nada. Ali��s,
outro.
cortei o barato daquele sujeito antes de
Lentamente o rapaz se ergueu, ampa-
come��ar. Se voc�� o conhece...
rado por algumas m��os que rapidamen-
��� Eu nem vi a cara dele. Estava de
te se estenderam. Firmou-se sobre um capacete, lembra-se?
dos p��s e depois sobre o outro. Desafi-
��� E da��? Sorriu para ele, n��o sorriu?
velou a al��a do capacete e retirou-o.
Patr��cia afundou-se em seu assento,
��� Acho que estou bem ��� balbuciou,
fechando os olhos. A cada dia tornava-se
abrindo caminho.
mais sufocante aquele ci��me. A qual-
��� Deve procurar um hospital ��� acon-
quer pretexto V��tor se exaltava. N��o ha-
selhou algu��m, mas ele ignorou o con-
via mais a confian��a de antes. A rela-
����o entre ambos se tornava insuport��-
selho.
vel.
Algu��m recolhera sua moto e a trou-
Recordou quando tudo come��ara, no
xera para junto do meio-fio. O rapaz ��ltimo fim de ano. V��tor e ela se co-
inclinou-se para examin��-la. Uma lan-
nheceram num grupo de amigos, duran-
terna lateral se quebrara. O mata-ca-
te o baile da passagem de ano.
chorro estava amassado. O resto parecia
em ordem. Acionou o bot��o da partida
Dan��aram juntos toda a noite. Con-
el��trica. O motor rateou, tossiu um pou-
versaram bastante. Mergulharam juntos
co, depois firmou-se, roncando normal-
na piscina quando o baile acabou. Vi-
ram o sol nascer. Alguma coisa s��lida
mente.
ficara daquela noite e fora alimentada
��� Eu vi o n��mero da placa ��� disse
nos encontros seguintes.
algu��m. ��� Est�� aqui anotado ��� acres-
Ele se mostrava atencioso, am��vel e
centou.
muito carinhoso, envolvendo-a e agra-
��� Voc�� devia chamar a pol��cia. Tem
dando-a, cercando-a de cuidados que a
2
faziam feliz. Tr��s meses depois, quando
Ele a encarou demoradamente, o ros-
o romance amea��ava tornar-se defini-
to s��rio. A tarde de s��bado, que prome-
tivo e consolidar-se, ele come��ara a dar
tia ser o in��cio de um final de semana
mostras daquele ci��me possessivo, dan-
divertido, transformava-se num desastre
do a Patr��cia a permanente sensa����o de por culpa daquele motoqueiro.
pertencer a ele, n��o por vontade pr��-
Desejou, ent��o, ardentemente, que
pria ou por fruto de uma conquista, mas
aquele sujeito tivesse se estourado no
por uma decis��o de posse tomada por
tombo. Seria uma boa li����o.
ele �� sua revelia. Essa atitude machista
Por outro lado, o desabafo de Patr��-
e insuport��vel em muito a vinha ma-
cia o intimidou. Ela nunca havia reagi-
goando ultimamente.
do daquela forma. Gostava dela e n��o
queria perd��-la. Sua beleza chamava a
Analisou seus sentimentos, enquanto aten����o. Sua presen��a era notada. A
ele continuava fumando e observando-a, id��ia de perd��-la se tornava um pesacomo se esperasse ouvir dela, de um mo-
delo, desde que, certo dia, numa reuni��o
mento para outro, uma confiss��o de de amigos, algu��m apontara as qualida-
culpa ou algo parecido.
des de Patr��cia e lembrara a V��tor o pe-
Gostava dele, por��m. Era ineg��vel rigo permanente que rondava uma mu-
isso. Naqueles meses todos haviam con-
lher t��o bonita e desejada.
vivido maravilhosamente e as recorda-
Mant��-la se tornaria cada vez mais di-
����es eram muitas e agrad��veis.
f��cil e isso o assustava. Conhecera-a num
Pensando naquela mudan��a, julgava momento de transi����o, quando, ao final
que algo havia acontecido. Talvez algum
da adolesc��ncia, tornava-se mulher. Em
problema particular o afetasse e se re-
t��o pouco tempo, muita coisa mudara
fletisse no relacionamento dos dois. In-
nela.
dagara, procurara saber. Tudo ia bem no
Tornara-se mais feminina. Trocara as
emprego dele, pelo menos era o que ele
cal��as desbotadas e as camisas folgadas
dizia. Em casa tamb��m n��o havia pro-
por vestidos que modelavam seu corpo.
blema algum.
Os cabelos displicentes de antes passa-
Se a raz��o daquele ci��me fosse algu-
ram a receber cuidados especiais e se
apresentavam sempre soltos e brilhan-
ma coisa que o afligisse, pondo-o inse-
tes, dan��ando ao redor de seu rosto, ro-
guro, Patr��cia n��o conseguira descobrir, ��ando seus ombros.
apesar dos esfor��os. Tentara. Queria
acreditar que o V��tor que a conquista-
Sim, Patr��cia se tornara uma mulher
ra n��o fora uma farsa, um erro lamen-
bem diante de seus olhos e, por incr��vel
t��vel.
que pare��a, ele fora o ��ltimo a notar
isso.
��� Em que est�� pensando? ��� indagou
ele, dominador, jogando fora o cigarro.
��� Est�� bem ��� ele disse, num esfor��o
supremo. ��� Est�� bem! Eu n��o devia
��� Em nada!
ter feito aquilo...
��� Preocupada com o motoqueiro?
��� Ainda bem que reconhece. Deve
��� Esquece, v��!
saber que algu��m pode ter anotado o
Ele riu cinicamente, como se lhe cau-
n��mero da placa. Vamos supor que o
sasse algum prazer provoc��-la daquela rapaz tenha se machucado e que esteja forma.
hospitalizado. Voc�� poder�� ser proces-
sado. Testemunhas n��o faltar��o. Voc��
��� Vamos descer? ��� convidou, ent��o.
fez aquilo diante de algumas dezenas
��� Perdi a vontade.
de olhos, inclusive os meus ��� interrom-
peu-se para tomar f��lego. ��� J�� pensou
��� Ainda chocada com o acidente?
nas conseq����ncias?
��� N��o. Chocada com sua mudan��a. O
��� Se a deixa mais calma, vamos vol-
que est�� havendo com voc��? Nem pa-
tar l�� e verificar ��� ele disse, dando
rece o mesmo de quando o conheci. Es-
partida.
t�� agressivo, ciumento, c��nico, insupor-
t��vel.
* * *
Eduardo firmou a moto sobre o su-
sos dele, igualmente cativada pelo rosto
porte, depois desceu e examinou a cor-
marcante do rapaz, pelos cabelos em de-
rente. Estava quebrada e enrolada na salinho, pelos olhos escuros e profundos, roda. Sentou-se no meio-fio e passou com um olhar penetrante e arrepiante.
as m��os pelos cabelos.
��� Eu disse que pago o conserto ���
��� Aquele... ��� resmungou.
disse V��tor, rispidamente, segurando-o
Tudo parecia estar bem com a moto pelo ombro e fazendo-o girar para
depois do acidente. O motor funcionara olh��-lo.
normalmente. Quando tentara andar, po-
��� Vai com calma, cara! ��� advertiu-o
r��m, ��quilo acontecera. Tentou imaginar
Eduardo, irritado com as maneiras do
como consertaria agora. As oficinas es-
outro.
tariam fechadas. Seria preciso abrir o
bloco e verificar se a engrenagem in-
��� O que ��? Vai querer engrossar? J��
terna da tra����o n��o fora afetada pela disse que pago o preju��zo ��� quase gri-passagem irregular da corrente.
tou V��tor, aborrecido com a troca de
Tudo isso queria dizer que, naquele olhares entre sua namorada e o moto-
final de semana, nada poderia ser feito queiro.
com a moto. Possivelmente nada pode-
��� E n��o faz mais que sua obriga����o.
ria ser feito tamb��m na segunda-feira Pra dirigir do modo como dirige deve
pela manh��, quando teria de ir para a ter tirado a carteira por telefone. O que Universidade.
pensa que ��?
Retirou um papel do bolso de seu blu-
V��tor balan��ou a cabe��a de um lado
s��o. Era o n��mero da placa do Mave-
para outro, depois sorriu cinicamente,
rick. Arrependia-se de n��o ter chama-
encarando o outro.
do a pol��cia. Com todas aquelas teste-
��� Quer saber de uma coisa? Dane-
munhas n��o seria dif��cil fazer com que se! ��� rugiu, virando as costas e rumano motorista pagasse os preju��zos.
do para o carro.
Ergueu-se. Teria de empurrar a moto
De passagem, apanhou Patr��cia rude-
ou telefonar para algum amigo que ti-
mente pelo bra��o, quase arrastando-a.
vesse uma camioneta para lev��-la.
��� V��tor, voc�� est�� me machucando ���
Nesse momento, um carro parou atr��s
protestou ela e, antes que ele pudesse
dele. Para sua surpresa, viu descer dele
compreender o que acontecia, Eduardo
o sujeito que provocara o acidente.
saltava sobre ele, segurando-o pelo co-
��� Cara, eu sinto muito pelo que acon-
larinho e puxando-o para tr��s.
teceu ��� come��ou V��tor. ��� Eu estava
mesmo com pressa e n��o pude evitar.
V��tor trope��ou no meio-fio e caiu. Er-
Voc�� est�� bem? A moto est�� bem?
gueu-se num salto e encarou furiosa-
mente o outro.
Eduardo fez um gesto mostrando a
corrente quebrada, depois ergueu os
��� Deixe isso, V��tor. Vamos embora
��� pediu Patr��cia, entrando no carro.
olhos para o carro. Patr��cia descia e ca-
minhava na sua dire����o.
��� N��o sem antes mostrar para o ar-
tista aqui quem sou eu ��� disse, aproxi-
P��de observ��-la de corpo inteiro e mando-se amea��adoramente.
seu cora����o bateu mais depressa. Era
linda. Aqueles olhos verdes cintilavam
Eduardo esperou-o na defensiva. Des-
mist��rio e fasc��nio. O corpo ondulante viou o punho que rumava para seu ros-tinha uma gra��a toda especial e deta-
to e, em resposta, afundou sua m��o no
lhes verdadeiramente arrebatadores.
est��mago de V��tor, que gemeu e dobrou-
se dolorosamente.
��� Eu pago o conserto ��� disse V��tor,
ap��s examinar a moto. ��� Conhe��o um
Eduardo ia golpe��-lo novamente, des-
mec��nico, posso traz��-lo aqui.
sa vez em pleno rosto.
Eduardo n��o o ouviu. Continuou olhan-
��� N��o, por favor! ��� gritou Patr��cia,
do Patr��cia, que parara a poucos pas-
descendo do carro.
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Eduardo relaxou o bra��o, enquanto a olhava fascinado. ��� Vai embora, cara!
olhava. V��tor recuara e se sentara no �� o melhor que pode fazer.
meio-fio, gemendo. Indecisa, Patr��cia fi-
Por instantes ele ainda ficou ali, co-
cou parada, sem saber a quem olhar. mo se fosse incapaz de se afastar. De-
Caminhou, afinal, at�� V��tor.
pois, lentamente caminhou at�� sua mo-
to, desceu-a do suporte e come��ou a
��� Viu? Tudo por culpa sua ��� solu-
empurr��-la.
��ou ele, o rosto crispado.
Enquanto se afastava, continuava
��� �� uma barra! ��� suspirou ela, le-
olhando Patr��cia, como se lhe prometes-
vantando os olhos para Eduardo, que a
se voltar a v��-la qualquer dia desses.
CAP��TULO 2
Patr��cia estendeu-se em sua cama e e reportagens sobre eles. Era fan��tica
ficou olhando o teto. Sentia-se realmen-
pelo Queen, mas reparou que, desde
te cansada. Os acontecimentos daquela que conhecera V��tor, aquele entusiasmo tarde serviram para refor��ar isso.
arrefecera.
Fora uma semana dif��cil. Provas e tra-
Sim, alguma coisa havia mudado ne-
balhos haviam tomado todo o seu tem-
la. Todas as coisas malucas que lhe da-
po. Estava ansiando por aquele s��bado vam prazer haviam sido deixadas. Seus e por um pouco de divers��o.
h��bitos mudaram. J�� n��o era a colegial
V��tor estragara tudo, dessa vez de deslumbrada por haver passado no ves-
uma forma que a magoara muito. Fize-
tibular. J�� n��o era a adolescente incon-
ra tudo para compreend��-lo, mas n��o seq��ente que gostava de patinar e dan-
conseguia nem de leve imaginar o que ��ar.
provocara aquela mudan��a.
Seus divertimentos haviam se torna-
Um homem n��o podia mudar daquela
do mais s��rios, mais adultos. Ergueu-se
forma, n��o podia agradar e cativar para,
e foi at�� o amplo espelho de seu arm��-
em seguida, se apossar, tornando-se do-
rio. Olhou-se. Na mesa de cabeceira ha-
no e senhor de uma mulher.
via uma foto sua, de corpo inteiro, ao
Nada lhe dava esse direito. O fato de lado de uma bicicleta.
gostar ou n��o dele n��o importava. Uma
Eram duas mulheres distintas. Uma
rela����o que deveria ser a dois tornava-
jovem e irriquieta, outra compenetrada
se unilateral. Apenas uma vontade pre-
e consciente de seu futuro. Fora uma
valeceria, a dele, armado de seu ci��me transi����o r��pida demais. Ela n��o perce-idiota.
bera isso.
Pensou, ent��o, no motoqueiro, enquan-
Qualquer coisa estalou dentro dela,
to passava os olhos pelas paredes de assustando-a. De repente percebia a
seu quarto. Deteve-se num enorme pos-
imensa carga de responsabilidade que
ter de Freddy Mercury, seu ��dolo, vo-
assumira. Um curso superior e um ro-
calista do conjunto ingl��s Queen.
mance com caracter��sticas s��lidas.
Sorriu, ent��o, percebendo o que a
De repente, t��o de repente, deixara
atra��ra tanto naquele motoqueiro. Era o de ser imatura. Era maravilhoso e igual-mesmo bigode espesso e negro, os mes-
mente assustador. Deixara de ser al-
mos cabelos penteados para tr��s, ape-
gu��m, sem despedida, sem consci��ncia,
nas ligeiramente rebeldes.
sem notar.
Fechou os olhos. Possu��a todos os
Pensou em V��tor, em como encar��-lo
discos do conjunto. Colecionava posters depois daquela tarde, em como enfren-5
tar e mudar o rumo tomado pelo namo-
Seria sua semelhan��a com Freddy
ro dos dois. Pensou em seu curso, nas Mercury? Seria o modo como ele a olhaprovas, nos trabalhos, na rotina di��ria ra, fazendo-a estremecer, perturbando-a?
e instintivamente encolheu-se.
Teria sido a maneira fulminante com
Fixou seu olhar no poster de Freddy que ele atendera seu apelo, quando lhe
Mercury. Ali estava seu ��dolo, algu��m pedira que n��o golpeasse V��tor nova-
que fora parte integrante e importante mente?
de sua adolesc��ncia. Estava deixando-o
Era muita coisa em que pensar no fi-
sem uma palavra, sem um adeus, sem nal de uma semana estafante, justamen-
uma satisfa����o.
te o tipo de coisa que detestaria fazer,
Algo entrou em ebuli����o dentro dela. fechada no apartamento.
N��o sabia se devia se entristecer na
despedida de um tempo passado ou se
devia festejar o tempo novo.
De qualquer maneira, alguma coisa
O ajuste final foi feito. O mec��nico
precisava ser feita. Principalmente na-
p��s a moto em funcionamento e enga-
quele s��bado, quando o sol se punha e
tou a primeira marcha, acelerando. So-
a noite ca��a mansamente sobre a cida-
bre o cavalete, sem tra����o, a roda girou
de. Foi at�� a janela do apartamento e velozmente.
ficou observando as luzes se acenderem
��� Pronto, est�� perfeita outra vez ���
durante algum tempo.
disse, desligando o motor.
A brisa fria do outono soprava con-
��� Rapaz, voc�� me quebrou um galho
tra seus cabelos, agitando-os e esfrian-
danado ��� sorriu Eduardo.
do-a. Um des��nimo profundo tomou con-
Para sua sorte, quando empurrava a
ta dela. Estava cansada. Se n��o fizesse moto, um grupo de rapazes passara, em qualquer coisa para se divertir, estou-suas motocicletas. Solidariamente o aju-
raria.
daram, rebocando-o at�� uma oficina, cujo
Havia discutido com V��tor, quando ele
propriet��rio morava nos fundos.
a trouxera para casa. Com certeza ele
Ali, a moto acabava de ser conserta-
n��o viria busc��-la naquela noite. Olhou
da. Anoitecera, mas valera a pena ter
o telefone.
esperado. Pelo menos n��o teria proble-
Lembrou-se de suas amigas. Pratica-
mas de transporte no domingo e na se-
mente n��o as via, sen��o rapidamente, gunda-feira para ir �� Universidade.
na Universidade, para onde V��tor a le-
Pagou o mec��nico, depois rumou para
vava todos os dias, pela manh��, e bus-
casa, onde, na certa, j�� deveriam estar
cava ao final das aulas.
preocupados com sua demora. Antes,
Deixara-as tamb��m. Era perturbador passou por uma farm��cia de plant��o e
observar esses detalhes. Um homem en-
comprou os rem��dios.
trara em sua vida e praticamente ocupa-
Quando chegou, teve de dar longas
ra todos os espa��os, todos os momentos.
explica����es e eliminar a preocupa����o de
Monopolizara seus pensamentos sem sua m��e, que sempre fora contra a com-
que percebesse. Apossara-se dela e exi-
pra da moto.
gia o reconhecimento dessa posse de um
Ap��s tranq��iliz��-la, Eduardo foi to-
modo que magoava.
mar um banho. Jantou e, antes de sair,
Voltou para a cama e sentou-se, atur-
foi ver o pai mais uma vez. Ele se en-
dida com aquelas descobertas inespera-
contrava acamado, e os rem��dios que
das. Pensamentos conflitantes passaram sa��ra para comprar eram para ele.
por sua cabe��a.
��� Como se sente, velh��o? ��� indagou,
Era bom o que acontecia? No poster,
sentando-se �� beira da cama.
Freddy Mercury n��o se atrevia a res-
��� Se eu disser que estou bem, voc��
ponder. Nos pensamentos de Patr��cia, dir�� que estou mentindo, filho. Por que gradativamente, a figura do motoquei-nos enganarmos, n��o? ��� ele disse, com
ro foi se impondo, como uma sa��da.
certa amargura.
6
��� Deixe disso, velho. Voc�� est�� fir-
o quarto. Sentia-se vazio e perdido. Des-
me e ainda vai se levantar desta cama de que o pai adoecera, e soubera qual mais cedo do que possa imaginar.
era o problema que havia com ele, vi-
��� Deus te ou��a, Eduardo, sinceramen-
nha se preparando para o pior. Agora,
te ��� disse o doente, estendendo uma pelo menos, havia uma chance, mas ela
das m��os e tomando a do filho.
poderia custar muito e exigir sacrif��cios
Apertou-a entre os dedos enfraqueci-
demasiados da fam��lia.
dos. Havia seriedade em seu rosto.
��� Vai sair? ��� indagou-lhe a m��e.
��� O Dr. Siqueira esteve aqui, logo
��� Sim, fiquei de encontrar uns ami-
ap��s sua sa��da, filho. Eu lhe disse que gos esta noite. Papai j�� dormiu.
o rem��dio havia terminado e que voc��
fora comprar mais. Ele aprovou... Por
��� O Dr. Siqueira me disse que ele
outro lado, disse n��o haver mesmo ou-
precisa de uma opera����o. Confirmou
tra possibilidade. A opera����o ter�� de ser
isso hoje, quando o examinou. O que
feita.
voc�� pensa disso?
��� Que seja, ent��o! ��� disse Edurdo,
��� Tranq��ilo, m��e! A medicina hoje
resignado e triste.
em dia �� capaz de milagres ��� disse,
arrependendo-se em seguida diante do
��� Percebe qual ter�� de ser nossa de-
olhar alarmado da m��e. ��� O que dir��
cis��o, n��o ��? Conto com voc��. Nada dis-
se �� sua m��e. Isso a desesperaria. Pre-
num caso simples como o do pai ��� cor-
ciso fazer a opera����o, �� a ��nica sa��da, rigiu, apertando-a em seus bra��os.
mas o risco a correr �� enorme. N��o es-
Pouco depois deixava a casa, num dos
tou fisicamente preparado para supor-
bairros residenciais do Vale Verde. Pa-
t��-la. �� um tr��gico dilema. Posso mor-
rou em um ponto qualquer, apenas para
rer sem ela... posso morrer nela.
acender um cigarro.
Eduardo voltou os olhos para fitar a
Olhou ao seu redor. Gostava de Lon-
parede, escondendo as l��grimas que drina, que o recebera muito bem e a
inundaram seus olhos. Ele e o pai sem-
seus pais. Filho ��nico, prestara vesti-
pre foram unidos. Suas conversas sempre
bular na Universidade e fora aprovado.
foram muito francas. Aquela, no entan-
to, era cruel demais, realista demais pa-
Cursava os ��ltimos anos de Engenharia
ra que pudesse suportar.
Civil. Tinha um futuro promissor.
Os dedos de seu pai apertando sua
Pensou no pai, que se mudara para
m��o, quase como um apelo, fizeram-no Londrina para estar junto do filho. Era voltar a olh��-lo.
um homem fora de s��rie que n��o hesi-
tara em deixar tudo que o agradava pa-
��� Sei que isso �� doloroso para voc��
ra apoi��-lo.
e muito mais para mim. Preferia ter de
resolver isso sozinho, poder fazer isso.
H�� tr��s anos atr��s moravam em Ouri-
Mas n��o posso e voc�� �� meu filho e nhos, no Estado de S��o Paulo, onde ti-
meu bra��o direito. Essa opera����o ser�� nham uma magn��fica fazenda. Quando
cara. Talvez tudo que temos...
Eduardo passou no vestibular, seu pai
��� Eu venderei a moto. Posso trancar
vendera a fazenda e aplicara todo o
minha matr��cula. Voc�� vai viver, pai. montante conseguido.
Aprendi muita coisa, posso conseguir um
Mudaram-se para Londrina, onde com-
emprego.
praram a casa onde moravam agora. O
O pai nada disse. Apenas o olhou com
problema de cora����o que h�� muito vi-
muito orgulho.
nha preocupando a fam��lia, manifesta-
ra-se agora com intensidade, agravan-
��� Descanse agora. Conversaremos do-se dia a dia.
amanh��, est�� bem?
Aquela opera����o preocupava Eduardo
��� Sim ��� concordou o homem, aco-
em todos os sentidos. Primeiro porque
modando-se melhor no leito.
seu pai poderia n��o resistir a ela e ape-
Eduardo cobriu-o carinhosamente, de-
nas ela poderia solucionar o problema;
pois beijou-o na testa. Sorriu e deixou segundo porque, financeiramente, pode-7
ria reduzir a zero as finan��as da fam��-
Olhou o c��u. A certeza de que em al-
lia e, ent��o, todo o futuro dele e da fa-
gum ponto sob ele, naquela mesma ci-
m��lia estaria comprometido.
dade, aquela jovem vivia trouxe-lhe cer-
Estava agitado e confuso, atordoado to al��vio, ainda que vago e distante.
ainda pela crua realidade que tinha de
Procur��-la poderia ser uma forma de
enfrentar. De dentro dele, ent��o, como espairecer. Encontr��-la, por��m, seria sor-um consolo desesperado e bom surgiu a
te demais, uma fantasia apenas. Mas,
figura de uma mulher, de magn��ficos ainda que fantasia, era a ��nica coisa
olhos verdes.
que tinha naquela noite.
CAP��TULO 3
A garota era uma amiga que conhe-
�� s��rio. Eu n��o posso prometer nada
cera pouco depois de chegar �� cidade. nem assumir qualquer compromisso ���
N��o era nada especial. Haviam sa��do disse ele, com apreens��o.
juntos algumas vezes sem maiores com-
��� �� t��o s��rio assim?
promissos. O fato de t��-la encontrado
��� Sim, infelizmente.
naquela noite o alegrou. No��mia sabia
��� Puxa, eu sinto muito! ��� exclamou
ser agrad��vel e encantadora.
ela, aconchegando-se no ombro dele.
��� Problemas? ��� ela indagou, ap��s
Eduardo passou o bra��o pelo ombro
perceber que ele n��o se encontrava em
dela, deslizando a m��o at�� o cotovelo.
seus melhores momentos.
Retornou lentamente, avan��ando um
��� Sim, muitos, mas vamos deixar isso
pouco mais, ro��ando o seio rijo e bem
desenhado.
de lado. O que voc�� me conta de novo?
��� Est�� preparado para uma grande
Ela descansou o rosto no ombro dele,
aventura? ��� ela perguntou, com um bri-
depois avan��ou os l��bios at�� seu pes-
lho desafiador nos olhos.
co��o, respirando ardentemente, excitan-
do-o, antes de mordiscar-lhe a ponta da
��� Que tipo de aventura?
orelha.
��� Estamos reunindo um pessoal para
��� J�� pensou em alguma coisa para
ir a S��o Paulo na sexta-feira que vem, esta noite? ��� indagou ela, a voz ligei-assistir ao show do Queen. Amanh�� al-
ramente enrouquecida.
gu��m ir�� at�� l�� conseguir os ingressos.
Estamos organizando uma lista do pes-
��� Sim, tenho planos para esta noite.
soal. Vamos de moto, carro ou ��nibus, Vamos tomar alguns chopes, depois va-
de qualquer maneira, mas vamos. O que
mos at�� sua casa. Suas amigas sa��ram?
me diz?
��� Iam sair, mas n��o combinei nada
��� Tentador ��� sorriu ele, pensando.
com elas. Detestaria que alguma delas
Talvez aquela fosse a aventura com chegasse de repente e nos apanhasse em
que vinha sonhando. No��mia poderia flagrante ��� ela riu, agora esfregando
acompanh��-lo. Iriam na moto. Poderia os l��bios pelo rosto dele, aproximan-
levar sua barraca e acampar em algum do-os de sua boca, esticando a ponta da ponto.
l��ngua para lamber-lhe provocantemen-
��� Vamos l��, tem que decidir agora. te o canto dos l��bios.
A lista s�� espera at�� amanh�� cedo,
Eduardo voltou o rosto lentamente.
Eduardo.
Esfregou seus l��bios aos dela, e a l��n-
��� Bem que eu gostaria de ir, mas gua insinuante foi alisar o c��u da boca
meu pai n��o est�� bem, o problema dele
da garota.
8
Suspirou e sorriu, deslizando a m��o
��� Na casa da D��bora. Estou acaban-
at�� as n��degas da garota. Beliscou-a ali.
do de chegar e pensei que voc�� gosta-
Ela riu, satisfeita em perceber que o ria de vir at�� aqui...
havia animado um pouco.
��� Sim, claro... Mas como sabia que
��� Acho que est�� havendo uma festi-
eu estaria aqui? ��� indagou, intrigada?
nha na casa da D��bora. O pessoal do
��� Bem, acabo de chegar do Safari e
batuque foi para l��. Vamos dar uma vi o V��tor sozinho l��. Conclu�� que de-
chegadinha? Um pouco de m��sica vai via ter brigado com voc�� e que estaria
anim��-lo ainda mais. Se n��o bastar, po-
sozinha. Quer que eu v�� busc��-la?
de estar certo de que eu o farei ���
prometeu ela, maliciosa.
��� Sim, meu pai mandou meu carro
para a revis��o. Como eu ia sair com o
��� Eu sei que o far�� ��� sorriu ele, en-
V��tor, nem me preocupei. Voc�� vem, en-
ternecido, beijando-a novamente.
t��o?
* * *
��� Se eu n��o for, mando algu��m bus-
c��-la. Como voc�� est�� vestida?
Patr��cia havia trocado de roupa. Ves-
��� Bem, com uma cal��a desbotada e
tira uma cal��a jeans desbotada e uma uma blusa, por qu��?
blusa folgada sobre o tronco nu. Os seios
��� Acabou de chegar aqui um novo
espetavam-se contra a malha, agressi-
amigo, algu��m que est�� se enturmando
vos e empinados. Olhou-se no espelho.
agora com a gente. �� coleguinha da
��� Est�� tudo, errado ��� soletrou ela, No��mia e bastante interessante. Talvez com profunda tristeza e alguma revolta. voc�� at�� o conhe��a. Ele faz Engenharia N��o podia ressuscitar o que fora. N��o
Civil na Universidade...
se enquadrava mais naquele papel. Mui-
��� Est�� bem, seja l�� como for, man-
ta coisa mudara em sua cabe��a. N��o bas-
de-o aqui depressa. Estou realmente an-
tava querer apenas, e tudo voltaria a ser
siosa para rever todas voc��s. Um beij��o!
como antes.
A id��ia de ter de se habituar �� nova
* * *
imagem que criara para si mesma con-
tinuava assustando-a. Pensou em V��tor,
V��tor estava em seu segundo u��sque.
em como aquela rela����o podia se tornar
Toda a raiva havia passado, bem como
sufocante a um ponto insuport��vel e a humilha����o que sentira ao ser agre-
desejou fugir.
dido por aquele rapaz, diante de Pa-
O telefone tocou. Ela se voltou para tr��cia.
ulh��-lo. Na certa era o V��tor. A ��ltima
Agora, pensando melhor, podia at��
coisa que desejava naquele momento era
aceitar o fato de que fora uma boa li-
falar com ele.
����o. Afinal, provocara deliberadamente
A campainha insistiu. Ningu��m aten-
toda a cena, movido pelo ci��me.
deu nas outras extens��es. Concluiu que
Pensou nisso tamb��m, nas constantes
o pai e a m��e j�� haviam sa��do para um
cenas, em como vinha perturbando Pa-
jantar com amigos. Estava sozinha no tr��cia com seu ci��me. Compreendeu que
apartamento e isso a aborrecia.
nada mais fazia do que perd��-la, agindo
Foi atender.
daquela forma. E perd��-la era justamen-
te algo que n��o desejava.
��� Patr��cia, �� a Ben��!
Tudo por qu��? Porque se deixara le-
��� Oi! H�� quanto tempo, puxa! Eu var pelos coment��rios dos amigos, que
estava justamente pensando em voc�� e louvaram a beleza de Patr��cia e, com
nas outras.
isso, haviam ferido seu orgulho pr��prio.
��� Calculei isso mesmo ��� disse a ou-
Era idiota pensar daquela forma.
tra e, ao fundo, podia ser ouvida a m��-
Patr��cia estava com ele, sa��a com ele,
sica alegre e ritmada de um conjunto reconhecia a exist��ncia de algo s��lido de samba.
entre os dois. N��o era uma garota vul-
��� Onde voc�� est��?
gar ou inconseq��ente.
9
Seu comportamento era irrepreens��-
mesmo tempo naquela m��o firme e
vel. Desde que iniciaram o namoro, ela
quente.
praticamente renunciara a tudo em fun-
Qualquer coisa agitou-se dentro dela.
����o dele. Deixara as amigas e tudo o N��o a semelhan��a com Mercury, n��o o mais, apenas para estar com ele.
que acontecera �� tarde, mas alguma coi-
Terminou o u��sque e pagou a conta. sa indefin��vel que a perturbou.
Estava agindo como um tolo. O que pre-
Em p��, diante dele, sentiu-se peque-
cisava fazer era procur��-la, desculpar-se na e impressionada. Ele se impunha e e fazer todo o poss��vel para faz��-la es-submetia pelo olhar, pela presen��a ape-
quecer aqueles momentos maus.
nas, como se seu corpo guardasse um
Sim, era justamente isso o que deve-
maravilhoso segredo de amor que desa-
ria fazer. Olhou o telefone sobre o bal-
fiava.
c��o do bar. Pensou em ligar, mas con-
cluiu que o melhor a fazer era procur��-
��� �� interessante e divertido como as
la pessoalmente. Na certa iria encon-
coisas acontecem, n��o? Ainda h�� pouco,
tr��-la em sua casa, sozinha, curtindo uma
quando sa��a de casa, eu pensava em vo-
fossa tremenda.
c��, e a noite est�� apenas come��ando...
Saiu, apanhou seu carro e rumou para
��� Queria me ver novamente?
O apartamento onde ela morava.
��� Sim ��� ele confessou, com seu
* * *
olhar cravado nos olhos dela.
��� Por qu��?
Patr��cia fechara o apartamento e des-
Ele n��o respondeu. Em seu sorriso ha-
cera ao t��rreo, para esperar pela sua ca-
via toda a explica����o. Por que um ho-
rona. Havia alguns vizinhos, e ficaram
mem e uma mulher desejam voltar a se
conversando. Crian��as aproveitavam encontrar? Quem saberia a resposta ou
seus ��ltimos momentos no parque infan-
as respostas?
til antes de subirem. A noite estava um
pouco fria e ela ficou satisfeita por ter
��� E como voc�� me achou?
vestido aquela blusa de mangas com-
��� Um golpe de sorte, o acaso, o des-
pridas.
tino, chame como quiser. Acho que es-
De repente, seus olhos se fixaram num
t��o preparando alguma coisa para n��s
motociclista que descia a rua lentamen-
��� disse ele, misterioso, apontando para
te e parava diante do pr��dio. Ele reti-
o alto.
rou o capacete. Patr��cia o reconheceu.
Era o mesmo que V��tor derrubara na-
Instintivamente Patr��cia levantou os
quela tarde.
olhos e apenas viu estrelas num c��u pro-
fundo e negro.
Ele sorriu e balan��ou a cabe��a de um
lado para outro. Apoiou a moto no su-
��� Ben�� pediu-me que viesse busc��-la.
porte e desceu, caminhando ao encon-
Conhece-a, n��o?
tro dela. Sem saber ao certo por que,
��� Ben��? Sim, claro... Ent��o v o c �� . . .
Patr��cia caminhou ao encontro dele.
Puxa vida! N��o �� mesmo uma coinci-
A semelhan��a com Freddy Mercury d��ncia incr��vel? ��� riu ela.
era grande, mas ele era real, estava ali,
��� Est�� pronta? Espero que n��o tenha
diante dela, contagiando-a com aquele medo de andar de moto...
sorriso que ela n��o podia compreender,
mas que adorava.
��� De forma alguma. Adoro moto ���
ela disse, guardando para si a observa-
��� Voc�� �� a Patr��cia? ��� indagou ele.
����o de que gostava tamb��m do moto-
���> Sim ��� respondeu ela, sem poder
queiro.
imaginar como ele soubera seu nome.
Caminharam para o pequeno ve��culo.
��� Meu nome �� Eduardo ��� ele falou,
Um carro desceu a rua e freou diante
estendendo a m��o.
do pr��dio. Um rapaz saltou. Por instan-
Patr��cia estendeu automaticamente sua tes ficou parado como um idiota, depois m��o para ele. Sentiu for��a e carinho ao
se apressou ao encontro deles.
10
CAP��TULO 4
V��tor parou diante dos dois, olhan-
dela o prendiam com for��a, entrela��a-
do-os entre furioso e surpreso. Uma ex-
das �� frente.
press��o de desalento estampou-se no
Baixava os olhos e observava os de-
rosto de Patr��cia. Eduardo postou-se na
dos finos e delicados, imaginando-lhes
defensiva.
a maciez e o toque carinhoso. Gostou
Incentivado pelo u��sque, mas confuso daquela sensa����o. Gostou daquele sen-diante do inesperado, V��tor tentava ar-
timento interessante que brotava den-
ticular as palavras, enquanto seus pu-
tro dele, como se o fato de t��-la con-
nhos se crispavam.
sigo significasse alguma coisa de espe-
��� O que voc�� pensa que eu sou, Pa-
cial.
tr��cia? ��� disse, afinal, apontando-lhe o
Para a garota, havia ainda um fato
dedo de uma forma grosseira.
especial em todos aqueles acontecimen-
��� Espere um pouco, cara! ��� falou tos. A forma como V��tor a procurara e
Eduardo, e o dedo em riste de V��tor como Eduardo a defendera faziam-na se voltou-se para ele.
sentir no centro de uma disputa.
��� Voc�� cale a boca! E se for esperto,
Era uma f��mea primitiva diante do
vai dar o fora daqui imediatamente.
embate dos machos que a disputavam.
Se por um lado essa concep����o machis-
��� �� uma boa id��ia! ��� concordou
ta da disputa fosse de encontro a suas
Eduardo, segurando Patr��cia pelo bra��o id��ias feministas, por outro havia o fato e levando-a para a moto.
em si, delicioso e excitante, capaz de
V��tor o alcan��ou, segurando-o pelo despertar toda sua aten����o para com o ombro rudemente. Perdendo a calma, vencedor.
Eduardo se voltou rapidamente e seu
Por que Eduardo agira daquela for-
punho atingiu o rosto de V��tor, que cam-
ma? Por que reagira e a mantivera? Te-
baleou.
ria sido puro cavalheirismo, ou havia,
Antes que pudesse se refazer, os dois
ocultas em sua a����o, uma inten����o ou
j�� partiam com a moto. V��tor ficou ali,
uma atra����o, ou as duas ao mesmo tem-
aturdido, tentando raciocinar. Depois, po?
cego pelo ci��me e pelo despeito, correu
Era tentador descobrir isso. Prestou
para o carro e saiu em persegui����o aos
aten����o ao homem �� sua frente. Era al-
dois.
to, de ombros largos e um rosto pareci-
A motocicleta levou vantagem no tr��n-
do com o de Freddy Mercury, seu ��dolo.
sito movimentado do s��bado. Rapida-
Como seria am��-lo e ser amada por
mente ganhou uma avenida e "costu-
ele? Seria ciumento como V��tor, ou, uma
rou" por entre os carros, afastando-se vez seguro do amor de sua parceira, de-do alcance de V��tor.
dicaria todo seu tempo em agrad��-la e
Na garupa da moto, Patr��cia apertava faz��-la feliz?
seu corpo contra o de Eduardo, tendo-o
Apertou-se a ele, pousando sua cabe��a
enla��ado �� altura do peito. A proximi-
contra as costas de Eduardo. Ele voltou
dade deles produzia uma sensa����o nova
ligeiramente a cabe��a para olh��-la. De-
e perigosa dentro dela.
pois, soltou uma das m��os do guid��o
Podia sentir a musculatura firme da-
e pousou-a sobre as m��os dela, unidas
quele corpo e se deixar envolver por
em seu peito.
uma aura protetora e carinhosa que ema-
nava dele.
* * *
�� frente, Eduardo sentia-se da mesma
forma. A press��o do corpo de Patr��cia
De volta ao bar, V��tor pediu um u��s-
contra suas costas espica��ava-o. Perce-
que e foi se sentar numa das poucas
bia claramente as formas rijas dos seios,
mesas desocupadas. Estava furioso. Mal
e as coxas ro��ando as suas. As m��os podia acreditar que tudo aquilo tivesse 11
acontecido com ele. No entanto, ali es-
��� Inclusive a Patr��cia. Estava che-
tava, em pleno rosto, um incha��o dolo-
gando quando sa��mos ��� informou outro.
rido para prov��-lo.
��� Sozinha? ��� indagou V��tor.
Por outro lado, todas as suas ciumen-
��� N��o, chegou com o Eduardo, um
tas suspeitas pareciam ter se confirma-
cara novo que est�� se enturmando agora.
do. O fato de haver encontrado Patr��cia
com o motoqueiro, saindo com a maior
��� Aquele da moto?
naturalidade, dava-lhe a entender que
��� Sim, ele mesmo ��� informaram.
o caso entre os dois n��o era recente.
��� Eu j�� vou para l��.
Sendo assim, mesmo quando sa��a com
��� Estaremos esperando ��� despedi-
ele, Patr��cia j�� se encontrava com o ou-
ram-se eles.
tro. Isso espica��ava seu ci��me e seu des-
peito, pois se sentia menosprezado e ri-
V��tor sentiu-se invadir por uma falsa
dicularizado.
sensa����o de calma. Relaxou aparente-
mente, mas sua mente fervilhava. Quan-
Quantos na cidade n��o saberiam da li-
tos na casa da D��bora sabiam do que
ga����o de Patr��cia com aquele sujeito? estava acontecendo? Talvez todos eles Quantos n��o estariam rindo dele, V��tor, sempre soubessem e houvessem oculta-pelo rid��culo papel nas m��os de Patr��-
do dele o fato.
cia?
Revoltou-se contra todos, indistinta-
Toda a mudan��a que observara nela mente. Precisava fazer algo para redi-
tinha fundamento. Aquelas conversas mir-se, ou passaria a ser o bobo da cor-veladas dos amigos tinham sentido. Eles te, o idiota completo, o palha��o no meio procuravam inform��-lo do que estava deles.
havendo mas ele, como um tolo, n��o per-
cebera.
* * *
Quanto mais pensava no assunto, mais
furioso se tornava. Para onde Patr��cia
Quando chegaram, Eduardo e Patr��-
e o outro tinham ido? Aquela noite de cia subiram de m��os dadas a pequena
alameda at�� a casa. A ampla sala es-
s��bado mal come��ara.
tava fartamente iluminada e o som agra-
Uma suposi����o tomou conta de seus d��vel de um samba da moda ganhava
pensamentos, fazendo com que todos os a noite de outono, dando-lhe um fasc��-
m��sculos de seu corpo se retesassem. nio especial.
Os dois poderiam estar agora num mo-
�� porta, No��mia os aguardava. Tinha
tel!
ouvido o ronco inconfund��vel da moto
Essa id��ia era cruel demais para ele. e fora ao encontro de Eduardo. Ao v��-lo Todo o tempo procurara manter o resse aproximar, de m��os dadas com Pa-
peito, n��o avan��ando al��m do que Pa-
tr��cia, estremeceu.
tr��cia determinava. O fato de que, so-
Fossem quais fossem as rela����es en-
vina com os carinhos dele, ela se entre-
tre os dois, o fato era que Eduardo lhe
gasse ao outro, livre e abertamente, fa-
pertencia e ningu��m o tomaria dela.
zia-o estremecer de indigna����o.
Quando o casal parou diante deles, No��-
mia sorriu, fingindo calma.
Terminou aquele u��sque. Pediu outro.
Um grupo de amigos apareceu, indo at��
��� Com licen��a, queridinha ��� disse,
o balc��o. Compraram alguns litros de estendendo as m��os e separando-os.
u��sque e depois iam saindo. Viram-no.
Enla��ou Eduardo pela cintura, depois
��� O que voc�� est�� fazendo aqui? ��� p��s-se nas pontas dos p��s para beij��-lo
indagou um deles.
com provoca����o, diante do olhar surpre-
so de Patr��cia.
��� Nada de especial ��� ele respondeu,
��� E o V��tor, como vai? Ouvi dizer
procurando disfar��ar o incha��o do ros-
que voc��s iam ficar noivos ��� disse No��-
to com um movimento de m��o.
mia, com a vis��vel inten����o de barrar
��� Estamos na casa da D��bora, rapaz. qualquer avan��o da parte da outra em
Todo o pessoal est�� l �� . . .
rela����o a Eduardo.
12
��� Pois eu n��o ouvi nada disso
das almofadas no ch��o, diante dos m��-
respondeu Patr��cia, no mesmo tom, dei-
sicos. No��mia o acompanhou.
xando-os �� porta e indo misturar-se aos
��� Marquinho, como v��o as m��sicas
jovens que se espalhavam pela sala.
novas? Ouvi dizer que voc�� encontrou
Eduardo se voltou para No��mia.
um parceiro e que juntos compuseram
coisas realmente boas. Por que n��o toca
��� O que foi isso agora? ��� indagou.
alguma coisa para n��s?
��� Como assim? Refere-se a Patr��cia?
��� Falou! ��� respondeu o rapaz, fir-
Ora, Eduardo, somos amigas, eu me in-
mando o viol��o junto ao corpo e debru-
teresso por ela, quero saber como vai ��ando-se sobre ele.
ela em todos os sentidos. Ela �� quase
noiva, sabia? Talvez se case em breve...
Dedilhou uma introdu����o r��pida, de-
pois come��ou a cantar. Sua m��sica fa-
��� E por que me diz isso nesse tom?
lava do amor, de suas contradi����es, de
Percebo que sua inten����o �� desencora-
suas recompensas.
jar-me, como se meu interesse por Pa-
tr��cia fosse uma coisa provada e, tam-
"Por que negar, se em teu olhar, eu
b��m, como se eu tivesse alguma satis-
vejo tudo!", dizia o refr��o.
fa����o especial a lhe dar, No��mia. Voc��
Como que compreendendo o sentido
sabe que eu n��o gosto nada de vulgari-
especial daqueles versos, os olhares de
dades e isso que voc�� fez foi vulgar ���
Eduardo e Patr��cia se encontraram. A
ele disse, deixando-a sozinha.
seriedade em seus rostos traduzia o sen-
��� Espere, Eduardo ��� chamou ela.
timento vacilante e irrevers��vel que es-
Abra��ou-o. Suas m��os carinhosas su-
palhava s��lidas ra��zes em seus cora����es.
biram pelas costas dele. Seus dedos en-
Assim como a m��sica, que falava da
rolaram-se nos cabelos de Eduardo, en-
casualidade de um encontro, da inten-
quanto ela se punha novamente nas pon-
����o de um casal em ignorar um senti-
tas dos p��s para ro��ar seus l��bios aos mento que os unia, havia uma verdade dele.
que se estampava nos seus olhos e que
��� Adoro voc��, sabe disso ��� declarou
era ineg��vel.
ela, colando seu rosto ao dele. ��� Voc��
No��mia, junto de Eduardo, percebeu
�� especial para mim, n��o se esque��a.
isso e se sentiu assustada ante a pos-
Eduardo segurou-a pelos ombros, fa-
sibilidade de perd��-lo para a outra. Co-
zendo com que ela se afastasse gentil-
nhecia Eduardo desde que ele chegara
mente. Olhou-a nos olhos. Percebia cla-
�� cidade. Apresentara-o aos outros,
ramente que No��mia gostava dele. Ti-
acompanhara-o, dera-lhe bons momen-
nha um carinho todo especial por ela, tos. N��o julgava justa aquela recom-
pelo seu companheirismo, pelos bons pensa.
momentos que proporcionava. Da�� a re-
Toda sua revolta, por��m, foi canali-
conhecer que a amava era um passo lon-
zada para Patr��cia, cujo comportamento
go demais no seu modo de entender.
No��mia n��o entendia. Patr��cia tinha um
Com os olhos, procurou Patr��cia na namorado, V��tor. Estavam quase noivos,
sala. Viu-a junto aos m��sicos, rindo, jo-
pelo menos era o que sabia. Ningu��m
gando os cabelos para tr��s num gesto comentara nada sobre um rompimento.
espont��neo e atraente.
Por que, ent��o, ela vinha ��quela festa
Como que atra��da pelo olhar dele, ela
se engra��ar justo com Eduardo? Se pre-
se voltou. Por instantes ficaram se tendia fazer ci��mes ao V��tor, que pro-
olhando. A magia e o fasc��nio daqueles curasse Um outro.
olhos verdes provocavam em Eduardo
Percebia que Eduardo estava se dei-
uma sensa����o que No��mia jamais en-
xando envolver e que, fatalmente, aca-
tenderia.
baria magoado pelo procedimento de
��� Tudo bem? ��� indagou No��mia.
Patr��cia, que na certa o usava para seus
Um grupo ruidoso de rapazes passou prop��sitos.
por eles, distribuindo bebidas. Eduardo
Abra��ou Eduardo, como que desejan-
apanhou um copo e caminhou at�� uma do afirmar diante de todos e principal-
13
mente de Patr��cia que havia algo entre olhou na dire����o onde esperava encon-ambos que n��o devia ser ignorado.
trar Patr��cia.
Suas m��os prenderam o rosto do ra-
O lugar estava vago, ela havia se le-
paz, fazendo com que ele a olhasse.
vantado. Procurou-a pela sala. Ergueu-
se. Algu��m gritou �� porta da sala.
��� Linda a m��sica, n��o? Pode ler tam-
b��m em meus olhos?
��� Eduardo, est��o mexendo na sua
moto!
��� Ler o qu��, No��mia? ��� retrucou
ele, alheio ��s inten����es dela.
��� �� ladr��o, pessoal! ��� gritou al-
gu��m.
��� Bobinho! ��� disse ela, beijando-o.
Eduardo correu para a porta e desceu
A m��sica acabou e todos aplaudiram. a alameda na dire����o do local onde dei-
O beijo for��ado de No��mia tamb��m ar-
xara a moto. Havia tr��s rapazes l��. Um
rancou aplausos e brincadeiras. Quando deles acabara de chutar sua moto e der-Eduardo p��de se desvencilhar dela, rub��-la. Era V��tor.
CAP��TULO 5
Um sil��ncio total pairou no jardim. A
percebera isso antes, mas o procedimen-
brisa noturna n��o ousava estremecer to dele, agora, confirmava tudo.
os fr��geis galhos das roseiras alinhadas
N��o podia deixar que V��tor descarre-
ao longo da alameda, como se temesse, gasse tudo isso sobre Eduardo, que fora, com isso, precipitar os acontecimentos.
at�� ent��o, um espectador inocente, en-
Parados, frente a frente, V��tor e volvido naquele pesadelo.
Eduardo se olhavam. O ressentimento
Se havia algu��m que podia evitar que
entre ambos chegara a um ponto explo-
os dois se engalfinhassem numa briga,
sivo agora. A moto estava ca��da, sem era ela. A ��nica forma de fazer isso se-maiores danos, mas n��tida fora a inten-
����o de V��tor em provocar o outro.
ria levantar o moral de V��tor, mesmo
que isso lhe custasse todas as suas chan-
Confiante nos dois amigos postados ces de permanecer ao alcance de Eduar-
atr��s dele, dispunha-se a, de uma vez do e descobrir o que ele provocava nela.
por todas, curar seu orgulho pr��prio fe-
rido. O cen��rio era ideal. Ali, diante
��� V��tor, pare com isso! ��� ela disse
de todos aqueles que, na certa, riram e todos os rostos se voltaram para ela.
dele pelo rid��culo papel que desempe-
��� Fique fora disso, Patr��cia. A briga
nhara.
dele �� comigo. N��o sei o que ele viu
��� N��o devia ter feito isso, cara ��� em mim, mas posso afirmar que a anti-
disse Eduardo, soletrando.
patia �� m��tua. Dev��amos ter resolvido
���
tudo isso hoje �� tarde, quando ele me
Eu fa��o o que eu quero. Voc�� n��o derrubou da moto...
gostou, n��o ��? Ent��o o que vai fazer a
respeito? ��� desafiou V��tor.
��� N��o, n��o h�� nada para ser resol-
Eduardo pesou a situa����o. V��tor n��o vido entre voc��s dois. O problema todo
estaria t��o confiante e provocador se n��o
�� entre mim e V��tor ��� afirmou ela, ca-
contasse com o aux��lio dos amigos que minhando at�� V��tor.
trouxera consigo.
Olhou-o demoradamente, e a certeza
Atr��s dele, Patr��cia percebia o que es-
de que nada nele a interessava mani-
tava acontecendo. De alguma forma, sen-
festou-se nela. N��o havia, por��m, outra
tiu-se culpada de tudo. V��tor tinha um sa��da. Era a ��nica forma de afast��-lo temperamento violento e irasc��vel. N��o dali e evitar um esc��ndalo desagrad��vel.
14
��� Desculpe-me, V��tor. Seu ci��me sem
e ficara e n��o havia como mudar isso
fundamento estava me aborrecendo. Eu nem como expulsar aquela dor.
quis apenas dar-lhe uma amostra de
como seria se eu quisesse realmente lhe
Freou a moto diante do pr��dio e des-
fazer ci��me. Nada tenho com o Eduar-
ceu, acompanhado de No��mia. Passaram
do. Eu o conheci hoje �� tarde, quando pelo sagu��o vazio e tomaram o eleva-
voc�� o fechou com o carro. Usei-o, en-
dor. Momentos depois estavam no apar-
t��o, para irrit��-lo. Eu errei, voc�� me tamento que ela dividia com algumas
perdoa?
amigas, todas estudantes, vindas de ou-
tras cidades da regi��o.
O tom sincero da garota, a confiss��o
No��mia era de uma fam��lia classe m��-
diante de todos, tornando Eduardo um
palha��o da vontade de Patr��cia, curou dia. Seu pai era advogado numa cidade o orgulho pr��prio ferido de Vtor.
vizinha. Ela cursava o segundo ano de
Letras Anglo-Portuguesas. N��o que o
Desarmado, esbo��ou um sorriso est��-
curso a interessasse de todo. Importava
pido, ao mesmo tempo que olhava desa-
mais o fato de cursar a Universidade,
fiadoramente em volta. Ali estava a pro-
de estar fora de casa, de conhecer gen-
va de que todos estavam enganados e te nova, fazer novos amigos, sentir-se
que Patr��cia ainda estava nas m��os dele,
que sempre gostara dele e que Eduardo liberada.
n��o passara de um joguete.
Conhecer Eduardo fora uma das me-
��� Claro que sim, amor ��� respondeu
lhores coisas que lhe acontecera. Vira-o
ele, abra��ando-a. E, diante dos olhos en-
na Universidade, perdido entre os pr��-
tristecidos de Eduardo, beijou-a longa-
dios, procurando o local de matr��cula.
mente.
Abordara-o, acompanhara-o e ganha-
Eduardo olhou ao seu redor. Havia ra uma carona e uma esperan��a. Reve-
olhares solid��rios, mas no fundo, todos zava com suas amigas as idas para a eles pareciam zombar dele. Caminhou Universidade. Cada dia usavam o carro
at�� a moto e ergueu-a. No��mia rapida-
de uma delas, e isso, ao final, represen-
mente subiu para a garupa.
tava uma importante economia nas me-
��� Eu tentei avis��-lo, querido ��� mur-
sadas, capaz de permitir-lhes acompa-
murou ela, ao ouvido dele, enquanto ele
nhar a moda e freq��entar os locais onde
punha a moto em funcionamento.
a turma se reunia.
Antes de arrancar em velocidade,
Enquanto Eduardo se sentava no am-
Eduardo olhou mais uma vez na dire-
plo sof�� da sala ela foi verificar se as
����o de Patr��cia. Apesar do que ela dis-
amigas j�� haviam voltado. Sentiu-se fe-
sera, havia alguma coisa naquele olhar liz ao constatar que estavam a s��s no que o fazia pensar na m��sica que ouvi-apartamento.
ram l�� dentro.
Descal��ou as sand��lias, soltou alguns
"Por que negar, se em teu olhar, eu bot��es da blusa e foi at�� a cozinha apa-vejo tudo!"
nhar gelo e copos. Passou por um arm��-
rio e retirou dele uma garrafa de u��s-
* * ���
que. Serviu dois copos. O de Eduardo
com bastante gelo, como ele gostava.
Havia despeito e revolta no cora����o
Entregou-o a ele, depois sentou-se ao
de Eduardo, torturando-o de uma forma
seu lado, ligeiramente voltada para ele.
inesperada. O que acontecera realmente Movimentou os ombros at�� conseguir o o atingira. Estar com Patr��cia fora algo efeito que desejava. Pela blusa entrea-novo e revelador. Sentira aquela sen-
berta, os seios nus se exibiam parcial-
sa����o sonhada e procurada de simples-
mente.
mente saber o momento em que aquela
��� Chateado, amor? ��� indagou, aca-
mulher especial surge para ficar.
riciando-lhe o peito, soltando alguns bo-
Ela surgira e entrara com viol��ncia t��es, e buscando os m��sculos bem deli-
em seu peito, instalando-se e traindo-o, neados, para apert��-los com deliberada tudo num mesmo dia. Mas ela entrara vol��pia.
15
��� Eu vou pegar aquele sujeito e dar-
Estendeu a l��ngua e lambeu lentamen-
lhe uma boa li����o ��� prometeu Eduardo.
te os contornos de um dos seios, enquan-
��� Para qu��? ��� Despeito? Devia dar
to a puxava para si, cada vez mais, at��
uma surra na Patr��cia, isso sim ��� su-
que pudesse beijar o bico eri��ado que
geriu ela. ��� Afinal, ela foi a culpada se oferecia.
de tudo.
Trouxe as m��os para o ventre da ga-
Por momentos o rosto de Eduardo se rota, depois subiu-as at�� dominar as for-tornou indecifr��vel. A lembran��a daque-
mas arredondadas e firmes dos seios
les olhos verdes provocavam a sensa-
dela. Levantou os olhos para No��mia.
����o de que nem tudo que fora dito era Sua boca estava entreaberta e seus l��-
verdade.
bios brilhavam, ��midos pela excita����o,
assim como seus olhos, semicerrados nu-
��� O melhor a fazer �� esquecer tudo. ma express��o de desejo.
E para isso, aqui est�� sua gatinha...
Vamos, olhe para m i m . . . ��� pediu ela,
Ela lhe beijou os cabelos, depois foi se
encolhendo junto dele, beijando-lhe o
dengosa, segurando-o pelo queixo e vi-
rosto, mordiscando-lhe os l��bios, provo-
rando-lhe a cabe��a para que ele a cando-o, enquanto suas m��os soltavam
olhasse.
os ��ltimos bot��es da sua camisa.
Ele sorriu, compreendendo o esfor��o
Abra��aram-se com for��a, estendendo-
que ela fazia para anim��-lo. Era uma se sobre o sof��, entregues �� for��a avas-boa garota. Pena que n��o lhe provocas-
saladora do momento e da paix��o.
se aquelas mesmas sensa����es que sentira
com Patr��cia.
* * *
Fechou os olhos e recostou-se no sof��.
As m��os carinhosas de No��mia se esten-
Sentados bem juntinho no interior do
tenderam, tocando-o. Tomou mais um carro, Patr��cia e V��tor trocavam um bei-
gole de u��sque, depois depositou o copo
jo reconciliador. Enquanto sentia os l��-
sobre a mesa de centro.
bios dele devorarem os seus, ela pensa-
��� Vamos, me d�� um pouco de aten-
va naquela sensa����o de vazio que a in-
����o ��� pediu ela, erguendo-se diante de-
vadia.
le e postando-se numa atitude provo-
Mesmo que se esfor��asse, n��o conse-
cante.
guia sentir nada em rela����o a V��tor, de-
Eduardo a olhou, deslizando o olhar pois de tudo que acontecera. Pensou nos pelo rosto bonito, pela blusa entreaber-momentos anteriores, no que j�� haviam
ta, pelos quadris bem desenhados e pe-
sentido antes, na conviv��ncia antes da
las coxas esculturais.
crise de ci��mes dele, esfor��ando-se para
reviver antigas sensa����es, mas era in��-
Estendeu as m��os, segurando-a logo til.
acima dos joelhos e puxando-a para si.
No��mia debru��ou-se para frente, deixan-
Prazer algum lhe advinha daquele bei-
do cair os cabelos diante dos olhos.
jo. Pelo contr��rio, uma sensa����o de su-
focar-se, de se sentir violentada em seus
Seus seios ficaram expostos aos olhos
desejos mais ��ntimos a inquietava, pro-
dele. Com o queixo, Eduardo firmou a
vando-lhe que nada mais seria o mesmo.
abertura da blusa, enquanto seus l��bios
pousavam sobre o vale perfumado e ten-
Seus pensamentos se fixaram em
tador. Suas m��os avan��aram para as n��-
Eduardo, nas pequenas mas marcantes
degas da garota, depois subiram um sensa����es que sentira junto dele. Elas
pouco mais, alcan��ando a linha acentua-
cresciam em import��ncia, tornando-se
da da cintura. Repuxou a blusa. Tocou-
insubstitu��veis e desejadas.
lhe a pele. Seus instintos despertaram.
V��tor soltou-a, depois reclinou-se em
Seus pensamentos se confundiram. O seu assento e acendeu um cigarro. Era
verde de um olhar trai��oeiro fez de seu
todo satisfa����o.
despeito um desejo de aplacar a revolta
��� Como as coisas acontecem, n��o? ���
de alguma forma.
comentou ele.
16
��� Por que diz isso? ��� retrucou ela, organizando um grupo para ir at�� S��o recompondo-se.
Paulo assistir ao show do Queen, no
��� Isso tudo que aconteceu. Confesso Morumbi.
que me fez perder a calma, mas me pro-
Seria a chance de realizar muita coi-
vou o quanto estava errado. Adorei o sa, de p��r a cabe��a no lugar, se enquaque voc�� fez, amor. Pe��o-lhe desculpas drar novamente no mundo, pensar em
por meu ci��me e prometo que, de agora
seus sentimentos e tomar decis��es.
em diante, tudo vai ser diferente.
Seria a sua despedida de um tempo
Patr��cia olhou-o, desejando gritar-lhe que passara. Seria seu adeus �� adolesque tudo realmente seria diferente, que c��ncia no ��ltimo culto ��queles que fo-n��o poderia suport��-lo, que n��o poderia
ram seus ��dolos e que haviam povoado
encontrar nele a menor alegria, a mais aqueles anos inquietos e divertidos com simples felicidade.
o som m��gico de suas m��sicas e com
a poesia de suas letras.
Pensar que ela pr��pria criara aquela
Extravasaria toda sua preocupa����o e
pris��o para si mesma a fazia furiosa con-
sairia de l�� com a cabe��a pronta para
sigo. Talvez tivesse agido certo evitan-
novas decis��es e para um tempo novo.
do aquela briga. O pre��o a pagar, po-
Mas o que V��tor diria de tudo isso?
r��m, parecia-lhe agora alto demais.
Olhou-o. Ap��s o que acontecera na-
A suposi����o de que, caso deixasse que
quele dia, a prud��ncia a aconselhava a
Eduardo e V��tor acertassem todas as di-
deixar o assunto para outro dia. O de-
feren��as, seu caso com V��tor seria de-
sejo de test��-lo, por��m, aborrecendo-o
finitivamente encerrado e ela estaria li-
ou irritando-o, magoando-o de alguma
vre para procurar sua felicidade batia-
forma, tornou-se irresist��vel.
lhe firme no peito.
��� O pessoal est�� organizando um gru-
No entanto, estragara tudo em rela����o
po para ir a S��o Paulo assistir ao show
a Eduardo, ridicularizando-o diante de do Queen. Eu vou ��� afirmou ela.
todos.
V��tor engoliu em seco. Patr��cia n��o
Criara, portanto, uma situa����o irreme-
estava perdindo autoriza����o, mas parti-
di��vel. Seria preciso tempo e oportuni-
cipando simplesmente. N��o era de seu
dade para consertar aquilo. A certeza de
feitio e V��tor sabia. Compreendeu, en-
que Eduardo podia lhe oferecer algo di-
t��o, que era um teste. S�� poderia ser
ferente e especial tomava seus pensa-
um teste e tinha de se sair bem.
mentos.
��� Claro, por que n��o? Sei quanto vo-
Lembrou-se do que algu��m comenta-
c�� gosta deles. Pena que eu n��o possa
ra na casa de D��bora. O pessoal estava
ir com voc�� ��� disse ele, simplesmente.
CAP��TULO 6
Um lindo domingo amanhecera. No
��� N��o, filho, desculpe-me se o assus-
c��u azul, o sol brilhava radiante, espa-
tei ��� ela disse, enquanto escancarava
lhando-se sobre a cidade, como uma b��n-
a porta e entrava.
����o, seu calor.
Caminhou at�� a cama e se sentou ��
Eduardo despertou com o ru��do de beira. Olhou o rosto sonolento do filho,
passos no corredor. Abriu os olhos no depois acariciou-lhe os cabelos em desa-momento em que sua m��e empurrava a
linho.
porta e punha a cabe��a para dentro.
��� Voc�� voltou tarde. Vim ver se tudo
Preocupado, ele se ergueu da cama.
estava b e m . . .
��� Algum problema, n��o? ��� indagou,
��� Tudo est�� bem, m��e. E papai, co-
apreensivo.
mo passou a noite?
17
��� Melhor. Tenho quase certeza de que
das e o vigor era n��tido em seu olhar.
ele vai insistir em se levantar h o j e . . . A esperan��a de que, afinal, aquela crise Voc�� sabe como ele ��, n��o?
n��o tivesse maiores conseq����ncias e que
��� Falarei com ele. Precisa repousar o m��dico se precipitara em seu diagn��s-
mais alguns dias, antes de se levantar.
tico animou-o.
��� Sim, fa��a isso. O caf�� j�� est�� na
Sentou-se no leito e encarou o pai.
mesa. N��o demore, ent��o, voc�� vai ��
��� Como se sente hoje, velh��o?
missa?
��� Preocupado.
��� Sim. E a senhora?
��� E por qu��?
��� J�� fui. N��s os velhos somos ma-
��� Porque meu jardim est�� l�� e nin-
drugadores ��� sorriu ela, deixando-o.
gu��m cuida dele. Preciso podar as ro-
Eduardo espregui��ou-se na cama, de-
seiras, dar um jeito naquela grama e . . .
pois abra��ou o travesseiro e apertou-o
��� Calma, posso chamar um jardinei-
contra o peito nu. N��o pensava em No��-
ro. . .
mia e nos loucos momentos que haviam,
mais uma vez, vivido na noite anterior.
��� Voc�� sabe que eu gosto de fazer
isso pessoalmente. Se chamar um jardi-
Seus pensamentos eram todos para neiro eu o deserdo ��� brincou o homem.
Patr��cia, seu olhar misterioso, que dizia
coisas que seus l��bios haviam negado. ��� Estou muito bem, filho. Bem mesmo.
Quanto mais pensava no que acontece-
��� Fico contente em ouvir isso, pai.
ra, menos se convencia de que ela fora
Quer alguma coisa de especial hoje?
sincera.
��� Quero apenas sair desta cama. Co-
N��o era ing��nuo. Conhecia um pouco
mo querem que meu cora����o fique bem
do car��ter humano. O que vira em Pa-
se me obrigam a imobilizar-me, sem
tr��cia fora espont��neo. Em momento al-
exerc��cio nenhum. Quero sair, andar,
gum podia classificar suas atitudes co-
cuidar do meu jardim.
mo uma deliberada inten����o de falsear
��� O Dr. Siqueira vir�� hoje novamen-
seus reais sentimentos.
te. Se ele concordar, poder�� se levantar.
Pensou nela desde o primeiro momen-
��� O Dr. Siqueira n��o me engana. O
to, quando a vira, no sem��foro. Aquele
que ele quer �� um paciente que se jul-
sorriso nos l��bios dela fora espont��neo gue incur��vel. Sabia que o desejo de e significativo como igualmente signifi-todo m��dico �� esse? �� como ter nas m��os
cativo fora seu olhar quando voltaram uma fonte de renda fixa ��� falou o ve-
ao local do acidente, momentos depois. lho, com seriedade.
N��o teria ela agido daquela forma
��� Est�� exagerando, pai. Sabemos qual
apenas para evitar a briga? N��o teria
dito aquelas palavras simplesmente pa-
�� seu estado. Aquela opera����o ter�� de
ra acalmar V��tor e afast��-lo dali?
ser feita e, no momento certo, voc�� a
far�� e tudo sair�� bem.
Desejava acreditar naquela hip��tese.
S�� assim acalmaria o que se agitava em
��� Sim, eu sei ��� reconheceu, afinal.
seu peito, pedindo vaz��o. Desejou, en-
��� Isso vem me preocupando e a todos
t��o, r��v��-la, falar com ela, esclarecer n��s, creio. As despesas ser��o enormes, tudo. Se a olhasse nos olhos saberia se n��o resta a menor d��vida. Tenho meu ela mentia ou n��o.
dinheiro aplicado, mas sempre rende
Pelo menos agora estava em melhor menos que a infla����o e isso pode se tor-
situa����o que na noite anterior, quando nar um problema, compreende o que
sa��ra de casa com o desejo de v��-la. Sa-
quero dizer, n��o?
bi�� onde encontr��-la.
��� Sim, eu sei, mas ele vai ag��entar
Saltou da cama, tomou um banho, de-
at�� que eu me forme. Depois eu passa-
pois vestiu-se. Antes de ir para a copa rei a tomar conta desta fam��lia.
tomar seu desjejum, passou pelo quarto
��� N��o enquanto eu viver, rapaz ���
do pai. Sentiu-se aliviado ao perceb��-lo disse o velho, com veem��ncia. ��� Voc�� melhor. Suas faces estavam mais cora-tem sua vida e vai cuidar dela. Mas ��
18
bom que tome conhecimento de nossa
Lembrou-se dos acontecimentos da noi-
situa����o financeira. Com o que recebi te anterior. Pensou no ��ltimo olhar que pela venda da fazenda paguei todas as Eduardo lhe lan��ara antes de partir.
minhas d��vidas e ainda me sobrou per-
Desejou que ele tivesse compreendido
to de um milh��o de cruzeiros, ap��s com-
tudo naquele momento.
prar esta casa tamb��m. Isso tem nos
Algum tempo depois ela sa��a, no car-
dado uma renda mensal razo��vel, mas ro do pai. O sol firmara-se no c��u e o
essa infla����o galopante, como costumam
movimento era pequeno nas ruas. Ru-
dizer, acabar�� por tornar essa renda al-
mou para a igreja mais pr��xima. To-
go irris��rio. Por isso vou precisar de dos os domingos ia �� missa e aquele n��o voc��. Ainda ontem recebi um aviso da seria a exce����o.
Prefeitura de Ourinhos, notificando os
valores do imposto predial a pagar de
Ap��s estacionar o ve��culo, caminhou
tr��s terrenos que possuo l�� ainda. Es-
para o templo. A cerim��nia j�� come��a-
ra. Tratava-se de uma missa jovem, com
t��o bem localizados e se o bairro se de-
m��sica e alegria. Ao fundo, o pessoal
senvolveu como eu esperava nesses conhecido do conjunto esmerava-se na
poucos meses, calculo que valorizaram introdu����o do ritual. A m��sica espalha-bastante. Preciso que voc�� v�� l�� verifi-
va-se por toda parte, criando um clima
car isso. Veja quanto valem, quanto po-
m��stico, refor��ado pelo sol que se divi-
de levantar com a venda deles...
dia nas cores dos vitrais com motivos
��� Eu n��o sabia desses terrenos, pai. religiosos.
Pensei que tivesse vendido tudo que pos-
Com profundo respeito, todos canta-
su��a l �� . . .
vam, certos de que orar pode ser feito
��� N��o, filho. Sou um homem da ter-
de muitas maneiras, inclusive atrav��s
ra, reconhe��o que apenas ela conserva da m��sica. Algu��m dissera, certa vez, seu valor hoje em dia. Era como um que cantar era uma forma de rezar. Pa-trunfo que eu tinha nas m��os e chegou tr��cia preferia uma outra cita����o que a hora de us��-los.
dizia que amar �� a melhor forma de
��� Eu farei isso, pai.
rezar.
��� Falarei seriamente com o Dr. Si-
Ela concentrou toda sua aten����o nes-
queira hoje e tentaremos fazer um or-
sa palavra. O que era amar? Jamais per-
��amento do que ser�� minha opera����o. guntara-se isso. Agora precisava desco-
Acho que vamos nos safar dessa, filho.
bri-lo. Era preciso conhecer novos fatos,
��� Estou certo que sim, pai ��� sorriu
ganhar novas experi��ncias, encarar sua
o rapaz, aliviado.
maturidade.
Enquanto pensava nisso, a figura de
Eduardo parecia pairar sobre todas es-
sas atitudes. Era como se nele estives-
sem todas as respostas.
Patr��cia vestia-se diante do espelho.
Enquanto abotoava a blusa de seda com
Seria, ent��o, o que sentia, aquilo que
preciosos bordados, fitava as roupas que
se chama amor? Ou seria mais um tolo
usara na noite anterior e que estavam entusiasmo de sua adolesc��ncia exter-torante? Um capricho? Um deseja de
ca��das junto de sua cama.
inovar, fruto da inquieta����o?
Elas representavam uma atitude, um
estilo de vida que passava irremediavel-
N��o, n��o conseguia pensar nisso dessa
mente. Elas lembravam, por��m, Eduar-
forma. Era algo novo e bom, capaz de
do e uma chance nova para compreen-
encher todo seu cora����o e fazer esbo-
der-se e conhecer-se.
��ar um sorriso em seus l��bios.
Deu os ��ltimos retoques nos cabelos,
No altar, o sacerdote pedia que todos
depois se voltou e olhou a cal��a desbo-
rezassem. Patr��cia rezou, ent��o, para que
tada, ca��da sobre o tapete. Sorriu. Seus conhecesse as respostas, encontrasse a pensamentos foram para Eduardo e a paz de esp��rito e seu caminho.
sensa����o de perda irremedi��vel nova-
Ent��o, como uma resposta ao seu ape-
mente abalou seu cora����o.
lo, um rapaz se aproximou e ajoelhou-
19
se ao seu lado. A princ��pio n��o perce-
se nos l��bios de ambos, maravilhados
beu nada. Depois, um perfume conheci-
ante o inesperado reencontro.
do, sentido antes em alguma parte, des-
A m��sica se tornou mais alegre. O dia
pertou-a.
se tornou melhor. A esperan��a renasceu
Ela voltou a cabe��a. O rapaz a olhou
em seus cora����es. O sorriso se tornou
tamb��m. Um sorriso hesitante esbo��ou-
mais largo em seus l��bios.
CAP��TULO 7
As pessoas passavam por eles, ao fi-
tantes, tentando imaginar um local sos-
nal da missa. Ficaram se olhando, ten-
segado onde pudessem conversar.
tando dizer tudo que sentiam, confusos
Rumou, ent��o, na dire����o de uma das
diante dos pr��prios sentimentos.
sa��das da cidade, ganhando a Avenida
Eduardo pensava que a melhor ma-
do Caf�� e rumando para o Est��dio do
neira de demonstrar tudo que desejava mesmo nome, no alto de uma colina de
dizer seria tomando-a nos bra��os e bei-
onde se descortinava uma das melhores
jando-a longa e delicadamente. Patr��cia vistas da cidade.
desejava ardentemente que ele a tomas-
se nos bra��os e a fizesse encontrar to-
Parou o carro num dos pr��prios esta-
das as suas respostas na for��a de um cionamentos do Est��dio do Caf��. Uma
beijo.
brisa deliciosa soprava. N��o longe dali,
um grupo de jovens acompanhava as
��� Magoado comigo? ��� indagou ela, acrobacias de um aeromodelo, cujo ronco
afinal.
estridente cortava o c��u como o zumbi-
��� Confuso.
do de uma abelha gigante.
��� Eu agi mal ontem �� noite.
Olharam-se. Havia tanto a dizer. Tan-
��� Se quiser explicar, tenho toda a tas respostas precisavam ser dadas, mas
manh��...
o sil��ncio de cada um, o olhar no olhar,
a proximidade um do outro, tudo isso
��� Eu menti diante de todos... Na
verdade, s�� fiz aquilo para evitar a parecia falar sobre tudo.
briga.
Emo����es intraduz��veis se retratavam
Um sorriso largo e satisfeito abriu-se num sorriso que pairava em seus l��bios, no rosto do rapaz.
na maneira como se olhavam, na imobi-
lidade e na inutilidade dos gestos.
��� Eu esperava que fosse isso. Preciso
falar com voc��. Acho que h�� tanto a
Apenas estar um perto do outro pa-
dizer e . . . Tem um tempo?
recia satisfaz��-la. A verdade de cada um
��� Sim, meu carro est�� ali...
residia, nesse momento, naquela desco-
berta que os maravilhava e confundia,
��� Tenho minha m o t o . . .
tal a for��a com que os assaltava.
��� N��o estou vestida para isso ��� riu
��� H�� dois dias atr��s n��s n��o nos co-
ela, constrangida, pensando em qu��o �� nhec��amos ��� murmurou ela, reclinando
vontade estaria naquele momento se
usasse sua velha cal��a desbotada.
a cabe��a no encosto alto do assento, li-
geiramente voltada para ele, olhando-o
��� Eu deixo a moto naquele posto de
fixamente.
gasolina ��� apontou ele.
��� Parece que j�� nos conhecemos h��
��� Boa id��ia ��� concordou ela. ��� Eu
uma eternidade ��� sussurrou ele em res-
o espero l��.
posta, estendendo uma das m��os para
Momentos mais tarde estavam ambos toc��-la no rosto, tecendo uma car��cia
no carro dela. Patr��cia pensou por ins-
suave que a fez fechar os olhos, submis-
20
sa ao sentimento que crescia a cada mi-
��� Julita, eu juro como voc�� me paga!
nuto dentro dela.
��� esbravejou No��mia, derrubando-a da
Olhando-a, t��o feminina e prostrada, cama e levantando-se furiosamente.
Eduardo n��o p��de refrear seu desejo.
��� Enquanto voc�� fica a��, dormindo
Inclinou-se. Seu h��lito soprou sobre o como uma sonsa, algu��m est�� tomando
rosto dela, que se arrepiou deliciosa-
seu namorado ��� disse Julita, venenosa-
mente.
mente.
N��o abriu os olhos. Sabia e desejava
No��mia caminhava na dire����o do ba-
o que estava prestes a acontecer. En-
nheiro e estacou, voltando-se para enca-
treabriu os l��bios e estendeu ligeira-
rar a amiga.
mente a ponta da l��ngua, aguardando a
��� O que quer dizer com isso? Refe-
aproxima����o dos l��bios dele, cada vez re-se ao que aconteceu ontem �� noite?
mais pr��ximos, at�� que tocassem os seus,
��� N��o, refiro-me ao que vi hoje de
colando-se por instantes, depois moven-
manh��, �� sa��da da missa, l�� na Igreja
do-se tentadoramente.
Dom Bosco.
Sentiu as m��os dele escorregando por
No��mia jogou para tr��s os cabelos
seu corpo, firmando-a de encontro a ele,
amarfanhados e caminhou lentamente na
apertando-a quase at�� sufoc��-la, en-
dire����o da amiga.
quanto uma sensa����o estonteante inva-
��� �� melhor voc�� se sentar ��� reco-
dia toda sua pele, sensibilizando-a, ele-
mendou Julita.
trizando-a, arrancando do mais fundo de
seu ser suspiros embriagados de paix��o.
��� Vamos, fale! O que foi que viu?
A for��a avassaladora daquele momen-
��� Vi o Eduardo e a Patr��cia no maior
to assustou-a. Separou-se dele ofegante, "love story" da par��quia. Estavam em-sem fala, incr��dula diante da emo����o bevecidos, olhando um para o outro, en-arrebatadora que a envolvera.
quanto sa��am. Eu fiquei bestificada e . . .
Eduardo a olhava da mesma forma, in-
��� Dispenso seus coment��rios. Vamos
capaz de compreender o dique que se ao que interessa. E da��?
rompera dentro dele.
��� Bem, fiquei ali por perto, obser-
��� Acredita em amor �� primeira vis-
vando-os. O Eduardo deixou a moto num
ta? ��� indagou ele, balbuciante.
posto de gasolina e subiu no carro da
Patr��cia. Para onde eles foram n��o me
��� Refere-se a n��s? ��� sorriu ela.
arrisco a descobrir.
��� Sim...
��� Voc�� n��o os seguiu?
��� N��o pode ser...
��� Eu n��o.
��� Por que n��o?
��� Pois devia t��-los seguido.
��� Porque j�� nos conhecemos h�� uma
��� Para qu��? Eu n��o sou de me in-
eternidade ��� murmurou ela, estenden-
trometer na vida alheia. Tenho coisas
do os bra��os para toc��-lo, enla����-lo e mais importantes com que me preocupar, atra��-lo para um novo beijo.
ora bolas! ��� exclamou Julita, deixan-
do-a sozinha no quarto.
* * ��
Para No��mia era dif��cil acreditar no
que acabara de ouvir. Seu olhar estava
Julita entrou no quarto e afastou as fixo no leito, onde na noite anterior ela cortinas, deixando que a claridade pe-e Eduardo haviam vivido momentos ines-
netrasse generosamente. Na cama, No��-
quec��veis.
mia resmungou e virou-se, escondendo
Aquilo n��o podia ser verdade. Deixou
o rosto sob o travesseiro.
o quarto furiosamente, �� procura de
A amiga foi se sentar junto dela, ar-
Julita. Foi encontr��-la na cozinha, con-
rancando-lhe o travesseiro. No��mia co-
tando ��s outras o que vira. Quando No��-
briu o rosto com as m��os. Julita segu-
mia entrou, ela se calou. Todas olharam
rou-lhe os pulsos, afastando-as.
penalizadas na sua dire����o.
21
��� Voc�� inventou tudo isso, n��o? Est��
Por isso estavam mantendo as apar��n-
querendo brincar comigo e eu n��o admi-
cias, dando a entender que nada havia
to isso, Julita.
entre eles, at�� que as coisas pudessem
Julita abaixou a cabe��a, dando a en-
ser resolvidas.
tender que n��o tinha nada a acrescen-
��� Muito esperto da parte dela ��� res-
tar.
mungou. ��� Mas n��o vou me entregar
��� Voc�� mentiu, n��o mentiu? ��� inda-
t��o f��cil.
gou No��mia, atabalhoadamente.
Pensou na maneira como fora acorda-
��� N��o, No��mia. Eu n��o brincaria com
da por Julita. Talvez estivesse ali uma
isso, sabendo de seus sentimentos em re-
boa id��ia a ser imitada. Apanhou seu
la����o a ele. Disse o que vi. A D��bora
caderno de endere��os. Tinha ali todos
estava comigo. Se duvida de mim, ligue
os nomes conhecidos da turma, inclusi-
para ela e se certifique.
ve de V��tor e Patr��cia.
��� N��o, isso n��o pode estar aconte-
cendo. O que Patr��cia pretende com
Discou para a casa do rapaz. Informa-
isso? O que eu fiz para ela? ��� indagou
ram que ele ainda dormia. Insistiu e,
No��mia, caminhando tristemente de vol-
afinal, p��de falar com ele. Com voz so-
ta ao seu quarto.
nolenta V��tor indagou quem era.
Estendeu-se na cama com uma von-
��� Enquanto voc�� dorme a�� feito um
tade irresist��vel de chorar. Suas amigas bob��o, sua namorada o faz de idiota, chegaram at�� a porta.
V��tor...
��� O que pretende fazer, No��mia? ���
��� Quem ��? O que quer dizer com
indagou Lu��za.
isso? ��� indagou ele, repentinamente
��� N��o sei ��� choramingou ela.
desperto de todo.
Julita fez um sinal para que as outras
��� Por que n��o liga para a casa de
a deixassem. No��mia pensou, enquanto Patr��cia e pergunta onde ela est��? ���
chorava. Tudo parecia mesmo perdido.
disse No��mia, desligando em seguida.
Apesar de tudo que pudesse fazer por
Ao levantar a cabe��a, viu-se no espe-
Eduardo, ele parecia ter se deixado en-
lho. N��o ficou satisfeita consigo mesma,
volver definitivamente por Patr��cia.
mas, interiormente, alguma coisa m�� ha-
S�� n��o conseguia compreender o com-
via se aquietado.
portamento da outra. A que pretendia
reduzir Eduardo? Humilhara-o diante de
todos, na noite anterior. Como ele acei-
tara aquilo? Como ele aceitava agora en-
V��tor havia ligado para a casa de Pa-
contrar-se com ela?
tr��cia, onde lhe informaram que ela sa��-
As l��grimas secaram em seus olhos.
ra para ir �� missa e que ainda n��o re-
Ela se sentou na cama, s��ria e pensati-
tornara. Ele se vestiu apressadamente,
va. Esbo��ou um sorriso tr��mulo nos l��-
mas, antes de sair, percebeu que n��o
bios. Talvez Patr��cia n��o tivesse, afinal, saberia onde procur��-la.
humilhado Eduardo. Com certeza ha-
Tomou rapidamente um suco de laran-
viam planejado aquela cena. Sim, s�� po-
ja, depois desceu para a garagem do pr��-
deria ser isso.
dio. Entrou no carro e ficou imaginando
V��tor era um tipo violento. Al��m dis-
coisas. Primeiro aquela voz, queria sa-
so, estava acompanhado de dois amigos ber de quem era. S�� assim poderia obter do mesmo n��vel. Se Eduardo aceitasse maiores informa����es.
a provoca����o, seria fatalmente surrado.
Estava tenso e revoltado. Depois do
Patr��cia, ent��o, usou de um eficiente que acontecera na noite anterior, julga-estratagema. Na verdade, apenas p��s pa-
ra que Patr��cia se emendaria e que tudo
nos quentes na situa����o, protegendo entre eles voltaria a ser o mesmo.
Eduardo.
Analisando melhor agora, sentia que
Compreendia agora a situa����o. Para ela n��o o tratara como ele esperava que
Eduardo e Patr��cia, o problema que eles fosse, quando se despediram. Faltava al-tinham a enfrentar era V��tor, que ja-
guma coisa na maneira com que ela re-
mais permitiria ser passado para tr��s. tribu��a os beijos e os carinhos.
22
Tudo tinha a impress��o de falso, de
��� No��mia �� uma boa menina. Foi
for��ado e mec��nico. N��o era, realmente, muito legal comigo quando cheguei aqui.
a Patr��cia que conhecera. Muita coisa Tivemos bons momentos juntos...
mudara realmente nela. N��o era uma
��� Na cama tamb��m?
garotinha irriquieta no fim de sua ado-
lesc��ncia. Era uma mulher que desejava
��� N��o posso esconder... Na cama
tamb��m.
mostrar sua for��a, impor sua vontade.
Isso ele n��o permitiria. Ser menospre-
��� No��mia sempre foi liberal ��� sor-
zado jamais. O que acontecera na casa riu Patr��cia, for��ado.
de D��bora, de alguma forma, servira pa-
��� Precisamos pensar no que vamos
ra mostrar a todos que ele ainda tinha fazer, Patr��cia ��� ele disse, com serie-poder sobre Patr��cia.
dade. ��� N��o comandamos nossos sen-
Aquele telefonema pela manh��, no en-
timentos. N��o posso me ordenar que n��o
tanto, fazia-o se sentir imbecil diante pense em voc��, da mesma forma como
de uma situa����o que fugia ao seu con-
n��o posso querer que No��mia fa��a a
trole e �� sua compreens��o.
mesma coisa em rela����o a mim e voc��
em rela����o ao V��tor.
Ligou o carro e tomou a dire����o do
pr��dio onde ela morava.
��� �� um problema s��rio... N��o que-
ro magoar ningu��m, Eduardo. Detesta-
* * *
ria construir nosso relacionamento sobre
a frustra����o de outros.
Olhavam-se, embevecidos. O aeromo-
��� N��o h�� outra forma, querida. N��o
delo havia pousado.
posso mais ficar com a No��mia sem sen-
Uma febre saud��vel fazia arder suas tir nada por ela, assim como voc�� n��o
peles sensibilizadas e girar suas mentes, pode, pelo mesmo motivo, ficar com o como um carrossel de pensamentos e V��tor. Temos de pensar em n��s.
sensa����es.
��� Vamos dar um tempo, ent��o, para
Haviam trocado beijos sem conta e se
que a poeira assente. O que me diz?
acariciado mutuamente, descobrindo-se a
��� O que prop��e exatamente com isso?
cada car��cia, criando um clima de pe-
��� Que a gente se afaste um do outro
rigoso envolvimento.
por algum tempo, at�� resolvermos nos-
��� Estamos encrencados, sabia? ��� co-
sos casos com V��tor e No��mia. Quando
mentou ele, acendendo dois cigarros e estivermos livres novamente, ent��o as-passando um para ela.
sumiremos abertamente nossa liga����o.
��� Por qu��? ��� ela indagou, acomo-
��� �� uma solu����o terr��vel, n��o creio
dando-se melhor para decansar a cabe��a
que possa enfrent��-la. Quanto tempo vo-
no ombro dele.
c�� ficaria sem me ver? Quanto supor-
��� Como vai ser de agora em diante?
taria? ��� indagou ele.
Voc�� vai romper com o V��tor? Acha
Uma express��o de desalento profundo
que poder��, depois do que me contou e desespero estampou-se no rosto apai-
sobre ele?
xonado e meigo da garota. Um solu��o
��� E voc��, o que far�� em rela����o a travou-lhe a voz e ela se lan��ou nos bra-
No��mia?
��os dele, apertando-o contra si.
��� �� como eu disse. Estamos encren-
��� Nem um minuto, Eduardo ��� so-
cados...
lu��ou ela, buscando os l��bios dele para
��� O que h�� entre voc�� e ela?
um beijo demorado que traduzia toda
��� Uma rela����o sem maiores conse-
sua afli����o interior.
q����ncias. ..
��� Poderemos nos encontrar todos os
��� Ela pensa o mesmo? Ela se sente dias na Universidade ��� sugeriu ele.
da mesma forma?
��� E no mesmo momento algum lin-
��� Por que pergunta isso?
guarudo ligaria para o V��tor ou para a
��� Porque preciso saber. Entre mim No��mia contando tudo. N��o daria certo.
e V��tor houve um romance, irremedia-
��� Pelo menos poderemos nos v e r . . .
velmente desfeito. Mesmo que eu quei-
��� Sem nos tocarmos? Sem nos sen-
ra, j�� n��o sinto nada na companhia dele.
tirmos? Sem beij��-lo, Eduardo? Acha
23
que eu suportaria, amor? ��� desabafou
For��aria situa����es de forma a desen-
ela, beijando-o novamente.
coraj��-lo, a deixar que ele conduzisse o
Apertando-a nos bra��os, Eduardo sen-
rompimento. Esfriaria em sua compa-
tiu-a tr��mula e desejou poder solucio-
nhia. Daria demonstra����es de desinte-
nar adequadamente aquela situa����o.
resse. Evitaria programas interessantes e
procuraria aqueles ma��antes, do tipo que
ele detestava.
Poderia se vestir como antes, apenas
para desagrad��-lo. Havia mil e uma coi-
Patr��cia dirigia sem pressa, voltando sas que poderia fazer, e Patr��cia estava para easa. Havia conversado muito com
disposta a fazer cada uma delas, a qual-
Eduardo e uma solu����o se esbo��ara pa-
quer pre��o.
ra que tudo se resolvesse sem que nin-
Afinal, estava em jogo sua felicidade.
gu��m sa��sse ferido ou magoado.
Ao pensar nisso, a figura de Eduardo
Evitariam se encontrar, at�� que Eduar-
dominou seus pensamentos. Sentiu-lhe o
do definisse um local onde pudessem fa-
calor do corpo, o perfume m��sculo, o sa-
zer isso sem que fossem notados. En-
bor dos beijos. Estremecimentos percor-
quanto isso, nada os impedia de, ao te-
reram seu corpo ao pensar na sensuali-
lefone, matarem a saudade que fatal-
dade que ele conseguira despertar nela.
mente os torturaria.
Chegava ao seu pr��dio. Manobrou o
carro do pai para o interior da garagem.
O dif��cil, agora, seria encarar V��tor, Antes de descer, olhou todo o interior, aceitar, ainda que temporariamente, sua como que a procurar sinais que marcas-companhia. Isso, no entanto, teria de ser
sem a presen��a de Eduardo.
feito. Com muito jeito precisava con-
venc��-lo de que nada mais poderia ha-
Desceu, afinal, e caminhou para o ele-
vador. Ouviu passos atr��s de si e vol-
ver entre os dois.
tou-se distraidamente. Estremeceu ao ver
Conversariam com calma. Deixaria a express��o furiosa no rosto de V��tor.
que ele percebesse sinais de que ela mu-
dara. Talvez a viagem para assistir ao
��� V��tor, que surpresa! ��� balbuciou.
show do Queen fosse um bom pretexto
��� Preciso falar com v o c �� . . . Agora!
para voltar mudada em rela����o a ele.
��� rugiu ele.
CAP��TULO 8
Estavam no interior do carro de V��-
��� Voc�� n��o compreendeu ainda, Pa-
tor. Ele havia falado baixo, mas furio-
tr��cia? O que pensa que sou? Que jul-
samente. Havia amea��ado, prometido gamento voc�� faz de mim? Tenho meu
vingan��a, repres��lias, numa t��pica ma-
orgulho, quero ser respeitado.
nifesta����o de ci��me doentio, totalmente
��� E quanto a mim? N��o tenho o mes-
fora de controle.
mo direito?
Patr��cia se encolhera toda, temerosa,
assustada com aquela atitude primitiva
��� Voc�� teve sua chance e desperdi-
e inconceb��vel num homem dito civili-
��ou-a. Agora vamos jogar ao meu esti-
zado, com um razo��vel n��vel cultural.
lo, da maneira que eu quiser. Vamos co-
Encarou-o. L��grimas brotavam de seus
me��ar hoje, daqui a pouco, quando virei
olhos.
apanh��-la para irmos almo��ar juntos. O
��� E o que espera com isso, V��tor? ���
domingo est�� magn��fico. Faremos um
indagou.
programa divertido. Todos nos ver��o
��� Manter as apar��ncias, fazer-me juntos. Passaremos a tarde na Higien��-
respeitado.
polis, para que nos vejam e comentem
��� N��o compreende q u e . . .
o quanto nos amamos.
24
Patr��cia abaixou a cabe��a. N��o podia
Imaginou, ent��o, o que poderia dizer
acreditar naquele pesadelo. Aquela pro-
o ele? Como poderia contar-lhe o que
posta ditada por V��tor n��o tinha sen-
acontecera h�� pouco sem, com isso, de-
tido. Era uma viol��ncia, um ultraje.
sencadear uma verdadeira tormenta? Se
��� Agora des��a, chore o que tiver de
contasse a Eduardo as amea��as feitas
chorar, pois quando eu vier busc��-la, por V��tor, fatalmente haveria um con-
quero encontr��-la sorridente e acess��-
fronto. V��tor era cruel e vingativo. Ja-
vel, compreendeu? ��� ordenou ele, brus-
mais aceitaria uma derrota e usaria de
camente, inclinando-se para abrir a por-
todos os meios para se impor. Isso po-
ta do carro.
deria ser perigoso para Eduardo, real-
Patr��cia fez men����o de descer. Queria mente perigoso.
afastar-se dali o mais depressa poss��vel.
Se antes parecia dif��cil para os dois
Fugir dele e de suas amea��as.
se encontrarem, agora se tornava pior.
��� Espere! ��� ele ordenou.
Suportar a companhia de V��tor poderia
Ela voltou para ele os olhos molha-
ser poss��vel, mas ficar longe de Eduar-
dos.
do, n��o.
��� Antes um beijo de despedida ��� ele
��� Eduardo ��� ela disse, esfor��ando-
falou, tomando-a nos bra��os com bruta-
se para n��o trair seu desespero e sua
lidade e sufocando-a com um beijo for-
dificuldade. ��� Vamos ao show do Queen,
��ado.
em S��o Paulo, na sexta-feira?
Quando terminou, soltou-a como se a
Houve um sil��ncio do outro lado.
empurrasse para fora do carro.
Aquela parecia ser a melhor maneira de
��� E lembre-se bem do que eu disse:
estarem juntos, longe de tudo e de to-
se souber que voc�� trocou uma palavra
dos, perdidos numa multid��o que n��o
que seja com aquele sujeito, re��no meus
se importaria em v��-los juntos.
amigos e vamos lhe dar uma surra t��o
��� Oh, amor, �� t��o dif��cil... Meu pai
grande que ningu��m o reconheceria est�� doente. �� s��rio... N��o p o s o me
quando terminarmos com ele.
ausentar de forma alguma. Seria mara-
Patr��cia olhou-o no fundo dos olhos. vilhoso se pud��ssemos... De qualquer
N��o tinha a menor d��vida que V��tor maneira, voc�� vai, n��o ��? Se assim o
cumpriria aquela amea��a.
desejar.
��� Quando isso vai terminar?
��� Eduardo, como eu gostaria que vo-
c �� . . . ��� solu��ou ela, incapaz de con-
��� Quando eu julgar que deva termi-
tinuar.
nar. Vamos ficar juntos at�� que todos
se conven��am de que continuamos fir-
��� Voc�� est�� bem, Patr��cia?
mes em nosso romance. Um dia desses
��� S i m . . . �� a felicidade de am��-lo
eu a deixo, mas isso ser�� quando eu que... Eu o adoro, Eduardo. N��o im-
quiser, compreendeu?
porta o que aconte��a, o que voc�� veja,
Patr��cia deixou o carro e correu para
o que digam, s�� acredite no que digo:
o interior do pr��dio. Tomou o elevador.
eu o amo mais do que qualquer mulher
Entrou em seu apartamento e correu j�� amou neste mundo...
para seu quarto, trancando-se. Atirou-se
��� Gostaria de estar a��, com voc��, ou-
sobre a cama e desabafou sua frustra-
vindo isso e olhando-a, querida ��� ele
����o e sua humilha����o num pranto con-
disse, apaixonadamente. ��� Quero v��-la
vulso e demorado.
novamente, hoje ainda, agora mesmo.
O telefone tocou, sobressaltando-a. Fi-
��� Vai ser imposs��vel, amor ��� disse
cou olhando para o aparelho, tentando ela, num esfor��o. ��� Mas eu o amo mui-
imaginar quem era. Pensou em Eduar-
t o . . .
do. Correu a atender. Ao ouvir-lhe a
voz, seu cora����o pareceu partir-se.
* * *
��� Al��, amor. Imagine que eu j�� es-
tava com saudade de voc��. Jamais pode-
Eles chegavam de todas as formas,
ria imaginar q u e . . . ��� ele continuou fa-
comprimidos nos ��nibus circulares, em
lando e suas palavras de ternura e amor
carros lotados, de motocicletas, enchen-
eram um b��lsamo para ela.
do de colorido os p��tios, os pr��dios, os
25
estacionamentos da Universidade, na-
��� Farei isso da pr��xima vez ��� ele
quela manh�� de segunda-feira.
disse, tentando se afastar.
Um c��u azul e limpo, sem nuvens, um
No��mia percebeu que havia qualquer
sol brilhante e uma brisa constante se coisa errada nos modos dele. Julgava juntavam num cen��rio de alegria para que, no dia anterior, tudo tivesse se re-receb��-los.
solvido em rela����o a Patr��cia, pois a vira
As conversas, os risos e as preocupa-
com V��tor, �� tarde, na Av. Higien��polis,
����es se espalhavam naquele universo de no encontro semanal da juventude da
juventude e vigor, tecendo caracter��s-
sua cidade.
ticas pr��prias daquele local.
��� Espere, Eduardo ��� pediu ela, al-
Apoiado �� sua moto, Eduardo obser-
can��ando-o.
vava a chegada de novos carros, ansioso
Era uma jogada decisiva e No��mia es-
para rever Patr��cia. Fora dif��cil supor-
tava disposta a faz��-lo.
tar o dia anterior, sem v��-la. Telefonara
��� Voc�� est�� procurando por Patr��cia,
para a casa dela ap��s o almo��o, �� tarde,
n��o ��?
duas vezes �� noite, sem sucesso.
Eduardo a encarou por instantes, son-
Precisava ouvi-la, v��-la, saber dela, dando-��.
estar com ela, ou seu cora����o explodiria
��� Sim, estou ��� respondeu, afinal.
de afli����o e temor.
No��mia n��o demonstrou surpresa, mas
Um carro se aproximou e Eduardo o uma pena que o confundiu.
reconheceu. Era o Maverick prateado de
��� Ela n��o quer v��-lo, Eduardo. N��o
V��tor, com pneus largos e rodas croma-
compreende o que ela est�� fazendo com
das. Realmente um belo carro, bom de-
voc��? Acorde, n��o seja idiota! Ela o tem
mais para o ser desprez��vel que o guia-
usado. Est�� bem com o V��tor, passaram
va, pensou Eduardo, enquanto seu cora-
o dia todo juntos, ontem. Voc��, mais
����o batia mais depressa ao reconhecer uma vez, foi usado, Eduardo. Pensa que a figura graciosa que fora tomada nos ningu��m sabe que voc�� e ela se encon-bra��os para um beijo for��ado.
traram ontem de manh��, ap��s a missa?
Seus m��sculos se retesaram e ele de-
��� Como soube disso?
sejou correr, arrancar V��tor do carro e
esmurr��-lo at�� que se fartasse disso.
��� Todos sabem, inclusive o V��tor. Foi
Controlou-se, pensando em Patr��cia, que
o golpe fatal de Patr��cia no ci��me dele.
desceu logo em seguida.
Agora est��o juntos de novo e falam que
Por r��pidos instantes ela ficou para-
ficar��o noivos em breve.
da, olhando em sua dire����o, depois pra-
��� Voc�� tem uma imagina����o f��rtil,
ticamente correu, fugindo quase, na di-
No��mia...
re����o do pr��dio mais pr��ximo.
��� N��o, querido. A sua �� que �� f��rtil.
V��tor, ao volante, vira Eduardo. Di-
Tire-a da cabe��a. Ou ent��o a procure,
rigiu devagarinho, passando pelo rival, veja se ela quer v��-lo, telefone para ela, olhando-o com ��dio e zombaria, como fa��a o que quiser e ver�� como ela o evi-que o desafiando.
tar��.
Eduardo retribuiu �� altura. O carro
Uma sombra de d��vida passou pelo
se afastou. Eduardo deixou a moto e saiu
rosto de Eduardo, enquanto seu cora����o
�� procura de Patr��cia, mas ela parecia amea��ava partir-se, perdido num torve-haver se escondido dele.
linho de medo e confus��o.
��� Por onde voc�� tem andado? ��� in-
dagou No��mia, ao encontrar-se com ele.
* * *
��� Por a�� ��� respondeu ele, distraida-
mente, procurando com o olhar aquela
No��mia n��o sabia at�� onde havia con-
figura ador��vel que faria seu cora����o seguido confundir Eduardo, enchendo-o bater mais r��pido.
de suspeitas. Isso n��o era o bastante, po-
��� Esperei por voc�� o dia todo, on-
r��m. Era preciso ir mais al��m, baseada
tem.
na suposi����o de que algo s��rio nascera
��� Estive ocupado. Meu pai est�� doen-
entre ele e Patr��cia.
te, sabia?
Precisava tamb��m abalar a confian��a
��� Sim, sabia, mas o que tem isso? Po-
dela. Por precau����o, sob qualquer pre-
deria ao menor ter ligado para m i m . . .
texto, era preciso destruir nela toda e
26
qualquer esperan��a de conquistar Eduar-
confusa e chocada. ��� O Eduardo me
do, de ficar eom ele.
convidou para ir ao show do Queen, na
A oportunidade surgiu num dos inter-
sexta-feira. Agora imaginem como?
valos, quando os alunos se reuniram pa-
��� N��o posso imaginar...
ra um caf�� r��pido e um cigarro. Encon-
��� Nem e u . . .
trou Patr��cia junto de um grupo de ami-
��� De moto. Vamos levar uma barra-
gas. Pensou por instantes e atacou.
ca. Dizem que h�� um camping em San-
to Amaro. Ficaremos l �� . . . Vai ser exci-
��� Gente, estou t��o feliz! ��� excla-
tante, realmente excitante, gente. Mal
mou, simulando. ��� Imaginem s�� o que
posso esperar por isso ��� terminou.
me aconteceu... Passei a tarde toda com
o Eduardo antem...
��� E voc�� tem coragem de ir daqui at��
l�� de moto? ��� indagou uma das amigas.
��� S�� a tarde? ��� maliciou algu��m.
��� Com o Eduardo eu vou a qualquer
��� N��o vou falar sobre a noite... N��o
parte ��� declarou, vitoriosa.
quero causar esc��ndalos ��� ela disse, de
��� Principalmente para a cama ��� dis-
olho na rea����o de Patr��cia, que ficou se algu��m.
CAP��TULO 9
A sensa����o exata era de que o c��u inferno para uma trag��dia acontecer.
havia desabado sobre sua cabe��a. Nada Apesar de desejar, mais do que qualquer mais explicaria aquele peso sobre seu outra coisa no mundo, correr para ele, cora����o, aquela afli����o que se misturava
fugiu, pois sabia que aquele n��o era o
�� humilha����o e �� revolta.
local adequado para um encontro.
Parecia uma brincadeira. S�� poderia
Se Eduardo sentisse o mesmo que ela,
ser uma brincadeira. Aquilo n��o pode-
viria procur��-la, e Patr��cia queria evitar
ria estar acontecendo. Ningu��m podia se
isso. Fatalmente isso seria levado ao co-
enganar daquela forma. Ningu��m podia
nhecimento de V��tor.
se deixar enganar daquela forma.
Depois, como um pesadelo, surgia
Todas as suas esperan��as se dilu��am No��mia para irradiar sua felicidade e em l��grimas que amea��avam brotar de seu veneno, destruindo tudo em que Pa-seus olhos verdes e rolar sobre suas fa-
tr��cia acreditava, tudo por que estava
ces, deixando, na trilha de sal, o estig-
disposta a lutar.
ma da ingenuidade roubada e estra��a-
N��o tinha como duvidar do que ouvi-
lhada pela viol��ncia gratuita de um mo-
ra. No��mia fora t��o espont��nea e no-
leque sem ju��zo.
tava-se a felicidade e a mal��cia em seu
Depois do que passara com V��tor no rosto. Era verdade. N��o duvidava disso.
domingo, depois de sufocar em seu peito
Eduardo a levaria para S��o Paulo de
o desejo de gritar o nome de Eduardo moto. Estremecia ao pensar nisso.
e correr para ele, lan��ando-se em seus
Sua raiva canalizou-se para ele. Fora
bra��os e suplicando que deixasse acon-
uma idiota em acreditar no que ele dis-
tecer entre os dois todas aquelas sensa-
sera. No fundo, era igual a V��tor. Um
����es incr��veis de sensualidade e amor aproveitador, apenas mais sutil, mais de-que sabia existir.
licado, mas um aproveitador sem co-
Fora uma tortura reprimir isso. O de-
ra����o.
sejo de rev��-lo fora enorme, insuport��-
S�� podia ser isso. Eduardo vingava-se
vel. Naquela manh��, quando chegara, da humilha����o a que Patr��cia fora for-
vira-o junto �� moto, no estacionamento. ��ada, na noite em casa de D��bora. Ape-Desejou correr para ele e contar-lhe tu-
nas isso justificava todo o procedimento
do que fora obrigada a fazer por V��tor.
dele.
Conteve-se a custo, pois fazer isso se-
Todo o tempo, ele mentira. N��o a ama-
ria o mesmo que abrir as comportas do
va. Queria apenas se vingar. Dissera a
27
ela que n��o poderia ir ao show do Queen
sorriso for��ado nos l��bios. Suas colegas
por causa do pai doente. No entanto, fizeram men����o de se adiantar.
prometera levar No��mia. Era o fim de
��� Esperem, voc��s v��o comigo, no car-
todas as suas ilus��es.
ro do V��tor. Ele deve estar chegando ���
disse.
* * *
Realmente, V��tor chegava naquele
momento e estacionava o carro. Ao ver
As aulas do per��odo da manh�� haviam
Eduardo caminhando ao encontro de Pa-
terminado. Os alunos se reuniam em lon-
tr��cia, desceu e rumou para l��, julgan-
gas filas nos pontos de ��nibus, aos ban-
do que Patr��cia o houvesse encorajado.
dos junto �� sa��da do campus tentando
Seria uma oportunidade ��nica de li-
uma carona, confusamente nos estacio-
quidar de uma vez por todas com aquele
namentos dos diversos departamentos.
assunto. Ningu��m o faria de tolo.
Em sua moto, Eduardo esperava pela
Eduardo parou diante de Patr��cia,
passagem de Patr��cia. Precisava v��-la, olhando-a maravilhado.
falar com ela, ainda que por um segun-
��� Posso falar com voc�� um instan-
do, tempo o bastante para poder dizer te s��?
a ela que a amava.
��� N��o, n��o tenho nada mais a falar
Era algo dif��cil de suportar. Havia com voc��. Meu futuro noivo est�� che-
pensado, naquela manh�� toda, num mo-
gando. N��o quero esc��ndalos. Seja edu-
do de se encontrarem de forma a n��o cado e d�� o fora. Ser�� que n��o v�� que
serem denunciados. A id��ia era ousada, est�� sobrando?
mas estava disposto a sugeri-la a ela.
Eduardo olhou-a sem compreender.
Havia um motel afastado da cidade. Atr��s dele, V��tor havia parado e sorria.
Poderiam ir para l�� separados. Se en-
Afinal, Patr��cia dissera aquilo em voz
contrariam. Teriam todo o tempo para alta, o bastante para que chegasse a seus conversar sem serem incomodados, sem ouvidos.
que ningu��m visse. Nada seria for��ado.
��� ��, foi como ela disse, cara. Voc��
O que tivesse de acontecer, viria natu-
est�� sobrando ��� falou V��tor, esbarran-
ralmente. O importante era estar com do em Eduardo para ir passar o bra��o
ela, poder falar-lhe, toc��-la, ouvi-la.
pelo ombro de Patr��cia.
De repente, seu cora����o bateu mais
Todos os m��sculos do corpo de Eduar-
depressa. Ele a viu, caminhando no meio
do crisparam-se. Seus olhos espelhavam
de algumas colegas. Ergueu-se e foi ao
revolta e humilha����o. O que No��mia
encontro dela.
dissera parecia ter sentido.
��� Talvez possamos aproveitar a oca-
Ao v��-lo, Patr��cia estremeceu de in-
si��o e solucionar tudo de uma vez por
digna����o. O que No��mia dissera ainda todas ��� disse, ent��o.
do��a em seus ouvidos. A humilha����o era
um gosto amargo em sua boca. O fato
��� N��o h�� nada p��ra ser solucionado.
de ser apenas um joguete nas m��os dele
Foi um engano, tudo foi um engano.
revoltou-a.
Acho que compreende como �� essa coisa
de usar as pessoas para um fim espec��-
Desejou gritar toda essa revolta, desa-
fico. Eu consegui meu objetivo. Est��
bafando sua afli����o. Percebeu, no en-
aqui, agora, ao meu lado ��� disse Pa-
tanto, que era sua ��nica maneira de se tr��cia, beijando levemente V��tor.
sair com dignidade daquela trama ar-
Passaram por Eduardo, que ficou ali,
mada por Eduardo para vingar-se dela. parado, confuso, furioso, at�� que o es-Estava com as colegas. Fatalmente, tacionamento esvaziasse e ele ficasse s��.
elas, de alguma forma, fariam o acon-
Caminhou, ent��o, para a moto. Algu��m
tecimento chegar aos ouvidos de V��tor.
se aproximou. Era No��mia.
N��o, isso n��o seria necess��rio. Ela mes-
��� Eu o avisei, Eduardo. Ela �� m �� . . .
ma providenciaria para que V��tor sou-
Eu sinto muito.
besse que encontrara com Eduardo na-
quela manh�� e que lhe dissera tudo que
��� Esque��a.
era preciso dizer.
��� Me d�� uma carona?
Ele a olhou demoradamente, depois
Esperou que ele chegasse, com um sorriu, desculpando-se.
28
��� N��o, acho melhor n��o. Se correr,
Sua m��e entrou no quarto e diminuiu
ainda pega o ��ltimo ��nibus.
o volume do aparelho de som. Patr��cia
ergueu a cabe��a, esbo��ando um sorriso.
* * *
��� O que h�� com voc��, filha? ��� inda-
gou-lhe a m��e, sentando-se junto dela,
Quarta-feira. Eduardo estava deitado na cama. ��� Algum problema com o V��-
no sof�� da sala, ouvindo m��sica. A tar-
tor?
de ia pelo meio e ele n��o tinha ��nimo
��� Sim e n��o. Ali��s, n��o sei mais on-
algum para sair.
de est�� o problema, m��e.
Os ��ltimos dias haviam sido um pesa-
��� Por que n��o me conta tudo, desde
delo torturante para ele. Aquele senti-
o princ��pio?
mento encravara-se dentro dele, espa-
��� Sim, por que n��o?
lhando ra��zes doloridas pelo seu peito,
Contou-lhe, ent��o, tudo conforme ocor-
que do��a a cada vez que pensava em rera.
Patr��cia... e ele pensava nela a todo
��� E agora, o V��tor se julga meu do-
instante.
no. Pode imaginar uma coisa dessas,
N��o conseguira entender. N��o podia m��e? At�� me proibiu de ir ao show do
ter-se enganado daquela maneira. No Queen. Est�� tiranizando minha vida.
entanto, tentara falar com ela diversas
��� Ent��o d�� o fora nele. As amea��as
vezes. Telefonaram. Ela se recusara a que ele fez no princ��pio n��o a atingem atender, at�� que, finalmente, o fizera, mais. Se ele quiser surrar o tal Eduar-apenas para jogar-lhe na cara seu des-
do, �� at�� bom que aconte��a. Afinal, os
prezo.
dois bem que merecem uma boa surra.
Vira-a todas as manh��s na Universi-
Patr��cia sentou-se na cama, olhando
dade. Era terr��vel supor que jamais te-
a m��e, percebendo que n��o precisava
ria nova chance de t��-la consigo, de to-
sofrer al��m do necess��rio. N��o havia
m��-la nos bra��os, de experimentar de mais esperan��as para ela em rela����o a
novo aquelas sensa����es sufocantes e ele-
Eduardo. Por que, ent��o, aceitar a tira-
trizantes ao beij��-la.
nia de V��tor, que n��o tinha, dessa for-
Algu��m caminhou at�� a outra pol-
ma, como amea����-la?
trona, sentando-se. Eduardo ergueu os
olhos. Era seu pai, j�� refeito da crise.
��� Excelente id��ia, m��e! ��� disse, apa-
��� Como se sente, velh��o? ��� indagou.
nhando o telefone e discando para Be-
��� Muito bem. Continuo firme na die-
n��, sua amiga. ��� Ben��, ainda tem um
ta que o Dr. Siqueira recomendou. Es-
lugar para mim? Quero ir ao show!
tou me sentindo fortalecer. Em breve
* * *
poderei me submeter �� opera����o e re-
solver isso de uma vez por todas. Es-
tou com saudade do meu jardim e de
Quinta-feira. A noite chegara com
minhas roseiras. Isso nos leva ��quele promessa de ins��nia. Eduardo caminhou problema dos terrenos, em Ourinhos. inquieto de um lado para outro de seu
Preciso que v�� at�� l�� verificar.
quarto. N��o podia ficar mais ali. Preci-
sava sair, fazer alguma coisa para acal-
��� Farei isso esta semana mesmo. mar aquele sufoco dentro dele.
Acha que isso pode ser feito no s��bado?
��� Sim, por que n��o? Assim voc�� n��o
Apanhou a moto. Pensou num chope,
ter�� muitos problemas faltando ��s aulas. dois, muitos, o bastante, talvez, para Mas estive observando voc��, filho. Est�� afogar aquele sentimento doloroso. Foi com um problema, n��o?
ao barzinho de costume. Entrou e se sen-
��� Sim, pai. Um problema s��rio. Um tou. Uma gargalhada embriagada explo-
problema de cora����o, mas diferente do diu atr��s dele.
seu. O meu n��o tem cura...
��� Que triste o nosso destino, cara ���
��� Apaixonado?
disse V��tor, sem inimizade, mas Eduar-
��� E sem esperan��as.
do ficou na defensiva.
��� N��o quer me contar tudo? Talvez
N��o pretendia ser humilhado mais do
ajude.
que j�� fora.
��� ��, acho que vale a pena tentar.
��� Viu como acabamos? Os dois de
m��os abanando. Eu quis demais, assim
* * ���
como voc��; Posso me sentar? Sem res-
29
sentimentos. Pago-lhe um chope. Ou pre-
��� A No��mia contou... A pr��pria Pa-
fere um u��sque?
tr��cia me disse... Por qu��?
Eduardo olhou-o confuso, enquanto ele
��� Por nada... Acho que vou aceitar
se sentava. V��tor pareceu entender.
aquele chope que me ofereceu. Ent��o o
��� Bia me deu o fora, sabia? Me deu
grupo j�� partiu... Sabe onde v��o ficar?
o fora!
��� N��o, me parece que iam se espa-
��� Patr��cia?
lhar nos apartamentos de uma por����o de
��� Sim, Patr��cia. Ela n��o me ama, colegas...
nunca me amou. Eu forcei demais a
Eduardo tratou de acalmar seus pen-
barra... Ora, vamos esquecer... Mas o
samentos, p��-los em ordem. Tudo se es-
que voc�� est�� fazendo aqui? O pessoal clarecia. Em seus ouvidos, ent��o, acima j�� partiu para S��o Paulo. Foram numa da confus��o alegre do barzinho, soaram turma. Cinco carros lotados... Quando as palavras de Patr��cia, naquele do-voc�� vai?
mingo:
��� Aonde?
"N��o importa o que aconte��a, o que
��� Ao show do Queen? A No��mia dis-
voc�� veja, o que digam, s�� acredite no
se que voc�� ia lev��-la de moto, que iam
que digo: eu o amo mais do que qual-
acampar...
quer mulher j�� amou neste mundo..."
��� A No��mia tem a imagina����o muito
No��mia fora a respons��vel com aque-
f��rtil ��� riu Eduardo, depois algo esta-
la hist��ria maluca e gratuita. Precisava
lou dentro dele, como um vislumbre de
encontrar Patr��cia. Precisava contar-lhe
explica����o para tudo que acontecera. ���
tudo, refazer tudo, recome��ar, agora sem
Com�� soube disso?
qualquer empecilho.
CAP��TULO 10
Eduardo partira de madrugada. Seus Ficaria para tr��s, como uma recorda����o
pais haviam concordado com seus pla-
que se apagaria nos momentos felizes
nos. Iria a S��o Paulo, procuraria Patr��-
que pretendiam viver.
cia e, na volta, passaria por Ourinhos e
Chegou a S��o Paulo no meio da tarde.
verificaria os terrenos.
Foi at�� o est��dio. Muita gente se aglo-
O importante era que estava indo ao merava, um clima de festa e deslumbra-
encontro dela. Durante a viagem, por��m,
mento dominava o local. ��nibus de to-
percebeu qu��o in��til poderia ser tudo das as partes do pa��s traziam inquietos aquilo.
f��s. Grupos chegavam com faixas, sau-
dando seus ��dolos.
Como iria encontr��-la num est��dio de
futebol lotado? Em sua pressa com os
Sua primeira provid��ncia foi encon-
preparativos da viagem, esquecera-se do trar um local seguro para deixar a mo-principal, algo que poderia resolver tu-
to. Depois tratou de comprar um ingres-
do. Talvez algu��m que n��o fora, de al-
so. N��o se importou com o pre��o. O lo-
guma forma, soubesse como localizar cal mais indicado para procurar Patr��-
Patr��cia.
cia seria o centro do gramado, onde os
f��-clubes se aglomeravam.
V��tor dissera que eles se espalhariam
por diversos apartamentos. Poderia di-
Entrou. Estonteado, percebeu que sua
ficultar ainda mais, mesmo que soubes-
tarefa n��o seria f��cil. Seria praticamen-
se do endere��o de apenas um.
te imposs��vel localizar quem quer que
Procurou n��o pensar nisso. Queria fosse ali dentro.
chegar l�� depressa, encontr��-la e con-
A previs��o era de que duzentas mil
tar-lhe o terr��vel desencontro de que pessoas estariam ali, at�� o in��cio do foram v��timas.
show. Olhando ao seu redor, Eduardo
Ele a amava e estava certo de que era
calculou que j�� havia esse n��mero ali
correspondido. O resto n��o interessava. dentro.
30
Olhou o enorme palco, com toda sua
tado a m��o, e colou-o no ombro direito
parafern��lia de luzes e instrumentos. do blus��o dele.
Numa plataforma que se parecia com
��� Pode dizer agora que �� do nosso
a parte superior de um disco-voador, f��-clube. Temos sandu��ches ali. Refrige-cercada de luzes, estava a incr��vel ba-
rantes e cerveja tamb��m. P��e uma nota
teria.
na caixinha depois.
O deslumbramento, por��m, cedeu lu-
A garota ia se afastar, mas parou,
gar �� afli����o. Como encontrar Patr��cia?
olhando-o, intrigada com a maneira com
Como chegar at�� ela naquela multid��o?
que Eduardo olhava a seu redor, aflito,
Estaria ali? Nas arquibancadas? Onde? procurando por alguma coisa.
Girou os olhos, confuso. Olhou as fai-
��� O que est�� errado, cara?
xas. "Deus salve o Queen". Enorme fai-
��� Tudo est�� errado, menina.
xa, pintada com letras vis��veis, na ar-
��� Por qu��? Voc�� parece que procura
quibancada. Viu as outras, que o cer-
algu��m ou alguma coisa.
cavam. Um grupo de rapazes e garotas
��� Adivinhou. Procuro minha garota.
tentava pintar uma outra, estendendo Vim aqui s�� para reencontr��-la. �� uma
precariamente um pano enorme e dese-
longa hist��ria... Um desacerto.
nhando as letras com uma lata de tinta
��� Vai ser uma loucura encontr��-la
em spray.
aqui. N��o tem jeito n��o.
O ambiente era de alegria. As pre-
Um rapaz se aproximou. Parecia ter
ocupa����es com tudo que fosse se des-
ouvido o que eles haviam conversado.
manchavam no desejo de ver, ouvir e
��� Quer achar sua garota? Tem cer-
louvar o grupo famoso.
teza que ela est�� aqui?
S�� ele, Eduardo, se sentia deslocado,
��� Sim, ela n��o perderia esse show
perdido em sua preocupa����o, doente de
por nada.
amor e alheio a tudo isso, pensando num
��� Talvez haja um m e i o . . .
par de olhos verdes que o fariam estre-
��� Como?
mecer.
��� Diga a�� o nome dela.
��� Ei, cara! Ajuda a��! ��� gritou al-
��� Patr��cia.
gu��m.
��� Vamos encontrar Patr��cia, ent��o ���
Ele se voltou na dire����o da voz. Um
disse o rapaz, ditando algumas ordens
rapaz lhe estendia um martelo e um r��pidas.
punhado de pregos.
Um resto de tecido foi espalhado so-
bre o gramado. O rapaz apanhou a tin-
��� Ajude a pregar a madeira na faixa
ta. Com habilidade escreveu com enor-
��� pediu o outro.
mes letras o nome da garota.
��� Sim, claro ��� concordou.
��� Precisamos usar algo especial ago-
A faixa estava pronta. "We Love You,
ra ��� acrescentou, escrevendo mais al-
Queen". Riu. Era divertido a seriedade guma coisa. ��� Como �� seu nome? ���
com que aqueles jovens se entregavam indagou.
�� simples tarefa de pintar uma faixa,
saudando seus ��dolos.
��� Eduardo.
��� Acho que vai dar ��� comentou, ter-
Seria lida facilmente pelos m��sicos. minando a faixa. ��� Vamos tratar de
Num tecido branco, letras garrafais em ergu��-la agora, pessoal. Se a sua garota vermelho.
estiver por a��, n��o vai dar outra.
��� Pronto, aqui est�� terminado ���
A faixa foi pregada num suporte de
disse.
madeira compensada e erguida. Come-
��� Obrigado!
��ou, ent��o, a ser girada para todos os
Uma garota estendeu-lhe um pequeno cantos do est��dio.
livreto mimeografado, onde estavam as
"Patr��cia, amo voc��. Eduardo", leu ele,
principais letras do conjunto.
compreendendo o que o rapaz pretendia
��� Cad�� seu distintivo? ��� indagou com aquilo.
ela.
Olhou ao seu redor. Torceu para que
��� Que distintivo?
os olhos maravilhosos de Patr��cia pou-
��� Voc�� n��o �� do nosso f��-clube?
sassem sobre a faixa e ela entendesse
Ele riu, dizendo que n��o. A garota re-
o apelo desesperado contido naquelas le-
tirou do bolso um pequeno adesivo, pin-
tras garrafais.
31
��� Acha que vai dar certo? ��� inda-
Eduardo torceu para que seu novo
gou ao rapaz que pintara a faixa.
amigo estivesse certo. Enquanto isso, n��o
��� Claro que vai, amizade. Nessas longe dali, uma garota se espremia por
transas de amor, o que vale �� ser ori-
entre a multid��o, apressada, ansiosa, o
ginal, �� falar, �� dizer, �� abrir-se. Quer
olhar verde e feliz fixo naquela faixa
coisa mais linda que esta faixa?
que simbolizava sua pr��pria felicidade,
algo t��o incr��vel a princ��pio como en-
��� Mas no meio de tantas outras...
contrar inesperadamente a pessoa ama-
��� V�� por m i m . . .
da naquela multid��o festiva.
FIM
AS ESTUDANTES �� uma publica����o mensal da Cedlbra ��� Editora Brasileira Ltda. Rua Filo-mena Nunes, 162 ��� CEP 21.021 ��� Rio de Janeiro, RJ. Distribui����o para todo o Brasil: Fernando Chinaglia Distribuidora S.A. Rua Teodoro da Silva, 907 ��� Rio de Janeiro, RJ.
Copyright (c) MCMLXXXI Cedibra ��� Editora Brasileira Ltda., que se reserva todos os direitos da presente edi����o, ficando proibida a sua reprodu����o total ou parcial. Composto e impresso na Gr��fica Lux Ltda. ��� Estrada do Gabinal, 1521 ��� Freguesia ��� Jacarepagu�� ���
Rio de Janeiro, RJ.
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De: Bons Amigos lançamentos
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Este e-book representa uma contribuição do grupo Bons Amigos e Só livros com sinopses para aqueles que necessitam de obras digitais como é o caso dos deficientes visuais
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