sexta-feira, 9 de abril de 2010

Cathie Linz - UMA PRINCESA EM NOVA YORK.txt

UMA PRINCESA EM NOVA YORK
The Marine & The Princess
Cathie Linz
Sabrina 1232
Irmãos Wilder 02
Homens de Honra 02


Para: Rei Leopold
De: Capitão Mark Wilder, Oficial da Marinha
Assunto: Princesa Vanessa Von Volzemburg

Majestade,

Fui designado para proteger a princesa Vanessa enquanto viaja incógnita pelos Estados Unidos, mas tenho tido problemas.
Vanessa está longe de ser a princesa mimada que eu imaginava. Ela é simples, autêntica e corajosa, uma pessoa encantadora. Uma jovem que anseia por liberdade
e por não ter de se submeter às obrigações impostas pela realeza. No entanto, ela sabe que precisa voltar e casar-se com um homem a quem não ama.
Vanessa ficará em segurança enquanto estiver sob minha proteção. Mas está fora do meu alcance mantê-la isolada do mundo, e também não posso prometer que serei
capaz de protegê-la de mim mesmo...


Digitalização: Joelma M.
Revisão e Formatação: m_nolasco73

Querida leitora,

Você já reparou como as plantas transmitem energia positiva? Como um lugar fica mais alegre, mais vivo quando tem plantas e flores? Mexer na terra, observar
a natureza... são coisas que adoro fazer, que me transmitem paz... Como é bom ouvir o canto de um pássaro, ver uma flor desabrochar... presentes que a natureza nos
dá e que na maioria das vezes nem percebemos...

Fernanda Cardoso Editora

Copyright (c) 2001 by Cathie L. Baumgardner
Originalmente publicado em 2001 pela Silhouette Books,
divisão da Harlequin Enterprises Limited.

Todos os direitos reservados, inclusive o direito de
reprodução total ou parcial, sob qualquer forma.

Esta edição é publicada através do contrato com a
Harlequin Enterprises Limited, Toronto, Canadá.
Silhouette, Silhouette Desire e coleção são marcas
registradas da Harlequin Enterprises B.V.

Todos os personagens desta obra são fictícios.
Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas
terá sido mera coincidência.

Título original: The Marine & the Princess

Tradução: Elaine Vidote
Editora e Publisher: Janice Florido
Editora: Fernanda Cardoso
Editoras de Arte: Ana Suely S. Dobón, Mônica Maldonado
Paginação: Dany Editora Ltda.

EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.
Rua Paes Leme, 524 - 10º andar CEP 05424- 010 - São Paulo - Brasil
Copyright para a língua portuguesa: 2002
EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.

Impressão e acabamento:
DONNELLEY COCHRANE GRÁFICA E EDITORA BRASIL LTDA.
DIVISÃO CÍRCULO - Fone (55 11) 4191- 4633


Irmãos Wilder (Cathie Linz)

1. Missão irresistível (Stranded with the seargent) - Julia Paixões Picantes 45 - Ebook
2. Uma princesa em Nova York (The Marine & the Princess) - Sabrina 1232 - Ebook
3. Married to a marine
4. Sleeping beauty and the marine

Obs1: Em Missão irresistível aparece o oficial da Marinha e melhor amigo de Joe Wilder, Curt Blackwell. Ele tem livro próprio: Daddy in Dress Blues (ebook em espanhol)


Obs2: A série Homens de Honra possui várias classificações, dependendo do site de pesquisa. O site Wikipedia, incluiu os 3 primeiros livros da série Irmãos Wilder.
Entretanto, o site Contemporary Romance Writers classificou esta série incluindo o livro Stranded with the Sergeant que é a história de Joe Wilder e omitiu o livro
Lone Star Marine, sobre Tom Kozlowski. Já o site Fictiondb classificou apenas os 5 últimos livros, da relação abaixo, como pertencentes a série Homens de Honra.


Marines, Men of Honor (Cathie Linz)

1. Missão irresistível (Stranded with the seargent) - Julia Paixões Picantes 45 - Ebook
Joe Wilder X Prudence Martine

2. Uma princesa em Nova York (The Marine & the Princess) - Sabrina 1232 - Ebook
Mark Wilder x Princesa Vanessa Von Volzemburg

3. Married to a Marine - Justice Wilder x Kelly Hart

4. Sleeping Beauty and the Marine - Sam Wilder x "Cassie"

5. Um homem de palavra (Her Millionaire Marine) - Ebook PRT
Kate Bradley x Striker Kozlowski

6. Cinderella's Sweet- Talking Marine - Ebook em espanhol (Amor y honor)
Ben Kozlowski x Ellie Jensen

7. Jogando com o dever (The Marine Meets His Match) - Ebook PRT
Rad Kozlowski X Serena Anderson

8. Corações Apanhados (The Marine and Me) - Ebook PRT
Steve Kozlowski x Chloe Johnson

9. Almas Gêmeas (Lone Star Marine) - Ebook PRT
Capitão Tom Kozlowski X Callie Murphy


http://en.wikipedia.org/wiki/Cathie_Linz#Marines.2C_Men_Of_Honor_Series
http://contemporaryromancewriters.com/index.cfm
http://www.fictiondb.com/author/cathie-linz~series~men-of-honor~5516~c.htm


CAPÍTULO I

- Tem de me ajudar! - a princesa Vanessa Alexandria Maria Tereza Volzemburg suplicou, aflita.
- O que há de errado? - Prudence Wilder, sua melhor amiga quis saber, do outro lado da linha. - Você está bem?
- Não, estou péssima! Se tiver de apertar outra mão ou esboçar mais um sorriso, vou enlouquecer! - resmungou, atirando para longe os sapatos caríssimos, feitos
sob medida. - Estou em Nova York, a cidade mais excitante do mundo, mais não passo de uma prisioneira!
Uma prisão de luxo, construída com a opressora trama de barras invisíveis em nome da lealdade à família real e país, pensou desolada.
Vanessa caminhou até a janela, os pés afundando no carpete macio, e olhou para fora.
- O que está fazendo em Nova York?
- Represento meu pai na Feira Internacional de Chocolates Manufaturados, promovida pelos empresários de Volzemburg.
- E ainda reclama?! - Prudence não conteve uma gargalhada.
- Estou acordada desde as seis horas da manhã, e já passa da meia-noite! - Vanessa mostrou-se, ofendida. - Tem sido assim todos os dias. Acho que nunca mais
poderei olhar para uma trufa de chocolate pelo resto de minha vida!
- Vanessa, não exagere!
- Certo, talvez consiga comer um bombom depois do desjejum... Mas não quero mais voltar para Volzemburg! - Retirou a fina presilha, deixando os longos fios
dourados caírem, suaves, pelos ombros. Mimi, o cabeleireiro a quem seu pai pagava uma fortuna por semana, teria um ataque se a visse despentear o penteado daquela
forma.
- Papai está me pondo louca com sua insistência para anunciar meu casamento com Sebastian de Koonan.
- Refere-se àquele magnata famoso, o homem mais rico de Volzemburg?
- O próprio. A linhagem dele é tão aristocrática quanto a minha, e é um homem interessante. Mas a possibilidade de tê-lo como marido... - Suspirou, entediada.
- Seria o mesmo que me casar com um irmão.
- Já disse a seu pai o que sente?
- Sim, mais de cem vezes, mas ele não me ouve! Preciso encontrar um jeito de fugir dessa prisão de responsabilidades, ao menos por alguns dias.
- Vanessa, não vá fazer nenhuma bobagem! - Prudence reconhecia aquele perigoso tom de voz, o mesmo que a princesa costumava usar quando eram adolescentes e
dividiam o quarto no renomado colégio interno onde estudaram.
- "Não fazer nenhuma bobagem?!" Não acredito que uma mulher que pratica bungee jumping esteja apta a dar um conselho desses!
- Bem, não sou uma princesa... - Divertindo-se com a argumentação inteligente da amiga, disse: - Você mesma diz que tem responsabilidades, querida. Não pode
abandoná-las assim, sem mais nem menos!
- Por que não?
- Porque sua vida é planejada com meses de antecedência, sua agenda não pode ser mudada de uma hora para outra.
- Sim, mas na próxima semana papai vai querer que eu passe algum tempo com Sebastian, no palácio. Não há nenhum evento oficial agendado. - Pela primeira vez,
Vanessa esboçou alguma excitação, como se visse uma luz no fim de um longo túnel. - Eu poderia...
- Não, não poderia, seja o que for que estiver planejando! Seria muito perigoso. Você é uma princesa. Se não for para casa, seu pai vai enviar o exército de
Volzemburg em seu encalço!
Prudence sabia bem o que representava o poder das Forças Armadas. Tanto seu pai quanto Joe, com quem se casara fazia menos de um ano, eram oficiais da Marinha
dos Estados Unidos.
- Ah, mas não vou desaparecer... Pretendo ficar aqui mesmo, em Nova York.
- Seu pai jamais permitiria.
- Farei com que pense que estou doente - Vanessa continuava, como se estivesse pensando alto. - E não estarei mentindo. Em breve ficarei mesmo, se prosseguir
nesse ritmo. Oh, Deus, preciso fugir desta gaiola! Estou decidindo algo que poderá funcionar.
- Ainda acho que é absurdo.
- Mas você ainda nem ouviu!
- Está bem, Vanessa, fale. Tente me convencer.
- Direi que adoeci. Nada sério, apenas um resfriado ou algo que me impeça de pegar o avião.
- Não acha suspeito dizer que ficou resfriada quando estava com encontro marcado com Sebastian?
- Não, se um médico confirmar!
- E como conseguirá que um médico aceite falar tamanha mentira?
- Nova York está cheia de atores. - Vanessa riu, contente como uma criança que planeja uma travessura.
- Está bem. Suponhamos que seu pai acredite. Mesmo assim, terá de ficar presa na suíte, fingindo que não passa bem.
- Não, se conseguir convencer minha dama de companhia a me ajudar! - O entusiasmo de Vanessa crescia à medida que falava.
- Céus! Não pode simplesmente sair pelas ruas de Nova York! - Prudence começava a se assustar de verdade.
- E aí que você entra! - a princesa, cada vez mais alegre, ignorava os protestos do outro lado da linha. - Que tal se conversasse com Joe e conseguisse alguém
da Marinha para ser meu guarda-costas?
Prudence ficou em silêncio por um longo momento. Conhecia a amiga e sabia que não desistiria enquanto não conseguisse o que queria. Por fim, teve de admitir
que seria inútil argumentar.
- Prometo que vou pensar nessa idéia, está bem? Creio que conheço um oficial que poderá ajudar. - E respirou fundo, resignada.
Exausta, Vanessa foi para a cama logo que desligou o telefone. O corpo todo doía, e sentia-se enjoada. Talvez fosse o caviar servido no banquete daquela noite,
ou mesmo o fato de não estar se alimentando bem havia muitos dias. Sua infelicidade crescera e assumira proporções monumentais, deixando-a sem sono e sem apetite.
Assim que caiu na cama, adormeceu no mesmo instante.
Acordou cedo na manhã seguinte, com o sol entrando pela vidraça e inundando o quarto de luz.
Pulou do leito, ainda tonta de sono, preocupada em elaborar o que chamava de "plano de liberdade". Como conseguir um ator para representar um médico? Conhecera
George Clooney no festival de Cannes. Ele seria perfeito!
Vestindo um robe de seda com o brasão real bordado no bolso, foi para o banheiro, distraída com suas divagações. Porém, ao abrir a porta, seu sangue congelou
nas veias.
- Bom dia. Capitão Mark Wilder, às suas ordens - o homem alto e moreno a saudou. Usava calça jeans e uma camiseta preta, e ostentava um sorriso discreto, muito,
muito sensual...

Mark quase gargalhou quando sua cunhada lhe pediu que protegesse uma princesa mimada. Ela devia estar brincando, disse a si mesmo, ao ouvir Prudence. Não dedicara
os melhores anos de sua existência à rígida formação da corporação de fuzileiros navais da Marinha americana para terminar como babá de luxo.
Poderia ter recusado, mas Prudence insistira de forma dramática, e seu irmão, Joe, apanhara o telefone para reiterar o pedido. Quando deu por si, estava no
vôo para Nova York, furioso com sua falta de habilidade em dizer "não".
O mais irônico havia sido que, depois de desligar o aparelho, seu superior imediato o chamara e o designara para uma missão especial: cuidar da proteção e
segurança de uma princesa que viajava pela América, como um favor pessoal ao rei de Volzemburg, sem que ela soubesse do verdadeiro propósito da incumbência.
Segundo a descrição de seu superior, Vanessa era uma garota inconseqüente, com uma vida luxuosa e confortável, estava levando seu devotado pai, um poderoso
aliado dos Estados Unidos, à loucura.
Mark entendeu por que a princesa tinha esse poder. Estava magnífica naquele robe de seda!
A última vez em que a vira usava um elegante vestido verde-claro, longo e discreto, e uma gargantilha de esmeraldas que, com certeza, deveria valer mais que
seu carro. Colocara uma fina tiara de ouro, que se confundia com os fios dourados dos cabelos.
Estava no casamento de Prudence e Joe, nove meses atrás. Embora simpática e amigável com todos, a princesa nem notara sua existência. Claro! Para ela, Mark
não devia ser nada além de um simples mortal. Ele, porém, ficara fascinado com a beleza estonteante e a graça natural com que se movia. Os olhos verdes se iluminavam
quando sorria, os lábios, cheios e sensuais, despertavam fantasias que Mark não ousava revelar.
Alta e imponente, não possuía o corpo de uma modelo. As curvas generosas e os seios fartos o agradaram mais do que gostaria. Sem sombra de dúvida, correspondia
a seu padrão de beleza. Só não estava tão certo se gostava daquilo numa princesa a quem teria de proteger.
- O que está fazendo em meu banheiro? - Vanessa exigiu, por entre os dentes, depois de alguns segundos de com completo espanto.
- Prudence não falou que eu viria? - Mark manteve o mesmo ar impessoal, ignorando a evidente hostilidade.
- Não, ela disse que iria pensar. Eu não esperava que viesse tão cedo... Como conseguiu chegar até aqui sem que meu segurança notasse?
- Sou um fuzileiro naval, princesa. Fui treinado pelo grupo de elite da Marinha, sei como entrar sem ser notado.
- Por favor, não precisa ser tão formal. Pode me chamar de Vanessa.
- Pode me chamar de capitão. - E fez uma ligeira inclinação de cabeça.
- Prefiro tratá-lo por Mark - ela sentenciou, ignorando a ironia sutil do comentário. - O que Prudence lhe informou a meu respeito?
- Que você tem uma idéia maluca a respeito de vagar pelas ruas de Nova York.
- Duvido que minha amiga tenha dito isso! - Vanessa ergueu o queixo, com imponência.
- A mensagem foi essa. - Mark a observava, fascinado com a majestade natural que irradiava nos menores gestos.
- Você parece não aprovar...
- Como eu disse, parece ser uma idéia maluca.
- Então, por que está aqui? - desafiou-o, fitando-o com aquelas incríveis íris verdes.
- Porque meu irmão me pediu isso como um favor especial. - Aquela era uma das razões, mas Vanessa não precisava saber disso.
- Ah, você é irmão de Joe! Ele foi muito gentil em me ajudar. - Acentuando as palavras, insinuou que a gentileza aplicava-se apenas a Joe.
- Deixe-me usar os termos adequados - Mark a corrigiu, relutando em admitir que gostava daquele estilo. - Você quer se ver livre de seus encargos de princesa
para passear por Nova York, certo?
- Sim, é mais ou menos isso. - Vanessa duvidava que ele pudesse compreender o que um simples passeio poderia significar para ela. - Importa-se de continuarmos
a conversa na sala? Não estou acostumada a discutir no banheiro.
- Como quiser, Alteza. Parece que a única a ter direito de usar o trono é você.
- Tem senso de humor, capitão. Gosto disso nos oficiais da Marinha.
- E você tem respostas à altura, Vanessa. Gosto disso numa princesa.
- Talvez eu destrua alguns de seus preconceitos sobre princesas... - Ela sorriu, ao caminharem para a sala, sentando-se no sofá com elegância, como se estivesse
mesmo em um trono real.
- O que pode ter de tão ruim em ser uma princesa? - Em pé à frente dela, Mark não conteve a curiosidade.
- Muitas coisas! - Vanessa replicou, com uma voz que soava como seda.
- Parece incrível para mim. Aposto que uma noite nesta suíte custa mais do que posso ganhar em um mês!
- Acredito que sim. Não sei ao certo, porém. Os secretários de meu pai cuidam desses pormenores. - E fez um gesto de desdém.
- O que espera de mim?
- Segurança - afirmou, de pronto. - Minha segurança, para ser mais precisa. Vou pagar para isso, é óbvio.
- Não me insulte! - interrompeu-a, ofendido.
- Estava apenas tentando... - Vanessa pestanejou, insegura. Não estava acostumada a ser contrariada.
- Trata-se de um favor para meu irmão e Prudence.
"E de cumprir as ordens de meu oficial superior", completou para si.
- Não sei o que dizer...
- Não diga nada. - Mark a encarava, o que a deixou ainda mais constrangida. - Apenas fale quais são seus planos.
Vanessa repetiu o que revelara a Prudence, tentando emprestar mais firmeza à entonação para soar convincente.
- Que absurdo! Pretende contratar um ator para fingir ser um médico? - Mark achou graça, iluminando o belo rosto másculo com um sorriso que quase a fez derreter.
- Conheço um doutor de verdade que poderá atestar que você precisa de repouso. Ele pode dizer que está exausta, na eminência de uma crise de stress...
- Os Von Volzemburg não têm stress! - Indignada, Vanessa levantou-se e o encarou. - Lutamos com Alexandre, o Grande, para proteger nosso país. Carregamos a
tradição de sermos destemidos guerreiros!
- Pode ser, mas não é preciso despejar óleo fervente das muralhas do castelo para proteger seu reino, nos dias de hoje.
- Não. Tenho apenas de passar vinte e quatro horas por dia indo de recepção a recepção... - Suspirou, com tristeza.
Mark dirigiu-lhe um olhar que não demonstrava piedade. - Deve ser difícil, não? Muitas festas, alimentação inadequada, poucas horas de sono... O dr. Rosenthal
é o homem certo para seu caso.
- Mas ele nunca me viu antes. - Vanessa estava receosa de que seu plano fracassasse. - O que o faz crer que irá concordar em ligar para meu pai?
- Ele é médico da Marinha. A realeza não o impressiona.
- Sério? Por um momento me esqueci de que vocês, bravos fuzileiros, nunca sentem medo! - Arqueou uma sobrancelha, e seus lábios sensuais curvando-se com estudada
ironia.
- Bem, madame, admito que a idéia de casamento me apavora...
- A mim também - Vanessa confessou, surpreendendo-o com a declaração espontânea.
- Como não quero me casar com você, nem você comigo, não temos por que temer!
Vanessa o fitou, confusa. Não esperava que um guarda-costas tivesse aquele grau de intimidade, nem que fosse tão espirituoso e interessante.
- Está bem, vou falar com o tal médico. Mas acho que devia procurar outro diagnóstico. Papai não aceitará que eu desmarque meus compromissos porque estou estafada.
Não é uma desculpa aceitável para não voltar para casa. Acredito seja melhor declarar que estou com otite, ou algo assim.
Mark estudou os olhos dela, depois a delicada orelha, com um magnífico brinco de brilhante.
- Consegue dormir com essas coisas enormes em suas orelhas?
- Estava cansada demais para tirar os brincos - respondeu, espantada, tocando o lóbulo num reflexo.
Anos de treinamento permitiam a Mark manter um olhar impassível, mesmo diante das situações mais adversas. Contudo, a proximidade daquela mulher destruía os
anos de prática num bater de pestanas.
- Será que ele não poderia ligar para meu pai e dizer que estou com um terrível resfriado? - insistiu, fazendo-o parar de imaginar como seria percorrer com
a ponta da língua a maciez da pele alva. - Que tal uma infecção de ouvido que me impedirá de voar por muitos dias?
- Sim. Acho que ele fará o que quer.
"Que homem não faria?"
- O médico não terá problemas éticos?
- O dr. Rosenthal é um grande amigo, fará o que você pedir. - Mark não estava disposto a revelar as razões do doutor para concordar com sua estratégia, e mudou
de assunto logo: - Onde planeja dormir, à noite?
- Aqui, suponho... - respondeu, confusa. Não havia considerado aquela questão.
- Nesta suíte? Não concordo. Teremos de passar por seu guarda pessoal todas as noites. Poderemos ser flagrados.
- Está bem, posso me acomodar em outro lugar. Há muitos hotéis razoáveis na cidade.
- Não que eu possa pagar.
- Pagarei todas as despesas - Vanessa se apressou em informar.
- Com o quê? É melhor não chamar a atenção usando seu cartão de crédito.
- É verdade! - Encarou-o, caindo em si. - Ainda não planejei todos os detalhes...
- Não se preocupe, eu cuidarei deles. Mas, antes de sairmos, princesa, teremos de esclarecer alguns pontos. Em primeiro lugar, estou no comando desta operação.
- Isso significa que terei de obedecê-lo, certo? - ela perguntou com um sorriso de desafio.
- Na mosca! Tenho mais experiência do que você.
- Em fingir que é uma pessoa comum?
- Não, Alteza. Sou uma pessoa comum. Refiro-me à prática em elaborar planos. - Mark tinha consciência de que, se a princesa Vanessa Alexandria Maria Tereza
Von Volzemburg soubesse a verdadeira razão por estar ali, o expulsaria sem pestanejar.
Fazia parte de suas funções ter certeza de que ela não descobriria.


CAPÍTULO II

- Alteza? - A dama de companhia da princesa a chamou, com leves batidinhas na porta. - Está pronta para o desjejum?
- Não, Celeste! - gritou, correndo em direção à entrada e segurando a maçaneta para impedir que ela entrasse. - Volte em quinze minutos, por favor.
- Como quiser, Alteza.
Ao se virar, Vanessa quase trombou em Mark. Ele se movera em tão absoluto silêncio que não percebeu que estava bem atrás de si, tão próximo que podia ver seu
reflexo na íris azulada. Perturbada com a proximidade, deu um passo em falso, e teria caído se as mãos fortes não a amparassem.
Vanessa sentiu a pele queimar sob a fina seda do robe, consciente de cada dedo pressionado contra seu braço. Podia ouvir as batidas do coração e sentir o vigor
dos músculos do corpo másculo e viril.
Lembrava-se da última vez em que o vira, no casamento de Prudence. Altivo e forte, demonstrava uma indiferença que combinava com o ar displicente e rebelde.
Era, sem sombra de dúvida, o homem mais atraente da festa.
Nunca se interessara por homens de farda, em especial alguém tão arrogante quanto o capitão Mark Wilder. Mas havia algo nele que a perturbava...
- Quem é Celeste? - Mark quis saber, quebrando a mágica do momento.
- Minha dama de companhia. Ela também exerce a função de secretária particular. - E decidiu se afastar rápido, para escapar à poderosa atração que ele exercia.
Precisava de mais espaço para reassumir o autocontrole. Seu sangue se aquecia com aquele toque. - Pretendo incluí-la em meu plano.
- Discordo de você. - Mark meneou a cabeça.
- Por quê? Celeste é de total confiança.
Mark fitou o teto. Tinha adoráveis olhos azuis, mas o sorriso era mortal. Ou, talvez, seus olhos tornassem o sorriso mais poderoso, quando brilhavam com humor.
Naquele momento, no entanto, cintilavam de impaciência.
- Ótimo! Deixe-a entrar e tente explicar o que você faz com um sujeito estranho em seu quarto!
- Celeste jamais exigiria nenhum tipo de explicação!
- Achei que tivesse sido claro quando falei que eu dou as ordens.
Vanessa cruzou os braços sobre o peito, num gesto obstinado. Não estava disposta a ceder, e se aquele fuzileiro prepotente e arrogante julgava que poderia
tratá-la como se fosse uma adolescente estava muito enganado!
- Faça como quiser, mas não diga que não avisei! - Mark respirou fundo, desistindo de argumentar.
Que camarada rude!, pensou Vanessa ao vê-lo se esconder no banheiro. Não sabia que, diante de uma princesa, tinha de pedir autorização com uma mesura antes
de sair? Era bem verdade que pedira-lhe para tratá-la sem formalidades, mas um sinal de respeito seria bem-vindo, concluiu, ao abrir a porta para Celeste.
- Fiz alguma coisa que a ofendeu, Alteza? - a dama de companhia quis saber, nervosa.
- Ao contrário, Celeste. Preciso de você num assunto de grande importância. - Vanessa puxou-a para dentro e girou a chave na fechadura. - Prometa que manterá
segredo de tudo o que eu lhe disser.
- É evidente, Alteza! - A moça a fitava com um misto de curiosidade e espanto.
- Sabe como estive ocupada nos últimos meses, com compromissos desde a manhã até a noite. Preciso de algum tempo para mim, Celeste.
- Concordo, princesa. Estou feliz porque vamos voltar a Volzemburg ainda hoje.
- Não, nada disso. Ficaremos em Nova York um pouco mais.
Vanessa revelou-lhe seu plano e pediu que não deixasse ninguém entrar na suíte enquanto estivesse fora.
- Espero que não se ofenda, Alteza, mas... Acha mesmo que vai dar certo?
- Claro que sim, Celeste! Então? Posso contar com você?
- Estou a sua disposição, princesa. - Celeste inclinou a cabeça em sinal de respeito. - Você tem sido muito boa para mim e para minha família. Há muita gente
que gostaria de estar em minha posição, mas fui escolhida, e serei eternamente grata. Mas... tem certeza de que não correrá nenhum perigo? Nunca me perdoaria se
lhe acontecesse algo.
- Não permitirei que nada aconteça a ela - Mark afirmou, abrindo a porta do banheiro.
- Não se assuste, este é o capitão Mark Wilder. Ele é cunhado de minha melhor amiga, e será meu guarda-costas temporário.
- E quanto a Anton?
- Ah, está preocupada com ele? - Vanessa a provocou. - Sei que tem uma afeição especial por você.
- Anton nunca faria nada que comprometesse sua segurança! - Celeste corou até a raiz dos cabelos. - Assim como eu, ele é leal a Vossa Alteza e à coroa.
- Anton é leal a meu pai, minha querida. E é por isso que você não deve dizer nada a ele.
- Pode confiar em mim - Celeste assegurou, olhando de soslaio para o estranho, incerta se poderia dizer o mesmo dele.
- Excelente! Então, diga a Anton que não estou me sentindo bem esta manhã e que não quero ser perturbada. Ah! E quando um médico chamado dr. Rosenthal chegar, faça-o
entrar imediatamente.
Celeste saiu, depois de colocar sobre a mesa a bandeja com o café da manhã.
- Estou faminto! - Mark exclamou, inalando o tentador aroma que exalava das vasilhas fumegantes. - Importa-se que eu coma alguma coisa? O serviço de bordo
do vôo noturno é péssimo! Não comi nada além de alguns amendoins salgados.
Sem esperar pela resposta, Mark sentou-se e soltou um suspiro de prazer ao destampar a vasilha das panquecas.
- De onde você veio? - Vanessa quis saber, admirada com seu apetite.
- Washington. - Mark já levava uma generosa porção à boca.
- E lá que está servindo, no momento?
Ele fez que sim e encheu com suco de laranja a fina taça de cristal.
- Um lugar adorável - ela observou, sonhadora. - Mas acho Nova York a melhor cidade da América. Aqui tudo parece vibrar, como se tivesse vida própria.
- Só o que ouço vibrar é o barulho infernal do trânsito.
Aquele homem não tinha a alma!, concluiu Vanessa torcendo o nariz. Não estava surpresa. Afinal, fuzileiros navais não eram conhecidos por sua natureza poética.
Mas não podia negar que era bonito demais.
Ali, em seu quarto, devorando seu desjejum, Mark se mostrava forte e inabalável, criando as próprias regras. Ah, sim, tinha de admitir que gostava daquele
estilo...
A camiseta preta realçava a poderosa masculinidade, destacando os músculos bem desenhados do peito e os bíceps pronunciados. Era fácil imaginá-lo em uma missão
perigosa, combatendo o inimigo.
Desviando-se, Vanessa fixou a atenção em um ponto da parede, esforçando-se para pensar qualquer coisa que a tirasse de um terreno que poderia ser muito perigoso.
Não tinha aquele tipo de fantasia fazia séculos!
Mark era rude, irreverente, arrogante, prepotente... e sensual até a medula!
Bem, as qualificações para um guarda-costas temporário não eram as mesmas de um companheiro, numa relação romântica, desculpou-se. Não estava procurando um
companheiro para sua vida, mas sim por liberdade. E ponto final.
- Enquanto você come, farei uma lista do que planejo para os próximos dias.
Vanessa sentou-se em sua escrivaninha e apanhou um bloco de papel com o brasão dourado destacando-se no alto da página, pondo-se a escrever com a caneta de
ouro que ganhara da rainha da Inglaterra em seu vigésimo primeiro aniversário.
- Já estive aqui por diversas vezes, mas nunca visitei atrações turísticas como a Estátua da Liberdade ou o Edifício Empire State. - E os relacionou como os
primeiros itens de sua lista.
Apesar de seus melhores esforços, sua letra nunca fora tão elegante e legível quanto a de sua irmã mais nova, Anna. Certa vez, um especialista em caligrafia
fizera um artigo sobre Vanessa, dizendo que ela possuía um estilo individual que denotava surpreendente insegurança. O comentário rendeu muitas matérias na imprensa
marrom, que adoravam qualquer notícia sobre ela.
- Oh, adoraria passear sob a luz da lua no Central Park! - Vanessa colocou a caneta sobre os lábios e suspirou.
- Caminhar no Central Park à noite?! Você deve estar louca!
- Terei um poderoso fuzileiro naval para me proteger, lembra-se? Além disso, ouvi dizer que, hoje em dia, Nova York é um lugar muito mais seguro do que costumava
ser.
- Você armou essa confusão toda apenas para brincar de turista e visitar a Estátua da Liberdade? - Mark reclamou, deixando os talheres sobre o prato.
- Quero fazer o que as pessoas comuns fazem: comer em um restaurante fast-food, comprar em uma loja de departamentos e dançar em algum clube noturno.
Mark franziu o cenho. Preferia passar um mês no Pólo Norte a sair com uma garota para as compras! O último item da lista também não o agradou. Dançar? Não
gostava daquele tipo de diversão. Os ambientes eram repletos de gente e fumaça, havia muito barulho e confusão.
Aquela missão seria uma das mais difíceis de sua carreira, vaticinou, desolado. Passara por terríveis tempestades de areia no deserto, onze anos atrás, quando
era um jovem recruta, e de súbito aquilo lhe pareceu um passeio no parque, diante do que o esperava.
Pertencia ao esquadrão de elite da Marinha, especializado em segurança, treinado para ser eficiente em qualquer tipo de situação. Era excelente em estratégia,
e teria de usar todos os seus conhecimentos para enfrentar os encantos de uma princesa doce, requintada, e curiosa, a mulher mais linda que já conhecera.
- Bem, acho que terminei. Vou tomar um banho. - E Vanessa se ergueu, seguindo para o banheiro.
- Coloque roupas apropriadas para exercícios - Mark avisou, prevendo o próximo passo de seu estratagema.
- Roupas para exercícios? - Ela arqueou a sobrancelha, curiosa.
- Sim, calça de moletom e camiseta. Algo desse tipo.
- Não tenho nada parecido. Talvez encontre uma malha de dança.
- Isso deve servir. - Mark, a despeito de suas tentativas em contrário, já começava a imaginar Vanessa em uma roupa colante, que deixaria evidentes todas as
curvas generosas.
- Por que devo usar traje esportivo?
- Quero lhe mostrar alguns movimentos.
- Ah, sim, para quando formos dançar e...
- Tome seu banho e se troque. Não temos o dia todo - apressou-a, começando a se impacientar.
Vinte minutos depois, Vanessa surgiu à soleira do banheiro.
- Estou pronta - avisou.
Mark voltou-se e prendeu a respiração. Nem sua prodigiosa imaginação o preparara para o que viu.
A malha preta, colada a Vanessa como uma segunda pele, realçava cada curva de forma quase obscena. Sem perceber o efeito devastador que sua presença provocara,
Vanessa caminhou na direção dele com naturalidade.
- E então, o que pretende? - Deteve-se diante dele e cruzou os braços, num gesto bem característico seu.
Mark pigarreou. Por um segundo, achou que a voz não fosse sair.
- Muito bem, princesa...
- Já disse para não me chamar assim - ela o relembrou, caminhando até a mesa e apanhando um cacho de uvas.
Onde aprendera a andar daquele jeito?, Mark se perguntou, irritado. Em uma escola para princesas?
Qualquer que fossem as lições que Vanessa houvesse tido em sua vida na realeza, ele estava prestes a ensinar algo novo. A existência era algo difícil. Em primeiro
lugar, precisava verificar seu preparo físico.
- Quantos abdominais consegue fazer?
- Nem imagino!
- Quanto tempo leva para correr um quilômetro?
O ar de surpresa respondeu a sua pergunta.
- Pelo que vejo, você não faz exercícios de rotina. Não tem um personal trainner, ou algo assim?
- Sou muito ocupada para esse tipo de coisa!
- Deixe-me dizer uma coisa, Vanessa: o castelo de cristal de Cinderela pode se quebrar em mil pedaços no mundo real. E você não está preparada para isso. Agora,
sente-se e coloque o cotovelo sobre a mesa.
- Não sabe que é falta de educação colocar o cotovelo sobre a mesa? - Dizendo isso, sentou-se, contrariada.
- Não estamos falando de regras de etiqueta, princesa. - Resmungando, Mark se sentou diante dela e colocou um cotovelo na mesa. - Agora, segure minha mão e
tente puxar meu braço para baixo, até encostar no tampo.
- E por que eu faria isso?
- Preciso sentir se você é forte.
- E por que teria de ser? Achei que só você tivesse de ser.
- Posso precisar de seu auxílio para me dar retaguarda. - Encarou-a, mal-humorado.
- Oh, entendo... - Piscou e o fitou, séria.
Enquanto os olhos azuis se perdiam em seus seios, abaixou o braço musculoso sem o menor esforço, antes que Mark percebesse.
Recobrando-se depressa, Mark reagiu e baixou o braço dela num segundo.
- Está bem, acho que é vigorosa o bastante - disse, evitando o brilho divertido nas pupilas dela. - Venha, vou ensinar-lhe o próximo movimento.
Mark se colocou a suas costas, envolvendo-a com os braços.
- Vou lhe mostrar como deve se defender, caso seja atacada... - informou.
Uma miríade de arrepios percorreu uma trilha proibida, espalhando-se por toda sua epiderme. O protocolo real proibia uma princesa de estar tão perto de alguém
que não fizesse parte da nobreza, ou de qualquer outro homem que não tivesse a linhagem aprovada por seu pai. Porém, ter Mark daquele jeito, tão íntimo, despertou
uma emoção incompreensível, que a fez se lembrar de uma cena de infância.
Quando tinha três ou quatro anos, freqüentava uma escola particular na capital de seu país, Saint Kristoff, e teve uma experiência que jamais esqueceu.
Ficava isolada no pátio, vigiada pela babá, enquanto as outras crianças brincavam no gramado. Invejava as risadas felizes e a liberdade de seus colegas, e
daria tudo para se juntar a eles. Certa ocasião, aproveitou um momento de distração da babá e saiu correndo, mas tropeçou e caiu no gramado, e se pôs a chorar de
vergonha e humilhação.
Mais tarde, o rei ficou sabendo e a chamou. Lembrava-se da imagem de desapontamento ao repreendê-la, dizendo que a uma princesa não era permitido chorar, nem
exteriorizar sentimentos e emoções.
Tentara, durante anos, fazer algo que o agradasse, sem nunca conseguir. Jamais ouvira um elogio sequer do pai. A Verdade era que, em seu coração, sentia-se
como uma menina solitária e infeliz. Entretanto, naquele momento, com 0s braços de Mark ao redor de sua cintura, de nada valia o rígido auto controle para reprimir-se.
Sentia-se viva pela primeira vez em anos!
Sem saber das lembranças que a distraíam, ele continuava dando ordens em tom grave.
- Há muitas maneiras de responder a um ataque. Você pode pisar no pé de seu agressor, ou se abaixar com rapidez e correr, ou ainda dar um golpe com o joelho
em algum ponto sensível. Entendeu?
- Sim...
Vanessa entendia, mas o funcionamento de seu cérebro estava paralisado pelo efeito devastador do corpo viril pressionado contra o seu.
Enquanto ela se debatia, presa pelos braços fortes, Mark girou-a com facilidade, colocando-a de frente para si. Perplexa com a força e a agilidade dele, Vanessa
permaneceu imóvel, e Mark informou o próximo movimento.
- A maioria dos ataques a mulheres acontece frontalmente. Alguém pode se chocar contra você, ou mesmo esbarrar. Para se proteger, coloque seu braço assim.
- Ilustrou, pondo o braço dobrado à frente do tórax. - Agora, coloque as mãos em minha garganta e tente me imobilizar.
Ao vê-la hesitar, incentivou:
- Lembre-se de como ficou com raiva de mim quando chamei seus planos de idéias malucas...
Assentindo, Vanessa se aproximou. A pele quente sob seus dedos e a respiração pesada a desconcentraram.
- A resposta adequada para ataques assim é empurrar seu agressor para longe. - Mark fez a demonstração com força o bastante para não machucá-la, mas com a
firmeza necessária para mostrar como um movimento vigoroso poderia causar surpresa e pânico. - Acha que pode fazer isso?
- Sim.
Vanessa estava quente com o contato corporal, e gotículas de suor cobriam-lhe a testa. Uma princesa era proibida de transpirar, até mesmo sob um sol de quarenta
graus. A excitação que a invadiu revelou a química que acontecia entre eles, dessas que só acontecem entre um homem e uma mulher. Era sexual, intensa.
Não tinha idéia do que Mark estava falando. Ficara atordoada com a poderosa masculinidade que exalava de todos os poros dele.
- Algumas vezes, princesa... - Com um movimento rápido, Mark a rodopiou, colocando-a frente a frente, com o sorriso mais sensual da face da terra. - ...seu
agressor pode usar uma aproximação perigosa. Está preparada para isso?
Antes que pudesse ponderar a respeito, a boca de Vanessa foi capturada pela dele.


CAPÍTULO III

Vanessa foi feita cativa, não pela força dos braços de Mark, mas pela intensidade da paixão. Correspondeu ao beijo com uma voracidade que surpreendeu a ambos.
Os lábios sensuais uniram-se aos seus com avidez, tirando sua respiração e qualquer possibilidade de raciocinar.
O fino tecido da roupa não permitia nenhuma proteção contra o calor do corpo másculo. Mãos ágeis deslizavam por suas costas, fazendo-a queimar na febre do
desejo.
Mark afastou as pernas e encaixou-a junto de si. A ação intensificou a intimidade do abraço. Mergulhando os dedos nos cabelos dourados, inalou o perfume suave
e feminino, enquanto sua língua explorava a doce umidade da boca macia.
Junto dele, Vanessa se transformara de uma garota ingênua em uma mulher ardente. Sua feminilidade desabrochava com uma naturalidade que jamais experimentara.
Estava pronta para a carga de volúpia quase selvagem que brotava dos recantos mais secretos de sua intimidade. Arqueou a coluna para aumentar o contato, rendendo-se
à força de seus instintos.
E então, tudo acabou.
Mark a soltou de repente, fazendo-a perder o equilíbrio. Sentia-se nua sem aqueles braços musculosos a seu redor.
- Você não devia ter correspondido ao beijo! - recriminou-a, ofegante. - O certo era ter usado as técnicas de autodefesa que acabei de lhe ensinar!
Na mesma hora, a lascívia se dissolveu num mar de humilhação. Corando até a raiz dos cabelos, Vanessa teve a impressão de que o chão sumia de sob seus pés.
Reagiu sem pensar. Num movimento rápido, segurou-o pelo braço e o girou por sobre o ombro, deixando que a gravidade fizesse o resto. Um segundo depois, Mark
a encarava, surpreso, estatelado no carpete.
Naquele preciso momento, Celeste abriu a porta da suíte e entrou com o dr. Rosenthal.
- Já ouvi dizer que é preciso se curvar à realeza, mas nunca imaginei que fosse obrigatório se chegar a tanto! - o simpático médico comentou com bom-humor,
enquanto Mark se erguia, constrangido.
- O capitão estava me mostrando alguns movimentos de defesa pessoal. -Vanessa se adiantou e estendeu a mão, para que Rosenthal a beijasse. A seguir, virou-se
para a dama de companhia: - Obrigada, Celeste. Pode sair.
- Não ensinei esse movimento... - Mark resmungou, limpando alguns fios do carpete grudados na camiseta.
- Aprendi com Golda, campeã olímpica por cinco anos consecutivos. Agora ela ministra técnicas desse tipo em Volzemburg e costuma freqüentar o palácio.
- Devia ter me avisado.
- Você não me perguntou! - Vanessa ergueu os ombros num movimento gracioso.
O dr. Rosenthal olhava de um para o outro, com um sorriso discreto. Não precisava ser psicólogo para entender o que estava acontecendo entre aqueles dois.
- Crianças, parem de brigar! - advertiu-os, com ares de professor. - Por mais fascinante que seja estar aqui, tenho pacientes esperando por mim no consultório.
O médico se parecia mais com John Wayne do que com George Clooney, Vanessa concluiu, depois de uma breve avaliação. A face enrugada e os olhos castanhos, gentis
e afetuosos, fizeram com que gostasse dele no instante em que o viu.
- Está enrubescida, princesa Vanessa. Receio que esteja com febre.
- Febre cerebral - Mark grunhiu, recebendo um olhar furioso dela.
O médico abriu a maleta de couro e apanhou o estetoscópio.
- Não sei o que Mark lhe disse... - Vanessa começava a ser examinada.
- Relaxe, Alteza. O doutor não vai retirar muito sangue - Mark zombou, sentando-se no sofá.
- Não retirarei sangue algum. Vocês dois acabarão fazendo isso, pelo que vejo.
- Desculpe-me, dr. Rosenthal. Foi muita bondade sua ter vindo. Sei que precisou se afastar de seus pacientes para me atender.
- Ele me deve um favor - Mark se apressou em afirmar, antes que o médico pudesse se pronunciar.
- Importa-se de esperar lá fora? - O dr. Rosenthal o fitava por sobre os óculos.
Mark tornou a resmungar e entrou no banheiro.
- Mark me falou que não há nada de errado com você, mas tenho de examiná-la. Respire fundo e segure o ar por alguns segundos.
- Conhece Mark há muito tempo? - Vanessa indagou depois de soltar a respiração.
- O bastante - O médico colocou uma espátula em sua garganta. - Desde quando conhece-o, Alteza?
- Mark é irmão de Joe, que é casado com minha melhor amiga, Prudence. - Vanessa sentiu grande alívio quando ele retirou a espátula.
- Ah, Joe! - O dr. Rosenthal passou a verificar a pressão arterial. - O galã da família Wilder.
- E Mark? O que é?
- O vaidoso! - O doutor sorriu, meneando a cabeça.
- É mesmo? Por quê?
- Você não tem de voltar logo, doutor? - Mark enfiou a cabeça pelo vão da porta do banheiro, incomodado com a direção que a conversa tomava.
- Ele terá de ligar para meu pai antes de sair - Vanessa o relembrou. - E agora, volte lá para dentro!
A princesa teve vontade de rir ao vê-lo obedecer, não sem antes resmungar.
- Você tem dormido bem?
- Quatro, talvez cinco horas por noite, se tiver sorte...
- Hum... E seu apetite?
- Mark comeu todo meu café da manhã! - provocou, sabendo que ele podia ouvir, de onde estava.
- Ei, havia o suficiente para alimentar uma família de cinco pessoas! - ele se defendeu, gritando por trás da porta. - E ela mal tocou no suco de laranja.
- Tudo indica que está com sintomas de stress, princesa. Acho que terá de interromper as atividades por certo período.
Vanessa lançou um olhar de triunfo para Mark, que acabara de entrar na sala.
Ele experimentou uma pontada de remorso. O médico fazia parte do plano. Abraham Rosenthal não fizera nenhuma pergunta ao ser informado sobre a missão, na base
da Marinha onde prestava serviço.
- Devo ligar para seu pai daqui?
- Sim, será melhor. O que você acha, Mark?
Era a primeira vez que consultava sua opinião, e Mark se indagou se ela se importava mesmo. Era ridículo sentir-se mal, como se o que Vanessa pudesse pensar
a seu respeito fizesse alguma diferença.
Vanessa estava acostumada a dar ordens tanto quanto ele. Não era uma mulher que se submetia à vontade dos outros. Era uma princesa, afinal de contas, e não
o tipo de garota vazia e sem classe com que estava acostumado.
Nunca amara mulher alguma. Se algum dia se casasse, seria com uma moça que respeitasse sua carreira como oficial. Muitas se impressionavam com o uniforme,
mas não sabiam como podia ser duro aquele estilo de vida.
Seu irmão mais velho, Justin, era um exemplo. Casou-se com uma adorável jovem logo que entrou para a Marinha e se divorciou depois de menos de um ano.
Joe se casara com a filha de um oficial, que, por isso, já sabia o que a aguardava. Mark queria provar a seu pai que era capaz de chegar ao escalão mais alto,
e a companheira certa teria de ajudá-lo, sendo reservada e pouco exigente. Tudo o que uma princesa jamais poderia ser.
Então, por que se alegrara tanto com o fato de ela ter pedido seu parecer? Para piorar tudo, Vanessa beijava como ninguém! Onde uma princesa teria aprendido
a beijar daquela forma?
- Mark? Você não respondeu ao que perguntei. Acha melhor que o doutor ligue daqui?
- Afirmativo - disse, com a entonação mais impessoal que conseguiu.
- Ótimo. Lembre-se de que não quero falar com papai. Desejo apenas que ele fique convencido da necessidade do repouso, e de que levarei alguns dias para voltar
para casa.

- E então? - Vanessa indagou, nervosa, quando o médico desligou o telefone, depois da chamada.
- Divirta-se, minha cara. - O dr. Rosenthal sorriu com simpatia. - Você ouviu quando falei ao rei que está com laringite e sinusite infecciosa, e que precisaria
de uma semana para se recuperar. Ele concordou, e pediu que eu cuidasse de você.
- Obrigada! - Vanessa ignorou o protocolo e o abraçou.
- Falou, também, que se não voltar em uma semana irá enviar uma equipe de médicos e virá buscá-la pessoalmente. Pediu que eu lhe enviasse um relatório amanhã.
- Isso lhe trará problemas?
- Não, desde que Mark me mantenha informado sobre sua saúde.
- Pode ter certeza de que farei com que ela descanse. - Mark lançou um olhar cúmplice para o médico.
- Cavalheiros, o objetivo desta pequena representação é me dar chance de ter algum tempo livre! Não preciso de repouso.
- Trate de fazer os dois! - foi a ordem do dr. Rosenthal, antes de sair.

- Você precisa de roupas... diferentes - foram as primeiras palavras de Mark, depois que o médico partiu. - Tem de usar algo mais comum, para que ninguém a
reconheça. Não tem algo como calças jeans e camisetas?
- Não, mas posso ir até a butique do hotel e...
- Peça para Celeste comprar algo.
- Boa idéia. Eu já havia pensado nisso.
- É mesmo? - Mark franziu o cenho, em sinal de dúvida. - Bem, se você diz...
- Uma Von Volzemburg nunca mente! - Vanessa retrucou, ofendida com a insinuação irônica.
- E pensar que estou ouvindo isso de quem acabou de enganar o próprio pai!
- Como eu dizia, uma Von Volzemburg nunca mente, a menos que seja imprescindível para conseguir a liberdade. Em 1456, o rei Frederick colocou uma placa no
castelo dizendo que estava infectado pela peste negra. Isso manteve as forças inimigas distantes, e o castelo sobreviveu.
- Bem, você não vai sobreviver às ruas de Nova York usando o mesmo recurso.

Meia hora mais tarde, Mark a fitava, incrédulo.
- Achei que tivesse entendido o que significa não chamar a atenção. Esse jeans está muito apertado, todos os homens acima de dezesseis anos vão olhá-la!
Vanessa voltou a cabeça para ver seu reflexo no espelho. De fato, estava um pouco justo. Não habituada ao estilo americano, achou que fosse comum as moças
se vestirem daquela forma.
Dirigiu-se ao closet e passou os olhos pelos cabides. A pantalona Valentino, de seda preta, era o traje mais convencional que encontrara. Sem muita opção,
escolheu uma blusa acinzentada de seda da mesma coleção e foi para o banheiro se trocar. Ao abrir a porta, Mark a encarou com o copo d'água que tomava parado no
ar.
- Por que pendura uma placa no pescoço dizendo "sou uma rica princesa e adoraria ser seqüestrada"?! - vociferou, colocando o copo na mesa com tal violência
que derramou a água.
- O que propõe, afinal? Quer que eu coloque um bigode postiço? Quem sabe se usasse uma fantasia de Charles Chaplin...
- Não precisa ser tão drástica. Basta que pareça menos... menos... sensual!
- O que disse? - Vanessa o encarou, espantada.
- Ouviu muito bem.- Irritado, Mark caminhou até a janela. - Tente não fazer o mundo todo olhar para você.
- Esta roupa foi assinada por Valentino! É clássica, discreta e...
- Não me importa que tenha sido assinada pelo Papa. Acontece que você fica muito... - Fez um gesto vago com a mão. - Ora, esqueça. Creio que tenho algo que
poderá servir.
Mark vasculhou a mochila e retirou uma calça de moletom e uma camiseta branca, onde se lia "I Love N. Y.".
- Estão limpas. - Estendeu-as na direção de Vanessa, sem perguntar se concordava.
- São enormes! Ficarei parecendo uma maltrapilha!
- Princesa, você não está indo para um desfile de modas. Nosso objetivo é sair daqui sem que seja notada.
- E não acha que causaria espanto a todos que alguém aparecesse no saguão do hotel vestido deste jeito?
Ponto para ela! Contrariado, Mark teve de admitir que tinha razão. A verdade era que não conseguia raciocinar desde que a vira usando aquele jeans.
- Certo. Optemos então pela calça e a camiseta.
- Mas você disse que estava muito apertada!
- Sim. E? - Ergueu o queixo, incentivando-a a prosseguir.
- Quer dizer que estou muito gorda!
Mark fitou o teto.
- Negativo. Quer dizer que fica muito atraente.
- Não foi o que entendi.
- Ouça, não ficarei aqui discutindo com você. Vista-se logo, e coloque este boné.
- Yankees? - ela reconheceu o símbolo bordado no brim. - Gosta de basquete?
- Claro, como todo americano. Suponho que você prefira críquete ou pólo, certo?
- Para ser franca, adoro basquete, mas a NBA não tem sido a mesma sem Michael Jordan.
Vanessa ainda teve o prazer de ver a expressão atônita de Mark antes de fechar a porta do banheiro.

Vanessa fez o melhor que pôde para parecer uma garota comum. Retirou todas as jóias valiosas e, como se sentia nua sem nada ao redor do pescoço, pôs uma fina
corrente de ouro com uma medalha de São Cristóvão, que sua mãe lhe dera quando ainda era criança.
Ao observar seu reflexo no espelho, mal pôde se reconhecer. Estava certa de que Anton, seu guarda de segurança, também não a reconheceria.
Aplicou um leve brilho nos lábios, optando por não usar maquiagem, escovou os cabelos e saiu.
- Estou pronta, e já vou avisando que não me trocarei de novo - afirmou ao abrir a porta do banheiro.
- Ótimo! - Mark avaliou-a com aprovação.
A camiseta, alguns números maior que o dela, escondia as curvas tentadoras do quadril e disfarçava a saliência voluptuosa do busto,
- Você disse que queria ir a um fast-food, certo? Que tal se fôssemos comer hambúrguer?
- Não posso sair assim, sem uma bolsa sequer! Quero muito passar a noite fora, e para isso tenho de...
- Não se preocupe, princesa, eu já tinha pensado nisso. Coloquei algumas peças suas em minha mochila.
- Mexeu nas minhas coisas?! - Pôs as mãos na cintura.
- Calma, peguei apenas o que achei necessário.
- Deixe-me ver.
Mark abriu o zíper da mochila e mostrou seu conteúdo. Colocara dois conjuntos de lingerie, rosa e bege, peças minúsculas que mal ocupavam espaço, e duas blusas
de seda.
- Preciso de mais alguns itens. - E caminhou para o closet.
- Você pode lavar uma pecinha ou outra, ou suas mãos são delicadas demais para isso? - Mark a provocou ao vê-la desaparecer dentro do closet.
Vanessa hesitou, ainda perturbada pelo fato de Mark ter tocado em sua lingerie. Por fim, apanhou algumas peças ao acaso, decidindo que não conseguiria se concentrar
na escolha do que era adequado.
Poderia adquirir algo mais quando saísse com o dinheiro americano que carregava.
- Está pronta, princesa?
- Sim, capitão. - Animada, pôs na mochila o que apanhara. - E você?
- Um fuzileiro naval sempre está pronto para o que der e vier!
Embora a voz de Mark soasse firme e altiva, no fundo sabia que aquela missão seria muito mais complicada do que imaginara.


CAPÍTULO IV

- E agora? Tem algum plano para sairmos? - Vanessa mal podia conter a excitação.
- Claro que tenho - Mark comentou, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. - Enquanto você se vestia, combinei com Celeste que pedisse seu almoço. Quando
o serviço de quarto chegar, Anton desviará a atenção do garçom. Será nossa chance de sairmos pela escada de incêndio.
- Ótima idéia! Por sorte, as refeições são preparadas pelo cozinheiro-chefe da comitiva real, e apenas o garçom oficial tem acesso a minha suíte. Anton e Karl
são amigos, sempre conversam por alguns minutos quando ele traz as refeições.
- Quer dizer que você não come o mesmo que os outros hóspedes? - Mark a encarou, espantado.
- É o protocolo. Não posso correr o risco de ser envenenada, ou algo desse tipo.
Céus, aquela mulher vivia num universo diametralmente oposto, Mark concluiu, e encostou o ouvido na porta.
- Psiu... - sussurrou com a mão suspensa no ar. - Ouvi alguma coisa.
Girou a maçaneta, com cautela, e observou que Anton estava sentado de forma que podia vigiar ambos os lados do corredor. O elevador se abriu, e Karl surgiu,
empurrando um carrinho com diversas travessas de prata.
Anton o saudou, levantando-se para ajudá-lo e dando as costas para a porta da suíte.
- Agora, venha!
Mark colou-se à parede, segurando-a pela mão. Com movimentos ágeis como os de uma pantera, esgueirou-se com uma rapidez fantástica até a escada de incêndio.
Rezando para que ninguém ouvisse as batidas de seu coração, Vanessa o seguiu com a respiração suspensa. A poderosa carga de adrenalina que corria por suas
veias provocavam uma sensação nova, nunca antes experimentada. Estava conseguindo! Encontrava-se a poucos passos da liberdade! A aventura estava apenas começando!
Nunca uma escadaria lhe parecera tão longa...
Por fim, chegaram às portas do elevador de serviço. Vanessa tremia como uma criança. Liberdade! Mal podia esperar por aquilo!
Ao mirar o espelho acima do elevador, Mark prendeu a respiração e tomou-a nos braços.
- Há alguém nos observando. Temos que despistá-lo. Finja que está apaixonada por mim.
Vanessa ainda tentou argumentar que seria impossível ser reconhecida naquelas roupas ridículas, com um boné dos Yankees cobrindo seus olhos e uma camiseta
na altura dos joelhos, mas a boca de Mark cobriu a sua, silenciando suas palavras.
Curioso, pensou. Não notara a presença de ninguém... Porém, o pensamento se diluiu na volúpia do beijo, que se prolongou mais do que o suficiente para que
qualquer pessoa que estivesse por ali tivesse tempo de ir embora. Em seguida, Mark afastou-a, com certa rispidez.
- Está tudo bem agora. Venha, temos de ser rápidos.
Vanessa titubeou, perturbada. Irritava-se com aquela habilidade dele em beijá-la com um ardor fantástico e, no momento seguinte, afastá-la como se tivesse
uma doença contagiosa. Quem pensava ser para tratá-la daquela forma?
Antes que pudesse reclamar, Mark colocou os dedos sobre seus lábios e a puxou para mais perto.
- Não diga nada. Existem muitas câmeras escondidas. Mantenha a cabeça baixa e siga-me.
Mark afundou ainda mais o boné dela, quase encobrindo a face adorável, e passou o braço ao redor dos ombros delicados, demonstrando que estava no controle
absoluto da situação. Abriu a porta de incêndio e a conduziu para o saguão. Atravessaram-na e ganharam a rua, virando à direita em direção ao Central Park.
Vanessa respirou fundo, enchendo os pulmões. O ar poluído e pesado lhe pareceu o mais maravilhoso do mundo. Seu peito parecia querer explodir de felicidade,
seus olhos engoliam a paisagem com uma voracidade quase selvagem.
Pararam diante de uma lanchonete, alguns blocos à frente.
Embora Vanessa estivesse exultando de alegria, não esquecera o aborrecimento. Ao menos, até entrar na lanchonete e inalar o delicioso aroma de batata frita.
Fascinada, deteve-se no caixa, indecisa sobre o que escolher. Lia os cartazes com a ilustração dos pratos, lamentando não ter apetite suficiente para pedir
todos.
- Quero uma porção dupla de batatas fritas e... e...
- Mais alguma coisa? - A adolescente do caixa a apressava.
- Não sei o que pedir. Quero... - Vanessa hesitou diante das inúmeras opções.
Galinha, hambúrguer, costeletas, peixe, salada. Não, tudo menos salada.
- Número quatro, por favor - Mark decidiu por ela.
- Espere, acho que prefiro galinha - Vanessa ainda tentou argumentar ao ver que ele escolhera hambúrguer duplo com batatas fritas e um refrigerante grande.
- Há uma fila atrás de você - ele disse, por entre os dentes, apanhando o troco.
Mark apanhou a bandeja com o lanche e saiu à procura de uma mesa vazia.
Ignorando o péssimo estado de espírito de seu segurança, Vanessa levou uma generosa porção de batatas à boca e cerrou as pálpebras, como se tivesse provando
o mais fino manjar da face da terra.
Mark a observava com uma idéia martelando na cabeça: será que faria amor com a mesma entrega?
- Escute, precisamos deixar algumas coisas claras - falou, tentando afastar as imagens perturbadoras.
- De acordo. - Vanessa mordeu com vontade o hambúrguer. - Em primeiro lugar, é muito indelicado fazer meu pedido sem me consultar.
- Preferia ser linchada pela fila monumental que se formou atrás de você? Parece que nunca esteve numa lanchonete antes!
- Não estive mesmo. Por isso quis vir.
Deslizando o olhar para a boca sensual, Mark provocou-a:
- Você não pode segurar a fila daquele jeito. Faz com que se pareça ridícula!
O sorriso adorável desapareceu diante daquela acusação. Não que ficasse ofendida por ser classificada como ridícula, mas ninguém nunca ousara falar com ela
daquela maneira. Mesmo na escola, sempre fora tratada com deferência e respeito, até quando tomava alguma advertência da diretora.
Vanessa colocou o sanduíche no prato, sentindo o apetite desaparecer.
- Termine de comer. - Mark ficou preocupado com a súbita mudança de humor.
- De fato, temos de pôr algumas cartas na mesa. - Vanessa endireitou-se no assento. - Você é apenas meu guarda-costas, não tem o direito de me dar ordens.
Se eu não quiser comer mais, é problema meu. Se demorar a escolher, ou se parecer encantada com este lugar, problema meu! Isso não me faz ser ridícula. Você poderia
ser um pouco mais gentil. Não preciso que fique dirigindo minhas atitudes. Por sinal, quero acrescentar que são contraditórias.
Naquele momento, Vanessa abriu as comportas e deixou extravasar toda a irritação que ele provocara:
- Pela manhã, me censurou por corresponder ao beijo e, agora há pouco, pediu que fingisse estar apaixonada! Sugiro que se decida, antes de me tomar alguma
atitude.
- Beijei você porque havia alguém olhando para nós!
Vanessa apertou os dentes. Mark estava dizendo que a beijara por obrigação! Como imaginava que se sentia, diante daquele insulto? Furiosa, era como se sentia!
- Sei que não me beijou porque quis, não precisa repetir. Quanto a mim, correspondi na primeira vez por curiosidade, e na segunda porque, conforme você disse,
havia alguém nos observando. Espero que não precise de uma terceira. Em Volzemburg há um velho ditado: "A terceira vez é dos tolos". E agora, se não vai comer, vamos
embora. Há gente esperando para se sentar, e não quero fazer papel de ridícula por obrigar os outros a esperar.
"Não, senhor, isso não será fácil!", Mark decidiu, ajeitando a mochila sobre os ombros. Nunca tivera problemas com mulheres. Talvez não fosse amável e cavalheiro
como seu irmão mais novo, Joe, mas fazia sucesso com o sexo oposto. Porém, Vanessa o desconcertava.
Relutante, teve de admitir ela estava com a razão. O beijo no elevador não fazia parte da estratégia de fuga. Mas como resistir àquela boca sensual e ao brilho
encantador daqueles olhos verdes?

Vanessa odiava sua aparência. Depois do lanche, o cós da calça ficara ainda mais apertado, fazendo-a se sentir gorda e desajeitada, e aquele boné atrapalhava
a visão. A salvação estava do outro lado da rua: uma loja de departamentos!
- Ei, aonde vai? - Mark perguntou, vendo-a fazer menção de atravessar a rua.
- Comprar algumas roupas.
- Agora?!
O desgosto estampado no rosto másculo a teria feito rir se não estivesse zangada com ele.
- Espere! - Mark segurou-a pelo braço. - Temos de atravessar na faixa de pedestres. Não queremos que você leve uma multa.
- Lógico que não. - Vanessa fitou de soslaio o policial parado na esquina.
- Certo, vamos planejar as compras.
Os dois se uniram a um grupo de pessoas que esperava para atravessar.
- Não quero ouvir mais nenhum de seus planos, Mark. Pretendo apenas fazer compras e me divertir. - E saiu, quase correndo, para chegar ao estabelecimento,
quando o semáforo abriu.
Resignado, teve de se apressar para segui-la. Esperava uma atitude mais comedida por parte dela, e não aquela manifestação tola de deslumbramento. Quando fechou
os olhos, saboreando a batata frita, parecia estar em êxtase!
- Podemos ir? - Mark apoiou-se na prateleira repleta de camisetas.
- Mas acabei de chegar!
- Engraçado, parece que estamos aqui há séculos.
- Presumo que oficiais da Marinha têm medo de ir às compras... - disse Vanessa, estendendo sobre si uma camiseta verde-clara.
- Não faz parte de meu treinamento.
- Que pena! Acho que você também pode aprender algumas coisas comigo.
Encarou-o com aquele sorriso adorável que provocava uma verdadeira revolução em seus hormônios.
- Preciso ir à sessão de roupas femininas. - Vanessa se afastava, e avisou-o por sobre o ombro, mas foi impedida pela mão forte em seu braço.
- Espere um pouco! Temos de ficar juntos. - Mark ergueu a infinidade de cabides que carregava. - Acha que vai precisar de mais?
- Você não tem irmãs, não é? Se tivesse, estaria mais acostumado ao ponto de vista feminino.
- Tenho muita experiência com mulheres - retorquiu, ofendido.
- É mesmo? Difícil de acreditar. Deve ser muito diferente de Joe, o galã da família.
- Todos os homens Wilder fazem sucesso com as garotas.
- E são modestos, também - acrescentou, com ironia, galgando os degraus da escada rolante. - Vamos subir. O departamento feminino é no segundo piso, e está
liquidando o estoque. Nunca estive em uma liquidação, estou ansiosa para ver como é.
Mark colocou os cabides em uma cesta e observou Vanessa caminhar por entre as centenas de araras repletas de peças. As íris verdes brilhavam com uma luz fluorescente,
refletindo o brilho dourado dos cabelos. Mesmo vestida como uma delinqüente, andava com uma majestade que a tornava única.
Mark podia, sem esforço, imaginá-la ostentando uma coroa, com milhares de súditos a seus pés. Inclusive ele mesmo, refletiu, irritado pelas batidas descompassadas
do coração sempre que seus olhares se cruzavam.
- O que acha? - ouviu-a chamar, segurando à frente do corpo um gracioso vestido florido, uma peça minúscula que deixaria as pernas à mostra. - Combina comigo?
- Qualquer coisa fica bem você.
Vanessa arregalou os olhos, surpresa pela resposta. Mark também se surpreendera. O que pretendia, falando daquela forma?, censurou-se. Qualquer olhar, qualquer
gesto que fizesse pareciam repletos de insinuações inconscientes, como se seu cérebro, sempre tão prático pelos anos de treino, tivesse sido desligado.
- É melhor experimentá-lo. Há um provador no final da loja - ele informou.
- Achei que tinha dito que precisávamos ficar juntos, Mark - a princesa devolveu.
Certo! Mais um ponto para ela!
- Está bem, pague e vamos embora.
- É assim que as americanas fazem quando compram roupas?
- Se não servir, você pode vir trocá-lo.
- Creio que vou levar este também... - Vanessa apanhou um vestido azul-claro, de alças, abotoado nas costas.
Ao passarem por outro corredor, Vanessa deu um grito, excitada.
- Veja, ofertas de vestidos de algodão a preços inacreditáveis!
Ignorando o mau humor de Mark, Vanessa escolheu, com toda a calma, quatro vestidos e seguiu para a seção de calças.
- Ouça, a idéia é que eu me divirta fazendo compras como uma mulher comum faria. Você parece querer fazer disso uma experiência desagradável, resmungando o
tempo todo e seguindo cada passo que dou! - Fitou-o, exasperada.
- Pode parecer incrível, mas está tendo uma experiência idêntica à das mulheres comuns, cujos maridos também ficam mal-humorados quando têm de acompanhá-los
às compras!
- Aposto que a maioria deixa os maridos em casa! - contra-atacou.
- Bem, em seu caso, seria impossível. Esqueceu que sou seu guarda-costas?
- Então, pare de bufar e olhar para o relógio a cada segundo. Está tirando minha concentração!
Oh, essa era a mais pura verdade. Os bíceps salientes, os músculos vigorosos sob a camiseta colada no corpo, as pernas longas e fortes... Mark possuía o poder
de capturar sua atenção em qualquer circunstância!
Tentando afastar os pensamentos perturbadores, Vanessa se pôs a vasculhar os cabides. Queria algo novo, que tivesse seu próprio estilo, e não a aparência clássica
e aristocrática de uma princesa.
Iria descobrir como era escolher as próprias roupas e deixar emergir uma nova Vanessa, como uma borboleta que sai do casulo. Era como se sentia: presa em um
casulo de cristal, onde todos observavam suas mudanças.
Quando criança, os paparazzi acompanhavam cada passo de seu crescimento. Aquele tipo de exposição a tornara muito crítica e severa consigo mesma, e a fizera
sedimentar a idéia de que precisava da aprovação pública para se sentir segura.
Às vezes, achava que desapontara o pai desde que nascera. O rei queria um menino, e demonstrou desgosto quando soube da chegada de uma garota. As coisas pioraram
depois que sua mãe morreu num trágico acidente automobilístico.
Vanessa tinha pouco mais de dezesseis anos, na ocasião, e tornou-se vulnerável às criticas paternas, sem ter alguém que interviesse a seu favor, como a mãe
costumava fazer.
Mas estava em uma imensa loja de departamentos, em Nova York! Não era momento para ficar melancólica.
- Acabou?
De súbito, Mark passou a representar o homem dominador e autoritário que Vanessa bem conhecia por intermédio de seu pai. Estava farta de ter de obedecer e
agradar para não pagar o alto preço de se sentir infeliz e culpada.
- Não, ainda não. - E dirigiu-se para a sessão de lingeries, esperando que Mark ficasse incomodado em acompanhá-la.
No entanto, ele apanhou a cesta com as compras e seguiu atrás dela.
Olhando por cima do ombro, Vanessa achou graça ao notar que Mark parecia sem graça. Parou diante de uma sessão de sutiãs e apanhou uma peça minúscula, de uma
delicada renda rosa-champanhe.
Para sua surpresa, Mark ergueu uma sobrancelha.
- A cor é perfeita para você.
Dessa vez, foi Vanessa quem ficou constrangida. Mark a encarava com aqueles perturbadores olhos azuis, como se fossem dedos tocando sua pele.
Com a respiração presa na garganta, Vanessa rezou para que ele não ouvisse as batidas descompassadas de seu coração.
- Sapatos! - Foi a primeira coisa que lhe ocorreu para sair daquela situação. - Preciso de sandálias.
- Pelo que vejo, você pretende montar um guarda-roupa completo.
Vanessa encontrou o que queria, mas, ao experimentar a sandália de couro presa ao tornozelo com uma fivela, a calça apertada impediu que se abaixasse.
Ao ver seu esforço, Mark se abaixou sobre um joelho e segurou o pé delicado, num toque firme e gentil. Os dedos quentes contra seu tornozelo provocaram uma
cascata de arrepios que subiram pela coluna.
- Veja, mamãe, aquele homem está pedindo a moça em casamento! - uma garotinha exclamou, correndo para eles.
Ambos congelaram. Os olhares se encontraram, como se tivessem sido apanhados num flagrante obsceno, que revelava o desejo explosivo contido naquele gesto.
- Venha, querida. - A mãe pegou a garotinha no colo e voltou-se para os dois. - Sinto muito. Ela ficou encantada quando viu meu irmão de joelhos pedindo a
namorada em casamento, algumas semanas atrás!
- Está tudo bem, não se preocupe. Não é, Mark?
- Afirmativo. - Ele ergueu-se de um salto, aparentando uma calma que estava longe de sentir.
Enquanto seguiam para o caixa, uma voz monótona anunciou pelo alto-falante uma liquidação-relâmpago na seção de lingerie. No mesmo instante, surgiram centenas
de pessoas correndo na direção deles.
- Fique perto de mim - Mark ordenou ao perceber que seriam tragados pela multidão.
Fácil para ele dizer. A constituição atlética e as costas largas o protegiam, mas Vanessa, embora mais alta que a maioria das mulheres ao redor, foi empurrada
contra um manequim com um traje de noiva. Tentou sair, mas era como subir um rio nadando contra a correnteza. De uma hora para outra, o pânico tomou conta dela.
Nunca experimentara algo tão assustador.
Foi aí que as íris azuis destacaram-se em meio ao ajuntamento, e a segurança confortável dos braços de Mark a guiou através do caos. Depois do que lhe pareceu
uma eternidade, conseguiram sair da confusão.
- Odeio fazer compras! - Mark desabafou ao descerem pela escada rolante.
- Todas as lojas são assim? - quis saber, ainda assustada. - Em meu país, elas fecham para o público, quando preciso comprar algo.
Quando chegaram à rua, Mark não perdeu tempo para chamar um táxi.
- Aonde iremos agora?
- Desta vez, eu decidirei. - Em segundos, informou um endereço ao motorista. - Já tivemos muita excitação por um dia, não acha?
Vanessa concordou. Ser uma pessoa como as outras era mais complicado do que supusera.


CAPÍTULO V

- Onde estamos? - Vanessa quis saber ao ver o táxi parar numa rua tranqüila, em frente a um charmoso prédio de três andares.
- Em casa. - Mark a ajudou a descer do veículo.
Vanessa tentou ignorar o calor da mão envolvendo a sua, mas foi impossível. A cada toque que experimentava, aumentava a poderosa química entre eles. Aquela
experiência era nova e inesperada. Encontrara inúmeros homens durante suas viagens por todos os países do planeta, mas nenhum jamais exercera aquele efeito.
Sebastian, em especial, nunca lhe despertara nada além de um afeto fraterno. A princesa sentiu o estômago revirar ao pensar que teria de se casar com ele.
Procurara inúmeras vezes conversar com o pai sobre seus sentimentos, para que ele desistisse da idéia de vê-la casada com um homem que não amava. No entanto, suas
palavras eram jogadas ao vento. "Papai se importa apenas com o próprio umbigo!", pensou, revoltada.
Vanessa respirou fundo, bem devagar, lembrando-se de que estava livre dos domínios do rei, ao menos por um tempo. Mas os laços que a ligavam a ele eram fortes
demais. Por serem invisíveis, não a deixavam esquecer que uma princesa devia lealdade ao monarca e ao trono.
Como se tudo isso não bastasse, sentia-se mal por nunca conseguir sua aprovação, e o casamento com Sebastian iria agradá-lo, embora tivesse de pagar um preço
alto demais.
Não queria recordar os problemas, no entanto. Tinha desafios imediatos a vencer. Esperou que o táxi fosse embora antes de pedir mais informações:
- O que quer dizer com "casa"?
- Um amigo me emprestou este imóvel por alguns dias. Decidi que seria mais seguro estar aqui do que no hotel, onde alguém poderia reconhecê-la. - Mark abriu
a porta de ferro da entrada. - O apartamento fica no terceiro andar.
Vanessa ficou sem fôlego depois de subir tantos degraus. Mark, ao contrário, nem sequer alterara o ritmo da respiração.
Quando ele enfiou a mão no bolso da calça, à procura da chave, Vanessa, sem querer, acompanhou o movimento e pousou o olhar na parte mais íntima de sua anatomia.
Desviou-o, porém, como se tivesse cometido um crime. Bastava um dia fora dos atributos de princesa para se tornar uma mulher vulgar, recriminou-se.
Ao entrar, focalizou a atenção na decoração do apartamento, tentando não esquecer-se da beleza de Mark. A sala de estar era pequena, com um sofá, uma mesa
de quatro lugares e um aparelho de televisão.
A cozinha se comunicava com a sala, e possuía um fogão, uma geladeira e alguns itens básicos. Ao final do corredor, o banheiro, que lhe pareceu menor que seu
closet na suíte do hotel.
Notou que havia apenas um quarto, com uma cama de casal coberta por uma colcha de patchwork, e virou-se, assustada, para Mark.
- Não se preocupe, Alteza. Dormirei no sofá - tranqüilizou-a, como se tivesse lido seu pensamento. - Sua reputação estará a salvo comigo, princesa.
- Tenho nome, preferia que o usasse!
- Vanessa... - ele destacou cada sílaba, para mexer com ela.
Embora fizesse muito calor, com o astro-rei brilhando sobre o telhado acima deles, Vanessa sentiu um arrepio gelado ao ouvi-lo pronunciar seu nome.
- Devo ligar para Celeste - avisou, antes que ficasse hipnotizada pelas íris azuis.
- Use meu celular e não fale muito. - Mark deu duas voltas na fechadura, para se certificar de que a porta ficara bem trancada.
- Por quê? Acredita que meu pai mandou grampear o telefone?
Mark já sabia que a resposta era afirmativa. O rei ficara sabendo do telefonema para Prudence, e por isso estava ali.
Sua lealdade à Marinha era inquestionável, e apenas seguia ordens, lembrou. Encontrava-se em uma missão igual a qualquer outra.
Desse modo, por que se sentia tão miserável diante dos maravilhosos olhos verdes, que o fitavam como se pudessem lhe confiar a vida?
A realidade era que Vanessa estava ali porque Prudence lhe garantira que podia confiar em um fuzileiro naval. E, como oficial, honra e lealdade eram os valores
máximos de seus princípios. Detestava-se por ter mentido, mas suas ordens eram claras. A princesa Vanessa não podia saber da verdade.
- Estamos na América, princesa. Essas coisas não acontecem aqui. Seu pai pode ser muito poderoso em seu país, mas seu poder não atravessa o continente - mentiu,
visto que o monarca tinha poder bastante para fazer com que se metesse naquela situação.
O oficial superior imediato de Mark deixara claro que o sucesso da operação seria bem recompensado, insinuando que conseguiria a promoção que almejava fazia
tempos.
- Se o telefone não está grampeado, por que devo usar seu celular? - Vanessa quis saber, curiosa.
- O telefone do apartamento está desconectado, e não quero que demore, porque as ligações de celulares são muito caras.
Anton, o segurança particular de Vanessa, poderia suspeitar se visse Celeste falando muito ao telefone, e Mark duvidava que fizesse parte da restrita equipe
selecionada para aquela missão.
- Está bem, não demorarei.
A inocência com que Vanessa acreditara na desculpa o fez sentir-se ainda pior. Bem, não era mentira que a linha do apartamento não estava funcionando, mas
ela não sabia que aquele imóvel pertencia à corporação da Marinha.
O rei Leopold queria que sua filha acreditasse que conseguira a desejada liberdade enquanto a mantinha sob sua vigilância. E ele era o encarregado disso. Um
espião, que agia em segredo enviando e-mails ao soberano com relatórios completos do dia-a-dia da princesa.
Não se tornara um oficial da Marinha americana para participar de subterfúgios de um rei!, pensou contrariado. Para ser honesto, não entendia a razão de tanto
cuidado. Vanessa não era uma garotinha mimada, como imaginara a princípio.
Aliás, seu trabalho seria muito mais simples se fosse apenas uma garota rica, fútil e vazia. Não se sentiria tão culpado, nesse caso. Mas não, tinha de ser
mais complicada!
Recordou o prazer ingênuo e ao mesmo tempo sensual de Vanessa ao se deliciar com as batatas fritas, deixando-o a ponto de cometer uma loucura.
Fora muito bem treinado para observar pequenos detalhes, mas alguns a respeito de Vanessa revelavam que existia mais do que conseguia enxergar. Não esperava
encontrar uma mulher tão sensual e encantadora.

Vanessa sentiu-se melhor ao experimentar as roupas novas e constatar que pareciam feitas sob medida. Apanhou a mochila de Mark, que ele jogara com displicência
sobre a cama. Ao se sentar, assustou-se com o movimento sob si e percebeu que se tratava de um colchão d'água. Excitada com a novidade, pulou sobre o leito feito
criança, dando gargalhadas à medida que era projetada para o alto.
Cansada da brincadeira, escolheu uma calça confortável e uma camiseta de malha fria, e calçou as sandálias novas.
- Ah! - exclamou, satisfeita, ao mirar seu reflexo no espelho.
Sem dúvida, sentia-se muito melhor!
Tudo de que precisava era um pouco mais de batatas fritas, e estaria no céu. Abriu a porta do quarto e respirou fundo, sentindo o estômago roncar.
- Pizza! - Suas pupilas se iluminaram ao entrar na sala e ver a embalagem sobre a mesa, ao lado de uma garrafa de vinho tinto.
- Está com fome? - Mark voltava da cozinha para apanhar pratos e talheres.
- Estou faminta!
- Não tinha idéia de que princesas tivessem um apetite tão bom! - brincou, sentando-se e colocando uma generosa fatia no prato dela.
- Hum... - Vanessa fechou os olhos, inalando o aroma delicioso da rica combinação de molho de tomate, manjericão e queijo.
- Não há pizza em seu país?
- Não como esta! - respondeu com a boca cheia, violando todas as regras de etiqueta.
- Meu Deus, jamais esperaria que uma princesa...
- Há muitas coisas que precisa aprender sobre princesas. - E levou outra porção à boca.
- Por que não me ensina?
- Você fala de um jeito que mais parece uma ordem, em vez de um pedido.
- Sou um oficial graduado da Marinha, estou acostumado a dar ordens.
- Deve também estar acostumado a ser obedecido...
- Sim. Há algo errado nisso?
- Só quando você não está na presença de seus subordinados. Será que é por isso que nunca se casou?
- O quê?! - Mark engasgou.
- Só pode ser! Você é mais velho que Joe, e ainda não se casou. Por quê?
- E daí? Você é da idade de Prudence e também não se casou. Por quê?
- Ainda não encontrei o homem certo. O casamento de uma princesa não é tão simples quanto parece.
- Nem o de um fuzileiro naval. O dever vem primeiro.
- Acredite, sei muito bem o que significa o dever. Mas ele não nos mantém quentes, à noite...
- Posso encontrar alguém para me manter quente à noite sem ter de me casar. - Mark esboçou um sorriso insinuante.
- Mas eu, não - Vanessa afirmou, desolada. - Jamais seria permitido.
- Entendo. Princesas devem se manter puras, certo?
- Não precisa soar tão sarcástico!
- Perdão, Alteza!
- Já falei para chamar de Vanessa! - Ergueu o garfo para apanhar o último pedaço de pizza.
Mark fez o mesmo. Acabaram por se encarar por alguns segundos, e ela aproveitou o momento de distração para puxar a última fatia para seu prato.
- Oh, não! - Ele levantou as mãos, num gesto dramático. - Perdi para uma competidora menor que eu!
- Não sou tão pequena assim. A imprensa costuma me chamar de Vanessa Vertical.
- Para mim, você parece perfeita.
Vanessa deteve o garfo no ar, em meio ao movimento.
- Pareço?
Ficaram em silêncio por alguns minutos. Uma verdadeira revolução acontecia na cabeça dela. Perfeita! Ninguém nunca lhe dissera aquilo antes. Aquela simples
palavra fez seu coração bater forte como os sinos da capela de Saint Kristoff.
- Você nunca havia estado em Nova York antes? - Mark decidiu falar a primeira coisa que lhe ocorreu, para evitar que a magia do momento a contagiasse.
- Sim, muitas vezes. Diga-me, quais são seus lugares favoritos?
Mark considerou a questão com cuidado. Já revelara mais do que pretendia, portanto, precisava manter a conversa num nível impessoal. Dizer quais seus locais
prediletos seria um movimento na direção certa.
- Gosto de museus de arte.
- É mesmo? Ora, nunca imaginei que...
- Por quê, há algo de errado nisso? - Ele a fitou, na defensiva.
- Não, é que...
- Acha que só porque sou fuzileiro não sei reconhecer um Van Gogh?
- Fiquei surpresa, é tudo.
- Também há um clube de strip-tease que visitei em uma ou duas ocasiões. E agora, está espantada?
- Sim, muito! - Vanessa falou com sinceridade. - Não achei que um homem com sua aparência precisasse pagar para ver mulheres nuas.
Mark ficou desconcertado. Não era, de modo algum, a resposta que esperava.
- Então, acha que tenho boa aparência?
- Pelo jeito, ganhou seu dia, não é, capitão? Olhe, a modéstia não lhe cai bem, sabia?
- Quem falou em modéstia? Perguntei se você acha que tenho boa aparência. Eu me considero lindo.
Vanessa gargalhou.
- Sem dúvida, princesa, fez com que eu vivesse um dia memorável! - Sorriu ao vê-la corar. - E para você, como está sendo se manter na pele de uma pessoa comum?
- Maravilhoso!
"Muito embora, perto de você, as emoções que afloram estejam longe de serem comuns, Mark..."
- Você já teve a impressão de que a vida é algo mais do que o que tem nas mãos? Às vezes, sinto que as melhores partes de mim, como criatividade e espontaneidade
para me expressar, estão sendo esquecidas em nome do dever e da lealdade.
- Nunca achei que tivesse problemas para se expressar - Mark retrucou, sorvendo um gole de vinho.
- Por isso quis tirar um tempo livre. As obrigações estavam matando minha alma!
Mark disse a si mesmo que Vanessa estava sendo melodramática. Como uma existência luxuosa e confortável poderia ser tão ruim?
- Milhões de garotas dariam tudo para estar em seu lugar - ele lembrou-a.
- Porque não sabem o quanto é terrível ter alguém para escolher as roupas que deve vestir, que tipo de música deve ouvir, que palavras deve dizer. Meu guarda-roupa
não representa o que sou, Mark, apenas é adequado para uma princesa.
Desolada, Vanessa pôs os talheres sobre o prato.
- O que pode haver de tão sensacional em ser princesa? - Olhou para ele com tristeza. - Costumo sair do palácio às sete horas da manhã. Meus afazeres se compõem
de três pontos básicos: reuniões oficiais, projetos de caridade e cerimônias de todos os tipos. Gosto mais do trabalho de caridade, mas não posso abandonar o protocolo
por nenhum momento. Não me é dado me envolver em nenhuma filantropia que o palácio considere controversa, como visitar vítimas de guerra em seus países.
- Às vezes, as guerras são necessárias. - Mark sensibilizou-se, ainda que a contragosto, pela melancolia no belo semblante.
- Acredito que discordamos nesse ponto.
- Bem, mas concordamos em muitos outros. Pizza, por exemplo. - Sorriu, tentando devolver-lhe o bom humor.
- E batata frita!
- Sim, batata frita. Prossiga, Vanessa. Estava me contando como é sua agenda.
Ela suspirou.
- Tudo o que faço é planejado com seis meses de antecedência. Nunca almoço sozinha. A tarde, descanso por alguns minutos e em seguida dou entrevistas ou visito
outros lugares. Após uma manhã e tarde repletas de eventos, tenho de comparecer a jantares beneficentes, por exemplo. Troco de roupa de três a quatro vezes por dia,
e Celeste é um elemento importante para me ajudar a fazer tudo direito.
- Nossa, você trabalha duro! - Mark meneava a cabeça.
- Em minhas viagens, muitas vezes vejo coisas de partir o coração. Estou muito interessada nos órfãos, venho tentando angariar fundos para instituições no
oeste da Europa. Vejo muitas crianças em condições deploráveis.
Uma das razões para que sua agenda estivesse tão lotada era que, em toda oportunidade que encontrava, Vanessa se empenhava em arrecadar fundos para crianças
carentes. Viajava pela Europa, América e Austrália numa campanha incansável para divulgar para o mundo a situação dramática daqueles pequenos.
- E o que faria se não precisasse ser princesa?
- Acho que não tenho escolha. Nasci assim e morrerei assim.
- É como ser oficial da Marinha. - Mark, dessa vez, deu-lhe um sorriso largo, estendendo-lhe a taça de vinho. - Depois de tudo o que contou, acho que está
precisando de uma bebida.
- Obrigada. - Vanessa apanhou a taça e foi para o sofá, sentando-se e tirando as sandálias. - Sabe, havia uma lei em meu país que condenava à masmorra qualquer
homem que visse os pés de uma princesa.
- Há quanto tempo isso aconteceu?
- Não se preocupe, a tal lei foi extinta em 1890. Além disso, não é a primeira vez que você vê meus pés - relembrou-o, divertida com o espanto dele.
- Deus, que alívio!
Mark sentou-se ao lado dela e pegou o controle remoto, percorrendo rápido os canais.
- Mark, volte ao canal anterior! - Vanessa gritou, segurando o braço dele. - Veja, é a loja a que fomos hoje à tarde!
O sangue de Vanessa gelou em suas veias. Teriam sido descobertos?


CAPÍTULO VI

Vanessa não percebeu o quanto tremia ao segurar o braço de Mark. Sabia apenas que precisava de algo sólido para não sentir que estava afundando.
- ...liquidação de lingeries do grande magazine, que provocou tumulto e terminou com a intervenção da polícia - a repórter dizia, enquanto mostrava cenas da
confusão no vídeo.
E, no meio daquilo tudo, lá estava ela! Ora, não era bem a princesa. O boné dos Yankees cobria suas feições, mas era possível ver Mark, empurrando-a para fora.
- Aquele casal parece ter sido apanhado de surpresa em meio à confusão - a repórter comentou, mostrando a imagem deles em zoom.
- Afirmativo, moça. - Mark lembrou-se da adrenalina em suas veias quando perdeu Vanessa de vista. Não vivia aquela sensação desde que atracara o navio em meio
à guerra do golfo Pérsico.
- Por favor, não mostre nossos rostos! - Vanessa murmurava, cravando as unhas no braço dele.
- Princesa, relaxe - pediu Mark, sem também conseguir fazê-lo.
Sempre usava o bom humor como defesa contra o medo, mas Vanessa não demonstrava apreciar aquele estilo. Endireitou a coluna e retirou a mão do braço musculoso,
fazendo-o sentir falta do calor dos dedos suaves contra sua pele.
- Estou relaxada. - A voz parecia calma, mas só ela sabia o que lhe ia no íntimo.
- Veja, estão mostrando outra reportagem. - Mark apontava para o monitor. - Ninguém conseguiria nos identificar com apenas um zoom sobre nossas cabeças. Quem
sabe, daqui para a frente, você passe a ouvir meus conselhos. Eu disse que não queria fazer compras.
Vanessa teria relaxado, se Mark não tivesse feito o último comentário.
- Você deveria saber que havia uma câmera lá. Esse é seu trabalho.
Mark a encarou, furioso, mas o que mais o irritava era saber que devia mesmo ter pensado naquilo.
- Certo, pode me mandar para a masmorra.
- Mark, se este serviço é tão insuportável, por que o aceitou?
- Porque Prudence me pediu. - Manteve o rosto impassível, mas sentiu o sangue congelar.
Ela suspeitaria de algo?
O rei Leopold Von Volzemburg também suspeitara de sua estada em Nova York, e mandara grampear o telefone do hotel. Estava um passo à frente da filha rebelde.
Mas Vanessa não podia supor que, para viver alguns dias de liberdade, acabara envolvendo membros do alto escalão do governo americano e do Departamento de Estado.
Permaneceu em silêncio, receando dizer alguma coisa que levantasse mais suspeitas.

- Ainda acho que poderíamos ter assistido ao final do jogo dos Lakers. O primeiro tempo de uma partida de basquete não tem graça - Vanessa comentava, quatro
horas mais tarde.
- Pronto, pode ficar com o controle remoto.
Mark entregou-o como uma oferta de paz, depois de passar as últimas horas indo de lá para cá pelos diversos canais.
- Vejamos se está passando algo interessante... Ah, Chocolate! Um de meus favoritos!
- Está com fome?!
- Não, refiro-me ao filme. - Indicou o vídeo. - Você já viu, Mark? Juliette Binoche está fantástica.
- Ela é linda.
Será que aquilo significava que Mark preferia as morenas? Vanessa experimentou uma pontada de ciúme, antes de se envolver com a história de uma mulher que
chegava a uma nova cidade e sucumbia à tentação do chocolate.
- Esse chocolate todo não deixa você enjoada? - Mark indagou, quando os créditos apareceram no vídeo.
- Ao contrário, me dão água na boca.
"E as cenas de amor com Johnny Deep também", concluiu em segredo. Faziam-na lembrar-se dos beijos que trocara com Mark.
E ali estava, passando a noite com ele. Certo, Mark dormiria no sofá, e ela, na cama. Mas compartilhava, uma intimidade inexplicável ao dividirem o mesmo apartamento.
Assistir ao filme romântico serviu apenas para aumentar seu desejo.
Seu coração se mostrava vulnerável. Como seria sensacional ser uma garota comum, trabalhando em Nova York e podendo escolher o homem que desejasse! E esse
homem seria Mark...
É evidente que o fato de ser uma princesa lhe dava certas regalias. Uma proclamação real o faria lhe dar atenção. O dr. Rosenthal, amigo dele, dissera que
Mark era o vaidoso da família. Podia imaginar como responderia se uma princesa tentasse persuadi-lo.
Era orgulhoso, não aceitaria submeter-se contra a vontade. Além disso, Vanessa não devia ser a primeira mulher a notar aqueles olhos azuis profundos e a poderosa
constituição física.
Entretanto, tinha quase certeza de que era uma das poucas que conseguira derrubá-lo no chão com um golpe, decidiu, satisfeita.
- Por que está sorrindo? - Mark a fitava de cenho franzido.
- Estava me lembrando de como o derrubei com aquele golpe mortal.
- Eu caí, não foi você que me derrubou.
- Cai com muita facilidade, não?
- Só quando você está por perto.
O olhar insinuante a desarmou. Prendendo a respiração, Vanessa mergulhou naquelas íris da cor do céu, levada pelo desejo de beijá-lo com toda paixão.
- Você sabe como tirar um homem de seu equilíbrio, Alteza.
- Não, eu... não sabia.
- Agora já sabe.
- Por que estamos sussurrando?
- Para que eu tenha de me aproximar de você.
- E isso é bom?
Mark balançou a cabeça, como se quisesse clarear o raciocínio.
- Não - afirmou com rispidez, levantando-se. - Creio que já vimos televisão o bastante por uma noite.
Vanessa estava tentada a ficar olhando para ele até o amanhecer. Não apenas olhando, mas beijando, sentindo seu corpo próximo ao dele.
"Amanhã será um novo dia", concluiu, ajeitando-se no sofá. Não havia por que apressar os acontecimentos.
- Não costuma ver televisão a cabo, Vanessa?
- Apenas quando estou viajando. Nunca fico no quarto do hotel tempo bastante para ver tevê. Temos alguns aparelhos no palácio, mas papai não aprova a influência
cultural e a violência excessiva da mídia americana. Ele acha que pode fazer nosso país voltar no tempo, como Camelot.
- Talvez o rei apenas esteja tentando ser protetor.
- Superprotetor, isso sim!
- Vocês não se entendem bem?
- Ter um rei como pai interfere no relacionamento, posso garantir-lhe isso. E você? Como é sua relação com seu pai?
- Ele é oficial aposentado, e estou certo de que, lá no fundo, pensa que também é um rei.
Vanessa riu com vontade. Adorava o toque espirituoso nos comentários dele.
- Lembro-me dele no casamento de Prudence. Pareceu-me ser gentil e atencioso.
- Gentil e atencioso? - Foi a vez de Mark dar risada. - Não é como eu o descreveria. Papai espera que eu alcance um alto posto na Marinha, e não perde uma
oportunidade para me fazer sentir um fracassado.
- Oh, eu sei bem como é isso. Ser julgado por alguém que você ama machuca mais do que gostaríamos de admitir.
Vanessa se arrependeu por ter feito aquela revelação ao notar a compreensão e a simpatia estampadas no rosto bonito.
- Bem, acho que é hora de dormimos... - Vanessa bocejou, levantou-se e foi para o quarto.
Antes de se deitar, quis olhá-lo pela última vez, e foi na ponta dos pés para o final do corredor. Encontrou-o debruçado sobre o laptop, completamente absorto,
teclando com agilidade.

Mark pensava nas palavras de Vanessa, rolando no sofá sem conseguir dormir. Não havia nada em comum entre seu pai e o rei Leopold. Muito bem, ambos eram autoritários
e apreciavam as coisas a seu modo. No entanto, o sr. Wilder jamais faria o que o rei estava fazendo com a filha, espionando e mantendo-a sob vigilância.
O sr. Wilder tinha expectativas a seu respeito que o sufocavam. Relembrou seu esforço, durante aqueles anos todos, para impressioná-lo, sem nunca ter recebido
uma palavra de incentivo. Tinha de provar que conseguiria, tinha de ser melhor que seus irmãos.
Dedicara-se a um grupo especial de combate ao terrorismo. A área de segurança sempre exercera especial interesse sobre Mark.
Estava envolvido com a segurança naquele momento, mesmo que estivesse trabalhando sozinho. Proteger Vanessa podia ser considerado uma operação especial. Tinha
de manter a integridade dela para preservar as relações entre os Estados Unidos e Volzemburg. A localização geográfica do pequeno país, a leste da Europa, tornava-o
muito importante para os Estados Unidos. E as relações amigáveis precisavam ser preservadas a qualquer custo.
A qualquer custo?, pensou com uma ponta de culpa. Suas ordens não incluíam beijá-la.
Era necessário se forçar a encará-la como a princesa que era, e não como Vanessa, a mulher mais atraente que já conhecera.
Não estava atraído por ela, ordenava-se com rigidez. E, mesmo que a atração existisse, teria de ser eliminada. Não se permitiria sentir o que quer que fosse
por ela.
Talvez a urgência em tomá-la nos braços e beijá-la se devesse ao fato de não estar com uma mulher havia muito tempo. Só podia ser isso. Qualquer coisa seria
aceitável para justificar a explosão de hormônios que devassavam seus sentidos sempre que a via. Ou até mesmo quando não a via.
Afinal, não se tornara um oficial da Marinha só porque achara que seria fácil. Sabia que teria de ter liderança e habilidade para vencer obstáculos difíceis.
Porém, naquele momento, não conseguia sequer adormecer, e a culpa era de Vanessa!
Passara apenas um dia com ela, e seu cérebro dava mostras de ter sido detonado por uma bomba.

Quando Vanessa acordou, na manhã seguinte, não recordou de imediato onde estava. Então, lembrou-se. Mark, seu guarda-costas... Aquilo explicava os sonhos eróticos
que povoaram seu sono sem cessar.
Sentou-se na beirada do leito e bocejou, ainda tonta de sono. Depois de escolher as roupas que usaria, colocou-as sobre o braço e abriu a porta, seguindo em
direção ao banheiro. Notou que Mark ainda dormia, estendido no sofá. Não parecia confortável.
Resistindo à tentação de afagar o rosto másculo, seguiu para o toalete.
Depois do banho, vestiu a camiseta branca e a calça jeans nova, com uma deliciosa sensação de liberdade. A próxima etapa seria o desjejum.
Mark ainda dormia quando foi para a cozinha. Pretendia fazer ovos com bacon, como vira certa vez em um programa de culinária na televisão.
Surpreendeu-se ao abrir a geladeira e constatar que estavam ali todos os ingredientes de que precisava. Mark devia ter saído na véspera e ido ao supermercado.
Porém, a falta de experiência fez com que deixasse os ovos caírem no chão e, ao tentar apanhá-los, esbarrou na frigideira, que se estatelou com um barulho ensurdecedor.
- O que está acontecendo? - Mark surgiu à porta da cozinha.
- O que está acontecendo?! - Ela procurava ganhar tempo. A visão dos braços musculosos evidenciados pela camiseta cavada a deixara impossibilitada de raciocinar.
- Estou cozinhando.
- Você?! - Os lábios sensuais se curvaram num sorriso cético. - E sabe fazer isso?
- Evidente que sei! - Não contou que aprendera através de algumas aulas na tevê, mas aquilo não importava.
- Jura que não precisa de ajuda? - Mark insistiu, duvidando das habilidades dela.
- Seria de grande auxílio se colocasse trajes adequados - censurou, dando-lhe as costas.
- Como quiser, Alteza. - Mark se foi, após fazer uma mesura.
Vanessa refletiu que seria muito arriscado que o primeiro prato que preparasse fosse ovos com bacon. Parecia muito complicado. Teria mais sucesso se tentasse
algo mais simples, como torradas e suco de laranja enlatado.
Enquanto Mark tomava banho, arrumou a mesa e sentou-se, a sua espera.
- Você conseguiu! - ele a espicaçou ao ver tudo arrumado. - Estou impressionado.
Vanessa perdeu o fôlego ao vê-lo. Os cabelos castanho-escuros ainda estavam molhados, conferindo-lhe um aspecto ainda mais sensual. Seu olhar passeou pelo
corpo másculo, detendo-se na inscrição da camiseta que vestia: "U. S. Marine Corps".
- Deixei a cafeteira elétrica programada ontem à noite - Mark apanhou a jarra de café fumegante.
- Que inteligente! Seria mais adequado que fosse o esperto da família, em vez de ser o vaidoso. - Vanessa se calou ao ver os olhos dele se enevoarem de súbito.
A verdade era que Mark já fora provocado o bastante por sua família, que valorizava muito a força física. Ele, ao contrário dos irmãos, preocupara-se em estudar
e passara muitas noites em claro, lendo sob a luz do abajur.
Dentre as Forças Armadas, a Marinha era tida como a de menor importância. Comentava-se, em tom de zombaria, que bastava ter músculos para ser fuzileiro naval.
- Falei alguma coisa errada?
- Não. É que... o café não ficou bom.
- Não?! Está delicioso! Melhor que o preparado pelo chef da corte!
- Bem, não tenho como comparar.
- Acredite, ele é muitíssimo competente.
- Tenho certeza de que sim.
Vanessa o observava enquanto comia. O que aquele homem tinha de especial que os outros não tinham? Sem dúvida, os olhos azuis eram divinos. As pequenas rugas
que se acentuavam quando sorria emprestavam-lhe um charme todo especial. E o corpo, viril e atlético, era perfeito.
O sorriso, incrível, e a boca sensual era um convite para ser beijada. Tinha também mãos sensacionais, Vanessa notava naquele momento. Firme, dedos longos
e delgados...
Mark era mais do que sensual. Era poderoso. Mesmo naquele momento, enquanto devorava uma fatia de torrada com geléia, parecia pronto a empunhar uma arma e
lutar contra qualquer inimigo.
O guerreiro e a princesa, pensou com um sorriso contido. Ambos acostumados a dar ordens e serem obedecidos...

- Sou a rainha do mundo! - Vanessa anunciou, de braços abertos, na proa da balsa que os levaria à ilha de Manhattan, horas mais tarde.
Assim que disse isso, um relâmpago cruzou o firmamento, que amanhecera acinzentado, com nuvens carregadas.
- Acha que foi algum sinal? - perguntou, rindo, enquanto corriam para a cabine coberta.
Ela estava adorável, com os cabelos voando ao vento e as maçãs do rosto coradas.
- Alguma coisa errada? - Vanessa tocou a face, notando que Mark a fitava.
- Nada, está tudo bem.
- Estou parecendo uma turista comum?
- Sabe que nada em você parece comum - ouviu-se dizer, sentindo a incrível onda de eletricidade entre eles. - Dê-me sua mão, vamos descer.
O sol voltou a aparecer no momento em que Vanessa pisou na ilha. Caminharam pelas ruas repletas de arranha-céus, em meio à profusão de cores e aromas. Ao avistar
a Estátua da liberdade, a garganta de Vanessa se apertou, numa emoção que fez seus olhos marejarem.
- Você está bem?
- Fiquei emocionada ao ver a estátua. Minha mãe era cidadã americana. Creio que tive um laivo de patriotismo por minha herança materna. Na verdade, nasci em
Nova York. Mamãe teve problemas na gravidez, então papai a trouxe para cá.
- Como uma americana acabou se casando com um rei?
- Eles se encontraram em Ascot, na Inglaterra. Minha mãe disse que foi amor à primeira vista. Meu pai quebrou a tradição ao se casar com ela.
- Se fez isso, talvez não seja tão rígido quanto você diz.
- Papai parece ter se esquecido do passado - afirmou, com amargura. - Ele mudou muito desde que mamãe morreu. Todos nós mudamos.
Vanessa se pôs a pensar no que a rainha pensaria ao ver a filha brincando de turista em sua terra natal.
Uma nuvem encobriu o sol ao mesmo tempo que um grupo de estudantes caminhava na direção deles. Preocupado, Mark se aproximou e passou um braço protetor pelos
ombros dela, provocando-lhe um arrepio de prazer.
A Estátua da Liberdade representava a idéia de paz e segurança para milhares de pessoas, e lá estava ela, uma princesa que encontrara tudo aquilo ao lado daquele
homem americano, um fuzileiro naval. Cerrou as pálpebras e saboreou o momento.
- Você está bem?
- Ótima! - respondeu com sinceridade, desejando ficar ali, colada a ele, pelo resto da vida. Com relutância, afastou-se e sorriu.
- Vamos. - Mark estendeu a mão, e Vanessa sentiu a energia e o calor da pele dele. - O escultor Frédéric-Auguste Bartholdi projetou esta estátua para marcar
o canal de Suez, mas a interferência histórica e política fizeram com que ficasse aqui.
Vanessa o ouviu, surpresa, sem conseguir imaginá-la em outro lugar a não ser ali, dando as boas-vindas a quem chegasse à América.
- A estrutura de ferro foi projetada por Gustave Eiffel - Mark continuou, exercendo a função de guia turístico -, o mesmo que construiu a torre de mesmo nome
em Paris.
Vanessa sorriu. Estivera na Torre Eiffel diversas vezes, mas não causara o mesmo efeito sobre ela que a Estátua da Liberdade. Talvez porque a estátua representasse
o que tanto procurava: liberdade e independência. Liberdade para ser ela mesma, para ser amada pelo que era, e independência para viver sua própria vida.
- Aonde iremos agora? - Mark quis saber, ao voltarem. - Há mais algum lugar a que gostaria de ir?
- Que tal se fôssemos ao Museu de Arte?
Mark fez que sim.
Antes de entrarem, ele se deteve na butique do museu e comprou para Vanessa uma delicada corrente de prata com uma miniatura da Estátua da Liberdade.
- Oh, não precisava... Você já me proporcionou muitas recordações hoje!
- Esta é diferente. Por favor, aceite.
- É muito gentil de sua parte. - E fez menção de colocá-la no pescoço.
- Quer que a coloque para você?
- Sim, por favor.
Ao sentir o toque dos dedos sobre a pele, achou que fosse desmaiar. Ali, no meio da loja lotada, seria capaz de abraçá-lo e beijá-lo sem se importar com mais
nada.
- Pronto. Deixe-me ver como ficou. - Colocando as mãos nos ombros delicados, virou-a de frente para si. - Está uma beleza!
Vanessa sorriu, e marcou aquele momento como o mais perfeito de sua existência.
Em seguida, foram ver a coleção de pintura impressionista. Vanessa estivera lá uma vez, quando ela e a mãe saíram para conhecer os museus mais importantes
antes de irem para a apresentação da Companhia de Balé de Volzemburg, anos atrás.
- Algo errado? - Mark estranhou seu silêncio. - Não diz uma palavra há horas!
- Estava recordando a última ocasião em que estive aqui, quando tinha quinze anos e estava com mamãe. Foi a primeira vez que vi um Monet original. Não tínhamos
muito tempo, nossa agenda estava apertada. Mas minha mãe prometeu que voltaria, e nunca pôde cumprir a promessa. - A voz de Vanessa tornou-se quase inaudível. -
Ela morreu em um acidente de carro um ano depois.
- Lamento muito. - Ele segurou sua mão, num impulso.
- Sinto saudade dela, mesmo depois de tantos anos.
- Tem mais parentes na América?
- Não. Mamãe era filha única, e meus avós maternos morreram em um acidente de avião pouco depois dela.
- Deve ter sido difícil para sua família.
- A realeza não mostra abatimento, não nos é permitido. Qualquer tipo de emoção deve ser evitado, a qualquer custo.
- Temos o mesmo princípio na Marinha.
- Sim, mas você escolheu se alistar. Eu não tive outra alternativa senão...
Mark refletiu se tivera mesmo chance de escolher. Fizera apenas o que era esperado que fizesse, e seguira a tradição familiar.
"Espere um pouco, o que está acontecendo, rapaz?!", disse para si mesmo, assustado. Jamais questionara suas escolhas antes!
Vanessa era a culpada. Ela o obrigara a rever suas próprias opções, e provocara aquela revolução em sua vida.

CAPÍTULO VII

Vanessa nunca se sentira tão nervosa antes. Nem mesmo quando encontrara o Papa pela primeira vez experimentara aquele tipo de emoção. E tudo porque Mark a
convidara para jantar...
O vestido preto que comprara na liquidação, simples e discreto, parecia feito sob medida. Escovou os cabelos, estranhando a cor acobreada da tinta que usara.
Ao menos seria melhor do que aquele boné ridículo dos Yankees.
Naquela tarde, haviam parado em uma drogaria, e ela se encantara com a infinidade de produtos que encontrou. Em seu país, drogarias vendiam apenas medicamentos,
mas na América podia-se achar desde selos a sorvetes e refrigerantes.
Mark sugeriu que comprasse um xampu para colorir os cabelos, garantindo que sairia na primeira lavada, além de um rímel e um perfume de dezesseis dólares.
Ele mesmo sugeriu a cor: castanho-acobreado.
Ansiosa para ver o efeito, Vanessa foi para o banheiro assim que chegou em casa. Ao aplicar o produto, lembrou-se da fortuna que seu pai gastava com seu cabeleireiro
exclusivo, Mimi.
Colocou algumas gotas do perfume, e se surpreendeu com o delicado aroma, que combinava à perfeição com sua pele. Milhares de mulheres pelo mundo usavam aquela
fragrância, pensou, adorando sentir-se igual a elas.
Avaliou sua imagem no espelho e ficou satisfeita com o viu. Estava feliz, e seu estado de espírito parecia emprestar um brilho especial aos olhos verdes.
Depois de colocar as sandálias novas, foi para a sala e escolheu um CD de Sammy Davis Jr., um dos favoritos de Mark. Enquanto esperava que ele terminasse o
banho, sentou-se no sofá e colocou no pescoço o pingente com a miniatura da Estátua da Liberdade, que ganhara na manhã em que foram a Manhattan.
- Está com fome?
Vanessa prendeu a respiração ao vê-lo entrar na sala. Estava maravilhoso com aquela calça jeans preta e uma camisa escura. Era o símbolo da masculinidade,
sensual e viril.
- Gostei da nova cor dos cabelos. Você está ótima!
- Obrigada, você também - ela disse, tentando manter a naturalidade.
- Está pronta?
Mark lhe fizera aquela mesma pergunta quando saíram da suíte do hotel, na véspera. Parecia ter se passado um século desde então.
- Sim, estou.
- Muito bem. - Mark lhe ofereceu o braço, num gesto solene. - Podemos ir?
Caminharam até o restaurante, que ficava a três quadras do apartamento. A noite, quente e agradável, parecia feita para os amantes. Ou talvez fosse ela, decidiu
Vanessa, notando os casais passeando de mãos dadas, que se envolvera com o clima romântico.
A sensação de estar sonhando continuou quando entraram no Clara's, uma simpática cantina italiana. As mesas eram cobertas com uma toalha de papel, em vez das
finas toalhas de linho, mas a princesa nunca se sentira tão bem.
- Garanto que você nunca esteve em um lugar como este - Mark comentou, ao puxar a cadeira para que ela se sentasse.
- Está falando com uma mulher que gosta de pizza e batata frita, lembra-se?
- Sim, lembro.
Como esquecer a expressão de deleite no belo rosto enquanto comia a porção de batata frita?
- Sendo assim, é melhor proteger seu prato para que eu não roube seu espaguete!
A música de fundo, suave e romântica, e a alegria dos casais conversando nas mesas vizinhas faziam com que se sentisse como em um filme.
Conversaram sobre os acontecimentos do dia, coisas que viram e ouviram ao saborear um delicioso minestronne como entrada.
- Gostaria de ser artista - Vanessa comentou. - Comecei a estudar Artes Plásticas em Paris, mas papai precisava de minha ajuda, e tive que voltar para casa
e reassumir minhas obrigações diplomáticas. Costumo pintar quando tenho algum tempo, mas está se tornando cada vez mais raro. E você? Sempre quis ser fuzileiro naval?
- Confesso que cheguei a alimentar a idéia de ter minha própria empresa de segurança.
- E por que não foi em frente?
- A Marinha ocupa cada minuto meu.
- E basta para você? Nunca pensou que a vida pode ser mais que isso?
Mark jamais ousara pensar, mas, desde que a conhecera, seu mundo tinha virado de cabeça para baixo.
- Não sei... - Mark hesitou. Nunca conversara sobre seus anseios íntimos com ninguém antes.
- Sinto um vazio, como se minha existência não tivesse sentido. Deve ser maravilhoso possuir a liberdade de escolher e fazer alguma coisa em que se acredita
de todo coração.
- Às vezes, começamos algo sem gostar e depois passamos a nos envolver e a apreciar.
- Ou então, nos moldamos e não percebemos mais que o sonho ficou para trás - Vanessa ponderou, com sabedoria.
- Ou um pouco dos dois. - Mark sorriu, cada vez mais admirado com aquela linda jovem.
- Sei o que quer dizer.
- Sabe mesmo? - Nem ele tinha certeza de que o que articulava pela primeira vez estava correto, e ela ainda parecia compreender.
- Sim. Os dois temos obrigações que exigem muito de nós. - Vanessa aguardou o garçom retirar os pratos. - Trabalhamos de acordo com um rígido padrão. Mas ainda
acho que, se tem um sonho, deve segui-lo a qualquer custo.
- E você? Qual é seu?
- Gostaria de trabalhar com aquelas crianças de que lhe falei. Adoraria poder dirigir uma fundação que abrangesse os menores carentes de todos os continentes.
Porém, como já sabe, meu pai me proíbe de fazer mais do que faço.
Vanessa começou a enrolar o espaguete no garfo com a ajuda de uma colher, assim que o garçom trouxe o prato principal.
- E por que não faz o que quer, Mark?
- Porque tenho um trabalho que ocupa todo meu tempo. Mark se admirava do apetite dela.
- Seu projeto é ser general?
- Não há nada de errado em ser general - resmungou, entendendo as palavras dela como crítica.
- Claro que não. - Vanessa ergueu as mãos, pedindo paz. - Qual é seu plano? Ser o mais jovem general na história da Marinha?
- Afirmativo.
- É curioso como os sonhos são diferentes dos projetos, não? Seu objetivo é ser o mais jovem general da história da Marinha, mas sonha em ter a própria empresa
de segurança.
- Diga-me, sua irmã é tão rebelde quanto você? - Mark mudou de assunto, incomodado com o rumo que a conversa tomava.
Sentia um estranho desconforto, como se tivesse tocado em um ponto novo e desconhecido, ainda muito delicado.
- Não, Anna é mais obediente às regras do que eu jamais seria. Ela é mais adequada para herdar o trono. Estou certa de que seria melhor rainha do que eu.
- Eu não diria isso. Você parece muito boa em dar ordens.
- Concordo. Entretanto, como observou, não sou boa em obedecê-las. E Anna é submissa e pacífica. E se parece muito com mamãe. É pequena, delicada e muito elegante.
Sempre sabe a coisa correta a fazer, dizer ou vestir. Perto dela, sinto-me tão alta quanto o Empire State. O que me faz lembrar... Podemos ir até lá amanhã?
- Ainda não se cansou de brincar de turista? - Mark suspirou, com impaciência.
- De jeito nenhum! - Tirou a sandália embaixo da mesa. - Embora meus pés estejam doendo.
- Lembre-me de fazer uma massagem quando chegarmos ao apartamento.

E foi o que Vanessa fez, assim que chegaram em casa. Mark colocou um CD de Frank Sinatra, Too Marvelous For Words.
"Sensacional demais para ser expresso com palavras", foi o que Vanessa sentiu quando ele começou a massagear seus pés. O toque era delicado, e seus dedos se
moviam em círculos sensuais e lentos.
- Tenho pés grandes - ela disse, em tom de desculpa.
- Quando Prudence e eu estávamos na escola, costumava falar que eu tinha esquis em lugar de pés. Não são pés de princesa.
- Suponho que Anna tenha pés de princesa.
O comentário a surpreendeu.
- Sim, tem mesmo. Como sabe, se nem a conhece?
- Ora, mas conheço você! - Passou a massagear-lhe os artelhos. - Ou melhor, estou começando a conhecer.
- Você sabe fazer com que eu me sinta bem, Mark.
Resistindo à tentação de dizer que sabia como deixá-la ainda melhor, Mark recordou o porquê de estar ali. Vanessa era uma princesa. Ele, o guarda-costas, encarregado
de protegê-la. Era algo que estava proibido de esquecer.
- Hoje foi um longo dia. - De um salto, Mark colocou-se de pé. - Você precisa descansar.
Então, Vanessa, mais uma vez, deixou-o sozinho com o laptop.

Os dois dias seguintes foram tão excitantes quanto aos primeiros, cheios de novidades e diversão. E terminavam com Mark se distanciando de Vanessa, mandando-a
para a cama enquanto enviava os e-mails secretos para o rei.
Cada dia mais culpado, estava restringindo o número de informações. Deveria relatar tudo o que acontecesse, mas não 0 fazia. De propósito, omitira os comentários
de Vanessa sobre 0 desejo de ser artista ou dirigir a fundação de caridade.
Traía a confiança dela, e nem a justificativa de estar seguindo ordens aliviava seu mal-estar, pensou, naquela ocasião, quando foram passear no Central Park.
Era uma ensolarada tarde de primavera, e o parque estava cheio de gente.
- Esta cidade tem dois times de beisebol, quinze distritos, cento e cinqüenta museus e milhares de restaurantes - Mark informou, folheando um guia turístico.
- Onde gostaria de jantar hoje à noite?
- Ainda nem almoçamos! Onde está a batata frita? - Vanessa perguntou, olhando por sobre o ombro dele para um grande saco de papel.
- Você queria um piquenique no Central Park, e isso não inclui batata frita. Temos galinha assada, salada de batata e maçãs.
- Para ser sincera, eu queria apenas passear aqui... - Apertou os lábios, decepcionada. - O piquenique foi idéia sua, lembra-se?!
- Uma idéia excelente, por sinal. - Mark guardou o livreto na mochila.
- Todos os fuzileiros são modestos como você? - provocou-o, sorridente.
- Já lhe contei sobre Chesty Puller? - Mark ignorou a questão. Estendeu uma toalha xadrez sobre o gramado e colocou a cesta de piquenique sobre ela.
- Não. - Vanessa apanhou uma coxa de galinha com as mãos, encantada com a liberdade do gesto. - Foi alguma namorada sua?
- Chesty é homem, um herói da Marinha. Durante a Segunda Guerra, estava com sua fragata no Pacífico quando deparou com o inimigo. O general Puller encorajou
seus homens e, mesmo estando em número infinitamente menor, venceu a batalha.
- Deve ter sido um homem especial - comentou, perguntando-se por que Mark teria lhe contado aquilo.
- Aqueles que o serviram contavam que Chesty caminhava por entre os inimigos sem que nenhuma bala o atingisse. Era um líder nato, que se tornou uma lenda.
Ele é apenas um dos inúmeros heróis da Marinha.
- Estou certa de que sim.
Vanessa esperou que ele prosseguisse, mas Mark se calou num silêncio que indicava conflito. Parecia estar tentando convencer a si próprio que havia uma boa
razão para continuar a investir em sua carreira como oficial. Vanessa reconheceu sintomas que ela própria já experimentara ao questionar seu destino.
- Quer falar sobre isso, Mark?
- Sobre o quê?
- Sobre o que o deixa tão aborrecido.
- Não.
Vanessa sentiu que um abismo se abria entre eles. Mark não a deixava se aproximar. Quando parecia permitir que chegasse perto era apenas para poder afastá-la
no momento seguinte. Porém, não podia forçá-lo a nada. Podia apenas ficar ali com ele, como fizera durante aquela semana, e rezar para que Mark não se arrependesse
de sacrificar as férias para estar a seu lado.
- A galinha está uma delícia! - falou, apenas para preencher o vazio.
- Está sentindo falta de casa? - Mark a encarou, como se não a tivesse ouvido. Parecia estar com o pensamento a quilômetros dali.
- Deve estar brincando! - Vanessa ergueu o rosto para o céu. - Eu ficaria aqui para sempre.
Mark foi impedido de replicar. Um garotinho de cerca de três anos precipitou-se na direção deles, correndo em disparada, e Vanessa esticou o braço e o segurou
antes que caísse.
- Olá, amiguinho. Aonde você vai?
O pequeno sorriu para ela. Encantada, a princesa o abraçou e beijou a face rosada.
O impacto da cena atingiu Mark com a força de um míssil. Experimentou uma emoção inexplicável, uma dor profunda e pungente. Desejou estar no lugar daquela
criança e ser abraçado com a mesma ternura.
Tudo o que inventara para justificar a atração que tinha por Vanessa não passava de mentiras. A realidade era que ela o tocava no mais fundo de sua alma. Não
era uma simples uma atração, Vanessa não era uma mulher comum. Nunca sentira nada semelhante, nunca notara que...
Deteve o curso dos pensamentos, assustado. Estaria apaixonado pela princesa?
- Joshua, onde você está? - Uma moça assustada correu na direção deles.
Tão rápido quanto aparecera, o garotinho foi carregado pela mãe.
Ele acenava de longe para Vanessa, e Mark também dizia adeus a qualquer esperança de voltar a ter paz depois de tê-la conhecido.
- Algo errado, Mark?
- Você gosta de crianças.
- É verdade. E você? - Antes de obter resposta, continuou: - Ah, lembrei-me do que falou a respeito do pânico que tem do casamento e do compromisso com uma
mulher. Imagino que isso signifique que não esteja interessado em ter filhos.
- Você afirmou que o casamento também a apavora, Vanessa.
- Por razões diferentes. Eu quero me casar, mas quero que seja pela mesma razão pela qual mamãe se casou: por amor.
- É? Qual o problema, então?
Os olhos dela escureceram.
- Papai tem outros planos para mim. Podemos falar de outro assunto, por favor? Não quero pensar nisso.
- Lógico. - Afinal, Mark entendia muito bem a arte de bloquear conjecturas desagradáveis.
Vanessa agradeceu aos céus pela rapidez com que puderam pôr aquilo tudo de lado. Não queria que nada estragasse o escasso período que teriam juntos. Desejava
apenas viver o momento maravilhoso que estava desfrutando ao lado do homem mais atraente da face da terra.
Sorriu ao imaginar o que seu pai diria ao vê-la sentada sobre a grama, comendo com as mãos!
- Qual é a graça? - Mark quis saber.
- Uma mulher tem seus segredos... - Vanessa o fitou por instante e, pegando-o de surpresa, se ergueu e o beijou nos lábios.
- O que foi isso?! - exclamou, atordoado, quando ela se afastou. A voz rouca revelava o que seria impossível esconder.
- Senti vontade de agradecer-lhe por estar me proporcionando tudo isso.
Mark tentou manter o autocontrole, mas estava perturbado demais para raciocinar. Não podia se distrair, estavam em um lugar público repleto de perigos inesperados.
Ainda abalado pelo impacto, olhou ao redor e observou dois repórteres a poucos metros dali. Teriam percebido o que acabara de acontecer?
- Não faça nenhum movimento brusco, Vanessa, mas olhe com discrição para a direita. Está vendo aqueles dois homens com câmeras? Você os reconhece?
Vanessa obedeceu e voltou a cabeça para a direção que Mark indicara.
- Não, nunca os vi. Acha que tiraram fotografias de nós dois?
- Não sei, mas não gosto deles. Há paparazzi espalhados por todos os cantos, e eles não têm o menor escrúpulo.
- Seria melhor que fôssemos embora?
- Afirmativo.
Era a primeira vez naquele dia que Mark falava como um oficial. Usou sua experiência para ter certeza de que ninguém os seguiria. Tomaram um táxi e pararam
em uma loja de departamentos.
- Vamos fazer compras? - Vanessa ficou muito alegre.
- Não se empolgue, paramos aqui apenas para despistá-los.

Ao dizer isso, Mark estendeu o braço e chamou outro táxi, dando um endereço diferente ao motorista. Terminaram por pegar mais um antes de, enfim, chegarem
ao prédio.
- Dá para me dizer o que está acontecendo? - Vanessa ficou ansiosa, ao vê-lo trancar a porta e se plantar na janela, observando a rua.
- Temos de ser cautelosos.
- E chama de "cautela" gastar uma fortuna com táxis?
- Não gostei daqueles repórteres no parque.
Vanessa o detestava quando respondia com frases curtas e evasivas!
- Poderia me explicar por que deixamos o parque e tivemos de pegar três táxis para vir para cá?
- Para confundir o inimigo.
- Acha que alguém está nos seguindo?
- Não tiveram a menor chance.
- Parece que você não gosta mesmo de dar chances, não é?
- Não, quando se trata de sua segurança. - Mark respondia sem tirar os olhos da rua.
- Obrigada pela consideração. Mas... e quanto ao resto de sua vida?
Aquilo o confundiu um pouco.
- Sou um fuzileiro naval, já enfrentei situações perigosas que envolviam escolhas difíceis. Em toda operação há um fator de risco.
- Estou me referindo a sua vida particular. Nunca fez nada inconseqüente, pensando apenas no momento? Jamais permitiu que a felicidade o pegasse distraído?
- Trabalho com disciplina, regras e regulamentos.
- E não gosta de fugir disso tudo?
Mark se calou, deixando-a pensar o que quisesse. Vanessa estava certa, preferia manter o controle sobre tudo o que fazia. Todavia, aquela mulher abalava suas
estruturas, deixando-o completamente vulnerável a seus encantos.
Não poderia ser seduzido, contudo, não queria ter sua lealdade abalada. Poderia ser desastroso, não apenas para ele, mas também para Vanessa.


CAPÍTULO VIII

- Mark está me deixando louca - Vanessa disse a Prudence ao telefone, naquela noite.
- Não me diga que está se apaixonando por ele!
Vanessa sentiu o sangue gelar diante daquela possibilidade. Aquilo não podia estar acontecendo!
- Querida, a família Wilder é privilegiada, e Mark é o mais sensual dos irmãos - Prudence a salvou, preenchendo a quietude. - Sei muito bem como se sente.
- Oh, por favor! - Vanessa simulava um autocontrole que estava longe de sentir. - Seu cunhado não é o primeiro homem charmoso que encontro pelo caminho.
- Mas é a primeira vez que se sente tão atraída quanto está se sentindo agora, por Mark...
- Ora, Pru, é porque ele é... - Vanessa não sabia o que dizer. Qualquer coisa que falasse pareceria incoerente.
- Sua reação revela sintomas de uma atração fatal!
- Oh, Prudence! Mark me beijou no primeiro dia em que nos encontramos, e teve a coragem de dizer que foi culpa minha! Acusou-me, dizendo que eu não deveria
ter deixado! - Vanessa desabafou, indignada. - Então, pouco depois, outro beijo! Afirmou que era para desviar a atenção de alguém que nos observava, mas não vi ninguém
por perto. Hoje, eu o beijei, e ele me lançou um olhar gelado, como se eu tivesse cometido um crime.
- E você gosta de beijá-lo?
- Muito! - Vanessa confessou, corando como uma adolescente apaixonada.
- Bem, Mark é um tanto complicado. É vaidoso, inteligente, enfrenta a vida como se fosse uma eterna batalha. Acho que não se apaixonaria com facilidade. Desconfio
que não admite perder o controle de nenhuma situação, e jamais permite que as emoções se sobreponham à razão.
- Por que não? Não há nada de errado em revelar os sentimentos. Não consigo entendê-lo!
- Acredite, emoções são consideradas uma fraqueza para oficiais da Marinha.
- Não só para eles. Meu pai é exatamente assim!
- Deve ser por isso que somos tão amigas, meu anjo. Nós duas gostamos de liberdade e nos rebelamos contra esse estilo de viver.
- Você jurou que jamais se envolveria com um militar. Vanessa lembrou-se da promessa que a amiga fizera quando eram estudantes.
Prudence riu com vontade.
- Sim, e agora já sabe como eles são irresistíveis, não é mesmo?
- Foi por isso que pediu a Mark para ficar comigo? - Vanessa indagou, desconfiada das intenções secretas da amiga.
- Imagine como seria fantástico! Se você se casar com ele, seremos concunhadas! - Prudence provocou-a.
- O único problema é que Mark não tem planos de se casar, e isso me inclui. E, mesmo que tivesse, ainda há um obstáculo: meu pai, que não desistirá da idéia
de me ver desposando Sebastian.
- Por falar nisso, hoje de manhã li em uma coluna social que você e Sebastian vão anunciar em breve o noivado.
Vanessa fechou os olhos, indignada. Não tinha dúvida de que a imprensa oficial da Corte divulgara aquela história.
- Papai acha que pode me coagir a aceitar Sebastian, mas está muito enganado!
- Tem falado com ele?
Vanessa ficou em silêncio por alguns instantes. Durante aquele tempo, evitara de propósito conversar com o rei. Porém, mais cedo ou mais tarde, teria de enfrentá-lo.
- Não, Pru. Desde que comecei minha aventura em Nova York nós não nos falamos.
Vanessa consultou o relógio. Era meia-noite, e, com a diferença de fuso horário, em Volzemburg seriam três horas da madrugada.
- Já é tarde, mas amanhã será a primeira coisa que farei.
- Faça isso, Vanessa. Acho que será melhor não deixá-lo preocupado. Mas vamos voltar ao assunto que interessa: Mark.
- Ah, refere-se a minha sombra? Pare de rir, estou falando sério! O único momento de privacidade que tenho é antes de dormir, como agora, que estou em meu
quarto, e quando vou ao banheiro.
- Não consigo imaginar um rígido fuzileiro naval seguindo-a por todos os lados!
- Ele não está usando uniforme.
- Sério? Quer dizer que está usando calça jeans e aquelas camisetas apertadas?! - Simulou um suspiro apaixonado. - Meu Deus, e o que Mark usa para dormir?
- Prudence, pare de colocar lenha na fogueira! - Vanessa a censurou, embora estivesse se divertindo com a brincadeira. - Não se empolgue, ele dorme no sofá
da sala. E, é lógico, não dorme de calça jeans...
- Evidente que não! Conte-me, Mark dorme de cueca?
- Pare com isso! - Vanessa não conteve a risada. - Costuma usar uma respeitável calça de moletom. Satisfeita?
- Respeitável, hein? Posso imaginar...
- Chega de brincadeiras, quero lhe fazer uma pergunta importante. - Pigarreou e indagou, hesitante: - Mark já teve alguma namorada firme?
- Creio que não. Não leva as mulheres a sério. Certa vez, numa conversa com Joe, falou que o casamento estava fora de seus planos até completar trinta e cinco
anos.
- Oh, que bom! - exclamou, com sinceridade, tentando corrigir logo em seguida: - Quero dizer, como deve ser bom planejar a própria vida. Odeio ter todos os
meus movimentos calculados com seis meses de antecedência.
- E o que vai fazer a respeito? - Prudence fingiu ignorar o alívio evidente da amiga.
- Ainda não sei, Pru. Mas, de uma coisa estou certa: não me casarei com Sebastian!

- A princesa não pode ser perturbada agora. - Celeste deteve Anton na manhã seguinte, apontando para a bandeja sobre a mesa da suíte. - Como pode ver, ela
ainda não tomou o desjejum. Assim que terminar o banho, aviso que quer falar com ela.
Desconfiado, Anton ficou atento ao ruído da água do chuveiro, que indicava que ela ainda estava lá.
- Não vejo a princesa há quase uma semana.
- Ela está doente. O médico esteve aqui, você viu.
- Não confio nele, Celeste. Notei o jeito como olha para você.
- O dr. Rosenthal é muito competente.
- E tem ligações com a Marinha, eu verifiquei.
- Você fez isso?! A princesa ficará furiosa, Anton! Não tem o direito de se intrometer, ela o escolheu pessoalmente.
- A princesa deveria ter procurado o médico da comitiva real - ele acrescentou.
- Como, se ele já havia ido para Volzemburg quando a princesa sentiu-se mal?
- O doutor teria voltado para vê-la. - Anton franziu o cenho. - Há alguma coisa muito suspeita por aqui. Não estou gostando disso.
- Não é seu trabalho julgar o que Sua Alteza faz ou deixa de fazer.
- Mas estou aqui para protegê-la! Não acha natural que eu me preocupe?
- Se está tão preocupado, não faça com que ela fique ainda mais doente trazendo problemas.
- Problemas? - O dr. Rosenthal os olhava, parado à soleira da suíte.
- Olá, doutor! - O rosto de Celeste se iluminou ao vê-lo. - Não é nada, apenas Anton, que está preocupado com a princesa. Eu disse que ela está melhor, mas
não quer ser perturbada.
Contrariado, Anton voltou a seu posto no corredor, não sem antes lançar ao médico um olhar de reprovação.
- Está tudo bem? - Rosenthal dirigia-se a Celeste, com um sorriso largo.
- Você tem sido muito gentil nos últimos dias, dr. Rosenthal. Não sei o que teria feito se não fosse seu apoio.
- Fico feliz em poder ajudá-la, Celeste. E, por favor, me chame de Abraham.
- Obrigada... Abraham. - Celeste corou ao pronunciar o nome dele.
- Quando falar com Mark, direi que Anton está suspeitando de algo. Temos de pensar em algo para que ele deixe de pressioná-la.
Seu modo terno e afetuoso revelava mais do que simpatia, e Celeste correspondeu com um sorriso radiante. Naquele momento, a campainha do telefone os interrompeu.
- Celeste, sou eu. - Era a princesa Vanessa do outro lado da linha. - Como estão as coisas?
A jovem contou sobre a suspeita de Anton, sussurrando para que ele não ouvisse.
- Receio que o rei fique sabendo e ligue para cá, exigindo falar com Vossa Alteza.
- Estou surpresa que ainda não tenha ligado! - Vanessa comentou, preocupada. - Fique tranqüila, falarei com ele. Está tudo bem por aí?
- Sim, Abraham tem ajudado muito.
- Abraham? - Vanessa repetiu, curiosa.
- O dr. Rosenthal - Celeste esclareceu, corando mais uma vez.
- Ah... Parece que vocês dois estão se entendendo bem!
- Sim, Alteza. - Celeste fitou de relance o médico, receando que tivesse ouvido o comentário de Vanessa.
- Fico contente que tenha alguém a ajudá-la. - E, antes de desligar, acrescentou em tom cúmplice: - Acho que formam um casal adorável.

- A princesa Vanessa ao telefone - Oscar Mullion informou, tapando o bocal do aparelho.
- Falarei com ela. - Com um movimento imperioso, o rei Leopold tomou o aparelho da mão do chefe de segurança. - Você deveria ter ligado antes, Vanessa.
Ela engoliu em seco, tentando não ficar desapontada com as primeiras palavras que ouvia de seu pai.
- Sinto muito, papai - foi só o que conseguiu dizer, lembrando-se de manter a voz rouca e abafada, como se estivesse com laringite.
- Quando pretende voltar?
- O médico disse que não poderia viajar por uma semana.
- Sim, cinco dias atrás, certo? - A entonação autoritária a deixou sem resposta por alguns instantes.
- Ele ainda não autorizou a viagem.
- Preciso de você aqui o mais rápido possível. Sebastian, seu noivo, está preocupado com sua saúde.
- Diga que agradeço pela preocupação, mas que não sou noiva de Sebastian. Gostaria que você parasse de insistir!
- Lembre-se de que você tem responsabilidades que...
- Lamento, tenho de desligar - interrompeu-o, inventando uma mentira para fugir do assunto: - A bateria do celular está no fim.
Furioso, o rei Leopold entregou o telefone para Oscar.
- Arrependo-me por ter permitido que Vanessa ficasse em Nova York!
- Vossa Majestade não teve escolha - Oscar o consolou. - E agiu muitíssimo bem ao providenciar-lhe um guarda-costas.
- Não estou tão seguro disso. Tenho recebido e-mails cada vez mais breves e sucintos. - Retirando um envelope da gaveta da escrivaninha, mostrou a Oscar as
fotografias de Vanessa no Central Park, que revelavam em zoom o beijo do casal. - Recebi estas fotos hoje de manhã, enviadas pelos meus contatos nos Estados Unidos.
- Tomarei providências, Majestade. - Oscar inclinou a cabeça, numa mesura respeitosa, e saiu apressado.

- Não saí de uma prisão para me enfiar em outra! - Vanessa se queixou, furiosa. - Você me manteve presa no apartamento durante o dia todo!
- Está chovendo. - Mark apontou para a janela, tentando manter a calma.
- Não sou feita de açúcar, sabia? Não corro o risco de derreter - ela disparou.
Talvez não, mas ele estava a ponto de se dissolver. Vanessa o punha em completo desequilíbrio. Usava um vestido azul florido, com finas alças que revelavam
os ombros delicados, que era curto o bastante para revelar as maravilhosas pernas, alvas e bem torneadas. Esforçava-se para que seus olhos não fossem atraídos para
elas sem parar.
Naquele dia, Vanessa não usava a corrente de prata que ele lhe dera. Em seu lugar, colocara uma gargantilha com uma medalha de São Cristóvão.
- Ouça, princesa, ficar aqui trancado com você também não tem sido fácil para mim - confessou com absoluta sinceridade.
Aquela afirmação a magoou. Estava vulnerável depois da breve conversa com o pai, e precisava de um ombro amigo, alguém que não a recriminasse o tempo todo.
E Mark mostrava um humor insuportável desde que deixaram o parque, na véspera.
- Que bicho o mordeu?
- Por quê? - Mark arqueou uma sobrancelha, com ironia.
- Está mal-humorado e rabugento desde que acordou!
- O que quer de mim? - indagou, com rispidez.
O ar vibrou entre eles quando seus olhares se cruzaram. A expressão selvagem, os traços marcantes e másculos a deixaram sem fôlego.
- Por que está tão distante? Tem me evitado, como se eu estivesse com uma doença contagiosa! - Vanessa desabafou, endireitando a coluna, sem deixar de encará-lo.
- Será que sou tão repulsiva a ponto de não querer tocar em mim?
- Não me provoque... - Mark estreitou os olhos.
A tensão evidente dos músculos do pescoço revelava o desejo que o consumia.
- Por que não? - Vanessa continuou, impiedosa. - Achei que fuzileiros navais eram imunes à tentação.
- Acredite, princesa, esse não é meu caso - murmurou com voz rouca.
Levantou-se e caminhou até a janela, tentando se defender do desejo selvagem de possuí-la ali mesmo, sobre o carpete.
- Está bem, vou fazer uma boa ação: sairemos para jantar. - Para seu desgosto, o tom áspero não produziu efeito sobre Vanessa.
- Ótimo! - exclamou, excitada. - Iremos jantar, depois poderemos dançar em alguma boate exótica e...
- Espere um pouco, Vanessa. Não vamos dançar coisa nenhuma!
- Ah, você não vai? Não me importo de ir sozinha. Fique aqui resmungando, como fez o dia todo.
- Ainda não entendeu, princesa. Sou responsável por você, esse é meu trabalho.
As palavras de Mark a magoaram ainda mais. Ele fazia questão de deixar claro que estava a seu lado apenas devido ao senso de responsabilidade e compromisso,
nada mais.
Então, por que a fitava daquela forma, como se estivesse despindo-a com o olhar? Não fazia sentido.
- Vou respirar um pouco de ar fresco - avisou-o, dando-lhe as costas. - Estarei de volta em dez minutos.
Porque ele tinha de ser tão... complicado? Era o primeiro homem que a tratava como mulher, e não como uma princesa. O primeiro que a fazia desejar alguém com
todas as fibras de seu corpo.
Mark a fizera descobrir a feminilidade, que desabrochara com a força de um vulcão. Sempre quisera ser vista pelo que era, e não pela coroa majestosa que usava.
Mark não era aristocrático como os nobres do mundo todo, que a cortejavam em suas viagens ao longo dos anos. Nem era formal e sério como Sebastian.
Ele era... Mark! Complicado, sensual, furioso, sensual, engraçado, sensual, honesto, direto e... sensual! Em resumo, o homem mais encantador que já conhecera.

Vanessa conseguiu convencê-lo a ir dançar. Seria aquilo ou trancá-la no quarto.
Ela usava uma calça fina, semitransparente, de um tecido acinzentado com um ligeiro brilho, e uma túnica rosa do mesmo material. Estava mais atraente do que
nunca.
- Onde arrumou essas roupas? - quis saber ao vê-la sair do quarto.
- Em Paris. Por quê?
- Como vieram parar aqui?
- Coloquei em sua mochila, antes de deixarmos a suíte do hotel.
- E acha que são trajes adequados para uma princesa?
- Não estou exercendo o papel de princesa agora - ela replicou, erguendo o queixo, desafiando-o. - Meu costureiro não sabe que tenho este conjunto. Quis trazê-lo
na bagagem para o caso de surgir alguma ocasião especial.
Vanessa havia aplicado uma sombra esverdeada, acentuando os exóticos olhos verdes, e um batom rosa cintilante, capaz de fazer um homem perder a cabeça. Os
cabelos soltos, sedosos e brilhantes, emolduravam o rosto perfeito.
- Tem certeza de que não é muito ousada? - Mark lutava para desviar o olhar do top que ela usava sob a blusa, revelado pela transparência do tecido.
- Absoluta! - Vanessa cruzou os braços sobre o peito ao sentir a pele queimar. - Nem sonhe em pedir que me troque!
- Você pode sentir frio...
- Não se preocupe. - Sorriu, colocando a mão sobre o braço vigoroso. - Tenho um fuzileiro grande e forte para me manter aquecida.
Mark não pôde evitar que aquela frase provocasse em sua imaginação uma sucessão de imagens eróticas, que se desenrolavam em sua cabeça como um filme.
E o acompanharam durante todo o jantar.

Escolhera um simpático bistrô, discreto e confortável, e comeram em silêncio. Vanessa pediu galinha e batata assada, e Mark optou por um filé com legumes.
Logo depois da sobremesa, seguiram para um clube noturno famoso, em um bairro elegante.
- Sinto muito, a casa está lotada - o porteiro os deteve na entrada.
- O quê? - Vanessa pestanejou, incapaz de acreditar que estava sendo barrada. Aquilo nunca lhe acontecera antes.
- Que pena, teremos de ir para casa e... - Mark se apresou em dizer, mas foi interrompido.
- Nem pensar! Há inúmeros clubes na cidade. Vamos procurar algum que não esteja lotado. - Vanessa empinou o nariz e seguiu pela calçada apinhada de gente,
ignorando os protestos dele. - Veja, aquele parece interessante!
Mark não aprovou a escolha. Achou que o bar agitado e barulhento tinha aspecto duvidoso. Tentou detê-la, mas Vanessa já havia entrado.
Numa avaliação rápida, verificou as saídas de emergência, embora não fosse fácil enxergar o que quer que fosse na penumbra interior.
A música barulhenta o deixou atordoado. Conduziu Vanessa a uma mesa vazia a um canto, de forma que pudesse observar todo o ambiente.
Com dificuldade, atravessaram a pista de dança, onde centenas de pessoas se aglomeravam, formando um bloco compacto. Antes que chegassem à mesa, ela foi ocupada
por um casal.
Vanessa esticou o pescoço e encontrou outra, no extremo oposto.
Cada vez mais tenso, Mark abriu caminho até lá. Precisava de alguma coisa para relaxar, e pediu uma dose de uísque, quando o garçom apareceu, depois de uma
longa espera.
Não precisava ser um expert em segurança para saber que aquele ambiente, repleto de bêbados, poderia lhe causar transtornos.
Mal acabara de pensar nisso e sentiu o peso de um corpo em suas costas. Virou-se, pronto para entrar em ação.
Um rapaz iniciara uma briga, logo ao lado, e fora arremessado com violência sobre Mark. Num piscar de olhos, o lugar se transformou em verdadeiro caos.
Ao se voltar, sentiu o sangue congelar nas veias. Vanessa havia desaparecido!


CAPÍTULO IX

Aterrorizada, Vanessa se levantou para evitar que os cacos de vidro que voavam em sua direção a atingissem.
Um homem pulou sobre outro. Atracaram-se e rolaram pelo chão. As mulheres gritavam e tentavam correr para longe do foco da briga, arrastando-a para o outro
extremo. O incidente na loja de departamentos parecia um passeio no parque se comparado à completa balbúrdia em que o bar se transformara.
A ponto de entrar em pânico diante do perigo e da violência que explodiam a seu redor, gritou por Mark.
Pressionada contra uma parede, lutava contra o desespero, que deixava um gosto metálico em sua boca. Onde ele estaria? Tinha de encontrá-lo!
Tentou se lembrar da aula de defesa pessoal. Se fosse preciso, teria de se defender por conta própria. Porém, Mark não lhe ensinara nada que pudesse ser útil
naquele tipo de situação. E, mesmo que tivesse ensinado, de nada valeria. Não conseguia se mover. Seus músculos recusavam-se a obedecê-la.
- Vanessa!
Os olhos azuis surgiram em meio à confusão, como dois faróis iluminando as trevas. Mark a puxou pela mão, arrastando-a até a saída de emergência, que dava
acesso a uma rua lateral, escura e deserta.
O ar frio da madrugada revigorou seus pulmões, e ela respirou fundo, tentando se acalmar. Quando corria, o salto de sua sandália se quebrou. Ao se abaixar
para tirá-la, Mark a tomou no colo e rumou em direção à avenida principal.
Vanessa envolveu os braços ao redor do pescoço dele, descansando a cabeça no ombro largo. Naquele momento, teve certeza de que nenhum mal lhe aconteceria sempre
que Mark estivesse por perto.
Amava aquele homem!
A constatação a paralisou, pondo-a ainda mais apavorada do que se tivesse de enfrentar uma guerra, como aquela de que acabara de sair. Amava Mark!
As dúvidas e as incertezas desapareceram. Suas emoções estavam à flor da pele, depois do trauma que vivera.
Não importava que fosse uma princesa, e ele, um fuzileiro naval, sem a linhagem exigida pelo protocolo. A única coisa que importava era estar ali, colada ao
homem que a fizera descobrir o amor.
Num impulso, beijou-o no rosto. Mark respondeu com o sorriso mais doce que ela já recebera.
- Controle-se, querida.
Querida, e não princesa! Era a primeira vez que se dirigia a ela daquela forma!
Mark a colocou de pé algumas quadras à frente e chamou um táxi. Quando viram-se na segurança de seu interior, Mark a fitou longamente.
- Estava com medo de que você estivesse machucado - Vanessa murmurou, aproximando-se e tocando-o no rosto, com os dedos trêmulos.
Mark tomou-lhe as mãos entre as suas e beijou-as com ternura.
- E você? Está bem? Ninguém a machucou?
- Estou bem. Mark, eu...
- Shh...
Os olhos azuis iluminaram-se com um desejo profundo, urgente. Como que atraído por um ímã, Mark cobriu os lábios sensuais com os dele, mergulhando na doçura
da boca macia e úmida.
Vanessa achou que estava sonhando. Sentia-se flutuar nas nuvens.
Aquele homem salvara sua vida, não por resgatá-la da briga no bar, mas por fazê-la desabrochar. Quando a língua experiente explorou sua boca, deixou que a
paixão contida explodisse e respondeu da forma como uma mulher poderia fazer, abrindo os lábios num convite sensual.
A delicadeza com que Mark a tocava, como se tivesse medo de assustá-la com a intensidade de sua paixão, a encantou.
Nunca vira aquela faceta de Mark. A doçura, a gentileza, mesmo sentindo a energia que havia dentro dele, contida como uma barreira prestes a se romper.
De súbito, Mark a puxou mais, com tanta ternura, que ela achou que fosse morrer.
O que aconteceria no dia seguinte? O perigo daquela noite mostrou que o tempo que passava ao lado de Mark era preciosíssimo e tinha de ser celebrado sem esperas
ou incertezas. Deslizou os dedos pelo peito másculo e abriu os botões da camisa, tocando a pele arrepiada.
Sussurrando em seu ouvido, ele a encorajava, fazendo-a enlouquecer ao acariciar-lhe a orelha com a ponta da língua. Ao senti-lo deslizar as mãos em suas costas,
foi invadida por uma cascata de arrepios.
- Passei a noite toda imaginando como seria tocar sua pele... - murmurou, beijando-lhe o pescoço.
- Agora já sabe. - Vanessa aninhava-se cada vez mais junto dele.
Mark beijou-a sem reservas, devorando-a com uma febre selvagem. Quando o beijo tornou-se mais exigente, o táxi freou e o motorista pigarreou, interrompendo-os.
- Já chegamos - anunciou, com forte sotaque indiano.
Mark afastou-se depressa. Vanessa podia sentir as batidas do coração na garganta.
- Sim, aqui estamos.
O jeito com que Mark disse aquilo fez com que parecesse que ali era o melhor lugar do mundo. Haviam chegado a um ponto sem retorno.
Assim que pagou a corrida, ele a tomou pela mão para entrarem no prédio.
- Não posso caminhar - ela disse, entre beijos. - Minha sandália...
- Eu sei. - Mark deteve-se e a tomou no colo, outra vez subindo com agilidade os lances de escada.
Colocou-a no chão, com gentileza, ao chegarem ao terceiro andar. Sem conseguir ficar um segundo longe do calor do corpo sensual, trouxe-a para si.
A cada toque, uma nova descoberta o fazia estremecer. Parecia ser a primeira vez que tocava uma mulher, concluiu, espantado. Na realidade, era a primeira vez
que uma mulher o encantava daquela forma, indo muito além da atração física.
Vanessa gemeu de prazer quando ele entreabriu sua boca com a ponta da língua e percorreu os lábios com movimentos atrevidos. Nem na mais ousada fantasia poderia
imaginar que a realidade seria tão maravilhosa.
Ela sorriu, procurando os olhos azuis na luz fraca do corredor, e colou-se no corpo viril, num convite feminino e sutil.
Movido por uma urgência que já não podia mais controlar, Mark pressionou-a contra a parede. Com um movimento rápido, suspendeu-a e fez com que envolvesse as
pernas em sua cintura, favorecendo o máximo contato de suas anatomias.
- Não imagina como desejo fazer isto, desde o primeiro momento em que a vi... - Mark estava rouco de volúpia.
Vanessa achou que fosse incendiar bem ali, naquele corredor escuro. Foi preenchida por uma urgência que estava fora de seu controle ao sentir a masculinidade
pulsante, que revelava o quanto Mark a desejava. Adorava aquele homem, e não queria mais esconder a verdade. Precisava lhe mostrar o quanto o queria.
- Veja o que você faz comigo... - Mark pressionou corpo contra o dela, beijando-a com lascívia.
- Quero sentir mais... - Vanessa gemeu, movendo-se de encontro a ele. - Vamos entrar.
- Tem certeza do que está pedindo? - Mark hesitou por um segundo.
- Sim. Já perdemos muito tempo - sussurrou ao ouvido dele, deslizando a mão para o bolso da calça. - Onde está a chave?
- Chave? - repetiu, como se estivesse em outro planeta.
- Sim, a chave do apartamento.
Rápido, Mark encontrou a chave, abriu a porta e entrou no imóvel às escuras.
Porém, seus instintos de guerreiro entraram em alerta assim que acendeu as luzes. De imediato, puxou Vanessa para trás de si ao deparar com dois intrusos.
Podia senti-la tremer a suas costas, enquanto ajeitava a roupa ao redor de si.
- Oscar! Como você pôde?! - Indignada, Vanessa deu um passo à frente.
Mark engoliu em seco ao vê-la colocar as mãos na cintura e encarar os invasores.
Oscar não estava sozinho. Trouxera três seguranças consigo. Mark reconheceu um deles como sendo o que carregava a câmera no Central Park.
- Capitão Wilder, o rei não está satisfeito com os relatórios recentes - Oscar declarou, com frieza. - Sentimos que não podemos mais contar com você.
As palavras de Oscar deixaram Vanessa petrificada. O chefe de segurança de seu pai falava com Mark como se já o conhecesse.
- Relatórios? Que relatórios? - Ela voltou-se para ele, atônita.
A culpa refletida no belo semblante fez seu coração parar. Quando tornou a bater, Vanessa era uma nova mulher. Uma que acabara de sentir a dor de ser traída.
- Vanessa, escute... precisa me ouvir! Não foi idéia minha. Recebi ordens para protegê-la e enviar relatórios a seu pai. Ele estava preocupado com sua segurança.
- Mark tocou-a no braço, mas ela o afastou com violência.
- Entendo muito bem, capitão. - A voz assumiu um tom gelado e cortante. A transformação era completa, de uma garota apaixonada para uma princesa de gelo.
- Não, você não compreende... - Porém, Mark foi interrompido por Oscar.
- Se a princesa Vanessa diz que entendeu, posso garantir que é assim.
Mark o encarou, desejando esmurrá-lo.
De estatura pequena e maciça, o chefe da segurança tinha olhos negros e um bigode fino. O porte altivo e pomposo demonstrava que não hesitaria em usar a força,
se necessário.
- Não posso imaginar como permitiu que ela saísse com estas roupas! - continuou, censurando-o.
- Você foi longe demais, Oscar.
Ele baixou os olhos com falso remorso.
- Peço desculpas se a ofendi, Alteza, mas receio que o rei Leopold ficaria ainda mais ofendido ao saber de sua vestimenta.
- Então, ele contratou um fuzileiro naval para ser minha babá? - indagou, com ironia, e voltou-se para Mark. - Diga-me apenas uma coisa: Prudence sabe a respeito
disso?
- Não! - assegurou, enquanto fechava o último botão da camisa. - Ela não tem nada com essa história.
Vanessa olhou pela janela, fugindo do poderoso efeito que o movimento daquelas mãos ainda exerciam sobre ela. Sentia-se constrangida, humilhada, magoada, mas
não lhe daria o prazer de demonstrar.
- O rei grampeou o telefone na suíte do hotel, Vanessa. Quando você ligou para Prudence e contou sobre seu plano, ele ficou sabendo. Eu já havia concordado
em ficar com você quando o monarca contatou o Departamento de Estado e, através dele, a Marinha.
- Não acredito em você! - desafiou-o, erguendo o queixo. - Concordou em participar de meu plano apenas para me enganar!
- Alteza, o rei acha que já ficou muito em Nova York - Oscar inclinou a cabeça em uma mesura. - Pede que volte para suas obrigações em Volzemburg. Talvez fosse
melhor que visitasse seu cabeleireiro antes que seu pai a visse.
- Não se preocupe, esta cor é temporária. - Vanessa pensou, com tristeza, que seria ótimo que o sentimento que nutria por seu guarda-costas também fosse.
- Você não tem que fazer nada que não queira, Vanessa - Mark afirmou, com autoridade. - Não precisa ir embora, se não quiser.
- Capitão, obrigado por sua ajuda. Sua presença não é mais necessária daqui por diante - Oscar o dispensou, mas foi ignorado.
- Vanessa, escute...
- Por que deveria ouvi-lo? - Ela apanhou a corrente de prata que ganhara dele e jogou-a sobre a mesa de centro. - Por que deveria ouvir uma única palavra do
que você diz?
- Sinto muito se a decepcionei...
- "Decepção" é pouco para exprimir o que sinto. Por que isso, capitão? Alguém estava apontando uma arma em sua cabeça?
- Eu estava seguindo ordens.
- Ah, sim! O leal fuzileiro! Seguindo ordens, nada pessoal... Devia tê-lo ouvido no primeiro dia, quando falou que meu castelo de vidro poderia se quebrar
no mundo real.
- Tive de obedecer, Vanessa. Não podia contrariar meu superior imediato.
- Alteza, estamos perdendo tempo. - Oscar se mostrava impaciente.
- Eu não pedi para estar aqui - Mark continuou, encarando Vanessa.
Palavras erradas para se dizer, percebeu assim que as articulou. Podia sentir a tensão que emanava dela. Sentia-se pisando em um terreno minado pronto para
detonar, e foi o que aconteceu.
- Que pena que ficou encarregado desta terrível missão! - Os olhos verdes lançavam faíscas na direção dele. - Mas veja pelo lado bom: seu trabalho está concluído
agora.
- Não foi apenas um serviço. Você não é apenas isso.
- Aposto que diz isso para todas as princesas que protege! - Riu sem humor.
- Sei que está aborrecida agora...
- "Aborrecida" não chega nem perto do que estou sentindo!
- Tomamos a liberdade de fazer sua mala, Alteza - Oscar anunciou. - O jato particular está esperando. Se não se importa, temos de...
- Deixe que espere! - Mark quase gritou, enviando um olhar mortal que fez com que Oscar desse um passo para trás. - Você não tem o direito de levá-la contra
sua vontade.
- Claro que não... nós nunca... - Embaraçado, Oscar baixou a cabeça.
- Não há nada de importante aqui que queira levar comigo - Vanessa se dirigia a Oscar com polidez.
- Vanessa, não pode esquecer todos os sonhos e esperanças que revelou para mim - suplicou, numa tentativa desesperada de fazê-la mudar de idéia.
- Quais? Todos aqueles que você relatou a meu pai?!
A traição atravessou-a como um punhal cravado no coração. Ela o amava. Acreditara que encontrara o homem que a faria feliz. Entregara sua alma a ele, dissera
coisas que nunca revelara para mais ninguém. E Mark tinha coragem de falar sobre esperanças e sonhos, depois de tê-los pulverizado!
Confiara nele com toda a força de seu ser. Podia compreender agora por que, todas as noites, Mark se debruçava sobre o laptop, até de madrugada.
Seu próprio pai não se mostrava capaz de amá-la. Por que achava que Mark poderia? Talvez fosse com ela, vai ver tivesse algo que impossibilitasse alguém de
amá-la.
- Você queria viver uma vida que a completasse, em vez de deixá-la vazia, lembra-se?
- A princesa Vanessa tem uma vida plena - Oscar disse, ofendido. - Seu noivo está esperando por ela ansioso.
- Noivo?!
- Sebastian de Koonan é um de nossos mais respeitáveis cidadãos, capitão. A família dele tem ligações com a família real por gerações e gerações. É um magnata
bem-sucedido, um homem sofisticado e culto. Será um marido perfeito para nossa princesa.
Por que ela não dizia nada, apenas o olhava com aquele olhar gélido? Mark a fitava, suplicando para que dissesse que era mentira. Em vez disso, um abismo de
silêncio os separava.
- Por que não me disse nada, Vanessa?
- Minha vida pessoal não é de sua conta. Além do mais, acha que uma princesa como eu iria se interessar por um fuzileiro como você?
Mark recebeu aquilo como uma estocada mortal, o golpe de misericórdia que precisava para acabar com aquele sofrimento.
- Fui um idiota por sentir remorso em mentir para você, Alteza. Foi você quem me enganou até agora.
- Nós nos enganamos. - E Vanessa deu-lhe as costas, antes de sair com Oscar.
CAPÍTULO X

- Estou decepcionado com sua atuação, capitão.
- Sinto muito, senhor. - Mark manteve a cabeça erguida enquanto o tenente-coronel o fitava.
Tomara o primeiro vôo de Nova York e chegara a Quântico, Virgínia, as nove horas da manhã. Não dormira um segundo na noite anterior, depois que Vanessa partira.
Não importava. Um fuzileiro naval não precisava dormir. E também não precisava de amor... não do amor de uma princesa comprometida com outro homem.
Mark voltou a atenção para seu oficial superior, tenente-coronel Charles Wilkes.
- Sei que a imprensa oficial do rei e a guarda real flagraram você e a princesa numa situação... comprometedora.
- Na realidade, senhor, nós fomos até eles. - A voz de Mark era tão impessoal quanto seu uniforme. - Estavam nos esperando no apartamento.
"Prontos para nos devorar!", disse para si mesmo. A porta estava trancada quando ele e Vanessa chegaram, o que significava que os homens da segurança deviam
ter entrado com suas próprias chaves.
- A questão é: o que faremos agora?
- Não deixaremos que aconteça de novo, senhor - Mark respondeu, sempre impassível.
Não permitiria que seu coração confiasse de novo em uma mulher. Todo o tempo sentira-se culpado por mentir para Vanessa, sem saber que estava sendo enganado.
- Esperávamos mais de você, capitão.
Mark nem sequer piscava, embora a vergonha e a humilhação o corroessem. Decepcionara a Marinha e sua família. Carregaria o fracasso pelo resto de seus dias.
- Estou profundamente arrependido pelos erros que cometi.
- Ao menos a princesa retornou sã e salva para Volzemburg. Agora, ela não é mais problema da Marinha americana, mas sim do pai dela.
Mark desejou poder esquecer assim fácil quanto o tenente-coronel Charles. Vanessa brincara com ele como uma profissional, seduzindo-o e destruindo seu coração,
enquanto havia um milionário a sua espera. Que idiota fora!
Nunca deveria ter confiado naquela mulher. E pensar que ela o fizera questionar sua lealdade à Marinha... Chegara até a acreditar na possibilidade de abrir
sua empresa de segurança!
Sentia que sua cabeça acabara de sair de um misturador de concreto. Seus pensamentos giravam em uma massa pesada e densa.
- Sei que esta missão foi fora do comum, capitão. Você tem excelente reputação e, embora tenhamos de enfrentar um escândalo que a mídia vai aproveitar até
a última gota, cumpriu o objetivo principal e manteve a segurança da princesa.
- Obrigado, senhor.
O tenente-coronel o encarou, deixando transparecer a simpatia que nutria pelo capitão. Porém, nem mesmo a atitude benevolente fez com que se sentisse melhor.
- Sei que manteve o rei Leopold informado sobre suas atividades. Vi os e-mails que enviou, capitão Wilder. Foi um golpe de azar ter sido flagrado naquela situação
comprometedora. O rei deveria ter sido mais claro com relação aos compromissos matrimoniais da princesa. - O tenente-coronel pigarreou. - Tenho de adverti-lo por
ter se envolvido romântica ou sexualmente com a mulher que deveria proteger.
- Não houve envolvimento sexual, senhor - Mark afirmou, de imediato.
- Fico aliviado em sabê-lo. - Tossiu, constrangido, e prosseguiu: - Como dizia, é uma missão muitíssimo incomum, e estou contente por ter acabado bem. Esse
tipo de coisa deve ser feito pelo pessoal do Departamento de Estado. Não temos treinamento suficiente na Marinha.
- Concordo, senhor.
- Tire duas semanas de férias antes de voltar a suas atribuições. Certo, capitão?
- Afirmativo, senhor.
- Ah, já ia me esquecendo! - Wilkes estendeu-lhe um envelope com o selo real. - Isto é para você.
Mark fez uma continência e deixou a sala do oficial. Seu desconforto aumentou depois de abrir o envelope. Encontrou um cheque da princesa Vanessa Alexandria
Maria Teresa Von Volzemburg.
Furioso, rasgou-o e jogou os pedaços na lata de lixo. Não precisava de seu dinheiro. Precisava de seu amor!

- Por que tem de tornar tudo ainda mais difícil para o rei? - já perdera a conta de quantas vezes ouvira isso.
Vanessa já ouvira recriminações de Oscar durante todo o vôo para casa, na véspera. Não precisava ouvir também de sua irmã.
- Anna, por favor, deixe-me em paz! - pediu, antes de mergulhar numa confortável poltrona.
Estavam no salão azul, um de seus ambientes favoritos no palácio. Ao entardecer, o sol refletia-se nos espelhos de cristal, projetando um caleidoscópio sobre
as paredes brancas. A mobília, em estilo rococó, recebia tratamento especial pela equipe de limpeza da Corte.
Mas, naquele dia, a rica decoração parecia sufocá-la, e a irmã contribuía para seu mal-estar. Apenas dezoito meses mais nova que Vanessa, Anna era pequena
e frágil como a mãe delas. Também tinha olhos verdes e cabelos loiros, mas, como Vanessa costumava dizer, eram mais obedientes. Parecia nunca ter um fio fora do
lugar.
Anna gostava das obrigações reais. Tinha espírito de liderança e podia ser tão maquiavélica quanto o pai quando se tratava de questões políticas.
- Não consigo entender como pôde ser tão rude com Sebastian - Anna dizia, insistindo em aborrecê-la. - Sua última escapada deixou papai desapontadíssimo.
- Então, estamos empatados, porque o comportamento dele também me deixa muito zangada.
Anna franziu as sobrancelhas.
- Você passou muito tempo na América, minha irmã. Está começando a parecer...
- ...uma pessoa de carne e osso?
- Uma pessoa comum, para usar um eufemismo.
- Anna, somos muito diferentes. Sabe muito bem que nunca desejei tornar-me rainha. - Vanessa tomou as mãos da irmã entre as suas. - Como gostaria que você
assumisse o trono! Seria uma rainha perfeita! Além disso, poderia se casar com Sebastian.
Anna pestanejou, com lágrimas nos olhos. A reação emocional pegou Vanessa de surpresa.
- Querida, por que está chorando? Sabe que é verdade. Você teria um futuro muito melhor como rainha. É mais obediente, mais disciplinada, e tem um talento
natural para governar.
Anna secou as lágrimas e a fitou, voltando a assumir o autocontrole.
- Está vendo? Esse é o olhar perfeito para uma rainha!
- Posso ser mais parecida com mamãe, mas você herdou seu espírito de liberdade.
- Ela foi uma rainha mais que perfeita. Gostaria de ser metade do que mamãe era, mas isso não aconteceu. - Vanessa deu de ombros, resignada. - Não consigo
aceitar determinadas atribuições, como me casar com alguém que não amo.
Vanessa levantou-se e caminhou até a janela.
- Não me casarei com Sebastian, Anna. Não importa o que papai dirá. O tempo em que um rei podia obrigar a filha a cumprir sua vontade já passou. Mamãe nunca
teria aprovado. Ela e papai se casaram porque estavam apaixonados, e quero que o mesmo aconteça comigo.
Anna caminhou até Vanessa e a encarou.
- Está apaixonada pelo fuzileiro naval?
O coração de Vanessa disparou quando ouviu aquela simples referência a Mark. Quando julgara que não poderia se machucar mais do que já acontecera, uma dor
profunda pareceu cortar seu peito como um punhal.
- Por que essa súbita curiosidade sobre minha vida amorosa? - inquiriu.
- Vanessa, não é adequado tratar Sebastian como você fez - Anna lembrou.
- Se está tão preocupada, por que não se casa com ele em meu lugar?
- Bem que eu gostaria! - confessou, corando a até raiz dos cabelos. - Mas ele nem nota que existo.
Vanessa arregalou os olhos, espantada, sua irmã amava Sebastian?
- Ah, minha querida, sinto muito! Não tinha idéia de que estava apaixonada.
Surpresa e sensibilizada, Vanessa viu a irmã cair em um pranto intenso. Abraçou-a e deixou que suas próprias lágrimas fluíssem. Chorou por sua irmã, por si
mesma, pelos sonhos destruídos, por Mark não amá-la como o amava.
Como pudera ter sido tão tola? Não significava nada além de "uma missão" para ele.
- Desculpe-me, Altezas. - Celeste estacou ao ver as irmãs abraçadas, chorando como duas crianças. - Não queria interromper...
- Está tudo bem, Celeste. Anna e eu estamos ficando loucas por causa dos homens. - Vanessa soluçou, enxugando o rosto.
- Oh, eles são todos iguais!
- Você também?! - a princesa indagou, espantada.
- Como Abraham pôde me tratar daquela forma? Pensei que gostasse de mim, mas estava apenas participando da operação!
Traição. Vanessa conhecia bem como aquilo doía. Fora traída pelo único homem que a fizera se sentir segura e amada. Mas tudo não passava de um engano. Mark
apenas cumpria ordens. Por sinal, emitidas por seu pai.
Sim, os homens eram todos iguais!

Os pais de Mark o esperavam no Aeroporto de Phoenix.
Depois de se aposentar, Bill Wilder mudara-se com a esposa para o Arizona, onde se dedicava ao golfe, e a mãe de Mark freqüentava um curso regular em uma universidade
para a terceira idade.
- Não precisavam ter vindo me buscar - disse Mark, ao vê-los no portão de desembarque. - Eu poderia ter alugado um carro.
Recebeu o abraço afetuoso da mãe, enquanto o pai mantinha a distância habitual.
- Então, acabou virando babá daquela princesa, hein?
- Bill, ele mal acabou de descer do avião! Espere alguns minutos antes de bombardeá-lo com seus comentários sarcásticos - a velha senhora aparteou.
- Eu? Era você quem estava preocupada que a adorável princesa levasse o coração de seu filho!
- Oh, pare com isso! - Ela tomou o braço do marido e sorriu. - Não era preocupação. Encontrei Vanessa no casamento de Joe, e ela me pareceu muito agradável.
O som daquele nome fez Mark gelar. Recusava-se a pensar nela. Passara horas com aquele estúpido pingente de prata que ela deixara sobre a mesa, pensando em
como as coisas poderiam ter sido, imaginando o que Vanessa estaria fazendo naquele momento... temendo que tivesse encontrado Sebastian.
Depois que ela foi embora, quase atirou o presente que lhe dera contra a parede para quebrá-lo em mil pedaços, da mesma forma como ela fizera com seu coração.
Em vez disso, entretanto, guardou-o na mochila, junto com as peças de roupa que a princesa não quisera levar.
Sentira-se um idiota ao abraçar a camiseta com a inscrição "I Love NY", com a qual Vanessa costumava dormir. Ainda conservava o perfume doce e delicado de
sua princesa.
Precisava esquecer Vanessa, ordenou a si mesmo. Tentou prestar atenção ao que seus pais diziam, mas não foi capaz.
Como seria se decidisse sair da Marinha?, indagava-se, ao estudar a estrada que levava à residência dos pais.
Seu estômago se apertou. Era um fuzileiro naval, treinado para tomar decisões em segundos e enfrentar qualquer obstáculo, e lá estava ele, frágil e inseguro,
frustrado e indeciso a respeito de seu próprio porvir.
A verdade era que nada parecia importar desde que Vanessa partira.

Naquela tarde, Mark foi para o sótão, onde conservava o velho saco de areia que usava para treinar boxe.
Suas emoções oscilavam sem parar. Naquele momento, estava furioso com Vanessa por tê-lo feito de tolo. Como pudera ter sido tão idiota?!
Descarregou toda sua fúria golpeando com tanta força que se podia ouvir a dois quarteirões.
- Quer se acalmar por um minuto e me dizer por que está tão aborrecido? - ouviu o pai falar, atrás de si.
Pegou a toalha que Bill lhe estendia e enxugou o rosto, sentando-se na cadeira de balanços que acompanhava a família desde que era pequeno.
- Você nunca me disse o que achou quando me tornei fuzileiro naval, pai. Por quê?
- O que é isso agora? - Bill franziu o cenho.
- Os Wilder têm uma longa tradição na Marinha. Você sempre se mostrou orgulhoso de meus irmãos, mas nunca elogiou meu desempenho.
Bill permaneceu em silêncio, fitando-o sem pestanejar.
- O que diria se eu abandonasse a Marinha, pai?
- Não diga bobagem! - Bill Wilder fez um gesto brusco com a mão.
- Posso querer outra coisa para mim.
- Além da Marinha?! - Bill exclamou, horrorizado. - De onde tirou essa idéia maluca? Aquela princesa moeu seu cérebro?
- Não, papai. Ela me odeia.
- Então é uma moça idiota, seja princesa ou não! - Bill indignou-se. - Se não pode ver o homem digno e honrado que você é, azar o dela!
- Ainda não respondeu ao que perguntei, pai. Quando lhe falei que queria me tornar fuzileiro, não me endereçou uma única palavra de apoio, como fez com meus
irmãos.
Bill respirou fundo e olhou Mark direto nos olhos.
- Filho, acredito que tenha sido a reação de um pai receoso de que seu filho achasse que ser oficial da Marinha não fosse bom o bastante para ele... assim
como seu pai não fora bom o bastante.
Mark o encarou, incrédulo.
- Como pode dizer uma coisa dessas? Queria apenas que você ficasse orgulhoso de mim. Quis sempre ser o melhor, como você foi!
- Filho, tenho muito orgulho de você. Mesmo quando faz alguma coisa cretina, como se apaixonar por aquela princesa.
- Eu não me... - Mark não conseguiu terminar a frase. Bill, meneando a cabeça, sorria.
- Acho que está na hora de tomarmos uma cerveja.
- Esqueça a cerveja! - Mark passou o braço pelo ombro do pai, como não fazia havia muito tempo. - Preciso de uma dose de uísque!

- Não posso acreditar que você tenha sido tola o bastante para se apaixonar por aquele fuzileiro!
Anna ainda estava com os olhos inchados, de tanto chorar no dia anterior.
Vanessa fugira para seus aposentos privativos no palácio e tentava se manter ocupada arrumando o closet, mas a irmã a seguira. Ambas evitavam encontrar Sebastian,
que acabara de chegar.
Aquela ala era conhecida como "Ala da rainha Adriana", nomeada depois de um dos mais famosos reis de Volzemburg, na era vitoriana. Adriana fora uma rainha
maravilhosa, mas seu gosto para a decoração era péssimo. As paredes, cobertas de veludo vermelho, e a mobília pesada e escura emprestavam um aspecto sóbrio e triste
ao ambiente.
Vanessa teve de se mudar para lá depois da morte da mãe. A tradição dizia que, em seu décimo sexto aniversário, o herdeiro do trono deveria ocupar aqueles
cômodos. Mas ele lhe provocava pesadelos.
- Mes enfantsl - A condessa Desiree Dupret-Koning-Bernini fez uma entrada triunfal.
A madrinha de Vanessa usava cabelos curtos, no mais moderno estilo europeu, e vestia-se com extravagância. Era prima do rei Leopold, e a única pessoa no planeta
capaz de intimidá-lo. Não aparecia com freqüência no palácio, por isso Vanessa não a via desde seu aniversário de vinte e dois anos.
- Querida, sua madrinha chegou! A diversão acaba de começar!
Vanessa e Anna olharam para ela sem esboçar um sorriso sequer.
- Por que esses rostinhos tristes, mignonnes? - quis saber, estalando um beijo na face de cada uma. - O que seu terrível pai aprontou desta vez?
- Quer que eu me case com Sebastian, mas não o amo. - Vanessa suspirou.
- Ela está apaixonada por um fuzileiro naval, titia!
- E Anna está apaixonada por Sebastian - Vanessa completou.
- Ah... - Desiree meneou a cabeça. - Então, o assunto é amor... Naturellement, algo de grande importância!
Desiree estava no terceiro casamento, e seu atual marido era um conde italiano. Viviam em um palazzo na cidade de Veneza, mas passavam a maior parte do tempo
viajando.
- O que está fazendo aqui? - Vanessa perguntou, curiosa.
- Vim organizar o baile de máscaras para comemorar o aniversário de Leopold. - A condessa acomodou-se com elegância ao lado dela. - Mas isso não importa. Quero
saber tudo sobre o fuzileiro naval.
Vanessa sentiu as lágrimas inundando-lhe os olhos, mas engoliu-as. Recusava-se a continuar sofrendo por Mark.
- É apenas alguém que papai encarregou de me espionar enquanto estava em Nova York.
- Espionar? - Desiree repetiu, com uma risada. - Querida, Leopold estava sendo cuidadoso. Ele se preocupa com o protocolo real.
- Pouco me importa o protocolo real! - Vanessa afirmou, com desdém, furiosa com a madrinha por estar defendendo seu pai. - Quero mais do que isso. Pretendo
desenvolver um projeto para cuidar de crianças inocentes, que não podem cuidar de si mesmas.
- E por que não leva esse projeto avante? - Desiree tomou as mãos da afilhada. - Ninguém mais cuidará de sua felicidade a não ser você mesma, meu bem.

- Mark, vou matá-lo!
- Também te amo, Prudence - disse ele, ao atender ao telefone, reconhecendo a voz da cunhada. - Como sabia que eu estava aqui
- Liguei para sua mãe ontem - resumiu, prosseguindo, zangada: - Como pôde espionar Vanessa daquela forma?
- Ela lhe contou?
- É claro que sim! Achei que podia confiar em você, Mark - ela disparou.
- Em primeiro lugar, você não devia ter me envolvido nessa história. Em segundo, sabe que eu estava apenas seguindo ordens.
Prudence respirou fundo, resmungando alguma coisa que ele ignorou.
- O rei Leopold havia mandado grampear o telefone da suíte, como faz sempre que a filha viaja. É uma medida de segurança usual, Prudence. O problema foi que
o rei soube do plano que Vanessa lhe contou, e chamou o Departamento de Estado. Eles entraram em contato com a Marinha, e foi assim que passei a fazer parte do plano.
Não foi idéia minha. Apenas obedeci a meus superiores.
- Você devia ter recusado!
- Acha que é tão simples recusar a ordem de um rei? Isso poderia causar um incidente internacional. Além do mais, sua amiga princesa não é tão honesta quanto
parece.
- O que quer dizer com isso?
- Que ela omitiu o fato de estar noiva!
- Ah, está se referindo a Sebastian?
O estômago de Mark se contraiu.
- Você sabia, e não me avisou?!
- Vanessa não está noiva de Sebastian. Certo, o rei Leopold quer que se casem, mas ela não vai obedecê-lo.
- Não foi o que ela me falou.
- Não sei o que lhe falou, mas a verdade é que Vanessa não ama Sebastian. Não há como se casar com ele.
Pela primeira vez, um lampejo de esperança iluminou os olhos de Mark.
- Então, por que não comentou nada quando o chefe da segurança mencionou o casamento? - Mark indagou, relutando em acreditar.
- Porque, na certa, preferia que você achasse que era uma princesa entediada brincando com seus sentimentos - Prudence revelou, como se fosse a coisa mais
óbvia do mundo. - Como imagina que um membro da realeza lida com as emoções? Não é fácil para Vanessa admitir que está apaixonada por você.
- Ela... lhe disse que está apaixonada? - Mark prendeu a respiração, receando que fosse explodir de felicidade.
- Não precisava dizer. Eu a conheço. Você a deixou com o coração partido.
A angústia tomou lugar da raiva que o consumia, ao se dar conta do quanto devia ter magoado Vanessa.
- Eu me arrependo muito mais do que possa imaginar, Prudence.
- O que ela representa para você? - Prudence foi direto ao ponto, como lhe era habitual. Sempre falava sem rodeios - Apenas uma operação especial da Marinha?
- Não! - ele quase gritou. - Eu a amo!
- Então...
Prudence não precisou concluir a frase. Era evidente que entendera o que estava acontecendo.
- Não é assim tão fácil, Pru. Vanessa é uma princesa. Tem tudo o que quer. O que eu poderia lhe oferecer?
- O que há de mais valioso para uma mulher - Prudence disse, com muita gentileza, mas firme o bastante para fazê-lo ouvir. - Amor. Vanessa tem procurado por
isso durante toda sua existência.
Deixou que Mark refletisse sobre aquela revelação, antes de prosseguir:
- Você é destemido o bastante para procurá-la e revelar o que sente, Mark?


CAPÍTULO XI

Cansada de ouvir Oscar dizer que o rei estava muito ocupado para falar com ela, Vanessa invadiu o salão esmeralda, interrompendo o desjejum do pai.
- Desculpe-me por minha atitude intempestiva, papai, mas preciso conversar com você.
- Sente-se, filha. Foi bom ter vindo até aqui, eu também preciso lhe falar. - Apontou para uma cadeira a seu lado, pedindo que sentasse. - Oscar me comunicou
qualquer coisa sobre uma fundação que você pretende dirigir... Que bobagem é essa, Vanessa?
- Venho tentado lhe dizer, mas você não ouve. E não é bobagem! Pretendo me dedicar a uma causa nobre, papai.
- E seu casamento com Sebastian? Consultou-o antes de levar avante esta idéia maluca?
- Não é uma idéia maluca, e não falei com Sebastian porque não lhe diz respeito.
Vanessa fitou seu quadro favorito, uma paisagem de campo inglesa em óleo sobre tela, tentando manter a compostura diante da autoridade paterna. A pintura era
uma das favoritas da mãe.
- Como não?! Ele é seu noivo!
- Nunca oficializamos o noivado. - Vanessa desviou-se do quadro para um ponto indefinido na parede.
- O que isso tem a ver com aquele marinheiro que você beijou no Central Park?
- Fuzileiro naval. O que ele... - Encarou-o, atônita. - Como sabe que eu beijei quem quer que seja no Central Park? Havia alguém nos espionando?
Lembrou-se de que Mark suspeitara que alguém os observava, naquela ocasião. Ele estava certo, pensou, furiosa.
- É óbvio que arranjei para que alguém protegesse minha filha.
- E quem me protegerá de você, papai? Pode responder a essa pergunta?!
- Sou seu pai e seu rei! Não precisa de proteção contra mim! - ele exclamou.
- Sim, preciso - disse, com mais tristeza do que raiva - Porque você é mais rei do que pai. Não está cuidando de sua filha, está apenas protegendo sua própria
visão do futuro que planejou para mim. Será tão difícil perceber? Não vê o que está fazendo comigo?!
Pela primeira vez desde que a mãe morrera, Vanessa deixou que as emoções viessem à tona diante de Leopold. Não tentou conter o pranto, que brotava em seus
olhos, nem evitou encará-lo quando o rei demonstrou espanto com sua reação emocional. Mas a expressão abrandou-se depois fitá-la por alguns minutos.
- Fiz isso por você. É minha filha mais velha, um dia será a herdeira do trono.
- É por isso que seria melhor que Anna recebesse a coroa em meu lugar.
- Impossível!
- Não, não é. Já aconteceu antes. Desiree pesquisou para mim. Ela me explicou que a rainha Adriana era a segunda filha. Os livros de história não revelam,
mas minha madrinha procurou nos documentos familiares. A irmã mais velha era Cristina.
- Cristina dedicou-se a uma instituição infantil. É isso o que pensa fazer?
- Assim como Cristina, pretendo me dedicar a uma causa nobre. E, se me tornar rainha, não poderei me realizar naquilo de que tanto gosto. Anna deve ser a rainha.
Você sabe que é perfeita, e ela poderá se casar com Sebastian. - Vanessa parou para respirar. - Será melhor para nós duas, papai. E também para a coroa de Volzemburg.
- Já conversou com Anna a respeito disso?
- Queria falar com você primeiro. Papai, lamento por tê-lo desapontado por todos estes anos - sussurrou, a voz embargada pela emoção. - Esforcei-me muito para
ser a filha que você gostaria que eu fosse...
Os olhos do rei Leopold se enevoaram, revelando uma melancolia que ela nunca vira.
- Parece-se muito com sua mãe, minha filha.
- Gostaria de ser parecida com mamãe, mas não sou.
- É sim, é tão independente quanto ela. Quando estava grávida, Helen teve sérias complicações e, mesmo sabendo que temos excelentes médicos em Volzemburg,
quis voltar para casa. Não pude convencê-la a ficar aqui. Sua mãe era muito determinada, quando punha uma coisa na cabeça, ninguém a fazia desistir. Sim, você é
muito parecida com minha Helen.
- Como conseguiu assumir as atribuições de rainha?
- Porque me amava. Fez por mim. Achei que talvez você pudesse amar Sebastian, e então abriria mão de sua da independência em nome do amor. Mas, em vez disso,
se apaixonou por um oficial americano.
- Eu não...
- Conheço-a bem, Vanessa - o rei a fez calar-se com um gesto decidido. - Não estaria beijando um homem em público se não tivesse fortes sentimentos por ele.
- Mark não vem ao caso, papai. Estarei muito ocupada ajudando as crianças para pensar nele. Pretendo arrecadar uma grande quantia, em breve.
O rei Leopold a observou por longos minutos, refletindo sobre o que Vanessa dissera, e então propôs:
- Por que não aproveita para solicitar doações no baile de máscaras neste fim de semana?
Surpresa com a sugestão, Vanessa o encarou.
- Mas o baile é para celebrar seu aniversário.
- Bem, por que não matar dois pássaros com um só tiro? Podemos celebrar o aniversário e arrecadar verbas para a fundação.
Vanessa ergueu uma sobrancelha, desconfiada.
- Está fazendo isso julgando que mudarei de idéia sobre passar a coroa para Anna?
- Não, faço porque acho que é justo. Eu já havia notado que Anna está apaixonada por Sebastian. - Segurou as mãos de Vanessa, com uma ternura de que ela não
se lembrava mais. - Ainda é tempo de corrigir meus erros. Conversarei com sua irmã. Mesmo que você não acredite, amo minhas duas filhas do mesmo modo. Lamento por
julgar que me desapontou, Vanessa. Como acabou de dizer, eu não a olhava como pai, e sim como rei. Nenhum pai poderia se queixar de uma filha adorável como você.
A declaração emocionada levou-a às lágrimas, enquanto seu pai a puxava para si, num abraço afetuoso.
- Amo você, papai! - ouviu-se dizer as palavras que não pronunciava desde que era a criança.
- Eu... - O rei Leopold acariciou os fios dourados com mãos trêmulas e afastou uma mecha rebelde dos olhos dela. - ...também te amo, querida.

- Cuidado ao acender os candelabros! - Desiree gritou, com seu costumeiro gosto pelo drama, enquanto atravessava o salão de bailes.
Depois de cuidar dos últimos preparativos e certificar-se de que a festa seria perfeita, subiu para os aposentos de Vanessa e a encontrou conversando com a
irmã.
- Bem, mes enfants, vocês estão maravilhosas! Esses vestidos estão simplesmente divinos.
Dessa vez, Desiree não havia exagerado. Vanessa e Anna pareciam princesas de contos de fada. Fariam com que Cinderela se sentisse humilhada.
Vanessa usava um vestido branco, com uma tiara de diamantes prendendo duas mechas. As jóias reais sobre a pele alva pareciam ainda mais valiosas.
- Você não acha que estou um pouco exagerada? - Anna avaliou seu reflexo no espelho, indecisa.
- De maneira alguma! - Desiree correu até ela, arrastando-a para longe do espelho. - Quer chamar a atenção de Sebastian, certo?
- Acho que não será preciso nada além do anúncio que meu pai fará esta noite... - Vanessa trocou um olhar cúmplice com a irmã.
- Por que não está usando máscara? - Anna quis saber, ajeitando a máscara cravejada de pequenos diamantes sobre os olhos.
- E cobrir este rostinho lindo? Jamais, meu bem! - Desiree disse, com afetação, fazendo-as rir. - Vamos, meninas! Os convidados já chegaram. Temos de fazer
nossa grande entrada!
As três se posicionaram no topo da escada que levava ao salão real, enquanto os trompetes ecoavam, anunciando sua chegada.
- Princesa Vanessa Von Volzemburg, princesa Anna Von Volzemburg e condessa Desiree Dupres-Koning-Bernini - o arauto real anunciou.
E elas começaram a descer, com toda a graça, as escadarias de mármore.

- Tem certeza de que vai dar certo? - O dr. Rosenthal falava com Mark, em frente ao castelo de Saint Kristoff.
Estudou a fachada imponente. O palácio, bem como algumas construções residenciais e a capela, ficavam protegidos pelas imensas muralhas. Deslumbrado com as
torres e colunas erigidas com elegância, tendo o céu como fundo, sentiu-se num livro de histórias infantis.
Intimidado pela imponência do castelo, Mark hesitou. O que poderia oferecer a uma mulher que vivia num lugar como aquele?
Amor, decidiu. Amor verdadeiro. E rezava para que fosse o bastante.
- Acredita que pode simplesmente entrar na festa do rei? - Abraham coçou a cabeça, começando a se arrepender por ter ido.
- Não pedi que viesse comigo. - Mark estacionou o carro que alugara. - Foi você quem insistiu em vir.
- Achei que pudesse precisar de retaguarda.
- Hum... Ou ficou encantado com a dama de companhia de Vanessa? Não se esqueça de que Celeste pode não ficar tão feliz em vê-lo.
- Vanessa também pode não ficar satisfeita em tê-lo aqui, meu caro! - Abraham contra-atacou com um sorriso de desafio.
- Bem, prefiro correr o risco.
- Tem algum plano?
- Planos nunca funcionam quando Vanessa está em questão. Terei de improvisar.
- E o que vai dizer a ela?
- Apenas serei honesto. Agora, dê-me a corda. Vamos escalar os muros.
Abraham tremia ao pular no terraço da torre mais alta do castelo. Ainda estava espantado com a facilidade com que Mark havia empreendido a escalada, para depois
puxá-lo. Conseguiram driblar a segurança com facilidade.
Mark recolhia a corda, quando uma mulher alta, com um extravagante vestido rosa-choque, deu um grito horrorizado ao surpreendê-los.
- O que está fazendo aqui, madame? - indagou, tenso.
- O rei não permite fumar no palácio. - Ela se aproximou, estreitando os olhos para observá-lo. - Você é o marinheiro de Vanessa, não é?
Mark não queria admitir nada que pudesse comprometê-lo. Não quando chegara tão perto.
- Fomos convidados para a festa, mas nos perdemos.
- Oh... É por isso que está usando essa roupa de camuflagem?
Mark arrependeu-se por não estar com seu uniforme de gala, que deixara no carro.
- É um baile de máscaras, não é?
- Sim, e não à fantasia! Do que está vestido, afinal? De príncipe guerreiro?
- Não sou príncipe - informou, com impaciência.
Planejara entrar o mais rápido possível, mas aquela mulher soprando fumaça em seu rosto estava atrapalhando a ação.
- Não se iluda, meu rapaz! Para Vanessa, você é o príncipe encantado. - Sorriu com simpatia. - Esses olhos azuis são inconfundíveis, capitão Wilder. E seu
amigo deve ser o bom dr. Rosenthal. Estou encantada em conhecê-los!
Abraham se aproximou e a cumprimentou com uma mesura educada.
- Sou madrinha de Vanessa, e devo dizer que você demorou muito para chegar.
- Vim o mais rápido que pude.
- Bem, de todo modo temos de livrá-los desse disfarce ridículo. Sigam-me!
Desiree marchou para dentro da sala. Ao se voltar, não encontrou ninguém atrás dela. Os dois americanos haviam desaparecido.

Vanessa observava Sebastian dançando com Anna. Não havia dúvida de que combinavam. Ele a olhava como se a visse pela primeira vez. Tinha certeza de que seriam
felizes juntos.
Sua irmã estava radiante. Assumir a posição de rainha do trono trouxe-lhe confiança e alegria.
- Bem, querida, como se sente depois de ter passado o trono para Anna? - o rei Leopold indagou, juntando-se a ela.
- Ótima, papai. Mas sentirei falta do chocolate que o confeiteiro fazia especialmente para mim.
- Não se preocupe, providenciarei para que sempre tenha acesso ilimitado. Você ainda é uma princesa, afinal.
- Sim, uma princesa dedicada ao trabalho.
- Sempre trabalhou com afinco.
- Mas agora meus esforços terão outro sentido. A noite foi melhor do que eu podia imaginar. Conseguimos um milhão de dólares para ajudar os orfanatos.
- E ainda não acabou.
- É verdade, ainda temos de cortar o bolo.
Os garçons serviam champanhe em taças de cristal enquanto a orquestra tocava Vivaldi.
Vanessa se movia com graça e elegância pelo salão vitoriano, recusando, muito educada, todos os convites para dançar. De repente, seu coração parou.
Em meio ao ambiente repleto, refletido nos espelhos de cristal, viu um homem vestido com o uniforme da Marinha americana.
Mark! Ele viera!
Segurando a barra do vestido, abriu caminho por entre os casais que dançavam, e tocou-o no ombro.
Porém, quando o rapaz se virou, percebeu seu erro. Aquele homem era menor e mais gordo. E o uniforme era apenas uma fantasia. A verdade era que não havia a
menor semelhança entre eles!
- Perdoe-me... - murmurou, desolada.
O desapontamento foi tão profundo que todas as luzes pareceram se apagar. O vazio que invadiu sua alma fez com que seus olhos ficassem marejados.
Saiu correndo do salão de baile antes que alguém a visse chorar. Ao chegar ao jardim, o salto de sua sandália se enroscou no gramado, como acontecera quando
caminhava no Central Park. Só que, dessa vez, não tinha os braços fortes de Mark para ampará-la.
Talvez tivesse sido muito dura com ele. Mark estava apenas seguindo ordens. De fato, concordara em ajudá-la antes de saber que fora designado para a missão.
E ela não acreditara nele.
Engolindo o pranto, caminhou por entre o exuberante jardim. Inalou o suave perfume das rosas, tentando pôr de lado a tristeza.
- Perdeu alguma coisa, princesa?
Aquela voz... Seu coração quase parou de bater de novo. Não podia ser... Voltou-se bem devagar, rezando para não estar delirando.
Mark! Vestia um imponente uniforme de gala azul-marinho, com botões dourados, que faziam com que os maravilhosos olhos azuis iluminassem a noite.
- O que está fazendo aqui? - balbuciou as primeiras palavras que lhe ocorreram.
- Estou procurando por você. Depois de escalar as paredes do castelo e passar pela segurança que, por sinal, precisa ser melhorada, encontrei sua madrinha,
que me convenceu a tirar a ridícula roupa camuflada. Voltamos para o carro, eu e Abraham, e nos trocamos. Por fim, conseguimos entrar no salão, e ele encontrou Celeste,
mas você havia sumido. Há centenas de pessoas lá dentro, e a maioria está usando máscara. A verdade é que senti um desejo inexplicável de vir para o jardim e...
Ufa!
Mark exclamou, quase sem ar. Vanessa nunca o vira falar tanto.
- Vamos começar tudo de novo - propôs, com um sorriso que a fez derreter. - Perdeu alguma coisa, princesa?
"Sim: minha alma", seria a resposta certa. Mas ela não conseguiu articular uma sílaba sequer ao vê-lo se ajoelhar e segurar sua mão, enquanto retirava do bolso
uma pequena caixa de veludo azul.
- Não trouxe o sapato de cristal, nem sou o príncipe encantado. - Mark ergueu a tampa e retirou a corrente de prata que ela deixara em Nova York. - Mas eu
te amo e quero me casar com você.
Vanessa teve vontade de se beliscar para ter certeza de que não estava sonhando.
- Sinto muito por tê-la decepcionado. - Mark estava muito emocionado: - Não há palavras para expressar o quanto lamento. Por favor, me perdoe.
Incapaz de falar, Vanessa apenas meneou a cabeça.
- Traí sua confiança e, mesmo que me perdoe, eu nunca vou me perdoar. Um fuzileiro naval não deve...
- Capitão? - interrompeu-o, com um sorriso provocante. - Você está começando a agir como fuzileiro de novo.
- Um fuzileiro apaixonado por uma princesa.
- Sou uma princesa, sim, mas abdiquei do trono em favor de minha irmã.
- Por quê? - Perplexo, Mark se ergueu e a encarou.
- Anna será melhor rainha que eu - foi a resposta direta e objetiva.
- Foi por minha causa? - Mark quis saber, consumido pela culpa. - Eu sabia, aquele escândalo que a imprensa...
- Tomei a melhor decisão, Mark. Estava farta de fingir ser alguém que não sou, de ter uma vida vazia e fútil. Não posso mudar meu passado, mas meu futuro,
sim, e é o que farei. Inaugurei uma fundação para crianças carentes, e estou muito feliz.
Um brilho de orgulho iluminou as pupilas de Mark. Vanessa não era mais a princesa que conhecerá. Tornara-se uma mulher forte, que segurava as rédeas de sua
existência, fugindo do destino traçado por seu pai.
- Ainda quer se casar comigo? - perguntou, insegura, olhando-o com atenção.
- Afirmativo, princesa. - Ele a fez sorrir ao simular uma continência. - Também não posso mudar o que houve, mas quero que você esteja em meu porvir. Não pretendo
ficar na Marinha pelo resto de meus dias.
- Mas você sempre foi fuzileiro.
- E você sempre foi uma princesa.
- Na verdade, ainda sou, Mark. Só não assumirei o trono.
- Na verdade, ainda sou fuzileiro - imitou-a.
- E o que pretende fazer? - ela quis saber.
- Esperar que aceite meu pedido. E então, contar sobre meu sonho de abrir uma empresa de segurança.
O rosto de Vanessa se iluminou ainda mais ao ouvir aquilo.
- Podemos trabalhar juntos! - exclamou, excitada. - Você sabe tudo a respeito de segurança, e eu, sobre etiqueta e diplomacia. Podemos interagir com os diplomatas
que vivem na América do Norte, e poderei abrir a sede da fundação em Nova York!
- Antes que você contrate os funcionários, importa-se de dizer se aceita ou não meu pedido? - Mark a interrompeu com um sorriso largo. - Ou devo entregar-lhe
um anel e pedir sua mão ao rei?
- Não preciso de um anel, preciso de você!
- Isso quer dizer que... sim?
- Sim, quero me casar com você, capitão Mark Wilder! Espero que saiba o que está fazendo, porque não pretendo voltar atrás.
- Um fuzileiro nunca volta atrás, madame.
Tomando-a nos braços, Mark mergulhou os dedos nos fios dourados dos cabelos perfumados, e sua boca encontrou a dela, num beijo que valia por uma vida... o
beijo de um homem que poderia lhe dar o que mais queria: o amor verdadeiro.


EPÍLOGO

Quatro meses depois...

- Tem certeza de que esse colar combina com o vestido de noiva? - Desiree insistiu mais uma vez.
Vanessa tocou a corrente de prata e sorriu.
- Certeza absoluta, madrinha!
- Este palácio é maravilhoso! - Prudence comentou com um suspiro. - Mas acho que é um pouco grande para mim.
- Para mim também. - Vanessa sorriu. - Mark encontrou uma casa adorável na Virgínia. Não vejo a hora de me mudar para lá.
- Não a culpo por estar apaixonada por ele. Os homens da família Wilder são irresistíveis.
- Prudence, desconfio de que você fez de tudo para que nos tornássemos concunhadas.
- Esperava que vocês se entendessem na festa de meu casamento, mas, quando vi que se ignoraram, concluí que teria de entrar em ação.
- Ela sempre foi assim - Anna disse, enquanto abotoava um magnífico colar de pérolas. - Sempre desprezou seus súditos! Foi por isso que assumi o trono em seu
lugar.
Vanessa, Prudence e Desiree responderam atirando as almofadas do sofá sobre ela, rindo como adolescentes.
- Ei, parem com isso! Não é assim que se trata a futura rainha! - Anna gritou, tentando se defender como pôde.
- Então, pare de provocar! - Vanessa, rindo, olhou com ternura para a irmã. - Seu casamento com Sebastian será o próximo.
- Sim - Anna respondeu, com ar sonhador. - Mal posso esperar!
- Por falar em espera, acho que já deixamos o capitão aguardando por muito tempo. - Desiree avaliou seu reflexo no espelho mais uma vez antes de sair.
Ela, Prudence e Anna eram as damas de honra. Vestiam um elegante modelo rosa-champanhe, inspirado nos tempos medievais, com decote arredondado e linhas discretas.
Vanessa estava deslumbrante em um vestido branco, de renda, com um delicado laço de cetim marcando a cintura. As mangas compridas, apropriadas para uma tarde
de outono, terminavam em um lindo anel no dedo médio.
A verdadeira magia, porém, era a felicidade que irradiava, tornando-a mais bela do que nunca.
Prudence carregava em uma bandeja de prata as alianças que ela e Mark haviam comprado juntos. Vanessa optara por uma linha moderna, em ouro branco cravejado
de pequenos brilhantes.
- Está pronta? - a amiga perguntou-lhe, ajeitando o longo véu que descia pela escadaria frontal da capela.
Vanessa assentiu, e seu pai juntou-se a ela na porta de entrada. O rei usava o traje de gala, adornado pelo broche com a insígnia real.
- Você está maravilhosa, querida. - Leopold a beijou de leve na face. - Sua mãe teria ficado muito orgulhosa de sua filhinha... assim como eu estou.
Contendo as lágrimas, Vanessa enlaçou o braço do pai, e os trompetes anunciaram a iminente entrada da noiva na capela real.
- Espero que seja uma cerimônia simples - Prudence comentou.
- Claro, temos apenas cem convidados - o rei informou-lhe. - O casamento de Anna será na Catedral de San Kristoff, com mil e quinhentos.
- Tive mais sorte que você - Vanessa provocou a irmã, com um sorriso.
- Não posso me concentrar com todos estes anjos voando na abóbada da capela! - Desiree reclamou, aflita. - Preciso de um cigarro.
- Não ouse se mover. - Anna posicionou-se ao lado dela. As portas se abriram, e as damas de honra entraram, enquanto coral entoava um hino suave e comovente.
A seguir, Vanessa percorreu a nave de braços com o pai. Seu olhar permanecia fixo em Mark, que sorria para ela no altar, mal contendo a impaciência de tomá-la
nos braços.
Quebrando a tradição, Vanessa não cobrira o rosto com o véu, justificando que não queria correr o risco de tropeçar e cair.
Mas a verdade era que desejava ver o futuro marido sem nada que lhe atrapalhasse a visão. Mark parecia ainda mais forte e mais sensual, se é que era possível.
Estava mais bonito do que quando a pedira em casamento, no jardim do palácio.
Usava o uniforme da Marinha, assim como seu irmão Joe. O irmão mais velho de Mark, Justin, estava em uma missão e não pudera comparecer. O caçula, Sam, sentara-se
no banco da frente com os pais.
Os demais bancos da capela estavam preenchidos por numerosos oficiais da Marinha, que haviam voado para Volzemburg no jato particular que o rei enviara para
trazê-los.
Nos bancos ao lado de Vanessa acomodavam-se seus amigos e familiares, alguns da realeza. Toda a equipe da Fundação de Auxílio à Infância, que acabara de inaugurar,
se encontrava presente. E sua antiga dama de companhia, que agora tornara-se sua assistente pessoal, estava radiante com o marido, o dr. Abraham Rosenthal.
Os raios de sol atravessavam os vitrais, banhando-os com uma cascata de cores.
Quando Vanessa era criança, costumava ir até a capela vazia e se deitar no chão de mármore, para o olhar os anjos no teto. Naquela época, ficava a imaginar
o que os fazia sorrir tanto.
Mas naquele momento ela soube. O amor os tornava tão felizes.
- Princesa Vanessa Alexandria Maria Teresa Von Volzemburg, aceita o capitão Mark Anthony Wilder como marido...
- Mark Anthony? - sussurrou ao ouvido dele.
- Não é hora para gracinhas - ele retrucou, mal contendo o riso.
- Tem razão - concordou, sabendo que o capelão não ouvia, a menos que gritasse. - Vou deixar para mais tarde, no quarto...
Percebendo que o capelão esperava a resposta, disse em voz bem alta:
- Sim!
- E você, capitão Mark Anthony Wilder, aceita a princesa Vanessa Alexandria...
- Você colocou na bagagem a camisola de seda que me mostrou? - Mark cochichou, muito perto dela.
- Sim, junto com a camiseta de Nova York.
- Será uma combinação interessante.
- Ainda não decidi qual das duas usarei em nossa primeira noite. Talvez a camiseta, e nada mais... - Piscou sedutora. - Acha que vai gostar?
O capelão pigarreou, fitando-o por sobre os óculos.
- Oh, sim! - Mark declarou tão alto que mesmo quem estava nos últimos bancos pôde ouvi-lo com toda a clareza.

Mais tarde, na magnífica recepção oferecida no salão nobre, os convidados comentaram sobre a ênfase que Mark colocara naquele "sim", bem como a paixão com
que beijara a noiva ao tomá-la nos braços no instante em que o capelão declarou-os marido e mulher.
Vanessa sorria diante dos comentários, sem tirar os olhos do marido. Sabia que seu abrigo estava nos braços daquele homem. Nada mais importava.


* * * *


CATHIE LINZ abandonou a carreira universitária para se tornar escritora de romances contemporâneos. Recentemente, foi agraciada com o cobiçado troféu de Romancista
do Ano, oferecido pelo Romantic Times Magazine. Sua característica marcante é o delicioso humor com que compõe seus romances.
Cathie adora viajar. Dedica todo seu tempo livre à família e aos dois gatos de estimação. Para trabalhar em seus livros, tranca-se no escritório e dedica-se horas
às maravilhosas histórias que cria, enquanto se delicia com seu vício secreto: biscoitos de chocolate!

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